Revista impressões 11

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PUBLICAÇÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOSPAPILOSCOPISTAS POLICIAIS FEDERAIS - ABRAPOL

EDIÇÃO 11 - JANEIRO DE 2017 | ANO XVII

REVOLUÇÃO PORTÁTIL DESENVOLVIDO POR PAPILOSCOPISTA POLICIAL FEDERAL DO INSTITUTO NACIONAL DE IDENTIFICAÇÃO, SISTEMA ALETHIA OBTEVE ÊXITO NAS OLIMPÍADAS, ACIDENTE COM A EQUIPE DO CHAPECOENSE E ATÉ NO ENEM

REPORTAGEM

ESPECIAL

Saiba mais sobre um assunto que

Conheça o Programa de Localização e Identificação

envolve diversas categorias e opiniões:

de Pessoas Desaparecidas (PLID), que pode mudar o

o Ciclo Completo de Polícia. | pág. 29

panorama do desaparecimento de pessoas no Brasil. | pág. 41

W W W . A B R A P O L . O R G . B R


EM 2017 A IDENTIFICAÇÃO HUMANA É DESTAQUE NA AGENDA DA CAPITAL FEDERAL.

29 a 31 de agosto de 2017

Hotel Royal Tulip Brasília Alvorada - Brasília/DF

Realização

Realização e Organização


AINDA MAIS ATRAÇÕES Biometrics HITech Expo

Congresso Brasileiro de Identificação

Biometrics HITech Conference

Fórum Político

Biometrics HITech Business Arena

Agenda com Autoridades

Lounge de Startups

Painéis Científicos

Encontro FENAPPI e Associações

Minicursos

NOVAS OPORTUNIDADES DE PATROCÍNIO Categorias Expositor

15 cotas

Anunciante

10 cotas

Fórum Político

10 cotas

Agenda com Autoridades

8 cotas

Biometrics HITech Business Arena

6 cotas

Lounge de Startups

5 cotas

Palestra avulsa

2 cotas

FIQUE ATENTO ÀS DATAS

Fevereiro de 2017 Lançamento do hotsite do evento e início da venda dos patrocínios.

Março de 2017 Abertura das inscrições.

29 a 31 de agosto de 2017 Realização do maior evento brasileiro especializado em biometrias e identificação.

Acompanhe as novidades pelas nossas redes sociais ou pelo site www.biometricshitech.show


PALAVRA DO PRESIDENTE

INSISTÊNCIA E A PERSEVERANÇA PARA UM PAÍS MAIS SEGURO E JUSTO

S

er Policial Federal tem se tornado um grande exercício de cidadania e patriotismo. No caso do Papiloscopista Policial Federal, isso tem se elevado à segunda potência. Para desenvolver suas atividades diárias, subsidiadas em suas competências e atribuições, esses policiais têm recorrido seguidamente ao Poder Judiciário para resguardar o direito de laborar e produzir os resultados que contribuem significativamente com os procedimentos de investigação e persecução criminal. Realmente é complicado e difícil de explicar isso à sociedade brasileira. O Sistema Alethia, dentre outros desenvolvidos por Papiloscopistas Policiais Federais, é um exemplo de superação. Mesmo com a escassez de recursos e a desmotivação resultante da falta de reconhecimento institucional no exercício de suas atribuições periciais, os Papiloscopistas transformaram este momento difícil em oportunidade. E, como resultado, obtiveram sucesso nas operações de controle e fiscalização de estrangeiros, na segurança privada durante a realização dos Jogos Olímpicos da cidade do Rio de Janeiro em 2016 e na identificação das vítimas do acidente aéreo da empresa LaMia, na Colômbia, com a utilização desse sistema. Colaboraram, também, com outras unidades policiais, agregando às ações aquilo que lhes é peculiar: “Especialização em Identificação Humana”. Poderíamos, ainda, citar outros casos em que falou mais alto o dever cívico de servir às instituições e à sociedade, colocando à frente o interesse público e coletivo.

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A luta dos papiloscopistas pela valorização e respeito ultrapassa as linhas avançadas da Polícia Federal. Por todo o Brasil, nas unidades da federação, os desafios são os mesmos. Contudo, o empenho, a dedicação e o esforço dos peritos em papiloscopia têm superado as dificuldades e traduzido em realizações efetivas suas propostas de trabalho e o serviço sistêmico nas polícias. No Distrito Federal, a Polícia Civil está prestes a inaugurar o maior centro de identificação e perícia papiloscópica da América Latina. Em Goiás, o projeto Goiás Biométrico – em fase de implementação –, já vem dando resultados. A lotação de Papiloscopistas Policiais na DEIC e da DHPP mostra que a atuação de peritos em papiloscopia dentro das Delegacias Especializadas tem colaborado de forma significativa com os procedimentos investigativos dessas unidades. São iniciativas que possuem um significado muito importante, primeiro porque comprovam que a insistência e a perseverança desses profissionais valem a pena. Segundo, porque apresentam um cenário em que todos os operadores da segurança pública têm seu espaço e mostram como contribuir para um País mais seguro e justo, bastando compreender a importância do trabalho coletivo voltado ao bem-estar da sociedade brasileira.

PRESIDENTE DA ABRAPOL

PAULO AYRAN DA SILVA BEZERRA

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NESTA EDIÇÃO

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ENTREVISTA

O Papiloscopista Policial Federal, Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos, que representou o Brasil na Interpol, em Lyon, fala sobre o período passado na França e o reconhecimento da perícia papiloscópica brasileira

PAPI CIÊNCIA

Pesquisa científica desenvolvida por policiais federais acaba de gerar resultado em Vitória (ES)

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Fique atento aos Riscos Ocupacionais na revelação e coleta de impressões digitais

REPORTAGEM

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PELOS ESTADOS

Conheça os caminhos que levaram o Grupo de Identificação do Rio Grande do Sul a construir a própria Capela de Cianoacrilato

EXPEDIENTE

PELOS ESTADOS

Entenda porque em Mato Grosso, cerca de 60 mil fragmentos não podem ser usados

Conselho Editorial

Bernardo José Munhoz Lobo Jade Kende Umbelino Leonardo Cosme Carvalho da Silva Luciene Marques da Silva Marlon Anselmo Duarte da Costa Paulo Ayran S. Bezerra

Jornalistas Responsáveis e Editores Executivos

Marcos Linhares - MTb 2406-DF João Vitor Fernz - MTb 0007637-DF DIRETORIA EXECUTIVA DA ABRAPOL

Presidente

Paulo Ayran da Silva Bezerra

Vice Presidente

Ramon Santos Fernandez

Secretário Geral

Bernardo José Munhoz Lobo

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PELOS ESTADOS

Um retrato falado deu muito o que falar no Pará

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ESPECIAL

O Programa de Localização e Identificação de Pessoas Desaparecidas (PLID) tem feito a diferença em São Paulo e pode chegar a todo o país

Saiba mais sobre o Alethia o sistema biométrico desenvolvido por papiloscopista policial federal que fez a diferença na segurança das Olimpíadas e Paralimpíadas Rio 2016

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PAPI CIÊNCIA

O Ciclo Completo de Polícia seria uma saída para o Brasil?

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CAPA

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PALAVRA DO PRESIDENTE

A OUTRA FACE

O PPF Thiago Souza encanta com técnica que traz à pintura os detalhes da fotografia

EVENTOS

Congresso de Necropapiloscopia em Natal (RN)

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PELOS ESTADOS

Saiba como, em Pernambuco, a solução de um único caso reduziu o número de explosões de caixas eletrônicos

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HIGHLIGHTS

EVENTOS

Curso de Necropapiloscopia em Goiânia (GO)

FOTO GALERIA

Repórter

Simone Andrade

Projeto Gráfico e Diagramação Gueldon Brito

Revisão

Cácia Leal

Coordenação e Revisão Final Paulo Ayran S. Bezerra

A Revista Impressões é uma publicação trimestral da Associação Brasileira dos Papiloscopistas Policiais Federais.

Diretor Jurídico

Conselho Fiscal

Diretor Financeiro

Titulares Camila Teixeira Feijoo Rogério Silva dos Santos Gabriel Ângelo da Silva Gomes

Marcos Rosseti Picinin A. Vieira Clauber Franco Miranda

Diretor De Assuntos Estratégicos

Jade Kende Goncalves Umbelino

Suplentes Marlon Anselmo Duarte da Costa Luciene Marques da Silva Leonardo Cosme Carvalho da Silva

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HIGHLIGHTS

LUCIO BERNARDO JR. / CÂMARA DOS DEPUTADOS

Nossa convicção é que o acesso único irá motivar e melhorar o clima e cultura organizacional”, deputado federal Subtenente Gonzaga (PDT-MG ), sobre a PEC 273/2016 que propõe que os órgãos elencados no caput do artigo 144 da Constituição Federal sejam organizados em uma só carreira, com provimento originário no primeiro nível.

JOSÉ CRUZ/ AGÊNCIA BRASIL

Ainda nós vivemos uma realidade em que milhares de pessoas são enterradas como não identificados. A intenção do projeto é tentar buscar com que nós possamos dar passos nessa identificação”, senadora Lídice da Mata (PSB-BA) ao discordar do parecer do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) pela rejeição do Projeto de Lei do Senado (PLS) 302/2014 que altera o Código de Processo Penal (CPP) para tornar obrigatórios os laudos periciais necropapiloscópicos.

Trata-se de uma intenção de diminuir a importância dos trabalhos periciais há décadas confeccionados por papiloscopistas da PF”, disse Marcus Firme, diretor parlamentar da Fenapef e presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Estado do Espírito Santo (Sinpef-ES) sobre o artigo 89 da IN 108/2016 limita a atribuição dos papiloscopistas no sentido de fazerem apenas “exames” papiloscópicos.

FABIO RODRIGUES POZZEBOM AGÊNCIA BRASIL

É uma checagem importante. Na semana passada, tivemos a primeira aplicação prática desse sistema. Um cidadão do Qatar, que vinha do Reino Unido, fez o teste e surgiu um mandado de prisão da Justiça britânica. Ele foi detido e deportado”, disse sobre a importância do sistema Alethia, o ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes, ao vistoriar as instalações do aeroporto internacional Eduardo Gomes, em Manaus (AM).

