Treino em Futebol

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TREINO em FUTEBOL

O exercício de treino como meio de comunicar uma forma de jogar
Nesta edição, 97 exercícios de treino + 89 online
Vítor Gouveia

TREINO EM FUTEBOL

O exercício de treino como meio de comunicar

uma forma de jogar

Lidel – edições técnicas, lda. www.lidel.pt
Autor
VÍTOR GOUVEIA
© Lidel – Edições Técnicas, Lda.
AUTOR V PREFÁCIO VII Luís Castro NOTA INTRODUTÓRIA IX SIGLAS E SÍMBOLOS XIII PARTE I – CONTEXTUALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE TREINO 1. A SEMANA ENQUANTO UNIDADE ESTRUTURAL DE PLANEAMENTO 2 1. Conteúdos a desenvolver na semana 6 1. Organização da semana 7 2. A SESSÃO DE TREINO 22 2. Planeamento ........................................................................................................................... 23 2. Objetivos 29 2. Partes constituintes da sessão de treino 33 2. Organização ............................................................................................................................ 36 3. A DEFINIÇÃO DE COMPORTAMENTOS NO MODELO DE TREINO 3. E NO MODELO DE JOGO 41 2. Modelo de jogo 41 2. Modelo de treino 44 2. Ataque 48 2. Transição ataque-defesa 58 2. Defesa 60 2. Transição defesa-ataque 65 4. O EXERCÍCIO DE TREINO 68 2. Comportamentos 69 2. Especificidade .......................................................................................................................... 70 2. Motivação 71 2. Espaço 71 2. Apoios e jokers ........................................................................................................................ 72
ÍNDICE
© Lidel – Edições Técnicas, Lda. | Treino em futebol IV 2. Progressões e variantes 73 2. O que queremos do treino? O que esperamos obter?...................................................... 75 5. O MODELO DE CLASSIFICAÇÃO DOS EXERCÍCIOS 78 2. Família ...................................................................................................................................... 78 2. Tipologia 81 2. Objetivo 92 2. Relação numérica ................................................................................................................... 93 2. Nota 95
II – APRESENTAÇÃO DE EXERCÍCIOS DE TREINO INTRODUÇÃO 98 6. GENÉRICOS 100 6. Lúdico 100 7. POSICIONAIS 103 7. Meiinho 103 7. Jogo de posição 113 8. DE DECISÃO CONDICIONADA 129 8. Circuito 129 8. Individual 132 8. Situação de bola parada ........................................................................................................ 139 8. Circulação tática 142 8. Episódico 156 9. DECISIONAIS 165 8. Jogo reduzido 165 8. Sucessivo 183 8. Manutenção da posse de bola 194 8. Situação de jogo 203 10. CONSIDERAÇÕES FINAIS 229 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 231 POSFÁCIO 233 Hugo Sarmento
PARTE

AUTOR

Vítor Gouveia

Natural de Miranda do Corvo. Licenciado em Ciências do Desporto e Educação Física pela Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra (FCDEFUC). Mestre em Treino de Alto Rendimento pela Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade Técnica de Lisboa. Título de Especialista em Futebol pelo Politécnico de Leiria. Treinador UEFA PRO. Foi Treinador-Adjunto no Anadia Futebol Clube e na Académica OAF (sub-23). Foi Treinador Principal no Clube Condeixa, Sourense e Académica OAF (sub-17 e sub-23). Colaborador com várias instituições ligadas à formação de treinador. Autor e coautor de diversas publicações técnicas e científicas. Atualmente, Docente de Futebol na Universidade de Coimbra e no Politécnico de Leiria em cursos de Licenciatura e Mestrado, em disciplinas de futebol. É, ainda, Treinador-Adjunto da Seleção Nacional AA de Angola.

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PREFÁCIO

Vítor Gouveia apresenta uma abordagem de temas de extrema importância para o treinador de futebol, para os que têm em perspetiva essa carreira profissional e para a generalidade dos que se interessam e têm paixão por esta modalidade. Os temas apelam à nossa atenção. Sugerem uma reflexão permanente com os olhos postos na execução diária das nossas tarefas. Sabemos o quão importante é o planeamento em função de um modelo de jogo próprio e do contexto que ele vai coabitar.

