REAL GAZETA DO ALTO MINHO EDIÇÃO DO CENTRO DE ESTUDOS ADRIANO XAVIER CORDEIRO | N.º 27
DIRECTOR JOSÉ ANÍBAL MARINHO GOMES REDACTOR PORFÍRIO SILVA
MARÇO 2021
“… O SENHOR D. DUARTE, ENQUANTO REFERENTE HISTÓRICO, É MAIS DO QUE UM PASSADO COMUM, É TAMBÉM UM SÍMBOLO DE UNIDADE NA DIVERSIDADE…” ENTREVISTA AO DEPUTADO ASCENSO SIMÕES
CONTEÚDO
PÁG. 07 - RIR, PARA NÃO CHORAR PÁG. 12 - REGIME – DO MODO DE GOVERNAR OU GOVERNAR-SE! PÁG. 16- A EXONERAÇÃO DE JOÃO FRANCO DECRETA O FIM DA MONARQUIA PÁG. 25 - A QUESTÃO DO REGIME: MONARQUIA – REPÚBLICA PÁG. 29 - D. PEDRO II E A CIDADE DO PORTO PÁG. 33 - A MONARQUIA PRESIDENCIALISTA PÁG. 40 - ENTREVISTA AO EX. SR. DEPUTADO DR. ASCENSO SIMÕES PÁG. 45 - MONARQUIA VS REPÚBLICA PÁG. 51 - AS MONARQUIAS EUROPEIAS CONTEMPORÂNEAS PÁG. 64 - VENERÁVEL JÉRÔME LEJEUNE PÁG. 67 - O OUTONO MARCELISTA
MARÇO 2021
REAL GAZETA DO ALTO MINHO
EDITORIAL PORFÍRIO PEREIRA DA SILVA
Na tomada de posse do renovado mandato do Presidente da República, e expressa pelas suas palavras na origem ou nos pressupostos conceitos dos princípios inautênticos da moral, voltamos a ser confrontados com o paradigma de ética republicana . Tal permanente conceção ontológica, quando repetida por conveniência de disfarce aos atropelos à liberdade e à moralidade autêntica dos seus atos, começa a cheirar a mofo. Na aristotélica “Ética a Nicómaco”, sendo a excelência dupla – sem que sua excelência do arauto republicano, se entretenha a refletir na tautologia do processo da habituação –, como disposição teórica do pensamento compreensivo (aceitável) e como disposição ética, sendo que a primeira assenta no ensino, formação e desenvolvimento, requerendo, ao mesmo tempo, experiência e tempo; “a disposição permanente do carácter resulta, antes, de um processo de habituação, de onde até terá recebido o seu nome, hábito , embora se tenha desviado um pouco da sua forma original” – citamos Aristóteles, pela afirmativa conclusiva de que daqui resulta, evidentemente, que nenhuma das excelências éticas nasce connosco por natureza, quanto mais a conceitos exteriores à nossa própria natureza, mas pela força do “hábito” por nós criados. Fazendo nossas as palavras de Aristóteles, as excelências éticas ao não se gerarem em nós nem por natureza, nem contra a natureza, mas efectivamente por sermos constituídos de tal modo que podemos, através de um processo de habituação, acolhê-las e aperfeiçoá-las. Desde que tenhamos o hábito de interiorizarmos os princípios autênticos da moral. O homem – e não os regimes – é e sempre será um ser moral na medida em que o seu agir, para ser moral, deve ser conforme, apenas e tão só, a alguns critérios, valores, regras e prescrições. Começamos a ficar perplexos com a tentativa do processo de acantonamento das excelências da ética , sendo que, à boa maneira aristotélica, “os construtores de casas fazem-se construtores de casa construindo-as e os tocadores de citara tornam-se tocadores de cítara, tocando-a”. Sempre será mais correcto apropriar-lhes a origem etimológica, encontrada em dois termos da Grécia Antiga: Éthos – costume, uso, maneira (exterior) de proceder; Êthos – morada habitual, toca, maneira de ser, carácter. Chamar a si a “ética republicana” não basta dizê-lo em praça pública ou em discursos de circunstância, quando muitas vezes esses preceitos, ainda que escritos à força da lei, são desrespeitados pela forma de agir, e as disposições do carácter são de uma natureza tal que podem ser destruídas por defeito, assentes no desejo e na ira. Passados cento e treze anos depois do Regicídio continuamos no ponto de partida para certos binómios, tais como: ético/jurídico e moralidade/legalidade, como se a ética fosse apenas ou exclusivamente republicana. Ou seja, o campo no qual a lei e a regra actuam e, na ética, o nível das fundamentações da lei e da moral. Até quando tal dislate?
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REIS DE PORTUGAL Títulos, estilos e honrarias
D. João VI
Nascimento – 13 de Maio de 1767 no Palácio Real de Queluz, Lisboa. Morte – 10 de Março de 1826, Palácio da Bemposta, Lisboa. Está sepultado no Panteão Real da Dinastia de Bragança, Mosteiro de São Vicente de Fora, Lisboa. Reinado – 7 de Setembro de 1822 a 10 de Março de 1826. Consorte – D. Carlota Joaquina. Dinastia – Bragança. Cognome – “O Clemente”.
Sua Alteza, O Infante Dom João (13 de Maio de 1767 – 11 de Setembro de 1788). 11 de Setembro de 1788 – 10 de Fevereiro de 1792: Sua Alteza Real, O Príncipe do Brasil, Duque de Bragança, etc. 10 de Fevereiro de 1792 – 14 de Julho de 1799: Sua Alteza Real, O Príncipe Regente em nome da Rainha. 14 de Julho de 1799 – 20 de Março de 1816: Sua Alteza Real, O Príncipe Regente. 20 de Março de 1816 – 7 de Setembro de 1822: Sua Majestade Fidelíssima, El-Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves. 7 de Setembro de 1822 – 10 de Março de 1826: Sua Majestade Fidelíssima, El-Rei de Portugal e dos Algarves. 29 de Agosto de 1825 – 10 de Março de 1826: Sua Majestade Imperial e Fidelíssima, O Imperador Titular do Brasil.
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O estilo oficial de D. João VI como Rei era: “Pela Graça de Deus, João VI, Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Ao reconhecer a independência do Império do Brasil pelo Tratado do Rio de Janeiro, D. João VI passa a usar, por carta de lei de 15 de Novembro de 1825, o título de imperador do Brasil, que lhe fora deferido pelo seu filho: Pela Graça de Deus, João, Imperador do Brasil, e Rei do Reino Unido de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc.
Como Rei de Portugal, foi Mestre das seguintes Ordens:
Grão-
Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant’Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. São João de Jerusalém, e Grão ‑ prior em Portugal. Grã-cruz das Ordens de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, de Carlos III, de São Fernando, de Isabel a Católica, do Espírito Santo, de São Luís, de São Miguel, da Legião de Honra, de Leopoldo, de Santo Estêvão, da Coroa de Ferro, de Santo André, de Santo Alexandre Nevsky, de Sant'Ana, do Elefante, do Leão Neerlandês, da Águia Negra; Cavaleiro da Ordem do Tosão de Ouro e da Ordem da Jarreteira, e serviu de Condestável no acto da aclamação de sua mãe, a rainha Dona Maria I. Filhos
D. Maria Teresa de Bragança (1793-1874), casada em primeiras núpcias com D. Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, Infante de Portugal e de Espanha, e pela segunda vez com Carlos de Bourbon, Conde de Molina, também Infante de Espanha e seu cunhado; com descendência. D. Francisco António Pio de Bragança (1795-1801), Príncipe da Beira; sem descendência. D. Maria Isabel de Bragança (1797-1818), casou-se com Fernando VII de Espanha; uma filha natimorta.
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D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal, Imperador do Brasil e Rei de Portugal (1798-1834), casado em primeiras núpcias com Maria Leopoldina de Áustria e em segundas com Amélia de Leuchtenberg; com descendência. D. Maria Francisca de Assis de Bragança (1800-1834), casou com Carlos de Bourbon, Conde de Molina; com descendência. D. Isabel Maria de Bragança (1801-1876); sem descendência. D. Miguel de Bragança (1802-1866), com duas filhas naturais legitimadas, casou posteriormente com Adelaide de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg e teve descendência do casamento. D. Maria da Assunção de Bragança (1805-1834); sem descendência. D. Ana de Jesus Maria de Bragança (1806-1857), casou com Nuno José Severo de Mendoça Rolim de Moura Barreto, 1º duque de Loulé; com descendência.
Pai D. Pedro III Mãe D. Maria I D. João VI em pessoa
«Embora fosse decerto o reverso do bonito, havia uma expressão de perspicácia e ao mesmo tempo benignidade, no seu rosto muito pouco comum, singularmente agradável: ficou-me a impressão de que ele tinha um aspecto decidido, particularmente na boca dos ascendentes maternos do seu pai [...] Nenhum dos seus súbditos falava a língua pátria — essa bela língua harmoniosa — com maior pureza e eloquência do que ele próprio. Quando estava no humor mais sério, havia uma prontidão, uma facilidade na sua dicção, muito notável: todas as palavras eram pronunciadas a propósito, e vinham com plena força. […] Ninguém sabia ganhar a afeição popular, à sua própria maneira, com mais felicidade do que este príncipe bem intencionado e simples» (Beckford, pp. 210 e 214). «era pontual, á moda de Luís XIV […] adorava a praxe. A etiqueta, com os seus incómodos e anomalias, não o enfastiava. Passadas as duas primeiras semanas após a chegada, recomeçou as antigas audiências das terças-feiras. […] Compareciam a elas desde o titular de preclara linhagem até ao mesteiral humilde» (Noronha, I, p.23).
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RIR, PARA NÃO CHORAR JORGE ANTÓNIO ARAÚJO
1
Abstract
Résumé
Several cases are tainting this presidential election. The electoral dispute for the presidency of the republic is more and more a factor of division among the Portuguese people. Living perhaps the greatest crisis of our time, the republican regime shows us a degrading spectacle, which demonstrates the superiority of a monarchical head of state for Portugal.
Plusieurs sont les cas qui ternissent cette élection présidentielle. De plus en plus, la dispute électorale pour la présidence de la république s’est constituée comme un facteur de division entre les Portugais. Alors que le pays traverse peut-être la plus grande crise de notre temps, le régime républicain nous expose à un spectacle dégradant, qui démontre la supériorité d’un chef d’État monarchique pour le Portugal.
Key words: Presidential elections; decay of the Portuguese republic; president and candidates; crisis and pandemic.
Toda a saga em torno das eleições presidenciais
que
neste
mês
se
realizam está a expor a nu o estado caduco do regime e da miséria em que vai o país. O contexto pandémico e caótico em que vivemos, bem como a
Mots clés: Élections présidentielles ; déclin de la république portugaise ; président et candidats ; crise et pandémie.
emergência de novas forças extremistas, contribuiu para fragilizar um sistema que já por si constantemente mostra fragilidades, evidenciando a superioridade do que seria uma chefia de Estado monárquica em Portugal. Analisemos a situação.
1 Juventude Monárquica Portuguesa
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S.A.R., o Senhor Dom Duarte de Bragança.
Julgo que qualquer cidadão com o mínimo espírito crítico concordará que os debates entre os candidatos presidenciais foram paupérrimos. O próprio formato em que tais debates se realizam propicia a superficialidade da discussão: curta, rápida e atabalhoada, conduzida por jornalistas mais preocupados com as audiências do que com o devido esclarecimento das ideias; demasiado centrada na troca de acusações e no lançamento de algumas palavraschave sonantes, lugares comuns sem grande conteúdo, para tentar fazer vibrar o respectivo eleitorado. Noto, porém, que a maior parte dos candidatos não parece saber o que é a chefia do Estado. O que apresentam são projectos de governo, os projectos dos seus partidos, transformando as eleições presidenciais em mais um
palco de promoção das forças partidárias e das suas disputas pelo poder. Nesse aspecto Marcelo Rebelo de Sousa tem razão, ao afirmar que cada um dos candidatos quereria apenas um presidente mais à esquerda ou mais à direita de modo a favorecer a sua própria cor política. Esta é, aliás, a assunção, por um dos candidatos, de uma das mais perversas formas de viciação do regime, ilustrando o modo como os partidos procuram sequestrar a chefia do Estado, manietando-a em seu favor. Vemos, para além disso, como nestes debates se discutem demasiadas questiúnculas, minudências, matérias que poderiam ser de café ou de mercearia, e, tirando aqui e ali algumas considerações pouco aprofundadas sobre a União Europeia, faltam visões estratégicas sobre o lugar de Portugal
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“CAFÉ TUGA” do ilustrador Nuno Saraiva*
no mundo, onde o chefe do Estado nos deveria, aliás, representar e personificar. De facto, não vi nenhum candidato abordar qual deve ser o posicionamento e a relação de Portugal com os seus aliados históricos, com a Ásia, e a China em particular, com os países de língua portuguesa, com África, qual o papel do mar, da defesa – já que o presidente da república é também o Comandante Supremo das Forças Armadas –, entre várias outras questões em que se joga o futuro do país e a afirmação e continuidade da nação portuguesa no mundo. Em vez disso, para além da discussão de questões correntes de governação, que nem cabem nas atribuições do presidente da república, temos apenas a confrontação de visões ideológicas da política e da sociedade, trazidas praticamente do século XIX e tantas vezes desligadas da nossa existência histórica. Debatese tudo aquilo que pode dividir os portugueses, mas nunca aquilo que verdadeiramente os pode unir em torno de um projecto ou desígnio para o país.
Se esta é uma situação recorrente e habitual nas eleições presidenciais, este ano a perfídia assume uma expressão ainda maior, tanto pelo confronto com novas forças extremistas, que vieram ameaçar o antigo equilíbrio de poderes, como pela situação de grave crise que o país atravessa. Os discursos estão cada vez mais extremados, sobretudo no campo da troca de insultos e de acusações, mais do que na discussão séria de ideias. A divisão dá-se ao nível partidário, ideológico, entre esquerda e direita, mas mais ainda: entre os portugueses do público e do privado; entre uns “portugueses de bem” e outros que supostamente o não são; entre portugueses de diferentes origens étnicas; entre os meios urbanos e rurais; entre um “Portugal antigo”, do “respeitinho”, conforme caracterizou Marisa Matias, e um outro – seja lá qual for – defendido pela mesma candidata; entre supostos “fascistas” e supostos “democratas”;entre os que usam batom vermelho e os que não usam; entre os que defendem o adiamento das eleições e os que o não desejam etc.
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“Baralhados” da ilustradora Cristina Sampaio*
As posições são tão díspares e extremas que, sabemos bem – temos a certeza! –, caso um desses candidatos vencesse as eleições, dificilmente se poderia assumir como presidente da facção oposta derrotada. E a tal divisão, à qual se apropria o dito português de termos “sete cães para um osso” – e não é que são mesmo sete os candidatos? –, deveria ser poupada a figura do principal representante político do Estado. As próprias eleições são hoje um ponto de discórdia. À hora em que escrevo este texto, Portugal consta como sendo um dos países com o maior número diário de casos de infecção e de mortes pelo novo coronavírus por milhão de habitantes, em todo o mundo. Desde o dia 15 de Janeiro que nos encontramos sob este novo estado de “confinamento”, que, na procura legítima por um bem maior como é a saúde pública, traz também o sofrimento, o empobrecimento e a desgraça a muitos dos nossos concidadãos. No entanto, os responsáveis políticos portugueses foram incapazes de adiar as eleições
presidenciais, com as respectivas campanhas e tudo o mais o que esse processo acarreta. Assim, e ao contrário do que talvez fosse suposto, o que recebo são imagens de acções de campanha e de comícios que juntam multidões, de filas nunca vistas para o voto antecipado e relatos de pessoas, algumas das quais amigas, que aguardaram horas para conseguir exercer o seu direito de voto. Que mensagens contraditórias são estas que nos passam? Quantas vidas vale a eleição do presidente da república? A protecção dos cidadãos constitui um dos principais deveres do Estado, pelo que a discussão e a escolha da sua principal figura não podem colocar em causa esse princípio num momento tão premente da nossa vida. Portanto, não nos digam que o regime não falhou, nem procurem colocar as culpas e a responsabilidade nos portugueses.
Fila de pessoas para o voto antecipado no Porto, que dava a volta ao quarteirão. Fotografia gentilmente cedida por João Pinto Bastos.
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Mesmo sendo eu um militante monárquico há já vários anos, nunca como hoje, ao ver todo este espectáculo, estive tão seguro do quanto a república se tornou tóxica e do quanto poderíamos beneficiar com uma chefia do Estado monárquica, um elo de perfeita união e de identificação entre o passado, o presente e o futuro do país. Hoje a luta é pela divisão dos portugueses, contrariando uma das funções do chefe do Estado, que deveria ser, precisamente, a de servir como elo de união. Pergunto mesmo: aceitará o presidente da república eleito tomar posse caso o seja com a maior abstenção de sempre da nossa democracia? É legítimo? Estão já para além do aceitável as polémicas e os episódios que
mancham todo este processo eleitoral. Os historiadores do futuro, ao analisarem os vários casos que nos têm sobressaltado, poderão ver aqui o agudizar dos sinais de desgaste do regime, que já se sentiam antes, ou quem sabe mesmo uma aceleração em direcção ao seu fim – esperemos que não como passagem para algo muito pior. Aceita-se demasiado bem a mediocridade da discussão em torno da chefia do Estado, o “avacalhamento” da posição da sua principal figura, ou o facto de caminharmos a passos largos para sermos o país mais pobre da Europa. Quão baixo teremos de descer até colocarmos de novo a questão monárquica em cima da mesa? Todo este circo daria vontade de rir, se não desse antes vontade de chorar. Ó, Portugal, por onde vais?
