Edição 297 - Brasileiro rende menos que a média mundial

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ta toda a cadeia, enfraquece a indústria local e desencoraja investimentos estrangeiros”, descreve o executivo da Rearch Consultoria, Marcelo Braga.

RAIZ DO PROBLEMA Para entender o porquê de o Brasil apresentar baixa produtividade, é preciso começar a análise pelos aspectos culturais. A famosa simpatia do povo brasileiro, que tanto ajuda no atendimento ao cliente, é prejudicial em outros momentos e, inclusive, vista como falta de objetividade em outros países. “O brasileiro quer sempre ser amigo, criar vínculos. Na Europa e nos Estados Unidos, eles são mais objetivos, mais pragmáticos. Não entram em assunto pessoal e respeitam o tempo do outro”, observa Braga. Já no Brasil, é comum que antes de iniciar uma reunião, sejam discutidos assuntos triviais, como o trânsito, o resultado do jogo de futebol ou a principal notícia do dia. “Os funcionários começam a ‘viajar’ e acabam não resolvendo nada. Até tratam de assuntos relacionados ao trabalho, mas desfocam do objetivo da reunião. Se o líder não redireciona as pessoas, elas se perdem”, afirma a consultora do Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas (Sebrae), Maria Terezinha Peres. Com isso, a reunião agendada para as 9h, se inicia, de fato, às 10h e, sem que alguém se dê conta, uma hora de trabalho é desperdiçada. Muito dessa postura descompromissada que o brasileiro mantém dentro da empresa é devido a uma questão moral, segundo Celestino. “O brasileiro médio acha que trabalho é algo essencialmente ruim. Em qualquer país do mundo, uma pessoa sabe que tem o dever moral de se sustentar. Aqui, achamos que alguém tem de fazer isso por nós. Falta apreço pelo trabalho. Com essa visão negativa, ninguém se prepara.” Além dos aspectos culturais, problemas socioeconômicos também acabam por refletir em falta de rendimento. Com uma base educacional ruim, é comum que os brasileiros entrem nas empresas com defasagem em conhecimento. Em geral, o brasileiro sabe pouco de muitos assuntos, mas tem dificuldade de se aprofundar nas tarefas por falta de conhecimentos específicos. “Ainda assim, se posiciona como se soubesse, se vende, assume responsabilidade e depois pena porque faltou conhecimento em um detalhe necessário”, afirma Braga. Essa postura acaba por demandar mais tempo na execução da tarefa e resulta em erros. “Quando essa falha não é percebida, é preciso que alguém refaça a tarefa em algum outro momento da cadeia, gerando retrabalho por não ter sido benfeito em um primeiro momento.”

COMO REVERTER? As raízes da questão da baixa produtividade são profundas, mas segundo os especialistas, é possível trabalhar para sanar ou, pelo menos, minimizar o problema. Em primeiro lugar, é preciso investir na gestão da empresa para que se compreendam o grau da falta de rendimento e os prejuízos causados por isso. Já nessa etapa inicial, surge um obstáculo, pois o empreendedor brasileiro não está acostumado a ter na ponta do lápis todos os números que envolvem seu negócio. “Não gostamos de processo. Aplaudimos o improviso”, destaca o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra, alertando que a falta de informações costuma ser ainda mais grave dentro do varejo. “Culturalmente, o varejo tende a acreditar no esforço, na dedicação, na famosa ‘barriga no balcão’. Isso é importante, mas não é mais suficiente. É preciso trabalhar com dados.” Somente com conhecimento do negócio é possível avaliar o nível de produtividade, que consiste em conseguir melhores resultados a partir dos mesmos recursos, trabalhando bem a equipe, controlando as finanças e investindo em tecnologia. “Ouvimos falar que as pirâmides e o Coliseu foram grandes obras de engenharia, mas na verdade foram grandes obras de administração. Para que essas estruturas fossem erguidas, foram geridos milhares de trabalhadores. Não adianta contar com os melhores técnicos, se eles não forem bem administrados. Quando a gestão é ruim, a produtividade vai ser baixa”, ressalta Celestino. Uma boa gestão, capaz de estimular a produtividade, deve, necessariamente, envolver uma liderança forte, capaz de reverter fraquezas características do trabalhador brasileiro em pontos fortes. “Somos mais comunicativos, mais emotivos, mas é possível tirar proveito dessa situação. As características culturais brasileiras têm seu lado positivo, quando o líder sabe direcionar e não deixa a equipe sair do foco”, orienta Maria Terezinha. Também é importante que a liderança se autoavalie. Antes de cobrar maior produtividade dos funcionários, a empresa precisa estar certa de que está oferecendo todas as condições para que um bom trabalho seja desenvolvido, afinal, há uma correlação direta entre produtividade e engajamento da equipe. “As pessoas têm de se sentir incluídas. Você conhece os funcionários pelo nome? Eles te conhecem? O respeito se conquista com um tratamento próximo”, questiona Terra. 2017 AGOSTO GUIA DA FARMÁCIA

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