Falar de planeamento é falar de projetar no futuro tudo aquilo que queremos ver acontecer num determinado período de tempo; temos um conjunto de intenções ao longo de uma época desportiva que queremos ver concretizadas. Sabemos que a densidade – o número de jogos, seja ele maior ou menor – vai determinar o nosso planeamento anual, mensal, semanal e diário. E apesar desta multiplicidade de planos, que se aplicam a tempos mais alongados ou mais curtos, há um período, uma unidade de tempo que, no futebol, prevalece entre as restantes: é o plano semanal aquele que absorve grande parte da nossa atenção; é nele que, sobretudo, nos concentramos.

No planeamento da denominada “semana de trabalho”, o número de jogos interfere de forma decisiva: a semana de três jogos é radicalmente diferente em termos de conteúdos da que contém, unicamente, os habituais dois jogos. As unidades de treino com conteúdos de recuperação/aquisição dominam as semanas de três jogos, enquanto que as de dois jogos se enquadram nas denominadas “semanas padrão”. Estas não nos colocam tantas dificuldades; estão já, de algum modo, convencionadas, estabilizadas na nossa cabeça, embora contenham a complexidade associada a todas as ideias dos momentos ofensivo e defensivo, transições e esquemas táticos, que se querem ver refletidas em treino.

As semanas de trabalho, sejam de três, dois, um ou nenhum jogo, têm o que para mim é o mais apaixonante no futebol (para além da suprema paixão que é o jogo): o exercício. A organização semanal, de um modo geral, e de cada um dos seus dias, em particular, carateriza-se por um conjunto de exercícios que são determinados pelos objetivos que se querem atingir. São propostas tarefas aos nossos jogadores. Estas tarefas são elaboradas em função das nossas ideias, do nosso modelo de jogo, pensado em paralelo com questões colocadas quer pelo jogo passado, quer por aquele que se aproxima. É por um lado essa experiência do passado e, por outro, a perspetiva do futuro, que definem os objetivos

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– objetivos submetidos a uma dinâmica de pensamento que hierarquiza prioridades e consequentemente determina exercícios.

Para atingirmos o que pretendemos, temos dinâmicas de trabalho instituídas que nos levam à elaboração do plano diário de treino e à sua execução. Essas dinâmicas incluem a reunião técnica pré-treino e pós-treino, os dias em que são observados e analisados os vídeos do adversário e os da própria equipa, a colocação estratégica do treinador e dos seus assistentes nas áreas de treino, o pensamento sobre a comunicação do treinador e o espaço onde cada uma das intervenções tem lugar.

Há um conjunto de departamentos que são decisivos no nosso dia a dia: o Departamento de Saúde, de Logística, de Scouting, de Análise de Adversários, de Comunicação, de Psicologia, de Tendências de Jogo, entre outros. Todos têm um papel importante, mais ou menos relevante em função dos momentos do dia e da época desportiva.

As temáticas deste livro são abordadas de forma bastante clara, conduzindo-nos a uma profunda reflexão sobre as exigências do trabalho das equipas de futebol. E se o papel de leitor coincidir com o de treinador, como no meu caso, o livro ajudar-nos-á a ponderar e a avaliar, continuamente, os contextos em que estamos inseridos, tornando-nos atentos ao modo como a decisão diária, e a repetição, determinam o todo.

O livro revela uma atenção especial, um olhar agudo sobre os exercícios de treino e os conteúdos a eles associados, apresentando um conjunto de sugestões que poderão ser adotadas e adequadas em função do que se quer trabalhar na equipa, dos objetivos que se pretendem alcançar.

O futebol será sempre um mundo entusiasmante, de desafios permanentes à imaginação, à capacidade organizativa e à liderança dos treinadores. Este livro pode ser muito encorajador para os enfrentar.

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VIII
Treino em futebol

NOTA INTRODUTÓRIA

O treino em futebol, até alguns anos atrás, era relativamente reservado, com os treinadores a fechar-se muito sobre si e sobre os seus processos, sobre as ideias que davam corpo à forma de jogar da equipa e os meios utilizados para o atingir. Lembramo-nos de um professor de faculdade, de uma modalidade individual, que apelidava o treino em metodologia de “bruxaria”, pois, além de esta se apoiar em muitas crenças e superstições, ninguém sabia muito bem o que se fazia durante a semana e a metodologia não seria algo muito claro. Claro que o rigor e o cuidado na preparação estavam presentes, mas o treino em futebol era sobretudo um meio muito blindado ao exterior.

Esta perspetiva mudou, com os treinadores a dedicar cada vez mais atenção à preparação das suas equipas, usando diferentes metodologias, mas tendo em comum a repetição de processos bem definidos. Os elementos nas equipas técnicas com diferentes perspetivas e backgrounds debateram constantemente, no sentido de garantir que as equipas estão o mais bem preparadas possível. Por outro lado, há cada vez mais abertura à investigação e à interação entre treinadores, seja em formações, seja em momentos em que estes “abrem a porta” a outras pessoas (treinadores, estudantes, escritores, investigadores, psicólogos, etc.), sem pudor em mostrar os pormenores da sua metodologia de treino. Acreditamos que essa partilha é importante, porque, por um lado, possibilita que outros vejam como equipas profissionais trabalham, sendo um exemplo importante para quem um dia queira trabalhar num patamar idêntico; por outro, mostra a convicção generalizada do treinador de que o seu trabalho é bem executado.

Este livro é escrito por treinadores e destinado a treinadores, não com a pretensão de ensinar o que quer que seja, mas com o intuito de partilhar! E esta partilha é encarada como um exercício de humildade, que nos faz querer ser mais competentes, recebendo críticas que nos levem a questionar cada passo que damos, na certeza de que, para poder andar, teremos momentos em que vamos cambalear, outros em que vamos tropeçar e, seguramente, alturas em que iremos cair. Mas a recetividade a aprender, a ouvir fará sempre parte da nossa forma de encarar o treino, ajudar-nos-á a erguer nos momentos difíceis, dando-nos a capacidade de encontrar soluções que se possam ajustar melhor às realidades com que vamos deparando.

O processo de treino é fascinante, complexo, no sentido em que é trabalhoso e temos de nos decidir por um caminho, face às diversas opções possíveis. Além

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do mais, implica repetir até à exaustão o processo de pensar, preparar, analisar, planear, aplicar, corrigir, alterar, competir, avaliar… na procura de uma perfeição que sabemos não existir. Tudo isto sem perder o foco de que o Jogo, a sua realidade, a lógica interna e comportamental devem estar sempre presentes.

Julgamos que esta procura incessante de ser melhor é inerente à condição de treinador de futebol, sabendo que nos movemos num meio altamente competitivo, em que não queremos ficar para trás.

Na nossa ótica, independentemente da forma como possa ser avaliado o sucesso dos treinadores, trabalhamos todos os dias no sentido de estar mais bem preparados, partindo essa exigência de nós próprios. Estamos convictos de que só desse modo é possível estar com ambição no futebol. Temos de ser nós a criar o nosso lugar, através de uma crítica constante em relação a tudo o que fazemos, com uma grande sagacidade na busca de informação, mas, ao mesmo tempo, não perdendo o critério na sua filtragem. As oportunidades não nos aparecem de “mão beijada”, temos de correr atrás delas, e, quando aparecem, o único caminho a tomar é mostrar que temos competência e podemos ajudar a fazer a diferença dentro de uma estrutura.

Com essa necessidade em mente, precisamos de primar pela diferença. Isso não quer dizer que nos consideremos melhores do que os outros. Significa, isso sim, que estamos dispostos a trabalhar mais do que todos, com ética, sem atropelos e com o máximo respeito por todos e pelo Jogo que tanto admiramos e de que fazemos parte.

Este livro é um produto desse trabalho de reflexão, influenciado pela autocrítica e pela crítica construtiva, que nos faz pensar sobre se estamos a tomar as melhores decisões que podemos. Temos as nossas convicções, as nossas ideias consolidadas1, mas mantemos o princípio de que é necessário não nos fecharmos sobre elas e estarmos recetivos ao mundo que nos rodeia. Atualmente, o mais difícil é termos ideias próprias, coerentes e consistentes. É um chavão dizer que “jogamos com as ideias”, mas acreditamos que podemos desenvolver as nossas próprias ideias, fruto de uma análise constante e das influências que temos. Claro que também podemos adaptá-las em função da nossa realidade, ao invés de copiar, dando-lhes o nosso cunho pessoal e sujeitando-as ao escrutínio da reflexão. Devemos ter a humildade de as estruturar, fundamentar e questionar, estudando e analisando os contributos que vão surgindo de treinadores e

1 Atenção, “consolidadas” não quer dizer que estejam cristalizadas. Usamos a palavra “consolidação” no sentido de as ideias serem firmes, o que é diferente de se manterem sempre no mesmo estado (cristalização).

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entendedores, e ouvindo (observando) aqueles cuja opinião mais importa: os nossos jogadores.

Depois, vem a partilha, que na nossa perspetiva é excelente. Permite, por um lado, verificar se conseguimos comunicar a nossa mensagem de forma inteligível, e, por outro, confrontar as nossas ideias com a crítica, voltando a refletir sobre elas e a mergulhar neste processo sem fim, neste círculo vicioso que nos leva a questionar continuamente todas as opções.

Acreditamos que a metodologia pode ser vista como o conjunto de ferramentas que se encontram ao alcance do treinador para potenciar o rendimento individual e coletivo nos diferentes fatores de rendimento e resolver os problemas com os quais se depara a cada passo do processo de treino. Este livro encontra-se estruturado da seguinte forma: começamos por abordar a organização da semana de treino, enquanto unidade estrutural de planeamento (microstruturação2). Esta semana pode ser ajustada em função do momento da época, da carga competitiva e do tempo compreendido entre dois jogos. De seguida, entramos na sessão de treino, abordando alguns aspetos extremamente práticos, desde o planeamento à preparação e implementação. A preparação da sessão de treino deve obedecer a um racional, e, nessa medida, abordamos o modelo de jogo, avançando um conjunto de comportamentos (ou princípios de jogo), a título ilustrativo, para posteriormente entrarmos na parte fundamental deste livro: o exercício de treino. Aqui, tecemos algumas considerações sobre a sua construção, apresentamos uma forma de classificação dos vários exercícios que podemos utilizar e, por último, avançamos alguns exercícios para concretizar as nossas ideias através de vários exemplos.

Esperamos que seja útil para cada um de vós, com a certeza de que o conhecimento tanto nasce na convergência de ideias, como, muitas vezes de forma até mais profícua, surge da divergência de perspetivas e ideias!

Vítor Gouveia (autor)
Nota introdutória | XI ©
2 Ver Owen et al. (2017).
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1. A SEMANA ENQUANTO UNIDADE ESTRUTURAL DE PLANEAMENTO

Existem diversas metodologias para desenvolver as competências de uma equipa de futebol, tornando‑a mais competitiva. Julgamos que a pretensão de colocar a metodologia à frente de tudo não faz sentido. Isto é, distingui‑la como principal fator de sucesso de uma equipa, quando nos identificamos com essa forma de intervenção – ou fazer o oposto, atribuindo culpas a outra metodologia, da qual não somos apologistas, perante o insucesso de uma equipa que a utiliza.

A metodologia serve o propósito de nos permitir selecionar ferramentas efe tivas para comunicar as ideias aos jogadores, potenciando o rendimento indivi dual e coletivo ao seguir e respeitar um conjunto de regras e procedimentos que salvaguardem as estruturas biológicas dos atletas. É um meio para alcançarmos o sucesso1 e não um fim em si mesma.

Acreditamos que a metodologia pode ser adaptada a situações distintas com as quais nos vamos deparando ao longo da carreira desportiva, em função de inúmeros constrangimentos (culturais, desportivos, climatéricos), não sendo estanque e estando constantemente aberta à crítica, podendo ainda ser cons truída com contributos de diferentes correntes metodológicas. Contudo, estas atualizações não devem acontecer por uma questão de moda ou por qualquer outro aspeto acessório, mas porque trazem mais‑valia ao nosso processo de trei no, mantendo uma base metodológica robusta com opções fundamentadas.

O que procuramos no treino em futebol é desenvolver uma identidade coletiva2, assente numa determinada forma de jogar, priorizando a comunicação das ideias através dos comportamentos táticos que pretendemos implementar a

1 O sucesso pode ser medido de várias formas, em função da realidade competitiva em que estamos inseridos. Pode tratar‑se de alcançar determinados objetivos desportivos, acrescentar valor monetário a uma equipa ou introduzir conceitos a uma equipa de formação, contribuindo para o desenvolvimento do jovem praticante.

2 Dentro desta identidade, tem de haver espaço para o desenvolvimento de competências indi viduais, dotando o jogador de mais recursos técnico‑táticos, tornando‑o mais competente na resolu ção de problemas no jogo e, consequentemente, contribuindo para a melhoria da equipa.

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Tabela 1.1. | Exemplo dos comportamentos a abordar numa semana de treino com jogos ao domingo. Aqui, entra o jogo anterior sempre numa lógica de correção dos aspetos mais negativos e de reforço dos comportamentos pretendidos pelo treinador.

