Cuidar do ser humano deve ser a preocupação central; o modo de ser cuidado revela como ele é. Viver é relacionarse, portanto, deslocar o nosso interesse para o outro deve ser a tônica de quem pretende cuidar da cidade. Cuidar do outro, desse ser único, singular e irrepetível.
DIREITO À CIDADE Elementos para uma nova Agenda Urbana em São Luís
Aziz Santos
CIEP CENTRO DE INOVAÇÃO E CONHECIMENTO PARA A EXCELÊNCIA EM POLÍTICAS PÚBLICAS www.ciepp.org
MISSÃO Contribuir para a formulação, implementação e avaliação de políticas públicas com base em evidências científicas OBJETIVOS • Investigar programas, projetos e ações governamentais para que possamos aperfeiçoá-los a partir de avaliações externas e recomendações ao poder público; • Implementar projetos no campo da educação, ciência, tecnologia e inovação que contribuam com a transformação social; • Inspirar o desenho de políticas a partir do conhecimento aportado por nossos pesquisadores PROPÓSITO Ser referência em inovação, conhecimento e produção de políticas públicas na América Latina VALORES Excelência Confiança Seriedade
SUMÁRIO
5 PREFÁCIO 10 APRESENTAÇÃO 11 INTRODUÇÃO 13 DIREITO À CIDADE 15 REINVENÇÃO DO URBANO 16 CULTURA 16 AGRICULTURA URBANA 17 SUSTENBILIDADE 18 DEMOCRATIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO
18 PERIFERIAS INSURGENTES 19 ESFERA PÚBLICA 19 MOBILIDADE URBANA 19 EXCLUSÃO SOCIAL 20 QUESTÕES URGENTES DO DESENVOLVIMENTO LOCAL 22 SÃO LUÍS: A VITÓRIA DA INCLUSÃO SUSTENTÁVEL 26 EMBLEMAS
Aziz Santos
DIREITO À CIDADE
PREFÁCIO NOVOS CAMINHOS PARA SÃO LUÍS Raimundo Palhano*
Considero Abdelaziz Aboud Santos um dos melhores executivos dentre os tantos com quem já mantive relações de trabalho. Quem primeiro me disso isso foi o Léo Costa, ex-Prefeito de Barreirinhas: ... “ele é muito eficiente!”. Estivemos muito próximos durante o Governo Jackson Lago, sedimentando uma amizade fraterna. O que disse o Léo foi pouco: Aziz nasceu para fazer acontecer e acumular resultados satisfatórios em tudo que realiza. Jamais admitiu esses predicados e muito menos aqueles ligados aos seus atributos intelectuais. Escapa dizendo sempre que não passa de um exbancário do BASA. Quem o conhece de perto sabe que não é nada disso. Aziz é um estrategista de mão cheia, tem um texto técnico e literário de grande poder e reúne uma sensibilidade humana privilegiada. É com esse olhar que recomendo a leitura de mais esta rica contribuição sua: esta plaquete preciosa, denominada, com muita sabedoria, de “Direito à Cidade: elementos para uma nova agenda urbana em São Luís”, vindo a lume em uma conjuntura marcada pelo distanciamento social e *
Foi Presidente do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (IMESC). Atualmente é diretor da Escola de Formação de Governantes, membro da Academia Caxiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Economista formado pela Universidade Federal do Maranhão (1972), especialista em Planejamento do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Pará (1982), mestre em História Econômica pela Universidade Federal Fluminense (1987), com intercâmbio na área de planejamento educacional na Iowa State University (1977) e na Universidad Central de Las Villas (Cuba, 1987). Foi Diretor de Pesquisas do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (Ipes), Pró-Reitor de Administração da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Presidente do Conselho Regional de Economia do Maranhão (CORECON-MA), Diretor Estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae-MA), Presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-MA) no Maranhão, secretário nacional de assuntos jurídicos da Undime Nacional, coordenador do Programa de Fortalecimento das Secretarias Municipais de Educação do Semi-árido do Ministério da Educação (MEC) e secretário municipal de Educação de Caxias-MA. Atualmente é consultor para educação junto ao Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), diretor da Escola de Formação de Governantes, membro da Academia Caxiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão.
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pelo embargo do beijo e do abraço, em sua máxima expressão, fruto da pandemia que destroçou as formas usuais de participação na rua e desestruturou as da casa. Antes de continuar a exposição sobre a nova agenda urbana deste bancário inspirado e culto, peço permissão para apresentar alguns apontamentos sobre a história, memória e cultura do torrão ludovicense, em seu sentido mais amplo, com o que espero avivar um pano de fundo que ajude na compreensão das ideias ousadas que o autor propõe nesta obra, voltadas ao despertar de São Luís de um sonambulismo sem final. O objetivo é lembrar que esta Urbe não é uma cidade qualquer. Ela tem segredos e mistérios que a tornam única no Brasil e no Mundo. Guardo a tese muito pessoal de que São Luís tem permanecido no avesso, ou no ostracismo, pelo pouco conhecimento sobre sua ontologia, ou suas múltiplas existências, e o seu ethos social. Farei um diminuto mosaico multifacetado e multicolorido dos símbolos de uma cultura e do seu povo, em eterna transição para lugares que ninguém conhece, e que, por isso, não consegue romper seus paradigmas de origem, exigindo há muito tempo, que seja decifrada, mesmo não existindo nem pés e nem cabeças à mostra. Começo pela máxima que os eruditos tupiniquins preferem, ao se reportarem ao Maranhão: do célebre Vieira, no Sermão da Quinta Dominga da Quaresma, de 1654, que escreveu: ... “A verdade que os digo é que no Maranhão não há verdade. No Maranhão até o sol e os céus mentem”. Um verdadeiro dogma sagrado, que implica na despolitização de suas outras Histórias, abafadas. Curioso.
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Mesmo assim, não se pode esquecer de obras grandes que embelezam o decantado pantheon maranhense, como Primeiros Cantos(1846), de Gonçalves Dias; Tese sobre mecânica celeste (1848), de Gomes de Souza; Jornal de Timon (1852/54), de J. Lisboa; Eneida Brasileira (1854), Odorico Mendes, a tradução poética de toda a obra de Virgílio; O Guesa Errante (1866), Sousândrade; O Mulato (1881), Aluízio Azevedo; Fanfarras (1882), Teófilo Dias, e tantos outros geniais. Não se pode abordar a questão do transporte sem passar pela História dos transportes urbanos no Maranhão, por A. Lopes. Lopes, escritor reconhecido como o que mantinha viva a tradição da cultura espiritual. Jornalista, francesista e a condição de historiador. Há um desafio recorrente aos decifradores da Cidade: como se institui a cidadania em sociedades desiguais e democracias imperfeitas? Tenho procurado oferecer respostas ao tema, sobretudo em meus estudos de pósgraduação universitária. Uma delas Aziz se reporta neste seu trabalho. É bom não esquecer que São Luís era praticamente o único lugar de referência urbana, econômica e política no Maranhão. Havia outros agrupamentos menores e regionalmente localizados, como se sabe. Por suas características de identidade, convivia-se com descontextualização e desequilíbrio sociais acentuados, de gênero e de tantas outras naturezas. Sempre houve o retorno da visão que sempre volta. Instituições edificadoras da consagração pública sempre exerceram um fascínio incomum. Eram e continuam sendo lugares de legitimação conquistada socialmente. Um meio de consagração dos agentes sociais e governamentais. Vem daí o reforço ao processo de constituição das hierarquias. Raízes também da dominação política e da dominação carismática.
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Exemplos emblemáticos consagrados: AML (1908), IHGM (1925), ACM (1854-1879), Faculdade de Direito, Centro Caixeral, Liceu Maranhense, Tribunal de Justiça, Prefeitura, sedes eclesiásticas, sedes governamentais e de poderes, entre outros. Tudo isso contribuindo para a formação de linhagens: de literatos, intelectuais, escritores, políticos, comerciantes e outros. Até a metade do século XIX eram os empresários que pensavam e propunham as medidas para viabilizar e expandir a economia maranhense. A Comissão da Praça é de 1854-1878 e representa o melhor exemplo. A República chega às avessas: nunca se implanta e o domínio dos coronéis e oligarcas se expande a tal ponto que muitos percebem suas existências até os dias de hoje. No período vitorinista o Maranhão era conhecido no Brasil como a Universidade da Fraude. Um horror! A nova cartografia ludovicense precisa enfrentar as questões da alteridade. Igualmente o preconceito racial, de jeca-tatu, de vira-latas e tantos outros. A nova cartografia deve encarar a encruzilhada entre o beletrismo helênico e a era da literatura baseada apenas na escrita rebuscada. Sem isso o relato do passado continuará o processo de despolitização. É preciso fazer Histórias, quando o passado vira reflexão e análise crítica. Continuo achando que decorrem desta maneira especial de olhar introspectivamente o Maranhão e o seu povo as dificuldades relacionadas a todo e qualquer esforço de interpretação sobre o presente, o passado e o futuro desta terra. O momento histórico, marcado por uma policrise incomum e sem precedentes, não deixa dúvida de que é preciso passar a limpo o que foi, o que é e o que será o Maranhão e a sua Capital. 8
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Tenho dito, sempre: “...significa, antes de tudo, colocar os mitos de cabeça para baixo, revelar os avessos, confrontar a razão patrimonialista e, sobretudo, ajudar a produzir uma cosmovisão que ocupe o lugar das explicações hegemônicas”. No aniversário da Capital, Aziz nos presenteia com este instigante “Direito à Cidade”, um alerta de que não temos mais tempo para esperar D. Sebastião, aguardado e jamais chegado nas Guerras de Canudos e Contestado, e ainda hoje pensado por alguns poderosos como a única possibilidade de restauração de uma Atenas ainda não suficientemente compreendida... Contando o tempo pela ampulheta francesa, São Luís, capital do Estado do Maranhão, fará em 12 de setembro de 2020, que chega a galope, 408 anos de registro no cartório do tempo, nesse lado do mundo. Claro que este território e seus primitivos habitantes são muito mais antigos. É um tanto desolador ter que festejar a data sabendo que os desafios são imensos. Aziz traz uma nova carta de navegação para a cultura ludovicense e com isso nos incentiva a agir. O CIEP, do grande e fecundo editor Jhonatan Almada, produtor intelectual para uma São Luís Reinventada, viabilizou os meios para que a embarcação ganhasse o mar e os rios do Maranhão e do Brasil.
