Real Gazeta do Alto Minho | N.º 28

Page 1

REAL GAZETA DO ALTO MINHO EDIÇÃO DO CENTRO DE ESTUDOS ADRIANO XAVIER CORDEIRO | N.º 28

DIRECTOR JOSÉ ANÍBAL MARINHO GOMES REDACTOR PORFÍRIO SILVA

ENTREVISTA AO ENG.º RIBAU ESTEVES

JUNHO 2021

PÁG. 43

‘Afinal ao Duque de Bragança, D. Duarte Pio, enquanto descendente e representante dos Reis de Portugal, deve ser conferido um tratamento de particular respeito. Sendo eu Republicano, sei reconhecer virtudes nessa possibilidade que se constata em vários Países Europeus, com destaque espacial para Espanha.’


CONTEÚDO PÁG. 08 - A MONARQUIA BRITÂNICA - NA ORIGEM DO PARLAMENTARISMO PÁG. 18 - O PATRIOTISMO E A LÍNGUA PORTUGUESA PÁG. 20 - HÁ 30 ANOS ESTEVE NAS ILHAS TERCEIRA E S. MIGUEL PÁG. 23 - MONARQUIA TEMPERADA VS RES PRIVATA PÁG. 31 - AOS JOVENS MONÁRQUICOS PORTUGUESES PÁG. 34 - MONARQUIA EM PORTUGAL - PREPARAR O DIA SEGUINTE PÁG. 39 - O PRÓXIMO CONGRESSO ELEITORAL E O “3.º MANIFESTO ROIALISTA” PÁG. 43 - ENTREVISTA AO EX.MO. SENHOR PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE AVEIRO, ENG.º RIBAU ESTEVES PÁG. 49 - DA NECESSIDADE DA TAPADA E DE OUTRAS COISAS MAIS PÁG. 53 - PANDEMIA – FACTOS, CRENÇAS E IDIOSSINCRASIAS PÁG. 57 - PÉS, O ALICERCE DO CORPO PÁG. 61 - ARREDA, O PRÍNCIPE BOMBEIRO

JUNHO 2021


REAL GAZETA DO ALTO MINHO

EDITORIAL PORFÍRIO PEREIRA DA SILVA

«Sem império dificilmente teríamos mantido a independência em certas épocas. Seríamos uma Catalunha “menos”. O império fez com que conseguíssemos manter-nos soberanos nos momentos mais difíceis». Ramalho Eanes

Nos tempos que correm há sempre motivos para trazer à colação, como forma de encobrir a incongruências ou incompetências presentes, o funcionamento das instituições sociais e políticas dos regimes anteriores. Tem sido sempre assim nas mudanças de regimes, estritamente alimentadas por polémicas político-partidárias, por forma a tentarem apagar a história, naquilo que caracteriza a identidade de um povo, na sua personalidade, na sua unidade e na sua continuidade, tanto no que ela tem de bem ou de mal. Segundo Ramalho Eanes, e como se a Família Real portuguesa não o fizesse e sentisse na prática, é nossa obrigação respeitar a personalidade, enquanto identidade do povo, manter a sua memória colectiva e garantir a continuidade, permitindo que ela se mantenha ao longo da História. O império e a escravatura (sendo esta última tão presente nos tempos de hoje, independentemente da cor da pele) são a causa-efeito do fracasso ou instabilidade dos regimes republicanos. Pelo menos, assim nos tentam convencer ou fazer acreditar. Da ideia de raça, nas suas diferentes dimensões, de forma imprecisa e demagógica, passamos ao racismo que, tal como escreveu Jorge Vala, se processa numa espécie de ideologia “que se alimenta dessa forma de classificação da diversidade humana, tornando radicalmente diferentes os grupos humanos e organizando-os numa hierarquia pensada como inevitável”. Esta ideia é levada ao extremo da ridicularização de transformar o conceito de “raça humana” na identificação dos aspectos nucleares do racismo, permitindo-se a reforçar, propositadamente, um preconceito racial, envolto em violência e descriminação ideológica, trazida sempre dos erros do passado e nunca dos propósitos “angélicos” do presente. Tudo serve de arma de arremesso para lutar contra o património evocativo que nos liga ao regime monárquico. “O desrespeito desta esquerda festiva em relação ao passado do país é uma atitude indesejável…” – disse-o Ramalho Eanes. Passados tantos séculos, tudo o que está por resolver tem sequelas do passado. O mal em nada se deve aos pecados do presente, porque vão-se mastigando virtudes, supostamente adquiridas através de consequências do processo de classificações ideológicas, carregadas de subjectividades e influências da cultura emotivista dominante. Voltamos a dissimular créditos de “moral e ética” comunitária, equilíbrio do poder ou ideia de justiça, ao sabor dos regimes saídos das revoluções ou de “golpes palacianos”. Psicologicamente falando, claro… Infelizmente, vivemos o tempo de trocar a qualidade da natureza humana, pelo ritmo das “vacinações” deturpadoras do justo conceito eminentemente histórico e de natureza política!

JUNHO 2021


PÁGINA 4 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

REIS DE PORTUGAL Consorte – D. Maria Leopoldina Áustria, D. Amélia de Leuchtenberg.

D. Pedro IV

Dinastia – Bragança. Cognome Soldado”.

Nascimento – 12 de Outubro de 1798 no Palácio Real de Queluz, Lisboa. Morte – 24 de Setembro de 1834 Palácio Real de Queluz, Lisboa. Conforme seu pedido, o seu coração foi depositado na Igreja da Lapa no Porto, e o seu corpo sepultado no Panteão Real da Dinastia de Bragança, Mosteiro de São Vicente de Fora, Lisboa e posteriormente transladado para a Cripta do Monumento à Independência do Brasil, também conhecido por Monumento do Ipiranga ou Altar da Pátria, em São Paulo. Reinado – 10 de Março de 1826 a 2 de Maio de 1826. Regente de Portugal - 3 de Março de 1832 a 24 de Setembro de 1834.

da

“o Libertador” e “o Rei

Títulos, estilos e honrarias

“Sua Alteza, o Sereníssimo Infante D. Pedro, Grão-Prior de Crato” (12 de Outubro de 1798 – 11 de Junho de 1801. “Sua Alteza Real, o Príncipe da Beira” (11 de Junho de 1801 – 20 de Março de 1816). “Sua Alteza Real, o Príncipe do Brasil” (20 de Março de 1816 – 9 de Janeiro de 1817). “Sua Alteza Real, o Príncipe Real” (9 de Janeiro de 1817 – 10 de Março de 1826). “Sua Majestade Imperial, o Imperador” (12 de Outubro de 1822 – 7 de Abril de 1831). “Sua Majestade, o Rei” (10 de Março de 1826 – 2 de Maio de 1826). “Sua Alteza Imperial, o Duque de Bragança” (15 de Junho de 1831 – 24 de Setembro de 1834).

JUNHO 2021


PÁGINA 5 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O estilo oficial de D. Pedro IV como Rei era: “Sua Majestade Fidelíssima, D. Pedro IV, Rei de Portugal e Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc.”.

Como Rei de Portugal, foi Mestre das seguintes Ordens:

Grão-

Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Ordem Militar de Sant'Iago da Espada. Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito. Real Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.

Filhos Do Primeiro Casamento D. Maria II. D. Miguel, Infante de Portugal, Príncipe da Beira, nasceu a 26 de Abril de 1820. D. João Carlos, (D. João Carlos Pedro Leopoldo Borromeu de Bragança), Príncipe da Beira, (Rio de Janeiro, 6 de Março de 1821 - Rio de Janeiro, 4 de Fevereiro de 1822) (João Carlos Pedro Leopoldo Borromeu de Bragança). D. Januária do Brasil (D. Januária Maria Joana Carlota Leopoldina Cândida Francisca Xavier de Paula Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragança), Condessa d'Áquila e Princesa do Brasil (Princesa Imperial entre 1835 e 1845 (nasceu no de Paço de São Cristóvão, Rio de Janeiro, 11 de Março de 1822 — Nice, 13 de Março de 1901), casou com Luís Carlos, Conde de Áquila, príncipe do Reino das Duas Sicílias, filho do rei D. Francisco I, c.g. D. Paula do Brasil (D. Paula Mariana Joana Carlota Faustina Matias Francisca Xavier de Paula Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga), Princesa do Brasil (nasceu no de Paço de São Cristóvão, Rio de Janeiro, 17 de Fevereiro de 1823 – Rio de Janeiro, 16 de Janeiro de 1833).

JUNHO 2021


PÁGINA 6 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

D. Francisca do Brasil (D. Francisca Carolina Joana Carlota Leopoldina Romana Xavier de Paula Micaela Rafaela Gabriela Gonzaga) Princesa do Brasil (nasceu no Paço de São Cristóvão, Rio de Janeiro, 2 de Agosto de 1824 — Paris, 27 de Março de 1898), casou com Francisco Fernando de Orléans, príncipe de Joinville, filho do rei Luís Filipe I de França e da rainha Maria Amélia de Nápoles, c.g. D. Pedro II, (D. Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga) Imperador do Brasil, (nasceu no Paço de São Cristóvão, Rio de Janeiro, 2 de Dezembro de 1825 – Hotel Bedford, Paris, França, 5 de dezembro de 1891), casou com D. Teresa Cristina das Duas Sicílias, filho do rei Francisco I das Duas Sicílias e de D. Maria Isabel de Bourbon, c.g. Do Segundo Casamento D. Maria Amélia do Brasil (D. Maria Amélia Augusta Eugênia Josefina Luísa Teodolinda Heloísa Francisca Xavier de Paula Gabriela Rafaela Gonzaga) Princesa do Brasil (Paris, 1 de Dezembro de 1831 – Funchal, 4 de Fevereiro de 1853). Filhos naturais De D. Maria Benedita de Castro do Canto e Melo, Baronesa consorte de Sorocaba, filha de João de Castro Canto e Melo, primeiro Visconde de Castro e de D. Escolástica Bonifácia de Oliveira e Toledo Ribas Rodrigo Delfim Pereira, 4 de novembro de 1823 em São José, Rio de Janeiro e faleceu a 31 de Janeiro de 1891, na freguesia de Santos-o-Velho, Lisboa. Diplomata brasileiro que viveu a maior parte de sua vida na Europa. Casou a 14 de Novembro de 1851 no Rio de Janeiro

com D. Carolina Maria Bregaro, filha de Manuel Maria Bregaro, natural do Brasil, e de sua mulher Célestine Clémence Amyot, natural de Paris, com geração. De Domitila de Castro do Canto e Melo, Marquesa de Santos, (São Paulo, 27 de Dezembro de 1797 — São Paulo, 3 de Novembro de 1867), filha de João de Castro Canto e Melo, primeiro Visconde de Castro e de D. Escolástica Bonifácia de Oliveira e Toledo Ribas D. Isabel Maria de Alcântara Brasileira, Duquesa de Goiás (Rio de Janeiro, 23 de Maio de 1824 — Murnau am Staffelsee, 3 de Novembro de 1898), casou com Ernesto José João Fischler de Treuberg, 2º conde de Treuberg e barão de Holsen. c.g. Pedro de Alcântara Brasileiro (4 de Dezembro de 1825 — 13 de Março de 1826), morreu aos três meses de idade. D. Maria Isabel de Alcântara Brasileira (Rio de Janeiro, 13 de Agosto de 1827 — Rio de Janeiro, 25 de Outubro de 1827) Duquesa do Ceará; morreu de meningite aos dois meses de idade. D. Maria Isabel II de Alcântara Bourbon (São Paulo, 28 de Fevereiro de 1830 – São Paulo, 5 de Setembro de 1896) Condessa consorte de Iguaçu, casou com o Pedro Caldeira Brant, Conde de Iguaçu, c.g. De Henriette Josephine Clemence Saisset Pedro de Alcântara Brasileiro (Paris, 28 de Agosto de 1829 – Califórnia, E.U.A. 1902), foi agente consular da França na califórnia, E.U.A., casou com D. Maria Palomares. c.g.

Pai D. João VI Mãe D. Carlota Joaquina

JUNHO 2021


PÁGINA 7 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

D. Pedro IV em pessoa

«Na mocidade pintam-n'o branco, rosado, vivaz nos olhos, alto, desempenado como um pinheiro novo, saudavel e destro. Intellectualmen-te, não se avantajava muito a seu irmão D. Miguel: tinha porém um certo pendor, não convenientemente cultivado, para as bellas-artes. Amava a musica, como um bom Bragança [...] As aptidões musicaes de D. Pedro, mais tarde dirigidas pelo maestro Neukomm, produziram, que se saiba, uma obra em portuguez, composta em Pariz, varios trechos de musica religiosa, uma symphonia a grande orchestra, o hymno da Carta, e o novo hymno constitucional.» (Pimentel-p. 159).

«madrugador, desde os tempos moços do Palácio de S. Cristóvão; trabalhador e estudioso — o descrevia Mansfeldt; — tenaz, assíduo, recto e justo — lhe chamara o pintor Debret; laborioso, corajoso, heroco) e frugal — o classificara Maler; — de índole caprichosa e entusiasta, e de trato afavel e natureza bondosa — o caracterizara Armitage» (Ferrão, p. 399).

Traslado do corpo de D. Pedro IV para o Brasil em 1972

JUNHO 2021


PÁGINA 8 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

A MONARQUIA BRITÂNICA - NA ORIGEM DO PARLAMENTARISMO ANTÓNIO PINHEIRO MARQUES

Abstract

Résumé

The evolution of the Bristish Monarchy in its relation with Parliament and its role in the current United Kingdom political system.

L’évolution de la Monarchie britannique, sa relation avec le Parlement et son rôle dans le système politique actuel du Royaume-Uni.

Key words: Monarchy; parliamentarism.

Mots clés: Monarchie; parlementarisme.

constitution;

dedicar alguma, embora sucinta, atenção à monarquia do Reino Unido.

A monarquia britânica

Quando

são

constitution;

mencionadas

as

atuais

Uma constituição não escrita

monarquias, a britânica é certamente a primeira que surge como sendo das mais

representativas,

importância

do

não

país

no

pela plano

internacional, como pela popularidade e brilho das cerimónias de carácter marcadamente tradicional e que tanto interesse atraem, tanto internamente como

noutros

países.

2021,

marcado

por

Neste

ano

de

aniversários

e

acontecimentos significativos, como o 95º aniversário da Rainha Isabel II ou a morte do Duque de Edimburgo, que teria celebrado o seu 100º aniversário a 10 de Junho, e em que já foi anunciado o

programa

das

comemorações

do

Jubileu de Platina em 2022, é natural

A constituição consuetudinária britânica compõe-se de uma série de documentos, costumes, jurisprudência e práticas de governo bem como de várias leis que foram surgindo ao longo da História. A sua forma de revisão é flexível, uma vez que pode ser alterada por simples leis ou mera constatação de que uma prática foi derrogada pelo desuso. Neste conjunto contam-se documentos fundadores, da Magna Carta à Lei dos Direitos, passando pela Petição de Direitos, que influenciaram outros países, alguns deles antigas colónias inglesas, como as que formaram os Estados Unidos ou as que são hoje estados independentes da Commonwealth .

JUNHO 2021


PÁGINA 9 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Igreja de Inglaterra. A já existente cláusula conhecida como Habeas Corpus foi reiterada na Magna Carta. São estas as disposições que, ainda hoje consideradas necessárias, estão vigentes e que restam de um texto elaborado na Idade Média para responder a exigências dessa época. Seguidamente, Henrique III concedeu em 1217 a Carta da Floresta ( Carta Foresta ), relativa aos direitos de acesso pela nobreza e homens livres às florestas e outras propriedades da Coroa, como terras de cultivo e baldios. A importância destes documentos complementares é realçada por uma multiplicidade de confirmações: do século XIII ao século XV as Cartas foram confirmadas trinta e duas vezes. Seguiu-se, entretanto, um período de desenvolvimento do poder real no século XVI. Conflito com o Parlamento

2015 - Comemoração dos 800 anos da Magna Carta - estátua da Rainha Isabel II em Runnymede

Devemos remontar ao século XII quando, ao subir ao trono em 1100, Henrique I estabeleceu por proclamação a Carta das Liberdades, com o intuito principal de satisfazer as queixas contra abusos de poder. A Carta das Liberdades, também conhecida por Carta da Coroação, foi um documento precursor da Magna Carta ( Magna Carta Libertatum ) concedida por João Sem-Terra em 1215, impondo limites ao poder do Rei, que ficava submetido à Lei, e garantindo, entre outras, as liberdades da cidade de Londres e da

Já no século XVII, o Rei Carlos I aprovou a Petição de Direitos (1628) que lhe fora apresentada pelo Parlamento, mas a luta deste para estabelecer a sua supremacia, contrapondo-se às tentativas do monarca de manter a autoridade real (entendida como de direito divino) viria a conduzir à guerra civil de 1642 a 1651, ao julgamento e decapitação do rei e à abolição da monarquia, substituída por uma Commonwealth of England , com um Conselho de Estado a exercer funções que competiam ao rei e os poderes legislativo e executivo concentrados no Parlamento. Abriu ainda caminho à Commonwealth of England, Scotland and Ireland , governada por Oliver Cromwell, como Lorde Protetor de uma república “sui generis”, de 1653 até à sua morte em 1658, depois de rejeitar em 1657 o título de rei.

JUNHO 2021


PÁGINA 10 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O filho, Richard Cromwell, sucedeulhe como Lorde Protetor, tendo renunciado em 1659, em período de contestação pelos militares e de grande agitação política que conduziu à restauração da monarquia e ao regresso do Rei Carlos II, chamado pelos parlamentares, depois de ter tranquilizado os opositores com a Declaração de Breda em que garantiu liberdades e concedeu um amplo perdão. Ainda no século XVII a reafirmação da importância do Parlamento na vida política e o receio protestante da influência católica levaram, em 1679, à apresentação de uma proposta de lei para exclusão da sucessão ao trono do católico Duque de Iorque, futuro Jaime II. A discussão do projeto no Parlamento levou à formação de duas facções, uma a favor da exclusão, os futuros Whigs , e outra contra, que daria origem aos Tories , componentes do bipartidarismo que dominou a vida política inglesa até ao aparecimento dos Trabalhistas. Carlos II, entre o arrastar das discussões e as dissoluções do Parlamento, conseguiu que a exclusão nunca passasse de projeto. Por outro lado, tinha vindo a promover o casamento das sobrinhas com protestantes, a Princesa Maria, futura rainha, com o primo Guilherme de Orange, governante ( stadhouder ) da República das Províncias Unidas dos Países Baixos e Ana, também futura rainha, com o Príncipe Jorge da Dinamarca. Em 1679, Carlos II sancionou uma nova Lei de Habeas Corpus .

O casamento de Jaime II (VII da Escócia) com Maria de Módena e as posições pró-católicas de ambos, bem como o nascimento de um filho deste casamento que se interpunha entre as princesas protestantes e o trono, levaram, depois da contestação mal sucedida do clero anglicano, a que um grupo de nobres convidasse o Príncipe de Orange, sobrinho e genro de Jaime II a ir para Inglaterra, em 1688, num processo designado como Glorious Revolution .

O

Rei,

entretanto

abandonado por muitos dos seus anteriores apoiantes (e depois de deitar ao Tâmisa o grande selo do Reino numa tentativa de inviabilizar a governação por não se poderem autenticar documentos) fugiu para França, onde foi bem acolhido pelo seu aliado Luís XIV. Este acto foi considerado como uma abdicação do trono, pelo que o Parlamento ofereceu a Coroa aos Príncipes Maria e Guilherme, como co-monarcas. Em fevereiro de 1689, o Parlamento apresentou aos novos soberanos a Declaração de Direitos, que a aceitaram, e foi convertida em lei no final desse mesmo ano. Foram coroados na Abadia de Westminster em abril de 1689, pelo Bispo de Londres, uma vez que o Arcebispo de Cantuária se recusou a fazê-lo por reconhecer Jaime II como rei. Esta coroação é tida por, de certa forma, marcar o fim do absolutismo régio, pois os reis prestaram juramento de governar de acordo com as leis aprovadas no Parlamento e também manter a religião reformada protestante.

JUNHO 2021


PÁGINA 11 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Os representantes do Parlamento oferecem a Coroa aos Reis Guilherme e Maria

Consolidação Parlamento

da

posição

do

A Lei de Direitos de 1689 (na Escócia foi paralelamente aprovado o Claim of Right Act , no mesmo ano e com o mesmo objetivo) garantiu direitos e liberdades que já existiam e introduziu uma série de limites à autoridade real, entre outros para impedir a interferência nas eleições para o parlamento, a fixação de impostos ou o recrutamento de tropas sem consentimento parlamentar. Esta lei permanece no direito de vários países como a Austrália, o Canadá e a Nova Zelândia. A Rainha Ana, grávida dezassete vezes, só teve um filho sobrevivente, Guilherme, Duque de Gloucester, que faleceu em 1700 com onze anos de idade, pelo que se levantou com mais premência o problema sucessório, uma vez que os mais próximos parentes eram todos católicos. Fosse por ser conhecida a eventual simpatia da Rainha por Jaime Stuart, seu irmão exilado, ou para cercear pretensões de eventuais apoiantes jacobitas, principalmente na Escócia país de origem da dinastia, em 1701 o

Parlamento aprovou legislação, de âmbito constitucional, o Act of Settlement , estabelecendo a sucessão protestante na linha da Eleitora Sofia de Hanôver, sobrinha materna de Carlos I de Inglaterra, e seus descendentes. Esta lei está integrada no direito dos quinze outros estados (designados por “reinos da Commonwealth ”) que partilham a mesma dinastia e ordem de sucessão com o Reino Unido, só podendo ser alterada com a aprovação de todos. O ano de 1706 viu a aprovação de duas Leis de União para a constituição do Reino da Grã-Bretanha: Union with Scotland Act e a Union with England Act adoptadas pelos parlamentos inglês e escocês respetivamente. Ambas tornavam possível o estipulado pelo Tratado de União de 1706, entre a Inglaterra e a Escócia, pondo fim à união pessoal dos dois reinos, criando um novo estado, fundindo num só os dois parlamentos anteriormente existentes. O mesmo veio a suceder com as duas Leis de União aprovadas pelos parlamentos de Londres e Dublin, criando o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda em 1800. A estes documentos, de tipo constitucional, juntam-se outros, como as inúmeras leis relativas ao sufrágio e outras questões eleitorais, bem como as leis de reforma da Câmara dos Lordes promulgadas já no século XX.

Sistema de governo

Embora tenha servido de inspiração para a elaboração das teorias de separação de poderes, por Locke e por Montesquieu, o sistema de governo britânico aparenta, formalmente, ser o de fusão de poderes.

JUNHO 2021


PÁGINA 12 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Dois princípios fundamentais enformam toda a vida política britânica: o Estado de Direito, com o império da Lei, à qual todos estão submetidos, e a supremacia do Parlamento, sendo hoje a Câmara dos Comuns o centro da discussão e decisão política. Poder legislativo

A “Coroa no Parlamento” é a expressão que engloba as três componentes do Parlamento: a Rainha, a Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns. A Rainha tem um papel formal e cerimonial, convocando e inaugurando a sessão parlamentar e manifestando a sua aprovação da legislação que lhe é apresentada, uma vez finalizado o processo parlamentar. O assentimento foi feito pessoalmente até ao reinado de Henrique VIII, tendo a partir de então passado a ser concedido por representantes do soberano. Seguindo a tradição e usando o francês anglo-normando, a aprovação de leis é manifestada pela fórmula verbal “ La Reyne le veult ” ou, para as leis relativas a orçamentos e finanças, “ La Reyne remercie ses bons sujets, accepte leur benevolence et ainsi le veult ”. No caso, que se não verifica desde 1708, em que a Rainha Ana negou a conselho dos seus ministros a aprovação de uma lei, a fórmula a pronunciar seria “ La Reyne s’avisera ”. A Câmara dos Lordes

A reforma de 1911, motivada por uma divergência entre o Governo e a Câmara, relativa a questões financeiras, reduziu os poderes dos Lordes em matéria legislativa,

Coroação - 2 de Junho de 1953

subordinando-os aos Comuns, ao deixar de ser necessária a sua aprovação final para os projetos apresentados. O governo de então, ameaçando uma nomeação de número suficiente de pares para votar o projeto de lei, conseguiu que a Câmara aceitasse o Parliament Act com as mencionadas alterações. Em 1949, o governo trabalhista, receoso que o programa de nacionalizações não passasse, fez aprovar nova legislação em sentido ainda mais restritivo dos poderes desta Câmara. A Câmara dos Lordes conta atualmente com quase 800 membros, dos quais 25 lordes espirituais, os principais bispos, encabeçados pelos Arcebispos de Cantuária e de Iorque, representando o total dos bispos da Igreja Anglicana. Os Lordes temporais incluem os pares hereditários, cujo número se eleva a 810 mas, desde a reforma de 1999, apenas 92 têm assento na Câmara em representação dos restantes, existindo a pouco provável possibilidade de os pares hereditários que detenham um título vitalício poderem participar nessa qualidade. De referir que em 1999 foi oferecido a todos os pares hereditários de primeira criação um título vitalício de barão, permitindo-lhes, se assim o entendessem, tomar parte nos

JUNHO 2021


PÁGINA 13 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

trabalhos da Câmara alta. Foi o caso do conde de Snowdon, Anthony Armstrong-Jones, criado barão Armstrong-Jones, em novembro desse ano. Quanto aos pares vitalícios são nomeados como reconhecimento de variadas carreiras profissionais e para aproveitamento da sua experiência para os trabalhos parlamentares. As listas costumam ser anunciadas pelo Ano Novo, pelo Aniversário da Rainha, por ocasião da dissolução do Parlamento ( Dissolution Honours List ) ou no fim do mandato do PrimeiroMinistro ( Resignation Honours List ), contemplando personalidades ligadas aos vários partidos e também independentes. Existe uma Comissão de Nomeações para a Câmara dos Lordes que participa no processo de escolha. Os novos lordes são livres de participar ou não nos trabalhos da Câmara, possivelmente de acordo com o interesse que tiverem nos debates especializados. Não auferem salário mas sim uma compensação para viagens e alojamento nos dias em que compareçam no Parlamento. A Câmara dos Comuns

A Câmara dos Comuns é o centro da vida política e do poder legislativo e de controle do governo. No século XVIII, a subida ao trono de Jorge I, Eleitor de Hanôver, príncipe alemão que não falava inglês, favoreceu a consolidação do sistema parlamentar, dado o seu natural alheamento da governação, ficando a resolução das questões inglesas entregues, com bastante autonomia, ao Cabinet e aos debates e decisões no Parlamento.

Esta Câmara tem atualmente 650 membros representando outras tantas circunscrições eleitorais. O sistema eleitoral inglês em que é eleito o candidato mais votado implica uma ligação direta entre o eleitorado e o eleito, mas por outro lado os eleitores que votam em candidatos que não são eleitos podem sentir que não estão representados. Em 2011, o governo de coligação de David Cameron organizou um referendo propondo a alteração do sistema eleitoral permitindo aos eleitores fazer uma escolha. A questão dividiu os partidos, mesmo os da coligação governamental, com o Partido Conservador a apoiar a manutenção do sistema vigente e o Partido Liberal Democrata a sustentar a opinião contrária. A mudança de sistema eleitoral foi rejeitada por 67,9 % dos votos. No Reino Unido existe o pluripartidarismo, estando onze partidos representados na Câmara dos Comuns. No entanto, e em consequência do sistema eleitoral que beneficia os partidos mais votados e a formação de maiorias, o bipartidarismo domina a formação dos governos; na atualidade o Partido Conservador e o Partido Trabalhista (primeiro partido da oposição) somam 562 dos 650 deputados. Têm ainda representação parlamentar os Nacionalistas Escoceses, os Liberais Democratas e o Partido Unionista da Irlanda do Norte e, com presença residual (1 a 3 lugares), os Nacionalistas Galeses e outros pequenos partidos. O Partido Conservador e o desaparecido Partido Liberal têm remotas origens no século XVII. Os Trabalhistas recuam as suas origens ao início do século XX, tendo formado governos minoritários em 1924

JUNHO 2021


PÁGINA 14 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

e de 1929 a 1931. Em 1988 surge, da fusão do histórico Partido Liberal com os Sociais-democratas, o Partido Liberal Democrata. Outras assembleias legislativas no Reino Unido

O Parlamento Escocês, instituído na sequência do referendo de 1997, contando com 129 membros, tem competências relativas a assuntos que apenas respeitem à Escócia. A primeira sessão foi oficialmente aberta pela Rainha Isabel II em 1999. De acordo com a legislação aprovada pelo Parlamento da Escócia os seus membros prestam um juramento de fidelidade à soberana, que dá a sua aprovação formal à legislação e acompanha os trabalhos através de relatórios semanais. Também Gales conta desde 1997 com uma Assembleia Nacional, de 60 membros eleitos por quatro anos. A Rainha presidiu em 1999 à abertura oficial da primeira sessão da Assembleia, com a presença do Príncipe de Gales, tendo ambos discursado, numa ocasião histórica para o Principado. O assentimento real é necessário para a aprovação da legislação emanada desta Assembleia. Existe ainda a Assembleia da Irlanda do Norte, com 90 membros, criada por lei de 1998, podendo legislar em todas as áreas que não sejam exclusivas do Parlamento do Reino Unido.

parte sob aconselhamento do Governo. Estas atribuições vão da nomeação ou demissão do Primeiro-Ministro e dos membros do Governo, à convocatória ou dissolução do Parlamento, passando pelo comando supremo e nomeações nas forças armadas, o direito de graça, ou a concessão de distinções honoríficas e abrange, na área internacional, a aprovação de tratados, acreditar e receber embaixadores, declarar a guerra e a paz ou enviar destacamentos militares em missão ao estrangeiro. Para o efeito, são frequentemente utilizadas as Orders-inCouncil , aprovadas pelo Conselho Privado. Segundo o princípio The King can do no wrong , a responsabilidade política dos actos é assumida pelos ministros.

Poder executivo

De mencionar a “Prerrogativa real”, também referida como “Prerrogativa da Coroa”, ao abrigo da qual a Rainha exerce vastas competências, na maior

Sessão conjunta das Câmaras em Westminster Hall - Julileu de Diamant

JUNHO 2021


PÁGINA 15 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O Conselho Privado é uma das mais antigas instituições, remontando aos conselhos do rei no período anglosaxónico e normando. É o órgão executivo formal, sendo o Cabinet , órgão de decisão governamental, considerado um dos comités do Conselho Privado. Os seus membros são nomeados vitaliciamente, abrangendo sempre os membros do governo, políticos de todos os partidos, juízes, funcionários públicos, para além de alguns membros da Família Real e bispos anglicanos. O soberano, quando atua em reunião do conselho é referido como The King-inCouncil ou, no atual reinado, The Queen-in-Council . Reúne com a frequência que for necessária, em média uma vez por mês, sob a presidência da monarca e com um quórum de três membros, devendo estar presente o lorde presidente do Conselho. As reuniões são de pé e rápidas, com a Rainha a pronunciar a fórmula de aprovação à medida que vão sendo enunciados os diplomas a sancionar. Com a Câmara dos Comuns convertida em centro da vida parlamentar, os primeiros-ministros passaram naturalmente a ser provenientes desta Câmara. O último Primeiro-Ministro com assento na Câmara dos Lordes foi o marquês de Salisbury, no reinado de Eduardo VII. Alec (Alexander) Douglas-Home, conde de Home, foi escolhido para suceder ao Primeiro-Ministro Macmillan, que se tinha demitido por razões de saúde. Sir Alec teve de renunciar ao assento na Câmara dos Lordes, nos termos previstos na lei, e candidatar-se na primeira eleição parcial para obter um lugar na Câmara dos Comuns.

Na prática constitucional britânica, depois de realizadas as eleições, o monarca incumbe o líder do partido com maior representação parlamentar de formar governo, sendo raramente necessário formar coligações (embora já tenha acontecido para obter uma maioria absoluta). A Câmara dos Comuns poderá manifestar o seu apoio ou rejeição na votação do programa de governo apresentado sob a forma de "Discurso do Trono". O Primeiro-Ministro indica os nomes dos membros do seu governo para nomeação formal pela Rainha, contando o Cabinet , governo no sentido restrito, entre 22 a 24 membros, muito embora o número de ministros seja maior. Semanalmente a Rainha Isabel II recebe em audiência o Primeiro Ministro do Reino Unido e mantém contacto regular com os chefes dos executivos da Escócia, Gales e Irlanda do Norte. Poder Judicial

A Coroa é “Fonte de Justiça”, existindo uma total independência do poder judicial, que é encabeçado pelo Supremo Tribunal de Justiça, o mais alto tribunal do Reino Unido para causas civis; para causas criminais tem jurisdição em Inglaterra, Gales e Irlanda do Norte, uma vez que a Escócia tem a sua própria hierarquia de tribunais criminais. É composto, presentemente, por presidente, vice-presidente e dez outros juízes, podendo o número ser aumentado pela Rainha se necessário. Os juízes do Supremo devem jubilar-se aos 70 anos. A Lei de Reforma Constitucional de 2005 estipula que os nomes dos futuros juízes do Supremo Tribunal de Justiça sejam propostos ao

JUNHO 2021


PÁGINA 16 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Primeiro-Ministro por uma comissão independente que, por sua vez, e sem poder alterar as propostas, os apresenta à Rainha para nomeação formal. Para elaborar as propostas, essa comissão deve consultar previamente os mais altos magistrados em Inglaterra, Escócia, Gales e Irlanda do Norte. Os juízes do Supremo Tribunal recebem o tratamento de cortesia de Lord ou Lady . A monarquia atualidade

britânica

na

Entre as críticas que regularmente aparecem sobre a monarquia, a mais frequente é a questão dos encargos a suportar. Jorge III cedeu em 1760 os rendimentos dos bens de que dispunha a troco de uma subvenção anual, designada por Lista Civil, situação que se manteve até 2012. O montante seria revisto no início de cada reinado, embora no atual, devido à inflação, se tornassem necessários ajustamentos mais frequentes. Para evitar esta situação e a acostumada discussão sobre a necessidade de aumentar a Lista Civil, o Governo fez aprovar em 2011 uma nova lei designada por Sovereign Grant , sendo a contribuição fixada em 15% do rendimento anual obtido pelo Crown Estate , embora, a título excepcional, a percentagem possa ser superior. Relativamente ao Príncipe de Gales, este recebe os proventos do Ducado da Cornualha, criado em 1337, para esse efeito. O Príncipe Carlos cedeu voluntariamente ao Tesouro cerca de 50% destas receitas. A Rainha, por sua vez, dispõe dos rendimentos do Ducado de Lencastre, criado em 1351, e de que Isabel II é titular, como

“Duque”. Como fundos privados que são, a monarca utiliza-os para suportar despesas próprias ou dos seus familiares. Pela sua atualidade, é interessante lembrar o clássico do constitucionalismo Walter Bagehot, que além de economista e editor de “The Economist” durante quase duas décadas, se notabilizou com o seu estudo The English Constitution de 1867. Neste trabalho em vez de se referir à separação de poderes, preferiu dividir as instituições de exercício do poder no Reino no que classifica como a parte dignificada (a monarquia) e a parte eficiente (os que exercem funções de governação). Enunciou claramente os três direitos que, numa monarquia constitucional com as características da britânica, o monarca detém: “o direito de ser consultado, o direito de encorajar e o direito de prevenir”, teoria ainda hoje válida. Por outro lado, e mais recentemente, o incontornável professor do King’s College de Londres e da Universidade de Oxford, Vernon Bogdanor, constitucionalista e politólogo, considera fundamental a separação das funções de Chefe de Estado das funções governativas (segundo o consagrado princípio “o rei reina, mas não governa”) garantindo numa monarquia constitucional que o Chefe de Estado não tenha ligações partidárias. Salienta também o papel unificador da monarquia, de maior relevância num estado multinacional como o britânico, uma vez que apenas o monarca pode verdadeiramente pertencer a qualquer e a todas as nações ao mesmo tempo. Vernon Bogdanor releva ainda o papel da monarquia na vida internacional, de especial importância no exercício da chefia simbólica da Commonwealth .

JUNHO 2021


PÁGINA 17 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Comunidade de composição muito diversificada e que se revê favoravelmente no atual sistema, como sabemos, rejeitando a possibilidade de uma liderança eletiva ou rotativa, possibilidades que o Professor Bogdanor considera expostas a desgaste ou a escolhas pouco adequadas. A presença, tantas vezes discreta da Rainha e da Família Real, muito enraizada na vida quotidiana da sociedade britânica, consubstancia-se através de uma rede de entidades a que estão ligados institucionalmente como as Igrejas de Inglaterra ou da Escócia, ou como patronos ou presidentes de associações de âmbito nacional ou regional ou ainda de organizações não-governamentais. Somam-se também as universidades e as várias dezenas de regimentos de que os membros da Família Real são coronéis honorários. Por outro lado, a título de curiosidade, mencione-se que a Rainha Isabel II está pessoalmente ligada a 600 dessas instituições e o Príncipe Carlos a cerca de 400, para não mencionar os restantes membros ativos da Família Real. A monarquia demonstrou uma notável capacidade de adaptação e, à

excepção do conflito entre a Coroa e o Parlamento no século XVII, as dificuldades provocadas pela evolução social e política foram resolvidas de forma bem aceite pela sociedade. Como sabemos as normas relativas aos casamentos e sucessão na Coroa britânica e nos restantes reinos foram alteradas em 2012, tendo entrado em vigor em 2015. O princípio básico relativo à atuação política do monarca é a sua mais estrita neutralidade. Apesar de os mais críticos considerarem que a Monarquia é um “carimbo de borracha” no sistema político, o certo é que sem esse carimbo o sistema não funcionaria, sendo em contraposição relevada a sua influência suave na sociedade, sobretudo em momentos graves da vida nacional. Também nas relações internacionais se fala na soft diplomacy da Família Real. Os mais minuciosos na sua análise salientam mesmo que a neutralidade política da Coroa permitiu um desenvolvimento bastante perfeito do sistema de democracia parlamentar inspirador para outros estados e que, neste seu modelo designado por “Sistema de Westminster”, é aplicado por trinta e três outros países, incluindo a Irlanda e Israel.

Cimeira de Londres, 2018, em que foi escolhido o Príncipe Carlos como futuro Chefe da Commonwealth

JUNHO 2021


PÁGINA 18 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O PATRIOTISMO E A LÍNGUA PORTUGUESA HUMBERTO PINHO DA SILVA

Abstract

Résumé

Patriotism is to love the land where you were born and raised. Be proud of the mother tongue, and the traditions and customs of your homeland.

Le patriotisme, c'est aimer la terre où vous êtes né et où vous avez grandi. Soyez fier de la langue maternelle, des traditions et des coutumes de votre patrie.

Key words: portuguese.

Pride;

mother

tongue; Mots clés: Orgueil; langue maternelle; portugais.

Ser patriota parece estar fora de moda. Confunde-se, muitas vezes, patriotismo, com nacionalismo: Patriotismo, é amar a terra onde se nasceu e se criou. Ter orgulho na língua materna, e nas tradições e costumes da sua pátria. Nacionalismo, exalta acerbamente o patriotismo. Pode degenerar em xenofobia, e pior ainda: em chauvinismo, provocando agressividade aos que possuam nacionalidade diferente. A globalização, as duplas ou mais nacionalidades, o receio de ser apelidado de xenófilo, esbateu o amor á pátria. Verifica-se isso em figuras públicas – intelectuais, políticos, desportistas, – quando se encontram no estrangeiro, ao exprimirem-se, quase sempre em inglês, como se a língua portuguesa não fosse a quarta mais falada no mundo…

Francisco Moita Flores, no seu artigo: “Uma Pátria Imensa”, na revista “Montepio” – 2015, referindo-se aos que desprezam a língua portuguesa, escreveu: “Mesmo aqueles que são eleitos e representam Portugal, descem os degraus da grandeza que receberam como herança, para discursarem em inglês. Com todo o respeito pelo inglês, jamais ouviremos uma rainha ou um primeiro-ministro britânico fazer o mesmo”.

JUNHO 2021


PÁGINA 19 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Sobre línguas estrangeiras, que os portugueses e brasileiros tentam exprimirem-nas o mais corretamente possível, escutemos a opinião de Eça de Queiroz, in: “A Correspondência de Fradique Mendes”: “Um homem deve falar com impecável segurança e pureza a língua da sua terra: todas as outras as deve falar mal, orgulhosamente mal, com aquele acento chato e falso que denuncia logo o estrangeiro. Na língua verdadeiramente reside a nacionalidade, e quem for possuindo com crescente perfeição os idiomas da Europa vai gradualmente sofrendo uma desnacionalização. Não há para ele o exclusivo encanto de falar materno com as suas influências efetivas, que o envolvam, o isolam das outras raças e o cosmopolitismo do verbo irremediavelmente lhe dá o cosmopolitismo do carácter. Por isso o poliglota nunca é patriota. Com cada idioma alheio que assimila introduzem-se-lhe, no organismo moral modos alheios de pensar, modos alheios de sentir. O seu patriotismo desaparece diluído em estrangeirismo.”

A respeito do amor à língua, disse também António José Saraiva, numa entrevista ao: “Público” (02/03/93): “Um castelhano só fala castelhano em qualquer parte do mundo. A gente ouve em Paris, um castelhano falar francês duma maneira que se percebe logo que ele é castelhano. Não sabe falar francês direito. O português coitadinho, adapta-se, fala português, pretendendo falar francês, e quando chega, vem cheio de “pierres”, “à gouche”… Queixam-se que a língua portuguesa é um túmulo. Se o é, deve-se aos que a beberam com o leite materno, envergonharem-se dela; já que são 361 milhões os que a falam, sem contar a diáspora portuguesa, brasileira e países africanos… O complexo de inferioridade, está tão entranhado na alma dos que falam português, que me disseram que certa figura pública, da área da ciência, quando esteve em França, falava em francês com os patrícios, para não ser reconhecido como português!…

JUNHO 2021


PÁGINA 20 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

HÁ 30 ANOS ESTEVE NAS ILHAS TERCEIRA E S. MIGUEL PHILIP DE EDIMBURGO JÁCOME DE BRUGES BETTENCOURT

Abstract

Résumé

The Duke of Edinburgh visited Ilha Terceira on March 24, 1991 and, in Angra do Heroísmo, the then Minister of the Republic for the Autonomous Region of the Azores, General Vasco Rocha Vieira, offered a dinner in his honor after the reception, in the solar da Madre de Deus. On the last day of the Duke of Edinburgh's visit to the Azores, he was in S. Miguel, where the then President of the Regional Government, Mota Amaral, organized a lunch in his honor at the palace Parque Terra Nostra.

Le duc d'Édimbourg a visité l'île de Terceira le 24 mars 1991 et, à Angra do Heroísmo, le ministre de la République de la région autonome des Açores, le général Vasco Rocha Vieira, a offert un dîner en son honneur après la réception, dans le solar da Madre de Deus. Le dernier jour de la visite du duc d'Édimbourg aux Açores, il était à S. Miguel, où le président du gouvernement régional de l'époque, Mota Amaral, a organisé un déjeuner en son honneur au palais du Parque Terra Nostra.

Key words: Duke of Edinburgh; 1991; Açores; Ilha Terceira; S. Miguel.

Mots clés: Duc d'Édimbourg; Açores; Ilha Terceira; S. Miguel.

Foi há, precisamente, trinta anos que esteve na ilha Terceira, no dia 24 de março de 1991, Philip Mountbatten, ou melhor S.A.R. o duque de Edimburgo, conde

de

Meríoneth

e

barão

de

Greenwich, marido da rainha Isabel II de

Inglaterra,

novembro

de

matrimonial

desde 1947,

o em

realizada

na

dia

20

de

cerimónia Abadia

de

Westminster transmitida pela BBC para todo o mundo, vista por mais de 200 milhões

de

pessoas,

iam

agora

completar 74 anos de união, não fosse ele falecer hoje, 09 de abril de 2021. JUNHO 2021

Philip e Isabel II

1991;


PÁGINA 21 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Sua Majestade Britânica fez no dia 21 de abril, 95 anos de idade e o Príncipe Philip, completaria no dia 10 de junho, um século de vida extraordinariamente intensa. Nascido em território grego, em Mon Repos, ilha de Corfu, (que visitei em 2007 ao participar de 2 a 10 de junho num cruzeiro no “Splendour of The Seas” da Royal Caribbean International que incluiu algumas ilhas gregas, saído de Veneza, passando por Mykonos, Pireu, Atenas, Katakolon, Corfu, Split (Croácia), nova estada em Veneza e passagem via terrestre por Pádua, Verona e Milão, onde apanhei avião para Lisboa), filho do príncipe André da Grécia e da Dinamarca e da princesa Alice de Battenberg, neto do rei Jorge I da Grécia, assassinado em 1913, corria-lhe nas veias sangue das principais casas reais europeias. Por força das circunstâncias então vividas, viu-se obrigado a estudar em vários países como França, Alemanha e Inglaterra (Escócia) e em 1939 foi integrado na Marinha Real Britânica, onde se distinguiu como o melhor cadete do seu curso na Real Escola Naval. Esteve embarcado em vários navios, como no couraçado HMS Ramillies a proteger embarcações australianas no Índico, no Ceilão (atual Sri Lanka), etc. Tripulou navios da frota do Pacífico e do Mediterrâneo em outubro de 1940 e participou durante a guerra, nas batalhas de Creta e do Cabo Tênaro, que lhe valeram a Cruz de Guerra grega por bravura e valorizaram a sua brilhante carreira que primou por grande tenacidade, coragem e engenho. Quando o Japão capitulou, Philip estava, como tenente, a bordo da frota aliada na baía de Tóquio. Serviu em diversos navios de guerra sempre

com grande competência, tendo comandado a fragata HMS Magpie. Philip era sobrinho dessa ímpar figura que foi lorde Louis Mountbatten (19001979), último vice-rei da Índia e primeiro governador-geral do Independente Domínio da Índia, Supremo Comandante Aliado do Sudeste da Ásia na 2ª Guerra Mundial, 1.º Lorde do Mar, etc. Ao tornar-se príncipe consorte, Philip dedicou a sua vida a representar oficialmente a coroa britânica em substituição da monarca em cerimónias públicas e oficiais, excetuando as do Parlamento, durante as mais de 7 décadas em que foi rosto importante da Monarquia Inglesa. Aposentou-se da vida pública nos finais de 2017. Entre as dezenas de condecorações que possuía, figuram as portuguesas: grãcruz da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor Lealdade e Mérito, 1955; grande-colar da Ordem do Infante D. Henrique, 1973; grã-cruz da Ordem Militar de Avis, 1979 e grã-cruz da Ordem Militar de Cristo, 1993.

Aurélio F. Fonseca, Jácome de Bruges Bettencourt, Duque de Edimburgo, José Guilherme Reis Leite, J.H. Simões Flores (vicecônsul honorário da Grécia). Solar da Madre de Deus em Angra, 1991.03.24.

JUNHO 2021


PÁGINA 22 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Na

sua

passagem

por

Angra

do

Curiosamente,

de

Heathrow o avião de regresso, eis que

Açores,

reparo se dirigirem a mim e à minha

Vieira,

no

aeroporto

República para a Região Autónoma dos Rocha

noite,

no

dia

Vasco

à

esperava,

Heroísmo em 1991, o então Ministro da general

12

quando

ofereceu-lhe após a receção, um jantar

mulher, S.A.R. o senhor D. Duarte de

em sua honra no solar da Madre de

Bragança e o Príncipe da Beira, D.

Deus,

estando

Afonso, que igualmente aguardavam o

convidados.

mesmo voo para Lisboa. Eles, também

Como aperitivo foi servido um verdelho

com parentescos em todas as casas

dos Biscoitos, Praia da Vitória, Chico

reais europeias…

Maria Brum (seco) da Casa Agrícola

O

Brum,

um

biblioteca pessoal de cerca de 12 mil

Madeira da Henriques & Henriques, Lda.

obras e para além de leitor atento,

No último dia da visita do Duque de

escreveu

Edimburgo aos Açores, este deslocou-se

discursos,

a S. Miguel, tendo o então presidente

sozinho,

do

oficiais. Gostava de pintar.

onde

presentes

ficou

cerca

Lda.,

e

Governo

instalado, de

20

como

digestivo

Regional,

Mota

Amaral,

Príncipe

Philip

14

reuniu

livros

e

fez

marcando em

mais

5.500

presença

de

22.300

Apreciava

no palacete do Parque Terra Nostra,

como

propriedade da empresa detentora do

relacionasse

Hotel das Furnas, ou seja, o Grupo

marinheiro

Bensaude.

modalidades desportivas. Viajou como

Recordo que na minha última estada

poucos, por todo o Mundo.

pela 5ª vez em Londres, de 3 a 12 de

As

junho

Edimburgo

2010,

percorrendo

mas

a

nessa

altura,

Inglaterra,

Irlanda,

adorava

o

parque

Edimburgo

circundante

Buckingham,

ao

numa

dia

de

que

que

o

foi.

o

que

mar,

Praticou

ao

assim se

como várias

Duque

de

multiplicaram-se e

por

Comunidade

toda

a

Britânica.

5,

no

Sem dúvida, o que vem demonstrar a

palácio

de

estima

espetacular

guardo

que

o

Povo

tem

pela

monarquia e a figura de Isabel II.

cerimónia com desfile de militares a cavalo,

com

extraordinariamente Inglaterra

de

tudo

homenagens

Escócia e País de Gales, voltei a avistar Duque

Pescava,

atos

organizado um almoço em sua honra

de

cozinhar.

uma

imagens

fotográficas.

JUNHO 2021

sua


PÁGINA 23 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

MONARQUIA TEMPERADA VS RES PRIVATA MIGUEL VILLAS-BOAS

Proclamação da independência de Portugal nas Cortes de Lamego

Abstract

Résumé

The republic began to witness a tragic spectacle in which only a few lorded over the power and had access to the main functions. The thing stopped being public and became private: the res publicae degenerated into res privatae. There was simply an oligarchic regime entirely devoted to serving a caste, that is, a mere Res Privatae. At the opposite end of all this is the most perfect of regimes: the temperate Monarchy. In the organic monarchy or under a traditional aegis, the King reigns and governs, but his power is limited by the assemblies - namely the Cortes, the professional associations and the municipalism constituted by representatives of the intermediary bodies, of the natural groups that make up the Community, which are responsible for the administration of state affairs.

La république a commencé à assister à un spectacle tragique dans lequel seuls quelques-uns dominaient le pouvoir et avaient accès aux fonctions principales. La chose a cessé d'être publique et est devenue privée : la res publicae a dégénéré en res privatae. Il y avait simplement un régime oligarchique entièrement voué au service d'une caste, c'est-à-dire d'une simple Res Privatae. A l'opposé de tout cela se trouve le plus parfait des régimes: la monarchie tempérée. Dans la monarchie organique ou sous une égide traditionnelle, le Roi règne et gouverne, mais son pouvoir est limité par les assemblées - à savoir les Cortes, les associations professionnelles et le municipalisme constituées de représentants des corps intermédiaires, des groupements naturels qui font la Communauté, qui sont chargés de l'administration des affaires de l'État.

Key words: Res Privatae; Monarchy; Old Freedoms.

Organic Mots clés: Res Privatae; Organique; Anciennes Libertés.

JUNHO 2021

Monarchie


PÁGINA 24 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

No direito romano, o adjetivo latino privatus era utilizado para distinguir entre o que é "privado" e o que é "público", sendo que o que era publicus tinha o sentido de "pertencente ao povo romano". Utilizado como substantivo, o termo privatus designa o cidadão romano que não é um magistrado público (cargo electivo). Durante o período republicano, um privatus podia, por vezes, receber o imperium

durante

uma

crise,

um

evento cuja definição é elástica, tornando-se um privatus cum imperio ; ora a concentração de poderes por indivíduos colaborou expressivamente para a derrocada do sistema de pesos e contrapesos que mantinha viva a própria res publicae .

