Flaviamartinsconstant

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de um dos mais conhecidos cortiços do Rio de Janeiro, o Cabeça de Porco.21 O segundo é o retorno, em 1897, dos soldados egressos da campanha de Canudos – batalha travada entre tropas republicanas e seguidores de Antônio Conselheiro no sertão baiano. Os ex- moradores do cortiço Cabeça de Porco e os soldados egressos teriam construído as primeiras casas nos morros de Santo Antônio e Providência, no centro do Rio de Janeiro. A presença dos soldados no morro da Providência teria, inclusive, provocado a alteração de seu nome para morro da Favela, nome que daria origem ao substantivo hoje amplamente difundido em todo Brasil e emblemático da cidade do Rio de Janeiro. O nome Favela seria uma referência a um morro que ficava nas proximidades de Canudos e que serviu de base e acampamento para os soldados republicanos. 22

No início da Primeira República, o projeto de construção de uma identidade nacional visava ao erudito. Por influência de idéias européias sobre a inferioridade do mestiço em relação às raças puras, e dos negros em relação aos brancos, parte da intelectualidade brasileira passou a ver o Brasil como uma sociedade atrasada e doente em função de sua imensa população miscigenada. Daí as origens da repressão às tradições culturais e religiosas populares, principalmente as de origem africana, e da “teoria do branqueamento”, como a solução para o problema do povo e da nação brasileiros. Por essa teoria, em três ou quatro gerações, a entrada de grandes contingentes de imigrantes brancos aumentaria a miscigenação e produziria uma população cada vez mais branca. Nesse período, “a imagem pretendida para o Brasil era a de um país higiênico, burguês, moderno e, acima de tudo, branco” (FENERICK, 2005: 30).

Conflitos entre valores nacionais e internaciona is, localismo e cosmopolitismo são comuns em processos de construção de identidades nacionais. No Brasil republicano esses conflitos começaram a surgir principalmente a partir da publicação

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O Cabeça de Porco ficava localizado na atual rua Barão de São Felix, próximo ao morro da Providência. Sua destruição aconteceu em janeiro de 1893, a mando do prefeito Bento Ribeiro (LOPES, 2005: 41). 22 Não exis te consenso sobre a causa exata da referência à palavra “favela” em Canudos. Alguns autores atribuem-na à vegetação que cobria o morro da Favela na Bahia, que seria semelhante à que cobria o morro da Providência no Rio de Janeiro, e outros, ao próprio morro baiano, que traria forte lembrança aos soldados, por ter retardado o avanço final do Exército da República sobre o arraial de Canudos. 26


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