Mario Quintana - CLB

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CADERNOS DE

LITERATURA B R A S I L E I R A

Mario Quintana INSTITUTO MOREIRA SALLES



FOLHA DE ROSTO, 4 MEMÓRIA SELETIVA, 8 CONFLUÊNCIAS Lya Luft, 20 Luis Fernando Verissimo, 22 Moacyr Scliar, 23 MARIO QUINTANA POR ELE MESMO, 28 GEOGRAFIA PESSOAL, 44 MANUSCRITOS/INÉDITOS, 70 ENSAIOS “Máquina de sentidos poéticos” – Fábio Lucas, 80 “Mario e a cidade” – Antonio Hohlfeldt, 89 “Quintana e a posteridade” – Carlos Nejar, 115 “O tradutor poeta” – Maria da Glória Bordini, 129 GUIA, 138


CADERNOS DE

LITERATURA B R A S I L E I R A

Diretor Editorial Editor Editor Assistente Ensaio Fotográfico Edição de Arte Assistentes Editoriais Assistentes de Produção

Antonio Fernando De Franceschi Manuel da Costa Pinto Michel Laub Edu Simões ˜ BEI Comunicação Acássia Correia, Flávio Cintra do Amaral e Helio Ponciano Carla Brandão, Cecília Harumi O. Niji, Fabiana Amorim e Priscila Oliveira

Colaboradores: Antonio Hohlfeldt, Carlos Nejar, Fábio Lucas, Luís Augusto Fischer, Luis Fernando Verissimo, Lya Luft, Maria da Glória Bordini, Moacyr Scliar, Paulo Becker

Foto de capa: Mario Quintana por Dulce Helfer

CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, número 25 – agosto de 2009


ISSN 1413-652X

CADERNOS DE

LITERATURA B R A S I L E I R A


Dulce Helfer


F O L H A D E R O S TO

Apontamentos de linguagem natural TRANSITANDO

ENTRE A FORMA TRADICIONAL DO SONETO E A REINVENÇÃO

DO DIALETO DOS FRAGMENTOS,

MARIO QUINTANA

RESUMIU AS TENDÊNCIAS

DA POESIA MODERNA BRASILEIRA NUMA OBRA DE RARA LEGIBILIDADE

Escritor que conseguiu o prodígio de expandir, como poucos na literatura brasileira, a recepção da poesia entre o grande público, Mario Quintana permanece um enigma em nossa cena cultural. Por trás da imagem de modéstia pessoal e de simplicidade estética que consagrou sua popularidade, existe uma obra de decifração complexa. Como teria o poeta se mantido equidistante de escolas e movimentos, das reivindicações das vanguardas, dos formalismos ou de sua obstinada recusa – tensão que atravessa o panorama de nossa literatura desde o modernismo – e ao mesmo tempo alcançado uma repercussão que o colocou ao largo da tendência da poesia moderna de cultivar searas excludentes de avaliação e leitura? Em suma, como e por que Quintana conquistou seu inequívoco prestígio sem recair no círculo de incomunicabilidade no qual permanecem até mesmo os grandes nomes da poesia modernista e contemporânea do Brasil? A simples existência dessa lírica – que concilia (e por isso desconcerta) a retomada da tradição do soneto e a invenção de gêneros próprios com igual excelência – já seria razão suficiente para incluir o escritor gaúcho no repertório dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA. Acrescenta-se aqui, de outra parte, um dado institucional de

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teor não menos relevante: a transferência do acervo de manuscritos e documentos de e sobre Mario Quintana para o IMS, acontecimento que permitirá a catalogação sistemática de seu legado e pesquisas sobre a gênese e a fortuna crítica de sua obra literária e jornalística. O fato de Quintana ter desenvolvido sua poética paralelamente à intensa atividade como cronista e tradutor, aliás, é uma das possíveis chaves interpretativas contempladas na presente edição dos CLB. Escritor que saiu da Alegrete natal para enraizar-se na capital gaúcha, o autor de Baú de espantos e Porta giratória assimilou duas tópicas da poesia moderna em geral e modernista em particular: o tema da cidade e uma dicção contaminada pela fala comum. De um lado, está a onipresença de Porto Alegre em seus livros, aclimatando o efeito de choque da metrópole moderna à oscilação entre a cidade antiga, onde “ainda é possível a visão lírica das coisas, a relação amorosa concretizada, a personalização”, e a megalópole na qual flagra, de maneira crítica e dramática, “a absoluta carência, o isolamento, o anonimato, enfim, a desumanização” – segundo palavras de Antonio Hohlfeldt em texto da seção “Ensaios”. De outro, uma escrita que viola os preceitos retóricos convencionais e utiliza o suporte do jornal, o formato da crônica, para criar com o leitor um vínculo que não é apenas comunicativo, mas de linguagem. Publicando de forma regular textos de caráter elíptico e especulativo, primeiramente na revista Província de São Pedro, da editora Globo de Porto Alegre, depois nas páginas do Correio do Povo, Quintana encontrou aí a plataforma para, a seu modo, reinventar em prosa e verso o mote modernista de uma linguagem que cobrisse o abismo entre o erudito e o popular, entre os registros culto e coloquial. Como salienta Fábio Lucas, também na seção “Ensaios”, “calcado (...) na capacidade de estruturar poemas de larga aceitação popular – pelo ritmo, pelo repertório vocabular, pela criação límpida e cadenciada do encantamento verbal, da superabundância oracular que os seus versos transmitem”, Quintana encontrara “o caminho certo da comunicação com o público brasileiro”. Esses dois aspectos são fundamentais para compreender sua inscrição, nem sempre evidente, na cena moderna – e aparecem também nas lembranças deixadas

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pela convivência com Quintana e pela leitura de seus textos, como o leitor desta edição dos CLB poderá constatar na seção “Confluências”. Nas memórias de Lya Luft, o poeta surge como “miragem caminhando pelas ruas de Porto Alegre”; e, na evocação de Moacyr Scliar, aquele “homem magrinho, encurvado, vestindo um terno surrado, sempre fumando seu cigarrinho e sempre sorrindo” renasce, como um passante baudelairiano, na praça da Alfândega ou na rua da Praia. E o homem da multidão, vagando anônimo pelas ruas da cidade como emblema da nova experiência proporcionada pela urbe, terá como contraponto (outra tópica modernista) a ironia e o humor, celebrados por um mestre no assunto – o cronista Luis Fernando Verissimo, também nas “Confluências”. Dessa conjunção de tendências que se reportam em permanente paradoxo – o sentido de pertencimento à cidade (ou à “gauchidade”), a linguagem atenta à banalidade e ao ridículo das pretensões tanto regionais quanto universalizantes, a referência às formas clássicas (do epigrama latino ao soneto simbolista) e a tirada humorística –, surge uma poesia cuja inalienável posteridade é vaticinada no ensaio de Carlos Nejar e pode ser fruída, em seu frescor original, na antologia de frases, reflexões e depoimentos da seção “Quintana por ele mesmo”. E se a tradução teve papel central na atividade de Quintana, como atestam o ensaio de Maria da Glória Bordini e a cronologia elaborada por Luís Augusto Fischer em “Memória seletiva” – tornando visível o poeta que no Caderno H evocou a figura do autor invisível como ideal de contemplação isenta do mundo pela ficção –, os “Manuscritos e inéditos” mostram, ao lado de esboços e documentos, um raro inédito de Quintana: o aforismo-manifesto “Do individual e do universal”, que se comunica com outros fragmentos do poeta e mostra um procedimento recorrente de implosão poética e reaproveitamento de seus estilhaços. Na “Geografia pessoal”, o fotógrafo Edu Simões registra os contrastes entre a Alegrete provinciana e uma Porto Alegre cuja paisagem encontra no hotel em que viveu o poeta – hoje transformado em Casa de Cultura Mario Quintana – um de seus lugares afetivos. Completa a edição de número 25 dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA um “Guia” com a bibliografia selecionada do autor de Preparativos de viagem, cuja obra não cessa de nos espantar.

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M E M Ó R I A S E L E T I VA

Viagem em linha reta “MEU DEUS, QUE MODO ESTRANHO DE CONTAR UMA VIDA!” Luís Augusto Fischer 1906 Em 30 de julho, num dia frio do inverno sulino, na cidade de Alegrete, nasce Mario de Miranda Quintana. A cidade, muito importante no oeste do Rio Grande do Sul, perto da fronteira com a Argentina, a 490 quilômetros de Porto Alegre, tem vastas fazendas de criação extensiva de gado. A família de Mario, porém, é totalmente urbana: seu pai é farmacêutico, e tanto o avô paterno quanto o materno são médicos. Mario é o terceiro filho do casal Celso de Oliveira Quinta na e Vir gí nia de Mi ran da Quintana: os dois primeiros são a irmã Marieta e o irmão Milton

(15 anos mais velho que Mario); depois nasceria Celso, o caçula. 1914 Tendo já aprendido a ler em casa – em 1912, ao que parece –, começa a frequentar escola regular, da professora Mimi Contino. Quintana mencionará como marcantes suas leituras do diário gaúcho Correio do Povo e da revista infantil Tico-tico, com histórias ilustradas, um grande sucesso editorial que começou a circular por aqueles anos no Brasil. Seu pai lê em francês para os filhos, enquanto a mãe lê em espanhol; daqui viria a intimidade do futuro poeta com essas línguas.

1919 Começa a estudar no Colégio Militar de Porto Alegre, instituição que a essa altura já tem uma larga tradição de ensino, funcionando desde meados do século XIX. A mudança é grande: não se trata apenas da nova condição de aluno em regime de internato, matriculado em colégio exigente, mas também da saída de sua terra natal para resi-

O pequeno Mario em 1908

Ao lado do irmão Celso (esq.) e da mãe Virgínia

Aos oito anos, com o cachorrinho Turri

Fotos: arquivo da família Quintana

1915 Passa a estudar em outra escola, a do professor Antônio Cabral Beirão, português, onde conclui o curso primário. Sua primeira leitura de livro foi As minas de prata, de José de Alencar.

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Arquivo da família Quintana

dir em Porto Alegre, a capital do Estado, cidade com atrativos culturais incontavelmente mais estimulantes, dotada de edifícios que são considerados “arranhacéus” fascinantes, conforme deixará registrado em crônica, no futuro. Seu primeiro ano no colégio é bastante bom: passa com boas notas em francês, português e aritmética, assim como em ginástica, mas apenas razoável em geometria e desenho (e também tem fraco desempenho em uma disciplina militar, a infantaria, sua menor nota do ano). 1920 Mesmo sem grande brilho no desempenho do ano anterior, é promovido a cabo de esquadra, o primeiro degrau das distinções. Mas, no decorrer do ano letivo, alguma coisa não anda bem, porque, quando chegam os exames finais, ele é reprovado em desenho e aprovado apenas com grau 4 (o menor possível) em português, aritmética e geografia. 1921 No começo do ano, prestando exames de segunda época (conforme o sistema daquele tempo, que permitia resgatar a reprovação do ano anterior), é reprovado em desenho. Em setembro, é desligado do colégio, a pedido do pai. Por esses anos da adolescência, devora Dostoiévski, indo contra as escolhas mais típicas de seus colegas, que preferiam Camilo Castelo Branco, Vargas Vila e Coelho Neto. 1922 No começo do ano escolar, Mario está matriculado nova-

O jovem Quintana no Colégio Militar de Porto Alegre

mente no Colégio Militar, no terceiro ano, ao que tudo indica tendo concluído o segundo em outro estabelecimento de ensino. Publica alguns poemas na Revista Hyloea, editada pelo grêmio de alunos da escola. Nenhum exemplar dessa revista é conhecido hoje; o arquivo do próprio colégio não o tem, em razão de um incêndio, nos anos 1950. Nos exames finais, segue sua rotina: é aprovado com 8 em francês, 9

7 em português e 4 em aritmética, mas é reprovado em álgebra e geografia. 1923 Nos exames de segunda época, prestados no mês de março, é reprovado em álgebra e aprovado com grau 5 em geografia. Mesmo assim, segue estudando no terceiro ano. Nesses anos de internato em Porto Alegre, frequenta a Biblioteca Pública, aos sábados, para


1927 Morre seu pai. Um poema seu é publicado na revista Para Todos, por iniciativa de Álvaro Moreyra, diretor da revista, um gaúcho que mora há tempos no Rio de Janeiro.

1924 Em janeiro, deixa o Colégio Militar, a pedido de seu pai, sem completar os estudos, que na época eram de seis anos. Nunca mais estudará sistematicamente, nem cursará qualquer carreira no ensino superior. Em pre ga-se na Li vra ria do Glo bo, ins ti tui ção ain da pe quena, mas que na década seguinte será uma potência editorial brasileira. O emprego, nesse momento, é modesto – desempacotador de livros estrangeiros, conforme lembraria anos mais tarde –, na condição de auxiliar de Mansueto Bernardi, poeta e editor.

1929 Volta a Porto Alegre, agora como redator do jornal O Estado do Rio Grande, dirigido por Raul Pilla, liderança política notável, parlamentarista numa terra de políticos em regra não apenas presidencialistas como também defensores de um Estado forte, como aliás é o caso de Getúlio Vargas, presidente da Província desde o ano anterior e futuro presidente do país. A entrada de Mario no jornal teria sido mediada por relações familiares, já que sua família era “maragata”, como o grupo político que sustenta o jornal. Sua carreira de redator nesse órgão de oposição política, conforme lembrará depois, não é muito bem-su ce di da: um dia, Pil la

1925 Retorna a Alegrete, passando a trabalhar na farmácia do pai, como “prático”, ou seja, ajudando na composição de fórmulas, mas sem ter formação técnica. A volta à cidade natal representa um passo atrás na vida do futuro poeta: tinha ido à capital para formar-se, prepararse para o futuro, talvez seguir alguma carreira tradicional, militar ou civil, mas retornara sem essas credenciais. 1926 Sua mãe falece. É premiado em um concurso de contos promovido pelo Diário de Notícias, então um importante jornal da capital gaúcha. O trabalho se chama “A sétima personagem”.

convoca-o para chamar-lhe a atenção, já que um dos títulos redigidos por Mario estava em franco desacordo com a linha política do veículo. Mario se lembrará disso evocando a pergunta feita pelo político: “Mas o senhor não lê os meus editoriais?”. E a resposta, honesta, foi negativa; Mario realmente não entendia nada de política, nem parecia esforçar-se para entender. Começa sua convivência com figuras jovens como ele, numa geração de talentos notáveis, como Augusto Meyer, poeta e crítico; Theo de mi ro Tos tes, tam bém poeta; Athos Damasceno Ferreira, poeta, historiador e romancista; Moysés Vellinho, crítico e historiador; Sotero Cosme e seu irmão Luís, ambos músicos (Sotero também artista plástico); e Erico Verissimo. 1930 Começa a colaborar com a Revista do Globo, publicação moderna, dinâmica, de leitura

Arquivo da família Quintana

ler suas predileções: novelistas russos, poetas simbolistas franceses e revistas de arte europeias. Nos exames finais, em dezembro, é mais uma vez reprovado em álgebra.

A farmácia do pai, Celso Quintana, em Alegrete 10


Reprodução do livro A Globo da rua da Praia, de José Otávio Bertaso

profissionais. Sabe-se que foram dezenas de livros traduzidos por ele, entre alta literatura e literatura da mais trivial; pouco mais de 30 levaram sua assinatura. É publicado seu primeiro poema no jornal em que viria a trabalhar por décadas, o Correio do Povo, de Porto Alegre. 1935 Nova temporada carioca: Quintana vai trabalhar na Gazeta de Notícias, permanecendo até o jornal fechar, pouco depois. Então, recebe convite profissional de Mansueto Bernardi, com quem já havia trabalhado na Globo e que então dirigia a Casa da Moeda, na capital federal; Quintana não aceita o convite e retorna para Porto Alegre, retomando definitivamente sua carreira de tradutor para a editora Globo. No Rio, conhece Cecília Meireles, para ele a máxima representação da poesia pura; em certo dia, encontra na rua Manuel Bandeira, outro que admira. Cecília Meireles teria publicado alguns poemas de Quintana

fácil, que teria uma vida longa (1929-1967) e seria em parte responsável pela ascensão da livraria e editora Globo. Apresenta-se como voluntário para lutar na Revolução em marcha, que leva Getúlio ao poder; alistado no Sétimo Batalhão de Caçadores de Porto Alegre, ruma para o Rio de Janeiro, onde permanece por seis meses. Seu batalhão foi utilizado em policiamento, e ele contou, anos depois, ter ficado encarregado do diário da tropa – foi, então, um redator de luxo. 1931 De volta à capital gaúcha, retoma o trabalho no jornal O Estado do Rio Grande até seu fechamento, em 1932, por ação política direta de Flores da Cunha, interventor estadual – o jornal tinha ficado ao lado dos revoltosos de São Paulo, contra Getúlio. 1934 Pela primeira vez é publicada uma tradução sua: Palavras e sangue, de Giovanni Papini, pela editora Globo, que começava sua arrancada nacional. Ao

autor italiano, ateu convertido ao catolicismo, que nos anos da Segunda Guerra ficaria marcado pela adesão ao fascismo, seguiram-se vários outros escritores no trabalho de tradução, do italiano, do espanhol, do inglês e, mais que tudo, do francês. Entre os mais conhecidos estão Virginia Woolf, Aldous Huxley, Somerset Maughan e Joseph Conrad, do inglês; e Voltaire, Guy de Maupassant, André Gide e Marcel Proust, do francês. (Proust ele pediu para traduzir, escalou-se para a tarefa, porque o admirava muito e queria ter certeza de um serviço bem-feito; em certo momento, era tal a sua minuciosa dedicação e a consequente demora na tarefa, que ele foi preterido numa rodada de aumento salarial, motivo por que chegou a pedir demissão. A propósito: também Voltaire traduziu por pedido próprio, por afinidade com esse antípoda de Proust.) Quintana tornou-se empregado da Globo para trabalhar em tempo integral como tradutor, formando uma banca invejável de 11

Reprodução

Jantar em homenagem ao teatrólogo Paschoal Carlos Magno (sentado no centro, ao lado do acordeonista); Quintana é o segundo em pé, a partir da esquerda, ao lado do escritor Guilhermino César (de terno cinza)

A escritora inglesa Virginia Woolf


Divulgação

na página literária do Diário de Notícias. 1938 Publica poemas na revista Ibirapuitã, editada em Alegrete. A revista granjeia alguns leitores para o poeta, ainda inédito em livro; um deles, Monteiro Lobato, chega a oferecer-se para editá-lo – num PS, pergunta e sugere: “Não tem já matéria desse gênero que dê para um livro? Se tem, é com prazer que me empenharei para que a editora Nacional o lance com todas as honras.” No corpo da carta a Quintana, diz:

O escritor e psiquiatra gaúcho Dyonélio Machado Que novidade eles [seus versos] no nosso mare magnum de poesias puramente sentimentais ou descritivas, sem uma sombra de ideia filosófica dentro! Cada conjunto de quatro versos seus constitui uma perfeita joia de forma e de filosofia da mais alta qualidade – a que paira no Olimpo do Humour.

Reprodução do livro A Globo da rua da Praia, de José Otávio Bertaso

1940 É publicado seu primeiro livro, pela Globo: A rua dos cata-

O editor Henrique Bertaso e o escritor Erico Verissimo na rua da Praia, em Porto Alegre, c. 1941

ventos, uma inesperada coleção de 35 sonetos. Sua fama como poeta já era sólida entre os amigos, mas só nesta publicação ele se dá a conhecer de fato; foi preciso certa pressão de amigos (Erico e Reynaldo Moura, além do irmão mais velho) para que Mario aceitasse imprimir sua obra. Os poemas são marcados por um lirismo singelo e por uma intensa referência à cidade de Porto Alegre, não a triunfante e progressista, mas a suburbana, delicada, ligeiramente passadista. Em crônica futura, o poeta lembrará que por esses anos de fato gostava de caminhar pela cidade, pegando um bonde e deixando-se levar até ao fim da linha, de onde retornava a pé, na companhia de algum amigo. Alguns contemporâneos são homenageados – Erico, Athos, Dyonélio Machado, escritores, ou Franz Pelichek, artista plástico tcheco que trabalhava na mesma Globo, como ilustrador –, e uns poucos poetas são citados como figuras de refe12

rência – particularmente Verlaine e António Nobre. O livro é dedicado aos irmãos Marieta e Milton e datado de Alegrete, 1938. 1945 Começa a publicar “Do Caderno H”, textos em geral curtos, elípticos, muitas vezes com temperamento de poemas, noutras vezes abertamente crônicas de atualidades, mas não raro lembranças e saudades, na revista Província de São Pedro, publicação de grande prestígio intelectual da Globo. Em texto futuro, dirá que o nome, “Do Caderno H”, nasceu de uma alusão à famosa hora decisiva: eram textos nascidos na hora H, em cima do prazo para entrega. Com esse título, publica apenas alguns textos na Província, porém serão centenas deles no futuro, por décadas, migrando para o jornal Correio do Povo. Parte dessa produção será mais tarde reunida em livro. 1946 Publica Canções, também pela Globo, com poemas metri-


Reprodução do livro A Globo da rua da Praia, de José Otávio Bertaso

grafadas, contendo um grande trecho de texto traduzido, voou pela janela da pensão em que vivia à época (o poeta saíra para beber, esquecendo do cuidado de fechar a janela). Quintana teria então dito a Henrique Bertaso, no dia seguinte: “Seu Henrique, a fugitiva fugiu pela janela”. A fugitiva é o título do volume em tradução, o sexto da série proustiana. 1950 Publica O aprendiz de feiticeiro, livro de poemas, pela editora Fronteira, de Porto Alegre. 1951 Publica Espelho mágico, coleção de poemas em forma de quarteto, pela editora Globo. 1953 Publica Inéditos e esparsos, pela editora Cadernos de Extremo Sul, Alegrete. Ingressa no jornal Correio do Povo, onde passa a publicar “Do caderno H”, até 1983.

Henrique Bertaso em seu escritório na editora Globo

1948 Publica Sapato florido, poesia e prosa poética; publica também O batalhão das letras, primeiro livro dedicado ao público infantil (em Sapato florido aparece uma personagem, Lili, que depois será protagonista de poemas infantis com o Anjo Malaquias, anjo criança que retorna em outros momentos).

Os dois livros saem pela Globo. Na Revista do Globo, publica “Pé de pilão”, poesia infantil que só sairia em livro em 1975. Está entre os fundadores do Clube de Cinema de Porto Alegre, instituição cultural de grande importância no Sul por décadas a fio, não apenas na divulgação da sétima arte, de que Mario era também um grande entusiasta, mas também na ativação cultural, em sentido amplo. Mario fre quen tou mui to o ci ne ma, mantendo paixões platônicas por algumas figuras, especialmente Greta Garbo. 1949 Durante a tradução de Proust, fonte de tão grande prazer que, dizia, poderia pagar para trabalhar, um pequeno incidente: parte das folhas datilo13

1957 Interna-se na clínica Pinel, em Porto Alegre, para tratar-se Reprodução

ficados e em verso livre; poemas melancólicos e meditativos ao lado de poemas com aspecto de crônica e de blague; alguns longos e outros bem curtos. Ao contrário do livro de estreia, aquela inusitada coleção de sonetos numa época em que ninguém mais os fazia, em Canções, Quintana mostra-se um poeta moderno, à vontade com qualquer regra de composição.

Capa de edição da Revista do Globo


do alcoolismo, doença que o acometeu por muitos anos. 1962 Sai pela editora Globo o vo lume Poe sias, reu nião das obras A rua dos cataventos, Canções, Sapato florido, Espelho mágico e O aprendiz de feiticeiro, edição patrocinada pela Divisão de Cultura da Secretaria Estadual de Educação do Rio Grande do Sul. Nessa década, não publica poemas novos, apenas antologias; é seu momento de reconhecimento, mais do que de conquista.

Arquivo da família Quintana

1966 Completa 60 anos. Sai sua primeira edição fora do Rio Grande do Sul, a Antologia poética, coletânea de poesia e outros trabalhos inéditos, organi-

zada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos, pela Editora do Autor, Rio de Janeiro. É o primeiro reconhecimento de peso para sua poesia, fora do Estado de origem. No dia 25 de agosto, o poeta é saudado na sessão da Academia Brasileira de Letras por Augusto Meyer, velho amigo porto-alegrense e um verdadeiro mestre para Quintana, e Manuel Bandeira, poeta com quem Mario tem várias afinidades de estilo, o qual recitou poema de sua autoria, batizado por um neologismo, “Quintanares”, os cantares de Quintana. Por essa antologia, recebe, em dezembro, o Prêmio Fernando Chinaglia para o “melhor livro do ano”.

Quintana e familiares no lançamento da Antologia poética (1966) 14

1967 Recebe o título de Cidadão Honorário de Porto Alegre, conferido pela Câmara de Vereadores, ocasião em que profere algumas palavras marcantes, irônicas, ligeiramente amargas, sempre agudas e antienfáticas: “Antes, ser poeta era um agravante, depois passou a ser uma atenuante, mas diante disso, vejo que ser poeta é agora uma credencial”. Passa a publicar a coluna “Do caderno H” no “Caderno de Sábado”, suplemento cultural do Correio do Povo, até 1980 (quando o jornal encerra suas atividades por algum tempo). 1968 O poeta é homenageado pela prefeitura de sua terra natal com placa em bronze na praça principal de cidade. É consultado sobre a frase que deve constar ali, para a eternidade, e Quintana, mantendo seu senso de humor amargo, dita as seguintes palavras: “Um engano em bronze é um engano eterno”. Morre Milton, seu irmão mais velho, grande incentivador de sua carreira literária. Começa a residir no Hotel Majes tic (onde per ma nece até 1980), imponente prédio com aspectos art nouveau no centro de Porto Alegre, cuja construção data da primeira década do século XX e que depois seria convertido em Casa de Cultura Mario Quintana. Publica seu maior sucesso na literatura para pequenos: Pé de pilão, poesia infanto-juvenil, pela editora Vozes, de Petrópolis, Rio de Janeiro. (Em 1975, o livro sairia em co-edição do Instituto Estadual do Livro com a editora


Edu Simões – IMS

novelas policiais, que ele devorava – e também suas recusas, suas antipatias em leitura, principalmente o francês Baudelaire, mas também os grandiloquentes Victor Hugo e Castro Alves, assim como o Concretismo. 1976 Ao completar 70 anos de idade, recebe a medalha Negrinho do Pastoreio, uma das mais altas distinções do governo do Rio Grande do Sul. Publica outro importante livro de poesia, Apontamentos de história sobrenatural, pela editora Globo, com apoio do Instituto Estadual do Livro. Publica Quintanares, antologia de sua poesia, que seria distribuída como brinde por uma agência de propaganda de grande importância na época, a MPM. Participa, como convidado especialíssimo, do álbum de humor 14 bis, editado pela Garatuja, de Porto Alegre, acompanhando vários cartunistas gaúchos, jovens ou experientes: o volume traz algumas de suas famosas “tiradas”, cheias de um humor cortante.

Garatuja, de Porto Alegre, ocasião em que conheceria um sucesso ainda mais significativo.) O livro viria a ser objeto de adaptações musicais e teatrais bastante conhecidas, nos anos vindouros. 1969 Um exemplo apenas para mostrar a atitude Quintana em relação aos fatos correntes da vida: a 20 de julho, quando na redação do Correio do Povo – e em toda parte –, todos assistiam emocionados à chegada do homem à Lua, o poeta compõe uma quadra, ao vivo: Todo astronauta que se preze Há de trazer pelo menos Um dos anéis de Saturno E uma camisa de Vênus.

Isso numa época em que “camisa de Vênus” era expressão quase pornográfica.

1973 Publicação do Caderno H, coletânea selecionada pelo autor a partir do vasto material que vem publicando já há anos, pela editora Globo. Por essa altura, pode-se afirmar que Quintana se tornou um sujeito famoso e popular em Porto Alegre, sendo reconhecido nas ruas. Nesse volume, aparece sua inapetência para com os críticos literários e de arte em geral, assim como suas preferências de leitura – em poesia de língua portuguesa, Tomás Antônio Gonzaga, Casimiro de Abreu, Guilherme de Almeida, Cesário Verde e também Catulo da Paixão Cearense, autor da proverbial canção Luar do sertão, quer dizer, todos líricos; entre os autores de outras línguas citados como referência aparecem Oscar Wilde, Ruben Darío, Laforgue, Verlaine, além de escritores de 15

Arquivo-Museu de Literatura da Fundação Casa de Rui Barbosa

Fachada atual da Livraria do Globo, em Porto Alegre

A partir da esquerda, Manuel Bandeira, Quintana e Carlos Drummond de Andrade no Rio de Janeiro dos anos 1950


Dulce Helfer

Mario Quintana em 1987, num dos quartos de hotel em que morou

1977 Sai A vaca e o hipogrifo, poemas em prosa pela editora Garatuja, de Porto Alegre. O livro Apontamentos de história sobrenatural ganha o Prêmio Pen Club de Poesia Brasileira. 1978 Morre sua irmã Marieta. Sua obra recebe uma edição paradidática na antologia Prosa & verso, pela Globo. Parte de sua produção sob o título genérico Caderno H é vertida para o inglês, na publicação Chew me up slowly, pela Globo, num trabalho de Maria da Glória Bordini e Diane Grosklaus. 1979 É publicado o livro Na volta da esquina, antologia de grande sucesso, quarto volume de uma coleção que circulou associada a um jornal diário, com edição RBS-editora Globo. Sai uma antologia de sua poesia em espanhol, Objetos perdidos y otros poemas, com tradução de Estela dos Santos e organização

de Santiago Kovadloff, pela Editorial Calicanto, Buenos Aires. 1980 Publica outro de seus grandes livros de poesia, Esconde ri jos do tem po, pe la L & PM Editores. Recebe o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra. Com Cecília Meireles, poeta de sua admiração desde muito tempo, Vinicius de Moraes e Henriqueta Lisboa, integra o sexto volume da coleção didática Para gostar de ler, da editora Ática, de São Paulo. Sua sobrinha-neta Elena monta o espetáculo A estrela e a sucata, com base em poemas de Quintana. Desse período em diante, ela será uma constante companhia do tio-avô. 1981 No dia 19 de março, é derrotado na eleição para uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, preterido por Eduar16

do Por tella, ex-mi nis tro da Educação do último presidente militar, João Figueiredo. Foi a pri meira de três der ro tas de Quintana, ele que era avesso a rapapés e a visitas de cortesia, mas que aceitou a candidatura como uma espécie de coroação de sua vida literária já avantajada. (Vale notar que essa candidatura ocorreu pouco depois de haver dito, em entrevista, que não se animava a solicitar votos para si, como era a praxe obrigatória.) Publica a Nova antologia poética, pela editora Codecri, do Rio de Janeiro, que era uma extensão do semanário O Pasquim, jornal de grande importância na que le mo men to po lí ti co e cultural do país, aliando cultura, oposição ao regime militar e humor. Retoma a publicação de “Do Caderno H”, no suplemento cultural “Letras & Livros”, do jornal Correio do Povo, numa fase que se encerrará em 1984, quando o veículo deixa de circular. A 9 de julho assiste à sua segunda derrota para uma cadeira na Academia, dessa vez perdendo para Orígenes Lessa, escritor paulista. Concorria à vaga, além dos dois, Lêdo Ivo. Participa da Jornada de Literatura em Passo Fundo como um dos primeiros homenageados por aquela que se tornaria um dos grandes eventos de literatura do Brasil nos anos vindouros. Recebe o Prêmio Jabuti de Personalidade Literária do Ano, concedido pela Câmara Brasileira do Livro.


Dulce Helfer

O poeta no Hotel Majestic, que abriga a Casa de Cultura Mario Quintana, no centro de Porto Alegre

1982 Em outubro, recebe o título de doutor honoris causa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre. Candidata-se pela terceira e última vez à Academia Brasileira de Letras, e perde mais uma vez. Em julho, quando da primeira rodada de votos, foi o mais votado (contra Carlos Castello Branco, jornalista político, o poeta Lêdo Ivo e outras figuras), mas não obteve maioria; em novembro, Castello Branco obtém os votos necessários à eleição, ficando Quintana em segundo lugar. Anos depois será convidado a candidatar-se, sem necessidade de fazer todo o périplo de visitas e agrados, mas então recusará. 1983 Através de lei promulgada em 8 de julho de 1983, o prédio do antigo Hotel Majestic, tombado como patrimônio histórico no ano anterior, passa a denominar-se Casa de Cultura Mario

Quintana. Desse hotel, Quintana foi hóspede de 1968 a 1980. Também nesse ano, Mario vai residir, por favor especial, no Hotel Royal, propriedade do ex-jogador de futebol Paulo Roberto Falcão; depois vai mudar-se para outro hotel, o Porto Alegre Residence, onde passará os últimos anos de sua vida. Publica Lili inventa o mundo, pela editora Mercado Aberto, de Porto Alegre. Ganha um volume na coleção Os melhores poemas, da Global Editora, de São Paulo, sob organização de Fausto Cunha. É lançada a Antologia poética de Mario Quintana, disco long-play, duplo, pela gravadora Phillips-Polygram, contendo mais de 100 poemas, todos lidos pelo autor. Algumas ilustrações musicais, com composição e execução de Geraldo Flach, Ayres Potthoff à flauta e Luis Fernando Verissimo ao sax (ele também assina a apresentação, na contracapa do disco). 17

1984 Publica Nariz de vidro, poesia infantil, com seleção de Mery Weiss, pela editora Moderna, de São Paulo. Sai a segunda edição do infantil O ba ta lhão das le tras, pela Globo. O sapo amarelo, novo livro infan til, é lan ça do (se le ção de Mery Weiss e ilustração de Marco Cena) e vem a ser o mais vendido na 30ª Feira do Livro de Porto Alegre. Publica, por algumas edições, a velha coluna “Do Caderno H” na revista semanal IstoÉ, no mesmo ano em que o tradicional Correio do Povo, para o qual contribuía, parou de circular (temporariamente). 1985 No dia 6 de maio, é atropelado, com consequências físicas bastante sérias (quebrou o fêmur esquerdo e precisou de cirurgia para colocação de prótese), perto da sede do jornal Correio do Povo, no centro de Porto Alegre. Faz até piada com o incidente: pediu que anotassem a placa do carro para jogar na loto. É escolhido patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, uma homenagem de grande alcance popular na cidade e no Estado gaúcho. Lança, pela editora Globo, três livros: Diário poético, agenda pessoal, de grande venda, em que a cada dia consta um pequeno texto de sua autoria – o poeta passa a ser lido, certamente, por uma legião de novos leitores, que talvez nunca, até então, tivessem entrado em contato com qualquer poeta; a Nova antologia


poética; e a antologia paradidática Primavera cruza o rio. Lançamento do álbum Quintana dos 8 aos 80, com organização de Tânia Carvalhal para a empresa Samrig.

declamava seu conhecido “Poeminho do contra”. No encarte, textos de Henrique Mann, Luis Fer nan do Ve ris si mo, Moacyr Scliar e Juarez Fonseca.

1987 Lança, pela editora Globo, Da preguiça como método de trabalho, outra coletânea de textos da série “Do Caderno H”, publicados no Correio do Povo. Publica pela mesma editora outro volume de prosa, Preparativos de viagem. É lançado Quintanares & cantares, um disco com patrocínio da Riocell: poemas musicados por Henrique Mann e interpretados por cantoras gaúchas (Glória Oliveira, Berê, Elaine Geisler, Suzana Maris e Marlene Pastro), acompanhadas pelo grupo Raiz de Pedra, com arranjos de Alfred Hülsberg; ao fim de cada canção, um locutor (Bira Valdez) recitava um pequeno poema, tendo ao fundo a Quarta sinfonia de Mahler, uma das preferidas do poeta em matéria de música erudita; ao final, o próprio autor

1988 Convidado a candidatar-se à Academia Brasileira de Letras, na vaga deixada por outro gaúcho, Vianna Moog, e nesse momento, ao que tudo indicava, com todas as chances de ser eleito, Mario prefere não aceitar. Pela editora Globo, publica Porta giratória, textos em prosa.

Dulce Helfer

1986 Completa 80 anos. Vê inaugurar-se a exposição Quintana dos 8 aos 80 anos, no Museu de Arte do Rio Grande do Sul. Lançamento da antologia 80 anos de poesia, organizada por Tânia Carvalhal, livro da editora Globo – empresa que, nesse ano, é vendida às Organizações Globo, mantendo o nome, mas transferindo seu comando, de Porto Alegre para o Rio de Janeiro. Publica Baú de espantos, pela editora Globo, com uma coletânea de poemas inéditos recentes que se somam a poemas igualmente inéditos, mas escritos entre os 12 e os 17 anos do poeta. Sai edição em quadrinhos de Pé de pilão, com desenhos de Cláudio Levitan, também responsável por musicar parte dos poemas do livro.

Recebe títulos de doutor honoris causa da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).

1989 Lança A cor do invisível, pela editora Globo. Outra casa editorial, a Ediouro, lança uma Antologia poética de Mario Quintana. Recebe outros dois títulos de doutor honoris causa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade Estadual de Campinas. É eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros, sucedendo a quatro outros poetas de grande público leitor, cada qual em sua época: Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, Olegário Mariano e Guilherme de Almeida. 1990 Pe la edi to ra Merca do Aberto, de Porto Alegre, publica Velório sem defunto. 1993 Lili inventa o mundo, outro texto infantil, é adaptado para o teatro por Dilmar Messias. No dia de seu aniversário, estreia o recital Quintanares, conjunto de 13 poemas musicados pelo compositor e maestro Gil de Roca Sales, executados pelo Madrigal Porto Alegre.

O poeta comemora seu aniversário de 80 anos 18


Ricardo André Frantz

a cada primavera a Feira do Livro de Porto Alegre. A estátua é de Xico Stockinger. 2008 Continuando uma sólida carreira póstuma, com várias encenações de seus textos infantis pelo Brasil afora e com a leitura continuada de sua obra poética e cronística, sai a edição do CD Pé de pilão, contendo músicas compostas por Cláudio Levitar, Vitor Ramil e Nico Nicolaievski, mais um libreto com desenhos de Levitan.

Luís Augusto Fischer é professor de Literatura Brasileira na UFRGS e escritor. Entre seus livros estão Machado e Borges (Editora Arquipélago, 2008) e, em colaboração com Sérgio Luís Fischer, Mário Quintana – Uma vida para a poesia (WS Editor, 2006).

FONTES

Escultura de Xico Stockinger em homenagem aos escritores Carlos Drummond de Andrade (em pé, com livro na mão) e Mario Quintana, na praça da Alfândega, Porto Alegre

1994 O Instituto Estadual do Livro do Rio Grande do Sul lança Cantando o imaginário do poeta, conjunto de poemas musicados pelo maestro Adroaldo Cauduro, regente do Coral da Casa de Cultura Mario Quintana. A editora FTD, de São Paulo, lança Sapato furado, derradeiro livro publicado em vida. A 5 de maio, no hospital Moinhos de Vento, morre o poeta, aos 88 anos. Seu velório e enterro co-

movem a cidade de Porto Alegre, em que viveu desde jovem e que cantou em tantos poemas. 1998 É lançado o álbum fotográfico Mario, trabalho de Dulce Helfer, com textos de Tabajara Ruas e Armindo Trevisan. 2001 É inaugurada a estátua de Mario Quintana com Carlos Drummond de Andrade, na praça da Alfândega, onde se realiza 19

FACHINELLI, Nelson. Mario Quintana, vida e obra. Porto Alegre: Bels, 1976. FISCHER, Luís Augusto e FISCHER, Sérgio Luís. Mario Quintana – Uma vida para a poesia. Porto Alegre: WS Editor, 2006. FONSECA, Juarez. Ora bolas – O humor de Ma rio Quin ta na. 4. ed. Por to Ale gre: L&PM, 2006. HELFER, Dulce, RUAS, Tabajara e TREVISAN, Armindo. Mario. Porto Alegre: s/ed. 1998. (Álbum fotográfico, com textos de Ruas e Trevisan). KANTER, Susana. “Cronologia da vida e obra de Mario Quintana”. In QUINTANA, Mario. Mario Quintana. 4. ed. Porto Alegre: Instituto Estadual do Livro, 1989. (Coleção Autores Gaúchos, vol. 6). Edição corrigida e aumentada, 2006. QUINTANA, Mario. Mario Quintana – Poesia completa. Organização, preparação de texto, prefácio e notas de Tania Carvalhal. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005. VAN STEEN, Edla. Viver & escrever, v. 1. Porto Alegre: L&PM, 1981. (Entrevista com Mario Quintana.)

Entrevistados para consultas de dados: Juarez Fonseca, jornalista Coronel Leonardo Araújo, professor do Colégio Militar de Porto Alegre Antonio Carlos Secchin, poeta e ensaísta


CONFLUÊNCIAS

Retratos do menino velho OU O FASCÍNIO DO POETA NA VISÃO DE TRÊS AMIGOS DILETOS: LYA LUFT, LUIS FERNANDO VERISSIMO E MOACYR SCLIAR

Divulgação

Gaúcha de Santa Cruz do Sul, Lya Luft nasceu em 1938 e formou-se em pedagogia e letras anglo-germânicas. Tradutora de clássicos como Virginia Woolf, Hermann Hesse e Thomas Mann, publicou seus primeiros poemas no livro Canções de limiar (1964) e estreou no conto em 1978, com Matéria do cotidiano. Autora dos romances As parceiras, A asa esquerda do anjo e O quarto fechado – nos quais a tônica dominante são as relações afetivas e familiares, com seus traumas, encontros e desencontros –, em 2003 Lya Luft lançou Perdas e danos, obra inclassificável, misturando memória, ensaio e ficção para tratar de temas como a infância, o amadurecimento e o aprendizado conjugal. Após esse livro de enorme repercussão, seguiram-se Pensar é transgredir (também de caráter memorialístico-ensaístico), as crônicas reunidas no volume Em outras palavras e o livro de contos O silêncio dos amantes, que marcou o retorno de Lya Luft à ficção.

Conheci Mario quando eu era muito jovem e ele, já famoso, acabava de sair de uma grave cri-

se. Magrinho, frágil, o sorriso maior do que a cara, a fumaça do eterno cigarro, na qual se perdiam seus pensamentos e se prenunciavam seus maravilhosos achados. Mario, como poeta, é uma das pessoas com quem emprego sem constrangimento o termo ‘maravilhoso’, porque sua poesia tem incontáveis achados quase miraculosos. Ou, em frases falsamente simples, nos apresenta o desafio, o mistério, um drama, algo para pensar durante dias ou anos. Tia Tula que nem olhava para trás... o renque de vozes na beira de um rio... o lenço cobrindo a cara, quando a dor nos derrubou nas lajes...

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Muitas epígrafes de livros que eu escreveria no futuro são versos dele. Inesquecíveis, quase assustadoramente complexos, quando muito de sua arte parece, a um olhar ingênuo, quase ingênuo também. Meus encontros com ele eram engraçados, porque por alguma razão ele gostava de mim, brincava com a cor de meus olhos, um dia me mandou um poema copiado na sua letra, no qual duas crianças sentavam-se juntas e havia uma alusão a olhos azuis. Comigo era meio paternal, no seu jeito de ogro. Certa vez lhe perguntei o que havia, afinal, na grande cômoda de seu quarto de solteirão. Foi numa fase em que a intrusão de alguém publicando coisas banais de sua intimidade o aborrecera muito. Perguntei, fazendo-me de sonsa, e ele respondeu, divertido, arregalando olhos e escancarando o sorriso: – Ah, naquelas gavetas estão as amadas mortas que estrangulei com suas próprias tranças! Ainda ouço sua risada metálica vendo minha reação, entre encantada e horrorizada. Rimos juntos, cúmplices como duas crianças fazendo suas artes. Algumas raras vezes, quando nos encontrávamos na redação do velho Correio do Povo, ele elogiava algum de meus principiantes poemas: nessas horas não era divertido, estava atento. Mas eu sempre desconfiava de que atrás das pálpebras meio cerradas e da fumaça do cigarro, ele se divertia com minha arrogância de publicar qualquer coisa que fosse. Lembro seu jeito de menino velho que conheceu profundo sofrimento e não acredita lá muito nas pessoas nem na vida, mas na sua arte, ah, essa sim. Sua história de vida é cheia de mistérios; seus sofrimentos o tornavam cada vez mais um bruxo das palavras e das metáforas, solitário no meio dos admiradores ou das crianças, escutando os passos de seus próprios fantasmas. Com palavras transfigurava isolamento, incompreensão, solidão e cansaço em pura beleza. Dramática e aguda, tantas vezes delicada, sempre tão impressionantemente humana. Conviver com ele – acho que ninguém realmente conviveu – não devia ser fácil. Mario, como pessoa, era bom a conta-gotas, enquanto durasse sua paciência e minha coragem. Nem todo mundo gostava de falar com ele, havia quem o achasse duro, sarcástico e evasivo. Minha visão dele talvez se confunda com a de sua poesia, mas sempre senti nele uma pungência de desperdiçada ternura e longas carências, que faziam dele a um tempo criança e mago, real e quase quimérico. Mario foi quase uma miragem caminhando pelas ruas de Porto Alegre, sonhando em seus quartos modestos, arquitetando poesia na sala de redação do jornal e expondo, com habilidades de psicanalista e brilho de poeta, nossas dores e encantamentos. Em sua poesia e sua pessoa, vemos que a arte foi o verdadeiro território, a casa, a amante, o exílio permanente do velho Bruxo que se chamou

Quintana.

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Sylvio Sirangelo

Nascido em Porto Alegre em 1936, Luis Fernando Verissimo deu início a sua carreira jornalística em 1967 e publicou suas primeiras crônicas no volume O popular (1973). Desde então, tornou-se um dos escritores mais prestigiados do país, com textos que mesclam humor e crítica social, publicados semanalmente nos jornais O Estado de S. Paulo, O Globo e Zero Hora. Filho do romancista Erico Verissimo, Luis Fernando também é autor de sucesso na narrativa longa, com os romances O clube dos anjos e Borges e os orangotangos eternos, entre outros. Criador de personagens que entraram no imaginário brasileiro, como o Analista de Bagé, o detetive Ed Mort e a Velhinha de Taubaté (e que deram origem a livros homônimos), suas crônicas estão reunidas em livros como As mentiras que os homens contam e Comédias da vida privada – adaptado para uma série da TV Globo.

Uma vez levei o Mario da nossa casa à casa do Josué Guimarães. Ele foi no banco de trás e na

hora de descer do carro teve alguma dificuldade. Quando finalmente conseguiu sair, comentou: – Como a gente tem pernas, né? Para chegar à porta da casa do Josué, subia-se por uma pequena escada sem corrimão que desafiava o equilíbrio do poeta. Ele frequentava muito a casa e descrevia a subida pela escada como repetidas tentativas de assassinato. O Mario gostava do Rio de Janeiro e sempre se hospedava no hotel Canadá, na Nossa Senhora de Copacabana. Mas dizia que o que mais gostava no Rio era entrar em túnel. – Pra descansar um pouco da paisagem – explicava. Outra do Mario: foi sentar-se numa cadeira onde havia um chapéu e todos em volta avisaram: – Mario, olha o chapéu! – Ah! – disse ele. – Pensei que fosse um gato. As consequências de sentar num gato seriam menos graves do que sentar num chapéu, para o poeta. O maior prazer do Mario era ficar num banco da praça da Alfândega durante a Feira do Livro, perto do local dos autógrafos. Fosse quem fosse que estivesse dando autógrafos, a demanda por autógrafos dele era sempre maior. E ele invariavelmente fazia uma cara de divertida surpresa a cada pedido. – Mas não sou eu quem estou dando autógrafos! Ele ia pouco à nossa casa, embora fosse amigo antigo do meu pai. No Natal, ganhava meias de lã feitas pela minha mãe. Todos os natais, meias de lã. Um dia, comentou:

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– A Mafalda deve achar que eu sou uma centopeia. Fazendo seus versos, o Mario foi um dos maiores poetas brasileiros de qualquer tempo. Fazendo suas frases e epigramas, foi um grande humorista, nem sempre reconhecido como tal. Sendo gente, foi

uma das pessoas mais fascinantes que conheci.

Edu Simões/IMS

Moacyr Scliar nasceu em Porto Alegre em 1937 e se tornou um dos grandes nomes da literatura brasileira contemporânea com uma obra que inclui romances como O centauro no jardim e A mulher que escreveu a Bíblia e volumes de contos como O carnaval dos animais e A orelha de Van Gogh. Formado em medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, especializou-se como sanitarista e fez pós-graduação em Israel. Com uma prosa marcada pelas origens familiares, pela memória e pelo humor da comunidade judaica de sua cidade natal, também lança mão de personagens reais para criar seus enredos, como acontece em Sonhos tropicais – cujo protagonista é o sanitarista Oswaldo Cruz – e A majestade do Xingu – baseado na vida do indigenista Noel Nutels. Autor de Saturno nos trópicos (ensaio no qual mostra como a melancolia aparece na cultura brasileira), Moacyr Scliar foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2003.

Mario Quintana era de Alegrete – do Alegrete, como costumam dizer os gaúchos, para quem a

cidade é motivo de orgulho. Histórico orgulho: o Alegrete que fica no sudoeste do Rio Grande do Sul, junto à fronteira com a Argentina, é o centro de uma região que os rio-grandenses, chefiados por Borges do Canto e Santos Pedroso, conquistaram a ferro e fogo aos espanhóis no começo do século XIX. As lutas se prolongaram por muitos anos; foram seguidas por guerras e revoluções, que consolidaram a fama da bravura alegretense. O que temos ali é o gaúcho típico: chapelão desabado, lenço ao pescoço, bombacha, botas, cavalgando seu corcel, corajoso e destemido, mas também generoso e hospitaleiro. Da ligação emocional dos gaúchos com o Alegrete dá testemunho o Canto alegretense, do tradicionalista Neto Fagundes:

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Não me perguntes onde fica o Alegrete segue o rumo do teu próprio coração cruzarás pela estrada algum ginete e ouvirás toque de gaita e violão. Prá quem chega de Rosário ao fim da tarde ou quem vem de Uruguaiana de manhã tem o sol como uma brasa que ainda arde mergulhado no rio Ibirapuitã. Ouve o canto gauchesco e brasileiro desta terra que eu amei desde guri. Em Alegrete, Mario Quintana não ficaria, contudo, muito tempo. Menino, veio para Porto Alegre estudar, como interno, no Colégio Militar. Retornou em 1925 para trabalhar na farmácia do pai, uma experiência a que ele atribuía o seu cuidado na ‘dosagem das palavras’: em farmácias também tinham trabalhado Carlos Drummond de Andrade e Erico Verissimo, ‘que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.’ Influenciado talvez pelo seu passado alegretense e por sua passagem pelo ensino militar, Mario teve uma breve experiência guerreira: em 1930, entusiasmado com a revolução liderada pelo conterrâneo Getúlio Vargas, alistou-se como voluntário no Sétimo Batalhão de Caçadores de Porto Alegre. O movimento foi vitorioso; culminou com a chegada dos gaúchos ao Rio de Janeiro e com a cena famosa em que amarraram seus cavalos no obelisco da avenida Rio Branco. Mas isto foi, a rigor, um interlúdio em sua vida pacata, a vida que ele passou quase toda em Porto Alegre. Como Erico Verissimo, aliás, que, nascido em Cruz Alta, estudou em Porto Alegre, voltou para sua cidade natal, mas acabou radicando-se na capital gaúcha, cenário de muitos de seus romances. Como Erico, Mario enveredou pelo caminho das letras; ambos trabalharam na editora Globo, então uma das maiores do país. Mario foi tradutor, foi cronista de jornal, mas foi, sobretudo, escritor e poeta. E assim como aconteceu com Erico, sua identificação com Porto Alegre aparece em vários dos poemas e das crônicas que escreveu. Exemplo é o comovente ‘O mapa’, que figura em Apontamentos de história sobrenatural: Olho o mapa da cidade Como quem examinasse A anatomia de um corpo... (É nem que fosse o meu corpo!)

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Sinto uma dor infinita Das ruas de Porto Alegre Onde jamais passarei... Há tanta esquina esquisita, Tanta nuança de paredes, Há tanta moça bonita Nas ruas que não andei (E há uma rua encantada Que nem em sonhos sonhei...) Quando eu for, um dia desses, Poeira ou folha levada No vento da madrugada, Serei um pouco do nada Invisível, delicioso Que faz com que o teu ar Pareça mais um olhar, Suave mistério amoroso, Cidade de meu andar (Deste já tão longo andar!) E talvez de meu repouso... É de uma cidade mítica, poética, transfigurada que o poeta nos fala, uma cidade feita de sonhos e de fantasias. Mas existe também a cidade real, de cuja paisagem urbana Mario era parte integrante, a ponto de se tornar um personagem típico, folclórico quase. Trabalhando no jornal Correio do Povo, que ficava bem no centro da cidade, era sempre visto na tradicional praça da Alfândega ou na rua da Praia: um homem magrinho, encurvado, vestindo um terno surrado, sempre fumando seu cigarrinho e sempre sorrindo. A imagem, que obviamente pouco tinha a ver com a do gaúcho típico, era, contudo, inteiramente compatível com o tipo de pessoa que Mario era: um homem reservado, com fama de tímido. Fama que ele contestava: ‘Não sou tímido’, dizia, ‘sou é caladão, introspectivo’. O que ele, entre parênteses, achava muito natural: ‘Não sei por que sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros?’

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Tímido ou calado, Mario era a gentileza em pessoa. Diáfano, tinha algo do Anjo Malaquias, personagem de seus livros infantis. Aliás, cada vez que lançava um desses livros, a fila de crianças em busca de autógrafos era enorme, mostrando que nem sempre ele era ‘caladão, introspectivo’. Tinha muitos amigos, entre eles os escritores Sergio Faraco e Josué Guimarães. Na casa de Josué e Nídia, Mario era uma presença constante. A sobrinha de Mario, Helena Quintana, ajudava-o a organizar sua vida, o que certamente não era tarefa fácil. Solteirão, Mario morava no tradicional Hotel Majestic, também localizado no centro. Desativado, o hotel foi tombado como patrimônio histórico do Estado em 1982; ali funciona hoje a Casa de Cultura Mario Quintana. A projeção nacional de Mario era indiscutível. Não é de admirar, portanto, o lançamento de sua candidatura à Academia Brasileira de Letras, com a qual, segundo disse o próprio Quintana em entrevista ao jornal O Norte, sempre mantivera boas relações. Em 25 de agosto de 1966, ao completar 60 anos, fora saudado na ABL por Augusto Meyer e por Manuel Bandeira; este último recitou então o famoso poema, ‘Quintanares’: Meu Quintana, os teus cantares não são, Quintana, cantares: são, Quintana, quintanares. Quinta-essência de cantares... Insólitos, singulares... Cantares? Não! Quintanares! Mais adiante recebeu, pelo conjunto de sua obra, o Prêmio Machado de Assis, o mais importante dos galardões concedidos pela Academia. Mas, ‘na verdade, eu nunca quis pertencer à Academia’, diz ele na mencionada entrevista, atribuindo sua candidatura à pressão dos conterrâneos que queriam ver mais um gaúcho na casa de Machado de Assis. A entrada na

ABL

que, nesse ponto, como em outros, segue a

tradição da Academia Francesa, faz-se por eleição, o que exige do candidato certa disposição pessoal, disposição esta que Mario, até por temperamento, não tinha. Foi derrotado duas vezes, em ambas por adversários de grande prestígio intelectual. A propósito, não se tratava de nenhuma exceção; vários membros da ABL

tiveram de enfrentar numerosas eleições antes de entrar. Numa terceira vez a sua eleição estaria prati-

camente garantida, mas então era ele quem não queria mais concorrer. Ao contrário do que se pensa, o ‘Poeminho do contra’ (‘Todos esses que aí estão/ Atravancando meu caminho/ Eles passarão.../ Eu, passarinho.’), muito citado então, não foi escrito como resposta ao resultado do pleito na Academia. A não-eleição de Mario representou um trauma para o Rio Grande do Sul, Estado que tem um sentimento de identidade muito forte. Anos depois, a Associação Rio-Grandense de Imprensa, que

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congrega os jornalistas gaúchos, desencadeou um movimento para, de novo, colocar mais um gaúcho na ABL,

além do poeta Carlos Nejar. Meu nome foi então cogitado. Como Quintana, resisti, mas, como ele,

acabei cedendo. Só que a urna me foi mais favorável e, em 2003, eu ingressava na Academia, lembrando, em meu discurso, o poeta. Talvez Mario não recusasse uma vaga na Academia, mas uma coisa certamente não lhe interessava: a suposta imortalidade dos acadêmicos. Imortalidade que, aliás, não representa uma promessa formal da instituição, cuja divisa diz apenas ‘Ad imortalitatem (Rumo à imortalidade)’. Não se trata, pois, de uma garantia, mas o qualificativo de ‘imortal’ corresponde, no fundo, a uma secreta aspiração de cada pessoa; inevitavelmente temos de lidar com o temor da morte. Um temor que Mario parecia não compartilhar. Recomendou: Amigos, não consultem os relógios quando um dia me for de vossas vidas... Porque o tempo é uma invenção da morte: não o conhece a vida – a verdadeira – em que basta um momento de poesia para nos dar a eternidade inteira. E acrescentou: ‘A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos’. Esse humor, que não negava – ao contrário, completava – o lirismo, é que fez de Mario Quintana um poeta amado pelos porto-alegrenses, pelos gaúchos, pelos brasileiros. Por ruas encantadas, por ruas que nem em sonhos sonhamos, ele nos leva com a magia de seus versos. Vale a pena trilhar seus ca-

minhos. Desse passeio, saímos confortados e engrandecidos como seres humanos.

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Dulce Helfer


M A R I O Q U I N TA N A P O R E L E M E S M O

Balão cativo Tal é a variedade de frases e reflexões criadas por Mario Quintana que não seria inadequado supor ter sido ele o criador de uma nova forma para uso próprio, algo entre confissão e aforismo, leveza e despojamento, humor e compaixão. Forma (ou estilo?) que permitia ao poeta verbalizar esse algo com absoluta naturalidade, como no aforismo “Receita”, do livro Porta giratória, para ficarmos num exemplo canônico: “No dia em que estiveres muito cheio de incomodações, imagina que morreste anteontem... Confessa: tudo aquilo teria mesmo tanta importância?” – fragmento de prosa em que a densidade se esvai, deliberadamente, em nome da compreensão de uma verdade profunda e ao mesmo tempo palmar. Escritor sempre cônscio da tradição literária – mas que, avesso a ostentar erudição, preferia ocultar seu repertório –, é de se supor que Quintana tivesse pleno domínio da historicidade das formas breves. Ao ler livros como A vaca e o hipogrifo e, sobretudo, o florilégio de máximas contidas no Caderno H, encontramos um autor que vai buscar tanto nos epigramas e adágios antigos quanto na linhagem dos moralistes franceses uma forma sentenciosa que rivaliza em importância com sua versificação. E se essa fonte clássica contrasta com o tom desabrido de suas reflexões, é talvez porque o poeta se inscreve igualmente na tradição brasileira da crônica, de um lirismo ao rés do chão coerente com a vida à la carte que ele, aforista em tempo integral, celebrava também em suas entrevistas: “Só sou metódico no horário de trabalho. Tenho uma certa tendência a me evadir, mas sempre faço um esforço por manter-me na terra – como um balão cativo”. Aqui, a meditação sobre o impulso de evadir-se desdobra a reflexão inicial sobre seu método não metódico de trabalho para, ao final, empregar a imagem poderosa do “balão cativo” (extraída de Pedro Nava), num instantâneo das tensões entre dispersão e arraigamento, espontaneidade e obstinação, que imantam sua poética. Esse mesmo poder de síntese – que em outro momento leva Quintana a comparar a singela limpidez da fórmula que preparava na farmácia paterna a um “sol engarrafado” – seria o segredo da profunda comunicabilidade do autor, da empatia suscitada por suas “confissões” sinceras? É com a simplicidade da sabedoria que Quintana se apresenta nas páginas a seguir, revelando-se de corpo inteiro, do infante enfermiço de Alegrete ao jovem aprendiz de farmacêutico – inesperados antecedentes do insanável portador de uma modéstia angustiada e sincera, que mais tarde inscreveria seu nome entre os maiores poetas líricos da literatura brasileira. 29


Infância

era impossível. Mas como convencer uma criança da irreversibilidade do tempo? Antes mesmo de Einstein, qualquer criança sempre soube que o tempo é relativo. Cronologia em linha reta é convenção. Não é verdade que o poeta vive todas as idades ao mesmo tempo?”

“Tive uma infância muito presa, devido à precariedade da saúde, quando pude soltei-me no mundo. Um choque. Fui criado num aviário e solto num potreiro. Daí talvez a explicação da minha posterior e prolongada boemia. Fui um menino doente, por trás da janela. Creio que foi a ele que dediquei depois um soneto de A rua dos cataventos.”

(“60 anos de líricos quintanares”. Visão. São Paulo, 19.08.1966)

(“O mago da arte em verso e prosa”. Notícias Agrale. Caxias do Sul, n. 52, out. 1989, p. 4)

“Quando estava no Colégio Militar (em Porto Alegre) só estudava português, francês e história. O resto absolutamente não me interessava. Era sempre reprovado em matemática porque só assinava as provas. Afinal de contas, o que eu tinha de ver com a raiz quadrada e outras bobagens? E a raiz cúbica, então? O estudo da álgebra, sim, é interessante. A gente lida com letrinhas.”

“Eu fui um menino por trás de uma vidraça – um menino de aquário. Via o mundo passar como numa tela cinematográfica, mas que repetia sempre as mesmas coisas, as mesmas personagens. Tudo tão chato que o desenrolar da rua acabava me parecendo apenas em preto e branco, como nos filmes daquele tempo.”

(Recorte de jornal. – Fonte: Arquivo da família Quintana)

(“Quintana, 85 anos de poesia”, por Nóris Eunice Pureza Duarte. Diário Popular, Pelotas, 01.08.1991)

“Triste de quem não conserva nenhum vestígio da infância...”

“Quando criança, queria ser pajem medieval – outra época não me servia. Os grandes me explicavam que

Dulce Helfer

(“Incompletude”. In Porta giratória, 2. ed. São Paulo: Globo, 2007, p. 128)

Ficção e confissão

“A minha biografia está implícita nos meus poemas. Toda confissão não transfigurada pela arte é uma falta de linha, uma presunção. O que é que os outros têm a ver com isso?” (“Incomoda quando ninguém se preocupa comigo”, por Ney Gastal. Recorte de jornal. Fonte: Arquivo da família Quintana)

“Saberá mesmo um poeta em que consiste essa espécie de força oculta que o faz poetar? Ele não tem culpa de ser poeta; portanto, não tem do que se desculpar ou explicar. Se eu conheço algum segredo é o da sinceridade, 30


O primeiro livro (lido)

não escrevo uma vírgula que não seja confessional. Esse desejo insopitável de expressar o que tem dentro de si é o mesmo que leva o crente ao confessionário e o incréu ao divã do analista. O poeta prescinde de ambas as coisas, e os que não são poetas, mas gostam de poesia, desafogam a si mesmos através dos poemas que leem: porque na verdade vos digo que não é o leitor que descobre o seu poeta, mas o poeta que descobre o seu leitor.”

“As minas de prata, de José de Alencar. Só o primeiro volume, o outro eu não o tinha à mão. Essa insatisfação inicial do meu primeiro contato com a literatura deu uma feição curiosa à minha maneira de ser nessa matéria, fato, todavia, que não interessa ao público em geral e por isso deixa de ser aqui explanado.” (“Panorama de uma geração”. In Porta giratória, pp. 182-183)

(“A poesia”. In Porta giratória, p. 21)

“Quando o camarada faz uma coisa cavada, por encomenda, não dá. Tem que ser um sentimento absolutamente sincero. Se não sentir nada, não deve escrever. Eu tenho tido períodos de deserto. Não vem nada e eu não escrevo. Digo: ‘Puxa, a lagoa secou e só ficou o jacaré’. Mas depois, de repente, vem aquela coisa, aquele relâmpago, aquele flapt, o santo baixa. Mas a gente não pode se fiar só no santo. A gente tem que ajudar o santo, que puxá-lo pelos pés. O Paul Valéry, poeta francês, dizia a mesma coisa de outro jeito: que os deuses nos dão o primeiro verso, os outros a gente tem que arranjar. Às vezes, o poema sai pronto. Fiz um soneto que é dos meus sonetos mais apreciados, inteiramente clássico com a mesma rima nos quartetos, numa noite de insônia, sem papel, sem sono, no escuro. Quando acordei, eu disse: ‘Olha, acho que fiz um soneto’.”

O primeiro livro (escrito)

“Não consigo lembrar. Comecei a fazer versos logo que aprendi a ler. O poema decerto não prestava. Mas um poema de um menino-poeta é sempre o melhor poema do mundo. Não deixo por menos. Pois é o primeiro e deslumbrado encontro de uma alma com a poesia.” (“O mago da arte em verso e prosa”. Notícias Agrale. Caxias do Sul, n. 52, out. 1989, p. 3)

A cidade e as serras

“Um lugar só é bom quando a gente pode fugir para outro lugar. Não compreendo esses grandes hotéis sozinhos no meio da mata, sob a alegação do clima, da natureza... A natureza é chata como um cartão-postal em tamanho natural. Nós somos os promíscuos habitantes da cidade. A cidade é que é a nossa verdadeira natureza. Com incômodos, sim, mas muito mais variados que os da natureza propriamente dita. E a minha volúpia que mais se aproxima da primitiva natureza é andar sem sapatos alta noite, entre o quarto e o banheiro, pelos corredores do prédio onde resido.”

(“A poesia é uma maneira de falar sozinho”, por Patrícia Bias. Leia. São Paulo, out. 1985)

“Poeta lírico, falo do meu eu, nos poemas, como ser humano. Mas acho incorreto estar falando sobre minha pessoa. Creio que a minha vida íntima nem a mim interessa. Quando a gente fala sobre si mesmo é para se gabar ou para se queixar. No primeiro caso, ainda passa. Mas, no segundo, ninguém gosta de despertar piedade.”

(“O citadino”. In Porta giratória, p. 51)

(“O poeta por ele mesmo”, por Manoela Sawitzki. Aplauso. Porto Alegre, n. 83, 2007, p. 40)

“A cidade é uma coisa que conhece a gente. Por exemplo, é claro, quando eu ando em Porto Alegre, 31


Dulce Helfer

as casas antigas me reconhecem quando eu passo. Mas as casas novas não sabem quem sou. Eu sempre fui citadino. Acho que, se a vida das cidades enlouquece, a dos campos embrutece.” (“Ouvindo Quintana minha alma assovia e chupa cana”, por Alice Ruiz. Bric a Brac. Brasília, n. 91, 1990, p. 94)

“O encanto das viagens está na própria viagem: a partida e a chegada são meras interrupções num velho sonho atávico de nomadismo.” (“Das viagens”. In Porta giratória, p. 152)

Farda, fardão, camisola de dormir

“Entrar para uma Academia de Letras tem algo de hipocrisia, pois o cara é logo obrigado a pronunciar, no discurso de recepção, o ‘elogio’ de seu antecessor. E o pior é quando ele é honesto e sente-se na obrigação de ler de fio a pavio as obras completas do falecido. Além disso, o acadêmico comete um meio suicídio, dedicando metade da vida a solenidades e rapapés, quando poderia empregá-la toda no silêncio e no recolhimento da criação literária.”

experimentamos o benéfico efeito do primeiro cigarro, da primeira solene tragada, da primeira e triunfal baforada. Porque – como um reflexo daqueles nossos inquietos e felizes anos de tabus e transgressões – ainda agora a gente se sente mais homem de cada vez que acende um cigarro... (...) E, depois, se já existe, neste mundo cão, a Cortina de Ferro e a Cortina de Bambu, por que não erguemos também, para uso íntimo e particular, uma intransponível Cortina de Fumaça?”

(“Academias”. Idem, p. 56)

“Todas as academias são uma espécie de sociedades recreativas e funerárias...”

(“Fumar ou não fumar”. In Porta giratória, p. 65)

(“O mago da arte em verso e prosa”. Notícias Agrale. Caxias do Sul, n. 52, out. 1989, p. 4)

Elogio da rasura e do método

“O laconismo é a decência do estilo.” (“Incomoda quando ninguém se preocupa comigo”, por Ney Gastal. Recorte de jornal. Fonte: Arquivo da família Quintana)

Cortina de fumaça

“Proibiam-nos fumar quando meninos, o que, como todos nós sabemos, não adiantava nada... Antes pelo contrário! E, apesar de toda a campanha que atualmente se tem feito contra os malefícios do fumo, até hoje

“Cortar, cortar sempre, meu único processo. E qualquer dia destes publico mais uma edição de 32


“Sempre me preocupou o mistério das palavras. Ao escrever, estou mais me perguntando do que respondendo algo. Nunca cheguei a uma resposta, felizmente, porque, se chegasse a uma certeza sobre a poesia ou as outras coisas, estaria morto. Como diz um dos grandes ‘magros’ da nossa poesia, Augusto Meyer, ‘a certeza faz engordar’. Dou como exemplo desta verdade são Tomás de Aquino, tão gordo que sentava numa cadeira especial onde acumulava toda a sua fé inabalável e ortodoxa da Suma teológica!”

minhas obras com a indicação seguinte: NOVA EDIÇÃO, CORRETA E DIMINUÍDA.” (“Cortar”. In Porta giratória, p. 74)

“O leitor ideal para o cronista seria aquele a quem bastasse uma frase. Uma frase? Que digo? Uma palavra!” (“O leitor ideal”. Idem, p. 74)

(“75 anos sem qualquer susto”, por Antonio Hohlfeldt. Correio do Povo, Porto Alegre, 1981)

“Eu não lutei com dificuldades, lutei comigo mesmo. Eu sempre trabalhei muito um poema. Eu lembro sempre aquela passagem da Bíblia, da luta de Jacó com o anjo. Lá pelas tantas Jacó começou a lutar com o anjo e dizia: ‘Não te largarei até que me abençoes’. E eu não quero largar um poema até que ele diga alguma coisa. Há poemas meus que eu não consegui dar forma definitiva até hoje, alguns já escrevi três ou quatro vezes.”

“O poeta tem que ser muito cuidadoso. Eu sempre fui. (...) Meu pai queria que eu me formasse, mas ele não pôde comigo. Aí me levou para trabalhar com ele. Durante sete anos fui prático de farmácia e foi aí que eu aprendi a cuidar dos ingredientes. Acho que meu cuidado com a forma começou aí. Não é fácil descobrir qual é a melhor forma entre as mil e uma maneiras que se pode dizer as coisas. Então, depois destes sete anos, fui

Dulce Helfer

(“Entrevista com Mario Quintana”. Debate, São Leopoldo, n. 5, maio de 1972)

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fazer o que queria fazer: escrever. Comecei [em jornais], o que colaborou para o meu amor à síntese. Porque poesia é síntese. (...) A poesia e a fotografia têm uma coisa em comum: eternizar o momento que passa.”

por Ney Gastal. Recorte de jornal. Fonte: Arquivo da família Quintana)

(“Ouvindo Quintana minha alma assovia e chupa cana”, por Alice Ruiz. Bric a Brac. Brasília, n. 91, 1990, p. 94)

“Há gente que guarda velhos papéis. Eu os perco. É o que estou dizendo: não os ponho fora: perco-os. Isso traz a vantagem de os achar de vez em quando e de os reler com um arzinho superior de sobrevivente.”

Papéis avulsos

“Vivo mais ou menos à la carte. Só sou metódico no horário de trabalho. Tenho uma certa tendência a me evadir, mas sempre faço um esforço por manter-me na terra – como um balão cativo.”

(“Anotações”. In Porta giratória, p. 62)

Loucura lúcida

(“60 anos de líricos quintanares”. Visão. São Paulo, 19.08.1966)

“A diferença entre um poeta e um louco é que o poeta sabe que é louco... Porque a poesia é uma loucura lúcida.”

“Sou um lobisomem da poesia. Escrevo de meia-noite em diante, até as três ou quatro horas. Às vezes, a poesia vem nas ocasiões mais impróprias e eu tomo nota do relâmpago num papelzinho; outras vezes, me esqueço pelo caminho. Se eu não esqueço, escrevo à noite, no silêncio. À noite, a gente só é visitado por fantasmas e eles são silenciosos...”

(“A diferença”. Idem, p. 135)

Leitores críticos

“E o que mais me penaliza e irrita é quando o crítico X se põe a pontificar que o poeta Y deve ser isto e não aquilo, que deve estar do lado de lá e não do lado de cá, ou vice-versa, que o seu temário tem de obedecer a determinado roteiro, que não pode fugir à vivência (ou outro palavroide) do tempo (de que tempo me hablas?) e onde é que vamos parar com esse bestialógico? Mas quem está com a palavra não é o autor? O autor que fale por si. Pobre do poeta! Escreve para dar satisfação, simplesmente... e querem obrigá-lo a dar satisfações!?

(“A poesia é uma maneira de falar sozinho”, por Patrícia Bias. Leia. São Paulo, out. 1985)

Metapoesia “Se um poeta consegue explicar o que quis dizer com um poema, o poema não presta.” (“Exegeses”. In Porta giratória, p. 124)

(“A fórmula mágica”. Idem, p. 85) “Tudo ajuda poetar, tudo atrapalha poetar. Mas, nos momentos de criação, onde quer que se esteja, as injunções do ambiente desaparecem na alegria da criação. Poesia é alegria, porque, por mais infeliz que esteja acaso o poeta, se ele consegue expressar isso com toda a felicidade – cadê tristeza?”

Afinidades eletivas

“– Quais as personalidades a quem mais admira? – Greta Garbo e Sherlock Holmes. – Qual o maior poeta brasileiro atual? – Deixe isso. Nenhum poeta é cavalo de corrida para ser obrigado a chegar em primeiro lugar.

(“Incomoda quando ninguém se preocupa comigo”, 34


– Sua principal qualidade? – O bom senso (não confundir com senso comum). – Seu principal defeito? – O de todo o mundo, isto é, o de não saber qual seja. – O que acha o senhor da poesia engajada? – O mesmo que acho das perguntas engajadas.”

(“Quintana – Poemas são como pássaros”, por Fernanda Veríssimo. Crisis. São Paulo, n. 1, out. 1989)

“O estrelato parece que passou. (...) O que não passará é o Chaplin diretor, que tanto lembra Molière na escolha – espantosamente simples e genial – do pormenor significativo. Pois todo mundo sabe que narrar é a arte de escolher. O dedo, o toque. E pronto. O resto é relatório. Tanto num livro, para o romancista, como num filme, para o diretor. Quanto ao Chaplin ator – muita vez já pensei, no escuro das salas de projeção: ‘Como seriam boas as suas comédias, se representadas por outro!’.”

(“Respostas tiradas de uma entrevista”. Idem, p. 137)

O que ela [Greta Garbo] tinha de extraordinário era a personalidade. Porque geralmente, numa mesma época, todas as pessoas têm a mesma cara. A cara é igual, mas a personalidade, que é uma luz que vem de dentro, é que faz a beleza das pessoas. É fato. Senão todos os velhos seriam horríveis, ninguém poderia olhar para eles, porque todos os velhos são deformados. Um olho às vezes fica mais para baixo, como este meu está.”

(“A estrela e o dedo”. In Porta giratória, p. 149)

Quintana tendo ao fundo foto do filme O garoto, de Chaplin/Dulce Helfer

“O primeiro grande choque que recebi foi com a leitura de Os miseráveis. Mas isto aos 13 anos. Depois, por motivos de gratidão e respeito, nunca mais

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Dulce Helfer

não havia tevê, cinema era uma vez por semana, e tanto aqui em Porto Alegre, como na minha terra, lia-se muito. Eu li muito cedo bons livros. Lembro que as minhas primeiras leituras foram os poemas franceses e os romancistas russos, gente como o Dostoiévski. Tive a vantagem de sempre gostar de leitura, e aprendi francês muito cedo, porque fui criado no fim da belle époque.”

reli o Victor Hugo. O escritor, porém, que maior influência exerceu na formação do meu espírito foi Rémy de Gourmont. Descobri-o na idade crítica. Ele me ajudou a libertar-me de vários tabus de todo gênero, contra os quais a gente sempre se rebela no período heroico da adolescência. Passada tal crise, fica-se, naturalmente, a salvo dessas perigosas aventuras...” (“Panorama de uma geração”. Idem, p. 182)

(“‘O passado é um grande intrometido’”, por Juarez Fonseca. Zero Hora, Porto Alegre, 30.07.1994) “Acho que a cadência e a melodia dos meus versos se aproximam da música angustiada de Mahler, sobretudo da Quarta sinfonia, com aqueles motivos se desenvolvendo, se entrelaçando, sem que haja solução final. Ele corta de repente a progressão sonora: parece que a lua caiu no chão.”

Regional, universal

“Enquanto existir esta palavra, ‘regionalismo’, estamos perdidos. A verdadeira obra de arte transcende as fronteiras. Simões Lopes, por exemplo, é um dos maiores conteurs do mundo; é assim que eu o admiro, e não como regionalista. Há muita gente aqui que só escreve coisas regionais por um espírito de acanhado bairrismo; há poetas que se debulham em rimas diante de um umbu (porque é o nosso umbu) e ficam frios e silenciosos perante um lampião de esquina. Que diferença de qualidade

(“Conversa com Quintana”, por Reinaldo Moraes. Globo – Revista Literária. Rio de Janeiro, n. 1, abr. 1987, p. 6)

“Tive a vantagem de nascer num tempo em que a gente não tinha outra coisa a fazer senão ler. Porque 36


gabarito universal. E desconfio até que nas Lendas, pelo verismo dos pormenores, tenha sido ele, nas três Américas, o verdadeiro precursor do realismo fantástico.”

poética pode haver entre um lampião e um umbu? Nenhuma. Outra coisa: tirante honrosas exceções, o nosso regionalismo tem sido uma fantochada: gaúchos eternamente valientes e chinas irremediavelmente traidoras, estes os bonecos convencionais que se agitam num texto aspeado de vocábulos fronteiriços, coisa muito boa para os futuros dicionaristas, mas de tão complicada leitura para um cidadão medianamente civilizado, como, por exemplo, A demanda do Santo Graal, ou quaisquer outros trechos do português arcaico.”

(Ibidem)

“Apesar de dizerem que eu sou – como é? – ‘subestimado’, sou conhecido em todo o Brasil. Quando cometi a asneira de fazer 70 anos notei isso, recebi cartas de todo o Brasil. E outra coisa: o Erico Verissimo não foi projetar-se no Rio, eu também não fui projetar-me no Rio. O que eu acho muito estranho é que em toda parte onde vou, seja Rio ou São Paulo, me perguntam por que eu não saio daqui. Ora, eu respondo que é pelo mesmo motivo que eles não saem de lá. Por que sair? Quem sai de sua terra tem um aspecto de aventureiro, sempre. Depois, mais cedo ou mais tarde descobrem a gente, desde que se tenha alguma coisa a ser descoberta. Quando o camarada não tem nada a ser descoberto, ficará encoberto lá como aqui.”

(“Panorama de uma geração”. In Porta giratória, pp. 183-184)

“Excetuando o preconceito regionalista, as nossas manifestações literárias se caracterizam por um forte acento de individualismo. A não ser assim, fácil seria dizer qual o melhor livro marxista, qual o melhor livro isto ou aquilo. Aqui, pois, cumpre especificar. Direi que o livro mais forte, mais intenso, mais bem construído que tivemos de 30 para cá foi o Dionélio Machado: Os ratos. O mais delicioso: Literatura e poesia, de Augusto Meyer. Há os Caminhos cruzados, de Erico Verisimo, que é o mais não sei o quê, mas em todo caso foi a revelação de um verdadeiro romancista. E que dizer de Seu Paulo convalesce, de Telmo Vergara, um conteur sutilíssimo?”

(“‘O passado é um grande intrometido’”, por Juarez Fonseca. Zero Hora, Porto Alegre, 30.07.1994)

Profissão de fé

(Ibidem, p. 184)

“Nós poetas nos comunicamos como os prisioneiros, com as batidas nas celas. Assim a gente vai se ligando, uns com os outros, unindo as solidões. Ao final forma um todo, porque eu acredito na poesia. Acredito mais na poesia do que em mim.”

“Quando eu tinha 16, 17 anos, evitava qualquer menção local, qualquer laivo bairrista em meus sonhos, para que estes pudessem ser lidos sem dificuldade em traduções francesas.”

(“Quintana – Conversa com um octogenário”, por Ivo Egon Stigger. Zero Hora, Porto Alegre, s.d. Recorte de jornal. Fonte: Arquivo da família Quintana)

(“Quintana, 85 anos de poesia”, por Nóris Eunice Pureza Duarte. Diário Popular, Pelotas, 01.08.1991)

“Não sou um mero romântico. Esta necessidade de expressão poética, os sapientes que a estudem: ou limitem-se a senti-la. Alguém já me perguntou e, estando eu numa ilha deserta, sem possibilidade de comunicação atual ou póstuma com o mundo, continuaria a poetar. Creio que sim. Digo mais: mesmo que um dia eu sobrasse como o único homem

“Eis aí como eram os adolescentes do meu tempo: viviam em Paris... Enquanto isso, no interior do meu Estado, Simões Lopes Neto escrevia em português, ou antes em brasileiro, ou melhor ainda em linguagem guasca, os Contos gauchescos e as Lendas do Sul – belas histórias tão tipicamente nossas, porém de 37


Dulce Helfer

seis anos como prático em farmácia. (...) Respeitava escrupulosamente as doses, tanto que era especialista em limonada de citrato de magnésia. Saía límpida. Parecia sol engarrafado.” (“Quintana – Conversa com um octogenário”, por Ivo Egon Stigger. Zero Hora, Porto Alegre, s.d. Recorte de jornal. Fonte: Arquivo da família Quintana)

“Já reparou que alguns dos maiores poetas e escritores brasileiros foram farmacêuticos? Drummond, Alberto de Oliveira e o romancista Erico Verissimo, para citar só os mais conhecidos. Sobre o Alberto de Oliveira, que já foi considerado príncipe dos poetas brasileiros, conta-se uma história curiosa a esse respeito. Dizem que um dia entrou lá na Academia Brasileira de Letras um poetastro de quinta categoria que foi logo se dirigindo para Alberto de Oliveira, de braços abertos, exclamando: ‘Como vai, colega?’ Ao que o grande poeta respondeu: ‘Colega? O senhor também é farmacêutico?’” (“Conversa com Quintana”, por Reinaldo Moraes. Globo – Revista Literária. Rio de Janeiro, n. 1, abr. 1987, p. 6)

Escolas, engajamento e movimentos

do mundo, não deixaria de encher o meu vasto ócio: faria poemas. Não obrigatoriamente poemas sobre o fim do homem no mundo. Talvez falasse de outra coisa. Talvez tentasse, mais uma vez, expressar esse mistério de cricrilos, de inefáveis ruídos que formam a rede do silêncio noturno. É um poema que sempre tenho tentado fazer, inutilmente.”

“Nunca pertenci a escola poética nenhuma. Escolas poéticas são coisas da moda. É o mesmo que embarcarmos todos no mesmo navio. Quando passa a moda, o navio naufraga e vão todos para o fundo. Mas, ao mesmo tempo que escrevi um soneto no Caderno H, escrevia coisas que, naquele tempo, se poderiam chamar de surrealistas. Escrevia também poemas em prosa. Fiz todos os gêneros poéticos.”

(“Conversa com o poeta”. Correio do povo, Porto Alegre, 31.07.1966)

(“Ouvindo Quintana minha alma assovia e chupa cana”, por Alice Ruiz. Bric a Brac. Brasília, n. 91, 1990, p. 95)

Sol engarrafado

“Para evitar o vexame de repetir o ano [no Colégio Militar de Porto Alegre] saí e me empreguei, com o Mansueto Bernardi, como caixeiro de balcão na Livraria do Globo. Meu pai soube e me levou para Alegrete, onde ele era farmacêutico. Assim fiquei

“Eu já fui tão engajado que cheguei a ir à Revolução de 30. Poeticamente, nem a escolas pertenço. Isto de pertencer a escolas poéticas, para mim, é o 38


O sonetista

mesmo que ser condenado à prisão perpétua. Não se pode sair de lá nunca! O melhor é aproveitar tudo de todas as escolas. E não há nada como gazear as escolas. É a melhor coisa da vida.”

“Foi só para provocar, porque na época o soneto estava muito desmoralizado, e eu queria provar que soneto também poderia ser um poema. Parece que funcionou, porque eram sonetos descontraídos, de linguagem moderna e não à moda de Camões, Bocage ou Bilac. Na verdade, fazer sonetos é mais fácil do que um poema de metro livre, porque a gente fica com aquela música no ouvido, e as palavras acabam se adaptando ao ritmo e às rimas. O verso livre exige que tudo esteja equilibrado, como uma criança que arma seu jogo de cubos: se um verso falseia, o poema desaba. Para funcionar, porém, ele tem de ficar em equilíbrio. Cada poema é uma ár vore poética, a gente tem de descobrir o seu ritmo próprio, para que a armação de seus versos não desabe.”

(“A última novidade é sempre uma rosa”, por Evelyn Berg. Correio do povo, Porto Alegre, 19.10.1969)

“O simbolismo trouxe um grande serviço de acabar com a lógica na poesia. O que trouxe o simbolismo e depois o modernismo confirmou é que a gente fazia coisas com associações de ideias, agora fazemos com associações de imagens. Bem, pelo menos eu faço com associações de imagens. Quando eu tenho uma ideia, por exemplo, e eu resolvo tirar um poema daquela ideia, não sai nada. A coisa tem que sair de outra forma e junto. A poesia não tem nada de maluca nem de hermética, rebuscada, tem uma lógica diferente; assim como há geometria não euclidiana, deve haver lógicas não aristotélicas, como no caso da poesia.” Dulce Helfer

(“Entrevista com Mario Quintana”. Debate, São Leopoldo, n. 5, maio de 1972)

(“75 anos sem qualquer susto”, por Antonio Hohlfeldt. Correio do Povo, Porto Alegre, 1981)

“Para as classes que estão por baixo – você me desculpe a expressão, eu não tenho a menor cerimônia – não adianta fazer poesia. Para o operariado, por exemplo, não adianta nada fazer poesia, eles não têm tempo de ler ou nem saber ler. Agora, só um camarada como Castro Alves é que pode influir. Mas ele era genial, e nós não somos. De maneira que um poeta, para influir na vida do país, na vida do operário, na vida pública em suma, deve candidatar-se a vereador, a deputado, a senador.” (“Mário Quintana – O poeta da esperança”. Jornal da Tarde, São Paulo, 30.07.1988)

“Dizem os comunistas que a religião é o ópio do povo; outros dizem que o ópio do povo é precisamente o comunismo; se pedissem minha opinião, eu diria que o ópio do povo é o trabalho.” (“O ópio”. In Caderno H) 39


Inauguração de placa em homenagem ao poeta em Alegrete (1968)/Arquivo da família Quintana

mo assunto no soneto ‘Trinta e Cinco’, o último de A rua dos cataventos. Mas de qualquer maneira, o modo de eu me comunicar com o mundo é o leitor. Só que esta relação, que eu considero íntima, deve ser sempre a dois.”

Homenagem

“Um engano em bronze é um engano eterno.” (Frase irônica enviada por Quintana à prefeitura de Alegrete para ser inscrita na placa de bronze em sua homenagem)

(“75 anos sem qualquer susto”, por Antonio Hohlfeldt. Correio do Povo, Porto Alegre, 1981)

Poeta pop Celibato

“Esta popularidade me comove e me chateia ao mesmo tempo (...). Tenho inveja do tempo em que eu era gloriosamente anônimo. E com o perdão do lugar comum, a poesia é flor do deserto, cresce na solidão. A popularidade atrapalha um pouco, mas o fato verdadeiro, por outro lado, é que eu escrevo para me comunicar. Só que tenho uma séria desconfiança de que se eu descobrisse ser o último homem na face da terra, aproveitaria este fato para corrigir alguns poemas. Esta eventualidade, aliás, tomei co-

“Tive umas namoradas como todo mundo. Mas elas foram muito compreensivas porque acabaram casando com outros para preservar minha independência. O que eu gosto, mais que tudo, é da minha independência.” (“Ouvindo Quintana minha alma assovia e chupa cana”, por Alice Ruiz. Bric a Brac. Brasília, n. 91, 1990, p. 94) 40


(“‘Satisfeitos da vida, só os medíocres’”, por Jussara Porto e Teresa Cristina Cardoso. Zero Hora, Porto Alegre, 06.11.1983)

“Vou dizer uma coisa que nunca disse porque isso é meio chato. Quando me perguntam por que nunca casei eu digo, por exemplo, que não gosto de pijamas. Há muitos motivos paralelos também. Na minha época, o pijama era a veste nupcial do noivo. Por mais pobre que fosse o camarada, não podia casar sem pijamas. Ora, eu jamais gostei de pijama porque a gente sunga as calças e os botões pisam a gente... E agora é tarde para casar. Tinha uma moça que sempre me perguntava: ‘Por que o senhor não casou?’ E eu respondia: ‘Porque elas fazem muitas perguntas’. Mas o fato é que antes de tudo não tive tempo, aliás, elas não tiveram tempo. Porque eu estive em tantas partes que, quando uma coisa queria ficar mais ou menos séria, eu ia para outra parte. Antes eu era prático de farmácia, na farmácia do meu velho. Depois me mudei de Alegrete para Porto Alegre, depois fui para o Rio; mais tarde voltei para cá, para a Livraria do Globo, voltei para Porto Alegre de novo e agora resolvi descansar os ossos no Correio do Povo. Outra coisa que colaborou muito para que eu não casasse foi o secretário de Educação de 1940, 1941, porque eu tinha uma namorada que era funcionária pública e ele mudou-a de turno. Me desencontrei dela.”

“Antigamente era quase impossível você sair sozinho com um amigo casado, ou, o que era muito mais impossível, com a mulher dele. Aquilo me dava uma dolorosa impressão de xifopagia. Daí a frase que registrei num dos meus livros: ‘Casar deve ser tão chato quanto ser xifópago’. Depois, tem o negócio da solidão. Ela é essencial para mim. Citando um verso da Bruna Lombardi, eu diria que, entre a solidariedade e a solidão, meu coração balança. Não escondo que eu tendo bem mais para essa última.” (“Conversa com Quintana”, por Reinaldo Moraes. Globo – Revista Literária. Rio de Janeiro, n. 1, abr. 1987, p. 7)

Prosa

Dulce Helfer

“Aos 20 anos de idade ganhei o primeiro prêmio num concurso estadual de contos, entre 200 e

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ra disfarçar o sentimentalismo, tá? O único poeta puro que conheci, sem mescla de ironia, foi Cecília Meireles. Ela era poeta puro, não se rebaixava a fazer gracinhas, trocadilhos, a fazer isso ou aquilo, ela era a poesia em poesia. Quem faz humor é para disfarçar o sentimentalismo, pelo menos é o meu caso. Os caras que são humoristas são os camaradas mais tristes do mundo.”

tantos concorrentes, promovido pelo Diário de Notícias de Porto Alegre. Depois de algumas tentativas, reconheci que os meus contos só tinham um personagem: eu mesmo. Desisti.” (“O mago da arte em verso e prosa”. Notícias Agrale. Caxias do Sul, n. 52, out. 1989, p. 3)

(“‘Satisfeitos da vida, só os medíocres’”, por Jussara Porto e Teresa Cristina Cardoso. Zero Hora, Porto Alegre, 06.11.1983)

Tradução e jornalismo

“Poeta é condição, não é profissão. Minha profissão é jornalista. É assim que está escrito na minha carteira profissional. Foi como jornalista que ganhei, na maior parte da minha vida, o meu sustento – e a redação do jornal foi sempre o lugar onde eu me senti melhor, em toda a minha existência.”

Presente futuro

“Não é propriamente o mundo que muda – são as formas exteriores. O progresso, que é tão falado. Mas o homem continua o mesmo através de todas estas coisas exteriores. Eu acho que o homem é o mesmo andando de carruagem no século XVIII ou num avião a jato. Creio que não muda. É ape nas um ca so de maior ou me nor velocidade.”

(“O jornalista”, por Oswaldo Goidanich. Cadernos Porto & Vírgula, n. 14, 1997)

“[Sobre o trabalho como tradutor na editora Globo] Foi a época da minha vida em que mais enlouqueci e mais produzi.”

(“A última novidade é sempre uma rosa”, por Evelyn Berg. Correio do Povo, Porto Alegre, 19.10.1969)

(Cadernos Porto & Vírgula, n. 14, 1997) “Amanhã a gente vai achar tão engraçado esses Apolos 8, 10, 11, como achamos engraçado o ‘Ford bigode’. Técnica é uma coisa que impressiona, mas é uma coisa superficial.”

“Não se dá valor ao trabalho do tradutor. Isso sempre me deixou indignado. A tradução é uma coisa séria. Quando a gente consegue fazer uma tradução boa, aceitável, isto é nada mais, nada menos, que a estreia daquele autor traduzido na literatura de língua portuguesa. Isso as pessoas, os críticos, não levam em conta. Eu traduzi clássicos como Voltaire, Proust, Balzac, Somerset Maugham, Conrad e Virginia Woolf, entre outros.”

(“Entrevista com Mario Quintana”. Debate, São Leopoldo, n. 5, maio de 1972)

“O presente é a coisa mais inapreensível que existe porque é uma espécie de sanduíche de nada entre o passado e o futuro.”

(“A poesia é uma maneira de falar sozinho”, por Patrícia Bias. Leia. São Paulo, out. 1985)

(“‘O passado é um grande intrometido’”, por Juarez Fonseca. Zero Hora, Porto Alegre, 30.07.1994) Humor

“Antes de tudo sou partidário do jogo do bicho. Jogo toda semana. Porque o vulgo carteado é que

“Todos [os poemas] doeram muito, sabes? Inclusive os humorísticos. Porque o humor é uma coisa pa42


Dulce Helfer

é perigoso, pois os camaradas passam a noite em claro, ficam tuberculosos, sabe como é? Perdem a saúde e tudo o mais. No bicho, o camarada joga e pronto. Além disso, é a loteria do pobre. E o governo não tem moral para proibir o jogo do bicho porque tem a Loteria Federal, não é? Jogo sempre porque faço um tratamento pela esperança, esperando que no outro dia acerte. Aquela frase não é ‘enquanto há vida há esperança’? É, sim, enquanto há esperança há vida.” (“‘Eles passarão, eu passarinho’ – Mário Quintana, 80 anos”. Correio Braziliense, Brasília, 15.06.1986)

“O futuro é uma espécie de banco ao qual vamos remetendo, um por um, os cheques de nossas esperanças. Ora! Não é possível que todos os cheques tenham fundos...” (“A poesia é uma maneira de falar sozinho”, por Patrícia Bias. Leia. São Paulo, out. 1985)

“A alma humana está dividida em três partes, uma em Shakespeare, outra na Bíblia, outra em Dostoiévski.”

Alma, Deus

“Deus está em toda parte. Mas por que procurá-lo no mundo exterior? Se ele está em toda a parte, está dentro até de cada um de nós e a cada um compete descobri-lo, dar-lhe a maior parte possível em nossa vida terrena. Do contrário, o nosso Deus interior pode até morrer, como acontece com os ateus, os positivistas, todos os materialistas. Eles não sabem que são o sepulcro de Deus. A falar verdade, não importa que a gente acredite ou não em Deus, mas se Deus acredita na gente. De minha parte, só acredito mesmo é na segunda pessoa da Santíssima Trindade, no Deus Vivo, pois temos testemunho histórico de que Jesus Cristo viveu entre nós. Quanto aos deuses pagãos, morreram de fato, pois os poetas deixaram de invocá-los. Dos anjos não posso absolutamente duvidar, em vista da insistência com que aparecerem em meus poemas. Santo da minha devoção? São Jorge, com seu cavalo e seu Dragão. Sou devoto dos três.”

(“Mário Quintana – O poeta da esperança”. Jornal da Tarde, São Paulo, 30.07.1988)

Morte sem adjetivos

“A única coisa que eu temo na morte são os necrológios – ah, esses adjetivos dos necrológios!” (“Temor”. In Porta giratória, 2. ed., p. 99)

“Sempre achei que a morte, embora venha naturalmente depois da vida, não passa de um aperitivo da vida, porque sendo o homem o único animal que sabe que vai morrer, por antecedência, dá um valor maravilhoso a cada instante da vida.” (“75 anos sem qualquer susto”, por Antonio Hohlfeldt. Correio do Povo, Porto Alegre, 1981)

(Ibidem) 43


Porto Alegre


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Alegrete







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M A N U S C R I TO S / I N É D I TO S

Os manuscritos de Mario Quintana revelam o modo metódico e disciplinado com que esse poeta considerado intuitivo cuidava de seus originais. Um fac-símile como o de “Estranhas aventuras da infância” – que reproduzimos aqui – revela um procedimento recorrente em inúmeros documentos do acervo de Quintana: o gesto de riscar transversalmente a folha de papel, como a indicar que aquele inédito ganhara a página impressa (no caso de “Estranhas aventuras da infância”, as páginas do livro Baú de espantos). Por essa razão, é difícil encontrar entre seus manuscritos uma folha limpa, sem o traço de seu imprimatur, como ocorre com o fac-símile de “Poema escrito numa garrafa”. Ainda assim, o trabalho do poeta com seus originais pode ser contemplado no cotejo dos manuscritos com a forma final – a exemplo do que ocorre com esse poema que, sob o título “Cripta”, acabaria integrando o livro O aprendiz de feiticeiro com as pequenas variações constantes da transcrição aqui publicada. Muito mais escassos, porém, são os papéis que ficaram de fato inéditos. Na maior parte, são anotações e esboços de caráter mais biográfico ou familiar do que literário – como o desenho ao lado, de 1982, assinado pelo “tio Mario”, ou o testamento escrito em 1983, que contém uma curiosidade: quase ao final, entre parênteses, o poeta justifica a brevidade do texto alegando a “urgência que o caso requer, por motivos óbvios”. Os motivos – óbvios para Quintana, mas nada evidentes para o leitor ciente de que ele sobreviveria mais de dez anos ao testamento – estão num sonho que o escritor gaúcho teve pouco tempo antes, no qual teria antevisto dia e mês da própria morte, data que passou a assombrá-lo a ponto de fazer o mais rápido possível suas disposições póstumas... Diante desse quadro, no qual textos poéticos inéditos são verdadeiras raridades, destaca-se o fragmento de prosa “Do individual e do universal”, que não encontra registro integral nos livros de Quintana – e que por isso merece leitura mais detida. O que surpreende desde logo é a estrutura do pequeno texto, que apesar de breve procura abranger as complexas relações entre o individual e o universal. Parece que essa oposição extrema leva o poeta a tratar as primeiras linhas como duas proposições lógicas que relacionam não o individual com o universal, e sim o homem com o bicho. O silogismo, no

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entanto, carece de qualquer conclusão se o leitor não admitir a ideia subjacente de que homem e bicho pertencem a uma mesma categoria. Daí resulta que todos os homens são bichos (o que é verdade, sob vários aspectos), e o que os torna desiguais – ou seja, individuais ou universais – são os “mundos” de cada um. Até aqui, o rigor da formulação seria quase impecável, não fossem as cambiantes trocas entre significantes e significados, fazendo ferver e estilhaçar o sentido do que vem depois. E o que vem depois é a afirmação paradoxal, porém plausível, de que o poeta, quanto mais individual, mais universal se torna. Quintana sustenta que o passo para a universalidade somente é possível quando o poeta se coloca acima das contingências, transcendendo as amarras do homem comum. O tom é filosófico, embora soe também como manifesto, no que discrepa dos meio-tons predominantes na poesia do autor. Como todo manifesto é também confissão de propósitos, o recatado Quintana salvou por fragmentação as partes que, separadas, não lhe infligiriam o desconforto da revelação. E, mais uma vez, usou a tática de implodir o poema, desmembrando suas partes, como sugeriu Horácio (disjecti membra poetae: “os membros do poeta esquartejado” – completáveis assim, segundo Paulo Rónai: “não seriam reconhecíveis se lhes desfizéssemos o ritmo e a disposição da frase”). O ritmo e a disposição da frase recaíram, no caso, nas linhas fragmentárias que o poeta escolheu para permanecer em seu patrimônio poético. As duas primeiras passagens aparecem no aforismo “Bicho & Gente”, do Caderno H, com uma pequena variação: “Existe um mundo para cada espécie de bicho. Mas, para cada bicho da espécie humana, existe um mundo diferente”. Já a frase “o poeta, quanto mais individual, mais universal” aparece em “Carta”, do mesmo livro. As passagens intermediárias, mais declaratórias que poéticas, ficaram registradas neste singular manuscrito, ao mesmo tempo édito e inédito – e, acima de tudo, revelador da inteligência poética de Mario Quintana.

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Do invividual e do universal Existe um mundo para cada espécie de bicho. Mas existe um mundo diferente para cada bicho da espécie humana. Daí, a minha desconfiança da poesia de equipe, engajada, comprometida. Porque um poeta, quanto mais individual, mais universal – isto é, mais livre das contingências da classe, do meio, da época, do folclorismo, dos campos fechados do regionalismo.

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Cripta*

Debaixo da mesa A negrinha. Assustada, Assustada. Na janela A lua. No relógio O tempo. No tempo A casa. E no porão da casa? No porão da casa umas estranhas ex-criaturas com cabelos de teia de aranha e os olhos sem luz sem luz e todas se esfarelando que nem mariposas ai todas se esfarelando mas sempre se remexendo eternamente se remexendo como anêmonas fofas no fundo de um poço de um poço!

* “Poema escrito numa garrafa” (manuscrito da pág. ao lado) foi publicado no livro O aprendiz de feiticeiro sob o título “Cripta”, com as pequenas variações que constam da transcrição acima.

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Estranhas aventuras da infância Era um caminho tão pequenino Que nem sabia aonde ia, Por entre uns morros se perdia Que ele pensava que eram montanhas... Enquanto a tarde, lenta, caía, Aflitamente o procuramos. Sozinho assim, aonde iria? Porém, deixamos para um outro dia... Perdido e só, nós o deixamos! E quando, enfim, ali voltamos Já nada havia, só ervas más... Tão vasto e triste sentiste o mundo Que te achegaste, desamparada... E foi bem juntos que regressamos, Ombro com ombro, a mão na mão, Enquanto, lenta, caía a tarde E nos espiava a bruxa negra... E nos seguia a bruxa negra Que hoje se chama Solidão! De Baú de espantos

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Minuta de testamento Eu, Mario de Miranda Quintana (profissão, CP [carteira profissional] etc.), em plena posse de minhas faculdades mentais (incluso atestado médico por psiquiatra) nomeio minha herdeira universal Elena Quintana de Oliveira e meu executor testamentário Dr. Marco Tullio de Rose. (O texto é simplesmente este, devido à urgência que o caso requer, por motivos óbvios.) As disposições do testador serão oportunamente entregues ao Dr. Marco Tullio de Rose. Mario Quintana Porto Alegre, 31.10.83

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ENSAIOS

Máquina de sentidos poéticos Fábio Lucas

Mario Quintana descobriu-se poeta desde o início, mas desenvolveu seus cabedais na prática da literatura. Quanto mais sabedor das regras de comunicação verbal, mais fluentes tornava suas composições. Contornava, sorridente, as lições dos sábios e da moda. É que o seu poder derivou inicialmente do modelo sonoro da herança simbolista que, no entanto, introjetou, nos seus artefatos, a majestade da retórica tradicional, neoclássica, obediente a cânones das belas letras: distribuição harmônica de acentos, culto das rimas raras, antecipação ideativa de fechos de ouro empolgantes. Enfim, tudo num sistema de regras, implícito à gramática da composição artística. Mario Quintana embarcou no último vagão do trem da literatura consagrada, em busca dos leitores e da notoriedade. A expectativa da época, que formulava a presunção do literato desejado pelo público, requeria um conhecedor da retórica da poesia que, entretanto, fosse capaz de exprimir-se numa linguagem afetiva e, até, sentimental. A rua dos cataventos, de 1940, reúne sonetos de bom andamento. Os sinais do período são evidentes: versos medidos, abundância de reticências, exclamações, pensamentos esgarçados, certo apelo às dores do mundo, lamentos pela infância pobre, religiosidade enternecida. Os títulos de certos sonetos dizem tudo: “Tudo tão vago...”, “Este silêncio é feito de agonias”. Assim por diante. Temas? Ventos, pássaros, grilos, morte, anjos, a cidade interiorana, ruas, caminhos, noites, crepúsculos, auroras, amigos, sapatos, tranças juvenis. Observe-se o gesto metonímico de exploração da parte pelo todo: ventos, caminhos, morte e saudade falam do tempo; ruas e sapatos traduzem o espaço; as tranças entram no lugar da amada ausente. Há visível um clima de

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António Nobre, muito lido pelos autores brasileiros atingidos pelo vitalismo impotente. Mario Quintana percebeu logo o alcance da proposta e cuidou de adicionar a ela o travo de um tempero novo: o uso lúdico das palavras, a injetar alegria e certa descontração no sentimentalismo patético. O humor serviu-lhe para o protesto contracultural. A forma pontilhou-se de dissonâncias que agrediam as leis do bom senso. Isso quanto aos cânones. No que diz respeito à moda, já dominadora nos anos 1940, teve de contrapor-se aos delírios das vanguardas europeias, trazidas ao Brasil pelo grupo pioneiro dos modernistas. Mario Quintana não se tornou modernista exemplar, nem um desafiador da linguagem acadêmica. Adotou, sem pejo, as conquistas da poesia confidencial, já refulgente nas vitrines literárias. Ali estavam os suplementos de literatura a bradar a excelência dos versos livres, das anedotas prosaicas, das flores do mal, a despontar nos canteiros da aristocracia das letras. Mario Quintana entendeu a toada da época e compreendeu de que lado poderia soprar o prestígio. Tornou-se, com o tempo, cada vez mais fiel ao próprio estilo. Calcado no talento, na capacidade de estruturar poemas de larga aceitação popular – pelo ritmo, pelo repertório vocabular, pela criação límpida e cadenciada do encantamento verbal, da superabundância oracular que os seus versos transmitem –, teve a noção de que encontrara o caminho certo. O caminho certo da comunicação com o público brasileiro. E operou numa região de forte apelo ao trabalho escrito, consideradas as circunstâncias nacionais, de baixa pressão da literatura no conjunto das obras consumidas, já que a maioria da população se conservava distante do hábito da leitura. Em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul, Mario Quintana pôde acobertar-se de estímulos à sua atividade literária. E saltou para versos mais complexos, além das quadras lítero-morais das trovas, mania nacional, recitadas em torneios festivos e intermináveis. Consta que, ainda nos primórdios da carreira, Álvaro Moreira insistira para que o poeta deixasse de lado as suas “quadrilhices”, referindo-se às publicações saídas no Almanaque do Globo. O grande salto de Quintana aconteceu com a publicação da Antologia poética, em 1966, pela Editora do Autor, do Rio de Janeiro, segundo a seleção

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de Rubem Braga, que, por sua vez, fora ajudado por Paulo Mendes Campos, consoante registra em nota introdutória da coleção. A rua dos cataventos (Alegrete, Natal de 1938) apresenta-se na totalidade. O mesmo acontece com O aprendiz de feiticeiro, de 1950, dedicado a Augusto Meyer. A certo ponto da vida, Mario Quintana tentava dominar os efeitos da vida boêmia que atacara a sua saúde. Sujeito a processos de desintoxicação, tornara-se deprimido, insociável. A publicação da Antologia poética trouxera-lhe novo alento, mais elevada autoestima, conforme depõe seu conterrâneo de Alegrete, Sérgio Faraco. O contista conta que Mario Quintana exigira que constasse da placa de bronze em sua homenagem, em Alegrete, a seguinte frase: “Um engano em bronze é um engano eterno”.1 Ironia e mordacidade ao mesmo tempo. Ao lermos a poesia e a prosa (muita prosa poética) do escritor sul-rio-grandense, muitas vezes nos defrontamos com a expressão de um lirismo particular, muito embora de alta filiação à índole luso-brasileira. Ao mesmo tempo, assistimos a uma quase propositada erosão do lirismo tradicional, mais de sentimentalismo à superfície do que de conteúdo reflexivo. É que Mario Quintana, no interminável poder de recriação – misto de recreio e criação – pontua os sinais de envelhecimento do antigo sistema retórico e conquista – com que força! – novo patamar de comunicação afetiva. Desse modo, o poeta surpreende sempre; suas imagens guardam novidades. Tendo iniciado a carreira literária com um livro de sonetos – A rua dos cataventos –, impôs-se logo à admiração dos leitores mais exigentes. O que veio depois, em termos de atualizações temáticas e formais, não se distanciou muito do leito inaugural. A tal ponto que o poeta, irônico, não deixa de pontificar no poema “Quem disse que eu morri?”: “Não importa que a tenham demolido:/ a gente continua morando na velha casa em que nasceu”. Vale como um recado aos críticos. Está na obra Preparativos de viagem (Rio de Janeiro: Globo, 1987). Ah, os aforismos de Mario Quintana! A todo momento servem de suporte para as elucubrações éticas e estéticas do poeta e prosador. Para a tarefa de destruir, Mario Quintana afivela a máscara da ironia, cuja maior graduação chegou ao sarcasmo. Tomemos um tema – a velhice – ao invés de personificar os ataques. Eis duas quadras exemplares, pertencentes à obra Espelho mágico (Porto Alegre: Globo, 1951):

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DO MAL DA VELHICE Chega a velhice um dia... E a gente ainda pensa Que vive... E adora ainda mais a vida! Como o enfermo que em vez de dar combate à doença Busca torná-la ainda mais comprida... DA EXPERIÊNCIA A experiência de nada serve à gente. É um médico tardio, distraído: Põe-se a forjar receitas quando o doente Já está perdido... No prolongamento do tema – velhice mais a morte –, tomemos um trecho do poema “Ao longo das janelas mortas”, de O aprendiz de feiticeiro. Depois de proclamar em alto e bom som: “Vou dar um tiro neste poema horrível!”, prossegue no estilo de fúria e desespero: Venham ver a minha degradação, A minha sede insaciável de não sei o quê, As minha rugas. Tombai, estrelas de conta, Lua falsa de papelão, Manto bordado do céu! Tombai, cobri com a santa inutilidade vossa Esta carcaça miserável de sonho... Aí está: “Esta carcaça miserável de sonho...”. Para celebrar as glórias do amor, utiliza as conexões insólitas. Mesmo o amor-engano oferece largo espectro de imagens ousadas. Na “Elegia”, de Apontamentos de história sobrenatural (Porto Alegre: Globo/IEL, 1976, p. 91), vem o exemplo do sapato desacompanhado: “Um sapato preto perdido do seu par: símbolo/ Da mais absoluta viuvez”.