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ENTREVISTA

CARLOS EDUARDO MOREIRA DA SILVA CAMPOS Papiloscopista policial federal representou o Brasil na Interpol, em Nice (França) e ajudou a projetar o país no contexto internacional. Por Marcos Linhares Especial para a revista Impressões

I

CARLOS EDUARDO MOREIRA DA SILVA CAMPOS

nquieto e bem-humorado, Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos (52), é casado, tem um filho e gradou-se como engenheiro agrônomo formado pela UnB em 1991. Em 2005, tomou posse como papiloscopista policial federal. Apaixonou-se pela atividade e os resultados foram aparecendo: Pelo Departamento de Polícia Federal (DPF) representou o Instituto Nacional de Identificação (INI) no INTERPOL Standing Committee Meeting on Disaster Victim Identification, em 2007, em Lyon (França). Depois, representou novamente o INI na International Association for Identification (IAI), em Louisville, Kentucky (EUA) em 2008. Em 2012, novamente na INTERPOL em Lyon, concomitantemente participou do AFIS Expert Working Group e do INTERPOL Symposium. Já em 2013,

ministrou curso sobre Retrato Falado em Alta Definição para policiais cubanos em Havana (Cuba). Enfim, tudo o levou a ocupar o cargo de Oficial de Ligação junto à Subdiretoria de Apoio a Investigação de Fugitivos da Secretaria-Geral da Organização Internacional de Polícia Criminal - OICP/INTERPOL em Lyon. Com o inglês afiado - morou nos EUA quando adolescente em um programa de intercâmbio cultural em 1981,depois fez curso de especialização em ensino de inglês como segunda língua na University of California, em San Bernardino em 1999 - Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos em entrevista à revista Impressões nos fala desse período passado na França e acima de tudo sobre sua visão acerca da perícia papiloscópica brasileira.

Tenho orgulho de ter chefiado por muitos anos antes desta missão em Lyon, o Setor de Representação Facial Humana do INI

SHUTTERSTOCK

VITIMAS DO ATAQUE EM NICE Em 19/07/2016, das 91 vítimas na lista recebida das autoridades francesas constavam: Vítimas Francesas: 51 Vítimas estrangeiras: 33

Nacionalidades das vítimas estrangeiras

Argélia: 1

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Armênia: 2 Bélgica : 1 Estônia : 2 Rússia : 2 Alemanha : 2 Turquia: 1 (residente na Alemanha)

Itália : 5 Cazaquistão : 4 Madagascar : 1 Marrocos : 1 Polônia : 2 Romênia : 1 Suíça : 3

Tunísia : 1 Estados Unidos : 3 Ucrânia : 1

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ENTREVISTA

POLÍCIA TAILANDESA

Cerimônia de encerramento do Forensics Seminar: Countering Terrorism in ASEAN, ministrado em Bangkok-Tailândia, evento que recebeu alunos de diversos países do sudeste asiático

IMPRESSÕES | Como apareceu a oportunidade de ir trabalhar como Oficial de Ligação junto à Subdiretoria de Apoio a Investigação de Fugitivos da Secretaria-Geral da Organização Internacional de Polícia Criminal na OICP/INTERPOL em Lyon? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Recebi o convite diretamente do Coordenador Geral de Cooperação Internacional que me conhecia de missões anteriores de cooperação internacional, porém ao me submeter à entrevista com os oficiais da IPSG-Lyon, me foi oferecida a vaga em Identificação de Vítimas de Desastres, DVI,

devido ao meu perfil forense. Como fui responsável pela tradução para o português do manual de DVI da Interpol e sou um dos membros do grupo de DVI no INI, assim como o primeiro papiloscopista a participar do INTERPOL Standing Committee Meeting on Disaster Victim Identification, a vaga se encaixou perfeitamente nas pretensões do INI e no meu perfil profissional. IMPRESSÕES | Como foi a receptividade e a adaptação? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Eu já conhecia todos os peritos em papilos-

REUNIÃO DO INTERPOL DVI STEERING GROUP EM CINGAPURA

Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos recebendo uma placa de agradecimento pelo curso de DVI ministrado à Polícia de Cingapura

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copia da INTERPOL de encontros anteriores, sendo, portanto, muito bem recebido. Quanto à adaptação, Lyon é uma cidade muito acolhedora e agradável. IMPRESSÕES | Ao passar por essa experiência pode avaliar como anda a perícia papiloscópica brasileira em relação às práticas internacionais? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | O Brasil, em especial o Instituto Nacional de Identificação, em conjunto com suas unidades descentralizadas não deixam nada a desejar em relação a expertise, material

ARQUIVO PESSOAL/ CEMSC

“Somos referência mundial em Retrato Falado em Alta Definição, assim como em comparação e Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos dando uma demonstração prática de coleta de impressões facial forense” identificação papilares em cadáveres pelo método de micro adesão

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ENTREVISTA

PAULA DORA/DPF

“Somos referência mundial em Retrato Falado em alta definição, assim como em comparação e identificação facial forense” de Londres (Metropolitan, City of London & British Transport Police) trabalharam em uma cena de desastre simulada juntamente com os serviços urbanos de busca e salvamento e o serviço de ambulâncias de resgate em áreas de risco. Também a Cena de DVI - Mortuário.

INTERPOL Symposium on Disaster Victim Identification em Maio/16 em Lyon-França

humano e técnico em relação às práticas internacionais. Somos referência mundial em Retrato Falado em alta definição, assim como em comparação e identificação facial forense, com dois programas desenvolvidos pelo Setor de Representação Facial Humana do INI que tenho orgulho de ter chefiado por muitos anos antes desta missão em Lyon. IMPRESSÕES | Cite dois casos internacionais que atuou durante esse período? Como foi essa experiência? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Por ocasião do ataque de 14 de julho, em Nice (França), a IPSG determinou o deslocamento imediato de uma IRT (Incident Response Team) por via terrestre para Nice, esse deslocamento se deu na manhã do dia 15/07/2016. A IRT foi composta por um Specialized Officer de contra terrorismo, uma policial francesa, dois Operational Assistants do Command and Coordination Center e esse Oficial de Ligação no comando de DVI. A IRT deu apoio às famílias no processo de identificação e retorno dos restos mortais aos seus entes queridos. A IRT procedeu à coleta de todas as informações

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Ante Mortem as vítimas estrangeiras e contato direto via I 24/7 além de contatos telefônicos. Acompanhei também o desastre do vôo da German wings, derrubado sobre os Alpes franceses, assim como todos os outros eventos de fatalidades em massa envolvendo estrangeiros nesse período de dois anos na Unidade de DVI daIPSG-Lyon. Participei de diversos treinamentos internacionais, dos quais posso destacar: O Exercise Unified Response que foi um exercício conjunto de desastre em massa da London Fire Brigade / London Resilience Partnership custeado parcialmente pela União Européia. Ele visava testar a resposta nacional e internacional a um desastre em massa com múltiplas vítimas fatais. O cenário montado foi situado em uma usina de energia desativada em Dartford - Kent e replicava um atentado/acidente no centro de Londres. O exercício testou diversos aspectos no atendimento de emergência como busca e salvamento, serviços médicos, autoridades locais e diversos parceiros multi-agência. A unidade de DVI do Reino Unido conduziu um exercício de DVI com múltiplas fatalidades. As unidades de DVI policiais da região

Para isso, um mortuário temporário foi montado próximo à cena do desastre. Policiais e especialistas de 10 diferentes regiões do Reino Unido prestaram apoio mútuo à operação no mortuário. Especialistas forenses também prestaram apoio. Unidades de DVI teams coletaram e registraram dados Post Mortem de atores e manequins no mortuário. Sem falar em Assistência Internacional. Especialistas em DVI de diversos países estiveram presentes na operação do mortuário de países como Holanda, Bélgica, Luxemburgo, França e Alemanha. Participei deste exercício como oficial de ligação da INTERPOL nas reuniões com o Mass Fatality Coordination Group e nos exercícios de mortuário. IMPRESSÕES | De modo geral, como avalia esse período passado na Interpol? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Foi um período de muita relevância, tanto para minha carreira e satisfação pessoal como para o INI, por levar o nome do insti-

“ Acompanhei também o desastre do vôo da German wings, derrubado sobre os Alpes franceses, assim como todos os outros eventos de fatalidades em massa envolvendo estrangeiros nesse período de dois anos na Unidade de DVI daIPSG-Lyon”

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ENTREVISTA

EXERCISE UNIFIED RESPONSE EM KENT (INGLATERRA)

Mortuário provisório montado nas proximidades do evento simulado

tuto e da Polícia Federal para um relevante organismo internacional, notadamente policial. Fato historicamente relevante para o cargo de Papiloscopista Policial Federal. Tanto a rede de contatos internacionais de alto nível como a convivência com policiais e especialistas dos 190 países membros que compõem a INTERPOL formam uma inestimável experiência quer no âmbito pessoal como no profissional. A necessidade de transitar entre diferentes culturas e crenças, representar seu país em alto nível perante autoridades mundiais é um desafio ao mesmo tempo fascinante, complexo e de suma relevância para a projeção do país e da polícia federal brasileira no contexto internacional.

IMPRESSÕES | Você retornou ao Brasil em 19 de novembro. Quais os planos para o futuro? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Na PF, nós vamos aonde somos requisitados, missão dada é missão cumprida, mas gostaria de retornar à minha unidade de origem, o Setor de Representação Facial Humana onde, tenho certeza, posso ser mais útil para a papiloscopia. Ao longo dos anos, juntamente com a equipe do Setor, nos tornamos referência mundial na área, o que me traz muito orgulho e satisfação pessoal e profissional. IMPRESSÕES | Para finalizar, o que acha que ainda podemos melhorar? Falta va-

EXERCISE UNIFIED RESPONSE - SIMULAÇÃO 2

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ARQUIVO PESSOAL/ CEMSC

Coleta de impressão digital por micro adesão

lorização ao papiloscopista brasileiro, em nosso país? Carlos Eduardo Moreira da Silva Campos | Cada dia mais o trabalho pericial do papiloscopista vem sendo reconhecido. Nossos exames periciais levam à autoria dos crimes e à identificação de desaparecidos, ajudamos na busca de suspeitos, na identificação de vítimas de crimes ou de desastres, sejam eles naturais ou causados pelo homem. Procedemos a exames periciais de identificação facial e comparação de imagens faciais, confecção de retratos falados e projeções de disfarces e progressões de idade. Um trabalho fascinante, necessário e fundamental na investigação policial que, tenho certeza, tema cada dia tendo mais visibilidade.