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APRESENTAÇÃO
O debate sobre o Direito à Cidade é um dos mais pertinentes e necessários na atual conjuntura de eleições municipais de 2020 em um contexto mundial inédito de pandemia. O usufruto desse Direito foi profundamente abalado. A pandemia afetou todos os fluxos econômicos, culturais, sociais e afetivos, a exigência do isolamento social para preservação da vida nos colocou em suspenso e nos impediu de circular livremente pela Cidade. O presente trabalho de Aziz Santos é contribuição fundamental para refletirmos o desafio do Direito à Cidade em São Luís a partir da experiência do autor na gestão municipal onde exerceu os cargos de Secretário Municipal da Fazenda e Vice-prefeito. Portanto, saber de experiência feito que nos aponta as questões urgentes para a cidade. A palavra-chave é a inclusão sustentável, a Cidade só pode ser Direito se for de todos e propiciar essa fruição especialmente aos mais excluídos das políticas públicas. O CIEP tem grande satisfação em acolher e publicar este trabalho no momento que estamos decidindo o melhor caminho para São Luís. Desejo que ele inspire os candidatos à prefeito e seus respectivos programas de governo. Boa leitura a todos! Jhonatan Almada Diretor do CIEP
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DIREITO À CIDADE: ELEMENTOS PARA UMA NOVA AGENDA URBANA EM SÃO LUÍS DO MARANHÃO Aziz Santos*
1. INTRODUCÃO Este texto é fruto de observações e notas extraídas aqui e acolá, sem pretensões acadêmicas. Trata-se de um tema a que me dediquei quando fui vice-prefeito de São Luís e me debruçava para compreender a complexidade da teia de relações da cidade e seu desastrado processo de urbanização. Além do acesso aos serviços públicos por toda a população, uma cidade humanizada precisa de lazer e convivência. Uma cidade solidária em que as pessoas ganham os espaços públicos, as ruas, praças, parques para se encontrarem sem pressa; uma cidade tranquila, arborizada com espécies nativas, paisagismo, com calçadas para os pedestres, todos esses ambientes disseminados pelos bairros. Tudo isso sob a proteção de um sistema de segurança eficaz e confiável. “Manter a segurança da cidade é tarefa principal, começando pelas ruas e pelas calçadas” (Jane Jacobs). Conhecê-la a fundo para intervir, entender sua vitalidade, como brincam as crianças, ir às ruas, falar com as pessoas para compreender a maravilhosa teia de relações dos seus habitantes. Aqui está a cura da insegurança e da violência; conhecer o vizinho, criar redes, misturar-se com os diferentes, saudá-los, e voltar a sorrir no espaço público. A rua é uma autêntica e complexa instituição social, onde desde crianças aprendemos a *
Abdelaziz Aboud Santos (Aziz Santos). Atualmente é Presidente do Instituto de Estudos Sociais e Terapias Integrativas-IEST. Economista formado pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e psicólogo formado pela Universidade CEUMA. Especialista em Metodologia do Ensino Superior e Filosofia Política pela UFMA. Foi gerente do Banco da Amazônia, presidente do Banco de Desenvolvimento do Maranhão (BDM), presidente do SEBRAE, presidente do Conselho Regional de Economia do Maranhão (COREN-MA), assessor-chefe da Prefeitura Municipal de São Luís, vice-prefeito de São Luís e secretário municipal da Fazenda de São Luís. Foi Secretário de Estado do Planejamento e Orçamento no Governo Jackson Lago (2007-2009).
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socializar e construir comunidades. Se a rua acaba por privilegiar o automóvel por sobre o pedestre, ela morre e inicia-se o fim da cidade. Sãos os “olhos da rua”, (Jane Jacobs), que sugerem que a presença das pessoas nos espaços públicos instaura uma certa segurança natural sobre esses mesmo locais, diminuindo com isso a violência. Cuidar do ser humano deve ser a preocupação central; o modo de ser cuidado revela como ele é. Viver é relacionar-se, portanto, deslocar o nosso interesse para o outro deve ser a tônica de quem pretende cuidar da cidade. Cuidar do outro, desse ser único, singular e irrepetível. Como falam Bernardo Toro e Leonardo Boff: o cuidado constitui a categoria central do novo paradigma de civilização que trata de emergir em todo o mundo. Saber cuidar, num modo de viver em que todos ganham, com acesso solidário ao alimento. “Saber cuidar se constitui na aprendizagem fundamental dentro dos desafios de sobrevivência da espécie, porque o cuidado não é uma opção: os seres humanos aprendemos a cuidar ou perecemos”. Cuidar das pessoas não significa, portanto, assistencialismo, como muitos dirigentes políticos verbalizam e praticam em nosso meio social, numa estratégia de alienação do eleitor, que acaba acreditando que a sua vida depende desses podres poderes e voluntariamente se tornando um servo da gleba. O sentido das coisas é afirmar o humano na ação. Trata-se de devolver ao homem sua dignidade/humanidade; cuidar integralmente, inclusive com sensibilidade, pois "bombas não mudarão o mundo, colocar em ação as qualidades sensíveis mais profundas do ser humano, o mudará" Willem Reich. A pessoa só é pessoa na relação com o outro. Precisamos de singularidade (nossa e do outro), o resto as máquinas fazem. Nisso está a nossa grandeza: sentir-se igual aos outros, pois sentir-se maior ou menor, nos isola, separa (também agrido o outro). 12
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Nossa “qualidade de vida” não pode depender de guetos protegidos por muralhas, alarmes e exércitos privados. Por isso devemos voltar a olhar o espaço público como o coração da vida moderna; seu projeto, seu uso, sua gestão e novas funções. Repensar a rua, a praça, o parque, a arborização e a paisagem urbana, aquela que nos permita humanizar o espaço público e experimentar o encontro, o intercâmbio e a diferença.