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A leitura da obra de Mario Quintana leva-nos pendularmente do rito formal da tradição aos territórios do protesto, do patético e da exclamação superlativa. O ritmo ciclotímico acentua-se, parece sempre um lírico paradoxal, cheio de exaltações do belo e de clamores da degenerescência. Os modelos de azeda explosão se destacam da superfície expositiva, aparentemente espontânea. Por exemplo, na ironia fulminante: DOS MILAGRES O milagre não é dar vida ao corpo extinto, Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo... Nem mudar água pura em vinho tinto... Milagre é acreditarem nisso tudo! Ou na alegoria da recriação: DOS MUNDOS Deus criou este mundo. O homem, todavia, Entrou a desconfiar, cogitabundo... Decerto não gostou lá muito do que via... E foi logo inventando o outro mundo. Também no chiste das compensações: DO CUIDADO DA FORMA Teu verso, barro vil, No teu casto retiro, amolga, enrija, pule... Vê depois como brilha, entre os mais, o imbecil, Arredondado e liso como um bule! E até no reino da morte, como no poema “Este quarto”, dedicado a Guilhermino César, cujo terceto final reza:

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A morte deveria ser assim: um céu que pouco a pouco anoitecesse e a gente nem soubesse que era o fim... O paradoxo habita o texto e as decisões existenciais de Mario Quintana. Assistido por irresistível pendor literário, vocacionado para a criação, escolou-se para o ato de escrever, adestrou-se na arte da composição lírica. E teve o respaldo dos contemporâneos que o estimularam na convivência e na localização de seus espaços de publicação. O poeta se vale – quantas vezes! – de vibrações das cordas líricas, em meio dos poemas, para tecer sua longa, interminável arte poética. Diz do poema, dos sons e das cores, elementos adjetivos; e do amor, da morte, dos amigos, da infância, elementos substantivos. E constrói metáforas ousadas, deita alusões, brinca com as palavras, ri-se dos outros, ri de si e da glória vã. Por exemplo, evoca Tolstói a fugir de casa aos 80 anos de idade e morrer na gare da estação desavisadamente, solitário, ausente da boa razão, nos versos do “Poema da gare de Astapovo”, de Novos poemas (incluídos na Antologia poética de 1966, da Editora do Autor). Já em A rua dos cataventos, um poema se intitula “Vontade de escrever...” e destila uma paisagem de solidão e morte. Entre os Novos poemas, o “Noturno” reserva o final para ligar o amor às palavras. Portanto, em clima de autêntico lirismo: Que mais Para o amor? Palavras? Só as escritas.2 Além da arte poética, incessante busca, o panlirismo anda solto na obra de Mario Quintana. Seja exemplo o poema “Se o poeta falar num gato”, de Esconderijos do tempo (Porto Alegre: L&PM 1980, p. 35), cuja composição, plena de cláusulas condicionais, encerra-se com o verso exclamativo: “Todos os poemas são de amor!”. Isso lembra antiga lição que ensina ser possível resumir o assunto de um romance, um conto, uma peça teatral ou de uma ficção qualquer, mas que o poema não pode nunca ser resumido. Ele é a palavra, o conjunto de vocábulos

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irredutíveis. A não ser que se considere que todos os poemas líricos querem ser simplesmente esta declaração: “eu te amo”. Lembre-se de que Esconderijos do tempo foi publicado no ano em que Quintana se consagrou com o Prêmio Machado de Assis, em 1976, quando o poeta celebrava os seus 70 anos de idade. Divertidamente dirá no “Pequeno poema didático”: “Todos os poemas são o mesmo poema”.3 Vale lembrar que Mario Quintana também cuida de exaltar os seus autores marcantes, com propriedade e sabedoria. Ao mergulhar um astro da ficção-científica – Ray Bradbury – nas camadas mais profundas da poesia, serve do pretexto para fazer a apologia da imaginação criadora: Depois de tantos anos de cínico materialismo Ray Bradbury é a nossa segunda vovozinha velha que nos vai desfiando suas histórias à beira do abismo – e nos enche de susto, esperança e amor. As coletâneas de Mario Quintana respondem às duas possibilidades de apreensão semântica: a microleitura e a macroleitura. A cada momento, a imprevisibilidade das imagens e das metáforas eleva a taxa de informação poética dos versos. Do mesmo jeito, cada poema alcança patamares elevados de autonomia, de dicção própria, que assegura o seu particularismo estilístico. Alinha-se, portanto, o poeta, a certa corrente de criadores que sustenta a noção de que a poesia existe como protesto contra a arbitrariedade do signo linguístico, tal a riqueza de motivações de que ela se vê ornamentada, tal a remotivação sistemática dos signos. Repetições e marcações rítmicas ampliam a capacidade sugestiva da máquina sonora do poema. Juntam ao corpo dos significantes o poder conotativo dos sons, um coro de agudezas, assim como as associações pictóricas harmoniosamente articuladas. De Esconderijos do tempo, recomendaríamos “Sóbolos rios que vão”, poema funéreo, súmula de alusões e criação; igualmente “Encontro”, poema suprarreal e, ainda, “O poeta canta a si mesmo”, pela surpreendente possibilidade de se desdobrar o final num trocadilho amplificador: “O poeta canta a si mesmo/ porque de si mesmo é diverso” (na mesma linha acústica, o derradeiro verso poderia soar assim: “porque de si mesmo é DE VERSO”).

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Curioso é que Mario Quintana se apoia repetidas vezes em frases-estopim no interior de litanias de cunho hipnótico. São tópicos, funções de ligação entre segmentos das composições. A polissemia de Mario Quintana é tanto maior quantos forem os planos de decifrações que abordem os seus poemas. O leitor inerte alcança apenas o raso dos atributos visíveis (ou audíveis), mais correntes e acessíveis à percepção descuidada. O poeta iniciou-se em nível elevado de competência comunicativa e concentrou, desde o início, valores rítmicos e retóricos que tornaram difícil eleger as suas obras-primas. Daí o espírito errático que governa cada antologia. Rubem Braga reuniu na célebre Antologia poética a produção de Mario Quintana em ordem, sempre que possível cronológica, mas cheio de dúvidas. Suprimiu alguns trabalhos e acrescentou outros. Já Fausto Cunha não se deu por perdido no turbilhão do tempo. Deu à coletânea que organizou em 1983 o caráter exigido pela coleção Melhores Poemas da editora Global. Mas, no ensaio introdutório, ao definir Mario Quintana no título como “o último lírico”, compôs um histórico das edições e ressaltou a habilidade de Quintana ao propor a Nova antologia poética (1981). Conforme explica Fausto Cunha, ele virtualmente remanejou sua obra, deixando de lado o tradicional critério de livro por livro. O resultado foi surpreendente. Revelou a extraordinária unidade da poesia de Mario Quintana, sua atualidade (no sentido de que um bom poema deve atravessar o tempo sem ficar datado) e a multiplicidade de sua inspiração.4 Virá, depois, a antologia com seleção de Sérgio Faraco (Porto Alegre: L&PM, 1997), uma das mais sensíveis reuniões de trabalhos de Mario Quintana. Sérgio Faraco reitera o princípio de seleção de livro a livro. Acrescenta à coletânea bibliografias ativa e passiva, de modo a orientar o leitor acerca da produção de Quintana e de sua respectiva fortuna crítica. Servem também as antologias para nos convencer do desconcertante modo de Mario Quintana estruturar a sua obra, um dos mais belos momentos líricos da poesia brasileira. As possibilidades combinatórias dos seus poemas são infinitas. Não se restringem à orquestração dos componentes sonoros, pois

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abrangem os saberes pré e pós-reflexivos, como elementos constitutivos dos significados. Tudo conjugado – impressões acústicas, memória livresca, pulsões criadoras, sugestões pictóricas e cromáticas, regressões e enfrentamentos existenciais –, tudo perfaz a índole diferencial da sua mensagem poética.

Fábio Lucas, natural de Esmeraldas-MG, é professor, ensaísta, tradutor, ficcionista e crítico literário. É membro das Academias Mineira e Paulista de Letras, diretor cultural do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos (IPSO) e ex-presidente da União Brasileira de Escritores (UBE-SP) por cinco mandatos. Autor, entre outras obras, de A mais bela história do mundo (São Paulo: Global, 1996), Luzes e trevas – Minas Gerais no século XVIII (Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1998), Literatura e comunicação na era da eletrônica (São Paulo: Cortez, 2001), O poeta e a mídia – Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto (São Paulo: Senac, 2004), Lições de literatura nordestina (Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado, 2005), Ética e estética de Erico Verissimo (Porto Alegre: Age, 2006) e Nove cartas – Razões e contrarrazões: João Cabral de Melo Neto, João Antônio e Fábio Lucas (São Paulo: Oficina do Livro Rubens Borba de Moraes, 2008).

NOTAS 1 PEREIRA, Marcelo. “Ecos de Mario Quintana”. Entrevista com Sérgio Faraco. A Gazeta, Vitória, 30.04.2006, p. 20. 2 QUINTANA, Mario. Antologia poética. Organização de Rubem Braga e Paulo Mendes Campos. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1966, p. 130. 3 Idem. Nova antologia poética. 3. ed. Rio de Janeiro: Codecri, 1983, p. 51. 4 Idem. Mario Quintana – Os melhores poemas. Organização de Fausto Cunha. 9. ed. São Paulo: Global, 1995, p. 10.

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Mario e a cidade Antonio Hohlfeldt

A poesia de Mario Quintana, por sua enorme riqueza de inspiração, permite-nos multiplicadas leituras, como certamente o leitor está a comprovar por esta publicação. Formalmente, por exemplo, pode-se explorar a alternativa da ironia – ferina, às vezes; sutil, em outras ocasiões – com que ele explora as contradições humanas. Ou as reiterações, as rimas internas, o bom uso do diminutivo etc. Tematicamente, pode-se enveredar por diferentes perspectivas, como a da passagem do tempo, da fragmentação da identidade – abordagens que o colocam, sem dúvida, num claro alinhamento pós-moderno ao lado de poetas como Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira ou Cecília Meireles. Mas queremos, aqui, propor um pequeno exercício de leitura da poesia de Mario Quintana sobre o mote da cidade – o que nos levou a uma releitura do poeta, de quem selecionamos 40 diferentes poemas que abordavam o tema. É a partir desses poemas que queremos evidenciar a maneira criativa e dinâmica com que ele representa a aparente contradição entre campo e cidade. Uma primeira constatação é o fato de que a cidade é presença constante, mas irregular, na obra de Quintana. Já no livro de estreia, A rua dos cataventos, ela surge pelo menos em cinco poemas. A incidência será mais forte nos textos de Caderno H, com 18 epigramas diversos, mais cinco em Apontamentos de história sobrenatural, chegando a nove em Da preguiça como método de trabalho. Nos demais trabalhos, não ultrapassa três textos, como em A vaca e o hipogrifo e Preparativos de viagem, restringindo-se a uma única passagem em Canções, Esconderijos do tempo, Velório sem defunto etc. Como se sabe, Mario Quintana nasce em Alegrete, em 1906, e vem para Porto Alegre, pela primeira vez, em 1919, para estudar no Colégio Militar. Problemas familiares fazem-no retornar a Alegrete, em 1924, mas ele se fixa de-

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finitivamente na capital do Estado poucos anos depois, para daí não mais se apartar. Sabe-se que ele não retornou nunca mais a Alegrete, ao longo da vida, exceção feita quando da passagem de seus 70 anos de vida. Assim, costuma-se dizer que Quintana é um poeta eminentemente urbano. Ao mesmo tempo, quem lê sua poesia com atenção verifica a forte crítica que ele desenvolve contra o anonimato ou a frieza dos arranha-céus, de um lado, e, de outro, certa rememoração quase nostálgica das cidadezinhas do interior, sua adesão aos arrabaldes e às pequeninas ruas e travessas sem saída, aliás, comuns na Porto Alegre dos anos 1930 que o poeta conheceu. O exame de um tema na poesia de Quintana, tal como nos propomos aqui, enfrenta sempre o desafio do isolamento em face de outros, eis que toda sua poesia imbrica permanentemente uma imagem em outra, de tal forma que é extremamente complexo buscar tal separação, correndo-se o risco de ler pela metade a obra do poeta, ao se tentar tal recorte. De qualquer maneira, duas outras observações servem como abertura para este estudo. De um lado, a existência de um distanciamento que não é apenas espacial quanto temporal. Nessa perspectiva, o poeta acha-se longe do que aborda, consegue olhar uma certa realidade como se estivesse fora dela. De outro, a oposição entre o elemento natural (que é essencial) e o artificial (marcado pelo consumismo), que levou Regina Zilberman a observar que a essência da poesia de Quintana prende-se à denúncia contínua da “substituição dos valores espirituais pelos artigos de consumo”. Ora, esses elementos, que encontram certo consenso na análise da obra do poeta, facilitam-nos em tese o caminho. Do corpus escolhido dos 40 poemas, trabalhamos mais intimamente com 20 deles, que se encontram reunidos no final deste artigo. Daí, recolhemos, claramente, uma dupla visão (ou versão) da cidade que o poeta nos possibilita: a cidade do interior ou a cidade antiga, o arrabalde, a ruazinha, o porão, a janela etc. Verificamos que o poeta parte de uma visão relativamente ampla (o todo da cidade) para ir-se concentrando gradualmente até as partes de interior da cidade, mais íntimas, que nos permitem melhor os (des)encontros conosco mesmos. Esses espaços, contudo, encontram-se distantes, tanto no tempo quanto no espaço. Assim, o que se desenha, de certo modo, é uma cidade idealizada. Outro espaço é a cidade real, com todas as suas contradições, seus desafios, seus malbaratamentos. Aqui se exerce a crítica à alucinada urbanização, à

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constituição das megalópoles, ao sentido de abandono e de anonimato que marcam tão fortemente sua poesia, na medida em que se constata a reificação humana, concretizada no arranha-céu, que é o caos absoluto para o poeta. Essa é a cidade do presente e do aqui do poeta, cidade em que ele sobrevive, cidade que ele critica, mas que também descobre à medida que por ela passa. Na cidade antiga, ainda é possível a visão lírica das coisas, a relação amorosa concretizada, a personalização dos acontecimentos, enfim, estamos num domínio plenamente humano das relações. Na megalópole, ao contrário, a visão crítica e dramática é a tônica, porque aí experimentamos a absoluta carência, o isolamento, o anonimato, enfim, a desumanização. Mas é nesse espaço que as contradições se revelam e, de certo modo, se resolvem, graças aos acontecimentos que ali têm lugar. Nesse sentido, a poesia de Quintana apresenta-se como uma poesia não utópica, não idealista, pelo contrário, uma poesia altamente crítica, embora também muito concreta, com os pés muito no chão. Se ligarmos essa observação ao fato de ser Quintana dono de um humour invejável, veremos como esta reflexão tende à unidade: o poeta é capaz de reconhecer a realidade, criticando-a, mas sabe, ao mesmo tempo, seus limites. Essa cidade-síntese, observe-se enfim, chama-se Porto Alegre. É para Porto Alegre que Quintana dirige alguns de seus mais belos poemas. É em Porto Alegre, em última análise, que o poeta admite viver, ainda que não deixe de criticá-la. A partir da pequena coletânea de poemas que apresentamos ao final deste ensaio, observemos alguns desses trabalhos e suas tendências. Em “O mapa” (p. 104), um de seus mais conhecidos poemas, Quintana trata a cidade como um corpo vivo, para o qual ele, semelhante aos anatomistas dos séculos passados, dirige sua atenção. Esse corpo vivo é pulsante – à semelhança do corpo do poeta – e por isso dói. Dói menos pelo que tem, mas, sobretudo, pelo que não terá: as ruas por onde não passará, os lugares que não conhecerá... Valendo-se de um espanholismo (esquisita) com valor de “estranheza”, o poeta sente-se distanciado e não identificado com a paisagem que, no entanto, aparentemente tão bem conhece. Por isso mesmo, há uma espécie de estranhamento, o que lhe permite melhor a observação. A nuança das paredes, por exemplo, retomando a imagem inicial da cidade como um corpo vivo, é como se fosse a escritura das ruas. Por isso, numa quase paráfrase de Manuel Bandeira,

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no seu célebre “Vou-me embora pra Pasárgada”, Quintana introduz uma quadrinha que começa com “Há tanta moça bonita/ nas ruas que não andei”, para concluir sobre o andar por esse mapa com uma mobilidade diversa, leve, com vago objetivo: folha levada, aproximando-se da morte, assumindo sua velhice num longo andar pela vida, o poeta nem por isso deixará de intentar ultrapassar-se mediante o prolongamento da vida graças ao olhar da amada, uma amada que é, simultaneamente, a morte e a própria cidade, na medida em que chegaria então à cidade ideal. Mencionada especificamente, Porto Alegre não é uma imagem generalizada, mas também não é uma cidade objetivada. Ela se concretiza através de um elemento real – suas ruas e suas personagens – semelhante aos caminhos da vida. Dessa forma, o poema é simultaneamente sobre a cidade, mas, também, sobre a própria vida que decorre nessa cidade. Idealizado sobre uma oposição – o que existe de fato e o que não se pode visitar –, o poema inverte sua direção ao final: a cidade, transformada na amada, quando o poeta é então apenas uma folha levada pelo vento da madrugada, passa ela a olhá-lo e, de certo modo, a constituí-lo, sendo então o seu repouso. Tom diverso é aquele adotado em “Canção da ruazinha desconhecida” (p. 105). A partir do uso do diminutivo (ruazinha), sempre reiterado, o poeta admite encontrar-se num território que domina apenas parcialmente (conhece a pequena rua a partir da esquina em que a mesma se inicia). Ou seja, não se trata exatamente de uma rua real, pois que ele não a percorreu em nenhum momento (é uma ruazinha perdida), mas inventada. Nessa rua, como se pode lembrar do “Livro de Jó”, Marta fia, ou seja, fica a passar o tempo, à espera de algo, como aquela Penélope por Ulisses. Essa rua inventada, por isso mesmo, semelha uma outra vida, aquilo que poderia ser uma utopia. É também, nesse sentido, a morte para onde o poeta, um dia, irá se mudar. Contudo, à medida que o poema avança, também sua leitura se modifica. A ruazinha não mais é perdida como tristonha, e, nela, Marta a fiar torna-se uma imagem mais prática da vida, quando contrastada com a figura de Maria, introduzida apenas no último verso, e que se encontra na janela, a sonhar, esta sim, a imagem poética mais forte. Citamos antes a transformação do poema, sua troca de tonalidade. E quando isso ocorre? Observe-se que a canção, estrito senso, está formada por três quartetos. Contudo, tais quartetos estão desmembrados em blocos de dois

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versos cada um, sendo que todas as estrofes iniciam-se pela referência à ruazinha, à exceção daquele bloco onde o poeta refere que pretende mudar-se para aquela rua, “quando tudo estiver perdido...”, isto é, quando ele chegar à morte. É então que ocorre a troca de tonalidade. A rua idealizada transforma-se numa rua concreta, por isso mesmo, mais tristonha. É a rua-símbolo da outra vida, sim, mas, sobretudo, uma vida bem menos interessante e poética do que essa atual, quando o tempo, definitivamente, fica suspenso. O diminutivo não é uma prática literária incomum na poesia de Mario Quintana. Pelo contrário, sua presença é quase corriqueira, como neste “As ruazinhas” (p. 105). O curioso, porém, é que o diminutivo em Quintana nem sempre segue a tendência do idioma português de aproximação, de carinho. Pelo contrário, ele indica, muitas vezes, certa distância criada pelo desconhecimento que o poeta tem do objeto a que se refere. Esse é o caso do poema em pauta. Apesar de o título do poema valer-se do diminutivo ruazinhas, o vocábulo só aparece ao final da peça. Antes, a referência constante é para as pequenas ruas, forma muito mais prosaica e, em certo sentido, mais retórica: essas ruas são descritas em minúcias, concretizam-se nas casas de porta e janela. Porta e janela, por seu lado, abrem uma imensa disponibilidade para o olhar do passante, mas, nem por isso, deixam de manter nuas as próprias ruas. E a solidão é tão dramática que os lampiões parecem álamos, esgarçando-se, como se buscassem algo ou quisessem agarrar alguém, com uma flexibilidade que faz com que suas chamas oscilem como galhos ao vento, única coisa viva nessa paisagem morta. Valendo-se da relatividade permitida a quem não se aproxima física, mas mentalmente de uma paisagem, o poeta sente tais ruas simultaneamente perto e longe, porque as pressente como reconhecíveis, mas admite, ao mesmo tempo, desconhecê-las. As ruas, assim, tornam-se algo irreal, projeções (idealizadas), como pinturas de parede (sombras – alusão à caverna de Platão?), como filmes, que existem mas não são (mais). A solução para essa contradição, contudo, esboça-se no movimento final do poema, quando, apropriando-se de tal paisagem, o poeta introjeta-a. É quando as pequenas ruas se tornam ruazinhas: o poeta encontra a síntese buscada; encanto ou desencanto, longe ou perto, conhecidas ou não, tais ruazinhas significam algo exclusivamente para ele.

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“Tempo perdido” (p. 106) é um texto exemplar sobre a identidade entre tempo e espaço. Porque este havia um tempo deve igualmente ser lido como um havia um lugar. Naquele tempo e naquele lugar, as estrelas, as crianças, o cachorro e o relógio eram absolutamente possíveis. E por ser um tempo e um lugar inventados, o relógio – único elemento artificial de todo o conjunto – não mede o tempo, mas medita: o que é tarefa, aliás, da própria poesia: o jogo com o tempo. O soneto “XXXIV” (p. 106), de A rua dos cataventos, é outro bom exemplo para a mescla entre espaço e lugar, ou, ainda, diferentes lugares podem ser lidos em diferentes níveis de interpretação. O soneto escolhe o arrabalde como seu espaço de enfoque, caracterizado pela existência do lampião (que mal ilumina, permitindo, assim, contraditoriamente, a poesia da imaginação e a pobreza da vida cotidiana). Aí se vive em infinita solidão, reduzindo-se os moradores a estrelinhas quietas – ou seja, personagens diminutas, anônimas, quase sem significação . A cidade está aqui apresentada pela metonímia do centro. As estrelinhas quietas – as menininhas pobres do segundo quarteto – lá não terão qualquer oportunidade. Mas é para aquele Centro – agora sim com maiúsculas, porque mitificado, encarando todo o significado de utopia e da realização – que as atenções se dirigem, aquele Centro de explosiva iluminação, onde as estrelinhas por certo se perderão. Mas é para aquele Centro que todas querem ir. O poeta, então, distanciando-se das imagens que percebe, imagina o sofrimento que as menininhas pobres hão de experimentar. Ele, contudo, parece que já conhece aquela realidade – terá ele também sofrido tal desejo? – e por isso refere a Cidade do Prazer como uma doida (que poderia ser lida também quase que como doída...). O contraste entre o natural e o artificial, evidente nesse poema que não esconde a existência de uma frustração por não se chegar de um lugar até o outro, retorna em um pequeno fragmento, como “Urbanística” (p. 107). O contraste aqui, porém, um ocorre diretamente no interior do próprio arrabalde e sob enfoque diverso: o poema compõe-se de apenas três segmentos frasais. No primeiro, parece esboçar-se uma imagem poética da paisagem do arrabalde: jardins bem arrumados, a que se seguem, numa gradação que se aproxima da ironia, os diminutivos bonitinho, comportadinhos... Na sequência, a quebra da linha seguida e a oposição/protesto, através de uma dupla indagação: por que não a natureza selvagem do matagal? (Observe-se o vocábulo a indicar algo grande,

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mais do que uma rima interna para o ser natural que se segue.) A aparente ordem dos jardins bem arrumados revela-se uma artificiosidade que controla e desnaturaliza, assim, os matagais selvagens... O título do poema diz tudo: a intervenção do técnico desumaniza o arrabalde. Do mesmo A rua dos cataventos, o soneto “XXIII” (p. 107) retoma o tratamento diminutivo da cidade, numa elocução que se aproxima muito da oração cristã da Ave Maria. O diminutivo, aqui, é crítico: a cidadezinha é pequenina, com seus burricos, a igrejinha que tem uma torre só... Tudo é a imagem da desolação, nascida do contraste entre aquele cheia de graça e o seguinte causa dó, em paralelismo com a graça ingênua dos burricos a pastar na praça diante da igrejinha de uma torre só. Quintana diverte-se aqui com as citações indiretas, primeiro de Drummond (como é vasto o mundo), depois de Alceu Wamosi (eu que de longe venho perdido). E nesse divertimento, trata de animar a cidade que não é, afinal, assim tão pacata: as nuvens movimentam-se e a torre única da igreja cisma com a vastidão do universo. O poeta, então, sentindo-se desenraizado, imagina-se seu natural. Seu sentimento, contudo, numa rápida troca de registro, inverte-se: sente sua vida tão pequenina que poderia morar naquela cidade. E assim, sua vida, como a cidadezinha, poderia ser abarcada inteiramente por um único olhar. A imagem da cidade do interior como uma realidade calma e tranquila reaparece na sutileza do poema “A diferença” (p. 108), onde se estabelece um contrassenso entre o seu brilhar (que permite a contemplação e a admiração) e o arder da cidade grande (que se autoconsome e, consequentemente, extingue). Distanciando-se, porém, do maniqueísmo das divisões binárias, Mario Quintana reconhece que sua poesia se alimenta tanto da poluição sonora das grandes cidades quanto do silêncio das pequenas, como expressa em “Os ruídos e o silêncio” (p. 107) (observe-se o bom uso dos contrários): os ruídos, por serem fragmentários, aparecem no plural, enquanto o silêncio, que é um continuum, basta-se no singular mesmo. Chegamos então à esta síntese irônica em “Antes e depois” (p. 108), traduzida num antes e num depois, a que se soma a boa exploração do adjetivo deslocado em relação ao substantivo, contrastando mordazmente a cidade de Porto Alegre enquanto uma grande cidade pequena, no passado, e uma pequena cidade grande, no presente.

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A visão crítica da cidade permanece no texto “Os ruídos da cidade” (p. 107), ainda uma vez irônico e ferino. Até mesmo pelo uso da aliteração cuidadosamente disfarçada na segunda parte do texto (pensarão, polidamente, apenas, pneu estourou) – Quintana evidencia o anonimato e a violência potencial que esse anonimato citadino nos traz. A ironia volta-se unicamente contra uma experiência, imensa e avassaladora, por isso mesmo corrente na alta noite: a solidão. Eis a perda da solidariedade, o distanciamento entre os seres. A incompatibilidade entre o ser e o viver. O tema ganha contundência em “Notas da cidade” (p. 108), em que, já no título, o poeta extravasa sua ambiguidade: por serem notas, era possível esperar uma espécie de canção ou hino. Afinal de contas, as notas sugerem música, e músicas nos conduzem à louvação. Contudo, o sentido parece dirigir-se mais para o universo semântico do noticiário de jornal. O texto, desdobrado em dez pequenos fragmentos, desenvolve diferentes e negativos aspectos da vida urbana. Os cinco primeiros textos são voltados para os aspectos externos da nova arquitetura, desde a contundência dos ângulos das construções contemporâneas até a resistência (isto é, a dureza) de seus materiais, que, como observará em outro poema, não permite a criação da pátina do tempo. Aqui, porém, ao conceito temporal da durabilidade, ele imediatamente opõe o conceito espacial do constrangimento, quando aproxima a moradia num sapato, numa falsa citação de uma história infantil, àquela em uma caixa de sapato. A metaforização é redutora e humilhante, sem dúvida, eis que nos reduzimos não à essência (o sapato), mas ao instrumento de seu transporte (a caixa), que deveria ser, pela lógica, maior que o objeto que contém. Jogando, a seguir, com um trocadilho simples (esses tetos me abafam), o poeta persiste na ideia da humilhação que significa a necessidade de procurar uma casa, na medida em que ele se vê obrigado a trocar constantemente de residência por força da ganância dos proprietários dos velhos casarões, que os vendem e entregam às demolições. O ritual sofrido pelo poeta é visualizado sob uma óptica de humour muito comum ao escritor, que se coloca, com certa ironia, como uma pobre vítima do progresso e do clamor público. O tom irônico continua no poema seguinte, quando ele aborda sua resistência ao que chama de arquitetura nova, por ser incapaz de construir uma casa velha (a aproximação dos contrários é de rara felicidade). Quintana amplia

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aquela ironia, ao explicitar que o leitor não deve rir, porque se trata de um poema triste. A partir desse momento, o poema modifica seu curso. Deixa de falar apenas no aspecto físico da arquitetura, para abordar seus desdobramentos emocionais, com reflexos que se poderia dizer para uma sociologia das emoções: o poeta relaciona a arquitetura nova com o surgimento de uma instabilidade social e individual. Passa a exemplificar a teoria. Primeiro, com a referência aos antigos cafés “sentados fumados conversados”, diante dos atuais “cafés de barranco”. Porque nos antigos cafés sentados fumados conversados permitia-se a atividade escatológica de destruição/recriação do mundo, o que não é mais possível nos novos cafés, onde não se pode sentar, já que o tempo, “não tem [mais] tempo de sentar”. Na conclusão do fragmento, uma terceira passagem semântica: contra a aparente inanição material – pensar e não fazer nada – afirma-se a ação imaterial, mental, criativa do “bem assentar as ideias”, que é, no fundo, o que ele defende categoricamente. Depois, aproxima os tijolos de um velho muro derrubado aos tijolos de sua própria constituição emocional. Num movimento de aproximação de lentes do geral para o particular (iniciado pelos ângulos da construção e a própria construção, até o detalhamento das cenas que se passam nas construções), Mario Quintana chega aos cafés e ao muro. Uma vez mais, opera o deslocamento característico de sua obra: não estamos mais a falar apenas dos espaços, mas também do tempo. Não falamos mais apenas do exterior, mas também do interior, que surge com a dolorida indagação final: “E quando põem abaixo, então, a velha casa em que nascemos?” Não se trata mais de uma casa qualquer, mas exatamente daquela casa em que viemos ao mundo. Observe-se que é nesse momento que o poema mune-se de um pronome indefinido implícito: [eles] põem abaixo. Aqui, uma vez mais, a metaforização escapa do real, puramente material e concreto, para o ideal e o simbólico. A casa não é mais apenas a construção de tijolos, mas o próprio edifício psicológico que a personalidade afirma, ao longo dos anos, e que, com tal instabilidade, fica sem seus pontos de referência, tornando-se ela própria instável. Verifica-se, então, que as notas da cidade, apesar de se referirem imediatamente ao aspecto externo das construções, no fundo estão a falar de seus residentes, os seres humanos, ainda que jamais mencionados explicitamente em todo o texto. As notas, dessa maneira, como

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no noticiário fragmentado do jornal, refletem a própria fragmentação da experiência humana da cidade. O poema seguinte, dedicado ao amigo arquiteto Fernando Corona, intitula-se “Arquitetura funcional” (p. 109). Corona era um catalão. Baixo, atarracado, extremamente inteligente, sagaz em suas tiradas, demorava-se muitas vezes a conversar com o poeta. Tal poema constrói-se a partir de ideias opostas que puxam umas às outras. Assim, repetindo a ideia anterior, o poeta opõe à arquitetura nova as casas velhas para, imediatamente depois, retomar a ideia da casa nova e vê-la carente dos fantasmas, aos quais opõe, por seu lado, as assombrações vulgares, reafirmando a importância de uma presença invisível (ainda os contrários aproximados). Num segundo movimento, aborda-se a vida infantil, lamentando-se que as casas atuais não mais possuem porões ou sótãos. No movimento conhecido de saltos semânticos, contudo, o poeta distancia-se do aspecto puramente físico da casa para transladar-se ao psicológico: as crianças ficarão sem o mistério e sem o sonho. Porque é só no porão ou no sótão (referências freudianas ao inconsciente e pré-consciente?) que se formam tais elementos – hóspedes clandestinos –, que se deve ocultar sucessivamente às visitas, aos confessores, aos professores e aos profetas, mas aos quais não se pode nem se deve renunciar em hipótese alguma. Porões e sótãos, pois, encontram-se no interior da alma e é ali que se afirma a personalidade do ser humano. Ao final do poema, contudo, o escritor retoma a ideia inicial, aparentemente perdida, da própria constituição física da casa. Mas o faz a partir daquelas partes que servem para que as pessoas se movimentem, cheguem e saiam, os velhos corredores, onde então a Lua vem assombrar, com o que se completa a imagem inicial dos fantasmas e das assombrações vulgares, afinal, elas também com seu lugar reconhecido na casa original de cada um de nós. Após tais observações, não nos surpreende que, no “Poema de circunstância” (p. 110), o poeta aproxime sua imagem daquela do boi a pastar e, consequentemente, como ao final da obra, do condenado. Explorando a visualidade e a paródia da brincadeira infantil da descoberta dos objetos da realidade que o bicho comeu e literalmente engoliu e deglutiu, aqui, graças às grandes e enormes construções, o texto opõe aqueles antigos monstros naturais pré-históricos aos monstros contemporâneos, os arranha-céus, muito mais perigosos e destruidores.

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Para contrastar com tais animais ferozes, o poeta transfigura-se num boi. Sua deglutição (ainda o tempo) está concretizada no olhar dirigido a uma grande árvore (neste sentido, a árvore surge igualmente como um ser milenar), tão antiga quanto os bichos pré-históricos. E o olhar traduzido no cromatismo múltiplo, perseguido desde o início do poema, dinamiza-se com o movimento contrastante que o pastar (algo lento, mas que é incentivado pela repetição do imperativo pastai) permite, até nova quebra de ritmo: a imagem final sugere que os monstros arranha-céus conseguem vencer; o último olhar do poeta, voltado para a árvore, é como o olhar de um condenado (a árvore, sinal de permanência da vida, não apenas corre o risco de ser derrubada pelo novo arranha-céu – “mas já estão gestando um monstro de permeio” – quanto se transforma no próprio elemento de execução e eliminação do poeta: será do alto de um de seus galhos que ele penderá, talvez). A referência bíblica de “Babel” (p. 111) aproxima a torre do arranha-céu, sobretudo quando sua degradação amplia-se mais ainda, reduzindo a construção a um simples espigão. Nesse poema, os construtores são aproximados à noção de demolidores múltiplos, da beleza e da comunidade dos seres humanos. Demolidores, os construtores criam às avessas: subterrâneos que fazem com que os seres humanos se tornem minhocas (rastejando) ou elevadas pairando sobre a terra, sem os pés no chão. Em ambos os casos, o que incomoda o poeta é ser tudo tão desnatural, semelhante a uma novela de Kafka. A esse primeiro movimento de “Babel”, segue-se uma segunda alusão, esta atualizada e próxima: o Rio de Janeiro, a partir de uma experiência vivida pelo poeta quando de uma visita à antiga capital federal, passando por seu novo aeroporto, por ele classificado como um pesadelo técnico. O tecnicismo do aeroporto e o barulho ensurdecedor da britadeira ao lado de seu quarto felizmente dão lugar ao largo do Boticário, oásis de casarões coloniais e lampiões (sempre as mesmas imagens para significar a essência das coisas – imagens de espaço que referem também o tempo), fazendo-o admirar a construtora inteligente que se preocupou com tal manutenção. “Babel” é, assim, um poema circular, que atualiza o episódio bíblico, permitindo-se pequeno contraste que parece apontar para a esperança de que nem tudo esteja perdido. Se a maioria dos construtores são demolidores, existe ao menos uma construtora inteligente (será mera coincidência a incidência do fe-

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minino nesse exemplar positivo, ao contrário da menção inicial do poema posta no plural e no masculino?) capaz de revalorizar o antigo. O mesmo ocorre com “O chalé da praça XV” (p. 111), já então sob absoluto domínio da rememoração. O chalé é uma das construções mais tradicionais da cidade de Porto Alegre. Acha-se bem no centro da cidade, na praça XV, e já viveu fases de grande e enorme afluência e fases de total abandono. Hoje em dia, recuperado, ficou um pouco à margem do movimento dessa área da cidade. Quando da criação do poema, contudo, entre os anos 1950 e 1960, o chalé ainda era de enorme referência para a vida intelectual da capital sul-rio-grandense. No poema, desde logo, o chalé acha-se antropomorfizado, pois é descrito metonimicamente pela gente que o frequentava: melhor, pelas pessoas – poetas – que o frequentavam junto com Quintana. Assim, permite a evocação dos amigos: Bilu (Augusto Meyer), Reynaldo [Moura], Cavalcanti (artista plástico ilustrador da Revista do Globo) e, curiosamente, o próprio poeta, que se coloca, assim, à distância de si próprio – distante uma vez mais, no tempo e no espaço, como demonstrará o restante do poema. Figuras silenciosas, que se ouvem a si próprias, silêncio quebrado apenas pela figura de Athos [Damasceno Ferreira], centrífugo e pirotécnico (observe-se a utilização das proparoxítonas a criar escarcéu auditivo ao texto), mas que acaba cingindo-se à tônica dos demais companheiros. Cria-se então um rio de silêncio subterrâneo – rio de poesia – harmonia confusa (outra vez os contrários) das almas, um continuum que de repente é interrompido pela conclusão que imediatamente atualiza a lembrança: hoje, existe apenas o rio do tempo que passou. Mais uma vez, o poema mescla os conceitos de espaço (o chalé) e de tempo (rio que passou), permitindo a aproximação das duas realidades que a lembrança recria, parodiando uma conhecida marchinha de carnaval (interessante registrar o quanto Mario Quintana se vale do cinema, da música popular, de outros poetas para a composição de suas obras. Seria isso uma influência da prática jornalística, que o mantém sempre ligado à realidade imediata? E/ou também de sua constante prática de leitura/releitura da poesia de si próprio e dos demais poetas?). Mostrando, contudo, que não é apenas da memória que vive sua poesia, mas também da observação e de participação no cotidiano da cidade, temos dois poemas menos resistentes ao tempo, obras mais presas ao momentâneo dessa matéria jornalística de que tanto se alimenta a poesia de Mario Quintana: “Uma surpresa” (p. 112) e “O velho Mercado e a nova praça” (p. 113).

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“Uma surpresa” inicia-se como narrativa policial, que tanto admira o poeta, suspendendo-se imediatamente a ação e deixando, no leitor, a curiosidade provocada. O narrador então muda seu foco e descreve um cenário relativamente caótico, marcado pelas demolições (sinal de morte) que provocam desolação e confusão, para refletir a respeito da cidade pronta. Para ele, trata-se de buscar um difícil equilíbrio: nem as atuais cidades, semelhantes a um formigueiro às tontas, nem Brasília, demasiadamente pronta, como maquete inanimada. O poeta deseja algo com certa pátina de tempo, com historicidade (a marca do homem) e com tradição (a memória dessa história). O contraste com o caos surge, então – criado todo clima entre suspense e poético –, na figura da sobrevivente palmeira que se revela aos nossos olhos. Observe-se que tudo acontece, conduzido pelo texto de Quintana, como uma revelação, uma epifania que mostra a vida verdadeira e natural, exuberante, traduzida pela palmeira, em meio à morte e à artificialidade dos arranha-céus. O texto faz uma pausa para reflexão. O paralelismo desdobrado reflete sobre a capacidade do homem de matar milhares de seres humanos pela simples pressão de um botão, coletivamente, opondo-se-lhe a morte individualizada, heroica, cara a cara. Em outro registro, a destruição das florestas e a surpresa em poupar-se uma árvore isolada como aquela palmeira. Esquecimento ou sentimento, indaga-se o poeta a respeito do real motivo de tal gesto. Mas o que se reafirma é a palmeira – alta, viva, verde. E o texto conclui-se com um traço esperançoso de melhores dias. “Uma surpresa” promove, uma vez mais, a responsabilidade do indivíduo (não do individualismo, atenção) característico da poesia de Quintana, que jamais aderiu à massificação e ao anonimato. O coletivo, sim, interessa ao poeta, como se depreende de “O velho mercado e a nova praça”, mas um coletivo que não abre mão, em hipótese alguma, das individualidades que o compõem. Esse poema parte clara e explicitamente de notícias de jornal, prática comum em Mario Quintana. A essas notícias, o poeta junta sua palavra. Embasando-se no contraste entre o velho e o novo, Quintana demonstra que tais conceitos não são necessariamente antípodas. Um mercado público velho (e não antigo, note-se a variante do vocábulo) desprovido de seu recheio e recriado, reanimado, por motivos sentimentais e estéticos (uma vez mais a duplicação dos motivos), permitiria uma praça interna (como as antigas mansões coloniais de

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influência espanhola, quem sabe reminiscências de sua meninice em Alegrete), chafariz, cadeiras sob as arcadas (o mesmo movimento do geral para o particular já verificado em poemas anteriores), permitindo a recriação de um espaço em Porto Alegre teoricamente possível de persistir apenas na zona rural (o espaço interior que possibilita um tempo interior, antigo, essencial). Aí caberia a banda de música, se a palavra para o ouvido certo permitir a ação adequada do poder público e de alguma construtora, para ficarmos nas imagens do próprio poeta. A conclusão do poema é belíssima, pois permite um dinâmico movimento de alusões que passa de uma área semântica para a outra, levando-nos à adesão do tema que alimenta o poema. Saímos da imagem ideal, construída pelo texto, para a constatação da necessidade de uma intervenção adequada, sem o que nada disso ocorrerá (felizmente, essa ideação aconteceu, eis que o velho mercado foi devidamente recuperado, equilibrando o antigo e o novo. Não sei o que Mario Quintana diria da obra, se a visse hoje em dia, mas sei que as pessoas ali acorrem, ao longo de todo o dia, e o velho mercado manteve sua vitalidade da antiga freguesia, incorporando, ao mesmo tempo, um novo público). Para concluir este exercício, avançamos um dos temas e das paixões mais constantes do poeta: os céus da cidade. Em “Apontamentos para um poema” (p. 114), como que a extravasar seu sentimento, indaga-se ele como faria para levar os céus de Porto Alegre para o Céu, numa aproximação contrastada entre os céus reais da cidade e o conceito religioso da outra vida. É no soneto “XXI” (p. 114), contudo, de A rua dos cataventos, que o tema vem mais desenvolvido. O poema é fundamentalmente uma evocação dos amigos que já partiram: Gadêa, Pelichek, Sebastião, Lobo Alvim, companheiros de ideais noitadas (o que já cria de per si um contraste, eis que as noitadas são elementos extremamente concretos às quais se aproxima um adjetivo ideal – os personagens evocados são poetas, artistas plásticos, músicos... enfim, um grupo notívago de jovens criadores e amigos entre si). Não obstante sua juventude, a tradição romântica perdura. A solidão é o sentimento experimentado pelo poeta que reconhece, porém, continuarem suas almas próximas, do que tem prova pelo sentimento das passadas dos amigos na calçada. No solilóquio que o soneto desenvolve, o poeta assume seu amor pela vida, ainda que uma vida mentirosa, porque feita de ilusões. Vencendo um eventual

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constrangimento, assume-se como romântico vagabundo (o que, de certo modo, é uma redundância), liga as duas realidades, a da morte e a da vida, através dos céus que tanto ama, antecipando a perspectiva do poema antes mencionado: os céus da outra vida concretizam-se nos céus dos crepúsculos de Porto Alegre, que seriam pintados exclusivamente por São Pedro (em alusão ao padroeiro da província, ao mesmo tempo em que alude ao guardião das chaves do paraíso). O soneto, como se sabe, popularizou-se. Ainda hoje, não é raro ouvir-se um porto-alegrense afirmar que o pôr do sol da cidade é o mais lindo do mundo... Poderíamos continuar indefinidamente a análise da poesia de Mario Quintana sob tal perspectiva, mas paramos por aqui. O que queremos caracterizar, de modo objetivo, pode ser demonstrado à saciedade na leitura desses textos. A poesia de Quintana está fortemente marcada pelo elemento urbano. Esse urbano, contudo, é um elemento real tanto quanto ideal. No seu aspecto cotidiano, merece reparos por parte do poeta: ele o prefere na sua dimensão antiga e interiorana ao caos anônimo da paisagem da megalópole contemporânea, marcada pelos arranha-céus e a massificação, o egoísmo e o individualismo. A paisagem urbana antiga, caracterizada pelo lampião, a pequenina rua, a cidadezinha onde era possível colocar as cadeiras nas calçadas, pode, eventualmente, ser recriada ou reencontrada. Contudo, mesmo a grande cidade nos permite surpresas e afirmações do humano: uma ár vore descoberta repentinamente, a recuperação de um recanto ou de um prédio e, sobretudo, a imensa abóbada dos céus crepusculares da cidade. Entre a memorialística cidadezinha interiorana e antiga, duplamente distante no espaço e no tempo, e a contraditória e agressiva cidade atual de novas formas arquitetônicas, Mario Quintana reconstrói e valoriza os espaços livres que a real Porto Alegre lhe permitiu e assim idealiza uma cidade utópica, feita mais de memória e de relações de amizade do que propriamente de matéria dura do tipo daquela que se utiliza na construção dos arranha-céus. É assim que, mesmo na cidade, ele reencontra e reafirma o humano.

Antonio Hohlfeldt é professor de teoria da comunicação e de comunicação e opinião pública no programa de pós-graduação em comunicação social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e é autor de ensaios sobre Adélia Prado, Ignácio de Loyola Brandão, Carlos Heitor Cony e Erico Verissimo para os CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA do IMS.

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ANTOLOGIA

O mapa Olho o mapa da cidade Como quem examinasse A anatomia de um corpo... (É que nem fosse o meu corpo!) Sinto uma dor infinita Das ruas de Porto Alegre Onde jamais passarei... Há tanta esquina esquisita, Tanta nuança de paredes, Há tanta moça bonita Nas ruas que não andei (E há uma rua encantada Que nem em sonhos sonhei...) Quando eu for, um dia desses, Poeira ou folha levada No vento da madrugada, Serei um pouco do nada Invisível, delicioso Que faz com que o teu ar Pareça mais um olhar, Suave mistério amoroso, Cidade de meu andar (Deste já tão longo andar!) E talvez de meu repouso...

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Canção da ruazinha desconhecida Ruazinha que eu conheço apenas Da esquina onde ela principia... Ruazinha perdida, perdida... Ruazinha onde Marta fia... Ruazinha em que eu penso às vezes como quem pensa numa outra vida... E para onde hei de mudar-me, um dia, Quando tudo estiver perdido... Ruazinha da quieta vida... Tristonha... tristonha... Ruazinha onde Marta fia e onde Maria, na janela, sonha... As ruazinhas Eu amo de um amor que jamais poderei expressar Essas pequenas ruas com suas casas de porta e janela, Ruas tão nuas Que os lampiões fazem as vezes de álamos, Com toda a vibratilidade dos álamos, petrificada nos troncos imóveis de ferro, Ruas que me parecem tão distantes E tão perto A um tempo Que eu as olho numa triste saudade de quem já tivesse morrido, Ruas como as que a gente vê em certos quadros, Em certos filmes: Meu Deus, aquele reflexo, à noite, nas pedras irregulares do calçamento,

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Ou a ensolarada miséria daquele muro a perder reboco... Para que eu vos ame tanto Assim, Minhas ruazinhas de encanto e desencanto, É que expressais alguma coisa minha... Só para mim! Tempo perdido Havia um tempo de cadeiras na calçada. Era um tempo em que havia mais estrelas. Tempo em que as crianças brincavam sob a claraboia da lua. E o cachorro da casa era um grande personagem. E também no relógio de parede. Ele não media o tempo simplesmente: ele meditava o tempo.

XXXIV

Lá onde a luz do último lampião Um triste charco alumia embalde, Moram, numa infinita solidão, As estrelinhas quietas do arrabalde... Na cidade, quem é que atenta nelas, Na sua história anônima, escondida? São menininhas pobres às janelas, Olhando inutilmente para a vida... Quando ao centro descemos à noitinha, Penso às vezes o quanto essas meninas No seu desejo triste hão de sofrer Ao ver os bondes que, do fim da linha, Partem iluminados com vitrinas, Para a doida cidade do prazer!...

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Urbanística Essas vilas de arrabalde com seus jardins bem arrumados, bonitinhos, comportadinhos... Mas por que não a liberdade de um matagal selvagem? Por que não deixam ao menos a natureza ser natural?

XXIII

Cidadezinha cheia de graça... Tão pequenina que até causa dó! Com seus burricos a pastar na praça... Sua igrejinha de uma torre só... Nuvens que venham nuvens, nuvens e asas, Não param nunca nem um segundo... E fica a torre, sobre as velhas casas, Fica cismando como é vasto o mundo! Eu que de longe venho perdido, Sem pouso fixo (a triste sina!) Ah, quem me dera ter lá nascido! Lá toda a vida pode morar! Cidadezinha... Tão pequenina Que toda cabe num só olhar... A diferença No campo as estrelas brilham. Na cidade, as estrelas ardem. Os ruídos e o silêncio Duas coisas ativam minha poesia: a poluição sonora das grandes cidades e o silêncio das cidades pequenas...

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Antes e depois Porto Alegre, antes, era uma grande cidade pequena. Agora, é uma pequena cidade grande. Os ruídos da cidade Não, não tenhas escrúpulos: se, alta noite, meteres uma bala no ouvido, os vizinhos pensarão – polidamente – que foi apenas um pneu que estourou. Notas da cidade Ah os ângulos contundentes das atuais construções urbanas... *** O mais triste da arquitetura moderna é a resistência do seu material. *** Havia não me lembro agora se no País das Maravilhas, da Alice, ou se na Cidade de Oz, uma velha que morava num sapato... E nós que moramos em caixas de sapatos! *** Esses tetos baixos me abafam... De modo que só resido em casas antigas. Acontece é que as casas velhas têm proprietários velhos, muito velhos, aliás, e por isso mesmo muito morredores. E seus herdeiros resolvem sempre vendê-las a construtores de edifícios. Há anos que venho me mudando: Sou uma pobre vítima do surto do progresso e do clamor público. *** E como eu fui dizendo logo no início de um poema dedicado a meu amigo o arquiteto e escultor Fernando Corona: “Não gosto da arquitetura nova Porque a arquitetura nova não faz casas velhas...” Não riam, por favor, que o poema é triste. *** Em todo o caso, como todos já devem ter reparado, é nessas épocas de mudança arquitetônica que se dá a maior instabilidade social e individual. ***

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Havia antes, por exemplo, os cafés sentados fumados conversados, onde a gente arrasava o mundo, mas renovava o sonho, o ideário, a vida. *** Agora, só existem esses cafés de barranco por onde se passa às pressas e indignadamente como numa fila de desaguadouro público. Por isso é que a geração de hoje parece tão no ar. Não tem tempo de sentar. Para bem assentar as ideias é preciso primeiro sentar-se... *** E quantas vezes nós, ao passar por uma velha rua quotidiana, sentimos uma vaga inquietação, uma falta de não sei quê. Vai-se ver, é um simples lanço de muro que demoliram e que, tijolo a tijolo, fazia parte da nossa construção interior, da nossa estabilidade, em suma. *** E quando põem abaixo, então, a velha casa em que nascemos?! Arquitetura funcional Não gosto da arquitetura nova Porque a arquitetura nova não faz casas velhas Não gosto das casas novas Porque as casas novas não têm fantasmas E, quando digo fantasmas, não quero dizer essas assombrações vulgares Que andam por aí... É não sei quê de mais sutil Nessas velhas, velhas casas, Como, em nós, a presença invisível da alma... Tu nem sabes A pena que me dão as crianças de hoje! Vivem desencantadas como uns órfãos: As suas casas não têm porões nem sótãos, São umas pobres casas sem mistério. Como pode nelas vir morar o sonho? O sonho é sempre um hóspede clandestino e é preciso (Como bem sabíamos) Ocultá-lo das visitas

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(Que diriam elas, as solenes visitas?) É preciso ocultá-lo das outras pessoas da casa, É preciso ocultá-lo dos confessores, Dos professores Até dos Profetas (os Profetas estão sempre profetizando outras cousas...) E as casas novas não têm ao menos aqueles longos, intermináveis corredores Que a lua vinha às vezes assombrar! Poema de circunstância Onde estão os meus verdes? Os meus azuis? O Arranha-Céu comeu? E ainda falam nos mastodontes, nos brontossauros, nos tiranossauros, Que mais sei eu... Os verdadeiros monstros, os Papões, são eles, os arranha-céus! Daqui Do fundo Das suas goelas, Só vemos o céu, estreitamente, através de suas empinadas gargantas ressecas. Para que lhes serviu beberem tanta luz?! Defronte À janela aonde trabalho Há uma grande árvore... Mas já estão gestando um monstro de permeio: Sim, uma grande árvore... Enquanto há verde, Pastai, pastai, olhos meus... Uma grande árvore muito verde... Ah, Todos os meus olhares são de adeus Como o último olhar de um condenado!