ARQUIVO PESSOAL/ CEMSC

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PAPI CIÊNCIA

CIÊNCIA EM AÇÃO Polícia Civil do Estado do Espírito Santo identifica impressão digital revelada em cartucho deflagrado

Por Carlos Magno Girelli

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PAPI CIÊNCIA

P

esquisa científica desenvolvida por policiais federais acaba de gerar resultado positivo. A Polícia Civil do Estado do Espírito Santo (PC-ES) identificou o autor de uma impressão digital revelada em cartucho deflagrado, coletado em local de crime, com o uso das técnicas sugeridas pela pesquisa. O crime consistiu em um homicídio praticado na Região Metropolitana de Vitória (ES). Visando preservar o sigilo das investigações que se encontram em andamento, as informações a seguir divulgadas ficarão restritas a questões técnicas. A pesquisa teve início em 2013, no Instituto Nacional de Identificação, e foi conduzida pelos PPFs Carlos Magno Girelli e Bernardo Lobo. Os resultados obtidos na primeira fase motivaram um estudo mais aprofundado, levando o PPF Girelli a desenvolver sua tese de Doutorado em Física sobre o assunto na Universidade Federal do Espírito Santo. Uma parte do trabalho dos papiloscopistas consistiu em testar e comparar

PPF GIRELLI

Figura 1. Cartucho deflagrado coletado em local de homicídio pela PC-ES, fotografado em luz ambiente após aplicação de cianoacrilato e gun blue.

diversos reagentes, sujeitos a diferentes condições. Os experimentos ainda não foram concluídos, mas, até o momento, a sequência que produziu os melhores resultados para a revelação de impressões digitais em cartuchos de munição fabricados em latão (deflagrados ou intactos) é a exposição do cartucho a vapor de cianoacrilato, seguida de imersão em solução de Gun Blue, finalizando com a aplicação de revelador fluorescente. Este último pode ser o Amarelo Básico 40, o Ardrox ou a Rodamina 6G, a depender da fonte de luz forense disponível. Outra vertente da pesquisa objetivou estabelecer melhores práticas de fotografia, tendo em vista que a fotografia de impressões digitais em cartuchos apresenta alguns problemas adicionais. Um deles consiste na dificuldade em se obter foco nítido sobre toda a superfície cilíndrica do cartucho, uma vez que a profundidade de campo é reduzida em macro fotografia. Outro problema está relacionado à distorção das linhas papilares quando se fotografa PPF GIRELLI

Figura 2. Dispositivo montado que permite girar o cartucho em ângulos conhecidos entre uma foto e outra, mantendo fixa a distância entre câmera e objeto e o foco.

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PAPI CIÊNCIA

Figura 3. Exemplo de composição fotográfica utilizando a fatia central de cada uma das nove fotografias obtidas após um giro de 40 graus do cartucho, gerando imagem plana de toda a superfície lateral do cartucho.

superfícies não planares. Além disso, considerando o diâmetro relativamente pequeno dos cartuchos comumente encontrados

em locais de crime (calibres 9 mm, .380 e .40), em comparação ao tamanho médio de uma impressão digital, é razoável que

esta ocupe parcela considerável da superfície lateral do cartucho, de modo que uma única fotografia talvez não seja suficiente

Figura 4. Composição fotográfica que permitiu visualizar toda a superfície lateral do cartucho planificada. O cartucho foi fotografado em intervalos angulares de 10 graus, sob luz ultravioleta, após aplicação da sequência de reveladores cianoacrilato + gun blue + Ardrox. A imagem final foi obtida unindo-se as fatias centrais recortadas de cada uma das 36 fotografias do cartucho.

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PAPI CIÊNCIA

superfície cilíndrica. O objeto fotografado foi um cartucho novo, que continha uma impressão digital coletada em papel branco colado ao longo de sua superfície. No caso de homicídio investigado pela PC-ES, os peritos aplicaram tanto a sequência de reveladores sugerida, quanto a técnica de fotografia mostrada. A Figura 4 apresenta a imagem final obtida por meio da composição fotográfica. Foram utilizadas 36 fotografias, tiradas cada uma após um giro de 10 graus do cartucho. O revelador fluorescente aplicado por último foi o Ardrox, e utilizou-se uma

Figura 5. Confronto realizado no AFIS entre a impressão revelada no cartucho deflagrado (à esq.) e a impressão padrão do suspeito (à dir.), apresentada pelo sistema. A conclusão positiva do perito quanto à identificação é corroborada pelos inúmeros pontos característicos coincidentes assinalados em ambas as imagens.

para capturar toda a imagem da impressão digital revelada. Para melhor ilustrar as dificuldades citadas acima, observemos a fotografia mostrada na Figura 1. Trata-se do cartucho deflagrado examinado pela PC-ES, fotografado em luz ambiente, após a aplicação de cianoacrilato e Gun Blue. É possível observar na imagem os três problemas apontados: distorção e falta de nitidez ao se afastar da região central do cartucho, bem como impossibilidade de se visualizar em uma única foto toda a impressão digital revelada. Para superar tais problemas, a pesquisa sugere que seja realizada uma sequência de fotografias do cartucho, mantendo fixa a posição entre objeto e câmera, apenas girando o cartucho em intervalos angulares conhecidos entre uma foto e outra. A Figura 2 mostra o dispositivo montado que permitiu realizar essa tarefa. Uma engrenagem com 36 dentes, acoplada a um eixo com rolamento, possui um porta-amostra no qual o cartucho é fixado. O porta-amostra é cambiável para acomodar cartuchos de diversos calibres. Uma esfera ligada a uma mola repousa no espaço entre dois

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dentes consecutivos da engrenagem, exercendo pressão suficiente para que ela seja mantida fixa naquela posição. A engrenagem pode ser girada manualmente e cada clique gerado pela passagem do dente sobre a esfera significa que a engrenagem girou 10 graus. Assim, o cartucho pode ser girado e fotografado em intervalos angulares precisos de 10 graus ou em múltiplos inteiros desse valor. O foco é ajustado para a região central do cartucho, onde a superfície é praticamente paralela ao plano focal da máquina. Com isso, é possível obter foco nítido sobre uma região maior e no local em que a distorção das linhas papilares é mínima. Com o uso de software de edição de imagens como o Adobe Photoshop, é possível selecionar a fatia central da imagem do cartucho, aproveitando, assim, apenas a porção nítida e sem distorção de cada fotografia. A imagem plana da superfície lateral do cartucho pode ser construída unindo-se essas fatias aproveitadas em cada foto. A Figura 3 mostra em detalhes um experimento no qual foram feitas nove fotografias do cartucho, girando-o em ângulos de 40 graus entre uma foto e outra, totalizando os 360 graus de toda a

fonte de luz ultravioleta. A Figura 5 mostra o resultado positivo do confronto entre a impressão revelada no cartucho e o padrão do suspeito apresentado pelo AFIS, com o assinalamento de diversos pontos característicos coincidentes. O resultado obtido representa um marco na história da identificação forense no Brasil e até no mundo. São raríssimos os casos de identificação de suspeitos com base em impressões digitais reveladas a partir de cartuchos deflagrados. Algumas renomadas instituições, como a Polícia de Nova Iorque (NYPD), sequer processam cartuchos deflagrados em busca de impressões digitais, devido à dificuldade e à falta de expectativa em se obter resultados positivos. A PC-ES, que também procedia como a NYPD e enviava cartuchos deflagrados direto ao setor de balística, acreditou no trabalho desenvolvido e aceitou a missão de incorporar as técnicas propostas em sua rotina de laboratório. Após quase oito meses processando mais de 1.000 cartuchos, chegou-se a esse brilhante resultado, validando o método desenvolvido pela pesquisa. Parabéns à equipe de peritos que trabalhou no caso (Figura 6). O sucesso foi fruto da participação e do empenho de cada um, desde a coleta no local de crime, perpassando pelo processamento das evidências no laboratório, pela fotografia e edição de imagens e pelos exames de confronto, até chegar na emissão do tão esperado laudo POSITIVO!

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PAPI CIÊNCIA

Figura 6. PPF Girelli com Peritos Papiloscópicos da PC-ES que trabalharam no caso. Da esquerda para a direita: Lavínia Marcarini (lab.), Erica Marquezini (lab.), Natália Piol (lab.) e Jenildo Gusmão (AFIS). Não estavam presentes na ocasião da fotografia, mas merecem igual homenagem os colegas do Plantão que realizaram o Exame de Local, coletando, acondicionando e transportando as evidências e também os colegas da Seção Monodatilar responsáveis pela emissão do Laudo. Parabéns a toda a equipe!

* CARLOS MAGNO ALVES GIRELLI Papiloscopista Polícial Federal há 12 anos, lotado no Grupo de Identificação da Superintendência Regional no Espírito Santo. Possui graduação em Física (1998) e Direito (2007), mestrado em Física (2001) e pós-graduação em Política e Gestão em Segurança Pública (2009), todos na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Atualmente é doutorando em Física na UFES, onde também atuou como professor substituto no Departamento de Física em 2002-2003 e 2011-2013.

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Sonhos que casam perfeitamente com imóveis planejados. Projetos que impulsionam sua vida. Somos mais que um grupo imobiliário, somos especialistas na construção de empreendimentos diferenciados para você e sua família sonharem com um grande futuro.


CAPA

MEDALHA DE OURO PARA O SISTEMA ALETHIA Sistema biométrico desenvolvido pelos Papiloscopistas Policiais Federais contribuiu para a identificação de estrangeiros que entraram no país durante as Olimpíadas e atualmente é utilizado em outras missões policiais. Por Marcos Linhares e Simone Andrade Especial para a revista Impressões

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CAPA

N

a hora das lágrimas, a ação se fazia necessária e rápida. Para a identificação dos corpos dos brasileiros, após o acidente aéreo que vitimou 71 pessoas nas proximidades do aeroporto José Maria Córdova, na Colômbia, o Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses da Colômbia contou com a presença de uma equipe de Papiloscopistas Policiais Federais lotados no Instituto Nacional de Identificação (INI/DIREX/PF). Foi montada, em Brasília, uma força-tarefa com nove papiloscopistas e dois servidores administrativos que colaboraram com a realização dos exames complementares e elaboraram os laudos periciais. Para a coleta das digitais em cam-

po, foram escalados Jade Kende e Renata Ferreira, ambos PPFs especialistas em identificação humana, mais especificamente em biometria das impressões digitais, treinados em DVI (Disaster Victim Identification – sigla para Identificação de Vítimas de Desastres) . O Governo colombiano previa três dias para a devida identificação. No entanto, o Governo brasileiro iria diminuir esse prazo por possuir uma carta na manga: o Alethia. A verdade estava lançada... ALETHIA Jade Kende e sua equipe, que já haviam desenvolvidos os sistemas HÓRUS e LINCE (de retrato falado e de exame prosopo-

gráfico de comparação facial), novamente desenvolveram, no Instituto Nacional de Identificação (INI/DIREX/PF), o Sistema Alethia, um programa de computador que, a partir de um notebook conectado a um smartphone e um leitor biométrico, possibilita a verificação de impressões digitais em uma grande base de dados previamente carregada. Em grego, Alethia significa “verdade” ou aquele que não conhece a mentira. O notebook é equipado com um algoritmo de comparação que o transforma em um mini AFIS (sigla em inglês do Sistema Automatizado de Identificação de Impressões Digitais), capaz de reconhecer impressões digitais em poucos segundos.