* Diário de Campanha. Cartoons: https://www.rtp.pt/noticias/politica/diario-de-campanhacartoons_1289102
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REGIME – DO MODO DE GOVERNAR OU GOVERNAR-SE! SUSANA CUNHA CERQUEIRA
Abstract
Résumé
Governing cannot be the art of governing itself, but should exist cohesion from all sides of the regime to be transparent and clear.
Gouverner ne peut pas être l'art de se gouverner soi-même, mais il doit exister une cohésion de toutes parts pour que le régime soit transparent et clair.
Key words: corruption.
Regime;
governance; Mots clés: corruption.
Em A arte da Guerra de Sun Tzu [1], um exército pode estar exposto a seis calamidades não naturais: deserção; insubordinação; desânimo; ruína; desorganização; derrota. Infelizmente, o exército, o povo português, tem vindo a sofrer, paulatinamente, as seis calamidades não naturais que se encontram presentes desde há muito e no presente. Deserção , não porque os portugueses quisessem, mas porque alguém incitou os nossos jovens a emigrarem com as palavras que ferem a alma de qualquer um, proclamando a seguinte ideia: “ emigrem, é uma boa oportunidade de emigrarem! ” Claro que sempre emigraram. Mandá-los partir é dizer que não há possibilidades de ter os filhos da Nação na sua Pátria. Pobres de espírito ou mutilados pelo cansaço.
Régime;
gouverner;
Na realidade, aconteceu! E emigraram e foram tais e tantos que, segundo os dados na ONU revelados pelo “Observador”, podendo os dados não serem totalmente fiáveis, porque se crê que o número aumentou: 2.6 milhões de portugueses encontram-se emigrados - Admirável mundo novo este, que nos constringe na amargura dos tempos. Partiram, desde sempre, sem nada nas mãos e com vontade de
[1] Tzu, Sun (2019) A arte da Guerra. Lisboa: Bertrand Editora, Lda.
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encontrar o que a sua Pátria não lhes dava e foi sempre este o seu desígnio, encontrar o que a Pátria não lhes permitia, dizendo: “Os Portugueses somos do Ocidente,/imos buscando as terras do Oriente[…]”[2] com a força hercúlea de quem parte, levados pela coragem e ousadia de deixar a sua Pátria, chorando internamente. Cá, tal como Camões descreve, as mães chorosas, outrora e sempre. Agora, hoje, em que o abraço não é sentido nem permitido. A Insubordinação parece ser uma palavra que não faz parte do vocabulário dos portugueses – povo corajoso, mas que chora e suplica pelo que é seu, havendo necessidade de organizações que vigiem a delapidação da dignidade do povo… povo de brandos costumes. Segundo a organização Transparency International Portugal – Transparência e Integridade existem vários (muitos!) casos poucos claros ( e.g. Caso Fax de Macau, Caso Paquetes da Expo, Caso Tecnoforma, Caso Bragaparques, Caso Freeport, Caso Vistos Gold)[3]. O que fazem os portugueses perante tais denúncias apenas superficiais como nenúfares que surgem nos lagos, encontrando-se, no fundo, a viscosidade do limo e a escuridão do que não veio (ainda) à luz? Sofrem, mais uma vez, na solidão do seu destino e alguns até se suicidam; outros, irrisórios, porque obstinados ao poder, fazem das mentiras verdades, sendo estas repetidas constantemente em conluios fechados, transformadas em verdades para o público em geral. Contudo, quando alguém se atreve a denunciar, a
voz é abafada e fica enrouquecida de falar para o vazio. Outros, surdos, ou de brandíssimos costumes preferem nem sequer pensar ou menorizam os factos. O peso do jugo faz-se sentir…
Parece que, por um lado, este sentido latente de um povo que sempre teve um jugo, o obrigou a baixar a cabeça, não por respeito, mas por obediência cega, e a não litigar o que é seu por direito – e os contribuintes pagam e continuam a pagar, e pagarão até ficarem exauridos. Por outro lado, há uma insubordinação quase acéfala de certos setores, como é o caso dos sindicatos dos professores e outras associações – as guildas medievais, com as necessárias adaptações. O que obriga o povo a ser conivente, silenciosamente, com uma corrupção latente? A Constituição? As leis? O sistema judicial? O prolongar de processos de julgamento ad aeternum ? Fazem-se legalizações , impõem-se novas leis em tempos de pandemia, quando o povo apenas está preocupado e estonteado com a sobrevivência em 2021, mas não se acelera a justiça? Claro que estamos num Estado de Direito, numa sociedade democrática, mas não haverá necessidade de varrer
[2] Camões, Luís de (1974) Os Lusíadas. Porto: Porto Editora. [3] https://transparencia.pt/a-corrupcao-na-politica-em-portugal-alguns-casos-marcantes-nos-ultimos30-anos. Consultado em 21 de março de 2021.
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para debaixo do tapete os casos que proliferam como metáteses de um cancro maligno, não circunscrito, até porque, atualmente, já existem os aspiradores robots que, com maior eficiência, fazem limpeza e agilizam o trabalho do homo faber ... Porém, a corrupção é, desde há muito sentida, já que Gil Vicente em O auto da barca do Inferno questionava o Corregedor “Nonne accepistis rapina?[4] E as peitas dos judeus/Que a vossa mulher levava? [5].
Comummente, fala-se da corrupção sistémica ou corrupção endémica[6], principalmente devido às debilidades de uma organização ou como processo em que existem incentivos conflituantes; poderes discricionários sem limite; poderes monopolísticos; falta de transparência; salários baixos e uma cultura de impunidade. Outros estudos referem, entre outras, a corrupção passiva para atos ilícitos e lícitos, a corrupção de eleitor, a corrupção ativa, a corrupção com prejuízo do comércio internacional, a
corrupção no desporto, o que permite visualizar a múltipla abrangência. Será que faz parte de certos grupos sociais, políticos e económicos possuírem este tipo de ADN? Consequentemente, existe uma amálgama adequada para todo o tipo de oportunismo económico, político, com partidos que se erguem sem fundamento apenas com a subversão no comando que não o mesmo que insubordinação. Perante esta situação, só poderá haver… desânimo , na linha de pensamento de Sun Tzu. Não será por acaso que temos o fado e a palavra saudade , e destino, sentindo-se sempre este peso no peito, quando olhamos para o mar ou para a montanha que sempre viu fugir os portugueses. Este destino que pesa e marca como se de um infortúnio fatal se tratasse: “ E mais ainda te reza o destino que tens de amargar, /Que a tua estrela de brilho divino deixou de brilhar.../Estrela que Deus te marcou, mas que bem pouco brilhou/ E cuja luz, aos pés da cruz, já se apagou ., como dolente, mas melodiosamente Hermínia Silva cantava o Fado da Sina. Sem falar de Cesária Évora que entoava Sodade que revela a necessidade de apropriação de um sentimento, emoção, tão portuguesa que (in)traduz a melancolia da alma, da mente, do espírito.
[4] não aceitaste suborno? [5] peitas = peitos das aves; subornos [6] Glossary. Anti-Corruption Resource Center. Consultado em 20 de março de 2021.
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Daqui para a ruína falta apenas um gesto fatal: a má gestão do erário público, abraçando apaixonadamente a desorganização e culminando numa relação pecaminosa com a derrota … “ - De quem?” Do povo português que, com mentiras, inverdades, eleições… perpetua um jugo decadente. Visão pessimista dos tempos? Não parece ser esta a questão, mas apenas se retoma o início da catarse efetuada: regime - do modo de governar ou governar- se . Como seria excelente que este pronome “ -se ” não implicasse um egocentrismo decadente e depauperado por parte dos setores político, económico… contra o povo português. Que líderes nos guiaram e guiam, quando o povo português cabe na capital londrina? Como sempre, a tirania tem nome!
Imagens retiradas das seguintes páginas: https://movimentodehumor.blogs.sapo.pt/tag/destaque https://jornaldiabo.com/opiniao/pedro-caetano/o-melhor-governo-do-mundo-a-governar-se/
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A EXONERAÇÃO DE JOÃO FRANCO DECRETA O FIM DA MONARQUIA MIGUEL VILLAS-BOAS
Abstract
Résumé
The dismissal of the João Franco Government was an option with tragic consequences for the Monarchy, because government stability had only returned with the reform that El-Rei Dom Carlos I was undertaking with that government. With the fall of the Government, the military forces loyal to the Monarchy suffered a severe blow, since it removed the Minister of War General António Carlos Coelho V.B. Vasconcellos Porto, considered 'Franco's military pillow' and Minister of the Navy Ayres D'Ornelas - one of Africa's last heroes alongside Mouzinho and Paiva Couceiro - and who, in addition to their pride and loyalty to the Crown, were excellent strategists and they had a strong ascendant over the high and medium military ranks, in addition to being experts in this underestimated art of nominations. Added to other nonsense imputed to the new m: the replacement in the military command of Lisbon of Pimentel Pinto by Rafael Gorjão. Thus, with the resignation of João Franco, Vasconcellos Porto and Ayres D’Ornelas, the new government signs, as the first Decree, that of the End of the Monarchy.
L’exóneration du gouvernement de João Franco était une option aux conséquences tragiques pour la monarchie, car la stabilité du gouvernement n'était revenue qu'avec la réforme qu'El-Rei Dom Carlos I entreprenait avec ce gouvernement. Avec la chute du gouvernement, les forces militaires fidèles à la monarchie ont subi un coup dur, en renvoyant le ministre de la Guerre, le général António Carlos Coelho V.B. Vasconcellos Porto, considéré comme ‘l'oreiller militaire de Franco’ et le ministre de la Marine Ayres D'Ornelas - l'un des derniers héros de l'Afrique aux côtés de Mouzinho et Paiva Couceiro - et qui, en plus de leur fierté et de leur loyauté envers la Couronne, étaient d'excellents stratèges et ils avaient un puissant ascendant dans les rangs militaires supérieurs et moyens, en plus d'être des experts dans cet art sousestimé des candidatures. Ajouté à d'autres bêtises imputées au nouveau m: le remplacement au commandement militaire de Lisbonne de Pimentel Pinto par Rafael Gorjão. Ainsi, avec la démission de João Franco, Vasconcellos Porto et Ayres d’Ornelas, le nouveau gouvernement signe, comme premier décret, celui de la fin de la monarchie.
Key words: Monarchy; Exoneration; King.
Mots clés: Monarchie; Exóneration; Roi.
João
Franco
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João
Franco
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Em seguimento de uma reunião secreta na noite do Regicídio, logo no dia 2 de Fevereiro de 1908, o Conselho de Estado, congregado no Paço das Necessidades, aprovou uma mudança na situação política que se traduziu na escolha de um novo Secretário por parte do novo Rei D. Manuel II. Assim, o 6° Marquês do Lavradio substitui o Conde de Arnoso, aliado de João Franco. Depois, o Conselho informou o Presidente do Ministério de que Sua Majestade a Rainha pretendia um ‘Ministério de Acalmação’, forçando a demissão de João Franco. " À noite, nas Necessidades, o Conselho de Estado reunido persuade o novo Rei, Infante Dom Manuel, a afastar João
Franco
e
a
formar
ministério
novo. Faz-se a vontade ao inimigo, abatem-se bandeiras perante o crime. «Os
regímenes
sucumbem
e
desaparecem, menos pela força do ataque que pela frouxidão da defesa» -
dirá o próprio João Franco. Resume, muito exactamente, um jornal, meses depois: - 'O Rei morreu na tarde de 1 de Fevereiro, no Terreiro do Paço. A Monarquia morreu nessa noite, no Paço das Necessidades ', precisamente quando a Realeza se erguia unida a um governo sério e forte. Eliminado da cena e lançado para o exílio o único homem de pulso, não há em torno de Dom Manuel II senão os velhos homens dos partidos, sempre envolvidos em querelas de vaidades, sempre obcecados pelo fito de conquistar o mando para si e para os seus amigos. Os partidos que aquele chamara de ‘rotativos’, aproveitam-se assim da inexperiência bem-intencionada do Infante adolescente para voltarem ao mesmo ‘regabofe’, depois dos esforços do rei e do seu 1º Ministro para fazerem de Portugal um país decente. ”, escreveu assertivamente o doutrinador monárquico António Sardinha.
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João Franco sai apoiado no braço do Ministro Vasconcellos Porto após demissão
De facto, a noite e os dias seguintes ao hediondo Regicídio trouxeram, não um clamor de justiça e resgate pela afronta do assassínio daquelas vidas cortadas do Rei Dom Carlos de 44 anos e do Príncipe Real Dom Luís Filipe de 22 anos, mas uma sequência de malfeitos. ‘ Que País é esse onde matam um rei e um príncipe e a primeira medida que se
toma
é
demitir
o
Ministério?! ’,
vociferou o Rei britânico Eduardo VII descontente com a responsabilização, demissão e degredo de João Franco, após o trágico Regicídio. ‘ Matam-se
Real , não podia ser admoestado pela política que desenvolvia em consonância com o Rei - cada vez mais executivo -, pois o rotativismo partidário tornara impossível governar com o Parlamento. O afastamento do Presidente do Governo seria uma opção de consequências trágicas para a Monarquia, porque a estabilidade governamental só voltara com a reforma que El-Rei Dom Carlos I estava a empreender com o governo de João Franco que perdurou entre Maio de 1906 e Fevereiro de 1908 – antes disso, nos anos anteriores sucediam-se governos um atrás do outro. ‘ Há muito a fazer e temos, para bem do País, que seguir por caminho diferente daquele trilhado até hoje; para isso conto contigo e com a tua lealdade e dedicação, como tu podes contar com o meu auxílio e com toda a força que te devo dar .’, escrevera D. Carlos na carta em que convidava João Franco a formar governo. ‘ Há muita coisa a fazer e creio que se pode e deve fazer e temos de seguir o nosso caminho doa a quem doer .’
dois Cavaleiros da Jarreteira como se fossem cães e no seu próprio País e ninguém se importa com isso ’, reiterou
o Rei-Imperador. João Franco e o seu Gabinete foram exonerados, e se de facto, o Presidente do Conselho podia ser culpabilizado de negligência na segurança da Família Real, que quase sem escolta percorreu os 100 passos até à morte num laudau, expostos à mercê dos terroristas carbonários, e se, também, podia ter comprometido a Coroa quando levantou inoportunamente a falsa Questão dos Adiantamentos à Casa
Príncipe Real, Rei D. Carlos e Ministro da Guerra Vasconcellos Porto
MARÇO 2021
PÁGINA 19 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Além disso, com a queda do Governo de João Franco Ferreira Castello-Branco as forças militares fiéis à Monarquia sofreram um rude golpe, quando o novo governo de Aclamação, chamado de Concentração Monárquica, presidido por Ferreira do Amaral, afastou o Ministro da Guerra General António Carlos Coelho V.B. Vasconcellos Porto, considerado o ‘ travesseiro militar de
D’Ornelas, o novo governo assina, como primeiro Decreto, o do Fim da Monarquia!
Franco ’ (Raul Brandão, Memórias, p.
227) e o Ministro da Marinha Ayres D’Ornelas – um dos últimos heróis de África ao lado de Mouzinho e Paiva Couceiro. Foi um desacerto fatal, pois o ministro da guerra e o ministro da marinha, respectivamente, para além de brio e fidelidade à Coroa, eram excelentes estrategos e possuíam um forte ascendente sobre as altas e médias patentes militares, para além de serem especialistas nessa subestimada arte das nomeações. Somam-se ainda outras tolices imputadas ao novo governo: a substituição no comando militar de Lisboa de Pimentel Pinto por Rafael Gorjão; no dia 6 de Fevereiro é revogada a Lei de Imprensa e ressurgem os jornais republicanos embargados por anteriormente terem sido acusados de incitamento à revolução, como o Correio da Noite, o Diário Popular, O País e o Liberal; em 12 de Fevereiro são amnistiados, os revolucionários do 28 de Janeiro de 1908, Afonso Costa, António José de Almeida, Egas Moniz, França Borges e João Chagas, e ainda os marinheiros implicados nas revoltas de 8 e 13 de Abril de 1906. Deste modo, com a demissão de João Franco, Vasconcellos Porto e Ayres
O Ministério do Presidente Almirante Ferreira do Amaral
Com o novo Gabinete Ministerial do Governo de Acalmação, no qual cabiam todos – por isso eles lhe chamavam de ‘Concentração Monárquica’ -, penetravam no Ministério, além dos dissidentes Regeneradores e Progressistas, diz-se que, subrepticiamente, os ideais republicanos, consequência das ligações sobejamente conhecidas do novo presidente do Conselho, Almirante Francisco Ferreira do Amaral, com o Clube Makavenko. No espaço de um mês, são revogados os diplomas franquistas da lei da imprensa (5 Fevereiro), decreto de “31 de Janeiro”, libertados António José de Almeida, Afonso Costa, Egas Moniz, João Chagas e França Borges, amnistiados os marinheiros revoltosos de 8 e 13 de Abril de 1906, dissolvidas as Cortes (29 de Fevereiro) e a convocadas eleições gerais para 5 de Abril. Mas o governo durante algum tempo manteve uma certa estabilidade.
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PÁGINA 20 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Todavia, consequência da demissão dos ministros da Guerra e da Marinha, a Carbonária Portuguesa, liderada por Luz de Almeida, apoiada pelo próprio grãomestre
do
Grande
Unido,
tendo
lançou-se
Oriente
agora
no
Lusitano
terreno
fértil,
recrutamento
de
fidelidades nos quartéis, especialmente na Marinha. Ao primeiro governo do reinado de Dom Manuel II, liderado pelo Almirante Francisco Ferreira do Amaral, segue-se o Governo de Sebastião Teles, apoiado por Veiga Beirão e pelos lucianistas, visando pôr ordem no exército, mas já era tarde. As chefias militares, a braços com a densa burocracia, emaranhavamse em espessos relatórios e na sua análise, assim como da decifração de falsos
e
elaboradíssimos
revolucionários
planos
idealizados
Os governos, que sucederam aos dois primeiros, avaliavam cegamente a lealdade dos militares ao regime através de sucessivas visitas a regimentos por El-Rei que era continuadamente aclamado, pois o problema não residia no Monarca de trato afável. A 11 de Abril sucede o Congresso do Partido Republicano Português, em Setúbal, com a subida de carbonários ao Directório republicano e que termina com a aprovação do programa que prevê o derrube da Monarquia pela via revolucionária. Segue-se o Governo de Wenceslau de Lima, mas que sofre forte oposição do despeitado José Luciano de Castro, que o apelida de valido de Teixeira de Sousa e qualifica o Gabinete como o governo da Politécnica do Porto.
pelos
republicanos como engodo, sem que tomassem consciência do verdadeiro perigo: o enraizamento da Carbonária entre
sargentos,
marinheiros.
Na
soldados
Câmara
Baixa
e das
Cortes o deputado republicano António José de Almeida profere um discurso iníquo merecedor de encontro com um sabre:
‘a
bomba
de
dinamite
em
revolução, e em certos casos, pode ser tão legítima, pelo menos, como as granadas de artilharia, que não são mais do que bombas legais, explosivos ao
serviço
da
ordem. ’
Mas
o
que
merecia bastão da Guarda e prisão por apelar à revolução pelo terrorismo nem sequer foi alvo de suspensão. Era a banalização
da
liberdade,
que
nada
valia porque tudo permitia!
MARÇO 2021
Bandeira da Carbonária
PÁGINA 21 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Talvez
por
liberdade
ser
que
a
época
Portugal
de
maior
gozou,
com
censura inexistente - lembremos só as caricaturas de Bordallo Pinheiro - e total liberdade de expressão, verifica-se
Valle e do Manuel Ramos, o recrutamento da Carbonária nos quartéis, os tumultos e a organização da comissão militar republicana para o derrube da Monarquia.
uma forte propaganda republicana em que se insulta o Rei por panfleto e escrito impresso através de pasquins como
A
Cartilha
do
Cidadão
da
Carbonária, e revistas como a Alma Nacional - dirigida por António José de Almeida – e dos mais diversos jornais criados com esse propósito; relembrese
o
dito
do
republicano
Brito
Camacho: ‘quanto mais liberdades nos derem,
mais
eles’.
A
delas
usaremos
propaganda
demagógica
assentava
contra
republicana em
mentiras
descaradas: vociferavam que Portugal era
um
País
analfabeto. vigência
atrasado
Ora
da
em
e
1910,
Monarquia
o
o
Povo
ainda
na
PNB
per
capita era de 60%, havia 4400 escolas
públicas
e
1000
particulares,
e
os
maiores vultos das letras portuguesas assim
como
o
progresso
material
haviam surgido a partir do Reinado de Dom Luís I e a Geração de Setenta de Eça
de
Queiroz,
Ramalho
Ortigão,
Antero de Quental, etc., atingiria o auge no reinado de Dom Carlos I,… mas a propaganda
republicana
não
SMF El-Rei D. Manuel II de Portugal
era
coarctada, em nome da liberdade de imprensa!
No Exército e na Marinha contínua o
A rede de serviços de informação da
vazio de fidelidades que já vinha da
Monarquia
deposição
Constitucional
era
de
Vasconcellos
Ayres
Preventiva,
a
estratégia reformista levou à confusão,
demissão do Juiz Veiga, à qual escapou
ao imobilismo e à deserção para as
primeiro
hostes
o
Regicídio,
após
depois,
os
engenhos artesanais de João Borges, do
-
carbonárias,
esta
que
quebra
e
assegurada pela pouco eficaz Polícia especialmente
D’Ornellas
Porto
alcança
da
o
perigoso número de 20 mil primos. A
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PÁGINA 22 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Carbonária
era
uma
organização
política, mas de cariz armado, uma espécie
de
terrorista
brigada
e
de
secreta,
artilharia,
inimiga
da
Monarquia, do clero e das congregações religiosas. Oficialmente, foi fundada em 1898 e o seu líder, desde 1900, era Luz de Almeida. Era paralela da Maçonaria, embora
sem
Maçonaria
ligações
orgânicas
Portuguesa
ou
à
outras
Obediências Maçónicas, não obstante ter utilizado algumas lojas do então Grande Oriente Lusitano Unido para aquartelar os seus órgãos superiores, e colaborado
oficialmente
Obediência
para
a
com
esta
tentativa
de
revolução republicana falhada de 28 de Janeiro de 1908 - conspiração urdida pelos republicanos, pela Carbonária e pelos dissidentes progressistas -, para o Regicídio de 1 de Fevereiro de 1908, e, depois
para
a
implantação
da
República. A Carbonária impunha aos seus
filiados
ocultamente
‘ possuíssem
que
uma
arma
com
os
competentes cartuchos ’.
Entretanto, atiravam ao Monarca Dom Manuel
II
as
culpas
que
eram
dos
políticos e do sistema que os últimos foram viciando, de sorte que, por parte do rotativismo partidário nos últimos tempos da Monarquia não havia senão interesses
e
nenhuma
sincera
dedicação à Coroa – especialmente com a partida forçada de uns poucos aptos e dedicados ao Rei e à Monarquia. Todos diligenciavam as suas comodidades e agenciavam o seu sossego e ninguém dentro do sistema estava disposto ou tinha coragem para sacrificar a vida pela
bondade
do
regímen
e
do
Como se escreveu acima, e que agora se desenvolve, a propaganda republicana assentou em ‘fake news’, mentiras e demagogia. Apregoava o burguês Partido Republicano Português que, na vigência da Monarquia, Portugal era um País arcaico, ora, em 1910, ainda em Monarquia, como se grafou Portugal tinha 60% do PNB per capita da Europa; o progresso material também se constatava nos 3 000 km de caminhos-de-ferro e nos 12 218 km de estradas reais, distritais e municipais, assim como centenas de novas pontes, das quais duas no Porto e uma sobre o Tejo; e, ainda 4 323 quilómetros de linhas telegráficas, com 119 estações. No ano de 1908, em Monarquia, o deficit da balança comercial portuguesa era de 37 558 contos. Analisando a balança comercial portuguesa entre 1908 e 1924, pode-se constatar um aumento exponencial da dependência comercial do País face ao estrangeiro, após a Implantação da República. Até nesse aspecto, Portugal deixou a quase autossuficiência para uma dependência quase crónica, como facilmente se constata: Em 1910 era de 33 786 contos, em 1912 nota-se já uma evolução do défice que aumenta para 40 730 contos, e assim continua na 1ª república, com 53 256 contos em 1913, e sempre a subir até ao record de 2 009 214 contos em 1924, aumentando exponencialmente o atraso e a dependência económica do País face às Nações mais industrializadas da época. Após a Implantação republicana de 1910 seguiram-se além das perseguições políticas, religiosas e o revolverismo, também, o desequilíbrio orçamental, a desvalorização da moeda e um aumento galopante da dívida pública:
Monarca.
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PÁGINA 23 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Desequilíbrio orçamental: 1910 = 60 000 libras 1912 = 1 203 000 libras Dívida Pública: 1910
(Monarquia
Constitucional
Portuguesa ) = 137 668 libras 1912 (1ª República Portuguesa) = 1 203 000 libras Em plena Monarquia, no desfile do 1.º de Maio de 1897, marcaram presença 50.000
trabalhadores,
perturbação
da
sem
qualquer
ordem,
e
sem
intromissão das autoridades. Exultante, o socialista Luís Figueiredo afirmou: ‘ A Monarquia tem a virtude de actuar como instituição moderadora ’. A esse
entendimento
não
possibilidade
de
comícios
era
alheio
todos
livremente
e
a
fazerem de
estar
consagrado o direito à greve. Recordese
que
em
1852
Promotor
surgiu
dos
Laboriosos ,
Melhoramentos
aquele
apelidar
do
Centro
o
que
se
primeiro
pode
sindicato
português, que reunia socialistas como Azedo
Gneco,
Também,
em
Batalha 1871
é
Reis,
etc.
fundada
Bandeira do Reino de Portugal
a
Fraternidade Operária , e em 1875 o
A Monarquia é deposta pela golpada
Partido Socialista denominado a partir
republicana e tudo mudou: 2 meses,
de
78
de
Socialistas
Partido de
dos
Portugal
Operários
e
cujo
imediatamente, república
-
a
à
proclamação
dita
Velha
-,
o
da caos
dirigente, o supra-citado Azedo Gneco,
originado leva o jornal O Sindicalista ,
dirigiu-se desta forma a El-Rei Dom
num
Manuel
II:
‘ Venho
agradecer
artigo
levantar
de
uma
sugestivo
título,
pertinente
a
questão:
reconhecidíssimo o bilhete e a carta
‘ Quem tem ganho com a República?
que V.M. houve por bem enviar-me e o
Quem Tem Ganho? ´, fazendo eco das
interesse que V.M. continua a tomar
queixas dos operários e dos sindicatos
pelos seus operários. Mal sabem eles
relativamente às limitações impostas
do alto patrocínio que tão eficazmente
pelo governo ao direito à greve.
os está auxiliando neste momento ’.
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PÁGINA 24 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Os Decretos com força de lei de 14 de
Como escreveria António Sérgio in ‘Breve
Março, 5 e 20 de Abril, bem como de 11 e
Interpretação da História de Portugal’:
12 de Maio de 1911, da responsabilidade
‘ Em 1910 abolia-se a Realeza… Fez-se
do ministro do interior António José de
uma verdadeira República? Não se fez…
Almeida
sufrágio
Não passava de formalismo político, sem
secreto, directo e facultativo, com quase
conteúdo reformador na economia e na
universalidade.
eleitores
educação.
recenseados correspondiam à somítica
economia
percentagem de 10% sobre o total da
democratizou realmente nada, nenhum
referiam-se
população:
1
a
Mas
472
um os
908
de
cidadãos
masculinos maiores de 21 anos, para uma população total de 5 960 056 habitantes. O Parlamento passou a ser um clube privado,
com
acesso
limitado
por
Não
se
aperfeiçoou
existente,
nem
Corredor
Constitucional,
que
dá
em
acesso
à
que
Sala
vida
económica
e
rural
(como
assistência) sofreu as reformas que se fazia mister. ’
o
das
tantos Passos Perdidos , nome que vem período
da
Monarquia,
pois
os
Deputados recebiam ali os Cidadãos do Reino e ficavam a vaguear enquanto conversavam - como caminharam, uns e outros, dando muitos passos, assim se deu ao corredor o nome de “Passos Perdidos”.
Além
disso,
nesses
bons
tempos de Monarquia, era habitual e permitido aos visitantes Portugueses nas galerias levantarem-se e interromperem as
Sessões
insurgir-se, perguntas
para
reclamar,
protestar,
e,
também,
colocar
aos
deputados
da
O primeiro ministério de João Franco, 1906
Nação.
Nada mais natural, se existia a premissa que
a
Câmara
Baixa
das
Cortes
representava o Povo e assim sendo, o Povo,
por
ser
interromper
as
Soberano, Sessões.
poderia Com
a
propriedade, o crédito, a educação ou a
Sessões do Parlamento era palco de do
se
dos factores de importância básica na
bilhete! Que diferença das Cortes na Monarquia
a
a
República, perdeu-se esse direito assim como se perdeu o Direito de andar nos Passos Perdidos.
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PÁGINA 25 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
A QUESTÃO DO REGIME: MONARQUIA – REPÚBLICA ANTÓNIO PIMENTA DE CASTRO
Abstract
Résumé
The last electoral campaign for the
La dernière campagne électorale pour
Presidency of the Republic resulted in
la présidence de la République s'est
the
Portuguese
traduite par l'indifférence du peuple
people and revealed a lack of quality in
portugais et a révélé un manque de
the
qualité
indifference debates
of
among
the the
candidates,
dans
les
débats
candidats,
and very weak “preparation” for the
niveau
highest office in our sad country.
«préparation» à la plus haute fonction
A President of the Republic is chosen
dans notre triste de campagne.
by groups or parties that will obviously
Un
demand that commitment and choice.
choisi par des groupes ou des partis qui
Therefore, he is not and cannot be an
exigeront évidemment cet engagement
"independent" person.
et ce choix. Par conséquent, il n'est pas
the
dignity
of
the
highest
et
culturel
président
ne
peut
et
de
pas
leur
les
demonstrating their low cultural level
Thus,
démontrant
entre
leur
la
très
faible faible
République
être
une
est
personne
magistracy in the country will only be
«indépendante».
possible in Monarchy. Who better than
Ainsi,
a
magistrature du pays ne sera possible
King
to
look
after
the
People's
things?
que
la dans
dignité la
du
monarchie.
plus Qui
haut mieux
qu'un roi à surveiller les choses des Key
words:
electoral republic.
Presidential campaign;
elections;
gens?
Monarchy; Mots
clés:
campagne république.
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Élections
présidentielles;
électorale;
Monarchie;
PÁGINA 26 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Quem assistiu à última campanha eleitoral para a Presidência da República Portuguesa, para além de assistir a um triste espetáculo, pôde constatar o baixo “nível” da “nossa” classe política, com uma ou outra exceção. Os “debates” entre os candidatos, para além do seu baixo nível, constituíram uma autêntica “peixeirada”, demonstrativa do seu do baixo nível cultural e fraquíssima “preparação” para o referido mais alto cargo do nosso triste país. Confesso que senti, como português, vergonha pelo que se passou, nos ditos órgãos da comunicação social. Como professor de História que sou, ficava arrepiado ao saber que os meus alunos estariam a assistir àquele horrendo “espetáculo”. Mais uma vez ficou demonstrado, para quem tinha dúvidas, o baixo nível da “nossa” República. Tinha toda a razão António Sardinha quando, já no seu tempo, escreveu: “E eu abençôo,
Coulanges,
«o
verdadeiro
patriotismo
não é o amor ao solo, é o respeito pelas gerações que nos antecederam ”»[3]. A
este propósito, vejam-se as atrocidades que se dizem do nosso passado histórico e das nossas Descobertas e o que fazem, e querem continuar a fazer aos nossos monumentos,
evocativos
desse
nosso
glorioso passado. Eu tenho orgulho em ser português e estarei sempre, sempre, na linha da frente para combater essas “barbaridades”.
Não
podemos
permitir
que meia dúzia de “infames” queiram destruir a nossa Gloriosa História. Quem não
respeita
a
História
do
seu
país,
compreendendo a época em que os factos foram feitos, não se respeita a si próprio, nem, muito menos aos seus antepassados, que triste sina esta…
abençôo esta República trágico-cómica que me vacinou a tempo pela lição da experiência [1]".