Domingo

Sábado (1 dia)

Jogo

Tempo de reação

6.ª-feira (2 dias)

5.ª-feira (3 dias)

4.ª-feira (4 dias)

3.ª-feira (5 dias)

2.ª-feira (6 dias)

Domingo

Velocidade específica

Resistência específica

Força espe ‑ cífica

Descanso

Regenerativa/ /Resistência específica

Individual

Sectorial, indi vidual, grupal

Bolas paradas

Bolas paradas (adversário)

Complemen tares, lúdicos, meiinhos, bolas paradas, episódicos

Complemen tares, meiinhos, circulações táticas, jogos reduzidos, bolas paradas, episódicos

Coletivo

Sectorial, indi vidual, grupal

Adversário

Último jogo

Jogos posicio nais, suces sivos, MPB, situações de jogo

Complemen tares, meiinhos com transição de espaços, jo gos reduzidos

Sectorial, individual

Meiinhos, jogos de posição, jogos reduzidos

Jogo

Dominante

Conteúdos

Dimensão dentro da equipa

Adaptação (vertente estratégica)

Análise de vídeo com jogadores

Exercícios-tipo

Intensidade  –Baixo;  –Alto;  –Muito baixo;  –Muito alto;  –Ausente;  –Presente.

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    
    
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Partes constituintes da sessão de treino

O treino deve ser composto por várias partes que tenham algumas diferenças en tre si, obedecendo a princípios fisiológicos (por exemplo, aquecimento e retorno à calma, em que o organismo passa do estado de repouso ao de atividade e, de pois deste último, ao repouso novamente) e também pedagógicos, direcionando o foco dos nossos jogadores para os comportamentos pretendidos, com vista a predispor os atletas para a aquisição de conteúdos ao longo do treino.

Verticais e rápidos (ataque e TDA)

Espaço para ligações interiores

Espaço entrelinhas

TDA equipa muito alongada

Comportamentos do DL

Ocupação defensiva do 2.º porte

Dificuldades de ligação da 1.ª com a 2.ª fase

Muitos jogadores em apoio (equipa partida)

Ligação da construção com a criação

Pouco critério na criação

Equipa muito alongada e pouco pressionante

Desorganização da linha defensiva

Figura 2.3. | Exemplo de comportamentos observados na própria equipa (cinza claro) e no adversário (cinza escuro) que poderão ser trabalhados ao longo da semana, em função do binómio identidade/adaptação. A partir daqui, podemos estabelecer objetivos para a semana.

Preferimos uma estrutura tripartida, adaptada a partir de vários modelos de estruturação das aulas de educação física, dividindo a sessão de treino em três partes, que diferem entre si pelos objetivos, pelo tipo de tarefas que as constitui (em função do grau de prontidão dos jogadores), mas que se sucedem de forma integrada e não devendo ser encaradas de forma estanque8.

Parte inicial

A parte inicial deve contemplar uma breve introdução dos objetivos do treino e a explicação dos exercícios da parte principal, para direcionar o foco dos joga

8 Ver, por exemplo, Castelo (2013), que propõe um modelo que divide a sessão de treino em futebol em quatro partes constituintes. O programa Grassroots da FIFA também propõe uma divisão em partes no treino com crianças e jovens.

A sessão de treino | 33 © Lidel – Edições Técnicas, Lda.

portador rapidamente em resposta à circulação do adversário, naturalmente temos de contemplar no nosso modelo de treino situações que promovam este tipo de ações, através da criação de exercícios‑tipo que depois poderão ser desenvolvidos com variantes e/ou progressões. Esses comportamentos devem ser hierarquiza dos e introduzidos ao longo da época em função de várias condicionantes, como, por exemplo, das aquisições prévias, do sucesso ou insucesso até ao momento na época ou mesmo da preparação para um jogo contra um adversário em que o treinador considere que a introdução de determinados princípios seja benéfica.

Quadro 3.1. | Resumo de algumas considerações que contemplamos na criação do modelo de treino.

• Trabalhar aspetos de organização defensiva e ofensiva

Potenciar a ideia coletiva a cada jogo, aproveitan do as características e capacidades dos joga dores

•  Garantir equilíbrio em todos os momentos de jogo como pla taforma para desenvolver comportamentos

•  Criar contextos que possibilitem o desenvolvimento de um modelo, garantindo liberdade aos jogadores e aproveitando as suas características e rotinas de clube

•  Consolidar o modelo de jogo ao longo das competições em que estamos envolvidos

• Conhecer as características do adversário

Explorar as fraquezas no adversário, conciliando as com a maior estimu lação, a cada jogo, de comportamentos que vão ao encontro das la cunas detetadas

Rentabilizar o tempo da melhor forma possível, articulando os treinos com outra informação complementar, para pas sar a informação de for ma inteligível

•  Explorar eventuais fraquezas, usando preferencialmente com portamentos inseridos no modelo de jogo

•  Antecipar pontos fortes do adversário, mostrando vídeos e dando soluções dentro do modelo de jogo

•  Articular de forma coerente identidade (modelo) e adaptação (estratégia)

• Treinar focando aspetos de diferente dimensão de organização dentro do coletivo: grupal, sectorial, intersectorial, coletiva e individual

•  Potenciar a aquisição de comportamentos, com divisão da equipa em grupos funcionais

•  Usar momentos de vídeo para análise do adversário, da própria equipa em jogo e dos treinos, contrapondo os comportamen tos esperados com os efetuados, numa lógica de correção

O modelo de treino deve levar em consideração as contingências próprias de cada equipa, de modo que o treinador as consiga antecipar, arranjando alternativas. Por exemplo, uma equipa pode ter um calendário extremamente sobrecarregado e, em função dessa contingência, precisar de respeitar o tem po de recuperação entre jogos, mas procurando treinar num regime diferente.

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definição de comportamentos no modelo de treino e no modelo de jogo |

Pegando neste exercício, pode mos construir uma variante (Figura 4.3.) na qual vamos alterar a forma de finalização da equipa preta, que, além de ter de defender a baliza, tem quatro minibalizas onde deve tentar marcar. Esta alteração pro voca comportamentos diferentes na equipa preta que, além do foco na organização sectorial defensi va, tem de explorar o momento de TDA ou o ataque (mais difícil) para finalizar nas minibalizas. Também os brancos vão ter de reagir à per da da bola e focar‑se em defender as quatro minibalizas. Logo, com esta variante, estamos a solicitar a ambas as equipas um maior leque de comportamentos expectáveis de ser desenvolvidos pelo exercício. Relativamente ao exercício ori ginal, podemos criar uma progressão, acrescentando dois médios à equipa preta e dois DL à equipa branca (Figura 4.4.). Com esta mu dança no número de jogadores, es tamos a focar‑nos, na equipa preta, na ligação intersectorial defensiva entre a linha de quatro defesas e os dois MI. Por seu turno, nos brancos, introduzimos alguns comportamentos du rante o ataque, nomeadamente na ocupação dos espaços e ações entre os DL e os MA. O seu funcionamento é idêntico, mantemos os comportamentos preten didos no exercício inicial e acrescentamos alguns novos.

Caso optemos por alterar condicionantes como, por exemplo, a estrutura e o número de jogadores, já consideramos um novo exercício, que vai implicar uma dinâmica diferente (Tabela 4.1.).

Figura 4.2. | Exercício 6x4+GR com objetivos diferenciados para ambas as equipas. Figura 4.3. | Variante do exercício apresentado na figura anterior, com alteração da estrutura.
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7. Posicionais

Meiinho

Ligação interior – 8x2

Objetivos

1. Direcionar comportamentos ofensivos para as ligações interiores e para o seu carácter desequilibrador;

2. Definir a proteção de espaços centrais como prioridade defensiva.

Ataque:

•  Jogo posicional: criar linhas de passe divergentes ao portador, ajustar posicionamento constantemente e acompanhar o movimento da bola, percecionar o momento em que o adversário está desorganizado, para colocar passe de rutura.

TAD:

•  Mudar de atitude ofensiva para defensiva e reagir imediatamente sobre o portador para limitar as suas opções.

Defesa:

Comportamentos

•  Jogador mais próximo a fazer contenção e colega a ajustar na cobertura, sempre com a preocupação fundamental de proteger as ligações interiores;

•  Primeiro defesa a diferenciar os apoios, interpondo o corpo entre o portador e a linha de progressão que o defesa quer fechar e, quando a bola entra na zona defensiva do colega, deve reagir rapidamente para lhe dar cobertura defensiva.

TDA:

•  Mudar de atitude defensiva para ofensiva; procurar a saída imediata da zona de pressão em condução ou com um passe (o colega tem de perceber se a bola fica segura para poder sair do espaço para receber, caso contrário deve priorizar o fornecimento de uma linha de passe curta).

Descrição

Os jogadores são organizados em duplas. Fica uma dupla no meio (a defender) e as outras dispõem-se livremente pelo espaço do exercício, a atacar. As duplas atacantes circulam a bola entre si – um toque por jogador – com o objetivo de fazer 20 passes consecutivos ou passar a bola entre a porta colocada na zona central. Sempre que uma destas situações acontece, a dupla do meio fica mais uma vez. Esta dupla sai do meio após perda de bola dos atacantes (vai para o meio a dupla que perdeu a bola) ou se recuperar e sair do espaço com a bola controlada (passe ou condução de bola).

Esquemas

Organização geral do exercício: duplas, a dupla a defender (amarela) no meio e uma porta na zona central.

Procurar tirar os defesas das posições para, no momento em que isso acontece, colocar um passe por dentro das portas.

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Objetivos

Circuito

Comportamentos

Descrição

Trabalho posicional

1. Melhorar controlo do espaço próprio;

2.  Acertar timing da desmarcação para receber a bola com a receção do colega;

3.  Trabalhar aspetos técnicos, para ter uma elevada VCB.

Ataque:

•  Criação de linha de passe diagonal ao portador: controlar a bola; controlar o espaço envolvente e de adversários que possam interferir com a sua ação, assumindo uma posição com os apoios diferenciados e a olhar por cima do ombro (varrimentos visuais);

• Criação de linhas de passe divergentes ao portador:

– Movimentar sem bola no tempo oportuno, partindo preferencialmente do ângulo cego dos defesas;

– Explorar dinâmicas ofensivas de tabelas, apoios frontais e de “terceiro homem”.

Jogadores distribuídos como ilustrado a efetuar as circulações em circuito. Circulam pelo menos duas bolas em simultâneo, podendo o treinador colocar mais, se assim o entender, para aumentar a intensidade do exercício.

Esquemas

O portador tem de ter sempre duas soluções de passe, dadas no tempo certo e com o cuidado de o jogador abrir o campo (diferenciar apoios). As setas vermelhas indicam a rotação após cada execução (sempre para a posição seguinte).

Manutenção das duas linhas de passe, mas a bola no primeiro passe salta uma linha (para a terceira linha), este devolve para o da linha abaixo, que passa ao da quarta linha, que devolve ao da terceira (“terceiro homem”).

Observações

Situação idêntica à anterior, mas o jogador da segunda linha recebe, devolve logo e, a partir daí, entra na terceira linha, que passa para a segunda. Daqui, a bola entra na quarta linha, volta à terceira e entra na primeira linha do outro sentido.

A bola vai diretamente da primeira para a quarta linha (jogadores da segunda e terceira linhas dão linha de passe como nas situações anteriores), depois entra na segunda; desta para terceira e volta à quarta linha.

Apresentamos algumas situações possíveis dentro desta estrutura e que nós operacionalizamos bastante tendo em vista o jogo.

Variante: colocar mais um jogador na primeira linha e, enquanto um está a executar, o jogador “extra” está em espera e fecha uma linha de passe na segunda linha; a partir daí, os jogadores decidem em função desse posicionamento.

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Manutenção da posse de bola

Objetivos

Comportamentos

Descrição

Organização defensiva coletiva – GR+10x10+GR

1.  Transmitir a noção do que pretendemos com o conceito de bloco defensivo, numa perspetiva coletiva em que cada jogador tem um papel a desempenhar;

2. Procurar desequilíbrios através da mobilidade dos MC e dos DL.

Ataque:

•  Ligação da segunda fase de construção com a criação de situações de finalização:

– Fazer ocupação racional do espaço de jogo;

– PL a fornecer apoio frontal para possibilitar a MPB em zonas de maior concentração defensiva; MA ou DL do lado da bola a dar largura, com o outro (MA ou DL) a dar linha de passe interior; MC a alternarem entre si o apoio ao portador e a desmarcação entrelinhas.

•  Mobilidade para criação de situações de finalização: com a bola no corredor lateral, DL ou MA a dar apoio por dentro, MC do lado da bola a atacar a profundidade (espaço entre DL e DC adversários); após VCJ, MA a receber em largura e DL a atacar o espaço entre DL e DC adversários.

TAD:

•  Reação coletiva à perda da bola: sobre o portador, espaço circundante, sempre com a equipa equilibrada e preparada para o controlo da profundidade.