PAPILOSCOPISTAS DA POLÍCIA FEDERAL NA COLÔMBIA USANDO O ALETHIA

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CAPA

EFICIÊNCIA E ORGULHO PARA O BRASIL As autoridades colombianas ficaram impressionadas com a eficiência do sistema e com o trabalho dos papiloscopistas brasileiros, que foram capazes de identificar, com precisão e rapidez, cinquenta e dois corpos, ou seja, 81,25% do total. Os demais corpos tiveram que ser submetidos a outros procedimentos técnico-científicos da necropapiloscopia para que se concluísse a identificação pela equipe de Papiloscopistas brasileiros.

Jade Kende e Renata Ferreira

LAUDOS PRONTOS Renata Ferreira aponta que, enquanto a equipe de Medellín realizava a coleta e o confronto pelo Sistema Alethia, a equipe

PAPILOSCOPISTAS DA POLÍCIA FEDERAL NA COLÔMBIA USANDO O ALETHIA

Jade Kende e Renata Ferreira, no mortuário na Colômbia, usando o Alethia para identificar as vítimas brasileiras no trágico acidente da Chape

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CAPA

JOSELITO CARNEIRO NEVES

de servidores lotados no INI foi responsável pelo confronto e pela confecção dos laudos de identificação papiloscópica. Essa equipe brasileira foi composta pelos PPFs Hernani Rodrigues Ribeiro, Rebecca Farah Valente, Luciene Marques, Marcelo Ortega, Frederico Batista Abreu, Elias Henrique Hamú, André Luiz Batista, Diogo Rocha Bertoldo e Rogério Corrêa, além das servidoras administrativas Graziela Salgado e Natália Rocha de Azevedo. Toda a equipe foi muito bem-sucedida na realização de suas atividades e recebeu elogios de autoridades que estavam envolvidas no processo”, diz satisfeita a PPF. Havia 77 pessoas a bordo do avião da companhia LaMia, sendo 68 passageiros e nove tripulantes. Seis conseguiram escapar com vida da tragédia, quatro brasileiros e dois estrangeiros. Na quinta-feira (1º/12), às 2h50 da madrugada, todos os 64 laudos papiloscópicos, referentes às vítimas brasileiras, estavam concluídos. MODUS OPERANDI O diretor do INI, Brasílio Caldeira Brant, relembrou a dinâmica: “Houve a determinação do Diretor Executivo da Polícia Federal (PF), Rogério Galloro, para que indicássemos dois papiloscopistas policiais federais para compor uma equipe que seria encaminhada à Colômbia. Eles embarcaram num avião da Força Aérea Brasileira, junto com o equipamento, que já possuía a maioria das impressões digitais dos brasileiros mortos no acidente, advindas dos passaportes. As sete que faltavam foram prontamente encaminharam pelos Institutos de Identificação de onde as vítimas eram originárias. A primeira ideia era a identificação por intermédio da coleta com tinta, comparando cada ficha com cada corpo. Nós, então, sugerimos e utilizamos o Alethia, que a Colômbia não conhecia. Eles haviam previsto três dias para a identificação dos corpos , conta Brant. O diretor do INI revela que “em 20 horas, todos os laudos estavam produzidos e foram encaminhados para o Adido Policial da PF, Geraldo André Scarpellini Vieira

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“ O governo colombiano previa três dias para identificação daqueles corpos. Fizemos, com o Alethia, em 20 horas”, Brasílio Caldeira Brant

(que foi o responsável por abrir portas de acesso para nossa equipe e a quem muito agradecemos). Os documentos foram levados ao Consulado Brasileiro na Colômbia e usados para confeccionar os atestados de óbito necessários para o traslado dos corpos ao Brasil, agora, sim, identificados. Os laudos também foram enviados para a polícia colombiana. Devo enfatizar, também, o grande apoio da Interpol, do Coordenador-Geral de Cooperação Internacional da PF, Luiz Dórea, e do Chefe da Interpol no Brasil, Valdecy Urquiza, além de nosso Diretor-Executivo, que entende o poder e a agilidade com que a papiloscopia atua, e confia nos resultados e na equipe”, esclareceu Brasílio Caldeira Brant.

segurança do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no sentido de localizar “pilotos” (pessoas que vão fazer a prova no lugar de outros). “Com a solicitação da equipe que coordenava as fiscalizações do Enem e como a biometria, pela primeira vez, seria utilizada para acesso às provas, o candidato precisaria usar sua impressão digital. Viu-se, então, a oportunidade de atuação da papiloscopia. Quando nos procuraram, sugerimos o uso do Alethia, que seria feito em suspeitos pré-definidos e naquelas pessoas que tiveram um mandado de condução coercitiva, nas operações ‘Embuste’ e ‘Jogo Limpo’. E, como sempre, o Alethia se mostrou digno de orgulho para todos nós’, contou o diretor do INI”.

ENEM Porém, o caso do acidente com o avião que transportava a “Chape” não foi o único uso do Alethia. Recentemente, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) pediu ajuda à Polícia Federal para ajudar nos procedimentos de

“O Alethia é uma ferramenta hoje utilizada em praticamente todos os nossos trabalhos de captura de foragidos internacionais e está sendo usado largamente”

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No entanto, como e quando o Alethia teve início? ATERRISSANDO NA COPA DO MUNDO 2014 Segundo o criador do Alethia, Jade Kende, o projeto-piloto surgiu durante a Copa 2014, “tínhamos a demanda de verificar todos os vigilantes que trabalhariam nos estádios. Com os equipamentos que tínhamos não seria possível. Tentamos licitar alguns, no entanto só conseguimos concluir a compra dos computadores. A parte de biometria não fora concluída. Então, com os equipamentos cedidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), desenvolvi o programa para verificar vigilantes biometricamente. Próximo aos Jogos Olímpicos do Rio, a Interpol nos questionou sobre a possibilidade de fazermos a fiscalização de 100% dos estrangeiros que entrassem pelos aeroportos. Desenvolvemos, então, o Alethia. Portátil, ágil, suportando uma grande base de dados, com modo fila, para acelerar o atendimento, posso dizer que a ideia inicial nasceu em 2014, mas, como não conseguimos a licitação, nós mesmos fizemos o Sistema”, alega o PPF. Brasílio Caldeira Brant relembra que a ideia inicial era a verificação de nome e fotografia apenas. Quando o INI foi consultado, disse que a segurança maior seria biométrica, uma vez que, normalmente, uma pessoa mal-intencionada muda nome e rosto. Brant esclarece que, diferente do que alguns possam pensar, o Alethia não é um equipamento que qualquer policial possa utilizar, uma vez que a ferramenta não traz categoricamente a identidade de alguém. Ela, como todo sistema Afis, apresenta as sugestões dentro de um universo definido, e é o papiloscopista que faz a análise naquele momento e afirma ou nega se são idênticos.

“ a ideia inicial nasceu em 2014, mas como não conseguimos a licitação, nós mesmos fizemos”

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NOS JOGOS OLÍMPICOS No dia seguinte à visita de inspeção dos Ministros da Justiça, Alexandre de Moraes, e da Defesa, Raul Jungmann, aos aeroportos, em 27/07, o Sistema Alethia da PF impediu que um estrangeiro entrasse no Brasil pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos. Tratava-se de P.I.D., de 46 anos, procurado pela Interpol e foragido do Qatar, onde havia sido condenado a seis meses de prisão. A partir das informações do Alethia, o estrangeiro foi retirado da fila e encaminhado a uma área reservada, para a conferência de sua identificação. PPFs realizaram os exames e elaboraram laudo de perícia papiloscópica, confirmando sua identidade. Como o sujeito constava da lista de difusão vermelha da Interpol, foi impedido de entrar no território nacional. O sistema foi utilizado nos principais aeroportos do País durante o período de realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, no controle de entrada dos estrangeiros. Também foi utilizado na fiscalização dos vigilantes contratados para fazer a segurança nos estádios dos jogos, garantindo que eram os mesmos que passaram previamente por cadastro e verificação de antecedentes criminais nas unidades da PF. À época, o Ministro Alexandre de Moraes disse que todos os sistemas e equipamentos adquiridos para a segurança dos aeroportos durante os Jogos Rio 2016 ficariam como legado e continuariam a ser utilizados após a realização do evento. “Uma outra ação não prevista por nós trouxe o inusitado. Essa ferramenta atuou inocentando um estrangeiro, homônimo de alguém que constava da lista de difusão, que possuía uma certa semelhança fotográfica com o procurado. Em um primeiro momento, a pessoa seria deportada. Assim que a equipe foi chamada, verificou-se a biometria e constatou-se que não se tratava do mesmo indivíduo procurado. Então, esse estrangeiro teve, sim, o direito de acesso ao Brasil, coisa que talvez não aconteceria sem o Alethia”, recorda-se o diretor do INI.

HOJE O Alethia, apesar do fim para o qual foi concebido, possui utilização bastante ampla. Ele pode ser utilizado em várias situações, inclusive em investigações policiais. Talvez esse seja o maior foco dele, porque o banco de dados poderá ser alimentado com diferentes biometrias. Em apoio a um pedido da Polícia Civil de Goiás, em uma verificação volante com um foco definido, “nós pudemos inserir no Alethia todas as impressões digitais criminais do Estado no sistema, e o equipamento foi utilizado com sucesso nessa verificação”, endossa o diretor do INI. SEGURANÇA PRIVADA Outro uso que pode ser dado ao Alethia é na verificação de vigilantes feita pela PF. “Nós cadastramos biometricamente esses vigilantes, então, em determinado momento, teremos cem por cento dessas biometrias. O equipamento poderá ser usado para, de maneira itinerante, auxiliar Delegacias de Segurança Privada da Policia Federal na fiscalização desses profissionais, quanto a sua situação cadastral. Imagine um vigilante que esteja trabalhando em determinada agência bancária e, em uma verificação aleatória, comprovar por meio das impressões digitais, se está efetivamente cadastrado. A utilização é bem ampla”, pontua Brant. PLANOS PARA O FUTURO Brasílio Caldeira Brant pontua que a ideia é reduzir as dimensões do equipamento Alethia e aprimorar sua utilização. O foco dessa ferramenta são as investigações a serem definidas pela autoridade policial. Numa consulta ao INI, eles orientarão, segundo o diretor, sobre isso. Quanto ao auxílio na identificação em aeroportos, onde tudo começou, seria uma grande utilização, mas, para que isso aconteça, é preciso que haja investimento, que sejam adquiridos equipamentos para serem aprimorados com esse foco. O Governo está preocupado com segurança e o equipamento promove isso e não provoca filas.