Também o povo, na sua sensata sabedoria, quando vê uma situação em que ninguém se entende, diz, com uma cara assustada: “Isto é uma verdadeira República ”. Ou ainda as palavras, ainda muito atuais, do próprio republicano presidente do ministério, António Maria da Silva, a confessar, alarmado, num momento de sinceridade – «“ O País tem estado a saque! »[2]. E, digo eu, ainda
continua a estar. Como disse Fustel de [1] - No livro “O Integralismo Lusitano”, página 27, Edições GAMA, MCMXLIII. [2] - Idem, página 60. [3] - Idem, - página 119. Imagem retirada da seguinte página: https://expresso.pt/presidenciais2021/2021-01-08-Marisa-perde-tambem-contra-Joao-Ferreira.-Eis-as-notas-doscomentadores-do-Expresso-e-SIC
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PÁGINA 27 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Todos estamos preocupados com a atual situação política que estamos a viver, com o futuro e o emprego dos nossos filhos e com o porvir do nosso querido País. Não é só o Covid-19 que nos preocupa, é sobretudo o que vai suceder após esta horrível pandemia… Como escreveu Mário Saraiva: “E os direitos cívicos implicam o dever de os saber usar. De modo nenhum pode tomar-se com indiferença a questão
de ditadura («à turca», sem Parlamento). Os Executivos – ou ministérios, como então
são
designados
–
duram
em
média três meses e alguns sobrevivem por
uns
tantos
Republicano
dias.
cinde-se
Democrático,
de
O
Partido
em
Afonso
três:
o
Costa;
O
Evolucionista, chefiado por António José de Almeida e; e o Unionista, de Brito Camacho – e em cada um germinam
política. É dela que dependem o melhor
grupos de interesses. O combate político
ou o pior governo, a orientação nos
entre
campos
assenta no ódio, na violência (não nos
administrativos,
social,
as
várias
fações
económico e espiritual, a ordem, a
esqueçamos
liberdade,
A
terrorismo. A Grande Guerra (1914-1918)
política marca um sentido na vida da
piora tudo e o custo de vida aumenta 30
nação
vezes. [5]".
e
a
segurança
decide
Inadmissível,
por
do
nacional. seu
futuro.
conseguinte,
a
indiferença política. (Diria que) , temos de pensar, já, nesse futuro e de modo nenhum
pode
tornar-se
com
indiferença a questão política. (…) A política marca um sentido na vida da nação e decide do seu futuro .”[4]. A
questão do regime é fundamental. Aproveitemos este “confinamento”, para pensar nisto. O Rei identifica-se com a Pátria. Nunca, desde o 5 de Outubro de 1910, houve um plebiscito que a veio legalizar, nasceu de um ato revolucionário. E sabemos muito bem que a história da primeira República é complicada, assim; “ A História da I República
é
escassos
16
Parlamentos,
trágica. anos, oito
Ao
longo
elege Presidentes,
de sete e
conhece 45 Governos, além de vários de
da
republicanas
Carbonária),
no
Todos sabemos que um Presidente da República (não me estou a referir a alguém em particular) é escolhido por grupos
ou
partidos
que,
obviamente
cobrarão esse empenho e escolha, como é, aliás do conhecimento geral. Portanto, não
é
nem
pode
ser
uma
pessoa
“independente”, vemos claramente isso em todos os países republicanos, pois tem
de
estar
ligado
a
grupos
de
interesses…que, obviamente recolherão o fruto do “seu empenho”. Os seus apoios, não
são
cobrados,
“desinteressados”, após
a
vitória,
não
serão nos
iludamos. Como escreveu Mário Saraiva: “ Não queremos de modo algum insinuar que não exista no credo republicano o mesmo sentimento de justiça, antes pelo contrário, mas a verdade é que se
[4] - Mário Saraiva, Razões Reais, 2ª Edição, página 16, QP, Lisboa, 1970. [5] - Catarino, Manuel, “Amália – Segredos, Episódios, Excentricidades”, páginas 20 e 21, Editora Guerra & Paz, 1º Edição, setembro de 2019.
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PÁGINA 28 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
lhe deparam maiores obstáculos para
constitui
o transpor da ideia à prática [6]. O
mesmo em qualquer regime condiciona
Nome República, vem dos clássicos, sobretudo dos latinos, de “Res-pública – República – Coisa do Povo” e quem melhor de que um Rei olha pelas coisas do Povo? Pelo contrário a Realeza
um
poder
moderador
que,
o equilíbrio. Ou seja, na Monarquia a instituição dinástica identifica-se com a imortalidade da Pátria, uma vez que o Rei se identifica com o Povo.
S.A.R., o Senhor Dom Duarte de Bragança.
[6] - Idem, Ibidem, página 47.
MARÇO 2021
PÁGINA 29 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
D. PEDRO II E A CIDADE DO PORTO HUMBERTO PINHO DA SILVA
Dom Pedro II
Abstract
Résumé
Dom Pedro II, emperor of Brazil, visited
Dom Pedro II, empereur du Brésil, visita
Porto twice, the first landed on March
Porto deux fois, le premier débarqua le
1, 1872 and was received apotheotically
1er
by the people.
apothéotiquement par le peuple.
The
second
arrived
in
Lisbon
on
Le
mars second
1872 arrivé
et à
fut
Lisbonne
reçu le
7
December 7, 1889, went to Porto, where
décembre 1889, se rendit à Porto, où
the empress died on the 28th of the
l'impératrice mourut le 28 du même
same month.
mois.
Key words: D. Pedro II; travel; Porto.
Mots clés: D. Pedro II; voyage; Porto.
MARÇO 2021
PÁGINA 30 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
os
Desembarcou, o Imperador, no dia 1 de
Imperadores e a população da cidade da Virgem; e desta, pelas terras de Vera Cruz, pois muitos foram os portuenses, que fizeram fortuna no Brasil. Seu pai, D. Pedro I, chegou mesmo a legar, ao burgo tripeiro, o coração, grato pela forma como sempre foi recebido nessa cidade. D. Pedro II realizou duas visitas à cidade do Porto. Na primeira, foi recebido apoteoticamente pelo povo, que com entusiasmo O aplaudiu ao longo do trajecto, entre a estação ferroviária das Devesas, em Gaia, e a cidade do Porto. Na segunda, o Imperador, viu falecer, no burgo portuense, a Mulher (filha do Rei Francisco I,) o que agravou, ainda mais, a aflitiva angústia em que vivia, pela afronta que lhe fizeram ao destrona-Lo. Ele, que sempre foi correcto, justo, pronto a perdoar a todos mesmo aos antagonistas. Acerca de D. Pedro II, Ramalho Ortigão, escreveu, em Junho de 1971, nas “Farpas”, Vol. XII: “O Sr. D. Pedro II cultivou o seu
Março de 1872, pelas seis e meia da
Sempre
existiu
amizade,
entre
talento:
é
filólogo,
é
naturalista,
conhece
a
história,
a
filosofia,
a
química, a medicina. De sorte que,
manhã, vindo de comboio, na estação das Devesas (Gaia), sendo recebido pelas autoridades e muito povo. A banda de música do Palácio de Cristal, animou a recepção. Seguiram os Soberanos, para o Porto, atravessando a bela Ponte Pênsil, que fora engalanada de vistosas bandeiras, assim como todas as artérias, por onde passava o Imperador, com: galhardetes, arcos e bandeiras. Nesse mesmo dia, visitou, na Igreja da Lapa, o mausoléu, que contem o coração de D. Pedro – Seu Pai. Deslocou-se
depois:
à
Igreja
de
S.
Francisco, à Igreja da Misericórdia, ao antigo Convento de S. António, em S. Lázaro e à Academia de Belas Artes. À noite D. Pedro II concedeu, no Hotel do Louvre – que ficava na esquina da Rua do Rosário e a Rua do Triunfo (actual D. Manuel
II)
–
recepção,
a
numerosos
convidados, que durou cerca de duas horas.
quando um grande homem faz um
Assistiu, de seguida, no teatro Baquet, à
discurso ao imperador, o imperador
comédia
remunera-o fazendo um discurso ao
Caminho da porta”.
grande homem”
No dia seguinte, o Imperador, aguardava,
Existe interessante livrinho, impresso em Coimbra, no ano de 1872, intitulado: “ Viagem dos Imperadores do Brasil em
Portugal ”,
descreve Soberano:
a
que
minuciosamente
primeira
estadia
do
de
Machado
de
Assis :
“O
no hotel, a visita do romancista Camilo Castelo Branco, mas este desculpou-se de não estar presente, invocando motivo de saúde.
MARÇO 2021
PÁGINA 31 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Sem vaidade, simples, como sempre foi, D. Pedro II, resolveu deslocar-se à casa do escritor. Luiz Oliveira Guimarães , em: “O Espírito e a Graça de Camilo” – Edição Romano Torres – 1952, – conta-nos o curioso encontro: “Em 1872, Camilo que morava, então,
Era preciso translada-La para o Panteão de S. Vicente (de Fora) em Lisboa. O Imperador
não
possuía
a
quantia
necessária.
no Porto, na Rua de S. Lazaro, foi visitado
pelo
Imperador
do
Brasil,
que o condecorou com a Ordem da Rosa.
Na
pequena
romancista,
havia,
sala
do
pendurados
na
parede, além de vários retratos dos Braganças,
o
retrato
do
poeta
Béranger. O Imperador detinha-se a examinar a pequena galeria, quando Camilo observou: “
-
Vossa
Majestade
está
a
contemplar os retratos dos seus avós… “-Mal imagina, meu amigo, em que eu
estou
reparar
a que
reparar!
Estou
Béranger
a
tem
expressão muito mais feliz do que os meus antepassados… “
-
E
sabe
Vossa
Majestade
porquê? “ Porque é menos perigoso fazer versos, do que decretos!”
Grande Hotel do Porto
Mais tarde o escritor dedicar-lhe-ia o romance: “Livro de Consolação”. A segunda visita e última à cidade, pelo D. Pedro II, foi, como disse, angustiosa e dramática: D. Pedro II hospedou-se no Hotel do Porto, na Rua de Santa Catarina. A Imperatriz, muito doente, faleceu, a 28 de Dezembro de 1889, dizendo angustiosas palavras de tristeza: “Ó Brasil… minha terra tão linda e não me deixam lá voltar!...”
O médico, Mota Maia, condoeu-se da atroz aflição, e foi contar ao Cônsul, o embaraço de sua Majestade. Este, movido de compaixão, lembrou-se do Visconde de Alvares Machado, homem rico, que fizera fortuna no Brasil. Avisado
pelo
prontamente
Cônsul, emprestou
o
Visconde, a
solicitada – vinte contos fortes.
MARÇO 2021
quantia
PÁGINA 32 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Deste modo evitou-se o constrangimento de se pedir empréstimo bancário, e que a noticia caísse no domínio publico. Doente, amargurado, triste, o Imperador (e Família,) partiu para o exílio, onde faleceu, a 5 de Dezembro de 1891 – com 66 anos de idade, – no hotel Berdford, em Paris. D. Pedro II era um homem culto, inteligente, notável intelectual, admirado e respeitado em todo o mundo. O prestígio granjeado pelo Imperador, levou o governo republicano de França a realizar as exéquias só prestadas a
Chefes de Estado, na igreja Madeleine. A urna, que continha terra brasileira, terminada a cerimónia, foi transportada, de
comboio,
sepultado
para
no
Lisboa,
mausoléu
onde
Real
de
foi São
Vicente de Fora, ao lado de Sua Mulher, a Imperatriz Tereza Cristina Maria. Trinta anos depois da sua morte, era proclamada a lei do banimento, que permitiu,
que
os
restos
mortais
do
Imperador e Sua Mulher – a 8 de Janeiro de
1921,
–
fossem
Petrópolis, Brasil.
Sepultura de D. Pedro II e da Imperatriz Teresa Cristina na Catedral de Petrópolis, Brasil
MARÇO 2021
trasladados
para
PÁGINA 33 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
A MONARQUIA PRESIDENCIALISTA TOMÁS A. MOREIRA
Abstract
da Causa Real, visto que me ouviam na Although
unusual
and
possibly
regarded as a nonsense, a presidential government
system
should
considered
be
in
a as
Monarchy a
valid
alternative for Portugal.
qualidade
de
da
sua
Direcção Nacional, pelo que respondi, de forma sucinta e ordeira: “… que a Causa Real e os seus associados defendem
uma
Key words: Presidentialist monarchy;
constitucional
alternative; regime.
separação, poderes
monarquia
democrática,
balanço
das
e
com
limitação
instituições
do
dos
Estado,
incluindo os do Rei. O funcionamento
Résumé
exacto dum novo regime monárquico
Bien que ce soit inhabituel et puisse sembler absurde, une Monarchie avec un système de gouvernement présidentiel ne doit pas être exclue en tant que alternative pour le Portugal. Mots clés: Monarchie
Vice-Presidente
présidentialiste;
não seria definido pela Causa Real, onde naturalmente
convivem
várias
sensibilidades, mas sim pelo Parlamento que viesse a definir as novas bases constitucionais.
O
provavelmente monarquias
novo
regime
seria
muito
próximo
das
europeias
que
todos
conhecemos em que o Rei não tem
regime; alternatif.
funções executivas.”
Não resisti a acrescentar resumidamente Numa entrevista à Real Gazeta do Alto
a minha perspectiva pessoal:
Minho (nº 15, Março 2018) perguntaram-
“Pessoalmente – e sem vincular a Causa
me “qual o modelo de Monarquia que
Real onde cabem opiniões diversas – na
defende para Portugal”. Pensei numa
monarquia constitucional e democrática
exposição algo extensa, mas considerei
que
dever transmitir a posição institucional
Governo
MARÇO 2021
defendo
existiria
eleito
um
Chefe
directamente
de por
PÁGINA 34 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
sufrágio
universal
Parlamento
(que
e
não
teria
pelo
funções
predominantemente legislativas e uma composição mais rica e capaz do que o nosso actual). Se quiser, é o modelo dos Estados Unidos da América mas em
que fica reservado para o Rei ou para um Presidente designado indirectamente. O Parlamento detém poderes legislativos (directos) e executivos (indirectos, através do seu poder sobre o governo), o que lhe
que o Presidente seria apenas chefe do
dá a posição de liderança na gestão
governo e não chefe do estado, lugar
pública. A principal luta eleitoral faz-se
que estaria reservado ao Rei.”
em
Acrescento agora mais algumas notas para justificar e aprofundar esta visão. Em termos de Regimes , a Monarquia e
partidos políticos, que detêm um peso
a República são alternativas legítimas para regulamentar a forma de preencher a Chefia do Estado. No plano dos Sistemas de governação democrática, o Parlamentarismo e o Presidencialismo são modalidades identicamente aceitáveis para definir a forma de escolha e os poderes do Governo e do seu Chefe. Teoricamente podemos ter repúblicas parlamentares ou presidencialistas; monarquias parlamentares ou presidencialistas. 1.
eleições
legislativas
através
dos
forte no controle do Estado. Sendo
o
Parlamento
composto
por
representantes de partidos, os chefes de governo habitualmente são os líderes dos partidos maioritários (ou de coligações). O eleitor é chamado a votar num partido, mas no fundo está a escolher o chefe de governo,
podendo
sentir-se
dividido
quando não reconhece no líder do seu partido
preferencial
características exercício
ou
esse
as
melhores
condições
cargo,
o
para
que
o
gera
fenómenos de voto útil e de transferência artificial do eleitorado em função dos
Sistemas parlamentares
chefes partidários de cada momento. O parlamentarismo é o sistema mais habitual na Europa ocidental tanto em Repúblicas como em Monarquias; casos próximos de nós são a Espanha, a Itália, o Reino Unido ou a Alemanha. O Governo, com poder executivo, emana do Parlamento e responde perante este. O Chefe do Estado apenas os pode dissolver em situações restritas. O Chefe do Governo pode ter várias designações (Primeiro-Ministro, Presidente do Governo, Presidente do Conselho, Chanceler, etc.) e não é Chefe de Estado, cargo sem funções executivas
O parlamentarismo é acusado de dividir o poder, de criar instabilidade governativa e
executivos
fracos
e
sectários.
A
fragmentação partidária, uma tendência actual em muitas democracias, dificulta a constituição
de
governos
estáveis
e
duradouros, capazes de concretizar um programa.
Coligações
não
pré-
anunciadas podem deturpar o sentido de voto dos eleitores. Manuel
Braga
brilhantemente
MARÇO 2021
da
Cruz
como
já a
descreveu República
PÁGINA 35 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
República Portuguesa poderia evoluir para uma Monarquia Parlamentar (“ O Rei e a Constituição ” palestra em 2016,
publicada em “ Quando o Povo Quiser ”, Real Associação de Lisboa, 2020). Devido à tradição anglo-saxónica é hábito considerar, sem grande reflexão nem debate, que este sistema é o que melhor convive com um regime monárquico em que o Rei não tenha qualquer função executiva efectiva.No entanto, o parlamentarismo foi o principal responsável da queda da nossa Monarquia Constitucional. Os seus excessos também destruíram a 1ª República. Justificar-se-ia uma nova experiência parlamentarista?
2.
Sistemas semi-presidencialistas
Exemplos deste sistema são Portugal, França e a Rússia. No semi-presidencialismo, por natureza incompatível com o regime monárquico, cabem vários sub-tipos, em função de maiores
ou
menores
poderes
presidenciais. O Chefe do Estado é eleito directamente o que lhe dá uma forte legitimidade, mas nomeia
um
Chefe
de
Governo
para
chefiar o executivo, para o que deve ter em
consideração
a
composição
parlamentar. As eleições para o Parlamento e para a Presidência
não
costumam
ser
simultâneas e naturalmente acontece o Presidente
e
a
maioria
parlamentar
serem de cores política divergentes e terem
posições
conflitos,
antagónicas,
bloqueios
ou
gerando
obrigando
a
compromissos de coabitação, tudo fontes de instabilidade governativa.
Dom Manuel II com o Presidente do Conselho. O parlamentarismo foi o principal responsável pela queda da Monarquia Constitucional Representantes do Semi-presidencialismo. A democracia portuguesa tem vindo a ser corroída pelo semi-presidencialismo
MARÇO 2021
PÁGINA 36 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Há poucos defensores deste sistema híbrido, que é mal compreendido pelos eleitores, dá azo a lutas de poder e à desresponsabilização dos eleitos. A democracia portuguesa tem vindo a ser corroída pelo semi-presidencialismo, começando a haver consenso quanto à necessidade de uma reforma profunda. 3.
Sistemas presidencialistas
São bem conhecidos os casos dos EUA, Brasil e Argentina. O presidencialismo democrático caracteriza-se pela eleição duma pessoa para Chefe do Governo, detentor do poder executivo. Habitualmente (mas não obrigatoriamente) essa pessoa é também Chefe do Estado. O Chefe do Governo, normalmente designado por Presidente, é a principal fonte de poder no Estado. Organiza e dirige o seu Governo como entender, sem submissão ao Parlamento com o qual está em pé de igualdade em termos de legitimidade, pelo que não tem o poder de o dissolver. As eleições mais decisivas são as presidenciais, cujo resultado frequentemente foge ao controle dos partidos políticos. O Parlamento tem limitadas funções de controle sobre o Executivo, mas detém o exclusivo do poder legislativo, podendo assim condicionar a governação, o que tem o potencial de gerar conflitos. O presidencialismo é mais transparente do que o parlamentarismo e evita a tradicional instabilidade de que este padece a par da chaga da excessiva partidarização da política. Os poderes executivo e legislativo estão claramente separados. O eleitor pode distribuir o
seu voto (sobretudo se as eleições não forem
simultâneas),
apoiando
para
o
Parlamento o partido do qual se encontra doutrinariamente mais próximo e para Chefe
do
Governo
quem
lhe
pareça
demonstrar maior liderança, capacidade de
concretização
ou
seriedade.
Os
deputados podem legislar de forma mais racional,
livres
da
pressão
de
obrigatoriamente apoiar ou contrariar um governo que elegeram ou ao qual se opõem[1].
Sidónio Pais, o Presidente-Rei. Talvez o caso mais paradigmático do Presidencialismo em Portugal
[1] Para aprofundar o tema existe muita literatura. Leia-se por exemplo “Juan Linz, Presidentialism and Democracy – A Critical Appraisal”, de Scott Mainwaring e Matthew Shugart, 1977, Comparative Politics. https://scholar.harvard.edu/files/levitsky/files/mainwaring_shugart.pdf
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PÁGINA 37 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
Muitos constitucionalistas e políticos defendem na teoria a superioridade do sistema presidencialista, pela unidade de comando, garantia de cumprimento de toda a duração dos mandatos, clareza de atribuição de funções e responsabilização directa do Chefe do Governo perante o eleitor, mas receiam a concentração de poder no Presidente e seu eventual abuso (preocupação acrescida em Portugal pela longa experiência de poder pessoal de Salazar). 4.
Monarquia Presidencialista
Em regimes monárquicos, apesar de não ser usual e poder parecer um contrasenso, não deve excluir-se um sistema de governação presidencialista. O Rei assegura a função formal de Chefe de Estado, sem qualquer poder executivo, legislativo ou judicial, estando-lhe naturalmente reservado o papel de moderador, que não precisa de ficar regulamentado na Constituição, visto que não é propriamente um direito ou uma função, mas antes um estatuto inerente ao cargo. O Chefe do Executivo é eleito por sufrágio universal personalizado, podendo nomear e exonerar livremente os membros do seu governo, no qual não é apenas o “primeiro dos ministros”, pelo que deve designar-se por “Presidente”: Presidente do Conselho, do Ministério ou do Governo, ou até mesmo Presidente da República (considerando a república como sinónimo de “aparelho do Estado”, como defendem constitucionalistas). Fica assim independente dos partidos e do Parlamento, que exerce o poder
legislativo,
não
obrigatoriamente
em
consonância com o Presidente. O
presidencialismo,
com
todas
as
vantagens que se lhe reconhece, adequase
bem
ao
regime
monárquico,
que
permite controlar eventuais excessos do Presidente (principal risco que se lhe aponta), ao colocar no topo da hierarquia o Rei, que duma ou outra forma acaba sempre por exercer o seu poder de moderador e árbitro. A preparação dos Reis para o seu cargo, a perenidade e estabilidade constitucional que
garantem,
a
identificação
dos
cidadãos com as famílias reais e o seu prestígio
internacional,
aquilo
que
representam em termos de estética, de símbolo
de
sentimento
unidade, de
comunidade, complementam,
de
pertença são
reforço
do
a
uma
factores
que
enriquecem
e
equilibram um regime presidencialista e ajudam a manter a unidade da nação para
lá
das
disputas
ligadas
governação.
O Rei e o Presidente O Rei complementa, enriquece e equilibra um regime presidencialista
MARÇO 2021
à
PÁGINA 38 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
5.
A Monarquia Presidencialista em
Portugal
do sistema, mas o Presidente conservaria alguma forma de direito de veto quanto a
Começa a ser consensual que a eventual reinstauração da Monarquia em Portugal não ocorrerá duma forma súbita, através dum surpreendente referendo, duma inesperada decisão parlamentar maioritária ou dum improvável golpe de estado, mas sim através duma evolução gradual e progressiva, relativamente lenta e faseada. A primeira etapa desse processo, sem necessidade de alterar a Constituição, pode ser uma República Coroada, na qual ao Duque de Bragança, não reconhecido como Chefe de Estado, é atribuído um papel cerimonial meramente simbólico, despido de qualquer poder funcional. Esta fase permitiria uma rápida transição para uma monarquia presidencialista, na qual o Rei já seria Chefe do Estado, mas sem quaisquer poderes na governação ou no funcionamento da máquina do Estado, entregues a um Chefe do Governo eleito por sufrágio universal, que continuaria a intitular-se Presidente, preferentemente até Presidente da República. Este assumiria muitos dos actuais poderes constitucionais do Chefe de Estado, não só os respeitantes ao Governo, mas provavelmente também os ligados ao Comando Supremo das Forças Armadas, à nomeação de embaixadores, ratificação de tratados internacionais, convocação de referendos, indulto de penas, e outras a definir. Seria demasiado exaustivo pormenorizar aqui as exactas modalidades práticas de funcionamento
decisões do Parlamento, como é habitual em regimes presidencialistas. 6.
Vantagens da Monarquia
Presidencialista em Portugal
O actual semi-presidencialismo é um compromisso
táctico
que
verdadeiramente não agrada a ninguém e degrada a qualidade da governação. Os
povos
nórdicos,
comunitarista,
de
revêem-se
parlamentares,
tradição
em
regimes
os
latinos,
enquanto
individualistas por natureza, tendem a identificar-se
com
sistemas
presidencialistas. A Monarquia Presidencialista salvaguarda a
pessoa
do
Rei,
permite
preservar
princípios democráticos na eleição para o Parlamento e na escolha eleitoral do Chefe de Governo, e respeita a “forma republicana de governo”, inscrita como imutável na nossa Constituição. Seria importante manter para o chefe do executivo
o
título
de
Presidente
da
República: Não se rompe a tradição dessa função no último século e facilita-se a adesão
da
esmagadora
maioria
da
população, que deseja poder escolher a pessoa que detém o poder efectivo no Estado, mas que ela tenha um mandato temporalmente facilmente
limitado
substituída
Permitiria ainda resolver
MARÇO 2021
e
possa
sem uma
ser
rupturas. questão
PÁGINA 39 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
prática, talvez mesquinha e ignorada mas bem real, ou seja, ultrapassar a ambição secreta de todos os nossos dirigentes partidários de um dia virem a ser Presidentes, que constitui provavelmente a mais forte razão de se oporem tenazmente a um regime monárquico, no qual imaginam que isso deixaria de ser possível. A Monarquia Presidencialista permitiria conciliar a vantagem dum Presidente popular, chefe dum Executivo forte, com a certeza de poder limitar a sua influência, não só através dum Parlamento independente e de mandatos limitados no tempo, mas também através da Chefia de Estado, onde o Rei dá garantias de imparcialidade, independência e estabilidade.
As ocasiões históricas em que fomos governados
com
um
comando
claro,
directo e personalizado indicam que o nosso
povo
poderia
aderir
com
entusiasmo a esta solução, uma gigante evolução civilizacional para o (hoje pobre e
ineficaz)
sistema
constitucional
da
democracia em Portugal. Assim os portugueses tenham a lucidez de o desejar e impor.
MARÇO 2021
PÁGINA 40 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
ENTREVISTA AO EXMO. SENHOR DEPUTADO DR. ASCENSO SIMÕES
“… O SENHOR D. DUARTE, ENQUANTO REFERENTE HISTÓRICO, É MAIS DO QUE UM PASSADO COMUM, É TAMBÉM UM SÍMBOLO DE UNIDADE NA DIVERSIDADE…”
MARÇO 2021
PÁGINA 41 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
P.- Que leitura faz do papel do Senhor
P.- E acha que o Estado Português
D. Duarte nos Países de Língua Oficial
valoriza
Portuguesa ao longo dos anos?
Duarte
R.- Tenho duas leituras que resultam de duas visões distintas. A primeira é a que se prende com as sociedades desses países e que me diz que o Senhor D. Duarte, enquanto referente histórico, é mais do que um passado comum, é também um símbolo de unidade na diversidade; a segunda é a que se liga ao facto de integrar a Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros e que permite constatar a influência diplomática e humanitária que o Senhor D. Duarte tem em África e em Timor.
esse e
das
tem um papel numa comunidade de afetos secular?
R.- Mais do que isso. A forma como o Senhor D. Duarte gere as suas relações com os diferentes povos é de afetos e é de autoridade.
do
Senhor
instituições
a
D. que
preside?
R.- Não, não acho! Eu tenho um livro de 2016 em que me pronuncio sobre a diplomacia
informal
dos
“grandes
portugueses”. Acho que ganhamos ou perdemos
quando
olhamos
para
as
nossas referências e as colocamos, ou não, ao serviço de Portugal. P.-
Recordar-se-á
Duarte
esteve
acolhimento P.- Quer dizer que o Senhor D. Duarte
papel
que na
dos
o
Senhor
vanguarda timorenses
D. do que
vieram para Portugal no tempo prévio à invasão de Timor pela Indonésia...
R.- Não só me recordo como ainda hoje há memória disso. Alguns dos quadros políticos de Timor Leste foram acolhidos em Portugal pelas instituições da Casa do Senhor D. Duarte.
“A FORMA COMO O SENHOR D. DUARTE GERE AS SUAS RELAÇÕES COM OS DIFERENTES POVOS É DE AFETOS E É DE AUTORIDADE.” SAR D. Duarte de Bragança Real na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, no distrito de Samsen, Bangkok, Outubro de 2017
MARÇO 2021
PÁGINA 42 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
“AS GRANDES NAVEGAÇÕES QUINHENTISTAS SÃO MARCAS QUE QUALQUER PORTUGUÊS DEVE ELEGER NO SEU ORGULHO PÁTRIO.” P.- Ele tem cidadania timorense...
P.- Decorrerá do processo natural de afirmação
R.-
Um
gesto
muito
bonito
que
demonstra que há formas de olhar o passado pelo lado bom que ele teve.
podem
ter
um
povos
depois
das
Independências?
R.- Olhando friamente para as relações
P.- E não acha que as instituições monárquicas
dos
papel
importante na irmanação de vontades
dos
portugueses
com
guineenses,
angolanos e moçambicanos eu penso que tardamos na consagração de uma
e projetos?
relação que se revele adulta. As nossas
R.- Não tenho uma resposta que possa
timorenses, por razões diferentes, é mais
ser totalmente clara. Até porque o Brasil
substantiva.
relações com os cabo-verdianos e os
tem o seu próprio caminho e é hoje, no que se refere à projeção da língua,
P.-
muito mais importante e eficaz do que
questionar sobre a leitura que tem dos
Portugal. P.-
Esse
Esta
sua
resposta
leva-nos
a
“Descobrimentos Portugueses”... deveria
ser
o
papel
do
Instituto Camões...
R.- As grandes navegações quinhentistas são marcas que qualquer português deve eleger
no
se aos desejos. O Instituto Camões não é
muita
dificuldade
um organismo suficientemente vivo e
período como “descobrimentos” porque
enquadrador das políticas que possam
não partilho da leitura eurocêntrica da
ser comuns aos países de língua oficial
História
portuguesa.
profundamente orgulhoso do passado e
R.- Pois devia. Mas a realidade sobrepõe-
Se
olharmos
para
Moçambique os falantes do português são, a cada ano, menos.
seu
orgulho
Universal.
em
pátrio.
Tenho
classificar
Para
se
esse
ser
do que fizemos não é preciso utilizar as palavras descobrimento ou império.
MARÇO 2021
PÁGINA 43 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
“A CORRUPÇÃO REAL E PERCEBIDA SÃO HOJE UMA REALIDADE QUE NÃO PODEMOS ESCONDER.(…) MAS A FALTA DE RESPOSTA AOS PROBLEMAS DAS POPULAÇÕES E O AFASTAMENTO DA REALIDADE QUE SE VERIFICA NO MUNDO POLÍTICO SÃO AINDA MAIS DANOSOS.” P.- A atual situação pandémica pode
que eu possa ter criado só veio a permitir
levar ao aparecimento ou reforço de
outros olhares sobre aquela obra. Mas
extremismos. Não lhe parece que o seu
sabe,
artigo sobre a demolição do Padrão
reerguer, em 1960, aquela estrutura. Para
dos Descobrimentos pode colaborar
ele
para reforçar esses extremismos?
dimensão de valorização de todo aquele
Cottinelli não
fazia
Telmo sentido
não numa
queria nova
espaço. Quanto aos extremismos só lhe R.- Uma pergunta é muito interessante e
posso dizer que faz mais um político
oportuna. Há uma primeira abordagem
corrupto por eles do que uma ideia,
pessoal que um país livre tem de me
mesmo que radical, de um político sério.
autorizar - o não ter respeito estético pelo
padrão.
E
há
uma
segunda
P.- Se tivesse que escolher um símbolo
abordagem histórica que deveria levar a
de Portugal que não a bandeira, qual
perguntar qual a razão de não estar ali quem foi a Ceuta, D. João I, quem foi o grande estratega das navegações, D. João II, nem sequer D. Manuel I veja só... E sabe qual é a razão? O regime do Estado Novo repudiou as grandes figuras históricas. Claro que ninguém vai tirar de Belém o Padrão, acho até que a comoção nacional
seria?
R.- Seria uma espada. Ontem as diversas espadas que nos construíram, umas boas e outras péssimas. Hoje as espadas da inteligência e da garra que, quando é previsto, sabemos inventar.
MARÇO 2021
PÁGINA 44 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
P.-
Falou
há
pouco
dos
políticos
Síria, o que se compreende mas não se
esse
pode aceitar por mera acomodação. A
fenómeno tem levado ao crescimento
Presidência Portuguesa da UE podia e
corruptos.
Não
acha
que
da abstenção?
ter
feito
mais
para
ajudar
as
instituições moçambicanas a fazer face
R.- A corrupção real e percebida são hoje uma
devia
realidade
que
não
podemos
ao terror que aquelas populações vivem. É um assunto que vai estar ainda muito tempo nas nossas preocupações.
esconder. Não estamos a saber tratar dessa praga. Mas a falta de resposta aos problemas
das
populações
e
o
afastamento da realidade que se verifica no
mundo
danosos.
E
político há
são
ainda
o
ainda
mais
arcaísmo
do
Entrevista realizada pela Causa Real para a Real Gazeta do Alto Minho da Real Associação de Viana do Castelo.
processo de votação numa altura em que 1/3 dos eleitores já vivem na era digital. P.-
Quer
comentar
catastrófica
que
Moçambique?
O
a
se que
situação vive
em
podem
fazer
Portugal e a União Europeia?
R.- Temos que interiorizar que os povos moçambicanos se separaram há quase meio século da nossa tutela. Não deve haver um colocar na balança a pobreza e a
insegurança
de
hoje
com
o
colonialismo de ontem. Tem sido essa a vantagem
do
Senhor
D.
Duarte,
não
aceitar o discurso neo-colonial que é o mais fácil perante a realidade que se vive. Portugal tem feito menos do que se impõe. Devia ter reforçado a sua ação nas Nações Unidas e junto da OEA, deveria ter chamado para uma ação concertada o Brasil e Angola. A União Europeia, fruto da sua realidade multipolar, olha para Moçambique como olha para a Líbia ou a
MARÇO 2021
PÁGINA 45 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
MONARQUIA VERSUS REPÚBLICA ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS*
Do ponto de vista da análise psicológica,
Por trás da opção pela forma de governo
um
-
fenômeno
muito
curioso
a
ser
vitalícia,
hereditária
e
monarquias;
no âmbito mais recôndito da psique de
individualista nas repúblicas - existe toda
cada
uma visão do universo, toda uma filosofia
república.
entre
monarquia
e
de vida.