Defesa:

•  Coesão do bloco defensivo: manter linhas próximas, priorizar o fecho do corredor central (MC do lado contrário à bola, baixa um pouco), sendo a ação norteada pelos indicadores de pressão (bola coberta/descoberta, bola difícil, passe para trás, entre outros) para assegurar uma resposta coletiva e agressiva.

Duas equipas de dez jogadores: os azuis, para pontuar, têm de conquistar o espaço vermelho (passe ou condução) e os brancos têm de marcar nas minibalizas.

Esquemas

Defesa (azuis): encurtamento da linha defensiva com a bola entrelinhas e ajustamento para fechar as minibalizas.

Ataque (brancos): foco no apoio frontal do PL e na alternância de posicionamento dentro/fora entre MA e DL.

Foco no posicionamento do MC por dentro (círculo branco) e movimento em profundidade do DL com o MA em largura e desmarcação para o espaço entrelinhas do MC do lado contrário (equipa azul).

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POSFÁCIO

O futebol é uma atividade social que beneficia do aporte da ciência para o seu desenvolvimento. A combinação deste conhecimento científico com o conheci mento técnico é fundamental para o desenvolvimento da performance neste que é o desporto mais popular do mundo.

O autor, através da sua experiência acumulada enquanto treinador em dife rentes níveis competitivos, escalões etários e em diferentes contextos culturais, beneficiando também da sua formação académica e experiência docente ao ní vel do ensino superior, apresenta nos uma ferramenta valiosa para todos aqueles que pretendam catapultar a qualidade dos seus jogadores e/ou das suas equipas para um nível superior.

Este livro encontra se divido em duas partes, abrangendo uma variedade de tópicos onde o autor aborda desde fundamentos básicos até estruturas macro de organização e treino da modalidade. O ponto de partida é o exercício de trei no, componente fundamental para o desenvolvimento e articulação de todo o processo de treino, que deve ser guiado por uma ideia norteadora do processo.

Tendo por base o quadro de referências que moldaram a sua experiência na modalidade, o autor apresenta uma conceção objetiva que facilita a organização do processo de treino, além de apresentar dicas e estratégias que, na sua pers petiva, poderão contribuir para melhorar o processo.

De forma destemida, assume diferentes propostas, sendo de salientar aquela que resulta do modelo de classificação dos exercícios, vertendo de forma objetiva a sua perspetiva sobre processos que visam a sistematização e simplificação da organização dos diferentes tipos de exercícios.

Pelo exposto, recomendamos vivamente a todos intervenientes (treinadores, dirigentes, jogadores, espetadores) a leitura deste livro que, claramente, repre senta um valioso contributo para o ensino/treino da modalidade e para a cons trução da excelência da atividade.

(Professor Auxiliar na Universidade de Coimbra; Doutorado em Ciências do Desporto)

© Lidel – Edições Técnicas, Lda.

TREINO em FUTEBOL

O exercício de treino como meio de comunicar uma forma de jogar

Este livro aborda questões práticas do treino em futebol, que destacam a capacidade de organização do treinador, com especial enfoque no exercício de treino como ferramenta fundamental na comunicação de um modelo de jogo. São abordados aspetos essenciais de planeamento, como a semana de treino, a sessão de treino, o modelo de jogo e o modelo de treino. Os exercícios de treino propostos são uma mais-valia desta obra: organizados e classificados de acordo com os seus objetivos, auxiliam a organização do treinador, que encontrará, para cada exercício: objetivos, comportamentos, descrição, esquema e eventuais observações.

Este livro será uma excelente ferramenta de trabalho para treinadores, alunos de disciplinas de futebol em cursos de Motricidade Humana ou Desporto e de outras formações específicas, como estudantes de áreas relacionadas com o treino em futebol.

CONTEÚDOS

Parte

Parte

2. A sessão de treino 3. A definição de comportamentos no modelo de treino e no modelo de jogo 4. O exercício de treino
O modelo de classificação dos exercícios
I: Contextualização do exercício de treino 1. A semana enquanto unidade estrutural de planeamento
5.
Genéricos
Posicionais
De decisão condicionada
Decisionais
exercícios
livro se esgotar ou ser publicada nova edição atualizada
com alterações. + www.lidel.pt
II: Apresentação de exercícios de treino 6.
7.
8.
9.
89
de treino disponíveis em materiais.lidel.pt/treino_futebol até o
ou
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