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PAPILOSCOPIA E ALETHIA ALIADOS DA INTERPOL

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ra ainda manhã na quinta-feira (27/10), quando o americano, procurado pela Interpol por ter cometido crimes cibernéticos e acusado de fraudar corporações em vários países, desviando ao menos R$ 6 milhões de empresas dentro e fora dos Estados Unidos, Michael Sabatine (nome falso usado), ou melhor, Michael

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Knighten, foi preso pela Polícia Federal em Blumenau (SC). O sistema tem sido usado para positivar indivíduos procurados internacionalmente. Quem nos conta isso é o Chefe da Interpol no Brasil, Valdecy Urquiza. “Foram duas situações interessantes. Uma com o uso do Alethia no momento da prisão, para se confirmar a identidade

“ Em 2015, batemos o recorde mundial de capturas internacionais da Interpol. Foram 56 pessoas presas aqui no Brasil. Quase a totalidade contou com a participação da equipe de papiloscopia”

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ELZA FIUZA/AGÊNCIA BRASIL

do culpado, e outra na fase de investigação. Nós tínhamos a digital do suspeito feita nos EUA, contudo, não estávamos com a do alvo aqui no Brasil. Ele estava muito recluso, praticamente não saía de casa e isso dificultava a obtenção dessa informação. Ele utilizava documentos falsos, então não constava em nenhum prontuário a digital dele para que se pudesse comparar. Acabamos montando uma operação, na qual conseguimos pegar um copo de vidro que o alvo utilizara enquanto estava na academia. Esse copo havia sido deixado intencionalmente em determinado local, obrigando o sujeito a ter que o retirar para usar o equipamento. Logo depois nós recolhemos o objeto. Foi o que nos possibilitou extrair dois fragmentos bem preservados. E a certeza de que se tratava de quem procurávamos só ocorreu no momento da abordagem, na residência dele, quando um colega papiloscopista fez a conferência com a digital encaminhada pela Interpol. E graças ao uso do Sistema Alethia, ele está preso em Santa Catarina, aguardando, ainda, o julgamento do processo de extradição junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Foi mais um caso de sucesso e que, sem a participação do INI e do Alethia, não seria possível”, aponta o Chefe da Interpol no Brasil. Urquiza lembra como surgiu a ideia desse Sistema: “o Alethia é uma ferramenta hoje utilizada em praticamente todos os nossos trabalhos de captura de foragidos internacionais e está sendo usado largamente. Surgiu de uma conversa nossa com o INI. Isso porque a Interpol mantém, em Lyon (França), um banco de dados com a biometria de pessoas procuradas. Esse banco de dados possui cerca de 20 mil indivíduos cadastrados, pessoas com difusão vermelha e que são procuradas por um dos 190 países que compõem a Interpol. A Interpol possuí um equipamento de identificação biométrica, mas ele não possuía condições práticas de funcionar, e, nesse contexto, o INI tomou a dianteira, por meio dos PPFs que lá trabalham, para buscar uma solução. E foi quando surgiu a ideia do Alethia. Colocamos em prática o

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O chefe da Interpol no Brasil, Valdecy Urquiza (E), e o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, na inauguração do Centro de Cooperação Policial Internacional (Elza Fiuza/Agência Brasil)

projeto-piloto no aeroporto de Guarulhos (SP), que foi muito bem-sucedido. Tivemos uma equipe de PPFs recrutados especificamente para essa missão. Nesse período todo, 100% dos estrangeiros que chegaram ao Brasil, inclusive com identificações positivas, passaram pelo Sistema. Desde então, nós passamos a utilizá-lo em todas as nossas operações aqui para captura de foragidos”, revela o Chefe da Interpol no Brasil. RECORDE MUNDIAL “Para se ter uma ideia, no ano passado, nós batemos o recorde mundial de capturas internacionais da Interpol. Foram 56 pessoas presas aqui no Brasil. Quase a totalidade desses casos contou com a participação da equipe de identificação biométrica. Quando essa identificação não é possível, utilizamos, em muitos desses casos, a identificação facial por meios dos laudos prosopográficos. Esses laudos dão à equipe de delegados que

atua aqui no escritório a tranquilidade de representar por uma medida de prisão junto ao STF. Este ano continuamos eficientes: já estamos com 43 presos até o momento”, revelou Urquiza. Pela relevância da atividade que eles vêm executando, hoje nós temos dois PPFs que trabalham na Secretaria-Geral da Interpol, em Lyon (França), com atividades relacionadas à identificação biométrica e facial de vítimas de desastres. Estão apoiando outros países, mas principalmente absorvendo conhecimento para ser repassado aqui no Brasil quando eles retornarem”, disse. INTERNACIONAL Segundo Urquiza, o Alethia não é, ainda, muito conhecido na comunidade internacional e, toda vez que temos oportunidade de apresentá-lo a alguma outra força, alguma outra agência policial estrangeira, eles ficam surpresos”, finalizou.

POLÍCIA FEDERAL/DIVULGAÇÃO

Investigadores usaram copo para comprovar identidade do norte-americano

Hacker era procurado pela Interpol

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RISCOS OCUPACIONAIS NA REVELAÇÃO E COLETA DE IMPRESSÕES DIGITAIS Proposição de Guia de Toxicidade de Reveladores Papiloscópicos em Laboratórios Forenses Por Marina González*

INTRODUÇÃO A ciência forense é multidisciplinar por natureza; por isso, além de unir diversas ciências em prol da justiça, também é possível interligar conceitos, visando à segurança da rotina do trabalho pericial. Aqui, colocamos a toxicologia ocupacional a serviço da papiloscopia, sendo a toxicologia ocupacional ramo da toxicologia que controla xenobióticos (químicos ou não) existentes no ambiente de trabalho com o objetivo de fornecer informações acerca da exposição dos trabalhadores a essas substâncias. A Papiloscopia é uma das principais formas de identificação humana e se faz importante por possuir métodos baratos, rápidos e com resultados concretos. As impressões digitais podem ser a conexão entre o praticante do delito e o crime, oferecendo a autoria ao fato. Quando as impressões papilares são latentes, necessitam passar por processos de revelação que podem envolver substâncias químicas que criam um contraste entre a impressão e a superfície onde está depositada. Essas substâncias são os reveladores papiloscópicos, que podem ser divididos em: substâncias que aderem às impressões

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por forças intermoleculares e substâncias que reagem quimicamente com as impressões. Um bom método de revelação cria um contraste entre a impressão digital e a superfície em que ela foi depositada e é fácil de ser executado, sensível e reprodutível. Entender a química da composição das impressões digitais é crucial para o estudo das substâncias que serão empregadas para sua revelação. A partir desse entendimento, é necessário conhecer as substâncias químicas que constituem os reveladores, os cuidados na sua manipulação e como agir em caso de acidentes. Esse conhecimento deve ser considerado na perícia brasileira, pois profissionais de diversas áreas podem atuar na profissão de papiloscopista, não havendo curso específico prévio ao curso de formação para habilitação à profissão. Desse modo, o presente trabalho teve como objetivo revisar pontualmente a ciência papiloscópica para listar as principais metodologias de revelação de impressões digitais, identificar os reveladores papiloscópicos e informar os riscos toxicológicos ocupacionais com a proposição de um guia de toxicidade de reveladores para rotina

forense. Uma das noções importantes no trabalho do papiloscopista é compreender o risco ocupacional envolvido não apenas nas situações inusitadas que a profissão oferece, mas no tipo de material em que se entra em contato e quais as medidas de proteção pessoal e coletiva devem ser tomadas durante a atividade pericial. Para isso, é fundamental que se possua boas práticas de laboratório (BPL), com um guia de riscos tóxicos, contendo informações acerca dos reveladores papiloscópicos. Diante da necessidade de mais acesso a informações acerca dos reveladores e de seus riscos, o compêndio deve conter informações sobre o risco setorizado dos materiais dentro do laboratório (mapa de risco), informações sobre a manipulação e composição química dos reveladores papiloscópicos e, principalmente, alertas de cuidado pelo laboratório e noções de primeiros-socorros. MATERIAIS E MÉTÓDOS A pesquisa foi realizada com a revisão sistemática baseada no protocolo Crochrane referenciada por Rother (2007), do período de fevereiro a julho de 2016,

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com os descritores: “reveladores papiloscópicos”, “perícia papiloscópica”, “impressões papilares”, “fingerprint analysis”, “revelation of latent fingerprints”, “fingerprint development” e “fingerprints” nas bases de dados Science Direct, Scielo, Portal de Periódicos da CAPES e Google Scholar. Os artigos-base selecionados para a formulação deste estudo foram: “Forensic Chemistry: The revelation of Latent Fingerprints” (FRIESEN, 2015) e “Identification: Fingerprints a Key Identification – Detection, Identification and Interpretation” (KOBUS et al, 2016). Adicionalmente, foram desenvolvidas pesquisas relacionadas às substâncias químicas que compõem os reveladores papiloscópicos em fichas de informação de segurança de produtos químicos (FISPQ) e em fichas de dados de segurança de material (MSDS) para compilação de dados de toxicidade ambiental, risco ocupacional e descrição de equipamentos de proteção individual e coletivos. Em laboratórios de revelação de latentes, o ambiente e os recursos são variados, por isso, cada laboratório deve possuir seu guia, podendo este artigo servir de base para sua elaboração. RESULTADOS Os resultados foram compilados detalhadamente, seguindo o critério de classificação dos reveladores papiloscópicos em (1) substâncias que promovem reações químicas – ninidrina, DFO (1,8-diazafluoren-9-one), amido black, nitrato de prata, revelador físico e Gun Blue; (2) substâncias que promovem aderência física – pós (óxido de ferro), pequenas partículas (dissulfeto de molibidênio, dióxido de titânio, óxido de zinco, óxido de ferro), iodo, corantes (amarelo básico, rodamina 6G, violeta genciana); e (3) substâncias que promovem reação química e aderência física – ésteres de cianoacrilato. A organização deu-se de acordo com o nome do revelador, a composição química, a técnica de revelação, a superfície e o material a que se destinam, informações de risco toxicológico e quais equipamentos de

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proteção individual (EPI) e proteção coletiva (EPC) devem ser utilizados (Tabela 1). De modo geral, quando da manipulação dos reveladores, o papiloscopista precisa dos equipamentos básicos de proteção individual, jaleco, luvas resistentes aos vapores orgânicos (nitrílicas, butílicas), máscara para pós e/ou vapores orgânicos e óculos de proteção. A manipulação exige local arejado e com capela de exaustão para a dissipação dos vapores orgânicos e pós. Entre os reveladores, faz-se importante citar que alguns necessitam de adição de calor para iniciar a revelação, como por exemplo, a ninidrina, os ésteres de cianoacrilato e o iodo, este último tem potencial de sublimação, necessitando isolamento e vedação completa quando utilizado. Essas substâncias químicas, em altas temperaturas, elevam a concentração de gases no ambiente, o que pode acelerar a intoxicação e aumentar a superfície de absorção da substância com as células. Ademais, resumidamente, muitos reveladores papiloscópicos possuem veículos que podem ser tanto quanto ou mais tóxicos que a própria substância ativa para a revelação. Três substâncias merecem destaque por serem os veículos mais comumente utilizados: o metanol, o etanol e o ácido acético. O metanol, substância química orgânica da classe dos álcoois, é inflamável e usado em especial como solvente; pode causar irritação nas mucosas e possui efeito tóxico ao sistema nervoso, principalmente ao nervo óptico, podendo levar à cegueira permanente. Os sintomas de exposição incluem dores de cabeça, vertigem, astenia, sonolência, acidose metabólica, náuseas, vômito, coma, cegueira e morte. A dose para causar intoxicação fatal em humanos é inferior a 150 mg/kg. Já o etanol, também da classe dos álcoois, apesar de ser mais comumente utilizado em laboratórios, é um líquido inflamável e, em altas concentrações, pode formar misturas explosivas com o ambiente. Ele é passível de causar lesões oculares graves, com toxicidade órgão-específico (fígado, tecidos nervosos), danos às células germi-

nativas, sonolência, vertigem, irritação de vias respiratórias e irritação gastrointestinal. Por fim, o ácido acético, substância orgânica classificada como ácido carboxílico, possui odor característico, sendo facilmente identificável, pois está presente na composição do vinagre de cozinha, e, por essa mesma razão, seus efeitos são subestimados. Ele é muito irritante se inalado e/ou ingerido, pode causar queimaduras graves na pele e em mucosas e, em elevadas doses, levar à morte. CONCLUSÕES A ciência papiloscópica lança mão de muitos conhecimentos da química forense e da toxicologia para a revelação de impressões digitais latentes. Durante a pesquisa, não foram achados compêndios específicos que ressaltassem a importância dos cuidados durante a manipulação dos reveladores papiloscópicos. A internet traz informações químicas e toxicológicas relevantes; no entanto, não há orientação quanto à necessidade de tais informações estarem presentes no ambiente de trabalho. Além disso, as fichas não são muito práticas e são pouco explicativas para o público geral, com códigos e desenhos que podem dificultar a interpretação das inforMARINA GONZALEZ

Resumidamente, muitos reveladores papiloscópicos possuem veículos que podem ser tanto quanto ou mais tóxicos que a própria substância ativa para a revelação

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mações, ainda mais se existir uma situação de emergência. As MSDS dos reveladores papiloscópicos são principalmente divulgadas pela empresa Sirchie, com o nome de venda apenas no idioma inglês, o que também pode dificultar o auxílio em caso de necessidade. Um guia de riscos toxicológicos deve ser objetivo, de fácil consulta e estar acessível a todos. Ademais, não pode ficar restrito ao ambiente laboratorial, mas sim disponível para todo e qualquer papiloscopista que trabalhe no local, por exemplo.

Assim, durante o curso de formação dos papiloscopistas, é necessário enfatizar a importância do uso de EPIs no ambiente laboratorial e nos locais de crime. Ressalta-se, ainda, a modificação de consciência ocupacional e reformulação dos Institutos de Identificação para melhor amparo das informações de manipulação dos reveladores papiloscópicos, permitindo que as informações toxicológicas estejam presentes no ambiente de trabalho e de fácil alcance para consultas eventuais. Além disso, é importante a presença de profissionais da

área capacitados para ministrarem cursos de reciclagem e para a fiscalização da segurança durante o trabalho. Evidencia-se a dificuldade de compilação de informações toxicológicas acerca dos reveladores papiloscópicos e a carência do sistema de segurança pública no que diz respeito ao cuidado com o profissional da área. Assim, com a breve apresentação dos resultados, sugere-se um modelo de estruturação de informações toxicológicas das substâncias químicas utilizadas na revelação de impressões papilares.

TABELA 1 – COMPILAÇÃO RESUMIDA DE DADOS DOS REVELADORES PAPILOSCÓPICOS. SUBSTÂNCIAS QUE PROMOVEM REAÇÕES QUÍMICAS Nome

NINIDRINA

Composição química

Técnica de Revelação

Superfície/Material

Riscos Tóxicos

EPI e EPC

Princípio ativo em pó: 2,2-dihydroxyindane-1,3-dione.

Reação com aminoácidos livres. A ninidrina pode ser borrifada no papel, que pode ser aquecido em uma estufa para acelerar o processo de reação da ninidrina com os aminoácidos. No entanto, a reação deve ser controlada para o calor não agir em demasiado sobre o papel (FRIESEN, 2014). A amina primária vai se condensar com a segunda molécula de ninidrina para formar a molécula diketohydrindylidene-9, conhecida como reação púrpura de Ruhemmann. A reação é instável e tende a desaparecer do papel, por isso, após a imediata revelação, é necessário o registro fotográfico (FRIESEN, 2014).

Papel, principalmente.

Média toxicidade. Irritação nas mucosas da boca, além de faringe, esôfago e aparelho gastrointestinal, mediante deglutição. Liberação de vapores orgânicos, igualmente prejudiciais, pode gerar irritação local, lacrimejamento, hiperemia das conjuntivas, náuseas e vertigem. Classificado com pictograma de atenção para risco químico.

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção.

Duas moléculas de DFO reagem com resíduos de aminoácidos presentes nas impressões digitais, que resultam num composto altamente conjugado, como o da reação púrpura de Ruhemann de coloração vermelha ou rosa. A substância formada também mostra excitação aproximada de 470 nm e necessita de luz específica (FIESEN, 2014). O uso do DFO na revelação de impressões não afeta o uso de outros reveladores, como nitrato de prata e ninidrina (KOBUS, 2016).

Papel, principalmente (funciona como uma alternativa moderna mais sensível em que não há resposta em relação à coloração da ninidrina).

Classificado como gás tóxico, explosivo e corrosivo. Pode causar danos aos tecidos. Classificado como perigoso nos pictogramas químicos de risco tóxico. Tóxico por ingestão e inalação. Passível de causar queimaduras e também pode afetar diretamente olhos, cérebro, fígado e rins.

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção; – óculos com lentes adequadas ao comprimento de 470 nm.

O naftol negro reage com as proteínas do sangue, principalmente com a albumina, formando um complexo de cor azul escuro vivo ou preto. A solução de revelação pode ser composta de metanol e ácido acético, responsável pela fixação e por uma solução de lavagem composta de água. Existem preparações de amido black que levam apenas água e ácido acético, no entanto é importante fazer o registro fotográfico após a revelação.

Revelação de impressões fixadas em sangue.

Veículos: metanol, etanol, éter de petróleo.

Princípio ativo: 1,8-diazafluoren-9-one (DFO).

DFO (1,8-diazafluoren-9-one)

Amido Black

Veículos: ácido acético, acetato de etila, metanol.

Princípio ativo: Ácido 2,7-Naphthalenodisulfonico acid, 4-amino-5- hidroxi-3-((4-nitrofeenil) azo)-6-(fenilazo)-, sal dissódico. Veículos: água, ácido acético e ácido fórmico.

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EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar.

EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar. Classificado como perigoso nos pictogramas de risco químico, é tóxico, inflamável e corrosivo. Pode provocar queimaduras e lesões oculares graves, além de ser suspeito de causar anomalias genéticas. O excedente do revelador deve ser descartado em recipiente identificado e encaminhado para local de gerenciamento de resíduos químicos.

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção. EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar.

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SUBSTÂNCIAS QUE PROMOVEM REAÇÕES QUÍMICAS (continuação) Nome

Gun Blue

Composição química

Técnica de Revelação

Superfície/Material

Riscos Tóxicos

EPI e EPC

Princípio ativo: dióxido de selênio, sulfato de cobre.

Quando a solução entra em contato com a superfície metálica, ela reage com a superfície, exceto no local onde estão presentes ácidos graxos dos resíduos das impressões, ou seja, reage em torno delas. O cobre e o selênio presentes na mistura são reduzidos na presença do zinco que normalmente está presente em misturas metálicas.

Superfícies metálicas e estojos de munição, armas e afins.

Recebe o pictograma de perigo, pois pode causar danos no trato gastrointestinal. Além disso, pode causar queimaduras na pele e oculares. Tem potencial de biomagnificação em ambientes aquáticos (acúmulo dos sais metálicos em fauna e flora aquáticos).

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção.

Veículo: água – algumas formulações utilizam ácido sulfúrico (H2SO4 ).

EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar.

SUBSTÂNCIAS QUE PROMOVEM ADERÊNCIA FÍSICA Nome

Pós (Negro de fumo, magnético, fluorescentes e branco)

Composição química

Técnica de revelação

Superfície/Material

Riscos Tóxicos

EPI e EPC

Princípio ativo: óxido de ferro, dióxido de manganês, óxido de titânio, óxido de zinco, ferro metálico, alumínio metálico, carbonato de chumbo*.

Utilizados amplamente nos locais de crime, em busca de impressões latentes recentes, à medida que o tempo passa, há predominância de compostos oleosos que são os principais para aderência dos pós. As principais forças de atuação são Van Der Walls e, em alguns casos, ligações de Hidrogênio mais fortes (CHEMELLO, 2006; FRIESEN, 2014).

Diferentes superfícies e materiais.

Podem causar danos importantes aos tecidos pulmonares e nas vias respiratórias. *Nos pictogramas de risco, o chumbo recebe classificação de potenciais causadores de danos genéticos e em células germinativas. Muitos institutos de identificação baniram o uso de carbonato de chumbo por esse motivo. O pó majoritário nas composições é o óxido de ferro, que, em altas temperaturas, pode oxidar a óxido férrico com potencial explosivo. Poderá ocorrer desconforto temporário nas vias respiratórias, devido à irritação mecânica quando a exposição for bem acima do limite de exposição ocupacional.

EPI: – jaleco; – luvas de látex; – máscara PFF1; – óculos de proteção.

O papel é colocado dentro de recipiente com iodo sólido e, na temperatura ambiente, irá sublimar dentro do espaço de confinamento (recipiente fechado) e revelar a impressão pela interação com os resíduos presentes nas impressões; a revelação gera uma imagem amarelo-alaranjada. A impressão deve ser fotografada logo após a revelação, pois o iodo é instável. O mecanismo de revelação não está bem estabelecido, mas sugere-se a presença de forças de Van Der Walls na reação, o que explicaria a brevidade do tempo de reação (FRIESEN, 2014).

Principalmente papel térmico.

Muito tóxico, mas recebe pictograma de atenção.

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção.

Veículos: resina, caulin, talco, amido.

Princípio ativo: Iodo (I2). Veículo: nenhum.

Iodo

EPC: – capela, sem exaustão no momento do uso dos pós por motivos de dispersão.

EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar.