MARÇO 2021
eletiva
nas
estudado é o do conflito interior, passado indivíduo,
temporária,
familiar
e
PÁGINA 46 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO
A opção monárquica concebe a nação como um imenso conjunto de famílias que, historicamente, são governadas desde tempos muito remotos por uma família soberana. Já a opção republicana, fundamentalmente individualista, concebe a nação como um conjunto de cidadãos que, a título estritamente individual, escolhem um cidadão para, em caráter transitório, exercer o poder a título também individual. Um dos grandes argumentos brandidos pelos republicanos do século XIX é que as monarquias eram muito custosas, pois precisavam sustentar não apenas o monarca, mas toda a sua família, enquanto as repúblicas seriam muito econômicas, já que as esposas, os filhos e demais consanguíneos dos presidentes eram cidadãos comuns e nada precisariam receber do estado... Cândida ilusão! A concepção monárquica prevê que não haja disputas nem preferências na escolha do herdeiro, que é determinado pela ordem de sucessão e de primogenitura, de geração em geração; e procura capacitar esse herdeiro, por meio de uma adequada educação, para o exercício pleno de suas funções. Já o sistema republicano prevê que a passagem do poder seja exatamente da forma oposta, ou seja, em meio a uma disputa eleitoral em que se enfrentam os candidatos, se engalfinham em luta inclemente, se agridem, se insultam, se acusam, por vezes se caluniam... tudo como meio de conseguir as preferências de um eleitorado volúvel, mutável e cambiante, ao qual compete eleger, para a suprema magistratura, o cidadão
mais capacitado para reger os destinos do país. De fato, em tese os candidatos a uma eleição presidencial são os melhores dentre os melhores, os mais talentosos, mais capazes, mais brilhantes e mais patrióticos dentre todos os cidadãos do país. Os propagandistas republicanos do Novecentos diziam que o perigo das monarquias
era
um
príncipe
incapaz
suceder ao pai e subir ao trono... mas não pareciam prever a possibilidade de um presidente incompetente - ou, em termos brasileiros,
uma
“presidenta
incompetenta”- chegar ao poder por via eleitoral. A concepção monarquista sabe que os homens são iguais na sua essência, mas se
diferenciam
muitos
acidentalmente
aspectos,
e
que
em
dessas
diferenciações decorre uma hierarquia de situações que em si mesma nada tem de injusta ou indignificante. A concepção republicana é teoricamente igualitária, mas na prática embute a mais cruel das desigualdades.
Muita
razão
tinha
Machado de Assis quando, aos 27 anos de idade, escreveu: “ peço aos deuses que afastem do Brasil o sistema republicano, porque esse dia seria o do nascimento da mais insolente aristocracia que o sol jamais alumiou ” (crônica de 5/3/1867,
citada por Roberto Pompeu de Toledo em “Veja”, 9/11/2016).
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antimonárquico, não pode deixar de ter, dentro de si, algumas vagas simpatias, às vezes sentidas e disfarçadas, às vezes nem
sequer
conscientemente
explicitadas, por tudo aquilo que, no imaginário coletivo, caracteriza a velha e tradicional monarquia. É precisamente por isso que se costuma dizer que em todo republicano há um monarquista
que
dorme
-
frase
cuja
autoria é desconhecida (já a vi atribuída até a Ruy Barbosa), mas que, em todo o caso, a experiência de muitos anos de propaganda
monarquista
revela
ser
verdadeira. Vale
lembrar,
a
propósito,
que
num
estudo clássico, intitulado “O Patriarca e o Bacharel” (São Paulo: Martins Ed., 1953), Enfim, tantas e tantas são as diferenças entre monarquia e república que poderíamos nos estender longamente sobre elas. Mas não é esse o objetivo do meu artigo de hoje. O que quero destacar é que, dentro do interior de cada mentalidade individual, convivem de certa forma essas duas mentalidades opostas, correspondentes às duas visões do universo antagonicamente inconciliáveis. Parece non sense o que estou afirmando, mas sustento que por mais que uma pessoa seja monarquista, ela não pode deixar de ter, no seu interior, ainda que implicitamente e no campo do subconsciente, algumas pitadas de republicanismo, ou pelo menos certos movimentos interiores tendentes ao republicanismo. E por mais que alguém seja republicano, jacobino e
Luís Martins analisou o caso de uma geração de jovens que saudaram com esperança o advento do regime de 1889 e pouco a pouco, ao longo da vida, foram se
desiludindo
com
a
república,
chegando à idade madura francamente como
saudosistas
do
velho
regime
imperial. Em “Ordem e Progresso” (Rio de Janeiro:
José
Olympio,
Freyre
também
1957),
Gilberto
ao
mesmo
alude
fenômeno. São exemplos clássicos de “ republicanos agredidos pela realidade ”, nos quais acabou despertando o velho monarquista adormecido. Consta que, no fim da vida, até Júlio de Mesquita Filho, diretor
do
republicaníssimo
jornal
“O
Estado de São Paulo”, não escondia seu saudosismo
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monárquico,
a
ponto
de
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dizer que não entendia como seu pai, sendo homem inteligente, tinha podido defender a República (cfr. José Maria Mayrink, Trajetória de um jornalista liberal, “O Estado de São Paulo”, 25/11/2009).
Karnal aponta vários aspectos do seriado que o impressionaram. Por exemplo, a cena da velha rainha Mary se inclinando respeitosamente diante da sua jovem neta no momento em que esta recebia a notícia do falecimento do falecimento de seu pai. “ The King never dies ”... Morto Jorge VI, a realeza britânica continuava viva,
sem
qualquer
solução
de
continuidade, na pessoa de sua filha Elizabeth. E o fato de a velha mãe do monarca falecido se curvar diante da neta (que naquele instante já não era apenas a neta, mas personificava uma instituição
venerável,
um
ideal,
uma
nação, uma História, a recordação de um passado e ao mesmo tempo a esperança de um futuro para todo um Povo e, mais do que isso, para um conjunto de povos que
constituiriam
tem
inegável
a
Commonwealth )
grandeza.
A
cena
impressionou Karnal, que a comenta e, ao mesmo tempo mostra certa nota de melancolia: “O trono é mais poderoso do que seus ocupantes.
Um exemplo característico de monarquista dormindo ou dormitando num republicano confesso pode ser encontrado em artigo do historiador e professor da UNICAMP Leandro Karnal, publicado precisamente no velho jornal dos Mesquita (O Real da realeza, “O Estado de São Paulo”, 4/1/2017), no qual comenta o seriado televisivo “The Crown”, que vem sendo exibido em todo o mundo e já conquistou um número imenso de aficionados.
Mary
se
inclina
enfaticamente e demonstra que não existe mais Elizabeth de Windsor, mas apenas a rainha Elizabeth II. Essa é parte
da
magia
das
monarquias:
a
liturgia do cargo antecede e se amplia sobre as pessoas. No campo simbólico, as
repúblicas
miseravelmente
sempre diante
falharam da
força
histórica e sagrada do trono. A célebre
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música
de
Haendel
usada
em
coroações, Zadok the Priest, com sua grandiosidade épica, seria inconcebível numa posse em Brasília”.
Não foi essa a única cena do seriado que fez Karnal lembrar melancolicamente da capital brasileira. Afinal de contas, se a Inglaterra, aferrada ao seu passado glorioso, insiste em se manter de pé, à maneira de uma mítica ilha de sonho, também nós, no Brasil republicano temos uma “ilha da fantasia” - como se costuma designar, com claro intuito pejorativo, a Brasília republicana. Karnal se impressionou com uma cena do velho Churchill discursando e não lhe foi possível deixar de compará-lo aos “estadistas” brasileiros da atualidade. Passo de novo a palavra a ele:
As palavras com que conclui seu artigo são
ainda
mentalidade
mais de
expressivas um
da
intelectual
inteligente que, agredido pela realidade republicana, sente dentro de si, latente, a atração pela monarquia: “Na nossa República, a mediocridade é exaltada e a ribalta política traz à tona o caráter tosco e raso dos nossos líderes. Não sou um monarquista, mas confesso que ser republicano está cada dia mais árduo...
God
save
the
Queen!
Que
Marianne, símbolo da República, tenha uma ou duas aulas de etiqueta e de dignidade”.
“Eu falei de ligeira melancolia. Sim, porque ouvir Churchill discursando me remete
aos
trópico
da
discursos crise.
atuais
Temos
sob
o
homens
preparados e já houve até pessoas cultas na presidência. Mas a falência da nossa retórica é brutal. Os políticos falam
mal,
pronunciam
de
forma
péssima e, quase sempre, expressam ideias pouco elaboradas. Insultam-se,
* Armando Alexandre dos Santos é licenciado em História e em Filosofia e doutor na área de Filosofia e Letras. É membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e da Academia Portuguesa da História.
matando o decoro, a inteligência e a esperança num Brasil melhor. Por que melancolia? discursos
Porque estiveram
um
dia
inscritos
os nas
páginas da literatura mundial; hoje, amiúde, constam em autos judiciais de acusações recíprocas de rapinagem. Moldura e tela ficaram de qualidade duvidosa”.
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REAL GAZETA DO ALTO MINHO
NOTA INFORMATIVA A Direcção da Real Associação de Viana do Castelo, com mandato para o triénio 2020-2023, cumprimenta V. Exas, desejando desde já a continuação de um bom ano de 2021. A Real Associação de Viana do Castelo tem um plano de actividades e orçamento para 2021, que inclui diversas iniciativas, que vão desde a organização de conferências à publicação da Real Gazeta do Alto Minho, órgão oficial de comunicação da Real Associação de Viana do Castelo, do qual muito nos orgulhamos, e que se pretende sejam executadas com a participação de todos os associados , simpatizantes e entidades que entendam colaborar, com o intuito de contribuir e ajudar a dinamizar o ideal Monárquico que todos nós abraçamos convictamente. Atendendo à necessidade imperiosa que temos em angariar recursos financeiros necessários ao normal funcionamento da Real Associação, e tendo em conta que uma das competências da Direcção é a cobrança de quotas, eu, em nome da Direcção e na qualidade de Tesoureiro, venho por este meio solicitar a V. Exas. a regularização da QUOTA DE ASSOCIADO REFERENTE ao ano de 2021, no valor de 20,00 € (vinte euros ), preferencialmente por transferência bancária, para:
Titular da Conta: Real Associação de Viana do Castelo Entidade bancária: Caixa de Crédito Agrícola Agência: Ponte de Lima IBAN: PT 50 0045 1427 40026139242 47 Número de conta: 1427 40026139242 SWIFT: CCCMPTPL Caso seja possível, pede-se o favor de enviarem por e-mail (real.associacao.viana@gmail.com e amorim.afc@gmail.com) informação da regularização da quota (ex: comprovativo), após o que procederemos de imediato à emissão do recibo de liquidação. Cordiais cumprimentos e saudações monárquicas, Filipe Amorim Tesoureiro da RAVC
FICHA TÉCNICA TÍTULO: REAL GAZETA DO ALTO MINHO PROPRIEDADE: REAL ASSOCIAÇÃO DE VIANA DO CASTELO PERIODICIDADE: TRIMESTRAL DIRECTOR: JOSÉ ANÍBAL MARINHO GOMES REDACTOR: PORFÍRIO SILVA WEB: WWW.REALVCASTELO.PT EMAIL: REAL.ASSOCIACAO.VIANA@GMAIL.COM
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AS MONARQUIAS EUROPEIAS CONTEMPORÂNEAS ANTÓNIO PINHEIRO MARQUES
A
Europa
abrange
monarquias
(Comunidade de Nações), resultante da
Bélgica,
Dinamarca,
evolução do antigo império britânico,
Liechtenstein,
Luxemburgo,
contribui com um significativo número,
Mónaco, Noruega, Países Baixos, Reino
dezasseis Commonwealth realms (Reinos
Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte
da
e
monarca, a que se juntam Brunei, Malásia
hereditárias, Espanha,
Suécia,
duas
dez
monarquias
eletivas,
Comunidade)
que
têm
o
mesmo
Estado da Cidade do Vaticano e Ordem
e Tonga, com monarcas próprios.
Soberana de Malta (nestes dois casos o
Como curiosidade, vejamos também a
cargo é vitalício, a menos que se verifique
distribuição da monarquia pelos outros
uma renúncia como sucedeu em ambos,
continentes. Em África contaremos três
já no século XXI) e ainda o Principado de
reinos:
Eswatini
Andorra, dotado de chefia de Estado
designado
por
dupla (uma diarquia), tendo como co-
Marrocos. Dez outros estão situados na
príncipes
República
América do Norte ou na América Central,
Francesa, eleito pelos cidadãos franceses,
todos pertencentes à Commonwealth of
e o bispo de Urgel, de designação pelo
Nations . No continente americano temos
Papa.
ainda as ilhas que integram o Reino da
o
presidente
da
(anteriormente
Suazilândia),
Lesoto
e
Dinamarca e o Reino dos Países Baixos ou As monarquias no mundo atual
são dependências do Reino Unido. A Ásia apresenta onze monarquias hereditárias
Antes, porém, de abordar a situação das
e duas monarquias federais eletivas: a
monarquias
Malásia,
na
Europa,
poderia
ser
em
que
o
rei
é
eleito
interessante verificarmos o seu número no
rotativamente
mundo,
presentemente
dos estados que integram a federação
quarenta e cinco estados soberanos que
(oito hereditários e um eletivo dentro de
são monarquias, das quais cinco não são
uma
hereditárias. A Commonwealth of Nations
Emirados Árabes Unidos (em que o chefe
onde
existem
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pelos
determinada
nove
governantes
linhagem)
e
os
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do estado federal é escolhido pelos governantes hereditários dos sete emirados). Por último, na Oceânia situam-se seis outros reinos, todos pertencentes à Commonwealth of Nations, dos quais cinco com o mesmo monarca, e Tonga, com rei próprio.
Trata-se, como é fácil de compreender, de um conjunto muito diversificado, por razões
não
só
principalmente
geográficas históricas,
como
políticas,
religiosas e sociais. As monarquias hereditárias europeias
Os acontecimentos do século XX, entre os quais cumpre relevar as duas guerras mundiais e as crises económicas e sociais, foram determinantes na evolução das monarquias europeias. A Grande Guerra alterou a geografia política da Europa, devido à queda e desmembramento dos impérios alemão, austro-húngaro, otomano e russo, onde A Rainha Guilhermina dos Países Baixos discursa perante o Congresso dos EUA
Poderíamos ainda considerar as monarquias a que poderemos chamar subestatais, com alguma forma de reconhecimento pelos países em que se integram (a título de exemplo, a Constituição da República da África do Sul reconhece as chefias tradicionais), num total de perto de trezentas e trinta, contando mais de duas centenas e meia em África, cerca de meia centena na Ásia (incluindo as sete monarquias que integram a federação dos Emirados Árabes Unidos e os nove estados federados da Malásia) e três dezenas na Oceânia, incluindo os chefes tradicionais (como os Liurais, em Timor-Leste), que exercem funções e usufruem de obediência e consideração política e social nas suas comunidades.
surgiu o primeiro regime comunista no continente.
Em
consequência,
verificaram-se reajustes de fronteiras e surgiram novos estados. Neste conflito, vários países detinham um estatuto
de
neutralidade
que
foi
respeitado, sendo esse o caso da Noruega (que se separara da Suécia por referendo em
1905)
e
também
da
Dinamarca,
Espanha, Países Baixos e Suécia, o que se não verificou com a igualmente neutra Bélgica, invadida pelo exército alemão. O Rei Alberto I permaneceu à frente das tropas belgas, como seu comandante supremo, enquanto a Rainha Isabel (filha da Infanta Dona Maria José de Bragança e
do
bávaro
Duque
Carlos-Teodoro)
prestava assistência como enfermeira na frente de combate.
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ano. As duas eram filhas da Infanta Dona Maria Ana de Bragança, casada com o Grão-Duque Guilherme IV, que foi por duas vezes regente do Luxemburgo.
Promulgação da Constituição de 1978 pelo Rei de Espanha
No Reino Unido, uma muito conhecida consequência da guerra com a Alemanha foi a mudança pelo Rei Jorge V, em 1917, do nome da dinastia reinante, do germânico Saxe ‑ CoburgoGota para o bem britânico Windsor. A família real apoiou empenhadamente o esforço de guerra, tendo o Duque de Iorque (futuro Jorge VI) combatido na batalha naval da Jutlândia. O apoio e a participação dos domínios britânicos na guerra reforçaram a evolução do seu sistema de autogoverno. Em 1922 surgiu o Estado Livre da Irlanda, que veio a separar-se completamente do Reino Unido em 1937. Também o Luxemburgo, outro estado neutro, foi invadido pelo exército alemão, sem que o pequeno país, com fortes ligações à Alemanha, pudesse obviamente oferecer resistência, o que não deixou de valer críticas à jovem Grã-Duquesa Maria Adelaide, de 25 anos, que sob forte pressão política abdicou em 1919, sucedendo-lhe a GrãDuquesa Carlota, sua irmã. Esta transição foi confirmada por maioria de 77,8 % num referendo desse mesmo
Abril de 1945, regresso da Grã-Duquesa Carlota do exílio
Em Espanha, então neutra, o Rei Afonso XIII criou em Madrid, em cooperação com a Cruz Vermelha, um Gabinete da Guerra Europeia ( Oficina de la Guerra Europea ), dedicado à situação dos prisioneiros de guerra, desaparecidos, repatriamentos e apoio a pessoas e famílias nos territórios ocupados, o que lhe valeu ser proposto para o Prémio Nobel da Paz em 1917 e em 1933, quando já se encontrava no exílio. Foram poupados tanto o Principado de Liechtenstein, neutro desde que em 1868 dissolvera o seu diminuto exército, e que prejudicado pelos seus fortes laços com a Áustria, derrotada em 1918, se viu forçado a
uma
aproximação
à
Confederação
Suíça (com a qual estabeleceu uma união alfandegária em 1919), como o Principado
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de Mónaco, cuja neutralidade foi proclamada pelo pacifista, oceanógrafo e amigo do Rei D. Carlos, Príncipe Alberto I, que no entanto apoiou de forma indireta mas até financeira o esforço francês, depois de tentar persuadir o Imperador Guilherme II a não declarar a guerra. Dada a preocupação francesa de que fosse chamado a suceder um parente alemão na falta de herdeiros do Príncipe Alberto I, uma vez que o Príncipe Luís, seu filho único, não tinha descendência do casamento, foi alterada a sucessão ao trono.