Ontem como hoje, na república passou a assistir-se a um trágico espectáculo em que apenas uns quantos senhoreiam o poder e têm acesso às principais funções. Com esse numerus clausus , em que o único tipo de representação é o de listas fechadas, com nepotismo, clientelas, sinecuras, conezias, governos onde convivem pais e filhos e guildas de enteados do regime que possuem um cartão premium de membro vitalício saltitando de tacho em tacho, e nos impingem as suas carrancas durante dezenas de anos, ensimesmados numa oligarquia em que não entra o respeitável Sr. Mérito, as críticas resvalam na indiferença, os casos de corrupção e incompetência avolumamse sem consequências e/ou demissões, assobiando os responsáveis políticos para o ar fingindo que nada aconteceu, numa ignorância totalitária que torna os inábeis e os negligentes ficarem ‘sempre-em-pé’, como o boneco. E as eleições são já pura pro forma de cumprimento de calendário. Assim, ao invés de a coisa continuar a ser pública passou a ser privada: a res publicae degenerou em res privatae – até porque existe uma porta giratória.

Coisa Pública ou Coisa Privada O Sempre-em-pé republicano, balança mas não cai

JUNHO 2021


PÁGINA 25 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O regime da arbitrariedade inaugurado ficou em rédea solta, e só a aversão destes homens à democracia é que é pública, pois o recurso à supracitada é puramente instrumental, deixando os cidadãos votar porque ganham sempre os mesmos, os que lá estão, para logo depois lhes voltar a exigir a vassalagem com imposições estapafúrdias em crescente de aviltamento. Passou a existir simplesmente um regime oligárquico inteiramente devotado a servir uma casta, ou seja, uma mera Res Privatae.

‘ Quase todos os autores escolásticos, tanto

antigos

quanto

modernos,

juntamente com grande número de outros autores não escolásticos, afirma que a Monarquia temperada é a forma preferível in abstracto ’, escreveu o Pe.

Ireneu González S.J. in Philosofiae Scholasticae Summa, BAC, Madrid, 1952, v. III, pp. 836-837.

Monarquia Temperada ou Orgânica

O filósofo, jurista, cientista político e professor universitário brasileiro, fundador da Faculdade Paulista de Direito, José Pedro Galvão de Sousa (São Paulo, 6 de Janeiro de 1912 — 31 de Maio de 1992) explicou: ‘ tal é a Monarquia

portuguesa nos seus primórdios. Tem um cunho eminentemente popular. Paternal e popular ao mesmo tempo. A Nação é uma grande família, de que o Rei é o chefe. O que, em parte, se verifica noutros povos da época. É a monarquia temperada, dentro das condições peculiares à sociedade de então. Monarquia limitada pelas ordens, como se tem dito. ’ Na monarquia orgânica ou sob uma égide tradicional o Rei reina e governa, mas tem seu poder limitado pelas assembleias - nomeadamente as Cortes, as agremiações profissionais e o municipalismo - constituídas pelos representantes dos corpos intermediários, dos grupos naturais componentes da Comunidade, às quais cabe a administração dos negócios do Estado. Foi com El-Rei Dom Afonso III de Portugal, nas Cortes de Leiria de 1254, que as liberdades municipais passaram a ser uma regra essencial de governação, pois a representação nacional foi alargada aos Municípios. O papel democrático dos municípios tornava-o em real representante de toda a comunidade local diante do Rei que valorizava o apoio popular, tornando a Monarquia Portuguesa uma democracia orgânica, pois os conselhos municipais compostos por ‘ vizinhos ’ tinham capacidade política e um enorme conjunto de liberdades fundamentais, regalias e seguranças, normalmente consignadas em carta de Foral - que elencava as matérias relativas à liberdade das pessoas, ao direito de asilo, à defesa dos direitos em juízo, à tributação, à inviolabilidade do domicílio – tudo isto em plena Idade Média. A importância destes concelhos era tal que eram enviados representantes às cúrias extraordinárias, as Cortes. Pode assim

JUNHO 2021


PÁGINA 26 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

ser vista como uma Monarquia temperada, aquela que em que a autoridade do monarca é limitada de outro ou outros poderes, tida por São Tomás de Aquino como a melhor dentre as formas de governo. E como é aquele regime político em que há a preocupação em que a sociedade se veja melhor representada é igualmente denominada monarquia representativa e como tal deve ser também vista como uma monarquia hereditária, nesse aspecto, como quase todas o são. De acordo com Santo Tomás de Aquino que, em "Do governo dos Príncipes", tendo em vista tal tipo de Monarquia, a denominada Monarquia Temperada, afirma ser a Monarquia, isto é, o governo justo de um só, a melhor das formas de governo, ressaltando que ‘ as províncias e cidades governadas por um só rei, gozam de paz, florescem na justiça e alegram-se com a opulência ’.

todos ou que ao menos todos possam elegê-los. (...) Devemos, pois, manifestar o nosso integral repúdio a esta “nossa” República inautêntica, antinacional e antitradicional, cópia mal feita de modelos surgidos a partir da “Reforma”, do “Iluminismo” e do Enciclopedismo, isto é, das ideologias que há séculos desgraçam o Mundo, nele havendo implantado o Império de Calibã, a nefasta civilização da técnica, do ouro e do número, onde a tirania dos “déspotas esclarecidos” de ontem cedeu lugar àquela dos banqueiros de hoje. E devemos, por conseguinte, lutar para que a República, nascida de um golpe militar desferido à revelia do nosso povo e contra a Nação Profunda, Verdadeira e Autêntica e as suas mais lídimas tradições, um dia caia finalmente “por terra, para a confusão de quem concebeu tão horrorosa ideia. ’

Ainda na referida obra, pondera o Aquinense que a Monarquia, ainda quando decaída, é a melhor das formas de governo e que o governo de um só corrompe-se menos facilmente em tirania do que o governo de muitos. Também na “Suma Teológica” o Doutor da Igreja defende a superioridade da Monarquia Temperada, ou Regime Misto: ‘ A boa ordem governativa de uma sociedade requer duas condições. A primeira é que todos tenham uma parte no poder, visto ser garantida assim a paz do povo e toda gente estimar e defender esta organização. Além disso, que um só homem seja estabelecido todos,

tendo

no

poder

abaixo

e

presida

dele

a

alguns

homens que dirijam em razão de seu valor e que sejam

eleitos

de

entre

El-Rei D. Miguel I de Portugal, O Tradicionalista

JUNHO 2021


PÁGINA 27 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

A monarquia tradicional, que foi defendida em Portugal pelo miguelismo, e no Brasil, pelo patrianovismo, opõe-se à Monarquia constitucional partidocrática e à monarquia absolutista, pois é uma monarquia regida pelos princípios do tradicionalismo ou da tradição, organizada na base da família e da propriedade, que foi sacrificada pelo absolutismo, pelo pombalismo e pelo republicanismo. No Reino de Portugal nasceu logo na sua origem, no tempo do seu primeiro Rei, Dom Afonso Henriques, e só foi interrompida pela primeira vez na dinastia filipina, para ser recomeçada em 1640. Quando os barões portucalenses elegeram o mais egrégio dos Infantes como seu primus inter pares ,

para

que

os

liderasse

até

à

Independência enquanto Estado, nos 771 anos que durou o Reino de Portugal, o Rei dos Portugueses assegurou o apoio de toda a Comunidade Portuguesa, reinando sempre de acordo com a vontade declarada de todo o Reino. A Monarquia Portuguesa resultava de uma convenção entre a Comunidade dos Portugueses e o Rei. Assim a legitimação dos Reis resulta destes receberem o poder do Povo para governar sob a obrigação implícita de reinar bem. O Rei coloca-se ao serviço da Nação – a servidão de reinar de que falava D. Pedro V - caso contrário, se ele não cumprir quaisquer deveres próprios à função real, a Comunidade pode destroná-lo. A Nação não é obrigada a amargar um Rei despótico e caprichoso ou um incapaz e por isso mesmo o Monarca pode ser deposto por Cortes

Gerais. É a repristinação do mandamento do direito visigótico de que o Rei tem de reinar justamente: ‘ És Rei se fizeres rectamente, se não fizeres, não és ’, que foi plasmado nas leis do Reino e depois nas Constituições do Reino de Portugal.

D. Afonso VI Preso em Sintra, por Roque Gameiro, 1917

‘ Os Tês Estados destes Reinos de Portugal, juntos nestas Cortes, onde representam os mesmos Reinos e em todo o poder que neles há, consultarão que por princípio delas deviam fazer assento por escrito firmado por todos (…) E pressupondo por cousa certa em direito, que ao Reino somente compete (…) eximir-se também de sua sujeição e domínio, quando o Rei por seu modo de governo se fez indigno de reinar, por quanto este poder lhe ficou, quando os povos a principio transferirão o seu poder no Rei para os governar ’, escreveu Ayres de Campos in ‘O poder Real e as Cortes’. Para castigar o Rei que fazia mau uso do poder ou que não tivesse capacidade para governar e administrar o poder que lhe havia sido conferido

JUNHO 2021


PÁGINA 28 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Assim, em Portugal, no caso particular de Dom Sancho II, por mau governo, no caso de D. Afonso VI por incapacidade, os Reis foram afastados com base nesse princípio enunciado.

Conjurado Dr. João Pinto Ribeiro

' O recém-nascido reino joga no xadrez da

Espanha

como

um

reduto

poderoso. Quando surge a grande crise de independência no final do século XIV, a filosofia da revolta - ainda hoje deficientemente

estudada

-

é

uma

afirmação curiosíssima, no contexto da época, da vontade nacional que se aponta

com

Surge,

talvez

Europa, interesse

a

a

fidelidade

pela

sujeição nacional,

dinástica.

primeira do

vez

na

príncipe

ao

expresso

pela

vontade do povo. É esta noção que surge na lenda do «senão... não», ou seja, da advertência solene feita ao rei Afonso IV pelos notáveis do reino que exigem que ele cumpra cabalmente o seu dever de rei. ‘, escreveu Francisco

de Sousa Tavares in ‘Combate Desigual’,

ensaios, Janeiro de 1957. Nem todos os monarcas são bons, mas a Monarquia em si é sempre boa: não devemos confundir o Homem (Rei) com a Instituição (Monarquia) e tirar falsas conclusões a partir disso. Segundo António Sardinha, o zénite da Monarquia temperada aconteceu no período da Restauração da Independência de Portugal, não fosse ela alicerçada por um dos seus principais mentores senão o principal, o conjurado João Pinto Ribeiro, que proclamava que ‘ a monarquia vale por virtude própria, independentemente da figura que a encarna ’, afastando-se assim do absolutismo de D. João II e do absolutismo despótico que só surge um século mais tarde em Portugal com a governação do Ministério de Sebastião José de Carvalho e Melo, vulgo Marquês de Pombal. O movimento, também, teve grande força no Brasil entre 1920 e 1930, com a Ação Imperial Patrianovista, que acreditava em uma "democracia orgânica" ou "império orgânico". Acreditavam em um estado confessional católico e eram liderados por Arlindo Veiga dos Santos, fundador da “Acção”, movimento sempre esteve ligado a Dom Pedro Henrique de Orléans e Bragança chefe da Casa Imperial brasileira na época. Só aqui, na Monarquia Temperada, o Rei não é refém da vontade políticopartidária. Tendo um papel unificador, aceitando a vontade da nação nas eleições e exerce as suas funções. Unindo todos os cidadãos num ideal comum de Pátria. Também Renan, historiador que fez o furor das fileiras do racionalismo, não deixou de constatar a ordem e o equilíbrio proporcionados pelo sistema monárquico. A sua visão debruçou-se sobre a Prússia, modelo, povo e sistema

JUNHO 2021


PÁGINA 29 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

que admirava, descobrindo a réstia do Antigo Regime, do modelo feudal e hierárquico, adaptado com a modernidade.

As 1ªs Bandeiras de Portugal

A esse sistema designou como "Antigo Regime desenvolvido e corrigido". Era a monarquia tradicional, hierárquica adaptada às instituições representativas das classes-médias e aos modelos constitucionais modernos. Aqui a "velha ordem" ainda não tinha sido destituída da sua verdadeira importância. A aristocracia ainda era tida como um exemplo da “moral” e do “dever”. O contra-balanço necessário entre o antigo e o novo, entre a tradição e a inovação. Para Renan, um sistema como este, uma vez destruído, não poderia mais ser reconstituído, pois ‘ uma série de ditaduras instáveis, um cesarismo de baixa extracção, eis tudo o que se vislumbra como hipótese de futuro ’.

Não podia estar mais certo. Remata-se com um excerto do Barão de Bretauville, retirado e adaptado de “El Bandido Realista”: ‘ Perante a voz da minha consciência afligida pelos males da Nação, perante tantos desastres, tanta ignomínia e tanto declínio, tudo abandono, a tudo

das dobras da nobre bandeira branca da Restauração que tem por lema “DEUS, PÁTRIA e REI” que é como quem diz a minha crença religiosa, a minha nobre Nação – PORTUGAL – e o mandatário da Lei, o garante da minha liberdade, dessa liberdade que eu quero e anseio para todos os fins honestos da vida, a possível salvação da minha Pátria, pesaroso por não o ter feito antes e pedindo à História que quando se ocupar das minhas faltas se lembre também do meu arrependimento e da minha confissão pública. Vou lá à Ourique da Monarquia e da honra portuguesa porque quero ter um Rei, filho e neto de reis e não mil tiranos que me vexem e oprimam; vou lá onde se encontra, não o senhor absoluto, como se apregoa para enganar os incautos, mas sim o representante da Tradição Nacional e das antigas liberdades; vou lá porque se proclama um absolutismo nobre e grande, o absolutismo da Lei que guarda sem diferenças o palácio do magnata e o casebre do mendigo e mede por igual o rico e o necessitado; vou lá para me encontrar no meio do antigo Portugal, entre um exército de bravos que lutam desinteressada e abnegadamente para provar ao Mundo que ainda acreditamos; e vou lá porque um Príncipe honrado e cavalheiro que nunca faltou à sua palavra e que lealmente cumpre as suas promessas, me garante tudo isto e não é loucura dar crédito a alguém de estirpe régia, aqui onde temos sucessivamente entregado a Nação a tantos aventureiros que nos levaram à situação em que nos encontramos. ’

renuncio, honras, dignidades, posição, lar e família, e vou procurar debaixo

JUNHO 2021


PÁGINA 30 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O próprio Senhor Dom Manuel II, o último Rei de Portugal, que outrora tinha sido conhecido como um parlamentarista ferrenho, na Entrevista concedida a António Ferro, em 7 de Dezembro de 1930, declarou:

‘Julgo que o Parlamento, com as suas antigas

funções

e

com

a

sua

velha

arquitectura, está em decadência. Nos países latinos, sobretudo…’

El-Rei D. Manuel II de Portugal

JUNHO 2021


PÁGINA 31 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

AOS JOVENS MONÁRQUICOS PORTUGUESES 1

GUILHERME CATITA *

Abstract This speech was written in the context of the election of the new direction of the JMP and intends to point out the faults of the young monarchists and of the monarchists in general and the possible solutions for these problems. The speech is also an appeal to the monarchists in general, to be more present in the modern society and in contact with the Portuguese people, intending to make the Royal Cause fall again in the good graces of the Nation. Key words: movement.

Future;

youth;

monarchic

Résumé Ce discours a été écrit dans le contexte de l'élection de la nouvelle direction du JMP et entend souligner les échecs des jeunes monarchistes et des monarchistes en général et les solutions possibles à ces problèmes. Le discours est aussi un appel aux monarchistes en général, pour qu'ils soient plus présents dans la société actuelle et en contact avec le peuple portugais, afin que la cause royale retrouve les bonnes grâces de la nation. Mots clés: Futur; monarchique.

jeunesse;

mouvement

Deus quer, o homem sonha, a obra…? Nasceu há muitos séculos, mas adormeceu há mais de cem anos. Há mais de cem anos que está atrás da secretária de uma biblioteca em madeira, entre livros e pergaminhos, bolor e pó, bafienta, nostálgica dos seus tempos de jovem, quando era aclamada nos grandes salões do seu palacete. Há mais de cem anos que está enclausurada na sua quinta, cujos muros não permitem alcançar o horizonte e ver além dos seus próprios campos. Há mais de cem anos que está parada, exposta num armário como um troféu de outrora. As engrenagens têm falta de óleo, o motor precisa de manutenção, o depósito está meio vazio. Eu sei, eu sei. Já chega de metáforas, mas infelizmente é este o perfil da monarquia em Portugal e dos monárquicos portugueses, incluindo os jovens, que muito têm de mudar para poder reconquistar o povo português e o país.

JUNHO 2021


PÁGINA 32 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Assim, a monarquia em Portugal é tratada como algo do passado e da história já escrita, quando é o futuro e a história que ainda se irá escrever. É tratada com nostalgia, quando devia ser com ânsia, e como algo morto ou imutável, quando devia ser dinâmica e viva. Nós, como jovens, temos que pôr a máquina de novo a andar, temos que alargar os horizontes, ser visionários, dinâmicos e cheios de vida; afinal, somos ou não um movimento repleto de juventude? Basta de estarmos agarrados só aos livros – e sublinho o “só” pois a educação e a formação são fundamentais para a nossa evolução, tanto de cada um individualmente como da nação em geral –, basta de sermos um aparente clube exclusivo e de estarmos agarrados a nomes. Basta de não sermos jovens. Temos que ir para as ruas; temos que visitar associações e instituições de todo o tipo; temos que defender causas simbióticas à monarquia, tão ferrenhamente como defendemos a Coroa; temos que ter orgulho em sermos monárquicos e em pertencer a este país que tanto nos deu, dá e dará; temos que abrir os olhos e perceber que a sociedade muda e que é a nossa função moldarmo-nos e adaptarmonos, porque de contrário a caravana passará, e ninguém ouvirá os cães a ladrar. A monarquia, mais do que uma forma de governo, é um conjunto de causas, e, apesar de isso estar presente na cabeça de cada um de nós, preferimos dar mais relevância ao passado e à história. E quais são essas causas? São o ambientalismo, a cultura, a tradição, o nosso idioma, as ciências, a educação. [1] - Intervenção proferida na XIV Assembleia-geral da Juventude Monárquica Portuguesa, realizada em Coimbra, a 12 de junho de 2021.

Todas

estas

causas

são

as

tais

que

funcionam simbioticamente com a Coroa. Ao defendermos a monarquia é imperativo que não nos esqueçamos delas e do seu papel no nosso Portugal. Os monárquicos foram os pioneiros na luta pelas causas ambientais e assim deve continuar. Os monárquicos foram sempre quem mais cuidou das nossas tradições, valores e cultura, que definem hoje o rosto de uma nação rica, à qual temos orgulho de chamar pátria. Os monárquicos devem bater-se por uma melhor educação, fundação basilar de uma sociedade avançada, para todas as nossas crianças e jovens, que são o futuro deste país. Os monárquicos devem bater-se por último pelas ciências e investigação, uma área essencial ao desenvolvimento do país como um todo. É esse o futuro que eu quero para os jovens monárquicos:

um

futuro

que

revele

mudança nas relações que temos com a sociedade,

mudança

na

forma

como

gerimos o tempo que dedicamos a cada área de estudo, e, principalmente, uma mudança na forma de agir. A Causa Real é intemporal

e

nós

devemos

defendê-la

dessa maneira. Agora, não vos peço vanguardismo, peçovos modernidade. Porque o futuro, o nosso e de Portugal, pode, deve e, se Deus quiser, será Real. Deus quer, o homem sonha, a obra…? Renascerá. * Guilherme Gonçalves e Silva Morais Catita terminou o Ensino Secundário em 2021, no Curso de Ciências Socioeconómicas e está ao mesmo tempo em formação no Conservatório de Música do Porto, na Classe de Composição. É atualmente membro da Juventude Monárquica Portuguesa, da Juventude Social Democrata e da Associação Lusa Portugueses por Israel.

JUNHO 2021


REAL GAZETA DO ALTO MINHO

NOTA INFORMATIVA A Direcção da Real Associação de Viana do Castelo, com mandato para o triénio 2020-2023, cumprimenta V. Exas, desejando desde já a continuação de um bom ano de 2021. A Real Associação de Viana do Castelo tem um plano de actividades e orçamento para 2021, que inclui diversas iniciativas, que vão desde a organização de conferências à publicação da Real Gazeta do Alto Minho, órgão oficial de comunicação da Real Associação de Viana do Castelo, do qual muito nos orgulhamos, e que se pretende sejam executadas com a participação de todos os associados, simpatizantes e entidades que entendam colaborar, com o intuito de contribuir e ajudar a dinamizar o ideal Monárquico que todos nós abraçamos convictamente. Atendendo à necessidade imperiosa que temos em angariar recursos financeiros necessários ao normal funcionamento da Real Associação, e tendo em conta que uma das competências da Direcção é a cobrança de quotas, eu, em nome da Direcção e na qualidade de Tesoureiro, venho por este meio solicitar a V. Exas. a regularização da QUOTA DE ASSOCIADO REFERENTE ao ano de 2021, no valor de 20,00 € (vinte euros), preferencialmente por transferência bancária, para:

Titular da Conta: Real Associação de Viana do Castelo Entidade bancária: Caixa de Crédito Agrícola Agência: Ponte de Lima IBAN: PT 50 0045 1427 40026139242 47 Número de conta: 1427 40026139242 SWIFT: CCCMPTPL Caso seja possível, pede-se o favor de enviarem por e-mail (real.associacao.viana@gmail.com e amorim.afc@gmail.com) informação da regularização da quota (ex: comprovativo), após o que procederemos de imediato à emissão do recibo de liquidação. Cordiais cumprimentos e saudações monárquicas, Filipe Amorim Tesoureiro da RAVC

FICHA TÉCNICA TÍTULO: REAL GAZETA DO ALTO MINHO PROPRIEDADE: REAL ASSOCIAÇÃO DE VIANA DO CASTELO PERIODICIDADE: TRIMESTRAL DIRECTOR: JOSÉ ANÍBAL MARINHO GOMES REDACTOR: PORFÍRIO SILVA WEB: WWW.REALVCASTELO.PT EMAIL: REAL.ASSOCIACAO.VIANA@GMAIL.COM

JUNHO 2021


PÁGINA 34 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

MONARQUIA EM PORTUGAL PREPARAR O DIA SEGUINTE

TERTÚLIA NA REAL ASSOCIAÇÃO DO PORTO A 17 DE JUNHO DE 2021

PAULO DE QUEIROZ VALENÇA PRESIDENTE DA DIRECÇÃO DA REAL ASSOCIAÇÃO DO PORTO

Abstract Debate, in a meeting organized by the Royal Associations of North Portugal, on what a Constitution could look like in a new monarchical regime. Key words: Constitution; restoration; next day; meeting; royal associations.

Résumé Débat, lors d’une réunion organisée par les Associations Royales du Nord du Portugal, sur ce que pourrait être une Constitution dans un nouveau régime monarchique. Mots clés: Constitution; restauration; jour suivant; reunion; associations royales.

Numa organização conjunta das Reais Associações de Braga, Porto, Trás-osMontes e Alto Douro e Viana do Castelo, realizou-se, no Porto, a 1ª Tertúlia da Monarquia do Norte, evento que se irá repetir ciclicamente nos mesmos moldes, em datas futuras e com temas diversos. O tema foi: MONARQUIA EM PORTUGAL. O DIA SEGUINTE e teve como orador principal Tomás A. Moreira, Presidente do Conselho Superior da Causa Real e primeiro Presidente da Direcção da Real Associação do Porto.

Juntaram-se cerca

de

nesta 50

conversa

pessoas,

informal

que

nela

participaram activamente, contribuindo para que a TERTÚLIA fosse animada e conclusiva sobre aquilo que se deverá fazer para a tão esperada restauração da Monarquia, quer antes do DIA SEGUINTE, quer

nos

dias

posteriores

ao

DIA

correcção

da

SEGUINTE. Questões

como

a

designação da nação para Portugal ao invés

JUNHO 2021

da actual República

Portuguesa,


PÁGINA 35 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

da criação de uma nova Bandeira, da oportunidade de rever a Constituição e de como o fazer, do regime político que melhor facilita a alteração do sistema de Chefia de Estado, do papel do Chefe de Estado Real, das Câmaras e com que representação para contribuir para a governação, foram alguns dos assuntos debatidos. Junta-se em anexo um resumo da intervenção de Tomás Moreira, onde as diversas situações melhor se escalpelizam. Ao jantar que se seguiu à 1ª TERTÚLIA DA MONARQUIA DO NORTE deu-nos a todos o gosto de se juntar Sua Alteza Real O Duque de Bragança. No seio das conclusões que se podem retirar, sublinhe-se que eventos destes, em conjunção de esforços organizativos entre as Reais Associações e melhor ainda até com a Causa Real, são veículos a utilizar sistematicamente para levar a Mensagem mais longe, principalmente para fora do nosso espaço de conforto, chegando àqueles que ainda se encontram algo cépticos ou desiludidos. Só juntos e em permanente debate, somamos dinâmicas, e reforçamos o nosso propósito de estabelecer uma nova Chefia de Estado e de promover um novo sistema político assente na Monarquia!

Imaginemos que conseguíamos o nosso intento.

teríamos

uma

população

entusiasmada com a ideia de voltar a viver em Monarquia, uma sólida maioria de deputados monárquicos e até um Presidente da República simpatizante da ideia. Já eliminámos a famigerada alínea 288-b da Constituição, o que permitiu realizar

um

referendo,

esmagadoramente

a

que

aprovou

restauração

da

Monarquia. O

instrumento

para

concretizar

a

mudança de regime seria uma revisão constitucional

aprovada

por

2/3

dos

deputados. Como seria essa Constituição monárquica do “dia seguinte”? A minha tese – e não é só minha – é que não

devemos

constitucional

tentar

fixar

concreto,

um

mas

texto apenas

princípios orientadores, na certeza de que definir pormenores caberia a quem fosse

democraticamente

mandatado

para o efeito. Há questões pacíficas e outras críticas, para as quais será difícil obter consensos prévios:

Intervenção de Tomás A. Moreira (Resumo)

A esmagadora maioria dos monárquicos rejeita uma tomada de poder não pacífica e aposta numa transição democrática, pelo que é dentro deste quadro que devemos pensar o que seria o dia seguinte à proclamação da Monarquia.

JUNHO 2021

Constituição de 1822


PÁGINA 36 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

1. Alterar a actual Constituição ou rasgála e fazer uma nova. Por mais tentador que seja fazer uma nova de raíz, seria mais complicado do que alterar a actual, que tem apesar de tudo algumas partes aproveitáveis. Qualquer das opções tem prós e contras; a resposta não é evidente. 2. Se optássemos não pela elaboração duma nova, mas sim por uma revisão da actual, então uma primeira reivindicação bastante consensual é a eliminação ou forte revisão do seu actual preâmbulo, um absurdo resquício do PREC que preconiza “abrir caminho para uma sociedade socialista”. Mas não devemos cair na tentação de escrevermos nós o que seria um eventual novo preâmbulo. 3. Há uma questão que podemos defender, sem risco de criar cisões internas e sem ofender os nãomonárquicos: À socapa o País foi rebaptizado e passaram a designá-lo oficialmente por “República Portuguesa”. Um cavalo de batalha dos monárquicos deve ser restituir ao País o seu nome: Nem “República Portuguesa” nem “Reino de Portugal”, mas simplesmente Portugal. Pelo que o título da actual “Constituição da República Portuguesa” deveria passar a ser “Constituição de Portugal”. 4. O que fazer quanto à bandeira nacional? Certamente quereríamos mudar as suas cores, mas o problema, é que, gostemos dela ou não, queiramos ou não, os portugueses afeiçoaram-se à bandeira actual, alguns combateram debaixo das suas cores. A reposição da bandeira azul-e-branca seria considerada ofensiva, um revanchismo tardio dos monárquicos e um regresso ao passado.

Para não dividirmos a nação, o mais sensato após uma Restauração seria uma bandeira totalmente nova. Lembro que já existiu uma proposta de bandeira toda azul (por simpatia com a UE e com a cor do mar), com as armas nacionais

e/ou

poderiam

ser

a

esfera

armilar,

encimadas

pela

que

coroa.

Parece-me mais fácil de defender do que o regresso ao azul-e-branco (ou até ao branco integral)… Queremos e devemos propor algo de concreto? nunca

Mesmo

será

entre

monárquicos

consensual.

Parece-me

sensato afirmarmos apenas que após a Restauração mudaríamos certamente a bandeira,

mas

quanto

às

suas

cores

remeter a decisão para mais tarde, para a vontade soberana dos constituintes. 5. Após estas primeiras questões mais estéticas,

haveria

que

regulamentar

assuntos relativos ao acesso do Rei à Chefia do Estado: Garantidamente a Constituição diria que a Chefia do Estado é transmitida por sucessão

dinástica

e

definiria

essas

regras. Ao

querer

restaurar

as

tradições

monarquia

portuguesa,

em

deveríamos

respeitar

tradição

a

da

princípio com

mais de mil anos de atribuir primazia aos herdeiros masculinos sobre os femininos. Um parecer interno do Departamento de Assuntos

Jurídicos

do

Ministério

do

Negócios Estrangeiros de Abril de 2006 confirma a força que tem a tradição nesta

matéria:

“ Não

obstante

ser

Portugal uma República, o direito à

JUNHO 2021


PÁGINA 37 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

sucessão na chefia da casa real não-

No entanto, os próprios monárquicos

reinante continua a ser regulado pelo

continuam

direito consuetudinário internacional.

importante e complexa, de saber se o rei

Uma nova Constituição que quisesse

deve

alterar

o

primazia

princípio

tradicional

masculina

sofreria

da forte

contestação. Uma

nova

Constituição

que

pretendesse manter o princípio sofreria idêntica contestação. Este

tema

é

crítico

e

melindroso.

divididos

administrar,

na

questão,

governar,

moderar,

reinar, ter um papel apenas cerimonial ou constituir meramente um símbolo. Nesta matéria, a tentativa de definir para uma nova constituição mais do que um mero

princípio

divergências

orientador

profundas,

levantaria

mesmo

entre

Também aqui pergunto se devemos

nós.

tentar fixar regras agora. Parece-me

8. E que sistema de governo deve a

melhor deixá-las para decisão futura.

Constituição

6.

regime?

O princípio da aclamação.

O estatuto real atribui ao Rei uma autoridade

indiscutível,

mas

não

estabelece quais as suas atribuições específicas dentro do funcionamento do Estado. Estas são definidas pela Constituição. Se o Rei dos Portugueses quiser chefiar o Estado e ser Rei de Portugal, terá que aceitar formalmente

prever

após

mudar

o

Diversas tentativas de estabelecer o que seria uma Constituição duma Monarquia restaurada falharam sobretudo por não se conseguir um consenso quanto ao sistema

de

Confrontam-se

governo

a

inúmeras

implantar. alternativas,

todas legítimas. Hoje temos um sistema

os poderes concretos que aquela lhe

híbrido,

atribui.

existe também na França e na Rússia. Há

Os nossos Reis só adquiriam a plena

outras opções, provavelmente melhores.

soberania após serem aclamados em

O meu ponto é que todos podemos – e

sessão

devemos

solene

perante

os

representantes da Nação. Este princípio faz parte tanto da nossa tradição

como

das

Constituições

da

Monarquia Constitucional. Até por isso deveria ser respeitado e considerado num novo quadro constitucional. 7.

Debrucemo-nos

agora

sobre

o

semi-presidencialismo,

–propor

preconizamos,

o

mas

modelo

ninguém

que

que

tem

o

direito de impor o seu modelo como único

e

obrigatório.

A

decisão

teria

sempre que caber a uma representação popular devidamente mandatada para definir novas bases constitucionais.

alterações a introduzir na Constituição

9. Independentemente do sistema de

relativas à organização do Estado:

governação que viéssemos a escolher,

Haveria que definir que papel atribuir

começa a ser consensual a necessidade

ao Rei no novo modelo constitucional.

de acabar com o monopólio dos partidos

A

na

nossa

proposta

simplesmente

tirar

não o

deve

ser

Presidente,

introduzir o Rei e não mudar mais nada.

representação

partidos

políticos

dos não

cidadãos. são

os

Os

únicos

representantes do povo e a Constituição

JUNHO 2021


PÁGINA 38 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

deve permitir a intervenção política cívica por outras vias que não a dos partidos políticos. É um princípio que podemos defender, sem explicitar como, até porque esta uma bandeira tradicional dos monárquicos. 10. Finalmente, um tema ligado ao anterior é a reivindicação duma Segunda Câmara, algo que existe em quase todos os países, monárquicos ou republicanos e que o movimento monárquico tem defendido porque corresponde à tradição nacional. No espírito do Integralismo Lusitano haveria muito a dizer sobre uma possível representação orgânica, mas isso já seria ir longe demais. Podemos defender o princípio duma Segunda Câmara, mas abster-nos de propor concretamente como seria composta. Há muitos modelos possíveis.

Conclusão: Certamente uma nova Constituição aproveitaria para mexer em muitas outras questões. Não devemos discutir os capítulos constitucionais que nada têm a ver com a Monarquia. Para todas as questões referidas, recomendo fixar apenas princípios genéricos e remeter as respostas concretas para os futuros constituintes mandatados pelo povo para desenhar o novo quadro constitucional. Querendo ser demasiado claros iríamos criar divisão, mesmo entre os monárquicos.

JUNHO 2021


PÁGINA 39 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

O PRÓXIMO CONGRESSO ELEITORAL E O “3.º MANIFESTO ROIALISTA” ANTÓNIO DE SOUZA-CARDOSO

Abstract

Résumé

In the last 111 years, the monarchical institution has suffered a false and planned campaign of discredit, labeled as a past institution and which exists in opposition to the democratic system of government. The Royal Institution better serves the development of countries and favors the happiness of nations, above all, in a time of globalization and universal mobility where cultural and moral bonds tend to weaken and demand permanent elements of aggregation and identity. There is an urgent need for a strategy that begins and ends with the permanent valorization of the royal institution, as an asset of enormous importance to Portugal for what it represents in terms of our history.

Au cours des 111 dernières années, l'institution monarchique a subi une fausse campagne de discrédit planifiée, qualifiée d'institution du passé et qui s'oppose au système de gouvernement démocratique. L'Institution Royale sert mieux le développement des pays et favorise le bonheur des nations, surtout, à l'heure de la mondialisation et de la mobilité universelle où les liens culturels et moraux tendent à s'affaiblir et exigent des éléments permanents d'agrégation et d'identité. Il y a un besoin urgent d'une stratégie qui commence et se termine par la valorisation permanente de l'institution royale, en tant qu'atout d'une importance énorme pour le Portugal pour ce qu'elle représente en termes de notre histoire.

Key words: Stratégie; royalist manifesto; D. Duarte; causa real.

A Causa Real tem este ano mais um Congresso eleitoral. Muito mais do que as pessoas, que serão

certamente

pena

reflectir

relevantes,

sobre

uma

vale

a

estratégia

para o movimento nos próximos anos.

Mots clés: Stratégie; manifeste royaliste; D. Duarte; causa real.

Sou um confesso opositor de um modo de ser ou de estar comum a muitos monárquicos, que o são, por mero estatuto social (?) ou cultural, mas que nada fizeram ou fazem para que a monarquia se credibilize com um projecto político do futuro. Esta atitude,

JUNHO 2021


PÁGINA 40 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

provavelmente firmada no gozo acomodado de pertencer a uma élite social ou intelectual, existe até nos que efectivamente militam no movimento, mais comummente, participando nos seus momentos festivos e sempre desabafando, com algum tédio, que” isto assim não vai lá”, mas…”enfim, o que é preciso é manter a chama acesa”. No que ao movimento monárquico diz respeito, não recuso que sofremos nos últimos 111 anos, uma insidiosa e planeada campanha de desacreditação da instituição monárquica: a ideia de que é uma instituição passadista e que existe em oposição ao sistema democrático de governo prevalece acima de evidências tão explicitas e actuais como as que nos são dadas pelas monarquias do Norte da Europa, por exemplo, portadoras dos mais elevados índices de desenvolvimento e bem-estar. Apesar desta campanha continuar a existir, não sou dos que atira a toalha ao chão, nem dos que conformadamente se juntam com o único propósito de “manter a chama acesa”. Eu não quero manter chama acesa nenhuma. Quero lutar pela convicção que tenho de que a instituição monárquica e, em especial, a Instituição Real servem melhor o desenvolvimento dos Países e favorecem a felicidade das nações, sobretudo, num tempo de globalização e de mobilidade universal onde os vínculos culturais e morais tendem a fragilizar-se e exigem elementos perenes de agregação e identidade. Tudo isto para Vos dizer que, numa

altura em que os ideários defendidos pelos partidos já foram derrotados pela História e se deu como comprovada a falência do marxismo-leninismo e das suas formulações mais suaves ou mais robustas, faltam ideias e impulsos novos de organização do próprio Estado e das suas Instituições, onde julgo que o movimento monárquico pode ter uma palavra nova e fresca a dizer; mas uma palavra a dizer naquilo que tem de intrínseco e singular à sua condição de forma de regime ou, para sermos generosos, o efeito indutor (o exemplo, claro!) que pode projectar na organização social e política e não a defender causas e projectos mais próprios de programas de governação, como o património, o ambiente ou a nossa vocação universalista. Tudo causas da maior relevância, mas sem nenhuma ligação especial à forma monárquica de regime. Apropriarmo-nos deste tipo de causas é uma via imprópria e dissimulada sobre os fundamentos que nos devem orientar e um caminho difuso e fragmentário sobre as motivações do movimento monárquico, no Portugal do futuro. A estratégia que defendo, desde há muito anos, é a mesma que defendeu em Congresso, há ainda mais anos, no primeiro “Manifesto Roialista”, o Tomás Moreira: uma estratégia

que

começa

e

acaba

na

permanente valorização da instituição real, enquanto importância

para

activo Portugal

de enorme pelo

que

representa ao nível da nossa História – uma das mais antigas do Mundo, da

JUNHO 2021


PÁGINA 41 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

nossa Identidade e agora, sim, da nossa Universalidade. A Instituição Real é útil e de enorme valor para o Estado – para o Estado monárquico ou para o Estado republicano. E estou até convencido de que, antes de o ser para um Estado monárquico, terá que

comprovadamente

ver

reconhecido o seu valor pelo Estado republicano;

ou,

para

ser

mais

simples, o Rei de Portugal, antes de o ser,

tem

que

recolher

o

reconhecimento geral da Nação como Rei dos Portugueses.

É esta a estratégia que, depois (só depois), deve propor modelos diversos de

implementação

ou

execução,

nomeadamente e, tendo em conta a formulação

escolhida

pelo

próprio

Duque de Bragança para o Movimento monárquico, por reflexões como as que existiram há uns anos no Palácio da Independência

-

uma

Causa

Real

focada na promoção da Instituição Real

em todo o território Nacional. Uma Causa Monárquica que dela dependa institucionalmente e que promova a reflexão e o pensamento político. Depois há a questão do como fazer. Que não é já a essência da estratégia preconizada, nem o modelo de organização do Movimento para a concretizar. É antes o modo de abordagem, a fórmula certa para que seja possível promover a estratégia. No mandato anterior a este, tentamos a questão do Protocolo de Estado. Não entendo porque teve tantos opositores internos. Tenho o justo receio de pensar que os principais opositores são os que permanentemente se aquietam com manter “a chama acesa”. A verdade é que de há muito tempo que não tínhamos logrado reter a atenção das altas esferas do Estado republicano e do sistema político em geral, de quem recebemos compreensão e atenção quase surpreendentes. Mas, no final, temos todos que reconhecer que esta abordagem não resultou. Não valia a pena ir a jogo, quando o próprio Movimento se dividia. Agora há que encontrar um novo pretexto que sirva a mesma estratégia. E julgo que este pode ser encontrado no processo que iniciamos na mesma altura, visando o reconhecimento do Senhor Dom Duarte e da Família Real Portuguesa, na Fundação Casa de Bragança. Acho que, com muito pragmatismo, é este o nosso pretexto dos próximos anos - animado por termos uma liderança governamental que não mostra inquietações a esse nível e, principalmente, um Presidente da República que, em segundo mandato, quererá fazer a conciliação da História numa Instituição que lhe é

JUNHO 2021


PÁGINA 42 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

muito cara. Nada do que aqui digo é demasiado novo, depois do primeiro e segundo Manifesto Roialista, cuja revisitação recomendo a todos. Espero que, neste Congresso, possamos debater o 3º Manifesto Roialista. E que o Movimento se escute e perceba a si próprio naquilo que aprova e que assume para o futuro. E entenda o valor que na política séria tem a palavra compromisso. Terá relevância, neste contexto, saber quem serão os protagonistas? Sim, terá muita. E eu até tenho convicções profundas sobre quem melhor poderia

interpretar este momento. Mas, muito mais do que a liderança ou a equipa, está uma palavra simples chamada vontade. Competência, experiência, influência são requisitos de enorme valia. Que de nada valem, se não existir vontade. Fica o meu repto a todos os monárquicos de boa vontade, para uma mobilização em torno de uma estratégia, clara, pragmática e assumida por todos, com unidade, determinação e o sentido de compromisso que o País e os vindouros esperam de nós.

JUNHO 2021


PÁGINA 43 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

ENTREVISTA AO EX.MO. SENHOR PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE AVEIRO, ENG.º RIBAU ESTEVES ‘ESTAMOS A DEIXAR CRESCER NA SOCIEDADE UMA POSTURA DE RADICALISMO, DE FALTA DE TOLERÂNCIA, DE SECTARISMO REDUZIDO A UM “GOSTO” OU “NÃO GOSTO” QUE VAI AFASTANDO AS PESSOAS UMAS DAS OUTRAS E CRIANDO O CALDO DE CULTURA PROPICIO AO CRESCIMENTO DE IDEOLOGIAS SECTÁRIAS…’

JUNHO 2021


PÁGINA 44 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

RGAM. - Preside à Câmara Municipal

RGAM. - Aveiro, elevado a Cidade, em

da notável cidade de Aveiro. Como é

11 de Abril de 1759, por Alvará Real d’El-

dirigir os destinos de um Município tão característico?

Rei D. José I, conseguiu ‘casar’, com grande

PCMA – É um excelente desafio com um balanço muito positivo. Obviamente que existem sempre pontos onde podemos melhorar, mas perante a situação que encontrámos quando chegámos à Câmara Municipal de Aveiro, em outubro de 2013, com uma situação financeira péssima e uma organização caóticas, sem meios para atingir os fins definidos, a classificação do trabalho efetuado é muito boa. Foi muito difícil, mas são notáveis os resultados alcançados. Como sabe, Aveiro tinha graves problemas financeiros e de disfuncionalidade de organização e de funcionamento, o que nos obrigou a contratualizar com o Fundo de Apoio Municipal (FAM) um Programa de Ajustamento Municipal (PAM), que cumprimos com todo o rigor. Recebemos sempre nota positiva em todas as avaliações realizadas pelo FAM. Ao longo dos últimos anos pagámos dívidas com mais de 20 anos a cidadãos e empresas, os fornecedores e investidores voltaram a confiar na Câmara Municipal Aveiro para investir, e os resultados estão à vista: Aveiro está em forte crescimento no investimento público da sua Câmara e tem hoje uma procura imensa em todas as áreas do tecido económico, do turismo à indústria, ao nível do investimento privado. Neste ano de 2021 recuperamos também a plena autonomia legal de gestão da Câmara, perdida há quase 20 anos.

acerto,

a

tradição

com

a

modernidade, tendo preservado com assinalável

sucesso

o

seu

vasto

Património, certo?

PCMA – Sem dúvida, a nossa estratégia continua

a

assentar

em

dois

pilares

fundamentais: o Ambiente e a Cultura. É por aqui que vamos. Como parte dessa estratégia estamos a valorizar e capacitar os Equipamentos Culturais

e

o

património

Cultural

de

Aveiro, com a obra de a reabilitação do Teatro

Aveirense,

a

requalificação

museográfica do Museu da Cidade, a ativação ATLAS

da Aveiro

Biblioteca (o

Municipal

reabilitado

no

edifício

Fernando Távora), no qual será também possível

aceder

ao

Centro

de

Documentação, à Livraria Municipal, a um Espaço

de

Criação

Tecnológica

e

coworking, uma Loja do Investidor e uma Área de Jogos e Educação STEAM. Entre muitos outros investimentos de várias tipologias que estão a renovar o centro urbano da cidade e várias áreas urbanas do Município. Nesta

estratégia

animação

cultural

contamos de

com

rua,

uma

eclética

e

cosmopolita, que permite aos residentes e

visitantes

assumindo

a

desfrutar Cultura

de

como

Aveiro, parte

nossa estratégia de promoção turística.

JUNHO 2021

da


PÁGINA 45 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Ao mesmo tempo, somos um parceiro ativo

e

estratégico

Centro

de

recebido

para

Portugal,

a

18

de

a

Turismo

tendo

maio

e

Aveiro 2020

a

Conferência de Imprensa da TCP que apresentou o novo vídeo “Chegou o Tempo”. Uma campanha de marketing ao nível de toda a Região Centro de relançamento dos circuitos económicos turísticos e onde, naturalmente, Aveiro tem

um

papel

muito

importante

a

desempenhar.

RGAM.

-

exemplo Museu

Foi

precisamente

desse

rico

Municipal,

num

património,

antigo

o

Convento,

que a Causa Real realizou o seu XXII Congresso, em 2014, e onde tivemos a supina honra de contar com a sua presença

na

Conferência

que

se

seguiu. Não sendo V.Exa. Monárquico, da

sua

intervenção

depreendemos

que, como bom democrata, não tem qualquer

anticorpo

contra

Presença do Eng.º José Ribau Esteves, Presidente da Câmara Municipal de Aveiro, como conferencista no debate público realizado no encerramento do XXII Congresso da Causa Real, a 15 de Outubro de 2016 no Museu de Aveiro (Santa Joana), subordinado ao tema “Modelos e Regimes constitucionais nos 40 anos da Constituição Portuguesa”, que contou com a presença como Conferencistas do Prof. Dr. João Pacheco de Amorim, professor da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Dr.ª Paula Leite Marinho, advogada e canonista e como moderador o Dr. António de Souza-Cardoso, Presidente da Causa Real.

a

Monarquia, verdade?

PCMA – Um Museu de cariz nacional que melhorou

com

aproveitando que

o

a

gestão

também

municipalismo

para é

municipal, recordar uma

boa

tradição da Instituição Real. Respeito muito a Monarquia e recordo que a maioria que lidero é uma coligação partidária entre o CDS/PP, o PSD e o PPM.

© Diário de Aveiro

JUNHO 2021


PÁGINA 46 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Ribau Esteves no Bureau do Comité das Regiões da UE

RGAM.

-

conferência

PCMA - É bem verdade. Estamos a deixar

privou com o Senhor Dom Duarte. Que

crescer na sociedade uma postura de

opinião tem do Duque de Bragança?

radicalismo, de falta de tolerância, de

PCMA

-

Nessa

Tenho

positiva.

mesma

uma

Respeito

genuínos,

algo

opinião

e

muito

consideração

tocante

pelo

que

representa emocionalmente séculos da

sectarismo reduzido a um “gosto” ou “não gosto” que vai afastando as pessoas umas das outras e criando o caldo de cultura propicio ao crescimento de ideologias

sua

sectárias extrema esquerda e extrema

simplicidade, tem um profundo sentido

direita, assim como ao desinteresse e ao

patriótico, em tudo diferente de qualquer

afastamentos

estereótipo.

serviço à comunidade, do serviço público.

nossa

RGAM.

História,

fracturante, cancel

alguém

que

Vivemos em

culture

que

um a

tende

na

tempo

agenda a

da

dividir

a

sociedade em campos contrários, e às vezes

incompatíveis.

O

que

pensa

de

muitas

pessoas

do

É Urgente, lutarmos contra esse processo em curso, para o que temos de dar lugar de primazia à cultura dos bons valores na Família, Política.

sobre esse assunto?

JUNHO 2021

na

Escola,

no

Trabalho,

na


PÁGINA 47 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

RGAM. – Sete dos dez países com Maior

do estar no poder em vez de gerirem o

Índice de Democracia são Monarquias.

poder

de

desenvolver políticas ativas de emprego,

Democracia 2020 do ‘The Economist

promover a cultura do mérito em vez de

Intelligence Unit’, duas repúblicas da

fazerem exatamente o contrário, entre

Europa Ocidental - França e Portugal -

outros aspetos.

de

acordo

com

o

Índice

para

reformar

o

Estado,

passaram da categoria de ‘democracia total’ para a categoria de ‘democracias

RGAM. – No nosso País, não poderia um

com falhas’. No caso português não

Rei

será

completamente

um

recuo

nepotismo,

a

impulsionado

pelo

instrumentalização

do

Estado e as medidas draconianas de limitação

de

direitos,

liberdades

-

de

Estado,

independente

e

suprapartidário, ser uma mais-valia na política e na sociedade?

PCMA - Subscrevi a petição de "Inclusão do Seguramente

está

um

contributo, mas acho que existem outros contributos

mais

relevantes,

como

a

doença do centralismo do Estado e do setor privado, a fragilidade e a falta de representatividade

dos

Deputados

da

Assembleia da República, que deviam ser eleitos

Chefe

e

garantias?

PCMA

como

em

círculos

uninominais,

as

geringonças que dão primazia à gestão

Duque

de

Bragança

na

Lei

do

Protocolo de Estado" e isso diz tudo. Afinal ao Duque de Bragança, D. Duarte Pio,

enquanto

descendente

e

representante dos Reis de Portugal, deve ser

conferido

particular Republicano,

um

respeito. sei

tratamento Sendo

reconhecer

de eu

virtudes

nessa possibilidade que se constata em vários Países Europeus, com destaque especial para Espanha.

‘RESPEITO MUITO A MONARQUIA…’

JUNHO 2021


PÁGINA 48 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

RGAM. – Quer deixar uma mensagem

realizar afincadamente na candidatura

final aos Monárquicos Portugueses?

de Aveiro a Capital Europeia da Cultura 2027, num investimento de capacitação

PCMA – Que saibam que em Aveiro

da Rede Cultural do Município e da

estamos

Região de Aveiro e de promoção dos

a

conservação

realizar

um

do

nosso

trabalho

de

Património

valores culturais de Aveiro.

Histórico, com grande base no Museu de Aveiro / Santa Joana que é como sabeis um edifício com grande simbolismo para

Muito Obrigado!

a nossa Cidade e para o nosso Município e onde viveu a nossa Princesa Santa

Entrevista realizada por Miguel Villas-

Joana, e que queremos a sua atenção e

Boas para a Real Gazeta do Alto Minho

apoio para o trabalho que

da Real Associação de Viana do Castelo.

estamos

a

JUNHO 2021


PÁGINA 49 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

DA NECESSIDADE DA TAPADA E DE OUTRAS COISAS MAIS TERESA CÔRTE-REAL

Abstract

Résumé

The defense of the essence of Tapada das Necessidades has a symbolic and paradigmatic value for what it can mean to other heritage spaces existing throughout the country and to the capacity to prevent their devirtualization by public entities through the joint action of civil society reinforces the extraordinary legacy left by Queen Maria II and her husband King Fernando II in relation to education for environmental awareness and heritage.

La défense de l'essence de Tapada das Necessidades a une valeur symbolique et paradigmatique pour ce qu'elle peut signifier par rapport aux autres espaces patrimoniaux existant à travers le pays. Réussir à empêcher votre la dévirtualisation par les entités publiques à travers l'action conjointe de la société civile renforce l'héritage extraordinaire laissé par la reine D. Maria II et par le roi D. Fernando II en matière d'éducation à la conscience environnementale et au patrimoine.

Key words: Material and immaterial heritage; identity; legacy; D. Fernando II.

Mots clés: Patrimoine matériel et immatériel; identité; héritage; D. Fernando II.

As cidades e os países não nascem, não aparecem nem se moldam do acaso. São fruto de um processo de construção permanente, de uma soma de vontades, e de personalidades que, pela sua singularidade e visão são capazes de transformar o que existe em algo estruturante e benéfico para toda a comunidade transportando para o futuro uma sempre renovada identidade que nos liga a todos. E há lugares que, pelas suas características representam tudo isso. Os Jardins Históricos são um deles. É também por isso que importa apoiá-los para serem preservados na sua essência. E que é tão simbólico e paradigmático pelo que pode significar

em relação a outros espaços patrimoniais existentes impedir

em a

todo

sua

o

país

conseguir

desvirtualização

por

entidades públicas como no caso da Tapada das Necessidades.

JUNHO 2021

Tapada das Necessidades


PÁGINA 50 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

A História de grande parte do século XIX português e o impulso dado nas áreas do conhecimento e da investigação das ciências da natureza, do urbanismo e da paisagem, da necessidade de educar para a descoberta e para a curiosidade, numa visão holística da cidade de Lisboa e área envolvente passa seguramente por ali. É evidente, neste como noutros casos, a necessidade de intervenção que lhe devolva a dignidade perdida. Não se pretendendo que esta apenas seja uma réplica do que já existiu, deve preservar a sua dupla função de grande lugar de livre disfrute da população com a natureza e de espaço percursor e incrementador de boas práticas ambientais com uma identidade única que acompanha o Portugal dos últimos 300 anos. Uma espécie de história de Portugal ao vivo contada através do episódio que lhe deu origem, dos edifícios com os da casa de fresco, da estufa circular e dos torreões do jardim zoológico, das centenas e centenas de espécies exóticas trazidas para as Necessidades em perfeita simbiose com as autóctones, dos espaços que a pouco e pouco se foram desenhando para alcançar uma cada vez melhor perspetiva e sempre tendo em conta a cidade no seu todo. Uma bela metáfora da alma de Lisboa e do nosso país também, se quiserem. É que aos responsáveis autárquicos cumpre cuidar e salvaguardar como património material e imaterial da cidade e do país. Em todos esses momentos houve protagonistas que a tornaram possível e cujo exemplo deve ser lembrado como exemplo de futuro. É que, ao contrário

do que é referido no Anteplano para a Tapada das Necessidades ainda em discussão pública, ela nasceu e foi-se desenvolvendo e recriando de e para a comunidade. Nunca sobre si própria ou num sentido puramente utilitarista de uma família. Foi a partir do enorme laboratório ao ar livre das Necessidades, trabalhando com espécies, algumas delas únicas, vindas de todo o mundo que o Rei D. Fernando II e a equipa de jardineiros, botânicos, arquitectos, viveiristas, artistas, entre tantos outros mestres por ele reunida que foi possível, por exemplo, o Parque da Pena ou o Jardim da Estrela pelo rei doado a Lisboa. Dali pensou-se a cidade e, portanto, a sociedade. Não como erradamente é referido no dito plano para “uso exclusivo da família real”, mas como elemento fundamental de uma estratégia absolutamente inovadora de perceber e conceber o espaço e alargar as mentes. Não é um jardim que é feito para um rei, mas foram vários reis que o quiseram para um país. Numa lógica transgeracional, de passagem de testemunho e de experiência identitária.

Edificios existentes no topo norte da Tapada

(créditos fotográficos CML)

JUNHO 2021


PÁGINA 51 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Mais. A Tapada das Necessidades é também um marco no que se entende hoje como a educação para a consciência ambiental tendo sido D. Maria II e D. Fernando os seus precursores em Portugal. Exemplar é o programa de estudos que desenharam para todos os seus filhos e filhas, nomeadamente dos futuros reis D. Pedro V e D. Luís I e do qual era parte integrante o trabalho, o acompanhamento e o conhecimento de todo o projecto que ali estava a ser desenvolvido e que seria mais tarde por estes replicado e aprofundado com os resultados que todos conhecemos e se refletiriam mais tarde na figura do rei D. Carlos e em todo o seu empenho e incremento nos campos das artes e da ciência em Portugal. Ao fazerem-no, muito à frente do seu tempo, demonstravam à sociedade o caminho a ser seguido no campo do

conhecimento e do impacto no desenvolvimento cognitivo e social das crianças do contacto libertador com a natureza em toda a sua dimensão e responsabilidade. É assim da mais elementar justiça que este legado exemplar, hoje tão actual como premente seja perpetuado no plano a ser executado na Tapada pela Câmara Municipal de Lisboa quer com a referência expressa aos protagonistas que a tornaram possível em locais emblemáticos da sua acção quer com a implementação de um projecto pedagógico com o seu nome que proporcione a vivência plena do que as Necessidades (ainda) conservam e que é nosso dever redescobrir. A cidade e o país agradecem que os dinheiros públicos contribuam para preservar a nossa identidade. Porque sem ela não há frutos, nem jardins que nos valham.

D. Fernando II

JUNHO 2021


PÁGINA 52 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

CORREIO REAL Nº 23

Capa do Correio Real nº 23, a revista semestral produzida pela Real Associação de Lisboa para a Causa Real, já expedida por CTT para os associados da Reais Associações. Deste número com 36 páginas destacamos, além duma reportagem da recente visita da Família Real aos Açores, um ensaio sobre a coroa britânica - uma muito antiga história de modernidade - um artigo sobre a Casa da Rainha, a instituição que na corte do antigo

regime dava apoio às soberanas, e uma entrevista ao Professor Manuel Braga da Cruz,

antigo

Católica,

um

reitor dos

da

Universidade

maiores

activos,

intelectuais e humanos, do movimento monárquico. Receber o Correio Real comodamente em casa com notícias sobre a Casa Real e o movimento monárquico é uma das vantagens

de

estar

inscrito

na

Associação de Viana do Castelo.

JUNHO 2021

Real


PÁGINA 53 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

A PROPÓSITO DA PANDEMIA A Real Gazeta do Alto Minho lançou o desafio a dois membros da direcção, Dr.ª Mariana Magalhães Sant’Ana e Dr. Ricardo Dias, ligados à área da saúde para se pronunciarem sobre os efeitos da pandemia na população. O excesso de informações e mensagens enviadas por entidades oficiais contribuíram para a confusão em torno da Covid-19, logo é essencial separar os fatos, crenças e peculiaridades desta pandemia. Sabendo-se que a paragem da actividade física regular tem efeitos fisiológicos graves no ser humano, e que factores de risco intrínsecos, como a idade, o sexo, o estado de saúde, a condição física, a composição corporal, a destreza motora, também contribuem para esses efeitos, é importante combater o sedentarismo.

PANDEMIA – FACTOS, CRENÇAS E IDIOSSINCRASIAS MARIANA DE MAGALHÃES SANT’ANA *

Abstract

Résumé

In December 2019, the first cases of SARSCov2 virus infection were declared. The excess of information and unclear messages transmitted by official entities have contributed to the confusion surrounding Covid-19. This article seeks to separate facts, beliefs and idiosyncrasies in this Pandemic.

En décembre 2019, les premiers cas d’infection par le virus du SARS-Cov2 ont été déclarés. L’excès d’information et les messages flous transmis par les entités officielles ont contribué à la confusion entourant Covid-19. Cet article cherche à séparer les faits, les croyances et les particularités de cette pandémie.

Key words: Pandemic; facts; beliefs.

Mots clés: Pandémie; faits; croyances.

* Médica

JUNHO 2021


PÁGINA 54 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Quando me desafiaram a escrever um artigo sobre a Pandemia, senti que não havia muito a dizer que já não tivesse sido dito. O que mais se vê por aí são entendidos em Pandemias, dos mais variados campos, a discorrer largamente sobre o assunto. Misturamse factos com opiniões, crenças com idiossincrasias. Tentemos, pois, separar estas áreas, na esperança de trazer alguma luz ao tema. Comecemos pelos factos . Em Dezembro de 2019 foram declarados os primeiros casos de infecção pelo vírus SARS-Cov2, na província de Wuhan, na China, embora hoje se saiba que terá havido casos pelos menos desde Outubro.

Vírus SARS-Cov2

A 30 de Janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS), declarou o surto de Covid-19 como Emergência de Saúde Pública de Âmbito Internacional. A 11 de Março de 2020, o Director Geral da OMS declarou o surto de Covid-19 como uma Pandemia. Entre 31 de Dezembro de 2019 e 05 de Maio de 2021, segundo a OMS, foram reportados 158 651 638 casos de COVID19 no mundo, incluindo 3 299 764 óbitos. Estes factos, consoante o terreno em que caíram, vieram alimentar crenças. Deixo aqui algumas com que me fui cruzando pelo caminho:

A Natureza está a purgar as agressões perpetuadas pelo Homem. Animais selvagens vagueiam pelas cidades desertas. Os canais de Veneza tornamse azuis e há golfinhos ao largo. A poluição atmosférica diminui drasticamente. Surge um Mundo novo, limpo dos excessos humanos. É tempo de tornar a viver apenas com o essencial. Trata-se do Castigo Divino pelos nossos pecados. O Homem tem sido egoísta, tem buscado poder e dinheiro e agora Deus castiga-o pelos seus actos. O poder ou dinheiro não o livra dos efeitos do vírus. O Homem tem de tornar a viver segundo as leis de Deus. A Selecção Natural manifesta-se em todo o seu esplendor. À medida que as condições ambientais mudam com a disseminação do vírus, só os mais aptos, aqueles que possuem maior capacidade de adaptação ao meio, é que sobrevivem. A Pandemia é uma Conspiração . E aqui temos várias vertentes, ou até todas em conjunto numa mesma crença. O vírus foi propositadamente fabricado num laboratório com o objectivo de destruir as outras economias que poderiam fazer frente ao monopólio chinês. A

JUNHO 2021


PÁGINA 55 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Pandemia não existe, os dados são manipulados com o objectivo de subjugar os povos pelo medo e pela lei, e assim criar uma nova ordem ditatorial à escala mundial. As vacinas anti-Covid não o são na verdade, mas sim produtos experimentais cujo objectivo é alterar o nosso código genético para nos tornar seres submissos, ou mesmo com o fim de aniquilar os que a tomarem. Por fim, há-que ter em conta as Idiossincrasias , i.e., a forma como cada um lida com a pandemia. Uns sentem que a vida ficou suspensa e limitam-se a aguardar que tudo volte a ser como dantes. Alguns deixaram-se levar pelo sedentarismo e têm comido ou bebido mais do que a conta. Há quem tenha perdido o emprego, quem tenha perdido família, quem tenha mergulhado num poço de tristeza ou de ansiedade. Outros, pelo contrário, decidiram mudar de vida, passaram a fazer exercício, dieta saudável ou deixaram de fumar. Também há quem tenha encontrado na Pandemia um novo modelo de negócio. Alguns (re)descobriram os prazeres de viver no campo. Houve quem concluísse que o casamento já não valia a pena, e quem decidisse juntar os trapos com a carametade. Para baralhar mais ainda, num tempo em que se exigia clareza, Governo, Direcção Geral de Saúde (DGS), União Europeia, e a própria OMS, deixaram-se enredar na confusão entre as evidências e as opiniões. Num dia o uso de máscara dava “uma falsa sensação de segurança”. No dia seguinte, passava a ser recomendada em espaços fechados

e, mais tarde, mesmo ao ar livre. Num momento aconselhava-se apenas a lavagem das mãos, depois já era importante deixar os sapatos à porta, ou as compras em “quarentena”. Num momento surgiu uma vacina que não era administrada acima dos 65 anos, e depois, a mesma vacina passou a ser recomendada apenas acima dos 60 anos. Primeiro, as experiências com Hidroxicloroquina pareciam promissoras, depois concluiu-se que o uso do fármaco era lesivo. A dada altura entendeu-se que se devia administrar corticóides aos casos graves, mas, entretanto, o excesso de corticóides levou ao aumento das infecções bacterianas. E eis que surgem estudos a apontar bons resultados com Ivermectina, mas outros, entretanto, desmentem-nos e o fármaco continua a não ser aprovado pela Agência Europeia do Medicamento para o uso na Covid-19. O que está a falhar aqui? A ciência? Não, falha a comunicação. Não por defeito, mas por excesso. Tudo passou a ser anunciado e escrutinado pela opinião pública. Perante um agente novo, que causa uma doença nova, a evidência muda dia a dia. Para nós, médicos, é normal receber uma circular a anunciar que um fármaco, que usámos durante anos, foi suspenso por ser ter descoberto um efeito adverso grave. Outras vezes, recebemos uma actualização dizendo que determinado medicamento, que não podia ser usado, por exemplo, nos doentes com insuficiência renal, afinal é mais seguro do que se supunha. Um dia, descobriu-se que o medicamento que se deu durante anos para a

JUNHO 2021


PÁGINA 56 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

vertigem não tem qualquer evidência de que funcione nesse problema, mas o mesmo medicamento, afinal, é útil para a angina de peito. A diferença é que esta informação só vem para a comunidade científica que sabe lidar com ela. O público não chega a saber se o medicamento foi suspenso porque se constatou que não é seguro, ou porque o laboratório que o fabricava simplesmente decidiu deixar de o fazer porque não dava lucro. Quanto à Covid-19, a informação circula pelas redes sociais, televisões e jornais, em tempo real e sem qualquer filtro. Muitas vezes, um título de um artigo científico é partilhado até à exaustão sem que ninguém tenha lido mais do que duas frases do mesmo. Também a estratégia de comunicação seguida por alguns países, entre os quais o nosso, fomentou este caos, com governantes e representantes da DGS a transmitirem como certezas absolutas, o pouco conhecimento de que se dispunha até ao momento, interpretado à luz da política. A decisão de suspender a vacinação com a vacina da AstraZeneca, numa altura em que atravessávamos uma das piores fases da doença, e pese os benefícios da vacina suplantarem esmagadoramente os seus riscos, é um bom (i.e. mau) exemplo disso.

Perante tudo isto, não é de estranhar que haja tanta confusão à volta do tema da Pandemia e que o cepticismo contra as instituições, governantes e profissionais tenha aumentado, assim como os movimentos populistas e negacionistas. Tudo aponta para que o SARS-Cov2 passe a ser um vírus endémico, e que ao longo dos anos vá surgindo uma imunidade progressiva às várias estirpes, com alguns surtos pelo meio, como, de resto, acontece com os vírus influenzae . Ainda não conhecemos totalmente a fisiopatologia da Covid-19, nem as sequelas a longo prazo da infecção. Aos poucos, vão surgindo novos estudos. Fármacos como a Ivermectina poderão vir a fazer parte do arsenal terapêutico, ou mostrar que causam mais dados do que benefícios. Para já, a estratégia de vacinação parece estar a resultar, com menos casos e menos graves nos grupos já extensamente vacinados. Deixemos, pois, a ciência seguir o seu curso. Um dia, a humanidade olhará para trás e verá o quanto evoluiu à custa desta Pandemia. Quanto a nós, ainda vamos a tempo de decidir se queremos viver esta experiência com angústia, com desconfiança, com indiferença, ou com a esperança de um mundo melhor.

JUNHO 2021


PÁGINA 57 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

PÉS, O ALICERCE DO CORPO RICARDO DIAS *

Abstract

Résumé

The pandemic has aggravated the sedentary behavior of the population: teleworking, associated with long periods of confinement and restrictions on free movement, so it is important that people remain active. After leaving the confinement due to Covid 19, in which health prevention is essential, it is also essential to raise awareness of the importance of preventing the onset of pathologies and foot problems, which are the postural foundation and foundation of the body. So, in this phase of deconfinement and in daily activities such as sport and work, the correct functionality of the feet is essential.

La pandémie a aggravé les comportements sédentaires de la population : télétravail, associé à de longues périodes de confinement et des restrictions à la libre circulation, il est donc important que les gens restent actifs. Après avoir quitté le confinement en raison de Covid 19, dans lequel la prévention sanitaire est essentielle, il est également essentiel de sensibiliser à l'importance de prévenir l'apparition de pathologies et problèmes de pieds, qui sont le fondement postural et le fondement du corps. Alors, en cette phase de déconfinement et dans les activités quotidiennes comme le sport et l'activité travail, le bon fonctionnement des pieds est essentiel.

Key words: Pandemic; sedentarization; foot.

confinement;

Mots clés: Pandémie; sédentarisation; pied.

A Podologia é uma especialidade do ramo da saúde que se destina à investigação, prevenção, diagnóstico e tratamento de todas as alterações que afetam o pé, bem como todas as variações que atingem o sistema locomotor. Estas variações podem ser dérmicas, estruturais, funcionais ou morfológicas. Mediante estas funções, o Podologista tem também um papel de relevo na função e reprogramação postural. Perante o conhecimento biomecânico adquirido de formação, consegue, através de ortóteses plantares personalizadas, as denominadas palmilhas, à medida do pé, corrigir e

confinement;

prevenir vários problemas que se refletem ao nível do joelho, anca e coluna. No dia-a-dia as pessoas são submetidas a uma grande tensão e desgaste, sendo o único ponto de apoio de todo o nosso corpo. Para a população sedentária e com reduzida atividade física pode ter um impacto negativo na saúde, no bem-estar e na qualidade de vida, esta longa e condicionada paragem. Está comprovado que a falta de atividade física é uma das principais causas para o desenvolvimento de deficiências estruturais e de patologias nos pés.

* Podologista

JUNHO 2021


PÁGINA 58 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

ii) Nos adultos, entre os 18 e os 64 anos, a atividade física reduz a mortalidade por todas as causas e por doenças cardiovasculares; a incidência de hipertensão, de alguns tipos de cancros, e da diabetes tipo 2; melhora a saúde mental, o funcionamento cognitivo e o sono. A recomendação é de 150 a 300 minutos de atividade moderadas ou de 75 a 150 minutos de atividades vigorosa ou, ainda, uma combinação das duas, ao longo da semana;

A pandemia agravou o comportamento sedentário da população, o teletrabalho, associado aos longos períodos de confinamento e as restrições da livre circulação (dever de recolhimento domiciliário), assim sendo mais do que necessário é fundamental para o bem-estar que as pessoas se mantenham ativas. Posto isto, a OMS emitiu recomendações para aumentar a atividade física e para combater o comportamento sedentário por faixa etária. Enumeram-se as recomendações: i) Para as crianças e os adolescentes, com idades compreendidas entre os 5 e os 17 anos, a prática de atividade física deve ser realizada durante 60 minutos, três dias por semana. Nesta faixa etária o exercício melhora a aptidão cardiorrespiratória e muscular; a saúde cardiometabólica, óssea e mental; a cognição e a redução da gordura corporal;

iii) Nos idosos com mais de 65 anos, além dos benefícios descritos para o grupo anterior, a atividade física ajuda a prevenir quedas e lesões relacionadas com as mesmas, e o declínio da saúde óssea e da capacidade funcional. Nas recomendações gerais, no caso dos adultos ou idosos com doenças crónicas, os tempos de atividade física são semelhantes. Quando não for possível cumprir as recomendações, as pessoas “devem praticar atividade física de acordo com suas capacidades”. A recomendação para as mulheres grávidas e no pós-parto é para que pratiquem 150 minutos de atividade moderada, reduzindo assim o risco de pré-eclâmpsia, de hipertensão gestacional, de diabetes gestacional, do ganho excessivo de peso, de complicações no parto e de depressão no pós-parto, assim como de complicações no recém-nascido, entre outros problemas. Após a saída do estado de confinamento devido à Covid 19, em que a prevenção na saúde é importante, é fundamental sensibilizar também a importância de prevenir o surgimento de patologias e de problemas nos pés, que são o alicerce

JUNHO 2021


PÁGINA 59 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

postural e a base de apoio do corpo, permitindo o caminhar de cada um. Assim, nesta fase de desconfinamento e nas atividades diárias como desporto e atividade laboral, a correta funcionalidade dos pés é fundamental, bem como a utilização de calçado adequado prevenindo a possível ocorrência de traumatismos. A adoção de posturas incorretas, os fatores ambientais e ausência de cuidados, podem tornar os pés vulneráveis às ações de bactérias, vírus ou fungos e contribuem para o surgimento de lesões e problemas podológicos.

É importante que as pessoas saibam que existem várias doenças que afetam o nosso organismo e que se refletem nos nossos pés, como é o caso da gota, artrite reumatoide, diabetes melitos e outros problemas relacionados com a

circulação. Os nossos pés por passarem a maior parte do tempo escondidos pelo calçado, são frequentemente esquecidos. No entanto, torna-se importante vigiá-los diariamente, sendo o primeiro passo para a deteção de alterações, permitindo um diagnóstico precoce e um acompanhamento adequado, de modo a prevenir o agravamento de complicações resultantes, por exemplo, de feridas ou bolhas. Além de estar alerta para possíveis alterações da pele, que podem ser sinais de micose no pé, no respeitante às unhas, devem estar atentas a irregularidades relativas ao seu formato, textura e coloração. Para proteger a integridade da pele e preservar a saúde dos pés, que estão muitas vezes sujeitos a condições de calor e humidade, que favorecem o desenvolvimento de fungos responsáveis por infeções, recomendase uma lavagem diária dos pés. Neste sentido, é importante uma correta higiene, como, lavar os pés com água morna e um sabão de pH neutro; secálos com uma toalha macia, sem esquecer os espaços entre os dedos; e a aplicação de um creme/loção hidratante, o que contribui para manter a pele dos pés suave e hidratada, protegendo-os dos agressores externos e ajudando a prevenir as calosidades. Isto porque, ao contrário de outras áreas do corpo, através das quais o suor pode evaporar facilmente, o uso de sapatos e meias pode levar à concentração de humidade. Assim, e de modo a prevenir o desenvolvimento de fungos e o crescimento de bactérias responsáveis por maus odores, além de trocar de meias diariamente, deverá

JUNHO 2021


PÁGINA 60 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

também alternar o seu calçado, evitando o seu uso contínuo. Aconselha-se que coloque os sapatos a arejar e que aguarde, pelo menos 24 horas, antes de calçar os mesmos sapatos novamente. Escolha também um calçado que permita a ventilação do pé, de preferência em pele, e meias de fibras naturais, preferivelmente de algodão. Ainda se recomenda que caminhar descalço tem as suas vantagens ao nível da circulação sanguínea, induzindo um estado de relaxamento perante os esforços a que os pés estão sujeitos no dia a dia. Contudo, mesmo em casa, deve evitar passar longos períodos sem calçado, uma vez que este tem como principal missão proteger os nossos pés, fornecendo-lhes estabilidade, com a capacidade de amortecer o impacto dos pés com o solo. Ao andar descalço está a deixar os seus pés expostos a perigos e também a impurezas, fazendo com que a pele perca a sua humidade e com que fique ressequida, o que pode levar ao surgimento de fissuras.

No respeitante ao calçado, não devemos esquecer que este deve ter entre três a quatro centímetros de sola e não mais, uma vez que quanto maior for a altura dos sapatos, menor a superfície de apoio do pé. Já os saltos completamente rasos, como chinelos e sabrinas, são também uma opção a evitar, pois a sua sola é demasiado fraca para amortecer o impacto do pé nas superfícies duras. Além disso, não oferecem um bom suporte ao arco do pé, pelo que a sua utilização regular está associada ao desenvolvimento de fascite plantar. Os chinelos abertos deixam também o pé exposto, aumentando o risco de lesões. Complementarmente, não deixe as unhas dos pés demasiado longas ou curtas, tenha antes em conta a linha dos dedos como medida. Não faça um corte arredondado nos cantos, de modo a permitir que a unha cresça para além da pele nas margens. Recomenda-se que olhe pelos seus pés, procure um Podologista.

JUNHO 2021


PÁGINA 61 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

ARREDA, O PRÍNCIPE BOMBEIRO ANTÓNIO MONIZ PALME

Abstract

Résumé

D. Afonso de Bragança, founded the Real Associação de Bombeiros Voluntários da Ajuda, of which he was the commander, and, when there were fires, he roamed the streets of Lisbon at high speed, in a fire engine, which he himself offered, and since there was no sirens at that time, to get people out of the way, shouted "Arreda, Arreda!" His passion for new motor vehicles also led him to be responsible for organizing the first car races in Portugal. He shared with Dr. Tavares de Mello the love for motorsport, and he saw in this master a permanent incentive for his learning of mechanical skills.

D. Afonso de Bragança, a fondé la Real Associação de Bombeiros Voluntários da Ajuda, dont il était le commandant, et, lorsqu'il y avait des incendies, il parcourait les rues de Lisbonne à grande vitesse, dans un camion de pompiers, qu'il offrait luimême, et comme il n'y avait pas de sirènes à ce moment-là, pour éloigner les gens, a crié "Arreda, Arreda!" Sa passion pour les véhicules automobiles neufs l'a également amené à être responsable de l'organisation des premières courses automobiles au Portugal. Il a partagé avec le Dr. Tavares de Mello son amour pour le sport automobile, et il a vu dans ce maître une incitation permanente pour lui à acquérir des compétences mécaniques.

Key words: D. Afonso de Bragança; “o arreda”; cars.

Mots clés: D. Afonso arreda”; voitures.

Dom Afonso, Duque do Porto (J. C. Fernandes, Lisboa,1903)

de

Bragança;

“o

A História é sempre injusta com algumas personalidades do Passado. As chamadas estrelas, que no seu tempo deram nas vistas, muitas vezes por motivos ínvios, jamais são esquecidas pois foram e são do agrado do grande público e da sociedade de consumo, cada vez mais medíocre. Na verdade, constituem sempre uma atracção para os leitores das revistas sociais e da pepineira das crónicas dos escândalos. Porém, a personagem normal, que não matou nem roubou ninguém, que sempre trabalhou o melhor que sabia e podia, não tem lugar nos escaparates da actualidade. Enfim, os tempos que vivemos e a sua frivolidade na avaliação das figuras do passado.

JUNHO 2021


PÁGINA 62 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

Qual a razão deste tipo de meditação!!!? Há dias, recordei uma conversa de há muitos anos com um velho amigo de meu Pai que, numa visita a S. Pedro do Sul, me perguntou se eu sabia quem era o Infante D. Afonso de Bragança, filho do Rei D. Luís e da Rainha D. Maria Pia de Saboia, filha do Rei da Itália, Victor Emanuel II. Respondi que sim, que era o irmão do Rei D. Carlos. Ficou espantado com a minha sabedoria de rapazola. Esse amigo de meu Pai, Domingos Tavares de Mello, era um beirão ligado aos primeiros automóveis entrados em Portugal, pois era filho do celebérrimo Dr. Tavares de Mello, que adquiriu, em 1897, uma viatura, uma carruagem automóvel, já com pneus de borracha, com um motor Daimler, fabricado pelo francês Levassor.

Era assim proprietário da segunda viatura entrada em Portugal, pois a primeira era do Conde de Avillez. Mas vamos ao que interessa. No fundo, pouco mais sabia desse príncipe Bragança que tinha uma alcunha bem engraçada, posta pela população lisboeta. Era chamado “O Arreda”. Nem mais. E fui sabendo pelo desportista, amigo da Família, que o Príncipe, além da simplicidade e modéstia que o caracterizava, não estava nada adaptado à vida da Corte, não tendo a cultura dos príncipes seus contemporâneos. Apesar de tal, falava correntemente uma série de línguas, desde o alemão, passando pelo francês e pelo inglês, acabando no italiano. Claro está que, como todo o português que se preza, falava castelhano!!! Contudo, para a investigação intelectual e para os estudos, não era lá muito dado. Porém, compensava essa falta com outras qualidades, como referia Tavares de Mello. Por Ele, soube igualmente, que o senhor seu pai, Dr. Tavares de Mello, era uma pessoa excepcional para a Época, pois tinha aprendido num ápice a compor não só a sua viatura, quando estava avariada, bem como todos os automóveis que apanhava à mão, nomeadamente os que posteriormente adquiriu. Na realidade, podia solucionar mecanicamente qualquer problema que acontecesse, o que era uma grande vantagem. Na altura, não havia um mecânico conhecido em cada esquina, como aconteceu posteriormente. Ora, Ele era um amante da marcenaria e da serralharia, onde gastava parte do seu tempo de lazer, descobrindo logo, por si, os vários e complicados segredos da nascente mecânica automóvel. E o príncipe D. Afonso tinha naquele companheiro de amor ao automobilismo, um mestre ideal e competente na mecânica e um permanente incentivo para a sua

Dr. Tavares de Mello

JUNHO 2021


PÁGINA 63 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

aprendizagem. Assim, o Príncipe criou um novo gosto paralelamente à sua grande paixão pelos bombeiros. Em relação aos soldados da paz, devo esclarecer que o Rei D. Luís, seu progenitor, tinha apoiado os bombeiros da Ajuda, cedendo-lhes um vasto espaço de uma sua propriedade. Razão porque a nova Real Associação dos Bombeiros Voluntários da Ajuda, passou a ter um Príncipe, apenas com 16 anos, como seu presidente honorário e que foi nomeado, em 1889, segundo comandante dessa Associação, tendo ajudado e apoiado a construção de um novo quartel. Por essa ocasião, o Sr. D. Afonso mandou vir da Alemanha uma escada especial Magirus, uma raridade na altura e que fez um tremendo sucesso. No meio dos abnegados bombeiros, seus companheiros, D. Afonso foi considerado um dos seus melhores e o povo lisboeta consideravao um dos mais corajosos voluntários entre os soldados da paz.

Escada Magirus adquirida pelo Infante D. Afonso para a Associação dos Bombeiros Voluntários da Ajuda

Num célebre fogo acontecido no Chiado, D. Afonso foi o primeiro a acometer uma casa incendiada, já envolvida pelas chamas, salvando muitas pessoas e transportando

algumas nos seus braços. Claro que, na altura, foi criticado pelos elegantes e snobes da Capital e por determinado tipo de crítica republicana, por considerarem não ser as funções de bombeiro próprias de um príncipe!!! Mas, D. Afonso de Bragança nunca se importou com esse tipo de críticas e continuou a exercer abnegadamente as funções de Soldado da Paz. Mal acontecia um incêndio, era o primeiro a saltar para o carro de cavalos dos bombeiros, que guiava com extrema mestria, conduzindo a alta velocidade, pelas ruas estreitas da cidade, e gritando a todo o pulmão, “ARREDA”, para que todos se desviassem e fugissem à passagem da carreta dos bombeiros, puxada pelos cavalos, em galope desabrido. E a alcunha de “Arreda” passou dos carros de cavalos dos bombeiros para os recém-chegados automóveis, que D. Afonso conduzia lindamente. Ainda por cima, sabendo compor as avarias em qualquer local onde eclodisse uma pane. E o povo gostava de ver o seu Príncipe debaixo dos carros, deitado no chão, cheio de óleo, a aplicar os conhecimentos mecânicos que tinha aprendido à sua custa. E Tavares de Mello recordava que D. Afonso, além do mais, em 1895, corajosamente assumiu a sua qualidade de oficial, como tenente coronel, e partiu para a Índia, a comandar uma expedição para acabar com uma revolta militar qua a má língua segredava ter sido instigada pelos ingleses. Após uma vitória esmagadora, passado um ano, assinou uma amnistia e regressou à Europa. Porém, a prisão do Gungunhana e os feitos das nossas forças em Moçambique, tirou ao Príncipe o seu legítimo lugar nas letras gordas das páginas principais da Imprensa. Presidiu então, com a Mãe, D. Maria Pia, à inauguração do Instituto de Odivelas,

JUNHO 2021


PÁGINA 64 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

uma escola criada para educar as filhas dos militares e para a qual andou a angariar fundos para colocar em pé tal projecto. Mas voltemos à actividade automobilística do “Arreda”. Se a maior parte dos automobilistas preferia os automóveis franceses, D. Afonso, por influência da Mãe, preferia os italianos, nomeadamente da marca Fiat.

multidão, entre os abraços dos populares e as provas de admiração e carinho da gente simples como Ele. Por esse motivo, aceitou ser presidente de júri em diversas competições, para continuar a sentir o cheiro da gasolina e o calor da competição. Nesse sentido, colaborou na criação do Real Automóvel Club de Portugal, de que foi presidente da Assembleia Geral até à implantação da República.

Automóvel FIAT do Infante D. Afonso vencedor do mínimo tempo e do primeiro prémio da 3.ª categoria da corrida Figueira da Foz Lisboa realizada a 27 de Outubro de 1902

Ao volante do seu Fiat, D. Afonso, em 1904, venceu a primeira edição da Gincana de Cascais. E não resistiu a inscrever o seu 12 CV na pioneira competição Figueira da Foz-Lisboa, a qual venceu. Foi sétimo, em 18 de Março de 1906, no disputado e inovador Quilómetro Lançado, de Valada do Ribatejo, prova idealizada pelo Real Automóvel Club, talvez a primeira de velocidade. Tavares de Mello que tinha mandado vir da Bélgica um Darrac de 60 CV, não conseguiu que a recém aquisição começasse a trabalhar, na linha de partida….! Azar dos azares, queixava-se mais tarde. D. Afonso, “o Arreda”, sentia-se bem, no meio da

O Infante D. Afonso, num dos seus potentes automóveis

O simpático D. Afonso, após a queda da Monarquia, foi para o exílio em Itália, onde sua Mãe acabou por falecer, assistida por Ele e pela Rainha D. Amélia. Sentindo-se só, D. Afonso, Duque do Porto, resolveu casar-se com uma escritora americana, Nevada Stoody Hayes, perante a oposição de

JUNHO 2021


PÁGINA 65 | REAL GAZETA DO ALTO MINHO

toda a família. Foi viver então para Nápoles, onde faleceu com 54 anos. Está o seu corpo no Panteão dos Braganças, em Lisboa. Deste modo, desapareceu de cena uma das figuras mais carismáticas do seu tempo, um príncipe bombeiro e

mecânico, amado pela gente simples alfacinha. Não posso deixar de recordar ainda as figuras sampedrenses de Mário Clemente e de Manuel Borges, amigos do meu Pai e, igualmente, admiradores de D. Afonso e dos Tavares de Mello.

Funeral do Infante D. Afonso, Duque do Porto

JUNHO 2021


TF AGENCY AGÊNCIA DE MARKETING & COMUNICAÇÃO

Marketing/Comunicação/Imagem Redes Sociais Multimédia Personal Branding Criação/Gestão Websites Relações Públicas SEO

Ajudámos a

ter

os

uma

nossos

clientes

estratégia

de

marketing única e inovadora, de forma a alcançarem uma maior

visibilidade

nas

variadas formas de publicitar a sua empresa/marca.

@tf_agency @TFagencyPT tf_agency@outlook.com https://tf-agency.negocio.site/



CONCURSOS ESCOLARES A IMPORTÂNCIA DO RECONTRO DE VALDEVEZ PARA A FORMAÇÃO DE PORTUGAL

Para mais informações contactar a organização: real.associacao.viana@gmail.com info@gepa.pt https://gepa.pt/

JUNHO 2021


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.