SUBSTÂNCIAS QUE PROMOVEM REAÇÃO QUÍMICA E ADERÊNCIA FÍSICA Nome

Composição química

Técnica de revelação

Superfície/Material

Riscos Tóxicos

EPI e EPC

Princípio ativo: etil-2-cianoacrilato e metilcianoacrilato.

A revelação é feita em ambiente fechado com ponto de água (em locais que contenham baixa umidade do ar, inferior a 40%). O cianoacrilato é exposto a uma fonte de elevação de temperatura até a vaporização completa no ambiente fechado; então a fonte de calor é cessada. Após a fumigação, os vapores fixam-se, retornando ao estado sólido, nas superfícies dos materiais. É necessário muito cuidado no controle da temperatura, pois pode haver formação de gases tóxicos (FRIESEN, 2014).

Materiais de superfície lisa.

Recebem o pictograma de atenção, mas os vapores podem ser prejudiciais, causando danos nas mucosas e na pele. A temperatura de vaporização está entre 59°C e 65°C, e um superaquecimento pode gerar a formação de ácido cianídrico (FIGINI, 2012).

EPI: – jaleco; – luvas nitrílicas (à prova de solventes orgânicos); – máscara para solventes orgânicos; – óculos de proteção.

Sem veículo. Ésteres de Cianoacrilato

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EPC: – capela de exaustão; – ambiente com fluxo de ar. *No momento da revelação, o fluxo da capela deve estar desligado.

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PAPI CIÊNCIA

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maio de 2016;

*Artigo desenvolvido

*MARINA GONZÁLEZ

como pré-requisito ao

Graduada em Toxicologia Analítica pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre – UFCSPA (2014). Pós-graduada em Perícia Criminal e Ciências Forenses pelo Instituto de Pós-Graduação – IPOG (2016). Atualmente, é mestranda de Ciências Farmacêuticas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, desenvolvendo pesquisa acerca do perfil químico de Cannabis sativa L.

título de especialista

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em Perícia Criminal e Ciência Forense – IPOG (Versão resumida)

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REPORTAGEM

CICLO COMPLETO DE POLÍCIA : PROBLEMA OU SOLUÇÃO? Por Marcos Linhares, Simone Andrade e Vitor Ferns Especial para a revista Impressões

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REPORTAGEM

O

Ciclo Completo de Polícia é um assunto que envolve diversas categorias e opiniões. Para se ter uma ideia, há um número representativo de Propostas de Emendas à Constituição (PEC) tramitando sobre o tema na Câmara dos Deputados, encabeçadas pela PEC Nº 430/2009, de autoria do Deputado Celso Russomano (PP/SP), que visa extinguir as Polícias Civis e Militares, criando uma nova Polícia, única e de Estado. Sem contar com a PEC 102/2011, do Senador Licenciado Blairo Maggi (PP/MT), que visa alterar dispositivos da Constituição Federal para permitir, à União e aos Estados, a criação de uma polícia única. Tudo, normalmente, passando por alterações no Artigo 144 da Constituição brasileira. A discussão envolve elementos que sugerem a criação de uma nova polícia, desconstituindo as Polícias Civis e Militares, além de desmilitarizar os Corpos de Bombeiros, instituindo novas carreiras, cargos e estrutura básica, e, ainda, pela perspectiva de os policiais federais poderem atuar em ciclo completo, dentre vários outros. De acordo com informações divulgadas pelo Grupo de Trabalho sobre Carreira (GTC), da Federação Nacional dos Policiais Federais (FENAPEF), composta por Adelson Cabral (RS), Antônio Moreira (SC), Magne Cristine (PE) e Márcio Ponciano (DF), “somente se entende o que é o ciclo completo de polícia se forem entendidas as funções de polícia, que nada mais são do

ASCOM/ FENAPEF

que a classificação das atividades policiais pelo momento de atuação da polícia: se antes do crime, pelas atividades de prevenção (função de polícia administrativa), ou depois do crime, pelas atividades de repressão (função de polícia investigativa). No Brasil, um órgão de polícia faz a atividade de prevenção ao crime e outro, a de investigação do crime. Como exemplo, nos Estados, a Constituição Federal atribuiu à Polícia Militar (PM) a atividade de prevenção e à Polícia Civil (PC) a atividade de repressão”, disse. Ainda segundo o GTC, da FENAPEF, “sabemos que a PM, mesmo sem ter a atribuição legal de investigação, internamente, se estruturou para atuar nessa área, pelas conhecidas P2. Por sua vez, a PC, mesmo sem ter atribuição legal de prevenção, internamente, também estruturou sua área de inteligência para prevenir crimes, além de realizar várias outras atividades preventivas, como o patrulhamento com viaturas, a realização de barreiras e a utilização de aeronaves, ou seja, para conseguirem fazer bem o trabalho que lhes compete, a PM e a PC entram na competência uma da outra. No entanto, mesmo assim, isso só ocorre em situações específicas, não como regra geral de atuação em ambos os órgãos. Por isso, cria-se um vazio que só faz crescer a criminalidade, pois no atual modelo bipartido, a atuação policial falha tanto na prevenção quanto na investigação do crime”, pontuou.

Segundo o presidente da FENAPEF, Luís Antônio Boudens, o modelo de ciclo completo proporciona mais eficiência à Polícia Federal.

Sobre a Polícia Federal (PF), o GTC explicou que “embora a PF seja um órgão de ciclo completo, os policiais não atuam em ciclo completo, pois lhes falta uma carreira única. Atualmente, na PF, os cargos policiais (Agentes, Escrivães e Papiloscopistas) que efetivamente atuam nas investigações e detêm a expertise policial, são impedidos de exercerem chefias, que são reservadas a outro cargo, o de delegado federal, cujos ocupantes entram no órgão por concurso distinto e vêm a ser chefes dos demais policiais. Muitas vezes, esses profissionais passam a ocupar o cargo de delegado sem experiência policial anterior, pois a lei lhes exige três anos de experiência policial “ou”

PROPOSTAS DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO APENSADAS À PEC 430/2009 Estão apensadas a PEC nº 432/2009, de autoria do Deputado Marcelo Itagiba (PSDB/RJ), que visa unificar as Polícias Civis e Militares; a de nº 321/2013, de autoria do Deputado Chico Lopes (PCdoB/CE), que visa extinguir as Polícias Civis e Militares, criando polícias estaduais e municipais e implantando o ciclo completo; a de nº 361/2013, do Ex-Deputado Otoniel Lima (PRB/SP), apelidada de PEC do FBI, que visa aumentar a eficácia da Polícia Federal, nos moldes do FBI, com novas diretrizes para a organização da carreira policial federal e para a valorização de seus integrantes; a de nº 423/2014, de autoria do Deputado Jorginho Mello (PR/SC), visando ao ciclo completo; a de nº 431/2014, de autoria do Deputado Subtenente Gonzaga (PDT/MG), que visa ao ciclo completo; a de nº 89/2015, de autoria do Deputado Hugo Leal (PROS/RJ), que visa à transformação dos Delegados de Polícia em Juízes; a de nº 127/2015, de autoria do Deputado Reginaldo Lopes (PT/MG), que visa à criação do Ciclo Completo e à criação do Conselho Nacional de Polícia; a de nº 198/2016, de autoria do Deputado Cabo Sabino (PR/CE), que visa prever a competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre as Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros Militares e especificar princípios sobre a carreira nessas corporações; e, finalmente (até agora), a de nº 273/2016, de autoria do Deputado Subtenente Gonzaga (PDT/MG), que visa instituir uma carreira com ingresso único para integrantes dos órgãos de segurança pública.

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REPORTAGEM

LUIS MACEDO / CÂMARA DOS DEPUTADOS

jurídica. Polícias pela metade não funcionam, assim como policiais pela metade não conseguem ter a expertise policial necessária para uma atuação eficiente. Isso é uma anomalia que precisa ser corrigida pela implantação da carreira única na Polícia Federal. Porém, a carreira policial federal nunca foi regulamentada e precisa ser efetivada com base em dois pilares: entrada única e promoção. Esses dois pilares são elementos que dão origem à formação de carreira e sua implementação não visa extinguir ou rebaixar nenhum outro cargo, pois se efetiva a partir da adequação da disposição atual dos cargos existentes para o novo desenho da carreira. Isso se dará por um processo de transição na organização dos atuais cargos numa mesma carreira, de forma que os novos ocupantes sejam selecionados por concurso e passem a integrar a carreira pela entrada única, no cargo inicial. Com os cargos estruturados na carreira policial federal, a progressão funcional será embasada na capacitação e na experiência. Assim, os policiais serão promovidos (provimento de cargo público pela promoção, Art. 8º, II, Lei nº 8.112/90) e podem chegar ao exercício de chefia por critérios de experiência e mérito. A estrutura dos órgãos policiais em carreira única é um modelo que funciona nas polícias federais de vários países de primeiro mundo, como o FBI, e, por isso, o constituinte previu esse modelo para a Polícia Federal brasileira, no entanto, ainda precisa ser efetivado na prática, objetivando alcançar a eficiência na segurança pública e na investigação criminal”, frisou. PEC Nº 430/2009 – O autor da PEC, Deputado Celso Russomano, em entrevista à Agência Câmara, ressaltou a importância da discussão do tema, defendendo o “nascimento de uma nova polícia organizada em uma única força, com todos os seguimentos e estrutura necessários ao acertado enfrentamento do crime. Não se trata de unificação das polícias, mas do nascimento de uma nova polícia. Para tanto, primeiramente, desconstituiremos as Polícias Civis e Militares dos Estados e do Distrito Federal, para constituir uma nova

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polícia, desmilitarizada e condizente com o adequado tratamento ao cidadão brasileiro, cujo comando será único em cada ente federativo, subordinado diretamente ao seu Governador, que nomeará o seu dirigente”, alegou. CICLO COMPLETO – Pela quantidade de eventos realizados até aqui sobre o tema, provavelmente a mais debatida proposta de Ciclo Completo de Polícia é a expressa na PEC nº 431/2014, de autoria do Deputado Subtenente Gonzaga (PDT/MG), que defende a atuação plena de cada polícia, ou seja, um modelo no qual todas elas atuem da prevenção à investigação, de forma que ninguém mais traria ocorrências para a PC, todos resolveriam suas ocorrências criminais diretamente com o promotor, mitigando a figura do delegado de polícia. Seria, dessa forma, incluído o inciso 11, com a redação: “Além de suas competências específicas, os órgãos previstos nos incisos do caput deste artigo realizarão o ciclo completo de polícia na persecução penal, consistente no exercício da polícia ostensiva e preventiva, investigativa, judiciária e de inteligência policial, sendo a atividade investigativa, independente da sua forma de instrumentalização, realizada em coordenação com o Ministério Público, e a ele encaminhada”. Um dos argumentos de defesa desse modelo é o de que, se cada polícia, principalmente as PMs e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), puderem realizar o Ciclo Completo dentro de suas estruturas, reduziria os processos burocráticos com encaminhamento dos casos iniciados por elas a outra polícia o que, segundo essa visão de ciclo completo, é um dos fatores que colaboram para a ineficiência do sistema policial hoje, no Brasil. Nas infrações de menor potencial ofensivo, as partes podem ser liberadas no local e, nas de maior potencial ofensivo, a polícia que efetuar a prisão fará os demais atos. No caso da atuação dos policiais militares, estes não terão que ficar horas nas delegacias para fazerem o Boletim de Ocorrência (BO), enquanto deixam suas áreas descobertas por horas.

