4 minute read

Primeira parede: Desintegração da mente

“Just as the world disintegrates, so does my mind.” - Desintegration of the mind - Peter Bjärgö9

A primeira etapa é tudo o que corresponde à parte teórica do meu trabalho. É tudo o que preciso saber do assunto, é tudo o que vem a partir dele em contexto escrito. Quando tive a ideia de criar um mundo para contextualizar essa série, comecei escrevendo um breve parágrafo sobre o que estava acontecendo, inicialmente pensando em retratar os monstros. Não demorou muito para que esse tema - apesar de vasto - diminuísse minhas opções.

Advertisement

O mundo não era para continuar na Era da Apoteose. Era tempo para a próxima era, porém as pessoas tentaram estender a vida da Estrela de Narubog e tudo foi corrompido.

Aqueles que sobreviveram pensaram: “Hey! Nós precisamos matar a estrela para que tudo volte a ser como era antes”, mas como alguém mata uma estrela morta-viva que corrompeu e absorve tudo?10

Até este momento eu tinha uma visão muito clara de que seriam desenhos escuros, muito influenciados pelo período gótico e por H.P. Lovecraft11. Então parei para pensar o motivo de querer esses elementos, principalmente o gótico. Porque não o breve momento da Art Nouveau? Ou o Japão durante o período Edo? Ou a Rússia no século XVIII? Porque,

9 Assim como o mundo se desintegra, o mesmo acontece com minha mente. (tradução minha) 10 Toda citação sem qualquer tipo de crédito ao autor foi escrita por mim. 11 Howard Phillips Lovecraft (1890-1937) foi um escritor americano que difundiu o horror cósmico como gênero literário. Considerado atualmente um dos maiores escritores de terror do século XX. (Wikipédia)

especificamente, arquitetura gótica? Essa pergunta estava me incomodando muito e eu não conseguia outra resposta além de “porque eu gosto, é a minha preferida”. Esta não é uma resposta que me agrada, já que me impede de explorar novos caminhos e experimentar. Então veio outra pergunta toda a minha vida é baseada em perguntas como já deu para perceber - e foi como uma luz no fim do túnel: e porque não o barroco mineiro?

A partir desta revelação milagrosa, as coisas começaram a caminhar num ritmo mais rápido. Sempre aparecem perguntas durante a pesquisa e eu tento respondê-las ao máximo sem ficar presa nelas. Muitas vezes são coisas que não interessam para a feitura do desenho, mas que me ajudam. Alguma dessas são fáceis, por exemplo:

“Isabela, não existe Nossa Senhora nem Jesus em Alviora, porque você está colocando a imagem dela e da cruz nas igrejas?”

Este tipo de questão é muito comum enquanto desenho e vão aparecendo coisas que entram em conflito com o mundo que criei e o nosso mundo, o que me força a parar o processo prático. Neste caso, pesquisei em várias mitologias (com enfoque na mitologia eslava) sobre entidades relacionadas à estrelas12 e o misticismo por trás tanto da prata13 quanto do número seis14. A partir de tudo isso nasceu outras cinco divindades, a forma como Narubog é representado, a Igreja das Seis Estrelas e como a religião afeta o que as pessoas vestem. Inclusive, é no momento que começo a me aprofundar na moda brasileira do século XIX, que se consolida o uso de elementos culturais brasileiros, especificamente elementos mineiros.

12 “(...) uma criança com braços até o cotovelo que eram de ouro sólido e pernas do quadril aos joelhos de prata. Estrelas juntas em volta de sua têmpora; de cada fio de cabelo em sua cabeça se pendurava uma pérola; a lua brilhava de suas costas, e o sol irradiava de seus olhos.” (Encyclopedia of Russian and Slavic myths and legends. Pág. 93) 13 A prata representa a energia lunar e a balança entre preto e branco. Simboliza pureza, força, clareza, foco e energia feminina. 14 O número seis representa amor incondicional, família, compaixão e empatia. Pode ter conotações negativas por conta da associação com o Diabo no cristianismo através do número 666.

Dúvidas mais complexas também aparecem e penso que elas são divertidas, dando mais contexto e realismo para Alviora, mas que, se eu fosse responder, levaria muito tempo de pesquisa. Nestes casos entra a suspensão de descrença em que a resposta é magia. Porque uma rocha prateada brilhante sustenta o mundo? Magia. Como tentaram manter essa coisa viva? Magia. Porque a corrupção existe? Magia.

É um processo demorado, que dá uma canseira e que, muitas das vezes, não serve para nada além de satisfazer minha curiosidade. Mesmo com esse pensamento, acho que além de me ajudar a dar mais riqueza e profundidade ao meu trabalho, esses nuances permitem que outras pessoas criem narrativas próprias com base no que eu apresentei.

This article is from: