8 minute read

O cara do café irrigado

Reportagem: Bruna O. Fernandes Bonin

Márcio Luiz de Carvalho, nasceu e foi criado na zona rural do município de São Domingos das Dores, interior de Minas Gerais. Herdou do pai, hoje com 90 anos de idade, a paixão pela cafeicultura, já que seu pai foi um dos primeiros cafeicultores da região.

Advertisement

Antes de ingressar na faculdade de agronomia, fez o curso de técnico agrícola na Escola Agrotécnica Federal de São João Evangelista, também no interior de Minas Gerais. Posteriormente ingressou na faculdade de agronomia, concluindo o curso de engenharia agronômica, no ano de 2002, pela Universidade Federal de Lavras.

Márcio é um profissional dedicado, utiliza todo seu conhecimento técnico na sua propriedade. Desde a concepção do projeto de irrigação, cálculos hidráulicos e a automação do sistema, tudo passa pelo criterioso controle técnico do engenheiro agrônomo.

Ele acompanhou de perto toda a instalação das tubulações, construção do reservatório, captação e bombeamento de água e equipamentos para o manejo tecnológico da irrigação.

Márcio gosta de tecnologia e faz questão de gerenciar tudo pelo celular, por isso conta com equipamentos modernos para saber com precisão a hora certa de irrigar. Com uma estação meteorológica própria, pode consultar dados climáticos da propriedade, que vão muito além do simples registro das chuvas.

Recentemente a empresa Galcon, instalou na propriedade do Márcio um sistema de monitoramento de solo, através de sondas estrategicamente posicionadas que permitem saber em tempo real as condições de umidade, temperatura e salinidade no perfil do solo. Com estas sondas é possível saber, por exemplo, se o solo se encontra encharcado, ou próximo da capacidade de campo ou se atingiu o ponto de murcha permanente, parâmetros fundamentais no manejo da irrigação.

Talvez você esteja pensando, mas este engenheiro entende de café? Pois bem, Márcio recebeu a Medalha de Mérito Cafeeiro no 46º Congresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras, em outubro de 2022, organizado pela Fundação Procafé, na cidade de Poços de Caldas, MG.

A homenagem é destinada para aqueles que contribuem para o desenvolvimento do setor agrícola, em especial a cafeicultura. O engenheiro agrônomo possui mais de dezoito trabalhos publicados e apresentados nos anais do Congresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras, além de participar como coautor de folhas tecnicas em diversos assuntos relacionado à cafeicultura.

Além disso, tem obtido altas produtividades em suas lavouras de café. O engenheiro agrônomo Rodrigo Vieira, especialista em projetos de irrigação na Codevasf de Juazeiro – BA, e também administrador do grupo de WhatsApp “Agricultura Irrigada”, comentou sobre o amigo Márcio de Carvalho: “Márcio é o técnico mais completo na irrigação, desde a topografia com RTK ao grão de café, passando pelos transientes hidráulicos com o software UFC. Ele é o cara do café irrigado”.

Para falar sobre a sua trajetória na cultura do café, o produtor, irrigante e engenheiro, concedeu uma entrevista para a Revista Irrigazine. Confira como Márcio Luiz de Carvalho aumentou sua produtividade de café e se tornou O CARA DO CAFÉ IRRIGADO.

Revista Irrigazine: Quando e onde começou a produzir o café irrigado?

O nosso projeto de cafeicultura irrigada no cerrado mineiro, mais precisamente em Presidente Olegário, foi iniciado em 2017. O que nos trouxe na região do cerrado foi a vontade de crescer mais no café.

Em 2014 começamos a andar pelas regiões do Brasil, como por exemplo: Bahia, São Paulo, Sul de Minas... procurando terras para investir no café. E, a região do cerrado mineiro foi a que nos chamou a atenção, então compramos as terras em sociedade com a família da minha esposa. A região de Presidente Olegário é muita rica na produção de muitos grãos, soja, feijão e principalmente o café. A propriedade possui 500ha de área total e planta 307 hectares (ha).

Por que a escolha da irrigação de gotejamento enterrado?

Logo tivemos o contato com a irrigação de gotejamento, até chegamos a pensar investir no pivô central, mas não era viável. Escolhemos o gotejamento uma vez que o consumo de água é menor e o manejo também. Em 2017 plantamos 56 ha, já em 2018 aumentamos a área em mais 56 ha e partimos para o gotejamento enterrado, uma tecnologia que veio para auxiliar muito no manejo do dia a dia. Um dos problemas do gotejamento comum no café, é que usamos muitas máquinas, então ocorre avarias nos tubos. Quando conhecemos o sistema de gotejamento enterrado tivemos inúmeras dúvidas. Mas, hoje todos os nossos projetos são feitos usando o gotejamento enterrado.

