Ofensiva Socialista n°33 - março-abril 2017

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Jornal da LSR

Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)

N° 33 • março-abril 2017

Tendência do PSOL

Temer quer impedir que você se aposente

Vamos barrar a “reforma” da previdência Fora Temer! Eleições Gerais! Construir a greve geral

8 de março de 2017: uma nova onda de lutas feministas em todo o mundo!

pág. 06-7

A luta contra a privatização da CEDAE no Rio de Janeiro pág. 09

Uma estratégia socialista para derrotar Trump pág. 10

Educação sob ataque pág. 12

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editorial

Ofensiva Socialista n°33 março-abril 2017

Governo quer aprovar contrarreformas na marra!

É preciso uma resposta à altura! O

governo ilegítimo de Michel Temer é um retrato fiel da podridão do sistema político brasileiro e um claro retrocesso sob todos os pontos de vista. Temer é fruto de um contexto em que a classe dominante brasileira não podia mais apoiar-se na normalidade do jogo político para fazer frente ao agravamento da crise capitalista. O pacto social Lulista já não servia mais no novo contexto. Para aprovar e por em prática novas e mais profundas medidas de ajuste econômico e contrarreformas em favor do grande capital, o recurso às medidas de exceção passou a ser regra. A própria manobra golpista do impeachment é um reflexo disso.

nhado espaço na sociedade. Isso já se manifesta no avanço da violência urbana, no papel do crime organizado nas periferias, na barbárie dos presídios, etc. Esse cenário também aumenta a probabilidade de explosões sociais motivadas pelo desespero e falta de perspectiva. Já vimos isso antes na grande recessão do início dos anos 1980 e em outras situações. Se a esquerda socialista e os movimentos sociais não construírem ferramentas de luta e organização, esse processo tende a se perder ou ser canalizado para saídas ineficazes ou mesmo reacionárias. É preciso oferecer um canal de luta organizada que supere as limitações burocráticas e corporativas do movimento sindical, popular e da esquerda atual.

Governo de exceção para impor contrarreformas

Alternativa política

U

ma das melhores descrições desse processo foi feita antes mesmo da posse de Temer por Roberto Brant, ex-ministro da previdência de FHC e então cotado para assumir a mesma função no novo governo (acabou perdendo a vaga em decorrência de sua sinceridade excessiva). Foi ele quem coordenou a elaboração do documento “Uma ponte para o futuro” (base dos atuais ataques) e contribuiu para as linhas gerais da proposta de contrarreforma da previdência que tramita hoje no Congresso. Brant disse ao Estadão (18/04/16) que essas reformas “não foram feitas para enfrentar o voto popular”. Reiterou: “com um programa desse não se vai para uma eleição”. Mostrou ainda o caminho para a aprovação das impopulares “reformas”: “Vai ser preciso ser rápido no Congresso. Dar um tranco... E sem mandato da sociedade. Vai ter de ser meio na marra”. De fato, é na marra e aos trancos que eles estão nos enfiando goela abaixo as contrarreformas e demais ataques. Temer conseguiu aprovar a PEC 55 (congelamento dos gastos públicos por 20 anos) antes mesmo que a população entendesse do que se tratava. Fez o mesmo com a contrarreforma do ensino médio. Mesmo não tendo conseguido ainda aprovar na Câmara seu projeto de renegociação das dívidas dos estados com a União, que implica na imposição de políticas duríssimas de austeridade e privatizações, muitas dessas medidas já estão sendo adotadas. É isso que está por trás da calamidade pública e elementos de barbárie no Rio, Espírito Santo e outros estados. Numa manobra típica de um governo de exceção, Temer está desenterrando um projeto de lei de 19 anos atrás que visa retirar qualquer restrição às terceirizações e ainda anistiar as empresas de multas e penalidades por irregularidades cometidas. Esse projeto consegue ser ainda pior do que aquele aprovado pela Câmara no ano passado e que está parado no Senado. O governo já anunciou sua política de contrarreforma trabalhista que representa na prática o fim da CLT, permitindo que “negociações” entre patrões e trabalhadores cancelem direitos trabalhistas estabelecidos na lei. Mas, a mãe de todos os retrocessos até agora, uma decorrência natural da PEC 55, é ao ataque brutal sobre a previdência pública e o direito de aposentadoria representa-

P do pela PEC 287, já em tramitação. Trata-se de um ataque à previdência pública pior do que aqueles promovidos por FHC nos anos 1990 e por Lula em 2003.

Temer tem pressa

A

té agora foram seis ministros afastados em decorrência das investigações e escândalos. Todos sabem o potencial avassalador que novas denúncias e delações podem ter sobre o governo. Para tentar manter-se é fundamental que Temer se mostre extremamente funcional para a classe dominante na aprovação das contrarreformas com rapidez recorde. O governo precisa mostrar serviço para o grande capital. Para complicar a situação, o TSE está julgando a ação que pede a cassação da chapa Dilma/Temer por crime eleitoral em 2014. Os depoimentos até agora incriminam não apenas a chapa vitoriosa, mas também as de Aécio Neves e Marina Silva. O depoimento de José Yunes, ex-assessor especial e amigo pessoal de Temer há décadas, assumindo que levou um pacote (que só podia conter dinheiro ilícito) para o ministro (agora afastado) Eliseu Padilha, é só um sinal do que pode surgir nos dias que seguem. Não é a toa que no mesmo momento em que o TSE caminha para uma deliberação sobre os crimes cometidos no financiamento da campanha Dilma/Temer em 2014, o governo busca avançar na aprovação de parte da contrarreforma trabalhista e dar passos na contrarreforma previdenciária. Temer que provar que não virou uma Dilma e mantém condições políticas de cumprir seu papel na aprovação das contrarreformas.

Derrotar as contrarreformas é criar as condições para a queda de Temer!

É

por isso que, um grande movimento nacional de resistência que seja capaz de barrar a contrarreforma da previdência, acabaria por minar as bases de sustentação do próprio Temer, criando as condições para a queda do governo. Esse não é um cenário impossível, ape-

sar das dificuldades no campo da organização popular e dos trabalhadores. Ao contrário da confusão e desconhecimento em relação à PEC 55, a maioria da população entende que a contrarreforma da previdência representa um ataque brutal. Isso já se reflete no Congresso, com os deputados da comissão especial criada para o tema declarando rejeitar partes importantes do projeto. É evidente que isso não é suficiente para derrotar o projeto. Vai ser preciso muita luta, de massas e radicalizada. Mas, é um indicador de que é possível vencer. A chantagem governamental ameaçando cortar o Bolsa Família e o PROUNI se a contrarreforma não for aprovada, pode acabar saindo pela culatra. A raiva contra mais uma ameaça de ataques pode se expressar de forma ainda mais intensa. Mas, é claro que isso depende da resposta organizada do movimento sindical, popular, da juventude e do povo.

Barbárie social

A

economia brasileira encolheu 3,6% no ano passado. Vivemos a recessão mais longa já registrada no país. A redução da renda (PIB) per capita no triênio 2014-16 foi de quase 9,5%. Segundo as projeções otimistas, retornaríamos ao nível de renda per capita de 2013, o mais alto da história, só em 2023. Desemprego oficialmente já chegou ao patamar de 13 milhões de brasileiros (12,6%). Isso sem levar em conta o trabalho ultra-precarizado. As projeções não são nada favoráveis. Segundo a OIT, de cada três novos desempregados no mundo em 2017, um será brasileiro. Na sua grande maioria os desempregados são negros, mulheres e jovens, o setor mais atingido da classe trabalhadora com a crise. A desocupação entre jovens de 18 a 24 anos chega a 26%. As políticas recessivas e de desmonte dos serviços públicos só agravam a crise e levam desespero para milhões de brasileiros para que uma pequena minoria garanta seus lucros e rendas bilionárias. O resultado dessa situação é a barbárie ga-

or tudo isso, a saída passa pela unificação das lutas, a organização de base nas periferias, comunidades, locais de trabalho e estudo. Passa pela construção de ações unitárias como o 8 e 15 de março e a construção de uma greve geral contra os ataques. Essa é a prioridade agora para todos que querem derrotar Temer e sua política. Nesse processo de lutas, será possível criar as condições para a construção de uma alternativa política e unificada da esquerda socialista, uma autêntica Frente da Esquerda Socialista claramente diferenciada do campo lulista. É preciso combater as ilusões em um retorno triunfante do Lulismo em 2018 porque jogam contra as lutas de hoje e não oferecerão nenhuma saída efetiva para os trabalhadores e o povo. Já vimos como o Lulismo produziu o contexto de derrotas da esquerda no período recente. O programa que Lula e o PT defendem não represente uma clara alternativa à crise e aos ataques de Temer hoje. Nossa luta é pelo Fora Temer já, numa luta vinculada ao combate às contrarreformas. Mas, a queda de Temer não pode dar lugar a uma eleição indireta de um novo presidente por esse Congresso de picaretas, corruptos, patrões e direitistas. Precisamos levantar a bandeira das eleições gerais para a presidência e o Congresso. É preciso defender novas regras eleitorais democráticas que garantam a soberania popular e rompam com esse sistema político eleitoral decrépito. Nesse contexto poderá emergir uma nova esquerda socialista, uma esquerda que aprendeu com os erros históricos do PT e do Lulismo e aposte na luta independente dos trabalhadores e num programa anticapitalista e socialista.

“Se a esquerda socialista e os movimentos sociais não construírem ferramentas de luta e organização, esse processo tende a se perder ou ser canalizado para saídas ineficazes ou mesmo reacionárias.”


nacional/lutas

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8 e 15 de março: Dias Nacionais de Luta

O próximo passo tem que ser uma Greve Geral de 24 horas As greves, paralisações e manifestações previstas para 8 e 15 de março podem se transformar em passos importantes para a construção de uma Greve Geral de 24 horas no país para derrotarmos os ataques brutais do governo Temer. Miguel Leme membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas. A última pesquisa da CNT/ MDA, publicada em 15/02, indicou que Temer está mais impopular do que nunca: apenas 10% dos brasileiros aprovam a sua gestão. Mesmo com toda essa impopularidade, o governo Temer vem conseguindo aprovar projetos importantes de ataques aos trabalhadores – PEC 55 e a Reforma do Ensino Médio – e fazer tramitar de forma acelerada no Congresso Nacional as contrarreformas da previdência e trabalhista. O objetivo do Temer é de aprovar estas contrarreformas no primeiro semestre deste ano. Temer vem conseguindo este êxito parcial por três motivos. O primeiro está relacionado à unidade da burguesia em relação a estes ataques. O segundo se deve ao papel nefasto desempenhado pelas centrais sindicais e o terceiro está relacionado a fragmentação da esquerda combativa.

Papel das centrais No caso das centrais sindicais, a Força Sindical apoia o governo Temer e a contrarreforma trabalhista e quer minimizar, apenas, a previdenciária. Tanto é assim, que o deputado federal Paulinho da Força já apresentou emendas ao projeto de contrarreforma previdenciária do governo. Uma delas propõe que a idade mínima para o trabalhador se aposentar seja de 60 anos para o homem e de 58 anos para a mulher. Já a CUT, desde o ano passado, vem convocando dias nacionais de mobilização com paralisação e greves, sem no entanto mobilizar para valer as suas bases. Por um lado, esta redução da capacidade de mobilização da CUT reflete a perda de autoridade de sua direção junto aos trabalhadores depois de 13 anos de atrelamento aos governos Lula e Dilma. Por outro, expressa também um projeto consciente de não ser consequente na luta e, de forma criminosa, permitir que estes ataques sejam aprovados por Temer – pois, na avaliação da CUT, isto fortaleceria o projeto Lula 2018. Este projeto ganhou mais força após a última pesquisa CNT/MDA em que Lula aparece em primeiro lugar em todos os cenários de primeiro turno

e na maioria dos de segundo turno. As centrais sindicais oficiais realizaram reunião no dia 13/02 e aprovaram a unidade em relação ao 15/03 sob o eixo “Nenhum direito a menos”. Para esta reunião, as centrais sindicais oficiais não convidaram a CSP-Conlutas e a Intersindical. Não fizeram o convite, pois sabem que estas centrais sindicais, apesar de minoritárias junto aos trabalhadores, exigiriam um processo de mobilização mais forte em relação ao dia 15 de março, a incorporação do dia 8 de março ao calendário de luta e a convocação de uma Greve Geral no país para derrotar as contrarreformas do governo Temer.

Derrotar os ataques As Frente Povo Sem Medo e Brasil Popular assinaram nota conjunta assumindo a construção dos dias 8 e 15 março. No caso específico da Povo Sem Medo há um objetivo claro em derrotar as contrarreformas do governo Temer. Já a Frente Brasil Popular participará deste calendário de luta apenas com o objetivo estratégico que é a construção de uma frente política ampla envolvendo PT, PCdoB e uma parte importante dos movimentos sociais a fim de fortalecer a candidatura de Lula para as eleições presidenciais de 2018. Não há qualquer balanço crítico da Frente Brasil Popular em relação aos treze anos de governos do PT. Lula e Dilma atrelaram a CUT, UNE e MST aos seus governos e, desta forma, conseguiram implementar medidas de ataques aos trabalhadores. É preciso lembrar que o conteúdo da PEC 55, que congelou os gastos públicos por vinte anos, as contrarreformas da previdência, trabalhista e mesmo a do ensino médio, já vinham sendo colocadas como prioridades pelo governo Dilma. Entretanto, não tiveram condições de ser apresentadas devido ao processo de impeachment.

Ainda insuficiente Apesar da unidade das centrais sindicais oficiais, CSP-Conlutas, Intersindical e das Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular em relação a 15/03, o processo de mobilização tem sido insuficiente e precisa ser intensificado no próximo período, principalmente no setor privado. Neste momento, há um processo muito forte de mobilização da educação básica através da CNTE e suas entidades filiadas, ensino superior através do Andes, Sinasefe e Fasubra e dos trabalhadores dos Correios que aprovaram que paralisarão suas atividades no dia 15/03.

O MTST acampou por semanas na Avenida Paulista em São Paulo contra o desmonte da política habitacional pelo governo Temer. No caso de São Paulo, tanto a contra uma medida do governo TeApeoesp como o Sinpeem, sindi- mer, que resolveu privilegiar recurcatos dos trabalhadores da educa- sos do Minha Casa Minha Vida pação básica do estado e do municí- ra as famílias com rendimento até pio, já aprovaram paralisação no R$ 9.000,00 em detrimento da podia 08/03 e indicativo de greve por pulação de baixa renda e do Minha tempo indeterminado para 15/03. Casa Minha Vida Entidades/Faixa Entretanto, é fundamental que 1 (famílias com renda de 0 a 3 saoutras categorias importantes, co- lários mínimos). mo é o caso dos metalúrgicos, peOs trabalhadores do serviço pútroleiros e bancários, participem de blico municipal de Florianópolis forma mais consequente das ações (SC) deram um exemplo de que é que serão realizadas em 15/03. Pa- possível lutar e obter vitória. Esra isso, é necessário que a constru- tes trabalhadores realizaram uma ção desta data seja realizada na ba- greve de 38 dias e impuseram uma se destas categorias, tendo em vis- grande derrota ao prefeito Gean ta o papel de freio desempenhado Loureiro (PMDB). O prefeito foi por suas direções. obrigado a voltar atrás na revogação do plano de carreira da maioria da categoria, na criação da preLutas importantes vidência complementar e em vários Como ano passado, 2017 tam- direitos retirados dos professores. bém começou quente do ponto de Além de Florianópolis, os trabavista das lutas. No bojo da crise do lhadores do serviço público munisistema carcerário, tivemos greves cipal de Santos (SP) estão num prode policiais militares por reajuste cesso de mobilização muito fornos salários e melhores condições te contra a política de reajuste zede trabalho, como foi o caso no Es- ro do atual prefeito. Aprovaram o pírito Santo e, em menor escala, no início da greve da categoria para 9 Rio de Janeiro. Também no Rio, de março. os servidores estaduais continuaram mobilizados contra o pacote de 8 de março ajuste fiscal do governo Pezão. Entretanto, esse processo de mobilizaNo dia 8 de março serão realização não foi suficiente para derrotar das manifestações em todo o munum dos ataques importantes deste do pelo fim da opressão, explorapacote que foi a aprovação do pro- ção e violência contra a mulher. jeto que permite ao governo estaduO movimento Ni una a menos, al privatizar a Cedae, a Companhia que ganhou peso internacional, esestatal de água e esgoto. tá chamando uma greve de mulheEm relação à moradia, há uma lu- res para o dia 8 de março em vários ta importante do MTST. O Movi- países do mundo. Estas greves têm mento acampou em frente ao escri- o objetivo de denunciar governos tório da Presidência da República misóginos, como é caso de Trump na Avenida Paulista em São Paulo nos EUA, e o feminicídio, que tem

aumentado assustadoramente nesta conjuntura. No Brasil, a maioria das manifestações do 8 de março está sendo convocada com o eixo Aposentadoria fica, Temer Sai! Paramos pela vida das Mulheres. Em São Paulo, será realizado um Ato com milhares de pessoas, envolvendo, principalmente, as professoras e professores do estado e municípios de São Paulo e a base das mulheres das entidades convocantes e organizadoras do 8 de março. Todas estas lutas indicam que há uma disposição de lutas dos trabalhadores e que é possível, sim, obter vitórias, como foi o caso dos trabalhadores de Florianópolis. Entretanto, estas lutas precisam ser unificadas e realizadas com um sentido comum para que tenhamos condições de construir uma Greve Geral de 24 horas no país, preparada com a realização de plenárias de bases nos estados e municípios, para derrotarmos as contrarreformas do governo Temer.

Plebiscito Popular contra a Reforma da Previdência No dia 14/02 foi realizada em Brasília a Reunião do Conselho Político da Auditoria Cidadã da Dívida. Um das deliberações importantes desta reunião foi a de realizar uma consulta pública nacional (plebiscito) junto à população sobre a contrarreforma da previdência. A consulta seria realizada em base a 3 perguntas. Além de uma pergunta sobre a reforma da previdência, haveria também uma sobre a auditoria da dívida pública e outra sobre as privatizações. O fato da Auditoria Cidadã ter deliberado por três questões criou resistência em algumas entidades importantes, como é o caso da CUT e o MST. Entendemos como correto o encaminhamento aprovado pelo Operativo Nacional da Povo Sem Medo no sentido de construir o diálogo para que tenhamos um plebiscito unitário. A realização deste plebiscito é fundamental para disputarmos a consciência da massa dos trabalhadores. Queremos que a população esteja conosco nas ruas contra a Reforma da Previdência. Não será uma disputa fácil, tendo em vista que o governo Temer tem jogado pesado com matérias pagas na TV, rádios e jornais impressos de grande circulação. O nosso contraponto tem que ser realizado de forma unitária nos locais de estudo e trabalho através do uso de cartilhas, vídeos e panfletos que estão sendo elaborados pelas entidades convocantes deste plebiscito.


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sindical O que a LSR defende:

●● Não à PEC 55, PLP 257 e outras medidas que impõe uma política de severa austeridade, que tem como objetivo cortar os serviços públicos, transferindo recursos para os ricos e o setor privado! ●● Não à reforma da previdência que estabelece 65 anos como idade mínima para se aposentar, aumenta o tempo de contribuição e iguala o tempo de contribuição entre homens e mulheres. Pelo fim do fator previdenciário. ●● Não à reforma trabalhista que abre para retirada de direitos conquistados através do negociado prevalecendo sobre o legislado. Não às terceirizações e precarização das relações de trabalho! ●● Não pagamento das dívidas interna e externa aos grandes capitalistas para garantir os recursos necessários para os serviços públicos e o desenvolvimento econômico com igualdade social! Auditoria das dívidas controlada pelas organizações dos trabalhadores! ●● Pela taxação das grandes fortunas, dos ricos e dos lucros das grandes empresas! ●● Por um programa de emergência para combater a crise e gerar emprego baseado em investimentos públicos em infraestrutura, moradia, transporte, saúde e educação. 10% do PIB para a educação pública já! Não à reforma do ensino médio de Temer! 10% do PIB para a saúde pública já! ●● Pelo direito à cidade para os trabalhadores e o povo! Tarifa zero nos transportes públicos! Estatização do sistema de transporte com controle democrático dos trabalhadores e usuários! Pelo direito à moradia garantido a todos e todas! Nenhum corte nos gastos e investimentos sociais! Mais investimentos na qualidade do transporte e serviços públicos! ●● Reforma agrária controlada pelos trabalhadores com fim do latifúndio! Não à usina de Belo Monte! Em defesa do meio ambiente e do direito à terra para as comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas! Fim do massacre dos sem-terra e indígenas! ●● Aumentos salariais de acordo com a inflação! Congelamento dos preços dos alimentos e tarifas públicas! Redução da jornada de trabalho sem redução de salários! ●● Contra o estatuto do nascituro em tramitação no Congresso! Pela legalização do aborto! Pelo fim da violência contra a mulher! Contra as propostas de reforma trabalhista

