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UMA MANHÃ
ROBERTO FRANKLIN
Uma manhã, após regressar de uma dolorosa ação, ao notar que pássaros procuravam galhos para pousar, em um mês de verão, Cláudio chega em casa abatido e solitário. Passara uma semana em um dos hospitais de sua cidade com a sua Helena acometida pela peste. Depois de uma luta incansável, Cláudio a perdera, foi uma triste manhã ter que deixar sob a terra sua companheira há dez anos, ainda jovem com tantos planos pela frente, com tantos sonhos, fora tolhido de todos os seus anseios. Ao chegar a casa, a atmosfera lúgubre, de um final de dia, aliado ao cansaço, o fez ir para o quarto. Após uma breve refeição, tomou seu banho e foi para a cama, solitário, acompanhado somente pelas lembranças de um período de convivência. Ao deitar-se, ouvia os sinos da matriz tocando sinfonias melancólicas, entoavam canções tristes de despedida, que repicavam à parede do seu quarto e o levava a tempos que vivera, suas memórias o atordoavam. Para fugir de seus pensamentos, virou-se para o lado, abraçando o seu travesseiro, sentiu a presença de sua amada que partira, seu perfume ainda impregnado levou-o a sonhos. Sentia a sua presença, no quarto ainda ecoava sua voz, palavras que ela sempre proferira não saíam de sua mente cansada, no seu quarto percebia a imagem de Helena tatuada nas paredes a todo momento, uma dor insuportável era sentida, igual a dor de um punhal penetrando, rasgando seu peito, destroçando as emoções, fazia-o chorar, a angústia, a depressão se misturavam a uma falta de ar incontrolável. Tentou levantar-se, dirigindo seu olhar para o piso do quarto, percebeu que marcas dos pés de sua amada carimbavam o tapete, dando a impressão da sua presença, seu pensamento, ora distante ora atual, o levava a momentos que viveram, deixava-o louco, sem a coragem de enfrentar o que acontecera. Seu peito sangrava e, numa atmosfera de dor, perseguia seu desespero, tudo era muito real tudo era muito fantasioso, não queria aceitar não queria acreditar, então percebeu que as roupas que foram deixadas sobre a cama no dia que fora levada para o hospital, o aguardavam como um aviso para que nunca se esquecesse de sua amada. As roupas estavam ainda impregnadas de perfume, o mesmo que o levou a sonhos e ao prazer, sentia ao abraçar sua camisola sua mão a percorrer seu corpo. Dando a impressão de procura, sentia seu calor, seus sonhos agora mais que presentes, devido ao que o consumia, sentia o peso do leve corpo dela no seu, as sensações aumentavam, olhava distante e, ao mesmo tempo, ouvia e percebia seus gritos e olhares, com um prazer que somente ela poderia dar. A cena era tão real na sua imaginação, que o sabor dos lábios de Helena era sentido, até que no momento percebeu que os olhos e a voz dela ecoaram naquele quarto, dando a verdadeira impressão que ambos entraram em uma dança sensual, que os levava a um prazer nunca antes sentido. Seu corpo desfalecido pelo sonho e pelo cansaço da semana o levou ao sono. Tudo apagou, estava só, sem a companhia de sua amada, percebeu que seus dias deveriam ser entediantes, nada mais fazia sentido, era levado à depressão e ao isolamento. No dia seguinte, ao levantar percebeu que o silêncio agora era sua companhia, percebeu que as sensações pararam, tudo mudara seu mundo agora seria um mundo unitário, um mundo de completo isolamento, o famoso dia seguinte. A solidão, agora sua companhia, o deixava em transe, não sabendo ainda o que iria fazer de sua solitária vida. Foram dez anos de uma companhia agradável, que ambos viveram como cúmplices. Nada era igual ao que era antes, nada se fazia sentir, nada o tornava feliz, as lembranças do dia a dia o atormentavam. A vida era para ser vivida, a vida era para ser compartilhada, desta maneira não havia outra solução, a vida para ele também acabara.
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