Como foi lidar com o bicho mineiro na lavoura de café?

No cerrado um dos grandes problemas que notamos logo nos primeiros meses do plantio, são as pragas: conhecido como o bicho mineiro (Leucoptera coffeella), que é considerado muito agressivo. Então, tivemos que aprender a conviver com ele. Quando a mariposa coloca seus ovos e eclode, vira uma larva e a larva entra na película da folha e forma uma mina e essa folha cai. O ataque é tão severo que você chega a perder 80% a 90% da folha, então a produtividade vai lá embaixo. Um dos grandes desafios foi aprender a conviver, não conseguimos controlar 100%, porque infelizmente é a região, mas usamos todos os defensivos registrados para a cultura.

Qual o desafio que encontrou na produção do café irrigado?

Um dos maiores desafios no cafeeiro foi realmente a praga que citei anteriormente. Pensando na conservação de solo e no manejo, passamos a fazer o manejo da braquiária ruziziensis nas entrelinhas do cafeeiro. Então, nós vimos uma grande vantagem no café e braquiária, já que ela é dominante, onde você planta não permite sair outras daninhas. A braquiária domina as daninhas e ela fica 100% na área, então trabalhamos com roçadas alternadas, essas roçadas alternadas têm vantagens na proteção do solo, pois mantém a umidade do solo por mais tempo, ou seja, toda água de chuva se infiltra no solo.

O café irrigado tem dados bons resultados?

Em relação a produtividade, estamos satisfeitos aqui no cerrado, com média das 3 primeiras safras de 69 sacas por hectare. E, esse ano na 4ª safra já temos uma carga pendente de mais 100 sacas por hectare, ou seja, a gente colhe ainda esse ano, então a nossa produtividade média está indo para 75 sacas, muito acima da media para a região do Cerrado Mineiro que é 35 sacas.

Como está sendo a fertirrigação neste sistema?

Com relação ao nosso sistema de irrigação: gotejamento enterrado. A região chove muito bem, mais de 1.400 mm de chuva, então não preciso irrigar o ano todo, principalmente em novembro, dezembro e janeiro. Então, nesse período eu faço uma adubação a lanço, em 60% a lanço no período chuvoso e 40% no gotejamento, então no gotejamento fazemos inserção de potássio, magnésio e entre outros. E, isso tem dado muito certo.

Qual é o manejo da irrigação que utiliza na cultura do café?

O nosso manejo na irrigação é feito de duas formas, temos uma estação meteorológica na fazenda, então realizamos o manejo baseado no clima. A estação me mostra temperatura máxima/mínima, umidade relativa e radiação solar. Através disso ela me dá o cálculo da evapotranspiração diária, então eu gero um balanço do que perdeu por evapotranspiração e reponho minha lâmina da irrigação baseada no clima. Recentemente instalamos uma sonda e ela mede a temperatura e umidade do solo. Em cima disso eu consigo calibrar melhor minha irrigação, então eu pego os dados do clima e da sonda e através disso consigo responder uma pergunta que todo o projeto de irrigação deveria saber: Quando e quanto irrigar. Esse é o complemento que todo irrigante deveria ter.

Explique um pouco sobre o terreiro que construiu na sua fazenda?

Dentro da fazenda nós construímos um terreiro de cimento para secar o café. O café quando vem da lavoura, passa pelo terreiro, para depois ir pra secadora. O terreiro tem uma dimensão de 16mil m² e construímos com as caídas voltadas para o centro para coletar água de chuva. Por exemplo, no ano passado choveu na fazenda 1.700mm e a coletamos mais de 28 milhões de litros de água e levamos para o reservatório para usar na irrigação. Então, nenhuma água é perdida.

Existe mais algum projeto que esteja à frente?

Tenho a hidroponia que surgiu pelo desejo de inovar e ter uma renda diversificada da cafeicultura. O projeto surgiu no ano de 2012 e fomos pioneiros na região. Minha esposa, Palma Lídia, que é advogada de forma ção, mas que não estava exercendo a profissão, entrou como administradora do projeto. Hoje já estamos há 11 anos no mercado, cultivando alface crespa, alface americana, alface roxa, rúcula e agrião.

Quais as vantagens da hidroponia?

A hidroponia possui inúmeras vantagens em comparação ao sistema convencional, dentre eles, consumo de água significativamente menor, uma vez que ela circula e é reutilizada, maior rendimento da área de cultivo, cultivo durante todo o ano, uso eficiente de nutrientes, menor utilização de pesticidas, melhor condição de trabalho para os colaboradores, já que a produção é em bancadas suspensas. Em compensação, podemos citar como desvantagem do cultivo no sistema hidropônico, o alto custo de implantação do projeto devido a necessidade de construção de estufas, mesas, bancadas, sistema hidráulico e elétrico.

This article is from: