
3 minute read
Chegada do Chat GPT incita discussões sobre o futuro do jornalismo
Capaz de criar conteúdos escritos com linguagem semelhante à humana, chatbot da OpenAI pode substituir profissionais por textos mecânicos e sem análise crítica
Por Artur Maciel, Esther Ursulino e Giovanna Oliveira
Advertisement
Em novembro de 2022, a empresa OpenAI apresentou ao mundo o Chat GPT (Generative Pre-Trainer Transformer, ou em tradução livre Transformador Pré-treinado Generativo), programa de Inteligência Artificial (IA) capaz de aprender conteúdos, responder perguntas sobre variados assuntos e criar, de forma rápida, textos novos com linguagem semelhante à utilizada por seres humanos. A aparição desta nova tecnologia, que vem sendo aperfeiçoada para apresentar um desempenho cada vez mais eficiente, incita discussões sobre o futuro do jornalismo e dos jornalistas. Afinal, o profissional da informação pode ser substituído?
Segundo Hugo de Paula, coordenador do curso de Ciência de Dados da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, “o jornalismo não vai se tornar obsoleto, mas como toda profissão impactada pela tecnologia, ele vai se transformar”.
Hugo cita o exemplo da Associated Press, agência que desde 2014 utiliza a inteligência artificial no processo de coleta, produção e distribuição de notícias; e o site Yahoo! Sports, que utiliza ferramentas para produzir milhões de textos por ano, baseados em resumos de jogos e estatísticas. Com isso, ele conclui que aquelas pessoas que fazem notícias baseadas apenas em fatos, sem interpretações, vão cada vez mais perder o emprego.
Silvio Mieli, jornalista e professor de Culturas Tecnológicas e Sociedade da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) faz uma crítica ao jornalismo que apenas reproduz, sem dar espaço às outras possibilidades. “Ao longo dos últimos anos o jornalismo e o jornalista automatizou muito a sua percepção; virou uma máquina de tentar descrever o real, de cópia do real. Nós robotizamos tanto a nossa profissão que alguns robôs fazem melhor do que a gente”, diz.
Mieli ainda destaca que o chatbot da OpenAI avança no campo da busca de dados, mas que isso nem sempre está ligado à compreensão deles. Similarmente, Fernando Osório, professor do Departamento de Sistemas de Computação da Universidade de São Paulo (USP), campus de São Carlos, disse em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo: “O Chat GPT é uma boa ferramenta para gerar textos, mas ele não sabe o significado das palavras. Ele é apenas um papagaio do que aprendeu”. Justamente por não compreender o que reproduz, a nova tecnologia está sujeita a cometer erros.
Delírios tecnológicos do “tudo sei” Com o avanço da tecnologia, chatbots estão se tornando cada vez mais comuns no atendimento ao cliente e na criação de conteúdo. No entanto, a precisão desses sistemas ainda é uma questão em aberto.
De acordo com Hugo de Paula, as ferramentas de criação de texto, como o Chat GPT da OpenAI, se baseiam na probabilidade para responder às perguntas. Isso significa que, em vez de dizer “não sei”, o sistema sempre dará uma resposta provável, que muitas vezes pode ser absurda e imprecisa. Esse fenômeno é conhecido como “alucinação” na área de tecnologia.
Embora a OpenAI tenha afirmado que o Chat GPT-4 alucina menos e tem melhor desempenho em 40% em comparação com o GPT-3, ainda há inconsistências no modelo. Por esse motivo, Hugo de Paula alerta que não podemos confiar cegamente nas informações fornecidas pelo chatbot
Apesar dessas limitações, o professor acredita que a ferramenta pode ser útil para o jornalismo. Por exemplo, o Chat GPT pode ajudar na sintetização de textos, na produção de notícias baseadas em modelos, na sugestão de pautas, na montagem de roteiros para reportagens e na checagem de fontes.
Silvio Mieli, especialista em jornalismo de dados, também vê potencial no uso do Chat GPT para melhorar as perguntas feitas pelos jornalistas. Segundo ele, a tecnologia pode ser consultada para verificar se as perguntas da pauta podem ser melhoradas com base nas respostas fornecidas pelo sistema.

Apesar de ser uma ferramenta promissora, é importante lembrar que o Chat GPT ainda é uma tecnologia em desenvolvimento e deve ser utilizada com cautela, especialmente no campo do jornalismo, onde a precisão das informações é crucial.
Função do jornalista em tempos de Inteligência Artificial
Em todos os cenários, o periodista terá a demanda de fazer uma análise crítica dos dados gerados pela ferramenta de IA, visto que por estar sujeita a responder perguntas específicas, ela não consegue extrapolar para outros campos – como identificar o impacto que uma notícia pode ter na sociedade ou fazer relações com diferentes áreas de conhecimento. Além disso, por ser treinado com milhares de textos, o Chat GPT pode acabar reproduzindo preconceitos e vieses da sociedade, que também devem ser analisados por uma visão humana e sensível.
Hugo de Paula afirma que, conforme a inteligência artificial for invadindo nosso mundo, surgirão muitos textos com problemas éticos que podem trazer prejuízos à sociedade – como o uso de termos ofensivos, vazamento de dados e disseminação de desinformações.
Nesse sentido, o coordenador destaca que a compreensão da IA é importante para o jornalista fazer reportagens que fiscalizem o desempenho da ferramenta, responsabilizando seus desenvolvedores por eventuais erros.
Em concordância, Silvio Mieli fala sobre a necessidade de uma formação básica para tecnologia, para ser possível criticar e analisar aquilo que, afinal, é fruto do trabalho intelectual humano.
“O Chat GPT tem que ser desmistificado. Não precisamos virar programadores, mas precisamos conhecer essa lógica que está sendo colocada dentro das máquinas”, conclui.