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Babel Deus sabotou a construção da Torre de Babel simplesmente porque não gostava de espigões, ou arranha-céus, como poeticamente eram denominados em tempos que não vão longe. Hoje, basta o pejorativo de espigões, para verse o quanto o abominamos – com exceção dos construtores – estranho sinônimo dos demolidores da beleza e da comodidade do mundo. Era tão bom viver à flor da terra... Mas parece que eles, os construtores, andaram lendo por demais as novelas de ficção científica. Tudo são elevadas ou subterrâneos. Ou anda-se minhocando por debaixo da terra ou pairando em alturas. Se ao menos fossem jardins suspensos da Babilônia... Onde está o nosso querido chão humano? Tudo é tão desnatural! Quando ainda há pouco estive no Rio, encaminharam-nos diretamente da porta do avião para o túnel, ao fim do qual aconteceu uma escada rolante, depois mais um túnel e mais uma escada, depois a espera de que as nossas bagagens passassem por nós. Era o Rio, aquilo? Não: parecia que estávamos dentro de um conto de Kafka. No hotel perguntou-me o gerente se eu preferia um quarto de frente ou dos fundos. Escolhi um dos fundos porque haveria menos barulho. Engano d’alma! Lá nos fundos havia uma britadeira que trabalhou toda a noite. E, no regresso, puxa! Quanta fila de espera e quanto guichê e quanto elevador! E ainda os cariocas indagavam se eu não achava uma maravilha aquele novo aeroporto... Eu achava a coisa um pesadelo técnico. A sorte é que andei autografando no Largo do Boticário – um oásis no Rio de hoje, com seus casarões coloniais, com seus lampiões – e tudo aquilo reconstituído ou ressuscitado pela senhora proprietária do local – uma construtora inteligente. Chalé da praça XV O chalé fazia parte da gente. Me lembro do Bilu, com o seu perfil perpendicular de cegonho sábio, o longo bico mergulhado – não no gargalo do gomil da fábula, não propriamente no canecão de chope, que era de fato o que estava acontecendo – mas no poço artesiano de si mesmo.

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Me lembro do Reynaldo, redondo, pacato, amável, tão amável, pacato e redondo que parecia um desses personagens de romance policial que ninguém desconfia que seja o autor do último crime da mala. Me lembro do Cavalcanti, com a sua cara silenciosa e receptiva de mata-borrão. Me lembro de mim, silencioso. Sim, a determinada hora éramos todos silenciosos... essa hora em que não é preciso dizer nada, nem mesmo o verso inesquecível de Valéry: “Oh mon bon compagnon de silence!”. Este silêncio era apenas quebrado quando chegava o Athos, o Athos centrífugo e pirotécnico. Mas isto não perturbava o nosso silêncio, nem o próprio silêncio do Athos... Pois havia um profundo e misterioso rio de silêncio que corria subterraneamente a todas as nossas palavras. Era o rio da poesia? O rio da harmoniosa confusão das almas? Agora é apenas o rio do tempo que passou. Uma surpresa Quem desça a rua da Praia na praça da Alfândega e olhe para o alto, à esquerda, será, apesar desse cuidado, recompensado com uma surpresa que depois eu conto. Vivemos numa paisagem, ou antes, num cenário de demolições – o que faria da atual Porto Alegre uma ótima tomada para os filmes que passassem em Londres ou Berlim depois de bombardeadas. Isto – quem é que não sabe? – é o Progresso. Mas que desolação, que confusão! Quando é que viveremos numa cidade pronta? Não estou mandando contra Porto Alegre. Quando estive, há pouco, em São Paulo, era a mesma coisa e, na rua, aquela agitação de formigueiro às tontas, como se alguém lhe houvesse pisado em cima. Uma cidade pronta, disse eu? Mas não, não me falem em Brasília. Essa é pronta demais, tão pronta, tão limpa, tão exata que parece uma maquete em tamanho natural. Falta-lhe a pátina do tempo, isto que alguns chamam de historicidade e que eu chamaria simplesmente de tradição – que é coisa que não se inventa, como andaram querendo inventar o Vovô Índio para substituir o Papai Noel que nossos avós europeus importaram consigo, não de contrabando, mas dentro de seus corações, única bagagem indevassável aos fiscais da Alfândega.

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Pois bem, dentro do programa de demolição e construção em que estava incluído muito velho pardieiro a pedir caridosa eutanásia, mas onde se cometeu também muito crime como o assassinato do velho templo barroco da Igreja do Rosário – acontece que, ao fundo daquele bloco de velhas casas que foram demolidas na praça da Alfândega, que é que se vê, ao olhar à esquerda por cima do tapume? Uma palmeira! Lá bem no fundo, enfim liberta dos paredões entre os quais estivera encerrada. Que teria levado o empreiteiro de demolição a poupá-la? Porque era uma coisa viva, saída da natureza e não de mãos humanas? Bem, sei que se tem destruído florestas, como na guerra se destroem exércitos, cidades. Tão fácil esta última façanha... basta apertar um botão. O difícil é fazer a coisa individualmente, com uma só criatura. Embora a guerra não seja considerada crime, pois é feita coletivamente. Esta a diferença entre nós e os totalitarismos. Porque estes desconhecem a unidade do indivíduo humano. E, da mesma forma que executa friamente a destruição de florestas, o homem hesita em destruir uma árvore – tão sozinha como ele e com o mesmo direito de subsistir. Enfim, não sei se por esquecimento, ou por sentimento, é que foi poupada entre os escombros, mas lá está sobre o tumulto da cidade – alta, viva, verde como uma esperança de melhores dias. O velho mercado e a nova praça Acabo de ler a bela sugestão do Correio de domingo passado, no sentido de que, em vez de demolir o Mercado Público, apenas se lhe tire o recheio, isto é, as bancas hoje anacrônicas, mas se conserve o edifício, tão grato às nossas recordações. E não o digo tão só por motivos sentimentais. Mas também por motivos estéticos, o que não demanda maiores explicações, porque está nos olhos de tanta gente. Uma praça interna, conforme a proposta, uma espécie de grande pátio como os das grandes mansões coloniais, com um chafariz ao centro (por que não aquele mesmo da Praça Quinze?) e as cadeiras sob as arcadas, correspondentes às cadeiras nas calçadas, que parecem não consentidas na Porto Alegre de hoje, mas conservadas exemplarmente em cafés de Viena e de Paris de sempre. E, assim, um pouco da antiga Porto Alegre não ficaria apenas em nossa vida interior. Junto antecipadamente, aqui, o meu aplauso entusiástico à banda de música que estaria tocando um dia na inauguração da nova praça, se nossas palavras viessem a dar acaso no ouvido certo.

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Apontamentos para um poema Ó céus de Porto Alegre, como farei para levar-vos para o céu?

XXI

Gadêa... Pelichek... Sebastião... Lobo Alvim... Ah, meus velhos camaradas! Aonde foram vocês? Onde é que estão Aquelas nossas ideais noitadas? Fiquei sozinho... Mas não creio, não, Estejam nossas almas separadas Às vezes sinto aqui, nestas calçadas, O passo amigo de vocês... E então Não me constranjo de sentir-me alegre, De amar a vida assim, por mais que ela nos minta... E no meu romantismo vagabundo Eu sei que nestes céus de Porto Alegre É para nós que ainda S. Pedro pinta Os mais belos crepúsculos do mundo!

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Quintana e a posteridade Carlos Nejar

“– O que vocês querem que eu diga de mim?”, gracejou Borges certo dia: “Não sei nada de mim! Não sei nem mesmo a data de minha morte!”. E Jorge Luis Borges amava os ditos espirituosos ou surpreendentes, capazes de escandalizar os ouvintes. Talvez pelo espanto da inteligência. E Mario Quintana, com igual irreverência, apanha em flagrante o autor de O livro de areia, como se lhe respondesse: Nenhuma das suas máscaras consegue no entanto esconder o próprio Jorge Luis Borges, logo reconhecível pelo seu velho sestro de enveredar por sucessivos atalhos – enquanto a própria história fica palpitando para ser contada. Quem seria que disse que a linha curva é sempre o caminho agradável entre dois pontos? E adiante completa: Aliás para que enredos? Não sou de mexericos. E humildemente confesso que, depois que perdi o hábito de ler novelas policiais, os enredos aborrecem-me soberanamente” (O livro de areia, p. 685).1 Seria maravilhoso, aliás, que tivesse havido o encontro entre Borges e Quintana, como se deu em livro entre Ernesto Sábato e Borges. Mas certamente a timidez quintaniana o faria esquivar-se. E se refugiaria num de seus esconderijos, ou sob o alçapão dos poemas, por se amedrontar com as pessoas – que, para ele chocam – preferindo as coisas. E nem todas, só as nominadas. Pois “as coisas que não têm nome assustam, escravizam-nos, devoram-nos...” (“A bela e

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o dragão”, p. 173). Mas, no dia em que se designar o universo, se “chamares a um dragão de Joli, o dragão te seguirá por toda parte como um cachorrinho...” (“A bela e o dragão”, p. 173). Observe-se, porém, que os tais Esconderijos do tempo (1980) não são acessórios de sua imaginação ou de sua sede de insaciada infância. Não. É sua sobrevivência na palavra, este esconderijo de sonhos e quimeras, sua posteridade. Embora “os antologistas do futuro recolham de cada poeta apenas algumas palavras” – adverte. Por serem exatamente essas o arcabouço do seu primordial esconderijo. E ele serve para arrebatar os subterrâneos ditosos da meninice, os sótãos que vêm e voltam em seus poemas, onde os deuses atrás da máscara ocultam o próprio enigma, mostrando que o mistério está na vida. Como se os sótãos portassem outra espécie justaposta de alma. E ali se acha o Baú de espantos (1986), com retratos, fantasmas, brinquedos, a torre azul, os arroios que “são rios guris”, as magias que se renovam, a manhã atacada de luz, a família desencontrada, com o tio solteirão e o vovozinho trêmulo, poemas adormecidos, certo crime da mala (suas obsessivas leituras policiais), os ceguinhos de nascença e as estranhas aventuras da infância, não menos estranhas do que as da velhice! Retira desses baús a existência que não morreu, que não pode mais morrer, porque a poesia assumiu que se tornou igual ao nome que uma guriazinha desenha, com letras, na vidraça. E de se esconder é que o menino se vai inventando. E de criar que o bilhete é atirado ao fundo do tempo, trazendo de volta o lampião familiar. Certo de que “as coisas duram tanto, duram mais do que a gente”. E observa, sabiamente, neste belíssimo texto, mote central de todos os esconderijos: Quem nunca quis morrer Não sabe o que é viver Não sabe que viver é abrir uma janela E pássaros pássaros sairão por ela E hipocampos fosforescentes Medusas translúcidas Radiadas

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Estrelas-do-mar... Ah, Viver é sair de repente Do fundo do mar E voar... e voar... cada vez para mais alto Como depois de se morrer! (“Viver”, pp. 607-608) Essa vontade levitadora do poeta já vem de antes. Diz talvez no mais belo soneto de sua (e nossa) A rua dos cataventos (1940): Quando a luz estender a roupa nos telhados E for todo o horizonte um frêmito de palmas E junto ao leito fundo nossas duas almas Chamarem nossos corpos nus, entrelaçados, Seremos, na manhã, duas máscaras calmas E felizes, de grandes olhos claros e rasgados... Depois, volvendo ao sol as nossas quatro palmas, Encheremos o céu de voos encantados!... E as rosas da Cidade inda serão mais rosas, Serão todos felizes, sem saber por quê... Até os cegos, os entrevadinhos... E Vestidos, contra o azul, de tons vibrantes e violentos, Nós improvisaremos danças espantosas Sobre os telhados altos, entre o fumo e os cataventos! (“XXVII”, p. 111) E é a rua do diáfano e sagrado espaço que criou na poesia brasileira, como Manuel Bandeira criou a sua Pasárgada, a utopia, sem a qual não vivemos. Por ser a forma de tramar o mundo justo e humano. Se não pela realidade,

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às vezes tão surrada, ao menos pela vasta e prazerosa imaginação. Porque engendramos a memória e a memória nos engendra. Até que o esquecimento nos esqueça. Falávamos das ânsias quintanianas de levitação, tão singular no talvez mais belo soneto desse especular livro. E funciona como espelho convexo, os dois quartetos de um lado e os dois tercetos de outro, como se o seu reflexo. O espelho de Lewis Carroll – uma face diante de outra: “Se você acreditar em mim, acreditarei em você. Negócio fechado?”. E não é por acaso que seu livro futuro se chamaria Espelho mágico (1951), uma espécie de Eclesiastes mesclado ao Livro de provérbios em versos, livro de bom viver, onde se lê, entre as máximas: Custa o rico a entrar no Céu (Afirma o povo e não erra). Porém muito mais difícil É um pobre ficar na terra... (“Da humana condição”, pp. 229-230). Mario Quintana dribla o acaso com pernas de muitos rios, como dribla até o seu dito facilismo, com o humor e as alusões. O livro de Canções (1946) é um avanço para dentro da modernidade, com achados verbais, leveza e irradiantes imagens, como se num aquário (usando expressão sua), com três espantosos poemas: “Canção de um dia de vento”, “Canção de Garoa” e a incrível “Canção de vidro”, que nem carece de rima para se sustentar, em que se verifica o gênio lírico do autor: E nada vibrou... Não se ouviu nada... Nada... Mas o cristal nunca mais deu o mesmo som. Cala, amigo... Cuidado, amiga... Uma palavra só Pode tudo perder para sempre...

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E é tão puro o silêncio agora! (“Canção de vidro”, p. 126) Talvez seja “o contorno de uma contraimagem”, ou imagens que nadam se entretecendo, o segredo de sua poesia, como refere Paulo Mendes Campos. Segredo, aliás, entre António Nobre, Verlaine, Rimbaud e Villon, que não hesita em esconder aos grandes do mundo e oferece como dádiva aos pequenos, ofendidos e humilhados. Esse sentimento chapliniano que não resiste ao desamparo e à piedade. Sabendo que a “poesia é um sintoma do Sobrenatural”, escreveu: Ariel – peixe luminoso – escapa Por entre as malhas dos sistemas e doutrinas. O seu país flutuante não pode ser localizado no mapa. Mesmo porque a poesia mora é nas entrelinhas, Mora no branco puro do papel. (“Ariel”, p. 882) E o mais interessante que revela a personalidade forte do poeta é o fato de não se ter ajuntado em nenhuma escola ou grupo. Embora tenha surgido em 1940, com a eclosão do formalismo, ou atravessado o ápice do modernismo, nem seus sonetos de A rua dos cataventos enfraqueceram com o tempo, nem ele se entregou de corpo e alma ao movimento de 1922. Como Cecília Meirelles, transitou imponderável sem se prender a nada, salvo a sua altiva cristalinidade e à música, que é a das esferas nos seus versos. Quando vigorava o poema-piada, Quintana reage com o non sense, ou com o absurdo das velhas e desataviadas cogitações humanas. Ou então reagia, como conta Augusto Meyer, tal um clown, elogiando as panóplias de Herédia. Inconfundível, ambíguo, delicado e astucioso, é um catalogador de sortilégios. O verso é um doido cantando sozinho. Seu assunto é o caminho. E nada mais! O caminho que ele próprio inventa... (“O verso”, p. 776)

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Ou que o inventa sem saber. E é essa integridade, trabalhando o poema várias vezes para dar a impressão de que a obra “foi escrita pela primeira vez”. Por querer o noturno poema porejado de orvalho. E essa busca de primeira vez é o tão mais antigo, que de repente é contemporâneo. E o tão contemporâneo com a lucidez de que um vocábulo é capaz de transmudar destino. Ganhando as coisas mínimas, por um eito, dimensões imensas. E é sempre reconhecível. Sim, a poesia de Quintana não se contenta no verso, carece de prosa, espaço, provando que até a prosa pode se encantar. Prova também que, sobre o gênero, reina a linguagem. E não quer provar nada, porque “o crime perfeito não deixa vestígios”. E o único possível é “o doloroso sulco lábionasal junto à garrafa morta...” Poeta da solidão, a que é assumida, a limpa e arejada solidão de seu quarto no Hotel Majestic e de outro hotel onde habitou atrás de seus fantasmas, atrás do pobre menino “que envelheceu um dia de repente”, ou do homem que desembocava inelutavelmente no menino. Afirmando, num dos seus cláridos poemas: Antes, todos os caminhos iam. Agora todos os caminhos vêm. A casa é acolhedora, os livros poucos. E eu mesmo preparo o chá para os fantasmas. (“Envelhecer”, p. 174) Ou talvez sejam os fantasmas que envelheçam, não ele. Porque ele ama e “muda a alma de casa”. E eles são reacionários, imutáveis, continuam nos vetustos casarões, aparecem vestidos com a roupa no corpo, diferentes de nós que, sem roupa, nascemos. E é igualmente poeta do fantástico, com a carga de um surrealismo abissal, o curto-circuito da inteligência: Tão comodamente que eu estava lendo, como quem viaja num raio de lua, num tapete mágico, num trenó, num sonho. Nem lia: deslizava. Quando de súbito a terrível palavra apareceu, apareceu e ficou, plantada ali diante de mim, focando-me: ABSCÔNDITO. Que momento

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passei!... O momento da imobilidade e apreensão de quando o fotógrafo se posta atrás da máquina, envolvidos os dois no mesmo pano preto, como um duplo monstro misterioso e corcunda... O terrível silêncio do condenado ante o pelotão de fuzilamento, quando os soldados dormem na pontaria e o capitão vai gritar: – Fogo! (“Trágico acidente de leitura”, p. 174) Parece fragmento de Edgar Allan Poe que sofre de iluminações rimbaudianas. Contudo, é um poema sem contraparente na nossa literatura. Mas não perde a inocência, ainda que zombeteira, percebendo que “os antigos retratos de parede/ não conseguem ficar longo tempo abstratos” (“Os retratos”, p. 486). Nem ele. Porque tudo em Mario tende à realidade, ainda que seja a do baú de espantos, ou do sapato florido, com o enigma “das negras flores que se abrem sob a chuva”, ou mesmo com a cor do invisível, crendo que, enquanto não acabarem os elefantes, não acabará a bondade humana. Nem acabarão os poemas, nem as horas. Pois “todos os poemas são o mesmo poema/ (...)/ Todas as horas são horas extremas!” (“Pequeno poema didático”, p. 397). E quanto ao tempo, “não pode viver sem nós, para não parar” (“O tempo”, p. 426). Também certo de que “a vida não dá tempo para a Vida”. E muito menos, tempo ao tempo. Quintana citou, em certa ocasião, este provérbio chinês: “Quem monta num tigre não pode apear”. A partir de Sapato florido (1948), levado pelo medo de ceder às injunções que não sejam as da pura expressão, escreve “como se fosse o último vivente sobre a face da Terra”, sem ter que pensar no que pensarão os outros, para não ter o terror de que todos os seus poemas sejam apócrifos. Essa autenticidade é a arte de montar no tigre. E, ao compor um livro com textos variados, entre provérbios, contos mínimos, inscrições, anotações, fragmentos de poemas, frases soltas, como Sapato florido, por sinal belíssima metáfora, também montou no tigre, por resvalar no tênue fio limítrofe entre prosa e poesia, num gesto inovador, que tanto atormenta certos teóricos, quando a linguagem é o sapato florido, acima dos cogumelos de gêneros, comestíveis alguns, outros menos. E ali emergem dois textos antológicos que marcam sua trajetória de grandeza. “Velha história”, em que um peixinho, depois de desaventuras, morre afogado, e “O Anjo Malaquias”, irmão dos de Cocteau, Rilke e Blake, inefável criatura, que saiu voando janela em fora.

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Dada, porém, a urgência da operação, as asinhas brotaram-lhe apressadamente na bunda, em vez de ser um pouco mais acima, atrás dos ombros. Pois quem nasceu para mártir, nem mesmo a Mãe de Deus lhe vale! Que o digam as nuvens, esses lerdos e desmesurados cágados das alturas, quando, pela noite morta, o Inocentinho passa por entre elas, voando em esquadro, o pobre, de cabeça pra baixo. (“O anjo Malaquias”, pp. 191-192) Genial essa espirituosa invenção do humor e da ironia quintaniana, não poupando sequer os anjos da tumultuante atrapalhação humana! Não seria o anjo Malaquias símbolo da presença de Quintana na poesia brasileira, com seu senso bondoso e zombeteiro e, ao mesmo tempo, insubstituível? E, se o poeta não poupa os anjos, a nada poupa, nem a si mesmo. Numa evidente alusão ao célebre poema de Bilac, sobre a forma, com suave malícia, brinca: Teu verso, barro vil, No teu casto retiro, amolga, enrija, pule... Vê depois como brilha, entre os mais, o imbecil, Arredondado e liso como um bule! (“Do cuidado da forma”, p. 212) Montou igualmente no tigre, ao retornar ao verso na coletânea seguinte, O aprendiz de feiticeiro (1950) – com capítulo à parte para a sabedoria e a beleza dos títulos dos livros de Quintana –, que, para alguns, como Drummond, é sua obra-prima. A visualidade do poeta não se esgota em si mesma, acompanhada de lúdico ritmo e lépida musicalidade a subir e cair como os repuxos. Ali se acham seres-poemas como o sensualíssimo “O dia”; o próprio poema (“O poema”), “ferido de mortal beleza”; outro, primoroso e também “O poema”: O poema é uma pedra no abismo, O eco do poema desloca os perfis: Para bem das águas e das almas Assassinemos o poeta. (“O poema”, p. 203)

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Esse último verso beliscado, ardilosamente, em Apollinaire mostra quanto a poesia é pólvora e perigo ou sacrifício neste tempo, que Henry Miller, ao analisar Rimbaud, denomina “o tempo dos assassinos”. Sim, O aprendiz de feiticeiro é a álgebra, o centro da arte poética de Quintana, em que a grande personagem – não é ele – é a distintíssima pessoa do Poema (não em vão, muitos guardam o mesmo título). No dito livro, situam-se, rodeados de clima de novela policial, o insólito – “Cripta” (que mereceria pela estranheza, estudo especial) –, “O poema do amigo” (“calado cúmplice!”), a “Obsessão do mar Oceano”, “Casas” (tanto a de Herédia, a de Rimbaud, Apollinaire, Blake e Cecília, onde sentimos, embora não o diga, que nelas construiu a sua) e “O anjo da escada”: (“Deixa-me! Que tenho a ver com as tuas naus perdidas? Deixa-me sozinho com os meus pássaros... com os meus caminhos... com as minhas nuvens...”) Também o surrealista “A noite” (com o diligente Sherlock Holmes, Watson por um fio de confusa e deliciosa história e Pallas Nausicaa Athena), “Ao longo das janelas mortas” (“Ah, que esta vida é automática!/ Estou exausto da gravitação dos astros!/ Vou dar um tiro neste poema [...]”), “No silêncio terrível” (“No silêncio terrível do Cosmos/ Há de ficar uma última lâmpada acesa.”) e o apoteótico “Cântico”, um dos importantes poemas visionários da língua: O vento verga as árvores, o vento clamoroso da aurora... Tu vens precedida pelos voos altos, Pela marcha lenta das nuvens. Tu vens do mar, comandando as Frotas do Descobrimento! Minh’alma é trêmula da revoada dos Arcanjos. Eu escancaro amplamente as janelas. Tu vens montada no claro touro da aurora. Os clarins de ouro dos teus cabelos cantam na luz! (“Cântico”, p. 207)

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Não, “quem monta num tigre não pode apear”. Monta na aurora. Certa vez, curioso, na redação do saudoso Correio do Povo, de Porto Alegre, indaguei a Mario Quintana por que usava tanto as reticências, e me disse que os poemas são campos que carecem de cercas. Hoje entendo, ao perceber quanto o poeta repete, em vários textos, que a poesia se concentra nas entrelinhas. E elas não deixam de guardar os bois do verso. Outro aspecto pouco referido é a forma discreta como Mario Quintana acentua sua gauchidade, ora na utilização de termos próprios do Rio Grande, sem bandear-se ao tradicionalismo, ora em certas descrições e costumes regionais que ele permite entrever, escutando “a conversa da peonada no galpão”, sempre voltado para o universal. Não só por cantar sua aldeia, mas por deixá-la cantar em si, com o tom mágico de quem busca o eterno. Se há uma evolução – e poetas como Quintana já vêm maduros –, é de foro interior, foro de experiências íntimas, que vai de O aprendiz de feiticeiro para o auge, na flor dos 60 anos, com Apontamentos de história sobrenatural (1976), para nós, indubitavelmente, seu melhor livro, em que todos os temas encontram seu tema e todas as horas, a sua hora. De um lado, o apologista de mistérios, e de outro, o que está com as pálpebras fincadas no Outro Mundo. Esses dois universos se completam, harmonicamente. Como se uma moeda. E aqui, do mesmo modo se verifica, como em Machado, Mario Quintana, ao encarar virtuosos sentimentos, por certo horror à hipocrisia, boceja ou cochila ou graceja. É um moralista que não se rege pela virtude, ainda que a luz não cochile. João Cabral se rege pela educação da pedra; outros, pela educação dos sentidos; Mario se rege pela educação da poesia. E, nesse sentido, é um disciplinador, ainda que não queira. E a tal evolução interna, do saltimbanco para o homem que se vê diante da morte, falando no excepcional “O morituro”: “Quero morrer na selva de algum país distante.../ Quero morrer sozinho como um bicho!” (p. 401). Ou sussurra em “Carta desesperada” (p. 458): Atravessa a rua Como nos tempos quase imemoriais Do cinema silencioso... Sabes, Beatriz? Eu vou morrer!

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Tal evolução não é uma conversão paulina, é um lento divisar desses nossos degraus viventes, aperfeiçoando premissas que se aleitaram em volumes anteriores, em etapas de maturação, que não é de um dia para outro. Ruminando ironia, gravidade, riso, lágrima, pensamento, sonho, agrura, dando-lhe o eflúvio novo, que se expandiu para a interrogação diante da Esfinge, a interrogação embevecida, às vezes desolada, ou apocalíptica – o contemplativo e lúdico dá lugar ao decifrador do abismo. Sendo esse interrogar, crise e extrema transfiguração. Já o ato de fazer apontamento, em face da rapidez das coisas ou da vital fugacidade, “um mistério encanando outro mistério no escuro”, pois jamais termina. Comentando no pungente e antológico soneto a Guilhermino César, “Este quarto...”: Este quarto de enfermo, tão deserto de tudo, pois nem livros eu já leio e a própria vida eu a deixei no meio como um romance que ficasse aberto... que me importa este quarto, em que desperto como se despertasse em quarto alheio? Eu olho é o céu! Imensamente perto, o céu que me descansa como um seio. Pois só o céu é que está perto, sim, tão perto e tão amigo que parece um grande olhar azul pousado em mim. A morte deveria ser assim: um céu que pouco a pouco anoitecesse e a gente nem soubesse que era o fim... (“Este quarto...”, pp. 460-461) A obsessão de céu enche o poema, persegue os abertos olhos do poeta. E noutro soneto, “Os parceiros”, descobre: “Sonhar é acordar-se para dentro” (p. 461). Sala de estar, onde tudo é disfarce – a vida ou a morte . Disfarce de outro perene disfarce.

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E em seu generoso Caderno H (1973), que depois se desdobra em A vaca e o hipogrifo (1977) e, após, em Da preguiça como método de trabalho (1987), em que se distrai entre poemas e aforismos ou minúsculos contos, o cronista terrestre e sobrenatural põe-se diante da “Máquina do mundo”. Mas não arrosta como Carlos Drummond a pedregosa estrada de Minas, com a fatigante, instigadora ou elementar, camoniana ou engajada máquina. Por não ver significação política nela ou no crepúsculo, a máquina é outra. E arqueja. [...] não pode mais, não pode mais... [...] A velha máquina, obsoleta como essas comovedoras criaturas a quem apelidaram Ford de bigode, a velha máquina, num derradeiro esforço, explode: – Pifff... Mal se ouviu. Uns riem. Outros, os últimos românticos, arrepelam-se: “Então isto é explosão que se preze? Onde é que está onde é que está aquele último dó de gavetão como só os pode soltar um verdadeiro leão no seu canto de cisne?!” Ora, depois que se dissipou no ar a última fumacinha, os curiosos, isto é, os sádicos foram se aproximando na ponta dos pés: aquilo estava irreconhecível... pura, pura sucata! [...] A sucata é o material em férias... Alegremo-nos, irmãos. Amigos e inimigos, demo-nos todos as mãos e dancemos de roda em redor dos destroços

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sobre o chão da miséria... Dancemos e cantemos – chocalhando os ossos – a nossa mais esperançosa canção... Porque a sucata quanto mais sucata mais pode vir a ser UMA OUTRA COISA! (“História do futuro”, pp. 265-267) “História do futuro” é um poema profético, sarcástico e apocalíptico. Como Padre Antônio Vieira, que se inclina sobre A história do futuro. Prevendo a sucata de tantas teorias, convenções, perplexidades universais, convicto de que a sucata é outra – ainda não aprendida – coisa, Mario Quintana apenas assume sua grande Poesia – que, sendo “sinal de identidade”, tangida de vida, jamais será pura (por haver severa dosagem do poético: “se só existisse poesia, ela mesma deixaria de ser poesia”), bastando que seja Poesia. E, se os “leitores são dorminhocos: gostam de ler dormindo”, Quintana é de uma natureza rara de grande Poeta – a do que gosta de sonhar, escrevendo, com o rigor de quem passa cuidadosamente os seus poemas a ferro. Ainda que muitos dos sonhos lhe escapem, os que o encontram, nos encantam. De forma imperecível. O que acontece de vez em vez na eternidade. Pois Mario Quintana, prazerosamente, já sabe e nem precisou que ninguém lhe dissesse, salvo o seu anjo Malaquias: “A posteridade é muito comprida. Dá um sono”. Mas não deixa nunca de ser, solenemente, a posteridade. A das almas que se vão para o hibernário. Com a contrapartida, de glória. A que lhe é devida e ninguém mais retira.

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Carlos Nejar, membro da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia, nasceu em Porto Alegre. Autor que transita por todos os gêneros (dramaturgia, poesia, romance, ensaio, conto e infanto-juvenil), recebeu os prêmios Machado de Assis, da Fundação Biblioteca Nacional, na categoria melhor romance, por Riopampa, em 2000; Cassiano Ricardo, do Clube de Poesia de São Paulo, em 1996; Jorge de Lima, do Instituto Nacional do Livro, em 1971; e Erico Verissimo, da Câmara Municipal de Porto Alegre, em 1981 – além de ter sido três vezes premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). Autor de História da literatura brasileira (no prelo, segunda edição) e de A idade da noite – Poesia 1 e A idade da aurora – Poesia 2 (São Paulo/Rio de Janeiro: Ateliê/Biblioteca Nacional, 2002), sua poesia completa sairá reunida num só volume pela editora Novo Século.

NOTA 1 Todas as referências de páginas deste ensaio são relativas à obra Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005.

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O tradutor poeta Maria da Glória Bordini

Entre os ofícios da palavra, o do tradutor é o menos reconhecido. Transpor um texto de uma língua a outra em geral é entendido como tarefa técnica, requerendo aptidão nas duas línguas, a de partida e a de chegada, e fidelidade ao sentido das frases do autor original. As exigências são altas, a remuneração é baixa, os prazos curtos, e o texto traduzido por vezes nem traz o nome do tradutor. Entretanto, “lutar com palavras”, não em uma, mas em duas línguas, não é, de modo algum, “a luta mais vã”, como no verso de Carlos Drummond de Andrade. É verdade que o sentido do verso drummondiano, na sequência do poema, tem a ver com não renunciar à tentativa de submeter a linguagem, ela mesma sempre evasiva, aos intentos do poeta. No caso da tradução, a luta se duplica, pois cada língua tem as suas peculiaridades e está viva numa cultura que, vista de fora, pode encerrar enigmas e tropeços inesperados. Traduzir literatura, essa forma de discurso em que a linguagem é esteticamente organizada, é dos ofícios mais duros. Persegue aquele que se afoita a usar sua voz para dizer a voz do outro o centenário dito italiano traduttore, traditore. É fácil resvalar no terreno escorregadio da tradução literária, tanto mais se quem traduz também é escritor e tem sua própria voz. Sintonizar-se com o vocabulário, o estilo e mesmo o ritmo e a sonoridade do outro significa deixar de lado, ou pôr entre parênteses, o seu modo de dizer, que, num escritor, tem escolhas que o identificam. Por isso, o bom tradutor literário deve estar atento tanto a si quanto à voz do autor original, tanto à natureza da linguagem do outro, quanto à da língua que traduz, desafio em que, a cada página, o equilíbrio pode desaparecer. E de equilíbrio se trata, uma vez que nem o tradutor poderá mimetizar inteiramente o autor, nem a língua de chegada o fará em relação à língua de partida.

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Cada um tem experiências, história e culturas diferentes, de modo que uma aproximação honesta ao que o texto era no original é o máximo que se pode esperar desse relacionamento tão delicado. Mario Quintana é o exemplo acabado dessa relação sutil entre dois textos. Não foi o único poeta a fazer-se tradutor. Uma de suas admirações, Manuel Bandeira, traduziu muito e bem. Mas não o fez profissionalmente e sim por amor à poesia estrangeira, selecionando idiossincraticamente o que desejava ler em português. Quintana, não. Estreando em livro tardiamente, aos 34 anos – embora seu primeiro poema publicado tenha saído na revista Para Todos, do Rio de Janeiro, em 1927 –, Quintana foi primeiro desempacotador da Livraria do Globo, depois jornalista de O Estado do Rio Grande, tornando-se enfim colaborador da Revista do Globo e, aliciado por Henrique Bertaso e Erico Verissimo, que nos anos 1930 davam impulso à futura editora Globo de Porto Alegre, transformou-se em tradutor remunerado. Sua estreia na nova atribuição foi com Palavras e sangue, de Giovanni Papini, em 1934. O livro obteve um grande sucesso editorial, e, na década de 1930, os dois jovens editores confiariam-lhe traduções de obras de entretenimento, que iam formando o público de sustentação da Globo. Nesse período, Quintana traduziu de Fred Marsyat, O navio fantasma, em 1937, de Alessandro Varaldo, A gata persa (volume da famosa Coleção Amarela de romances policiais), em 1938, do então célebre biógrafo Emil Ludwig, Memórias dum caçador de homens, e finalmente do grande romancista polonês, naturalizado britânico, Joseph Conrad, sua obra talvez mais importante, Lord Jim, ambos de 1939. Com tal variedade de gêneros, Quintana ia refinando sua arte tradutória. Na época, era costume traduzir indiretamente, e o poeta se valia de versões em geral em língua francesa – que ele aprendera com a mãe em criança – para as traduções a ele encomendadas. O trabalho era esporádico, mas não deixava de ser uma fonte de sustento, dado que Henrique Bertaso pagava escrupulosamente cada texto na entrega dos originais. Tendo firmado uma reputação como tradutor fluente, só então o poeta se animou a oferecer à Globo seu primeiro livro de poemas, os sonetos de A rua dos cataventos, em 1940, depois mais dois, Canções, em 1946, e Sapato florido, em 1948, dedicando, ainda nesse ano, um abecedário divertido para o público infantil, O batalhão das letras. Todavia, viver de poesia, mesmo em tempos em

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que ela ainda tinha apelo a certas camadas de público, era uma proeza, e Quintana não via seus livros circularem o suficiente (ele se tornaria célebre apenas dos anos 1960 em diante). Na década de 1940, mesmo envolvido com a produção de sua poesia, Quintana fez parte, meio à distância, da assim chamada Escola de Tradutores da Globo, que contava com colaboradores de salário fixo, e cujas traduções passavam por um rigoroso processo de depuração. Diz Erico que, escolhido o livro a verter-se para o português, procurava-se o tradutor, de acordo com a especialidade linguística de cada um. Feita a escolha do tradutor, este fazia sem pressa o seu trabalho, tendo à sua disposição uma rica biblioteca em que havia vários dicionários e enciclopédias. [...] Depois que o tradutor dava por terminado o seu trabalho, os respectivos originais eram entregues a um especialista da língua de que o livro fora traduzido, para que ele os confrontasse, linha por linha, com o original, procurando verificar a fidelidade da versão. Havia uma terceira etapa, a em que um especialista examinava o estilo do livro, discutindo-o com o tradutor, cujo nome ia aparecer sozinho no pórtico do volume.1 Quintana desenvolvia seu trabalho preferencialmente em seu quarto de hotel, mas já se animava a traduzir do inglês, contando com os bons dicionários da Globo e o recurso a Erico Verissimo e a Leonel Vallandro, que dominavam o idioma. Sua produção, nos anos 1940, impressiona pela quantidade de títulos e pela qualidade de suas versões. Foram elas, em ordem cronológica: STACPOOLE,

H. de Vere. A laguna azul. Porto Alegre: Globo, 1940. GRAVES, Robert. Eu, Claudius imperador. Porto Alegre: Globo, 1940. MORGAN, Charles. Sparkenbroke. Porto Alegre: Globo, 1941. YUTANG, Lin. A importância de viver. Porto Alegre: Globo, 1941. BAUM, Vicki. Hotel Shangai. Porto Alegre: Globo, 1942. FÜLOP-MÜLLER, René. Os grandes sonhos da humanidade. Porto Alegre: Globo, 1942. LAMB, Charles; LAMB, Mary Ann. Contos de Shakespeare. Porto Alegre: Globo, 1943.

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MAUPASSANT,

Guy de. Contos. Porto Alegre: Globo, 1943. MAUROIS, André. Os silêncios do coronel Bramble. Porto Alegre: Globo, 1944. GIDE, André. A escola de mulheres. Porto Alegre: Globo, 1944. MORGAN, Charles. A fonte. Porto Alegre: Globo, 1944. LEHMANN, Rosamond. Poeira. Porto Alegre: Globo, 1945. JAMES, Francis. O albergue das dores. Porto Alegre: Globo, 1945. LAFAYETTE, Madame de. A princesa de Cléves. Porto Alegre: Globo, 1945. BEAUMARCHAIS. O barbeiro de Sevilha ou A precaução inútil. Porto Alegre: Globo 1946. WOOLF, Virgínia. Mrs. Dalloway. Porto Alegre: Globo, 1946. Note-se que, de textos mais populares (A laguna azul foi um sucesso editorial anos a fio, assim como o livro de Lin Yutang, e o romance de Vicki Baum), Quintana foi transitando para obras mais cultas. Traduziu a adaptação em prosa dos irmãos Lamb da obra de Shakespeare, que até hoje arrebata seus leitores, os romances de Charles Morgan – um autor de sucesso na Europa de então, que se tornou muito lido no Brasil graças a suas traduções – até chegar ao clássico teatral de Beaumarchais e ao grande romance intimista de Virginia Woolf. Estava pronto para enfrentar o desafio maior, que viria com a encomenda de Bertaso e Erico, traduzir Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust. Em 1948, sai o primeiro volume, No caminho de Swann, saudado pela crítica como uma excelente tradução. Na década seguinte, enquanto escrevia sua obra-prima, O aprendiz de feiticeiro, lançado em 1950, seguido de Espelho mágico, de 1951, ele se defrontaria com grandes obras da literatura mundial. Continuaria a tradução de Proust, com A sombra das raparigas em flor (o volume 2), em 1951, com O caminho de Guermantes (o volume 3), em 1953, e com Sodoma e Gomorra (o volume 4), em 1954. De A comédia humana, de Honoré de Balzac, ele traduziria Os sofrimentos do inventor, em 1951, e Ilusões perdidas, em coautoria com Ernesto Pelanda; em 1954, Uma paixão no deserto; em 1955, Seráfita e também Os proscritos. Apesar da monta da tarefa de traduzir Balzac e Proust, encontrou tempo para verter os franceses Voltaire, em Contos e novelas (1951), e Prosper Merimée, com Novelas completas (1954), e os ingleses Aldous Huxley, com Duas

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ou três graças (1951), e Graham Greene, com O poder e a glória (1953), autores que fizeram época na história da literatura estrangeira no Brasil. Além disso, ainda incluiu em sua lista de obras de impacto no grande público as traduções de Somerset Maugham, Confissões (1951), Biombo chinês (1952) e Cavalheiro de salão (1954), a de Pearl S. Buck, Debaixo do céu (1955), mais um romance policial, de Frederick Brown, O tio prodigioso (1951), e as biografias da dupla Henry Thomas e Dana Arnold, Vida de homens notáveis (1952). É possível que existam outros trabalhos de Quintana na seara da tradução, mas esses são os que possuem exemplares localizados. Depois dos anos 1950, Quintana abandonou a tradução. Afastando-se da editora, dedicou-se apenas a sua poesia e, nos anos 1960, recebeu um posto no jornal Correio do Povo, passando a publicar a conhecida coluna “Do Caderno H”. Houve uma retomada do interesse por sua obra, que a Editora do Autor, do Rio, e a Globo, de Porto Alegre, incentivaram, e ele tornou-se um dos poetas mais estimados do País. Como tradutor autodidata, Mario Quintana alcançou uma extraordinária performance, que se revela em especial em sua versão para a caudalosa obra proustiana. Quando Brito Broca visitou a Globo, encontrou Quintana a traduzir “como se estivesse copiando um texto numa folha de papel almaço” e “ficou impressionadíssimo”, como testemunha José Otávio Bertaso, em seu A Globo da rua da Praia. Informa ele que: Os longos períodos proustianos eram traduzidos por Quintana sem a menor hesitação. [...] Examinando mais de perto o trabalho que o autor de Rua dos cataventos fazia e constatando a excelência da tradução, Broca exclamou algo como: “É incrível, como você consegue fazer?”, ao que Quintana respondeu sorrindo, ao mesmo tempo em que acendia um novo cigarro: – Com o primeiro da série Em busca do tempo perdido, tive alguma dificuldade. Agora, as coisas estão bem mais fáceis.2 Brito Broca, além de historiador e crítico literário, era também reconhecido especialista em literatura francesa, o que confere a sua admiração uma qualidade ponderável. De fato, Quintana traduzia como se lesse, mas captando a frase completa, seus torneios originais e instantaneamente a remanejava para

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conformá-la a um ritmo mais característico do português, de modo que seu texto fluía naturalmente. Essa capacidade de apreender, interpretar e selecionar o que seria mais pertinente para o ouvido brasileiro tornou Proust mais próximo do público interessado. Deve-se observar que esse mesmo público antes desdenhava ler o grande romancista em outra língua que não fosse o francês, o que atesta a arte tradutória do poeta. Uma amostra do trabalho de Quintana na versão brasileira de Proust pode evidenciar as razões do reconhecimento que, ao longo dos anos, ele recebeu, mesmo tendo como parceiros da empreitada colegas do porte de Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, entre outros. De O caminho de Guermantes, veja-se a descrição que o narrador tece da princesa de Guermantes, ao contemplá-la de seu camarote no sarau de gala da Ópera em que iria assistir a atuação de Berma em Fedra:

Comme une grande déesse que préside de loin aux jeux des divinités inférieures, la princesse était restée volontairement un peu au fond sur un canapé latéral, rouge comme un rocher de corail, à côté d’une large réverbération vitreuse que était probablement une glace et faisait penser à quelque section qu’un rayon aurait pratiquée, perpendiculaire, obscure et liquide, dans le cristal ébloui des eaux. A la fois plume et corolle, ainsi que certai nes flo rai sons ma ri nes, une gran de fleur blan che, du ve tée comme une aile, descendait du front de la princesse le long d’une de ses joues dont elle suivait l’inflexion avec une souplesse coquette,

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Como uma grande deusa que preside de longe aos jogos das divindades inferiores, a princesa permanecera voluntariamente um pouco para o fundo, num canapé lateral, vermelho como uma rocha de coral, ao lado de uma larga reverberação vítrea, que era provavelmente um espelho e fazia pensar nalguma seção que um raio teria praticado, perpendicular, obscura e líquida [, no cristal ofuscante das águas]. Ao mesmo tempo pluma e corola, tal como certas florações marinhas, uma grande flor branca, penujosa como uma asa, descia da fronte da princesa, ao longo de uma de suas faces, de que seguia a inflexão com uma docilidade faceira, amorosa e


amoureuse et vivante, et semblait l’enfermer à demi comme un oeuf rose dans la doucer d’un nid d’alcyon. Sur la chevelure de la princesse, et s’abaissant jusqu’à ses sourcils, puis reprise plus bas à la hauter de sa gorge, s’étendait une résille faite de ces coquilages blancs qu’on pêche dans certaines mers australes et qui étaient mêlés à des perles, mosaïque marine à peine sortie des vagues qui par moment se trouvait plongée dans l’ombre au fond de laquelle, même alors, une présence humaine était révélée par la mobilité éclatante des yeux de la princesse. La beauté qui mettait celle-ci bien au-dessus des autres filles fabuleuses de la pénombre n’était pas tout entière matériellement et inclusivement inscrite dans sa nuque, dans ses épaules, dans ses bras, dans sa taille. Mais la ligne délicieuse et inachevée de celle-ci était l’exact point de départ, l’amorce inévitable de lignes invisibles en lesquelles l’oeil ne pouvait s’empêcher de les prolonger, merveilleuses, engendrées autour de la femme comme le spectre d’une figure idéale projetée sur les ténèbres.3

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viva, e parecia encerrá-la ao meio, como um ovo róseo na suavidade de um ninho de alcíone. Sobre a cabeleira da princesa, e baixando até as sobrancelhas, depois reunindo-se [retomada] mais abaixo, à altura da garganta, estendia-se uma rede feita dessas conchinhas brancas que se pescam em certos mares austrais e que eram entremeadas com pérolas, mosaico marinho mal saído das vagas e que de momento se achava mergulhado na sombra, a cujo fundo, mesmo então, uma presença humana era revelada pela mobilidade fúlgida dos olhos das princesa. A beleza que colocava esta muito acima das outras filhas fabulosas da penumbra não estava, de todo, material e inclusivamente inscrita na sua nuca, nas suas espáduas, nos seus braços, no seu talhe. Mas a linha deliciosa e inacabada deste era o exato ponto de partida, a geração [a atração] inevitável das [de] linhas invisíveis com que o olhar não podia deixar de prolongálos [que o olhar não podia deixar de prolongar], maravilhosas, engendradas em torno da mulher como o espectro de uma figura ideal projetada nas trevas.4


É notável que as frases se desdobram na mesma formação e ritmo do original, com duas exceções: um “e” introduzido antes de “que de momento”, para evitar duas orações adjetivas coordenadas assindéticas, que em português soariam mal, e o deslocamento do “de todo”, que de certa forma perturba a fluência, pois poderia ser substituído por “não estava, material e inclusivamente, toda inscrita...”. Há algumas escolhas vocabulares que se afastam do original, conforme indicado, mas que não afetam e até esclarecem o sentido. Note-se também a omissão da parte final da frase que se refere ao fragmento do espelho partido por um raio, lacuna impossível de explicar, pois tanto pode ser esquecimento do tradutor quanto – o mais provável, tendo em vista a revisão rigorosa a que os originais eram submetidos – perda de uma parte da linha durante a composição no linotipo. A tradução de Quintana, em tantas outras obras, conserva, como aqui, uma margem para manobras linguísticas que ressaltam o sentido original, em favor da fidelidade, mesmo que eventualmente exijam uma interferência criativa para alcançar esse efeito. Os afastamentos em relação ao vocabulário e à sintaxe do texto original, sem violação semântica, ao contrário da obediência à literalidade, mostram a habilidade do tradutor, pois efetuam aquela difícil aproximação entre dois universos linguísticos distintos. Quintana apurou seu estilo poético ao exercer precocemente o jornalismo, o que lhe deu “uma facilidade de expressão, uma melodia natural, uma limpidez de imagens que descansam e agradam”, que Sérgio Milliet, a propósito do lançamento de A rua dos cataventos, temia desagradassem a “crítica mais requintada”.5 Essas características perduraram para além da primeira coletânea de seus poemas, mas não o fizeram menos estimado pelos críticos, mesmo que o tenham tornado muito popular junto ao grande público. Há que lembrar, porém, que a grande quantidade de traduções realizadas pelo poeta também teve um papel relevante para que sua poesia parecesse tão natural e ao mesmo tempo tão inquietante e frequentemente hermética. Afinal, ele tivera contato tanto com o romance realista quanto com o de vanguarda, tanto com os clássicos quanto com os seus contemporâneos, tanto com o gênero policial quanto com o biográfico, e era inevitável que seus versos guardassem os ecos de muitos dos autores que ele verteu, se não na forma, na temática. A tradução decerto contribuiu para o repertório de possibilidades de que seus poemas se alimentaram.

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O que pode passar despercebido é que a mestria linguística manifesta em suas traduções se enraizava no seu talento poético. O Quintana tradutor era alguém que lidava com o idioma como um prestidigitador, que lia insaciavelmente, tanto os poetas de sua e de várias épocas quanto outros gêneros, às vezes improváveis, mas que se valia de toda a matéria lida e traduzida para dar corpo a uma noção muito pessoal de poesia, como em “Crônica”: “Ah, essas pequenas coisas, tão quotidianas, tão prosaicas às vezes, de que se compõe meticulosamente a tessitura de um poema... talvez a poesia não passe de um gênero de crônica, apenas: uma espécie de crônica da eternidade”.6 De qualquer forma, além de fazer a “crônica da eternidade” em sua poesia, ele legou para a língua portuguesa algumas obras-primas da literatura universal – que só então foram postas nas mãos do público brasileiro, feito esse que nunca é demais reconhecer numa cultura em que o desconhecimento de outras línguas parece ser encarado como insignificante.

Maria da Glória Bordini é professora do Departamento de Letras da PUC-RS, coordenadora do Acervo Literário de Erico Verissimo e autora de Fenomenologia e teoria literária (São Paulo: Edusp, 1990) e Criação literária em Erico Verissimo (Porto Alegre: L&PM, 1995), entre outros.

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G U I A M A R I O Q U I N TA N A

Espelho mágico UM TESTEMUNHO DA OBRA VIVA DO AUTOR Paulo Becker

OBRAS DO AUTOR

1. Poesia

O aprendiz de feiticeiro. Porto Alegre: Fronteira, 1950; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

A rua dos cataventos. Porto Alegre: Globo, 1940; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

Espelho mágico. Porto Alegre: Globo, 1951; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

A vaca e o hipogrifo. Porto Alegre: Garatuja, 1977; 3. ed., São Paulo: Globo, 2006.

Esconderijos do tempo. Porto Alegre: L&PM, 1980; 3. ed., São Paulo: Globo, 2005. Canções. Porto Alegre: Globo, 1946; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

Caderno H. Porto Alegre: Globo, 1973; 2. ed., São Paulo: Globo, 2006.

Baú de espantos. Porto Alegre: Globo, 1986; 2. ed., São Paulo: Globo, 2006.

Sapato florido. Porto Alegre: Globo, 1948; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

Apontamentos de história sobrena tu ral. Por to Ale gre: Glo bo/IEL, 1976; 2. ed., São Paulo: Globo, 2005.

Da preguiça como método de trabalho. Rio de Janeiro: Globo, 1987; 2. ed., São Paulo: Globo, 2007.

138


Preparativos de viagem. Rio de Janeiro: Globo, 1987; 2. ed., São Paulo: Globo, 2008. Porta giratória. Rio de Janeiro: Globo, 1988; 2. ed., São Paulo: Globo, 2007.

Quin ta na res. Por to Ale gre: L&PM, 1976. Prosa & verso. Porto Alegre: Globo, 1978. Na volta da esquina. Porto Alegre: Globo, 1979.

A cor do invisível. Rio de Janeiro: Globo, 1989; 2. ed., São Paulo: Globo, 2006.

Nova antologia poética. Rio de Janeiro: Codecri, 1981.

Velório sem defunto. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1990; 2. ed., São Paulo: Globo, 2009.

Os melhores poemas de Mario Quintana. Organização e introdução de Fausto Cunha. São Paulo: Global, 1983.

2. Poemas reunidos

Diário poético. Porto Alegre: Globo, 1985.

Poesias. Porto Alegre: Globo, 1962.

Nova antologia poética. Porto Alegre: Globo, 1985; 12. ed., organização de Tania Franco Carvalhal. São Paulo: Globo, 2007. 80 anos de poesia. Organização e estudo introdutório de Tania Franco Carvalhal. Porto Alegre: Globo, 1986; 2. ed., São Paulo: Globo, 2008.

Água: os últimos textos de Mario Quintana. Organização de Elena Quintana e Eduardo San Martin. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2001. Centenário de Mario Quintana (1906-2006): antologia, poesia e crônica. Organização de Ricardo Wahrendorff e Regina Zil ber man. Bra sí lia: Aba ré/Fundação Astrogildo Pereira, 2007. Para viver com poesia. Organização de Márcio Vassallo. São Paulo: Globo, 2008.

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A laguna azul. De Henry de Vere Stacpoole. Porto Alegre: Globo, 1940. A importância de viver. De Lin Yutang. Porto Alegre: Globo, 1941.

Jammes. Porto Alegre: Globo, 1945. Poei ra. De Ro sa mond Leh mann. Porto Alegre: Globo, 1945. A princesa de Clèves. De Madame de Lafayette. Porto Alegre, Globo, 1945. O barbeiro de Sevilha ou a precaução inútil. De Beaumarchais. Por to Alegre: Globo, 1946.

Spar ken bro ke. De Char les Morgan. Porto Alegre: Globo, 1941. Os grandes sonhos da Humanidade. De René Fülop-Miller. Porto Alegre: Globo, 1942 (em parceria com R. Ledoux). Hotel Shangai. De Vicki Baum. Porto Alegre: Globo, 1942.

Mrs. Dalloway. De Virginia Woolf. Porto Alegre: Globo, 1946. No ca mi nho de Swann. De Marcel Proust. Porto Alegre: Globo, 1948.

O albergue das dores. De Francis

Biombo chinês. De Somerset William Maugham. Porto Alegre: Globo, 1952. Vidas de homens notáveis. De Dana Lee Thomas e Henry Thomas. Porto Alegre: Globo, 1952. O caminho de Guermantes. De Marcel Proust. Porto Alegre: Globo, 1953.

O poder e a glória. De Graham Greene. Porto Alegre: Globo, 1953.

Con tos de Sha kes pea re. De Charkles Lamb e Mary Ann Lamb. Porto Alegre: Globo, 1943.

Os silêncios do Coronel Bramble. De André Maurois. Porto Alegre: Globo, 1944.

O tio prodigioso. De Fredric Brown. Porto Alegre: Globo, 1951.

À sombra das raparigas em flor. De Marcel Proust. Porto Alegre: Globo, 1951.

Contos. De Guy de Maupassant. Por to Ale gre: Glo bo, 1943.

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Os sofrimentos do inventor. De Honoré de Balzac. Porto Alegre: Globo, 1951.

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Paulo Becker é professor de literatura da Universidade de Passo Fundo (RS), escritor e roteirista de programas de televisão (UPF TV/Canal Futura).


AG R A D E C I M E N TO S

Elena Quintana de Oliveira, Paula Biazus, Dulce Helfer, Lucia Rebello, Joaci Pereira Furtado (Editora Globo)

151


Dulce Helfer



INSTITUTO MOREIRA SALLES

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Jornalista responsável: Antonio Fernando De Franceschi (MTb: 9.093).


ESTA OBRA FOI COMPOSTA PELA BEI˜ • COMUNICAÇÃO EM GARAMOND E GILL SANS COM FOTOLITOS E IMPRESSÃO NA IPSIS GRÁFICA E EDITORA PARA O INSTITUTO MOREIRA SALLES EM AGOSTO DE 2009.


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