Antologia READ ON, Portugal, Versão Integral, 2020

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ROCK'N'ROLL, BABY!

ARNE SVINGEN

Ele próprio toca frequentemente música tão alta que não consegue ouvir a campainha, o telemóvel ou as pessoas a atirar pedras à janela. Ele sobe as escadas para apertar o botão da campainha durante algum tempo, quando a porta se abre de repente. - Oh? diz ela, a apenas meio metro de distância. Ele não esperava que ela dissesse nada de sensato. Mesmo com o penteado dela e com uma camiseta velha, ela é mais bonita do que ele se lembrava. - Eu trouxe uma guitarra. E funciona, explica ele. Ela não vê a caixa da guitarra nem o amplificador, mas olha para trás dele, como se esperasse que ele viesse com uma banda completa. - O que estás a fazer aqui? pergunta ela. - Eu não pude evitar. - Podias enviar uma mensagem. Ou telefonar. - Então achas que eu não devia ter vindo. - E o que é que vai acontecer agora? - Escrevi uma canção para ti. E adoraria tocá-la... para ti. É como colocar a lista de músicas do Spotify no shuffle, ele não tem ideia do que está por vir. Tudo o que ele pede é que o seu silêncio seja em breve substituído por algo agradável. - Meu Deus, Jacob. Vieste até aqui para tocar uma canção para mim? - Posso entrar? Ela hesita, antes de dar um passo atrás e fazer um gesto confuso de mão. Não vai haver abraço. Nem ele esperava que ela se agarrasse ao pescoço dele. A esperança era que ela não lhe atirasse a porta à cara. Jacob não sabe se deve tirar o casaco e os sapatos, ou apenas tocar ali no corredor. Eles olham um para o outro. Ele talvez fique de pé por um tempo. - Vamos para baixo, para a cave", diz ela, e percorremos a cozinha em frente e entramos numa escadaria escura. Ele bate com o amplificador na porta no caminho para baixo. Ela pede que ele tenha cuidado. Na sala da cave, Emilie senta-se no sofá. Jacob fica de pé. - O que estás realmente a fazer? pergunta ela. - Eu ouvi as melhores músicas do mundo. - De que é que estás a falar?

- Todas as músicas realmente boas são sobre ... algo que é realmente difícil de dizer, mas muito mais fácil de cantar. - Sentimentos? Jacob acena com a cabeça. - E depois as letras dizem que temos de arriscar, senão arrepender-nos-emos para sempre. - Então a tua vida é como uma canção? - Não, mas a melhor letra diz mais em três minutos do que um livro inteiro diz. Não é rock 'n' roll sentar-se em casa e sonhar com tudo o que poderia ter acontecido. Tens de sair. Correr o risco. Estar um pouco ... despido. E eu acho que foi isso que fiz hoje. Mas... com roupa. Emilie sorri momentaneamente. - Tenho estado a pensar em ti, diz ela. - Na verdade, foi um prazer conhecer-te... naquela altura. Jacob pousou a caixa da guitarra e o amplificador. Não chegam a mais do que dois passos do sofá, mas mesmo assim ele dá um passo para a direita e senta-se no apoio do braço do amplificador. - Mas eu tenho uma namorada, acrescenta, com uma cara mais séria. Também tens disso? - Há muitas canções sobre como é bom ter uma namorada. As pessoas escrevem sobre o amor o tempo todo. Mas sabes que mais? - Agora estou curiosa... - Se não fosse por algumas das melhores canções que existem, haveria muitos que só queriam estar com uma rapariga que se dedicasse, uma namorada decente, o melhor que pudessem encontrar nessa altura, de alguma forma. Mas as melhores canções dizem-me que eu consigo encontrar algo muito melhor. Há alguns que são totalmente, completamente ... sim, que são apenas ... - Essas canções dirão sempre que se pode encontrar algo muito melhor. Nem eu teria sido suficientemente bom depois de algum tempo. - A diferença é que eu escrevi uma canção para ti. E nunca fiz isso a mais ninguém. Os olhos da Emilie estreitam-se. - E agora achas que vou cair por ti no momento em que a tocares? Tal como todas as raparigas ficam completamente moles quando vêem um rapaz

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