2. DIREITO À CIDADE Precisamos voltar a ter direito à cidade (Henri Lefebvre), com uma infinidade de espaços públicos pensados no interesse da população; em que demolições deem espaços a novos parques ou em que construções históricas tombadas passem a ser locais de encontro, ao invés de estacionamentos. Em que a população local tenha o direito de comandar, orientar e pressionar todo o processo urbano, em oposição aos interesses meramente relacionados ao capital. Não se trata apenas de ter acesso aos serviços públicos fornecidos pelo capital, mas usufruir da “a liberdade de construir e reconstruir a cidade e a nós mesmos”, em um processo coletivo e não individual. Direito à cidade negado historicamente, desrespeitado e negligenciado pela urbanização moderna, com claros sinais de segregações e desigualdades espaciais, com a concentração de infraestrutura, serviços básicos, equipamentos e locais de lazer em locais centrais das cidades ou nos bairros mais ricos, a exemplo dos shoppings, em alguns casos. A leitura do livro de Raimundo Palhano, A Produção da Coisa Pública – Serviços Públicos e Cidadania, nos ajuda a compreender a questão de como são consumidos – e por quem – os serviços públicos essenciais. O direito à cidade constitui-se não somente no acesso àquilo que ela oferece ou pode oferecer, mas na ação de mudar a cidade de acordo com os nossos próprios desejos. A questão do tipo de cidade que desejamos é 13
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inseparável da questão do tipo de pessoas que desejamos nos tornar. Isto é, a liberdade de fazer e refazer a nós mesmos. Trata-se, na visão do sociólogo David Havey, de um dos mais preciosos de todos os direitos humanos. Ou, nós criamos os espaços e os espaços nos criam, pois moldam nossas relações e interações à medida em que são criados (Milton Santos). Precisamos urgentemente de administrações mais democráticas da cidade, que façam uso intenso e constante de mecanismo para a participação direta da população, através de debates e conferências públicas, assembleias com a população, e tantas outras. O Estatuto da Cidade, de 2001, por exemplo, foi instaurado com o objetivo de “garantir o direito à cidade como um dos direitos fundamentais da pessoa humana, para que todos tenham acesso às oportunidades que a vida urbana oferece”. Mas 17 anos após sua publicação, pergunta-se quanto realmente avançamos? Modelos mais
democráticos
de urbanização, mais
humanos e
sustentáveis, onde possam vicejar novas formas de socialização, de promoção cultural, de impulsionamento das economias locais e solidárias. É na rua, no encontro das diversidades, que nasce o sentimento de pertencimento à cidade, por isso ela precisa ser ocupada todos os dias. É na rua ainda hoje que as mudanças ganham forças para acontecer e é lá também, tomando todos esses lugares que são nossos por direito, que se torna possível sermos mais fortes que o interesse de privatizar nossa democracia e nossos espaços.
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3. REINVENÇÃO DO URBANO Mais da metade da população mundial vive em cidades (ONU). No Brasil, esse número é ainda maior. Segundo dados do Censo 2010, organizado pelo IBGE, quase 85% da população brasileira vive em cidades. A cidade passou a ser o palco e o cenário das desigualdades econômicas. Trata-se do que Lefebvre chama de “tecido urbano”, ou seja, um movimento geral de concentração numa rede de malhas desiguais. Além disso, a supervalorização do “urbano”, nas suas mais variadas peculiaridades, em detrimento do “nãourbano” produziu aquilo que o autor chama de “implosão-explosão” das cidades, que é a faceta da urbanização sem reflexão. A falência dessa matriz trouxe um novo conceito de desenvolvimento urbano, cada vez mais discutido em todo o mundo: o urbanismo caminhável, que cria novas centralidades e valoriza a curta distância entre moradia, trabalho, educação, saúde e lazer. Uma organização urbana baseada em alta densidade, com diversos tipos de imóveis ligados por áreas de lazer, bem conectados por sistemas de transportes coletivos e alternativos não motorizados. Ou seja: as melhores cidades do mundo são aquelas cujos bairros dependem cada vez menos de transporte individual motorizado, com ruas arborizadas e fácil acesso a pé ou de bicicleta para os deslocamentos cotidianos. Desenvolver esses novos padrões é um desafio de todos: governo, empresas privadas, sociedade civil e universidades. Mas, para que as pessoas caminhem mais, é preciso criar melhores caminhos, bairros mais atrativos como investir em caminhos seguros, iluminados e com infraestrutura adequada para pedestres e ciclistas. É necessário estimular a população a ocupar ruas e praças e incentivar a formação de mais espaços de convivência.
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Nesse sentido, nasce a necessidade de repensar a cidade e o espaço onde ela se insere, sendo este um dos grandes desafios do nosso século, tendo em vista que os centros urbanos tendem a crescer em muito nos países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. (Henri Lefebvre).
4. CULTURA A cultura é um componente essencial para a profunda compreensão do fenômeno social, pois dialoga com a dimensão da construção de significados. Assim, Henri Lefebvre afirma que a cidade “é uma obra de arte”, que se exprime na realidade complexa e contraditória de sua própria existência. E mais: a cidade é o espaço das manifestações. Não somente das manifestações no seu sentido político, como forma de reivindicação e processos de luta, mas como manifestação das relações humanas e das singularidades de cada pessoa ou grupo. É o espaço onde as contradições se colocam como ordem e onde os contrastes se manifestam. A sociedade urbana irradia a construção e reconstrução de sentidos e significados em meio ao caos urbano. Caos que se converteu em ordem, pois não há sociedade sem ordenação. Dessa forma, a cidade é o espaço por excelência do conflito e do embate político, pois é nela onde o poder se manifesta na sua forma mais nua e crua. É, ainda, o espaço do manifesto humano, o lugar onde se procura não somente estar, mas também inventar.
5. AGRICULTURA URBANA Na realidade apresentada, as cidades também podem nos oferecer oportunidades para um futuro mais humano e ambientalmente mais equilibrado. Nesta acepção, a agricultura urbana destaca-se por sua capacidade em assegurar o direito à ocupação das áreas disponíveis para a produção de
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alimentos, a cooperação comunitária e a redução dos custos com deslocamentos e energia, materializando um planejamento mais democrático e participativo do espaço urbano. Em 1996, uma pesquisa conduzida pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) identificou que de 15 a 20% da produção de alimentos são provenientes da agricultura urbana. Estudos atuais estimam que 1,1 bilhão de pessoas estejam envolvidas com a referida atividade. Por isso, nestas últimas décadas, diferentes organizações vêm realizando pesquisas e ações com a finalidade de diagnosticar a agricultura urbana e promover ambientes institucionais que a favoreçam como estratégia mitigadora de diferentes problemas urbanos, tais como a pobreza, a desnutrição e a questão ambiental. Deve-se ressaltar, ainda, que a agricultura urbana é uma atividade marcada pelo protagonismo de agricultores, organizações não governamentais, coletivos, ativistas e pesquisadores. Portanto, ela envolve um sistema de governança local marcado pela atuação de múltiplos públicos estratégicos, no qual as universidades assumem um papel de grande relevância, ao produzir estudos de análise, avaliação e diagnóstico tanto para aprimorar a gestão de riscos, o planejamento e a implementação de políticas públicas, quanto para servir de base à pressão política por mudanças institucionais mais bem estruturadas.
6. SUSTENTABILIDADE Nesta dimensão, vale lembrar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: acabar com a pobreza, com a fome, assegurar uma vida saudável, uma educação inclusiva e de qualidade, garantir o acesso à água, saneamento e energia, promover o crescimento econômico sustentável com emprego para todos, uma industrialização inclusiva e sustentável, fomentando a inovação, 17
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conservar e usar de modo sustentável os recursos da natureza, promover sociedades pacíficas com acesso à Justiça para todos, estabelecer parcerias para o desenvolvimento, e tornar as cidades seguras.
7. DEMOCRATIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO Assim é necessário garantir que as pessoas, em todos os lugares, tenham informação relevante e conscientização para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida em harmonia com a natureza; desenvolver e implementar ferramentas para monitorar os impactos do desenvolvimento para o turismo sustentável, que gera empregos, promove a cultura e os produtos locais.
8. PERIFERIAS INSURGENTES Sabemos que o descuido proposital da urbanização empresarial impediu que tais benefícios chegassem aos núcleos de moradia das periferias, pelo que se tornou necessária a organização das comunidades em torno destas reivindicações junto ao poder público, e para o enfrentamento jurídico inevitável. As organizações e as associações de bairro das periferias autoconstruídas emergiram como resposta das favelas à desordem institucional. A periferia passou a se constituir em um polo de resistência, capaz de produzir sua própria cultura e ciente de suas necessidades e direitos. A insurgência das periferias passou a ser um agente transformador desses territórios. Emergiu das favelas uma cultura própria, um jeito de viver com visão do coletivo (não sem conflitos), a consciência da necessidade de ser reconhecida como parte legítima da cidade (com todos os direitos e deveres dos demais cidadãos). Tudo isso em um fluxo contínuo no sentido periferia – centro.
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9. ESFERA PÚBLICA A participação alternativa na esfera pública a partir das associações comunitárias passou a representar a periferia, e com isso surgiu uma nova relação entre o Estado e o cidadão, reforçada pela politização das classes trabalhadoras. Ocorreu o que se poderia chamar de “radicalização da democracia”, por meio da luta pela conquista de espaço (político, territorial, cultural, etc.). As bases de uma democracia passam pela salutar organização social de base.
10. MOBILIDADE URBANA Sendo assim, a crise da mobilidade urbana ganha cada vez mais força na pauta das questões referentes ao Direito à Cidade e à Nova Agenda Urbana, esta que em sua última versão orienta e se compromete com a promoção do acesso universal aos sistemas e modalidades de transporte e mobilidade seguros, sustentáveis, acessíveis e que levem em conta as questões de idade e gênero. Sabemos que espaços públicos ocupados por pessoas, ruas e bairros que permitem o deslocamento a pé dos seus moradores para as tarefas cotidianas tendem a ser mais seguros. Nesse contexto, projetos que resgatam a forma mais democrática, saudável e inclusiva de se deslocar, como andar a pé e pedalar, ganham espaço e reconhecimento por sua importância.
11. EXCLUSÃO SOCIAL Historicamente, a exclusão social, em especial nos centros urbanos, tem sido um dos vetores da degradação ambiental. Logo, a redução das desigualdades locais e regionais é fator fundamental para a recuperação deste passivo socioambiental. 19
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Portanto, entendemos que os principais desafios a serem enfrentados pelos que pensam as cidades de hoje, profissionais, gestores públicos e sociedade, são os de transformar nossas cidades em espaços democráticos, inclusivos e sustentáveis. Cidades que respeitem as diversidades culturais, étnicas, de raça e gênero. Que sejam pensadas sob a lógica da acessibilidade de bens e serviços, transporte alternativo e não poluente, que sejam mais arborizadas, etc. Cidades pensadas para e pelas pessoas e não para e pelo capital.
12. QUESTÕES URGENTES DO DESENVOLVIMENTO LOCAL: o Local e o Global como Panos de Fundo A globalização, como fenômeno econômico, nasce e se caracteriza com o movimento de valorização do capital financeiro em escala planetária. Suas origens remontam a Bretton Woods, em 1944, nos EUA, quando foram lançadas as bases do sistema financeiro internacional. Globalização continua sendo essencialmente vinculada ao mundo da economia e das finanças, permanecendo o desafio de sua irradiação nas demais dimensões da sociabilidade humana. Deve-se dizer, por isso, que local e global são a mesma coisa. Não há global sem local e vice-versa. A questão básica está ligada aos limites e desafios da participação cidadã em toda sua plenitude. A globalização geralmente é acusada de responsável pelas crises desafiadoras: crise do desenvolvimento, crise do estado, crise da dívida externa e da dívida pública, crise do setor público, crise do emprego. Sendo assim, e preciso que se foque as determinâncias do global sobre o local. O outro foco é compreender também que a globalização, para além dos seus fundamentos estruturantes, é um fenômeno sociológico, político e cultural. Se assim compreendida, abre-se um outro canal que é o que demonstra que o 20
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local afeta também o global. É incompleto entender a globalização como um fenômeno mundial que se aplica a diferentes realidades locais, forçando a sua adequação. É preciso usar lentes de aumento e perceber que também os fenômenos locais podem se universalizar segundo sua própria lógica, às vezes contraditória em relação a outras lógicas locais. A questão da produção de infraestruturas nas zonas urbanas e rurais. É preciso saber distribuir as competências no ordenamento dos territórios. No início do terceiro milênio os municípios em geral e os grandes centros urbanos enfrentam desafios cada vez mais complexos, devido à dinâmica demográfica, que
gera
aglomerações
mal
dimensionadas,
mudanças
sociais,
despovoamentos, e outros que desequilibram as estruturas territoriais. É indispensável, para atenuar os problemas, sobretudo pela evidenciação da cada vez maior ineficiência do estado no enfrentamento da questão social, a participação cívica organizada na tomada de decisões territoriais. A aplicação da Agenda 21, hoje esquecida e de outras estratégias, no processo de desenvolvimento local e territorial é cada vez mais decisiva. Sobretudo tendo em vista a questão da interdependência entre o urbano e o rural. A aplicação da Agenda 21 e outras estratégias equivalentes, em municípios e territórios é fundamental para criar condições de sustentabilidade ambiental. O desenvolvimento local está intimamente relacionado com a boa qualidade dos serviços públicos e sua gestão eficaz, o que abre condições de dinamização para as economias urbanas. A resolução dos problemas dos grandes centros urbanos passa pela criação de uma boa qualidade de vida nos pequenos e médios municípios e centros urbanos. As
melhorias
de
qualidade
nas
estruturas
locais
dependem
obrigatoriamente de uma ação política decidida e por um compromisso democrático. A importância da democratização do poder local é condição indispensável para o desenvolvimento social. É fundamental que se reforce a 21
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tese da autonomia do poder local, começando pela autonomia política e financeira. A importância das Associações Nacionais, Regionais e Estaduais de Municípios como interlocutoras nas questões do desenvolvimento do poder local é decisiva. Não nos moldes ainda predominantes, em que estão vinculadas aos condomínios do poder oligárquico. Assim, o desenvolvimento local e a sustentabilidade são eixos fundamentais para a reinvenção do urbano e das cidades. O local tornou-se condição
para
o
desenvolvimento
sustentável.
Das
quase
3.000
recomendações práticas da Agenda 21, que buscam responder o que seria necessário em nível global para reconciliar o desenvolvimento com o ambiente, mais de dois terços passam pelas mãos e cooperação dos governos e poderes locais. A ação local é chave para a sustentabilidade, ao lado da participação ativa da sociedade civil, sem o que não se desenvolvem satisfatoriamente as políticas públicas inclusivas e promotoras da equidade.
13. SÃO LUÍS: A VITÓRIA DA INCLUSÃO SUSTENTÁVEL Nos tempos de hoje, é unânime a convicção de que São Luís precisa de uma Nova Agenda de Desenvolvimento, que concilie, finalmente, as dimensões políticas, econômicas e sociais, convergindo em favor da inclusão e do desenvolvimento sustentável, espécie de Pacto Político de forças convergentes com o melhor interesse da cidadania. Uma tarefa urgente é a de buscar experiências bem-sucedidas, locais ou não, que minimizaram problemas crônicos de cidades, ou lhes deram coesão e vitalidade no seu enfrentamento: vale mencionar a vitoriosa experiência, sempre lembrada por Rossini Corrêa, da cidade de Medellín, Colômbia, antes associada ao cartel de drogas e a mais violenta do mundo e, após ter vencido o crime, é considerada uma das melhores cidades do mundo para se viver, vista também como a Cidade da Inovação. A experiência do empreendedorismo é 22
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tão marcante que tem sido alvo de análises por outras cidades, inclusive no Rio de Janeiro. Outra experiência interessante, embora de menor tamanho social, é a da Vila Arco-Íris, da Comunidade Kampung Pelangi, na Indonésia. Tratava-se de uma favela degradada, com todos os problemas inerentes de exclusão social e econômica, até que um diretor de escola propôs uma simples mudança para dar vida ao lugarejo: sugeriu pintar casas, paredes e telhados, escadas, becos de cores vibrantes e desenhos multicoloridos. O resultado de tanta cor: foi a atração de centenas de turistas, melhoramento da economia local, com famílias saindo da miséria graças às cores. Tudo isso pela pequena quantia de 29 mil dólares. O que pode fazer uma simples mão de tinta! Cabe aqui a lembrança da Teoria das Janelas Partidas, oriunda de pesquisa da Universidade de Stanford (EUA). Resumidamente: duas viaturas idênticas “abandonadas” uma em bairro pobre e outra em um bairro rico. A primeira foi vandalizada em poucas horas; a segunda, preservada. Contudo, tudo se modificou ao ser quebrado um vidro do veículo colocado no bairro rico: violência e vandalismo pontificaram de igual modo ao que ocorreu com o veículo do bairro pobre. Conclusão da pesquisa: não é a pobreza que é deletéria, mas algo que tem a ver com a psicologia humana nas suas relações sociais, indicando que o delito é maior nas zonas onde o descuido, a sujeira, a desordem e o maltrato são maiores. A ideia de deterioração quebra os códigos de convivência, de leis, de regras e induz ao “vale-tudo”. Isso tudo mostra claramente o cuidado que haveremos de ter com os espaços públicos, ruas, parques, estacionamentos etc., pois o descuido aqui pode ser fatal para a instalação da desordem, da violência e da insegurança. Se os parques e outros espaços públicos são deteriorados e progressivamente abandonados pela maioria das pessoas, estes espaços são progressivamente ocupados pelos delinquentes. 23
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Baseado na Teoria das Janelas Partidas foi aplicada em 1980 no metrô de Nova York, anteriormente lugar perigoso de transgressões de toda natureza; posteriormente, impulsionou a política que conhecemos como “Tolerância Zero” de Nova York, originalmente concebida para criar comunidades limpas e ordenadas, não permitindo transgressões à lei e às normas de convivência urbana. Embora tenha depois tomados rumos diferentes, a tolerância zero colocou Nova York na lista das cidades seguras. Quem já experimentou estar à frente da cidade de São Luís e dos seus desafios políticos, estruturais e administrativos sabe muito bem o drama que é desejar resolver as coisas e esbarrar na escassez de recursos e, portanto, na falta de condições materiais concretas que ensejariam suas soluções. Os estudos mais relevantes historicamente sobre o crescimento de São Luís sempre projetaram suas estratégias para uma cidade planejada para 300 mil habitantes. A mesma recebe a partir da década de 70 enormes contingentes de trabalhadores do campo que foram expulsos de suas terras pela grilagem desenfreada, comandada pelos que se intitulam donos do Maranhão, os mesmos que produziram a famigerada Lei de Terras, no limite, responsável pelo êxodo rural, ao entregar a preço de bananas e para a especulação financeira boa parte do nosso território aos grandes conglomerados empresariais nacionais e internacionais. O sentido do trabalho é o de democratizar a sociabilidade para melhor enfrentar os desafios e a crise instalada. Conversar com a cidade, com seus habitantes, convidá-los à participação efetiva na equação dos problemas e furar o cerco da contrapropaganda dos poderosos meios de comunicação dos seus adversários históricos. Nessa esteira, o trabalho também é o de restauração da autoestima da cidade, buscando nas suas raízes culturais a identidade do povo, com a realização de festivais de música e arte com o objetivo de promover uma troca 24
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cultural dos legados musicais e artísticos dos povos africanos,
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americanos e europeus (as etnias de nossa formação enquanto povo), ao tempo em que cuidamos de homenagear o turista com o singular modo de receber de sua gente e com a beleza ímpar do seu patrimônio histórico. Representam iniciativa de forte repercussão na geração de trabalho de parcelas expressivas de nossa população pela via da economia criativa; e forte apelo ao pagamento dos tributos municipais por parte dos contribuintes pela comprovação popular da materialização das obras. De nada adianta a luta desvinculada da conexão com nossas raízes. Só se constrói o novo reverenciando o passado, pois a nossa força enquanto povo não se origina das lutas dos contrários, mas do respeito à cultura ancestral. Essa é a arma do empoderamento popular. Munidos dela não alimentaremos o campo de energia que queremos mudar, mas reforçaremos o campo de consciência que devolva ao homem sua humanidade, e que aponte para o futuro emergente que todos desejamos. Algumas questões precisam ser de logo pautadas quando nos propomos a pensar São Luís sob a ótima de sua humanização, entre outras: - Releitura dos Planos de Desenvolvimento Urbano de São Luís, iniciando pelo elaborado por Palmério Cantanhede, no início do século XX, seguido da apreciação dos planos de Ruy Mesquita e Haroldo Tavares, por serem considerados exemplos históricos relevantes. Este exercício ligado à apreciação contemporânea dos exemplos relevantes poderá contribuir para a construção da Nova Agenda de São Luís. - A implantação de um novo complexo infraestrutural que possibilite a produção das bases de um urbanismo sustentável, com equidade de acessos. A falta de infraestrutura, de drenagens profundas, de habitação, de hospitais, de escolas, de legislação que pusesse freio ao acelerado e viciado processo de urbanização, em que os mais ricos impuseram normas de 25
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convivência sempre a favor do seu conforto, aproveitando-se do domínio oligárquico do território da Ilha, em que as leis, sob a tutela dos mais fortes economicamente, ao lado da falta de autonomia política somente conseguida em meados da década de 80, produziu uma cidade historicamente dependente da vontade dos que detinham – e detêm o poder político, e produziu uma imensa periferia, verdadeiras cidades dentro da Cidade,
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sobremaneira os custos de administração dos serviços públicos pela sua horizontalidade territorial, fruto da especulação imobiliária por parte dos privilegiados que seguraram por décadas os espaços não construídos no centro urbano. - Dinamização das Forças Produtivas Locais, adotando formas avançadas e criativas de reprodução e distribuição ampliadas. Ponto de partida para uma nova economia que eleve o emprego e a renda da sociedade inclusiva. - Definição de um novo Arranjo Institucional baseado no Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Integrado Sustentável. Garantir que as políticas públicas não percam a centralidade no desenvolvimento humano e na garantia de equidade, Apesar de ser relativamente recente a autonomia de São Luís, o poder público precisa avançar no sentido da auto-gestão e da eficiência. É preciso superar a síndrome da dependência. A dez passos do La Ravardière está o Palácio dos Leões que historicamente nomeou os seus interventores, com o falso nome de prefeitos, e ainda hoje exerce grande influência no desempenho da gestão municipal.
14. EMBLEMAS - O que fazer com Centro Histórico de São Luís? Continuar com a pálida política de restauração dos seus mais de 4.000 prédios tomados pelo governo estadual e pelo IPHAN, ou implementar uma nova visão de restauração de cidades históricas como faz Cuba, por quadra e com consultoria especializada 26
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de países que já superaram os seus desafios nesse mister? Além disso, por que não negociar legitimamente com os proprietários de prédios degradados a possibilidade de transacioná-los em feiras imobiliárias internacionais, sempre cuidando dos usos do interesse popular? - O que fazer com o Aterro do Bacanga? Talvez instalar ali a administração pública senão dos três níveis de governo, pelo menos do estadual e municipal. Com isso, revitalizaríamos o Centro Histórico hoje favelado e com perspectivas de perda do título de Patrimônio Histórico da Humanidade dado pela UNESCO. Largo espaço também para o turismo de entretenimento. Ideias que poderão fazer com que o cidadão ludovicence se apropria de espaço absolutamente nobre do ponto de vista urbano. - O que fazer do Sítio Santa Eulália? De propriedade dos servidores públicos estaduais (que nem sabem disso em sua grande maioria), mas entregue à devastação e ocupação temerária, quando pode ser transformado em espaço de paisagismo, de lazer, de convivência e de entretenimento da população, até mesmo multiplicando o patrimônio dos seus donos. Além do mais, à beira do Rio Anil, por quê não instalar ali o Museu do Mangue, já que o Maranhão possui extensas áreas contínuas dos manguezais brasileiros, sendo que São Luís já perdeu metade delas. - Parque do Diamante: até quando vamos conviver com a ação predatória dos moradores das áreas próximas, com o desmatamento, a degradação do seu patrimônio ecológico e a ocupação irregular desta nobre área, considerada a maior área verde ainda inserida no Centro de São Luís, para a qual até já se tem lei municipal de1989 como área non aedificandi, com o objetivo de proibir a construção de edificações no local, garantindo sua preservação. - Parque do Bom Menino: à espera de uma ação de transversalidade para ser ocupado pelo empreendedorismo de pequenos negócios, feira de trocas,
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inovações tecnológicas, plantas ornamentais, agricultura orgânica, espaço permanente de arte e cultura. - Fábrica Santa Amélia: hoje de propriedade do Município, com projeto executivo pronto para acolher a diversidade cultural da cidade, CIDADE DA CULTURA, com centro de convenções, museu das etnias, do bumba-meuboi e do patrimônio imaterial do Tambor de Crioula. - Museu de Arte Contemporânea: projeto de Niemeyer, já transformado em projeto executivo, pago com dinheiro público, a ser construído ao lado da Praça Maria Aragão com o objetivo de abrigar milhares de gravuras soterradas no Palácio do Governo. Projeto esquecido nos porões da burocracia pública. - Mercado Central: cartão postal de toda cidade que se propõe a receber turistas, com projeto pronto e jogado às traças, ponto central entre a reordenação urbana da Avenida Magalhães de Almeida e a Fábrica Santa Amélia (Cidade da Cultura).
Estes apontamentos não tem quaisquer preocupações com esmeros científicos, ideológicos ou partidários. Representam, isso sim, tão somente uma singela colaboração no sentido de estimular o diálogo entre as forças políticas, empresariais, trabalhadores, universidades, estudantes e organizações da sociedade civil que se preocupam com os destinos da cidade.
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PUBLICAÇÕES CIEP www.ciepp.org
LANÇADOS TSUJI, Tetsuo. O planejamento estratégico não é bicho papão. São Luís: CIEP, 2020. SANTOS, Aziz. Direito à Cidade: elementos para uma nova agenda urbana de São Luís. São Luís: CIEP, 2020.
PRÓXIMOS LANÇAMENTOS ALMADA, Jhonatan (org.), Palhano, Raimundo (coord.). Educação profissional para o desenvolvimento do Maranhão. São Luís: CIEP, 2020. ALMADA, Jhonatan, JABBOUR, Elias & PAULA, Luiz Fernando de (orgs.). Repensar o Brasil. Rio de Janeiro: CIEP, 2020. SANTOS, Aziz, PALHANO, Raimundo, ALMADA, Jhonatan. Futuro interrompido: projetos instituintes. São Luís: CIEP, Instituto Jackson Lago, 2020. RÊGO, Luiz. Cultura e educação. São Luís: CIEP, 2020 (Biblioteca Básica Maranhense-BBM, v. 5).
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