é uma publicação da Liberdade, Socialismo e Revolução

Telefone: (11) 3104-1152 E-mail: lsr@lsr-cit.org Sítio: www.lsr-cit.org Facebook: www.facebook.com/lsr.cit Assinatura: 10 edições: R$ 25 reais

e da previdência que visam retirar direitos da mulher trabalhadora! Salário igual para trabalho igual! Por mais verbas para a implementação da Lei Maria da Penha! Contra toda forma de opressão às comunidades LGBT! ●● Pelo direito democrático de manifestação! Não à criminalização dos movimentos sociais e à repressão! Liberdade e fim dos processos sobre os manifestantes! ●● Basta de violência policial racista nas periferias! Desmilitarização e controle popular sobre a polícia! Combater o racismo nos locais de ensino, de trabalho e na sociedade. ●● Reestatização das empresas privatizadas por FHC, Lula e Dilma com controle democrático dos trabalhadores! Estatização do sistema financeiro e grandes empresas que controlam a economia sob controle dos trabalhadores! ●● Pela reconstrução das ferramentas de luta da classe trabalhadora, independentes dos governos petistas e da direita tradicional. ●● Construir a CSP-Conlutas como central sindical e popular, democrática, classista e de luta, que sirva como base para a construção de uma nova Central unitária de todos os setores combativos e independentes de patrões e governos. ●● Construção pela base de espaços democráticos amplos para unificar as lutas. Por um Encontro Nacional dos Movimentos em Luta! ●● Pela construção de novas relações entre aqueles que lutam, baseadas na solidariedade de classe, democracia e respeito às divergências. ●● Por um PSOL afinado com as ruas: de luta, socialista e radicalmente democrático. Por candidaturas do PSOL a serviço das lutas e com um programa socialista. Qualquer representante público do PSOL deve viver com salário de trabalhador. Pela construção da Frente de Esquerda nas eleições e nas lutas. ●● Por um governo dos trabalhadores baseado na democracia das ruas, na mobilização de massas dos trabalhadores e da juventude e com um programa socialista! ●● Por uma economia democraticamente planificada, onde a produção e os serviços, preservando o meio ambiente, estejam voltados aos interesses de toda a população e não uma pequena elite privilegiada. ●● Por uma Federação Socialista da América Latina e um mundo socialista. Colaboraram nessa edição: André Ferrari, Cacá Melo, Cristina Fernandes, Felipe Tavares, Isabel Keppler, Jane Barros, José Afonso Silva, Kshama Sawant, Luciano Barboza, Marcus Kollbrunner, Maria Clara Ferreira, Mauricio de Oliveira Filho, Miguel Leme, Raphael Mota e Wagner Fonseca

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Servidores de Santos

0% eu não aceito! Os servidores de Santos aprovaram o movimento de greve por tempo indeterminado. A greve se inicia no dia 09/03 é histórica! A última greve por tempo indeterminado dos servidores foi em 1995! Mauricio de Oliveira Filho Os servidores municipais de Santos – SP, foram afrontados pelo prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) no primeiro ano de sua segunda gestão, Paulinho oferece 0% de reajuste aos trabalhadores. A categoria reivindica a inflação do período mais 8% de aumento real. Durante um ato realizado pelos servidores no dia 14/02 diante do silêncio da prefeitura sobre o reajuste, apesar da proximidade da data-base, o secretário de gestão, o Cacá Teixeira, cinicamente disse à categoria que não poderia “vender sonhos”, e que só poderia voltar a falar em reajuste em julho! A resposta foi imediata! No dia seguinte, em assembleia, a categoria entrou em Estado de Greve. E na quinta‑feira, 23/02, quase 700 servidores decidiram pela greve. A desculpa da prefeitura é a crise econômica. Contudo, o orçamento da cidade é o maior da história e teve um aumento de 8% em relação a 2016.

Mesmo cientes das mentiras da prefeitura, os servidores pautam algumas medidas de redução de gastos públicos, como: redução de 20% nos valores dos salários do Prefeito, dos cargos de confiança (cargos políticos) e dos vereadores; extinção de 30% dos cargos de confiança (cargos políticos) de diversas Secretarias; fusão da Secretaria Municipal de Segurança com o gabinete do prefeito etc.

Não somos pipoqueiros! Nossa greve é GERAL! Santos vive uma situação única. Os servidores têm dois sindicatos. Enquanto o Sindserv chamou assembleias numerosas (a última delas com mais de 600 servidores) orientando o caminho da greve geral, o Sindest (que teve sua criação impulsionada pela prefeitura) lança edital exigindo o recolhimento do imposto sindical, chama assembleias com 11 pessoas e orienta uma “Greve Pipoca” (paralisação de um setor por dia), que foi motivo de piada em toda a categoria. A prefeitura não dá sinais de que voltará atrás tão facilmente de sua decisão. Será preciso construir uma greve forte para que os servidores saiam vitoriosos desta luta. Nossa greve não é pipoqueira! Nossa greve é GERAL! Mas será preciso

mais que apenas cruzar os braços. O movimento grevista, em sua assembleia geral, decidiu por construir Grupos de Trabalho (GT’s) setoriais para organizar a greve na base da categoria. Estes grupos devem ser o motor da greve nos setores (Educação, Assistência, Saúde, Serviços Urbanos etc.). O diálogo com a população, a visita aos locais de trabalho, as atividades de greve (aulas públicas, debates, atividades culturais, panfletagens etc.) devem passar pelos GT’s. Ou seja, esta será uma greve construída pela base! Assim, o movimento terá condições de construir mais uma vitória contra a gestão tucana em Santos. E não haverá prefeitura nem Sindest que bastem para conter nosso triunfo! Reajuste com aumento real já! 0% eu não aceito Não pagaremos pela crise! Cortem os cargos de confiança! Reduzam os salários do prefeito e secretários! Nossa Greve é Geral! Meu sindicato é o Sindserv! Não somos pipoqueiros!

Servidores da UFRN enfrenta Temer e ataques da reitoria O Sintest/RN, sindicato dos técnico-administrativos da UFRN, tem se caracterizado como um sindicato de luta. Essa postura não tem sido diferente no enfrentamento ao ponto eletrônico e ao acordo assinado com a reitoria após a greve contra a PEC 55 (PEC 241). Essas duas batalhas são frutos de uma retaliação promovida pela reitoria, após uma decisão certa da categoria de defesa da universidade e de, articulado com a FASUBRA, partir para um movimento nacional contra o ajuste fiscal de Temer. Felipe Tavares Durante a greve contra a PEC 55, os colegiados superiores aprovaram duas notas e uma contra a PEC 55, outra em favor da greve dos técnico-administrativos. No entanto, pouco depois do Natal, com a universidade praticamente esvaziada, a reitoria se apresentou de outra forma: foi intransigente ao defender a reposição de cada hora não trabalhada, que implica em hora extra por um ano. Fez isso na contramão da orientação da ANDIFES, associação ironicamente presidida pela reitora da UFRN, que defendeu a reposição em tarefas. Não

bastasse, pouco depois ela impôs, sem a realização de diálogo e de qualquer diagnóstico das especificidades da universidade, um sistema de ponto eletrônico que controla minuciosamente a carga horária dos servidores. O início do ano foi marcado por um desânimo da categoria e parte da direção tinha como postura, inicialmente, a de amenizar o impacto do ponto eletrônico. A demora para uma resposta ágil, articulando com FASUBRA e CSP‑CONLUTAS, denunciando as atitudes arbitrárias da reitoria, impactou a categoria e seu envolvimento nessa luta.

Mobilizando a base A situação, entretanto, começou a mudar conforme o sindicato passou a fazer assembleias para debater o acordo de greve e o ponto eletrônico. Ficou evidente a necessidade de se partir para uma quebra do acordo e uma luta contra o novo registro de frequência a partir de um amplo processo de mobilização. Nesse sentido, a LSR, que compõe a direção com um integrante, articulada com outros servidores, tem cumprido um papel importante, na medida em que esteve na vanguarda da reivindicação da quebra do acordo de greve, defendeu o boicote ao ponto eletrô-

nico durante o seu período experimental e defendeu a realização das reuniões setoriais que já estão acontecendo. O processo de mobilização da categoria tem dado resultado pois, após a realização de um ato no pátio da reitoria, a administração central recuou e aceitou que fosse formado um Grupo de Trabalho para discutir formas alternativas de pagamento das horas. Das reuniões setoriais têm sido tirados nomes que irão representar o setor no citado GT, o que fortalece o trabalho de base do sindicato. Sobre o ponto eletrônico especificamente, devido aos métodos coercitivos da reitoria e das chefias que preveem de corte de salário a assédio moral, a adesão chegou a 92%, segundo a pró-reitoria de gestão de pessoas. Entretanto, a postura do sindicato é a de ser contra e, nas conversas setoriais, fica evidente a insatisfação da categoria com o novo tipo de registro. Cabe agora intensificar a luta contra o ponto eletrônico, inserindo-o localmente nas pautas das paralisações nacionais de 8 e 15 de março, coletar mais informações sobre os seus problemas e produzir um dossiê sobre os prejuízos causados por ele ao serviço público e aos servidores.


nacional

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Contrarreforma da previdência

O brutal ataque neoliberal que acaba com nossa aposentadoria O governo Temer enviou para o Congresso Nacional no final do ano passado a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287 que visa acabar com o direito do trabalhador brasileiro poder se aposentar. Wagner Fonseca Os principais pontos da PEC 287 são: idade mínima de 65 anos para a aposentadoria, sendo que em muitas regiões do país, a expectativa de vida é muito próxima desta idade, como é caso do Maranhão, onde o homem vive 66,3 anos em média; fim do direito das mulheres se aposentarem cinco anos antes que os homens, desconsiderando a dupla e tripla jornada de trabalho que as mulheres enfrentam no seu dia a dia, 49 anos de contribuição para o trabalhador ter direito a 100% da média de todas as suas contribuições à previdência e não o salário integral como vem sendo erroneamente divulgado pela imprensa; fim do acúmulo de pensão com aposentadoria, fim da aposentaria especial dos professores, sem reconhecer o desgaste físico e mental presentes no exercício desta profissão e a exigência que o trabalhador rural comprove tempo de contribuição à previdência. Esta exigência impedirá que estes trabalhadores rurais se aposentem, tendo em vista que a maioria não tem registro em carteira.

A toque de caixa Apesar desta PEC não ter o respaldo da classe trabalhadora, o governo Temer quer aprová-la a toque de caixa. O objetivo é bancar a primeira votação na Câmara Federal no final de março e no mais tardar, começo de abril. A preocupação é votar a PEC 287 antes que a divulgação das delações premiadas da Odebrecht, combinadas com a resistência nas ruas dos trabalhadores impeçam a votação desta proposta. Michel Temer parece ter sido a

pessoa certa no lugar certo para aprofundar o processo de desmantelamento de algumas conquistas importantes previstas na Constituição Federal de 1988. Nesse espectro, a questão previdenciária ocupa posição central e a sua reforma é sempre citada como sendo necessária para corrigir supostos déficits que desequilibram as contas do governo. Entretanto, este suposto déficit não existe. Como bem tem sido divulgado pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social (Anfip), a Previdência faz parte da Seguridade Social, junto com a Saúde e a Assistência Social. Em 2015, diferente de um suposto déficit, houve um saldo positivo de R$ 11 bilhões. Isto ocorreu, pois diferente do governo, a Anfip soma todas as receitas que segundo a Constituição devem ir para a Seguridade social – contribuição previdenciária dos trabalhadores, patrões e governos, Cofins, CSLL, PIS/PASEP etc. – e desconta todas as despesas que vão para a Previdência, Saúde e Assistência Social (ver quadro). Com isso, diferente de déficit, há uma superávit nas contas da Seguridade Social.

Dinheiro da previdência é desviado

Centenas de milhares a protestaram no Chile no ano passado contra o sistema privatizado de previdência que levou ao empobrecimento dos aposentados.

A verdade nua e crua é que parte do dinheiro que deveria ir para as aposentadorias é utilizado para pagar juros aos bancos. Além disso, ao invés do governo tentar acabar com a aposentadoria do trabalhador, ele deveria cobrar a dívida que as empresas tem com o INSS que é da ordem de R$ 340 bilhões, R$ 100 bilhões que os ricos sonegam em impostos e acabar com os R$ 88 bilhões de isenção fiscal que as empresas recebem todos os anos. Não é de agora que se tenta deslegitimar a Seguridade Social e em particular à Previdência Social. Desde à promulgação da Constituição de 1988, o sistema sofre ataques que ameaçam a sua finalidade.

Já nos anos 90, são exemplos desses ataques à previdência do setor privado, a extinção de alguns benefícios como o abono, o pecúlio, os auxílios natalidade e funeral por legislações que não precisavam de mudanças na Constituição. Posteriormente, em 1998, no governo FHC, outros ataques foram impostos através da Emenda Constitucional nº 20 que instituiu, por exemplo, uma idade mínima para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição e a imposição de um teto de 10 salários mínimos para as aposentadorias da iniciativa privada. Em 1999, FHC criou o Fator Previdenciário que é uma fórmula matemática que tem

Seguridade Social não é deficitária!

2005 2010 2012 2013 2014 2015

Receitas

289,8 458,1 595,8 651,1 687,8 694,2

Despesas

217,1 404,2 513,0 574,7 632,1 683,1

Resultado Fonte: ANFIP

72,7

54,0

82,8

76,4

55,7

11,2

Valores em bilhões

o objetivo de reduzir os benefícios de quem se aposenta antes da idade mínima de 60 anos para mulheres e 65 anos para homens, e incentiva o contribuinte a trabalhar por mais tempo. Quanto menor a idade no momento da aposentadoria, maior é o redutor do benefício. Um estudo da Câmara dos Deputados estima que desde 2000, ano em que entrou em vigor, até o final de 2011, o fator previdenciário tenha gerado uma economia em torno de R$ 55 bilhões para os cofres do governo.

Décadas de ataques contra a previdência O desmonte do modelo de previdência continuou durante o Governo Lula. Em 2003, Lula atacou a aposentadoria do trabalhador do setor público. Entre muitos ataques, Lula instituiu o redutor de pensão; o fim da paridade para novos servidores; o fim da integralidade para novos servidores, com cálculo pela média; a instituição da cobrança de contribuição de aposentados e pensionistas, incidente sobre a parcela acima do teto do RGPS e a previdência complementar do servidor. Se não há motivos contábeis ou técnicos, como foi evidenciado nesse texto, o que mais justificaria a voracidade dos ataques a esse Sistema?

Uma forma de começar a responder essa questão é olhando o orçamento da União e ver com o que, de fato, estão gastando nosso dinheiro e perceber como é central para o processo de acumulação capitalista global, as dívidas públicas dos diversos países. O capitalismo em sua atual fase financeirizada deu autonomia à esfera financeira da esfera produtiva e o sistema das dívidas públicas que cada vez mais compromete os orçamentos Estatais serve para sua concentração e centralização do Capital. Os ataques à Previdência Social, sempre utilizando-se de argumentos distorcidos, tentam atacar direitos previstos na Constituição Federal de 1988 promovendo retrocessos de dezenas de anos de luta dos trabalhadores e criando obstáculos severos na efetivação de uma sociedade justa. Por este motivo, é fundamental construirmos uma unidade mais ampla que possa desembocar em uma greve geral no país para que tenhamos condições de derrotar este ataque. Neste marco, é fundamental a construção por parte dos movimentos sociais, do plebiscito contra a reforma da previdência que tem o objetivo de disputar a consciência da massa da população para que ela esteja conosco nesta luta.


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especial: dia das mulheres

Ofensiva Socialista n°33 março-abril 2017

8 de março de 2017: lutas feministas e Este 8 de março, no ano de comemoração do centenário da Revolução Russa, adquire uma importância histórica por representar uma retomada de lutas internacionais, de solidariedade mundial, um ponto de inflexão que poderá desencadear uma nova onda de lutas feministas em todo o mundo. Jane Barros O movimento de mulheres dá um passo à frente quando compreende que a unidade na luta e a articulação internacional é o único caminho capaz de garantir vitórias e conquistas. A luta contra Trump não se restringiu às mulheres e à população estadunidense. Pelo mundo todo se espalhou como uma luta contra o retrocesso dos direitos, sobretudo contra o machismo, que mata, oprime e segrega. Da mesma forma, o Ni una a menos, uma campanha iniciada na Argentina, ganhou as ruas de vários países, revelando que o feminicídio é uma terrível realidade deste modelo de sociedade, sendo mais grave nos países mais periféricos. Neste 8 de março está sendo chamado uma paralisação mundial, o 8M, em defesa da vida das mulheres contra o feminicídio. A esta pauta mundial, somam-se outras nacionais como no caso do Brasil com a Reforma da Previdência; nos EUA, com a pauta anti-Trump e sua política de austeridade misógina; ou na Irlanda, onde a luta pelo direito ao aborto legal assume papel central. Nos momentos de crise econômica e política, os setores mais vulneráveis da classe trabalhadora sentem de maneira mais brutal o impacto. As mulheres, os negros e

LGBT’s pagam com suas vidas à manutenção da sociedade capitalista. E de modo não mecânico, imediato, tendem a sair a frente dos processos de luta. Os eventos citados acima são exemplos disso. Não se trata se um fenômeno recente. As mulheres têm assumido papel protagonista na construção de lutas insurrecionais e revolucionarias ao longo da história. Aquela sensação que temos de déjà vu, de já ter visto e vivenciado experiências, não é mera coincidência, tampouco obra do acaso. Cabe a nós revolucionárias aprender com a história e pegar suas rédeas, afinal a única forma de acabar com essa condição de opressão é superando este modelo de sociedade.

A retomada recente das lutas O final de 2016 foi tomado por greves, lutas e marchas de mulheres em todo o mundo. Meio milhão de mulheres na Polônia saíram às ruas para impedir que retrocessos fossem impostos aos casos de abortos já permitidos por lei no país. A grandiosidade desta luta fez com que o governo recusasse e voltasse atrás desta medida. Na Islândia, milhares de mulheres juntaram-se na capital Reykjavik para protestar contra diferenças salariais entre homens e mulheres. Elas saíram de seus trabalhos duas horas e 22 minutos antes do fim para mostrar que as mulheres em média recebem 72% do salário do homem. Na Argentina a cada 36 horas uma mulher é morta. Os casos de feminicídio assumiram a pauta nacional onde milhares de mulheres retomaram as principais ruas do país no final de 2016 depois que a estudante Lucia Perez de 16 anos, foi dro-

Operárias de Petersburgo deram início à Revolução Russa em fevereiro 1917.

gada estuprada, morta e empalada por dois homens. Essa indignação ultrapassou as fronteiras da Argentina e da América Latina, provocando uma série de manifestações em todo mundo de solidariedade à luta e a vida das mulheres. Na Itália, no último novembro, 200 mil marcharam pelo fim da violência contra a mulher e o movimento Ni una a menos local chamou os sindicatos para organizar uma greve. Janeiro de 2017 honrou a jornada de lutas feministas por todo o mundo. No dia 21 de janeiro, momento da posse de Donald Trump nos EUA, as mulheres tomaram as ruas. Trump não só perdeu no voto popular como construiu uma campanha extremamente misógina, de ataques claros às mulheres, assim como indicou uma série de medidas que indicavam retrocesso em direitos conquistados, a exemplo da legalização do aborto. As mulheres convocaram paralizações, greves, e manifestações em todo os país. Só em Washington foram 500 mil pessoas. Assim como no caso de Ni una a menos, a solidariedade internacional esteve presente, mulheres em todo o mundo organizaram ações nas embaixadas e consulados dos EUA, como forma de denunciar os retrocessos nas políticas sociais, nos direitos humanos e o machismo de Trump, que além de impactar o mundo globalmente, possui seus representantes locais que operam as políticas machistas necessárias a reprodução do capitalismo. No Brasil organizamos uma ação no consulado em São Paulo, em Belo Horizonte atividades na rua e ações em diversas capitais do país. Estes dois grandes eventos impulsionaram o 8M como uma ação internacional, uma greve de mulheres em todo o mundo. O movimento Ni una a menos é parte deste processo ao apontar como centro a defesa da vida das mulheres, a denúncia e o combate ao feminicídio. Uma carta assinada por mulheres e ativistas estadunidenses, dentre elas Angela Davis, Por uma greve internacional militante no 8 de março, chama uma greve das 99% pelo direitos e pela vida das mulheres, apontando que esta luta não pode se desconectar da luta contra as políticas neoliberais. Esta carta revela o limite de leituras no campo da política de identidades, que secundarizam uma luta estratégica, o debate de classes, em nome de construção de espaços seguros as opressões, ou a política de “cheque seus privilégios”, ainda focado numa perspectiva individual, comportamental e não estrutural das opressões. Nesse sentido, significa um passo à frente.

MIlhões de mulheres participaram na Marcha de Mulheres contra Trata-se então de uma retomada da articulação das lutas em nível mundial no 8 de março, apontando o caminho da real vitória contra o machismo: a luta anticapitalista e internacional.

Brasil: as pautas nacionais fortalecem a luta internacional O Brasil vive hoje sob o domínio de um governo ilegítimo fruto de um processo de impeachment organizado pela burguesia como forma de garantir a aplicação do duro pacote de contrarreformas, de austeridade para o conjunto da classe trabalhadora. O governo Temer hoje tem construído uma relação de relativa e frágil estabilidade capaz de aplicar a PEC 55, na calada da noite, no fechamento do congresso para o recesso de final de ano, congelando os gastos na área social por 20 anos. Um governo amplamente formado por homens, dignos representantes dos 1%, que trazem consigo, além de muitos ministros e membros envolvidos nos escândalos de corrupção, são capazes de expressar posições reacionárias em relação a pauta de opressões, que na prática quase erradica os parcos orçamentos que existiam para as políticas públicas para mulheres. A proposta que tramita recentemente é a denominada “reforma” da previdência, na verdade uma contrarreforma, uma vez que impõe re-

trocessos à direitos conquistados. Como não poderia ser diferente, as mulheres são centralmente atacadas. A proposta de emenda constitucional (PEC) propõe equiparação dos critérios de idade e tempo de contribuição. A proposta do governo Temer equipara homens e mulheres a 65 anos de idade para aposentadoria. A conquista da aposentadoria integral só seria possível mediante 49 anos de contribuição. Com base em dados do Fórum Econômico Mundial, estima-se que, no ritmo de 2015, países como o Brasil demorem 170 anos para alcançar a igualdade econômica entre mulheres e homens. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2014, 90,6% das mulheres realizam afazeres domésticos. Entre os homens, esse percentual é de 51,35%. Entre nós mulheres, a média fica em torno de 21,35 horas semanais dedicadas ao trabalho de cuidados sem remuneração. Para eles, é menos da metade, 10 horas. Ou seja, a dupla e tripla jornada de trabalho e a desigualdade entre mulheres e homens no mercado de trabalho é ignorada nesta contrarreforma, um retrocesso ao direito já adquirido. Trata-se de um duro golpe, pois na prática a aposentadoria integral será inviável para a ampla maioria da população, e para as mulheres ainda mais, que por conta do mercado de trabalho, dificilmente con-


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especial: dia das mulheres

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: uma nova onda de em todo o mundo!

a Trump nos Estados Unidos. seguiremos contribuir com 49 anos initerruptamente, por muitas vezes sermos obrigadas a sair dos trabalhos para exercer a tarefas dos cuidados com a família, saúde, já que estes serviços vêm sendo paulatinamente sucateados. É relevante o fato de que parte considerável de nós mulheres estarmos em serviços precarizados, nos quais por um longo tempo, não temos registro em carteira e, portanto, direitos sociais. Isso se agrava num cenário de crise e desemprego, num pais onde a expectativa de vida é de 75 anos. No Brasil, mesmo a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), está chamando uma paralização para o 8 de março e uma greve para o dia 15 tendo como pauta a luta contra a Reforma da Previdência. Esta confederação hegemonizada pelo petismo foi obrigada, pela sua base majoritariamente feminina, a dar alguma resposta a esse brutal ataque. Todavia cabe aos setores de oposição de esquerda organizar e tencionar para levar a cabo esta deliberação. Neste sentido, incorporar esta pauta nos atos de 8 de março no Brasil faz parte da luta internacional das mulheres contra as políticas neoliberais como bem citou a carta Por uma greve internacional militante no 8 de março, assinada por Angela Davis, Cinzia Arruzza, Keeanga-Yamahtta Taylor, Linda Martín Alcoff, Nancy Fraser, Tithi Bhattacharya e Rasmea Yousef

Odeh: “Também precisamos alvejar o ataque neoliberal em curso sobre os direitos sociais e trabalhistas”. O eixo inspirado pelo Ni una a menos, em defesa da vida das mulheres tem composto as convocatórias nacionalmente. Importante lembrar os dados oficiais sobre o feminicídio no Brasil. A cada 11 minutos uma mulher é violentada, a cada uma hora e meia uma mulher é morta. A morte de mulheres negras aumentou 54% nos últimos anos. Essa brasileira nos impõe a árdua tarefa de organizar um gigantesco 8 de março, unificado, iniciando um processo de lutas ao longo do ano, em defesa das nossas vidas. Nesse sentido é central também incorporar a temática da legalização do aborto, pauta cara a todas as mulheres, as feministas e, sobretudo as negras trabalhadoras, que mais sofrem e morrem por abortos provocados. Como o aborto é ilegal no Brasil, exceto em casos de estupro, anencefalia e risco de morte a mãe, mensurar os números é muito difícil. Todavia em 2012 o então governo de Dilma Rousseff foi colocado contra a parede por peritos da ONU, que acusavam o Executivo de falta de ação sobre os abortos de risco, que causam a morte de 200 mil mulheres a cada ano no mundo. Contra a Reforma da Previdência, em defesa da vida das mulheres, pela legalização do aborto devem ser os eixos inspiradores das lutadoras que saíram as ruas e se somarão a paralização internacional no 8 de março.

8 de março: deve ser o estopim de um processo de lutas permanente e internacional A condição da mulher na sociedade capitalista revela-se como sendo a de uma cidadã de segunda classe, quando muito. A exploração e a opressão sob qual as mulheres trabalhadoras são submetidas se expressam através de dados objetivos, como menores salários, priores empregos, menos qualidade de vida. Isso somando a questão racial e de orientação sexual e identitária, potencializa a situação de subalternidade. Num cenário de crise econômica e social a condição de vulnerabilidade é adensada. Os exemplos históricos revelam isso, fazendo com que em alguns momentos as mulheres assumissem a primeira fileira das lutas contra o sistema social. Assim foi na Comuna de Paris, na revolução Russa e nas outras insurrecionais. A história foi capaz de nos mostrar o quando a nossa situação trági-

ca, pode se transformar em farsa na medida em que, enquanto mulheres trabalhadoras, nutrirmos qualquer ilusão na possiblidade de superar a misoginia e o machismo no sistema capitalista. O passado e a história presente comprovam que não há emancipação das mulheres com capitalismo, sendo assim a construção de uma outra sociedade, de uma sociedade socialista é condição para a plena liberdade e vida das mulheres. Contudo combater o machismo é tarefa do presente. Lutar pela vida e os direitos das mulheres é tarefa desta geração de ativistas, militantes e socialistas.

Centenário que inspira 2017, o centenário da Revolução Russa, deve inspirar as lutas das mulheres em todo o mundo. Há muitos anos, décadas, não se via uma articulação desta envergadura capaz de dar voz as mulheres, principalmente as trabalhadoras, as mais atingidas por essa implacável crise econômica. Nós socialistas devemos nos somar a esta empreitada, nas nossas cidades, nos espaços de trabalho, estudos e vida, mobilizando e ganhando o maior número de mulheres para a luta. Construir uma grande unidade de ação, a partir de pautas politicas concretas, pois precisamos articular grandes movimentos nacionais, para barra a contrarreforma e pela defesa da vida das mulheres. E só conseguiremos fazer isso juntas, pois juntas somos fortes! O 8 de março é só o começo, a deflagração de um processo de lutas que tomará as ruas do Brasil e do mundo! Não há socialismo sem feminismo, tampouco existe possibilidade de emancipação plena das mulheres fora da construção de uma sociedade de novo tipo, socialista, livre e realmente democrática!

Uma carta assinada por mulheres e ativistas estadunidenses, dentre elas Angela Davis, Por uma greve internacional militante no 8 de março, chama uma greve das 99% pelo direitos e pela vida das mulheres, apontando que esta luta não pode se desconectar da luta contra as políticas neoliberais.

Entrevistamos algumas mulheres que estão na linha de frente das lutas no Brasil! Confira a íntegra no site e na página do Facebook! Amanda Gurgel é professora do Estado no Rio Grande do Norte e militante do Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista (MAIS): “Muitas das nossas reivindicações históricas que não foram ainda atendidas, como por exemplo direito ao aborto, que tem a ver pelo direito ao nosso próprio corpo, a luta contra a violência contra as mulheres, contra o feminicídio, todas essas bandeiras permanecem vigentes, atuais, nenhum desses problemas foram resolvidos ainda pelas mulheres. Mas nesse momento, é muito importante que haja um entendimento de que nós temos bandeiras gerais que precisam ser abraçadas pelas mulheres como um

todo. A luta, por parte das mulheres, de resistência e enfrentamento ao governo ilegítimo de Michel Temer ela é central. A luta contra ajuste fiscal, contra as reformas que estão sendo implementadas ela é crucial e é necessário que todo movimento esteja unificado”.

Natália Szermeta é da Coordenação Estadual de SP do MTST: “Acredito que o cotidiano de todas as mulheres, em especial as mais pobres, é opressor e violento. A direita brasileira, aquela que saiu do armário, é reacionária, odiosa e machista. O feminicídio, a violência doméstica, o estupro é uma dura realidade e medo constante na vida das mulheres. Mas a luta coletiva ainda que tenha como inimigo um machista ilegítimo, creio que nos dá força para seguir! Então acho que viver

oprimida é muito pior do que viver lutando contra a opressão!”

Kátia Sales é mãe da Thainá, vice presidenta do PSOL-MG e assessora Jurídica Parlamentar dos mandatos de Áurea e Cida em BH: “Não há saída que não seja a revolução socialista. Não há atalhos. Ou nos organizamos em uma grande frente nacional com uma agenda positiva por mais direitos ou veremos o pouco que conquistamos virarem pó. Para essa frente ser vitoriosa, ela precisa assumir a pauta das mulheres como sendo sua. A tentativa se revolu-

ção sem as mulheres não passará da esquina”.


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nacional

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Rio é modelo para ataques e para a resistência Desde o final de 2015, o Estado do Rio de Janeiro vem sendo o centro das lutas no Brasil. O Pacote do Pezão, que vem sendo ensaiado desde 2015, se tornou a ponta de lança das medidas de austeridade do governo Temer, transformando o Rio no laboratório destas medidas. Os servidores, em contrapartida, também organizam sua resistência, através do Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais, o MUSPE. Fazem do Rio um dos modelos de resistência para outros Estados e Municípios. Raphael Mota e Luciano Barboza diretores do SEPE Pezão, desde 2015, quando a crise do Estado veio à tona, tenta passar a conta para os servidores. No final de 2015, ocorreu parcelamento de salários, o que voltou a ocorrer no final de 2016, junto com fechamento de emergências hospitalares, demissões em massa de terceirizados e outros inúmeros casos que refletem o sucateamento da máquina pública do Estado. Esse caos é fruto da lógica do PMDB de governar privilegiando os empreiteiros e as grandes empresas a partir das isenções fiscais e da prática nefasta de troca de favores. Não tardaram “pipocar” denúncias de corrupção: algumas delas levaram à prisão do ex-governador Sergio Cabral e na cassação da chapa do Pezão/Dornelles pelo TRE-RJ em primeira instância nesse início de 2017.

Estopim da crise O estopim da crise foi a queda dos recursos dos royalties, provocada pela drástica queda do preço do barril de petróleo – a conta do Estado não fechou mais! Pezão então optou por manter a política de

Inúmeras manifestações dos servidores do Rio de Janeiro conseguiram impedir a votação do pacote de maldades de Pezão. isenções e passar a conta para os servidores e a população. Isso levou os servidores estaduais a reorganizarem o MUSPE (Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais) e a Plenária dos Servidores. O MUSPE, hoje, toma a frente da mobilização e da unificação dos servidores estaduais. Um diferencial deste movimento dos servidores foi a presença dos setores da segurança pública, que incialmente optaram por realizar movimentos à parte do MUSPE e depois se integraram ao movimento unificado, apesar de algumas ressalvas e conflitos com partidos e o SEPE. Sem dúvida, a ocupação da ALERJ por algumas horas, realizada por eles, foi um catalizador e acirrou a luta no Estado. O novo capítulo do movimento da segurança foi a greve “branca” da Polícia Militar. Seguindo o modelo do Espírito Santo, familiares dos policiais bloquearam diversos batalhões. Mesmo não ten-

Pezão transformou Rio de Janeiro em um laborátorio de aplicação das políticas de austeridade de Temer.

do a mesma força que o movimento capixaba, essa mobilização contribuiu para deixar o governo Pezão ainda mais instável, ao ponto do mesmo pedir auxílio das forças armadas, apesar da mídia e do governo afirmarem que não era por causa da greve. Este movimento dos familiares tem suas peculiaridades, é chamado internamente de “PM de Sangue azul” ou “puro sangue”, rechaçando qualquer intervenção externa de partidos, sindicatos ou associações, inclusive a que representa os militares. Em nossa avaliação, apesar de ser progressista a iniciativa de uma greve em si, suas pautas não eram em si progressistas. O movimento abertamente criticava a desmilitarização da PM, reforçando o aparato repressor do Estado.

Acordo entre Temer e Pezão O ano de 2017 iniciou com o grande acordo entre Temer e Pezão. Na ALERJ, o governo fluminense aprovaria o aumento previdenciário dos servidores para 14% e venderia a CEDAE, uma das últimas empresas estatais do Rio e que ainda dava lucro. E, em troca, o governo Temer concederia R$ 3,5 bilhões em empréstimos. O valor é irrisório frente a folha de pagamento do Estado, que passa dos R$ 60 bilhões, ou da sua gigantesca dívida pública. Esta troca nada justa traduz na verdade que há outras intenções dos dois governos do PMDB. O que está em jogo é muito mais que a “saúde” financeira do Estado do Rio: é, na verdade, a implementação das medidas de austeridade propostas pelo Temer, que tem como seu carro chefe a Reforma da

Previdência encarnada no aumento da contribuição. O Rio é o grande laboratório destas reformas. A CEDAE então se tornou um verdadeiro “boi de piranha”: sua venda por um valor bem abaixo do avaliado em nada mudará a situação do Estado.

Primeiro passo para a greve geral A luta unificada contra os ataques de Pezão aos direitos dos servidores públicos completou mais de um ano gerando dezenas de adiamentos das votações na ALERJ, fruto das lutas semanais dos servidores do lado de fora da Assembleia. No último ano, houve um verdadeiro calendário de lutas no Rio de Janeiro e a unidade dos trabalhadores dos mais diversos segmentos no MUSPE manteve os nossos direitos de pé até o momento. No RJ, a luta trouxe vitórias defensivas (na defesa de direitos) e não vitórias ofensivas (como seriam conquistar aumentos salariais e melhores condições de trabalho). Porém, se não houvesse a luta unificada do MUSPE, esse pacote já teria sido aprovado e a situação dos servidores públicos estaduais estaria muito pior. O PMDB, mesmo tendo ampla maioria na ALERJ que reelegeu em fevereiro de 2017 Jorge Picciani presidente da casa legislativa pela sexta vez, não conseguiu ainda votar o pacote de maldades, por causa da força da luta dos servidores. A luta unificada no Rio de Janeiro deve servir como exemplo de luta para os demais Estados e municípios. Os ataques aos servidores virão de uma forma unificada por parte dos governos federal, estaduais

e municipais e, por isso, defendemos a unidade de todos os trabalhadores de diversos ramos profissionais e sindicatos diferentes. A unidade na luta para defender direitos trabalhistas é mais importante do que interesses pequenos e mesquinhos entre as diferentes direções sindicais. Os atos do dia 8 de março, Dia Internacional das Mulheres e do dia 15 de março, dia da greve geral da educação, devem contribuir para a construção da greve geral nacional dos trabalhadores. Vivemos um momento decisivo para a classe trabalhadora, pois os governos estão utilizando o discurso da crise econômica para justificar a retirada de direitos conquistados historicamente através das greves. Não vamos aceitar que os trabalhadores paguem pela crise econômica com a retirada de direitos trabalhistas e até mesmo com a perda do direito às greves, que podem ser julgadas ilegais pela justiça. Para barrar os ataques dos governos, só a luta unificada dos trabalhadores numa greve geral nacional! Só a luta muda a vida!

“O PMDB, mesmo tendo ampla maioria na ALERJ que reelegeu em fevereiro de 2017 Jorge Picciani presidente da casa legislativa pela sexta vez, não conseguiu ainda votar o pacote de maldades, por causa da força da luta dos servidores.”


nacional

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A luta contra a privatização da CEDAE no Rio de Janeiro Entrevista com sindicalista e trabalhador da Cedae, Ary Girota O projeto de lei 2.345/17, que autoriza a venda de 99,9% das ações da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE), como condição para viabilizar um empréstimo de R$ 3,5 bilhões do Governo Federal ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, como parte da solução para o estado de calamidade financeira, foi votado pelos deputados da ALERJ no dia 20 de fevereiro. Em uma seção extraordinária, cheia de atropelos, em tempo recorde de cinco minutos, o PL foi aprovado depois de vários adiamentos, frutos da mobilização contrária feita pelos servidores públicos estaduais. Os trabalhadores da CEDAE, juntamente com os representantes do MUSPE (Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais), foram impedidos de entrar nas galerias da ALERJ para acompanhar a votação. Do lado de fora da ALERJ, sofreram dura repressão da Força Nacional e do Exército, que foram enviados pelo governo Temer a pedido do governador Pezão, estabelecendo um verdadeiro Estado de Exceção. Em entrevista ao jornal Ofensiva Socialista, o sindicalista, trabalhador da CEDAE e militante da LSR Ary Girota, destaca as consequências da privatização Luciano Barboza Qual a relação da privatização da CEDAE com o impeachment do Pezão? Essa possível cassação da chapa Pezão/Dornelles, votada no TRE a partir de uma ação por iniciativa do deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) em 2014, confirma a ilegalidade e a imoralidade de um governo que dilapidou os cofres públicos para se manter no poder. Entramos também com o pedido de impeachment porque Pezão, baseado em uma manobra política, tenta mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal a seu favor, com a chancela e apoio do Supremo Tribunal Federal (STF), para que ele possa contrair novos empréstimos. Qual é a realidade da CEDAE hoje em termos de estrutura, trabalhadores e ativos? Nós somos uma empresa com 5.877 trabalhadores ativos e aproximadamente 3.500 trabalhadores terceirizados, atendemos 64 municípios do Estado do Rio de Janeiro. Tivemos um lucro aproximado de

Ary Girota agitando contra a privatização da CEDAE. R$ 400 milhões e entregamos dividendos na ordem de R$ 80 milhões em 2016. De 2011 até aqui, já tivemos R$1,5 bilhão de lucro. Ou seja, somos uma empresa superavitária e não utilizamos nenhum recurso do Tesouro e financiamos nossas obras. O que necessitamos é de mais atenção é no sentido de que as políticas públicas tenham um viés social. A CEDAE tem que cumprir esse papel com mais coerência e empenho. É óbvio que isso é de responsabilidade do governo do Estado, que interfere nos rumos da empresa. Para se ter uma ideia, parte das obras dos Jogos Olímpicos foi financiada com o dinheiro da CEDAE. Ainda não temos ideia de um valor patrimonial da empresa. A sensação que dá é que estamos pedindo um empréstimo de R$ 5 mil e entregando como garantia um carro de R$ 150 mil. Ou seja, quem comprar as ações da CEDAE por R$ 3,5 bilhões, estará comprando a expansão do sistema, comprando Guandú II, obra de ampliação e universalização da água na Baixada Fluminense, financiada pela Caixa Econômica Federal num valor aproximado de R$ 3,4 bilhões, e levando de gorjeta todo o sistema de produção e distribuição de águas instalado no Complexo do Guandú, complexo de Laranjal (Tratamento e distribuição de água) no Leste Fluminense, com milhares de quilômetros de redes de distribuição de águas que atendem um número aproximado de 12 milhões de pessoas. Na área de tratamento de esgotos, temos ainda as redes de coleta e tratamento de esgotos que compõem o sistema, com Estações de tratamento e Elevatórias de Esgotos com quilômetros de redes ins-

talados e operantes que sequer foram mencionados na avaliação patrimonial. A que se deve essa centralidade na privatização da CEDAE? A centralidade dessa privatização, ao que tudo indica, vem de um projeto de privatização do saneamento no Brasil. Um projeto do capital rentista, das empreiteiras não por acaso, parte delas, como a Carioca Engenharia e a Queiroz Galvão, compõem o grupo Águas do Brasil e estão envolvidas na Lava Jato. Estima-se que se tenha algo por volta de R$ 508 bilhões destinados ao saneamento no Brasil inteiro. As empreiteiras, portanto, estão de olho nesse dinheiro. As empreiteiras querem abocanhar esse dinheiro que será fornecido pelo Ministério das Cidades para o saneamento e, além disso, vão continuar a lucrar com a cobrança do serviço. Além disso, se eles conseguem entregar a CEDAE, qualquer empresa estadual será mais fácil de ser entregue.

cessão, esse grupo não tem obrigação de atender nas comunidades mais pobres e periféricas. E isso gera um conflito: a CEDAE não opera mais o sistema, mas é a responsável por levar o serviço a essas comunidades. Por outro lado, nós temos o exemplo de Niterói, que há 17 anos foi privatizada e presta um serviço razoável. Mas eles não falam, por exemplo, que a empresa não conseguiu acabar com o lançamento de esgotos nos rios da cidade. Até os rios que cortam Icaraí, área nobre da cidade, são valões de esgoto. Muita gente defende a tarifa mais barata cobrada pela empresa em Niterói (R$ 2,70/m3), mas o que eles não contam é que compram por R$ 1,51/m3 por uma imposição contratual que obriga a CEDAE a entregar a esse valor. Ou seja, o Estado subsidia uma empresa privada. Isso afeta os cofres públicos. No geral, a privatização, ao passar do tempo, precariza as relações de trabalho, há uma rotatividade muito grande de trabalhadores e, consequentemente, falta de memória do que foi realizado, precarização na manutenção e reparos. A busca do lucro vai fazer com que, ao longo do tempo, a qualidade caia e uma das coisas mais graves, a ausência de controle social que está prevista no marco nacional do saneamento (Lei 11445/2007). Numa empresa privada, esse controle vai ser limitado. Como empresa pública, a população pode e deve opinar sobre a empresa. Estamos perdendo um patrimônio do Estado do Rio de Janeiro. Por que os deputados votaram a favor da privatização da CEDAE? O Estado do Rio de Janeiro vai na contramão da história. No cená-

rio mundial, as empresas privadas têm perdido espaço nos outros continentes e nos outros países. Muitas cidades reestatizaram ou remuncipalizaram seus sistemas porque, ao longo dos vinte anos, o saneamento básico não combina com lucro econômico. Por isso, as cidades estão retomando os seus sistemas. O atendimento a população tem que prevalecer. E quando o objetivo é a busca por lucro, o serviço fica prejudicado e quem sofre é a população. Mais de 200 cidades em 37 países do mundo retomam o controle da água e do saneamento básico, porque isso não combina com lucro econômico. Grandes mobilização impulsionaram nessa direção, como a chamada Guerra da Água em 2000 em Cochabamba, na Bolívia, contra a privatização da água, ou agora na Irlanda onde um boicote barrou a introdução de taxas cobradas pela água. Pezão conseguiu os 41 votos para a venda da CEDAE na lógica de loteamento de cargos e de troca de favores com os deputados, o velho clientelismo politico. Muitos dos que receberam cargos recentemente são parentes dos deputados que mudaram de posição nos últimos dias da votação. E agora, o que fazer? Continuar as mobilizações para barrar a implementação do projeto de privatização da CEDAE. Durante o ano de 2014, a crise hídrica fez com que 1.265 municípios de 13 estados das regiões nordeste e sudeste decretassem situação de emergência - ou seja, o tema da água é vital nos próximos anos e não vamos deixar que empresas privadas controlem esse importante recurso natural. Continuaremos na luta!

Como isso pode prejudicar os serviços de fornecimento de água e esgotamento? Na medida que a privatização acontece, a busca pelo lucro vai impedir que as comunidades mais carentes, mais periféricas, tenham acesso ao saneamento básico. Nós temos uma prova aqui no RJ: a AP5, que vai de Deodoro até Pedra de Guaratiba, era uma área operada pela CEDAE e entregue à prefeitura do Rio em 2009. A prefeitura, por conseguinte, entregou à iniciativa privada. No contrato de con-

Pezão quer vender a lucrativa CEDAE por preço de banana.