Gustavo VI Adolfo numa cerimónia de entrega do Prémio Nobel
Príncipe Rainier III e o Príncipe herdeiro Alberto
A segunda guerra mundial foi igualmente determinante no destino das monarquias europeias, pois os soberanos e os seus países não reagiram todos da mesma forma ao conflito. A Suécia permaneceu neutra, mas o Rei Gustavo V, ao mesmo tempo que facilitava a passagem de tropas alemãs pelo seu território para a Finlândia, com o fim de combaterem o exército soviético, favorecia a fuga e o refúgio de judeus.
O Rei Carlos XVI Gustavo com as princesas sucessoras na Coroa da Suécia
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Espanha manteve o seu estatuto de neutralidade. Era então república desde 1931, só tendo a monarquia sido restabelecida, mas sem rei, em 1947. No Liechtenstein, o período da guerra foi enfrentado pelo Príncipe Francisco José II, que subiu ao trono por abdicação de seu tio, Francisco I, que em razão da sua avançada idade, mas muito possivelmente receoso da anexação da Áustria pelo III Reich e das suas consequências, uma vez que era casado com uma senhora de origem judia. Francisco José II, neto da Infanta Dona Maria Teresa de Bragança, Arquiduquesa de Áustria, foi o primeiro soberano a viver permanentemente no principado, que não foi ocupado pela Alemanha, e com sua mulher, a Princesa Gina, procurou minorar as carências da população fazendo uso da sua fortuna pessoal e apoiando os refugiados e prisioneiros de guerra. Foi a Princesa Gina a fundadora da Cruz Vermelha do Liechtenstein.
II sentimentos pró-franceses e estando a população muito próxima dos italianos. Este difícil equilíbrio, entre a Alemanha e Itália,
terminou
com
a
entrada
no
principado do exército italiano em 1942 e, depois da queda de Mussolini, com a invasão pelas tropas alemãs. O Príncipe Rainier, herdeiro da Coroa por renúncia de sua mãe, a Princesa Carlota, alistou-se no exército francês em 1944, ao atingir a maioridade,
tendo
participado
na
libertação da Alsácia. No Reino Unido, tanto o papel do Rei Jorge VI como o da sua família assumiu grande
importância
pelo
apoio
que
deram às populações em todo o país e pela participação no esforço de guerra. Jorge VI, a partir de 1939 visitou as suas tropas na Europa e no Mediterrâneo e no norte
de
África,
enquanto
o
irmão,
Duque de Gloucester teve várias missões na Bélgica, Médio Oriente, África oriental e Índia. Um outro irmão, o Duque de Kent, morreu em acidente de aviação em 1942, durante o seu serviço ativo na RAF. Nunca
os
soberanos
britânicos
ponderaram a possibilidade, mesmo nos momentos mais difíceis da guerra, de sair
do
míticos Dia Nacional do Liechtenstein. O Príncipe com a família
O Mónaco permaneceu numa neutralidade considerada benevolente em relação à Alemanha, em parte devido às ligações da banca com aquele país, mantendo o Príncipe Luís
país, da
fortificaria
tornando-se
resistência. a
símbolos
Este
solidariedade
conflito
dentro
do
império britânico e também a rápida evolução da Comunidade Britânica de Nações para a nova Comunidade de Nações,
em
1949,
na
sequência
proclamação da república na Índia.
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da
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Liliane Baels, conhecida como Princesa de Réthy, casamento que lhe cerceou a popularidade, uma vez que a memória da muito querida Rainha Astrid, falecida em 1935, perdurava no povo belga. O irmão do monarca, o Príncipe Carlos, exerceu a regência desde 1944 e o Rei Leopoldo depois
III do
só
regressou
referendo
à
que
Bélgica lhe
foi
favorável, realizado em 1950. A família real britânica, no fim da II guerra mundial
O Rei Alberto I dos Belgas e o Príncipe Leopoldo
A Princesa Isabel, futura rainha, no Serviço Auxiliar do Exército, II guerra mundial
O Rei dos Belgas, Leopoldo III, contrariamente ao seu governo, que saiu do país para Paris e depois para Londres, decidiu permanecer em Bruxelas, aceitando a ocupação, mas sem colaborar com a Alemanha. Resistindo às imposições do ocupante, a Bélgica ficou sob governo militar alemão. Prisioneiro no castelo de Laeken, Leopoldo III tentou negociar a situação dos prisioneiros de guerra belgas e acabou por ser deportado para a Alemanha, em 1944, e depois para a Áustria, em 1945. Entretanto casara com
Entre os soberanos que saíram do seu país,
cabe
Guilhermina
destacar dos
a
Países
Rainha
Baixos,
que
viajou para Inglaterra a bordo de um navio
da
incentivou mensagens
Royal
a
Navy .
resistência radiofónicas
De
Londres
através aos
de
Países
Baixos e Índias Ocidentais e Orientais holandesas, no programa Radio Oranje , emitido pela BBC. Em 1942, a Rainha viajou até aos Estados Unidos, tendo feito
um
discurso
ao
Congresso
americano (a primeira vez que sucedeu com um monarca)
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onde se apresentou
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como porta-voz não só da população do seu país, na Europa, mas também de milhões de pessoas na Ásia e também na América. Enquanto a Princesa herdeira, Juliana, se instalou com as filhas no Canadá, o Príncipe Bernardo, seu marido (bem como a Rainha Guilhermina e o seu governo no exílio), permaneceu no Reino Unido, tendo chefiado a missão militar neerlandesa na capital britânica e exercido o cargo de comandante-chefe das forças armadas de 1944 a 1945. A Grã-Duquesa Carlota do Luxemburgo, imediatamente antes da invasão alemã, em 1940, passou primeiro a França e depois a Portugal, partindo daqui para Londres, onde se instalou com o seu governo. Durante o exílio, esteve nos Estados Unidos por várias vezes sensibilizando as autoridades americanas para a situação do seu país. um símbolo da resistência nacional aos ocupantes alemães, tendo ficado célebres as suas intervenções radiofónicas pela BBC, dirigidas ao povo e aos resistentes luxemburgueses. É considerada a “mãe” do Luxemburgo moderno. O Grão-Duque herdeiro João, de 19 anos, após a formação na Academia Militar de Sandhurst, alistouse no exército britânico (como também fizera seu pai, o Príncipe Félix, filho da Infanta Dona Maria Antónia de Bragança e de Roberto I, Duque de Parma) e participou nas operações de guerra (desembarque da Normandia, batalha de Caen e libertação de Bruxelas), entrando com as tropas aliadas no Luxemburgo, quando da libertação. Foi nomeado coronel do regimento dos Guardas Irlandeses, a que pertencera, e general honorário do exército britânico pela rainha Isabel II.
Luxemburgo - quatro gerações de grão-duques
Quando Noruega
da
invasão
ofereceu
alemã,
a
resistência
que (o
a
que
permitiu a fuga de Oslo do Rei Haakon VII, família real, governo e membros do parlamento), o soberano, sob pressão dos políticos pró-alemães para legitimar a ocupação nazi, negou-se a aceitar que formassem governo e comunicou que se fosse necessário preferiria abdicar. Já com o país a ser bombardeado, Haakon VII embarcou com a família e os seus ministros num navio de guerra britânico com destino à Grã-Bretanha. Daí passou a
dirigir
mensagens
pela
BBC
à
resistência interna. O Príncipe herdeiro (depois Rei Olavo V), general e almirante, foi
nomeado
chefe
do
estado-maior
general, visitando as tropas norueguesas e participando na libertação do país e no desarmamento do exército de ocupação alemão.
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Como consequência imediata da guerra, verificou-se fronteiras
não
só
como,
um
reajuste
devido
à
de
ocupação
soviética da Europa Oriental, a instalação na
Albânia,
Bulgária,
Jugoslávia
e
Roménia de regimes comunistas após a supressão das respetivas monarquias. Adaptação no tempo Regresso dos Reis à Noruega, depois da libertação do país
Ao contrário do que sucedera com o Rei Haakon VII da Noruega, seu irmão, o Rei Cristiano X, quando da ofensiva alemã (com o pretexto de defender a neutralidade da Dinamarca de uma invasão britânica), optou por permanecer no país. Cristiano X transformou-se também num símbolo mítico da resistência dinamarquesa, o que ficou bem ilustrado com os episódios em que saía em Copenhague para passeio, a cavalo e sem escolta, e respondia, aos que se preocupavam com a sua segurança, que a sua guarda era o povo dinamarquês ou, quando as autoridades alemãs exigiram que os judeus passassem a usar identificação na roupa, o Rei usava a estrela de David amarela no seu uniforme. Nos dois países os cidadãos ostentavam o monograma dos respetivos reis como símbolo da resistência ao invasor.
Na maioria destes estados, onde muito cedo
se
introduziram
reformas
do
sistema político, com a passagem do sufrágio
censitário
ao
sufrágio
generalizado masculino e por fim ao sufrágio
universal,
deu-se
também
e
simultaneamente, com a consolidação do
funcionamento
parlamentar,
a
da
chegada
democracia de
novos
partidos à vida política. Os trabalhistas no Reino Unido e os sociais-democratas nas
monarquias
nórdicas
protagonismo
e
assumiram
acederam
a
responsabilidades de governo, a partir dos
anos
20.
O
socialismo
surgiu
também na vida política luxemburguesa, tendo o Partido dos Trabalhadores do Luxemburgo entrado para o governo na década
seguinte.
Pelo
contrário,
a
fragmentação política na Bélgica e nos Países Baixos não permitiu uma evolução político-partidária
semelhante
à
das
monarquias do norte da Europa, e os partidos da área socialista só integraram os governos desses países um pouco O Rei da Noruega presente nos exercícios militares
mais tardiamente. Veremos igualmente a
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inovação com as alterações das normas de sucessão (em cinco das monarquias existe apenas uma condicionante de tipo religioso) e o desaparecimento das antigas normas que regiam os casamentos dinásticos. Introdução do sufrágio universal
A Noruega adotou o sufrágio universal em 1913 (o sufrágio masculino datava de 1898, quando ainda estava em união com a Suécia), seguida pela Dinamarca em 1915 (sufrágio censitário em 1834 e 1849) e em 1919 pelo Luxemburgo, Países Baixos (sufrágio masculino em 1917) e Suécia (sufrágio masculino em 1909) e pelo Reino Unido em 1928 (sufrágio masculino em 1918). A Bélgica aprovou o sufrágio universal em 1948 (sufrágio censitário em 1893, sufrágio masculino desde 1918) e em Espanha o sufrágio universal é consagrado na constituição de 1977 (sufrágio censitário em 1812 com vicissitudes várias, entre as quais a 1ª República, masculino em 1869, com alterações motivadas pela sua perturbada evolução política). Os últimos países a aceder ao sufrágio universal foram o Mónaco em 1962 (sufrágio masculino em 1911) e o Liechtenstein em 1984 (por referendo desse ano, existindo o sufrágio masculino desde 1921, e desde 1976 o voto das mulheres em alguns municípios - a título de curiosidade, o sufrágio foi alargado na sequência do que sucedera na vizinha Suíça, que referendou o sufrágio universal em 1971, embora no último cantão só fosse introduzido em 1990).
Cristiano X da Dinamarca
Margarida II da Dinamarca, a rainha-artista
Alteração das leis de sucessão
Cada país adaptou, em processos com ritmos e formas próprias, as leis de sucessão no sentido de consagrar a primogenitura absoluta (em que o mais velho sucede), uma vez que em meados
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do século passado já não se entendia a discriminação em razão do sexo. Vários estados tiveram no século XX soberanas muito admiradas e populares: os Países Baixos desde 1890, sucessivamente com as Rainhas Guilhermina, Juliana e Beatriz, o Luxemburgo com a GrãDuquesa Carlota, que sobe ao trono em 1919, o Reino Unido desde 1952, quando a Rainha Isabel II sucede ao Rei Jorge VI e a Dinamarca desde 1972, com a atual Rainha Margarida II. A sucessão foi possível apenas por não terem irmãos varões, ainda que mais novos. Nalguns casos estas mudanças na lei não produziram efeitos imediatos, uma vez que o primogénito era um príncipe (casos da Bélgica, do Luxemburgo e dos Países Baixos) mas ficou assim assente o princípio para situações futuras.
O Rei Guilherme-Alexandre, piloto de avião comercial
Estas alterações surgiram a partir de 1980, ano em que a Suécia é o primeiro estado a alterar a sua lei fundamental de sucessão, introduzindo a primogenitura absoluta. A Princesa Vitória, primogénita, substituiu o irmão mais novo, passando a ocupar o primeiro lugar na linha de sucessão. Seguiram-se em 1983 os Países Baixos e em 1990 a Noruega, onde o Príncipe Haakon-Magnus, mais novo do que a irmã, manteve a sua posição, uma vez que a lei não teve alcance retroativo. A Bélgica em 1991, a Dinamarca em 2009 e o Luxemburgo em 2011 aprovaram legislação no mesmo sentido. Quanto ao Reino Unido, o processo foi mais complexo e lento devido à ligação especial que mantém com outros quinze reinos, com os quais partilha um soberano comum, pelo que a alteração teve de ser feita numa cimeira com esses estados, aproveitando-se para o efeito a CHOGM (Reunião de Chefes de Governo da Comunidade de Nações) de 2011, na Austrália. Na ocasião, por proposta do primeiro-ministro britânico e com prévio assentimento da Rainha Isabel II, os chefes de governo aprovaram por unanimidade o acordo de Perth, pelo qual todos se comprometiam a tomar medidas para que a sucessão nos respetivos países se passasse a reger pela primogenitura absoluta. Depois de todos os países terem comunicado que tinham cumprido as formalidades legislativas necessárias (no caso da Austrália, os parlamentos de todos os estados, bem como o parlamento federal, tiveram de aprovar legislação adequada), a nova norma de sucessão entrou em vigor em março de 2015.
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Por último, três países não alteraram as suas leis tradicionais de sucessão. Em Espanha, onde o assunto já fora alvo de algum debate, o presidente do governo, por motivo do nascimento da primeira filha do Rei Filipe VI em 2005, adiantou a possibilidade de uma reforma constitucional para a qual contava com o apoio do partido principal da oposição. Sendo o processo de revisão constitucional em Espanha moroso, e uma vez que não nasceu nenhum príncipe, a iniciativa acabou por ser abandonada. Assim, em Espanha tal como no Mónaco, permanece vigente a sucessão por primogenitura com preferência de varão. No Liechtenstein continua a vigorar a sucessão agnatícia, somente masculina e com exclusão das princesas e sua descendência. Casamentos e sucessão dinástica
Atualmente, em quase todos estes estados as normas relativamente aos casamentos já não incluem limitações de qualquer tipo relativamente ao cônjuge. No entanto, os casamentos de quem se encontrar na linha de sucessão ao trono devem obter algum tipo de autorização do monarca ou pelo menos contar com um assentimento tácito. Na Bélgica, o Rei deve dar a sua autorização e no Reino Unido a aprovação da Rainha é manifestada em sessão do Conselho Privado e limitado aos seis primeiros na ordem de sucessão. Na Dinamarca o consentimento real é dado em sessão do Conselho de Estado, enquanto nos Países Baixos os Estados Gerais devem assentir ao casamento e na Suécia a anuência é concedida pelo governo a pedido do Rei. A constituição espanhola
apenas estabelece que os casamentos não podem ser contraídos havendo proibição do Rei e das Cortes Gerais. Em todos estes casos a celebração de casamento sem aprovação, explícita ou tácita, tem como consequência a exclusão do contraente e da sua descendência da sucessão dinástica. A Monarquia e as Igrejas
É nos países de tradição protestante que é mantida uma maior ligação oficial entre a Monarquia e as respetivas Igrejas nacionais. Na Dinamarca e na Noruega existem Igrejas nacionais com estatuto oficial, enquanto na terceira monarquia nórdica, não tendo a mesma situação a Igreja da Suécia, esta dispõe, no entanto, de legislação que lhe é própria. Nestes três países o monarca deve pertencer à Igreja Evangélica Luterana. Nos Países Baixos, a família real pertence tradicionalmente à Igreja Reformada, hoje designada por Igreja Protestante dos Países Baixos, tendo desaparecido em 1983 a proibição de casamento com católico. No Reino Unido, a Igreja de Inglaterra é oficial, mantendo uma participação de vinte e seis dos seus bispos na Câmara dos Lordes ( Lords Spiritual ). A monarca é a Suprema Governadora da Igreja de Inglaterra. Quanto à Igreja da Escócia, é considerada uma Igreja nacional. A Rainha Isabel II é a sua protetora e nomeia anualmente um Lorde Alto Comissário para a representar na Assembleia Geral da Igreja da Escócia. Em países de maioria católica, como a Bélgica, a Espanha e o Luxemburgo, há separação igreja-estado, embora a religião católica receba algum tipo de reconhecimento (por vezes junto com
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outras confissões religiosas) e as famílias reinantes sejam católicas. Nos Principados de Liechtenstein e Mónaco o catolicismo é religião oficial, existindo liberdade religiosa. A Monarquia e as Forças Armadas
Por último, não se poderia deixar de lembrar que todos os monarcas europeus e suas famílias mantêm vínculos profundos com as forças armadas dos seus países. Tiveram formação militar, prestaram serviço, alguns nos vários ramos das forças armadas, detêm patentes militares e, na maioria, o comando supremo das forças de defesa dos seus estados incumbe aos soberanos. Estão neste caso o Rei dos Belgas e também os de Espanha e da Noruega, as Rainhas da Dinamarca e do Reino Unido, o Grão-Duque do Luxemburgo.
As forças armadas devem fidelidade ao monarca mesmo que não exerça o comando supremo, como é o caso da Suécia, em que o Rei, que teve formação militar, detém apenas funções de representação e cerimoniais, sendo almirante e general honorário das forças armadas. Também nos Países Baixos o Rei, que prestou serviço militar, não exerce o comando supremo, que está investido no governo desde 2003. O Príncipe Alberto II de Mónaco, que teve treino militar na Marinha francesa, é o comandante-chefe da Companhia de Carabineiros do Príncipe; quanto ao Principado de Liechtenstein, não dispõe de forças armadas, como é sabido. A modo de conclusão
Nalguns destes países os monarcas detêm funções meramente representativas e cerimoniais, noutros conservam poderes que são exercidos em seu nome pelos governos de turno, responsáveis estes perante o parlamento e em dois deles, Liechtenstein e Mónaco, os príncipes reinantes detêm poderes de governo efetivos, com a geral aceitação dos seus concidadãos. Os monarcas europeus e suas famílias mantêm ligações estreitas com todos os setores da vida nacional. Em todos os casos, o sistema político e a própria personalidade dos monarcas condicionam certamente a forma como exercem as suas funções. Um recente “Índice de Democracia” (elaborado pela Economist Intelligence Unit ) inclui entre as dez mais avançadas
O Rei dos Belgas entrega o Prémio Rei Balduíno para o Desenvolvimento em África
democracias no mundo seis das monarquias europeias e também o “Índice de percepção da corrupção”
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(para os anos 2012-2020, elaborado por Transparency International ) enumera entre os primeiros vinte países com menos corrupção onze monarquias (sete europeias e quatro fora da Europa). A monarquia é vista também como tendo uma relevância especial em momentos de crise política ou de perturbações da vida nacional. Exemplo bem recente disso, o acompanhamento da crise atual e o apoio e incentivo dos monarcas às populações dos seus países e a atenção com que as suas mensagens são ouvidas. No caso da Rainha Isabel II, as várias comunicações que fez em 2020 despertaram muito interesse não só na opinião pública nacional como também na estrangeira. As monarquias europeias deram mostras, na sua evolução dos últimos cem anos, de uma notável capacidade de adaptação aos novos tempos, com superação das crises e das críticas mais fortes, devido ao escrutínio público a que estão sujeitas, por vezes por falhas dos próprios titulares da instituição, mas mantendo sempre uma evolução serena. Embora a popularidade seja algo muito volátil, certo é também que em todas as monarquias europeias os níveis de popularidade, tanto da instituição como dos seus titulares e de boa parte das suas famílias, são muito elevados e mantêm-se de forma bastante consistente. Saliente-se ainda que nestes países, com democracias fortemente enraizadas, não existe proibição de apresentação de medidas legislativas no sentido de abolir a instituição e também que a monarquia pode ser livremente discutida, nuns com mais regularidade do que noutros. Como é natural tal aconteceu quando estes países escolheram a forma do estado ou aprovaram legislação relativa às respetivas monarquias.
A monarquia foi estabelecida na Noruega independente por 78,94 % dos votos em 1905, no Luxemburgo foi mantida por referendo em 1919 e em Espanha a monarquia parlamentar foi estabelecida como forma política pela Constituição de 1978, referendada por 88,54% dos votantes. Foi também por referendo, em 2009, que a Dinamarca aprovou a reforma da lei de sucessão, por 85,3% dos votos, enquanto nos restantes países as alterações foram introduzidas por processo legislativo ordinário, entre 1980 e 2013. No Liechtenstein a iniciativa sobre a supressão dos poderes do príncipe foi rejeitada em 2012 num referendo, por 76,43 % dos votos. Os monarcas europeus contemporâneos assumem-se e são geralmente reconhecidos como símbolos da permanência, continuidade e unidade dos seus estados e garantes do normal funcionamento das respetivas instituições. Apartidários e estando acima da disputa e da erosão política, acumulam uma notável experiência, tanto pessoal como familiar, e contribuem para a estabilidade da vida nacional, com a vantagem de a poder encarar com distanciamento e a perspetiva informada que acompanha um percurso de longo prazo.
A Rainha Isabel II com os monarcas europeus, 2002, Jubileu de Ouro
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VENERÁVEL JÉRÔME LEJEUNE CARLOS AGUIAR GOMES
Jerome Lejeune um homem para a eternidade visual
Abstract
Résumé
Jérôme Lejeune, who died on April 3,
Jérôme Lejeune, décédé le 3 avril de 1994
1994,
est un vraie exemple de vie dédié à la
is
a
dedicated
true to
example
Science.
of
a
life
Lejeune
is,
without a doubt, one of the fathers of human genetics in the field of diseases. Lejeune is also a good example of a scholar committed to his faith. His
Science. Lejeune est, sans doute, un des pères de la Génétique humaine dans le domaine des maladies. Lejeune est bien en exemple, aussi, d`un savant engagé
domain: the defense of life from the
dans sa Foi. Son domaine: la défense de
beginning. At the request of St. John
la vie depuis son début. À la demande de
Paul II, Magnum, Lejeune was, by direct
St. Jean Paul II, le Grand, Lejeune a été,
indication of this great Pope, the first
par nomination direct de ce grand Pape,
President of the Pontifical Council for
le
the Family. Between Saint John Paul II,
Pontifical pour la Famille. Entre St. Jean
Magnum and Jérôme Lejeune there was
Paul II, le Grand, et Jérôme Lejeune il y
a very close bond, a true friendship.
avait une très grande complicité, une
Key words: Jérôme Lejeune; venerable; geneticist.
premier
Président
du
Conseil
vraie amitié. Mots clés: Jérôme Lejeune; vénérable; généticien.
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A 3 de Abril de 1994, Ano Internacional da Família, (era a manhã do Domingo de Páscoa), falecia o grande Homem de Ciência e de Fé, o Prof. Jérôme Lejeune. Hoje o Venerável Lejeune. A ele se devem inúmeros trabalhos de natureza científica que lhe valeram vários prémios e o reconhecimento internacional como um dos grandes cientistas da área da genética médica. Lejeune, aliava aos seus grandes talentos de geneticista uma fé católica sem medo e com uma coragem imensa. Por esta razão não recebeu o Prémio Nobel que lhe estava destinado, pois como se sabe, a ele se deve a descoberta originante do chamado “mongolismo”, que abriu o conhecimento para a relação entre património genético e algumas doenças cujas causas residem precisamente num erro do património genético. O Professor Lejeune teve um curriculum científico impressionante. Basta referir que defendeu a sua tese de Doutoramento aos 25 anos, na Sorbone (França). S. João Paulo II, Magno, tinha uma veneração imensa por este católico cientista e por este cientista católico. Não foi por acaso que este Papa pediu em 1993 a Lejeune que elaborasse o estatuto de uma Academia Pontifícia para a Vida, o que o cientista fez e 11 de Fevereiro de 1994, João Paulo II, Magno, funda, com esses estatutos a Academia Pontifícia para a Vida. A 26 desse mesmo mês, Lejeune foi nomeado seu primeiro Presidente, apesar de já estar muito doente com um cancro nos pulmões. Como se referiu, Lejeune, morre pouco tempo depois, num Domingo de Páscoa. Três anos passados, a 22 de Agosto de 1997, numa visita Pastoral a França, aquando das Jornadas Mundiais da Juventude, num verdadeiro
entorse ao programa e ao protocolo, João Paulo II, Magno, fez questão de ir rezar e dar público testemunho da sua veneração para com Lejeune junto do túmulo onde jaz “o seu irmão Lejeune”, no dizer deste Papa.
Nestes dias de conturbação de ideias, sobretudo no campo da Fé e da VIDA HUMANA, Lejeune é um farol que nos deverá iluminar na busca da verdade de que é possível ter-se fé e ser arrojado e sábio em qualquer campo da Ciência. Alguns dados mais relevantes da vida e obra do Venerável Lejeune: Jérôme Jean Louis Marie Lejeune, nasceu a 13 de Junho de 1926 em Montrouge e foi baptizado a 19 de Junho de 1926. Casa em 1 de Maio de 1952 com Birthe Bringsted, com quem tem 5 filhos. Aos 25 anos, 15 de Junho de 1951, defende a sua tese de Doutoramento em Medicina e 1952 é nomeado estagiário de pesquisa no Centro Nacional de Pesquisa Científica, centro dirigido pelo Prof. Raymond Turpin, para trabalhar com crianças, então chamadas mongolóides. Em 1957 é nomeado perito junto da ONU para o estudo dos efeitos das radiações atómicas. Em 26 de Janeiro de 1959, a Academia das Ciências
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(França) publica os seus trabalhos sobre as causas do mongolismo descobertas em 1958. Recebeu numeros prémios pelos seus trabalhos sobre as patologias cromossómicas, entre os quais se destaca em 1962, o Prémio Kennedy pela descoberta das causas da Trissomia 21. Em 1964 torna-se primeiro titular da primeira Cadeira de Genética Fundamental na Faculdade de Medicina de Paris e em 1965 é nomeado Chefe da Unidade de Citogenética no Hospital Necker de Crianças Doentes, em Paris. Em 1981 foi nomeado pela Academia Pontifícia das Ciências em missão junto do dirigente soviético Leónidas Brejnev para o informar dos perigos de uma guerra atómica. Em 1982 foi nomeado membro do Instituto (Academia das Ciências Morais e Políticas) e em 1983 membro da Academia Nacional de Medicina (França). Foi indigitado em 1989 como testemunha num processo célebre em Maryland, EUA, sobre a humanidade de embriões congelados, num processo de divórcio. É com este seu testemunho que perde o Prémio Nobel.
É este o grande percurso do Venerável Lejeune que dedicou a sua vida de cientista notável à defesa das crianças por nascer atingidas pelo Síndrome de Down, a Trissomia 21. Em
Paris,
criado
em
um
sua
Centro
homenagem, de
estudo
foi e
investigação sobre doenças genéticas que apoia estudos e doentes de todo o mundo (https://www.fondationlejeune.org/). Entretanto, o Papa Francisco já declarou o
Professor
Jérôme
Lejeune
como
Venerável dia 21 de Janeiro de 2021, reconhecendo a heroicidade das suas virtudes, depois do voto positivo do congresso
de
teólogos,
Bispos
e
Cardeais se terem reunido em 12 de Janeiro deste ano. Tive
o
privilégio
correspondido
com
de este
me Homem
ter e
Santo e de ter visitado a Fundação com o seu nome, em Paris, onde tratam e investigam
as
doenças
genéticas
humanas. Num momento dificílimo para a nossa Cultura, homenagear e recordar este Homem é um dever, sobretudo quando nos impõem uma “limpeza” da nossa memória e dos que nos ajudaram a ser o que somos (ainda!).
João Paulo II a rezar na sepultura de Jérôme Lejeune
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O OUTONO MARCELISTA ANTÓNIO DE SOUZA-CARDOSO
Abstract
Résumé
Only a minority of the Portuguese think
Seule une minorité de Portugais pense qu'il est pertinent de choisir le président et la majorité de cette minorité vote toujours pour le président qui est déjà là, ne servant pas l'objectif sous-jacent à une élection, qui est l'alternance. Ce qui veut dire, par simple raisonnement syllogistique, que les Portugais se débrouillent bien sans l'élection du chef de l'Etat. Le président n'était pas et ne sera pas, politiquement parlant, de tous les Portugais. Et si au premier mandat il pouvait prétendre qu'il l'a fait, au second et dernier mandat, le Président aura tendance à représenter la Famille politique qui a toujours été la sienne.
it is relevant to choose the President, and
the
majority
of
that
minority
always votes for the President who was already
elected,
not
serving
the
purpose underlying any election, which is alternation. The President was not and will not be, politically
speaking,
of
all
the
Portuguese. And if in the first term he could
pretend
that
he
did,
in
the
second and last term, the President will
tend
to
represent
his
political
family. Key words: President; independence; King.
Nada de novo em relação à eleição de Marcelo. Nem o próprio Marcelo que não sendo novo, fica a dever a maioria reforçada nesta eleição ao facto de também não ser novo no cargo. O sufrágio universal tem, sem hipocrisias ou formulações politicamente correctas, muitas virtudes
Mots clés: Président; indépendance; Roi.
e alguns inconvenientes. As virtudes são conhecidas inalienável
e
radicam da
no
princípio
igualdade.
Os
inconvenientes têm precisamente a ver com
a
marotice
de
quem
aplica
o
sufrágio e de quem escolhe que ele seja…, normalmente indirecto.
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Quer dizer nas eleições legislativas, por exemplo, não elegemos o primeiroministro, nem sequer podemos dizer, como bem sabe Passos Coelho, que o partido mais votado tem como garantia designar o primeiro-ministro. Apesar de toda a Campanha ser feita á volta de um Programa de Governo e de protagonista que o assume. É esta falsa relação entre eleitores e eleitos que perverte a bondade do sufrágio indirecto, típico das democracias parlamentares. Já nas eleições que preconizam o sufrágio directo há uma relação pessoal que o eleitor entende bem. E uma absoluta e comprovada valorização da continuidade. A confiança e a ausência de risco, ou por outras palavras a pouca vontade de experimentalismos, têm sido uma constante da eleição Presidencial. E os Presidentes, todos, têm visto as suas maiorias reforçadas na segunda eleição. Acredito com total sinceridade que se não existisse limitação de mandatos, ainda lá estaria notem, por vontade do povo, o General Ramalho Eanes. A outra constante da eleição Presidencial é a falta de importância que lhe é prestada por um grande
número de portugueses. Mais de metade dos portugueses não acham útil ou relevante eleger o Chefe de Estado e de entre os que acham, a grande maioria prefere garantir a continuidade e a estabilidade, do que apostar na mudança. Em suma, só uma minoria dos portugueses acha relevante escolher o Presidente e a maioria dessa minoria vota sempre no Presidente que já lá está, não servindo o objectivo subjacente a qualquer eleição que é a alternância. O que quer dizer, por simples raciocínio silogístico que os portugueses passam bem sem a eleição do Chefe de Estado. E passavam ainda melhor se á continuidade, estabilidade, experiência e confiança no Chefe de Estado, pudessem ainda acrescentar, a independência, a isenção e a possibilidade de terem uma Chefia de Estado conciliada com a sua história, a sua cultura, a sua identidade. A Nação e o Estado reunidos por um elemento agregador retirado do espectro de todas as frivolidades político-partidárias e verdadeiramente ao serviço de todos: - O Rei, pois claro, na sua força calma, na perenidade do seu compromisso com a nação que serve de forma referencial e permanente. Mas o ponto principal deste artigo é o de mostrar que a segunda eleição de um Presidente é tão previsível como enganadora ou mentirosa. Isto é, os que valorizaram a continuidade na eleição do Chefe de Estado irão ser fatalmente enganados porque o Presidente reeleito vai fazer tudo menos continuar o
Imagem retirada da seguinte página: https://www.lavozdegalicia.es/noticia/galicia/2018/07/25/presidente-afectos/0003_201807G25P5991.htm#
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mesmo tipo de mandato que exerceu na primeira eleição. E isto ocorre pela razão mais pueril: - É que o Presidente não é isento. O Presidente não é independente. O Presidente não foi nem será, politicamente falando, de todos os Portugueses. E se no primeiro mandato podia fazer de conta que sim, no segundo e último mandato - a vertigem do Outono!, o Presidente tenderá a voltar a representar a Família política que sempre foi a dele. E em representação de quem, não poucas vezes, terá a tentação de regressar, como ocorreu sem bons resultados com Ramalho Eanes na fundação do PRD e com Mário Soares, num regresso pouco inspirador á liça partidária.
Ao dia de hoje, em plena Semana Santa, já se percebeu ao que vem Marcelo neste segundo mandato e já se notam as primeiras brechas com o Governo que, no dizer de muitos, o próprio Marcelo “trouxe ao colo” na legislatura anterior. Será um Marcelo mais genuíno, mais verdadeiro, mais autenticamente ligado á sua Família política. Mas não será, fatalmente, o Marcelo que a maioria decidiu reeleger. Marcelo quer liderar a oposição pela tentação irresistível de ser imortal. Mas como, apesar das tentações só somos imortais perante a nossa Fé e porque Marcelo não se chama Marcelo por acaso, temo que este segundo mandato venha a ficar ironicamente na História como o Outono Marcelista!
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