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internacional

Ofensiva Socialista n°33 março-abril 2017

Uma estratégia socialista para derrotar Trump

Elevar a resistência construindo paralisações no 8 de março e 1º de Maio! Donald Trump e seu governo de bilionários e preconceituosos desencadearam uma explosão social diferente de qualquer outra já vista contra um presidente estadunidense ainda no início do seu mandato. Kshama Sawant vereadora por Seattle e membro da Socialist Alternative (seção do CIT nos Estados Unidos) A série de decretos reacionários vindos da Casa Branca foi recebida por contínuos protestos. A histórica Marcha das Mulheres em 21 de janeiro, talvez o maior dia de protestos na história dos EUA, foi logo seguida por dezenas de milhares de pessoas fechando aeroportos com desobediência civil em massa. Nas duas semanas seguintes, as ondas de protestos continuaram em todo o país. Os movimentos sociais já ganharam algumas vitórias, incluindo a reversão temporária da proibição de imigração, demonstrando que Trump e a classe de bilionários não estão imunes a uma revolta dos 99%. Também vimos processos estrategicamente importantes, como a paralisação dos taxistas de Nova Iorque, em solidariedade aos imigrantes, e os trabalhadores da Comcast cruzando os braços na Filadélfia, no começo de fevereiro. Embora sejam apenas pequenos passos iniciais, o gigante adormecido da classe trabalhadora estadunidense está se mexendo.

Ritmo acelerado O ritmo dos eventos tem sido impressionante. As chamadas para expandir a resistência cresceram. Greves e desobediência civil em larga escala estão sendo discutidas amplamente. Agora, as organizadoras da Marcha das Mulheres de janeiro, junto com Angela Davis, convocaram uma “greve de mulheres” no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, junto com um apelo global de socialistas e outras organizações. Houve também propostas para grandes protestos maciços no Dia da Terra (22 de abril, em defesa do meio ambiente) e uma discussão crescente sobre paralisações no 1º de Maio, Dia Internacional dos Trabalhadores. Ao mesmo tempo, tem-se aberto um debate na esquerda: qual é a

estratégia necessária para derrotar Trump, os elementos de extrema-direita incentivados por seus ataques e a agenda neoliberal mais ampla da classe dos bilionários? Como podemos nos mobilizar e onde devemos concentrar o enorme poder potencial dos movimentos sociais e da classe trabalhadora? Devemos ser claros sobre o terreno político: Trump não tem mandato e chefia um governo fraco. Ele entrou no cargo com índices de aprovação historicamente baixos, que caíram ainda mais desde o dia de sua posse. Nenhum presidente na história americana moderna teve uma rejeição da maioria da população ainda no primeiro ano no cargo, mas Trump conseguiu dentro de oito dias. Mas Trump e a classe dos bilionários só entendem uma coisa: o poder. Já está claro que este governo planeja atacar brutalmente um setor dos 99% após outro, e não será facilmente dissuadido de seus ataques xenófobos, misóginos e anti-trabalhadores.

Combatendo Trump e a classe dos bilionários Nossa tarefa é histórica: devemos barrar a agenda de Donald Trump, ou então tirá-lo do cargo. Como socialista, creio que devemos nos basear na mais ampla unidade de ação de todas as forças preparadas para lutar seriamente contra este governo perigoso. Isto deve incluir sindicatos, imigrantes, mulheres, ativistas do Black Lives Matter, LGBTQs, organizações ambientais, verdes, apoiadores de Bernie Sanders, socialistas e democratas progressistas. Também devemos apelar para atrair setores dos 99% que foram enganados a votar em Trump, mas com base firmemente antirracista e antissexista. Não podemos apenas reagir aos ataques de Trump. Precisamos apresentar demandas audaciosas que possam inspirar as pessoas com uma promessa de melhorias dramáticas, como aquelas popularizadas por Bernie Sanders, incluindo: um sistema de saúde pública universal; um salário mínimo federal de 15 dólares por hora; ensino superior gratuito; taxação dos ricos para financiar um programa de obras públicas para criar empregos e reconstruir a nossa infraestrutura, desenvolver energia verde e transporte público; exigir que “Black Lives Matter” (vidas negras importam)

e o fim do encarceramento racista em massa. O audacioso programa de Bernie entusiasmou milhões, especialmente os jovens, enquanto as propostas tímidas e amigáveis às corporações de Hillary não conseguiram mobilizá-los. Não há como evitar que haja grandes diferenças políticas de estratégia e interesses sociais neste movimento. Ao nos unirmos em ação, precisamos continuar tendo debates honestos e abertos sobre o caminho a seguir. Devemos basear-nos nas necessidades da luta contra Trump e a classe dos bilionários. Não podemos deixar a luta subordinada ou restrita aos limites do que a liderança corporativa do Partido Democrata permitirá. Os Democratas no congresso continuarão a ser postos à prova em termos de sua vontade de permanecer firme contra Trump. É um passo bem-vindo os Democratas, sob pressão dos movimentos sociais e de sua própria base, votarem unanimemente contra Betsy DeVos como Secretária de Educação, que só foi confirmada com um inédito voto de minerva do vice-presidente Mike Pence. No entanto, 14 democratas, incluindo Tim Kaine, que seria o vice de Hillary Clinton, haviam votado a favor de cada um dos ministros de Trump antes de DeVos. Como socialista, embora eu respeite os esforços sinceros de grupos como o Nossa Revolução para reformar os democratas, não acho que o Partido Democrata ofereça o tipo de liderança combativa, operária e baseada em movimentos que será necessária para enfrentar um impiedoso inimigo como Trump. Teremos de construir uma alternativa aos Republicanos de direita e aos Democratas de Wall Street: um novo partido de massa dos 99% que rejeite todas as doações corporativas. Devemos trabalhar para desenvolver um movimento poderoso, unificado e combativo, com os olhos abertos para os desafios que enfrentamos.

Aumentar a resistência! Barrar Trump exigirá um grande salto em nossa luta. Protestos simbólicos não serão suficientes. Precisamos continuar a romper a “normalidade”, como fizemos nos aeroportos, nos envolver na desobediência civil pacífica de massa e construir esse movimento rumo a

Kshama Sawant em protesto contra Trump em Seattle. greves por parte da classe trabalhadora em geral para paralisar setores estratégicos da economia e infraestrutura. A convocação desta semana pelos organizadores das Marcha das Mulheres para uma “Greve das Mulheres”, no dia 8 de março, representa uma grande oportunidade para o nosso movimento. Devemos aproveitar plenamente esse potencial e usá-lo para mobilizar as mais amplas forças possíveis para os protestos do Dia Internacional da Mulher, e também como um trampolim para greves e ação de massas por parte dos imigrantes e da classe trabalhadora em geral no 1º de Maio.

Nossa ferramenta mais poderosa Esta é a ferramenta mais poderosa que temos: os trabalhadores cruzarem os braços, fecharem as empresas e afetarem os lucros das corporações. A classe dos bilionários se assustou com o “caos” dos protestos nos aeroportos gerados pela proibição de entrada de muçulmanos e pressionou Trump. Isto é apenas um vislumbre do enorme poder potencial que a classe trabalhadora tem para interromper a agenda do governo. Se centenas de milhares de mulheres (e homens) tirarem licença médica, tirarem o dia de folga ou se organizarem em seu local de trabalho para sair mais cedo e participar de grandes protestos (como aconteceu na Polônia em outubro do ano passado) seria um grande avanço, mesmo se não houver greves. Enviaria uma mensagem poderosa para a classe dos bilionários: que uma continuidade do apoio à agenda de Trump poderá levar a protestos ainda maiores. Uma atividade no local de trabalho pode assumir diferentes formas. Uma greve geral nacional, ainda que a forma mais poderosa, não está posta nesse momento. Além dis-

so, os ativistas não devem deixar o trabalho se não houver apoio forte o suficiente para evitar que sejam demitidos, mas sim se juntar aos protestos imediatamente após o trabalho. Nossa força está em número e organização, e é por isso que o movimento dos trabalhadores e a esquerda devem assumir e construir com urgência uma ampla participação. Membros da base e líderes sindicais de esquerda poderiam propor resoluções em seus sindicatos, a partir de agora, a favor da greve no 8 de março e no 1º de maio. Essas propostas podem ajudar a criar um debate muito necessário no local de trabalho sobre a necessidade de uma luta pra valer contra as políticas anti-povo e de intolerância de Trump - políticas que colocam uma questão de vida ou morte ao movimento dos trabalhadores no país, particularmente com a proposta de reforma trabalhista.

Elevar a consciência de classe O debate sobre o que será realmente necessário para construir um amplo movimento grevista deve ser usado para elevar a consciência de classe. Todos os que estão decididos a resistir a Trump devem ajudar a elevar a resistência nas próximas semanas, incluindo organizar a desobediência civil pacífica em massa e paralisações de rodovias, aeroportos e outros locais chave no 8 de março e no 1° de Maio. Devemos reconhecer que não há um caminho simples para a vitória, que muitas vezes iremos nadar contra a corrente e sofrer retrocessos. Trump pode ser derrotado. Mas para isso devemos nos basear em uma luta ousada, na unidade na ação e no enorme poder social da classe trabalhadora estadunidense, com o potencial de paralisar o sistema capitalista. Não há tempo a perder!


internacional/cultura

Ofensiva Socialista n°33 março-abril 2017

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9ª Escola Latino Americana do CIT

Aprender com o passado para conquistar o futuro Cerca de 200 pessoas participaram da 9ª Escola Latino-Americana (ELA) do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT), que ocorreu entre os dias 24 a 29 de janeiro em Itapecerica da Serra. Isabel Keppler O evento dividiu-se em dois momentos. De 24 a 27 de janeiro, estiveram presentes membros do CIT, da Izquierda Revolucionaria e da Nova Organização Socialista (NOS). No dia 27 realizamos um grande ato público no centro de São Paulo para abrir a segunda etapa da ELA e discutir “Cem anos da Revolução Russa: Lições para a esquerda hoje”. O evento contou também com representantes de mais organizações como Insurgência, MAIS, NOS, APS, Terra Livre, MTST. Mais companheiros se somaram na segunda etapa, nos dias 28 e 29.

Quatro eixos Os quatro grandes eixos dessa Escola foram a situação mundial, América Latina, reorganização da esquerda e Revolução Russa, com

plenárias e grupos de discussão. O tema das opressões foi apresentado de forma transversal, nesses quatro eixos. A abertura discutindo Revolução Russa deu o tom que queremos para esse centenário da revolução de outubro: reflexões e discussões profundas não pelo saudosismo de um momento histórico, não apenas para relembrar o que esse evento significou para a história mas, mais que isso, aproveitar esse exemplo para tirar grandes lições para a esquerda hoje e traçar perspectivas para uma alternativa socialista na atual conjuntura.

Crescente instabilidade Sobre situação mundial, os militantes debateram 2016 como um ano de choques e rebeliões e a perspectiva de 2017 com mais ataques que exigirão muito das organizações de esquerda e movimentos sociais. Apesar de processos de contrarrevolução preventiva em diversos países, observa-se uma conjuntura polarizada em que há espaço para uma alternativa de esquerda, socialista mas na sua ausência, a tendência é a direita ocupar esse espaço com figuras como

O

filme de Ken Loach, “Eu, Daniel Blake” é uma obra marcante não por ser uma história excepcional de um único personagem, mas justamente por conseguir retratar, de forma extremamente sensível, algo tão genérico e cotidiano como a realidade dos trabalhadores. O filme se passa na Inglaterra, mas muitos elementos refletem a situação da classe trabalhadora em outros países da Europa, e mesmo no Brasil. Isabel Keppler Daniel Blake é um sujeito simples, que trabalhou a vida toda com carpintaria. Viúvo, enfrenta uma verdadeira saga para acessar o “benefício” da previdência social, após receber orientações médicas para se afastar do trabalho depois de sofrer um ataque cardíaco. Outros personagens são a jovem Katie, mãe sozinha com dois filhos e desempregada, cujo benefício também lhe é negado por um problema burocrático; e China, vizinho de Daniel, negro, trabalhador de um depósito e que vê a possibilidade de melhorar de vida através do trabalho informal, vendendo tênis produzidos na Ásia e extraviados na fábrica. A partir do sofrimento de cada personagem diante de um Estado

após os processos revolucionários inacabados de 2011. As ameaças e perspectivas reais de mais terror seguem, sendo urgente e necessário um movimento de massas, construído pelos trabalhadores de forma independente. Na América Latina, entramos em uma nova fase da crise econômica na medida em que a China é atingida e, por consequência, países da América Latina. A crise política dos modelos bolivarianos e centro esquerda reforçaram esses elementos de dependência com a economia chinesa e a sua fragilidade.

Miguel Campos, da Izquierda Revolucionaria, que está em processo de unificação com o CIT, falando na ELA. Trump. A eleição de Trump deixa em aberto muitos processos mundiais, sobretudo em uma conjuntura de declínio econômico e militar nos Estados Unidos, que deixa de ser “onipotência” abrindo espaço para China e da Rússia. Já no Oriente Médio, vivencia-se um processo de fato contrarrevolucionário, de violências, guerras e ditaduras

Reorganização da esquerda Em relação ao processo de reorganização da esquerda, a participação da Izquierda Revolucionaria, cujo processo de unificação com o Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores encontra-se em um estágio avançado, enriqueceu bastante as discussões na Escola Latino Americana, apresentando boas perspectivas dessa unificação na construção da Internacional. Também a presença da NOS contribuiu para materialmente mostrar a disposição das organizações na

Daniel Blake, um homem de 2017 que vira as costas para suas misérias, o filme desperta no espectador identificação e empatia – sobretudo neste atual momento de perda de direitos e imensos cortes de verbas em serviços públicos. Isso adquire ainda mais intensidade em um país como a Grã-Bretanha, que historicamente se destacou na construção do Estado de Bem Estar Social e, hoje, enfrenta uma crise brutal, que se reflete em uma evidente piora na vida das pessoas. A falta de oportunidade para a juventude, em especial das mulheres, se encontra na figura de Katie, cuja perspectiva de estudo e trabalho é derrocada pelas condições objetivas, que a empurram para uma angustiante situação de fome e de prostituição.

A

pesar do filme ter logo no título a primeira pessoa do singular e um nome próprio, a presença dessas três personagens e a forma como suas individualidades, seus anseios, suas indignações são retratadas dão ao filme um caráter de classe. Isso em um contexto em que, diante da complexidade do mundo do trabalho, por vezes nos passam despercebido as nos-

sas semelhanças. Se hoje esse caráter de classe não se manifesta de forma tão forte pelo modo de trabalho comum (rotina, uniforme, jornada de trabalho), como foi nas grandes fábricas inglesas da Revolução Industrial, por certo as dificuldades de sobrevivência permitem nos enxergarmos enquanto pertencentes ao mesmo grupo. Não podemos ignorar o dado apresentado pela Oxfam, no início desse ano, em que consta que 1% da população mais rica detém a mesma riqueza que os 99% das pessoas.

E

então é preciso trazer a reflexão sobre o papel do Estado diante desse cenário. A burocracia, elemento forte do filme, aparece como um obstáculo para a garantia de acessos aos direitos sociais. A lógica de funcionamento parte da compreensão de que o trabalhador mente, é desonesto e quer se aproveitar do dinheiro público e, portanto, o Estado deve exigir uma série de documentos e aplicar procedimentos para checar se esse trabalhador realmente precisa e tem direito aos “benefí-

cios”. Um cenário que não é diferente do que os trabalhadores enfrentam nas filas do INSS diariamente aqui no Brasil.

A

transferência da responsabilidade para empresas privadas, mediante terceirização dos serviços públicos, é retratada de forma bastante ilustrativa quando o serviço que atesta se Daniel Blake é digno ou não de benefício é feito via telefone, através de um questionário genérico aplicado por uma pessoa que se apresenta como “profissional da área da saúde”, sem especificar formação, de uma empresa dos Estados Unidos. Por isso, é preciso ir além e entender que tal burocracia não se trata de um mau gerenciamento do Estado, mas sim um modo de operação justamente para não funcionar – e estar o mais ausente possível na forma de direitos – para os 99%. A perversidade de um Estado que privilegia e protege os ricos, o 1%, e desampara e nega direitos a uma maioria, se escondendo através da terceirização e de uma burocracia lenta, morosa e burra. “Eu, Daniel Blake” é lançado

importante construção das frentes de esquerda com revolucionários em diversos Estados do Brasil, algo mais do que necessário na atual conjuntura. A discussão sobre opressões trouxe experiências da Revolução Russa, da atual conjuntura sobre a luta contra as opressões e, em especial, o protagonismo das mulheres em lutas políticas importantes como o grande ato das “Mulheres contra Trump” que marcou o inicio de 2017 nos Estados Unidos. No domingo, último dia da escola, também Dia da Visibilidade das Transexuais e Travestis, dedicou-se um espaço da programação para o tema. A participação, pela primeira vez, proporcional de homens e mulheres (50%) na ELA foi um resultado concreto e material de um trabalho sério que o CIT na formação de quadros femininos. A 9ª ELA do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores, para além de servir como uma injeção de ânimo a todas e todos participantes, afim de preparar para intervir nas lutas reais no Brasil, América Latina e no mundo, também mostrou o crescimento quantitativo e qualitativo da nossa Internacional. em uma conjuntura de inúmeros ataques que fazem pesar sob nossos ombros a sensação de estarmos sendo derrotados. Mas há uma tensão presente no filme que não pode ser ignorada, que se relaciona com a consciência nos países da Europa Ocidental, Estados Unidos e América Latina: uma distopia cotidiana com potenciais pequenos e grandes rompantes. Por um lado, certa anestesia diante de tanto sofrimento, mas por outro uma indignação que nos inquieta, ainda que de forma sutil, solitária e silenciosa. A potência da classe trabalhadora no filme se manifesta através dos laços de solidariedade, sobretudo entre Daniel e Katie. A força em construir relações humanas em tempos de profundo embrutecimento, e tais relações construídas como forma de resistir e enfrentar a violência cotidiana do Estado.

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o final do filme, quando Daniel Blake escreve no muro, ainda que seja um gesto tão sutil, pequeno e insignificante diante do gigante capitalista, demonstra ali o vulcão adormecido que é a força da classe trabalhadora. Ainda que de forma incipiente, mostra que não estamos prontos para nos render. E mesmo na condição de indivíduos mortais temos nossas vidas interrompidas por vezes cedo demais e de forma injusta, enquanto classe a resistência permanecerá viva, ativa e pulsante.


Preço: R$ 2,00 • Solidário: R$ 4,00

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N° 33 • março-abril 2017

Educação sob ataque É preciso unificar a luta dos estudantes, professores e funcionários As ocupações das escolas secundaristas em São Paulo em 2015, para barrar o projeto de fechamento de escolas do governo Alckmin, passou de um movimento local e se tornou nacional: no ano seguinte, mobilizou os estudantes contra o congelamento da verba nacional destinada aos serviços públicos para população. Maria Clara Ferreira As mais de mil ocupações contra a PEC 55 e a reforma do Ensino Médio em 2016, com início nas escolas do Paraná e que alcançaram as universidades federais de todo o país, deram o tom de uma importante mobilização nacional. A luta contra a PEC 55, que reunia algumas categorias dos servidores públicos, da saúde e, principalmente, da educação, tomou mais fôlego com a adesão dos estudantes. A juventude debateu com a população sobre esta medida e sobre os primeiros meses do governo Temer - um governo que já tinha menos de 10% de popularidade em seus primeiros meses, tendo ainda pior resultado entre os jovens, segundo pesquisa do IBOPE.

Juventude impulsionando pautas nacionais Isso mostrou que existe uma juventude capaz de pautar as lutas nacionais e de agir em unidade com outras categorias. As mobilizações unificadas com os sindicatos dos docentes, como ANDES e SEPE, garantiram um ato com dezenas de milhares de pessoas em Brasília no dia 13 de dezembro, data da votação da PEC. Foi uma manifestação duramente reprimida pela Polícia Militar e que apresentou várias limitações para a construção da unidade, mas que marcou a necessidade de uma forte luta contra do governo Temer. A PEC 55 foi aprovada e os efeitos da crise pioraram na educação. O governo Temer anunciou uma redução de 45% dos investimentos para as universidades federais para este ano, significando R$ 350 milhões a menos para 63 instituições. Nos primeiros meses de 2017, a juventude se deparou também com

uma piora na crise das universidades estaduais, que terão dificuldades em manter o seu funcionamento básico, como a UERN, UERJ e USP. Isso é resultado dos Estados também aplicarem cortes na educação.

Universidades estaduais em crise Em 2016 a folha de pagamento da USP correspondeu a 105% do que foi repassado pelo governo. O novo plano do governo quer impor um limite de 80% para a folha de pagamento e alcançar isso em cinco anos. Cada ano a universidade terá que tomar medidas para reduzir a proporção da folha de pagamento em 5 pontos porcentuais. Isso vai além de congelar reajustes salariais e novas contratações – é receita para demissões e brutais cortes na educação. O repasse dado à UERJ foi insuficiente para iniciar as aulas dos seus mais de 35 mil alunos, criando o risco da universidade fechar. A instituição já soma uma dívida de R$ 360 milhões e teve o início das aulas deste ano adiado pela quinta vez. A crise da UERN, no estado do Rio Grande do Norte, levou alunos, professores e funcionários a fazer uma forte luta em defesa da instituição que estava ameaçada de ser privatizada e acusada pelo TJRN de ser a causa da crise orçamentária do estado. Há um ano, os servidores da universidade não recebem seus salários em dia. Além disso, as salas sucateadas, quedas de energia, cortes nos telefones expõem a ausência de investimento para a manutenção mínima dos cinco campi.

Fechamento de salas Os professores da rede estadual de São Paulo seguem desde 2014 sem reajuste salarial e não haverá mudança desse quadro sem uma mobilização da categoria. Mesmo com a grande luta das ocupações em 2015, que barrou o projeto que fecharia escolas, o governo estadual fechou mais de 2.800 salas de aula ao mesmo tempo em que houve um aumento de 70 mil alunos matriculados. No dia 8 de março, haverá plenárias da educação por todo país,

principalmente contra a reforma da previdência, que afetará uma ampla camada de professores – em especial as mulheres, que terão mais dificuldades de se aposentar se aprovada a reforma. Há também indica-

tivo de uma greve nacional da educação a partir do dia 15 de março, convocada pela CNTE. É preciso unificar trabalhadores com estudantes secundaristas e universitários para as paralisa-

ções e greves e buscar a mais ampla unidade. Essas mobilizações também devem considerar que a juventude tem uma taxa de desemprego duas vezes maior que o restante da população.


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