Se pegarmos os grandes eventos realizados no Brasil, a exemplo das Olimpíadas, nós tivemos o ciclo completo em um conceito que funcionou”, defende o deputado João Campos

No Brasil, a única instituição que realiza o ciclo completo é a PF, que, identificando um crime, dentro de sua própria estrutura, realiza as formalizações e investigações sobre o caso. Segundo o presidente da FENAPEF, Luís Antônio Boudens, esse modelo proporciona maior eficiência à PF. “Não há perda de informações, já que a mesma equipe que faz a abordagem inicial faz o procedimento até o fim, e isso propicia celeridade e integração de dados, tanto da prevenção quanto da investigação, e em consequência chega a melhores resultado”, aponta. NEM TUDO SÃO FLORES – Já o Deputado João Campos (PRB/GO) acredita em outro conceito de ciclo completo. Para o parlamentar, o ciclo completo ideal e que vai melhorar a eficiência das instituições é o que preserva o modelo atual das polícias, com cada uma atuando na sua especialidade, porém completando o ciclo por intermédio de um trabalho integrado entre elas. “Se pegarmos os grandes eventos realizados no Brasil, a exemplo dos Jogos Olímpicos, nós tivemos o ciclo completo em um conceito que funcionou. Um comando conjugado formando o ciclo completo, no qual todos trabalham juntos, mas cada um em sua esfera”, exemplifica o parlamentar.

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REPORTAGEM

UNIFICAÇÃO DAS POLÍCIAS – Outra proposta que suscita ainda mais debate sobre o tema é a unificação das polícias. Segundo o Deputado Subtenente Gonzaga, o modelo não vai atingir o objetivo principal, que é elevar o número de casos solucionados a partir de uma maior eficácia das polícias. Além disso, para Gonzaga, a proposta prevê apenas a unificação das polícias civis e militares, ignorando que as demais passem por problemas estru-

turais. Já o Deputado João Campos defende que essa é uma boa alternativa, pois somaria os recursos das duas polícias, porque, para estruturar as PMs para realizarem o trabalho burocrático e investigativo, sairia caro (e as policias já carecem de investimentos), além do que, levaria tempo. O modelo adotado pela PEC 431/2014 traz a premissa da eficiência pela PC e PF que, não tendo mais o serviço cartorário para atender necessariamente à

LÚCIO BERNARDO JR. / CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPUTADO SUBTENENTE GONZAGA (PDT/MG) O Ciclo Completo vai parar de jogar fora informações e vamos permitir iniciativas de investigação Em entrevista para a revista Impressões, o autor da PEC 431/2014, Deputado Subtenente Gonzaga (PDT/MG), fala sobre suas expectativas com a PEC no que tange à elevação de casos solucionados no País. Em média, apenas 8% das pessoas que cometem homicídios respondem pelo crime que cometeram. O Deputado comenta, ainda, os desafios para as PMs, não só quanto ao processo de implementação do ciclo completo de polícia, mas também na construção de relações de confiança com a população. O último parecer apresentado sobre a Proposta foi feito pelo relator, o Deputado Marcos Rogério (DEM/RO), em setembro. A única ressalva foi sobre a PEC 89, que compõe o rol de propostas sobre o assunto. O relator suprimiu do texto a previsão de que delegados se tornem juízes. Na argumentação do relator, o trecho tornava o texto inconstitucional. No mais, o parecer é pela admissibilidade. Confira entrevista com o Deputado Subtenente Gonzaga. IMPRESSÕES | Por que o conceito proposto pela PEC 431/2014 é melhor que o modelo de polícia que temos hoje no Brasil? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | O objetivo é atingir o problema de baixos índices de elucidação de casos no Brasil por meio

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demanda da PM, da Guarda Civil Municipal (GCM) e da PRF, terão condições para desempenhar suas vocações investigativas. Para auxiliar na compreensão do tema, confira entrevistas realizadas com o autor da PEC nº 431/2014, Deputado Subtenente Gonzaga, e com o presidente da Federação Nacional dos Delegados de Polícia Civil, Rodolfo Laterza, que se posiciona contrário à proposta.

ARQUIVO PESSOA

RODOLFO LATERZA O ciclo completo de segurança pública depende de uma ampla construção de um modelo que inclua os aspectos causais do problema como foco principal e norteador. O delegado capixaba Rodolfo Laterza faz uma análise contundente sobre o assunto. Ele é presidente de três entidades de classe de delegados: Federação Nacional dos Delegados de Polícia Civil (FENDEPOL); Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Espírito Santo (Sindepes); e Associação dos Delegados de Polícia (Adepol/ES). Além disso, ainda é diretor da Adepol do Brasil. O delegado classifica o tema como “sensível, polêmico e complexo” e contribui para a discussão na entrevista que segue na íntegra. IMPRESSÕES | O senhor acredita que o modelo de ciclo completo de Polícia defendido pela PEC nº 431/2014, de autoria do Deputado Subtenente Gonzaga (PDT/MG), é o melhor modelo para a polícia brasileira? Rodolfo Laterza | Quaisquer proposições de alteração constitucional que versem sobre o intitulado ciclo completo ou outro sistema de segurança pública dependem de uma ampla construção de um modelo que inclua os aspectos causais do problema como foco principal e norteador. Simplesmente alterar o sistema, sem garantir recursos econômicos e verbas orçamentárias minima-

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REPORTAGEM

da autonomia para que as polícias investiguem. No dia a dia, o policial esclarece situações ou tem informações que dão suporte a uma sustentação de um modo operante. Como ele não tem a competência legal de investigar, isso é jogado fora. No modelo atual, o que a Polícia Militar e a Rodoviária produzem, que não é flagrante, é jogado fora para que a Polícia Civil e Federal, a partir da compreensão do delegado, deem continuidade. Então, o que faremos é parar de jogar fora informações e vamos permitir iniciativas de investigação. Se nós aumentarmos essa capacidade de investigação, podemos atingir melhores índices de solução de casos. Outra coisa que vai melhorar é o fato de policiais perderem tempo nas delegacias. Os dois lados (ostensiva e investigativa) estão perdendo tempo para fazer esse Boletim de Ocorrência. IMPRESSÕES | Como as áreas de atuação serão estabelecidas? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | Os territórios já estão definidos pela Constituição. A Guarda tem um território, a Polícia Rodoviária também tem. Quanto aos territórios que são cobertos pelas Polícias Militar e Civil, podemos deixar a Polícia Civil onde ela está, com a responsabilidade de investigação, que é a expertise dela. O mesmo deve ocorrer com a Polícia Federal. Além disso, levando em conta que os flagrantes são atos concretos, identificados e visíveis, eles não precisam de investigação. Assim, se tirarmos os encaminhamentos dos flagrantes para as delegacias, nós já vamos tornar o processo mais ágil, pois vai direto para a justiça. E aquele território que não tiver duas polícias, a que tiver faz o ciclo completo. IMPRESSÕES | Como será preparar as polícias para esse conceito de ciclo completo? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | A matriz curricular das polícias já permite o conhecimento dessa natureza (investigativa). A ação policial conta com a inteligência o tempo todo. Na prática, talvez teríamos que treinar um pouco mais a formatação do processo, não a ação de investigação. E ainda que tivéssemos 100% das pessoas incompetentes para fazer a investigação nas Polícias Militares, acredito que, em cinco anos, teríamos o efetivo treinado para investigar e trabalhar com processos. E, se tivermos 20% do efetivo preparado para esse modelo de trabalho, já alcançaríamos um percentual de pessoas preparadas para a investigação maior que a média mundial. A média nos

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mente sustentáveis, agravará ainda mais o caos vigente, até porque a proposta desse modelo acaba por estender novas atribuições aos órgãos de segurança pública, já absurdamente sobrecarregados e prejudicados por falta de efetivo, péssimas remunerações de seus integrantes e sucateamento generalizado de recursos materiais. Outorgar novas atribuições às instituições policiais, sem sequer investir adequadamente, tornará inócua uma alteração tão profunda e tão sistêmica. Portanto, antes de alterar o sistema de segurança pública vigente, precisamos é de fato investir nele, repensar o severo e contínuo contingenciamento de verbas que afligem os órgãos policiais, que são obrigados até mesmo a economizarem combustível em suas duras e deploráveis realidades. Desde 1988 nunca o Poder Público investiu minimamente nos operadores de segurança pública e nas instituições responsáveis por essa função social. Imaginemos uma realidade prática atual que demonstra todo este contexto dramaticamente: as nobres Polícias Militares, sobrecarregadas ao extremo, sem conseguir atender às fundamentais atribuições de policiamento preventivo e preservação da ordem pública, sofreriam um colapso ao ainda se verem determinadas a trabalhar na persecução penal. O mesmo ocorreria com as Polícias Civis e Federal, já colapsadas por uma sobrecarga de procedimentos apuratórios que crescem geometricamente em uma sociedade tão assolada pela violência e que passariam a também atuar na prevenção. Com as crises estruturais de hoje, atinentes à crônica escassez de recursos humanos e materiais, teríamos um caos generalizado. IMPRESSÕES | O senhor diverge da lei? Em quais pontos? Rodolfo Laterza | Minha abordagem não foca no questionamento da constitucionalidade das Propostas de Emenda Constitucional que instituem o “ciclo completo”, algo por si só polêmico e duvidoso, que demandaria verdadeiros tratados de discussão. Faço uma análise pragmática e fundada no realismo político-institucional. Creio que uma medida como essa, tão profunda, depende de uma coesão de conceitos e ideias ainda a evoluir, pois, para sua efetivação, o ciclo completo dependeria da construção de uma nova instituição policial, não militarizada, com aparato uniformizado e estrutura de investigação autônoma, algo lamentavelmente não desejado por setores políticos e por segmentos corporativos. Há um fundamentalismo exacerbado em se abordarem certos temas na segurança pública, com cada instituição agindo hermeticamente e usando estereótipos umas contra as outras. Isso por si só já torna muito difícil atingir uma meta de se avançar em uma instituição policial não militarizada, unificada, com plano de carreira avançado e digno, e com autonomia assegurada em nível legislativo. IMPRESSÕES | O atual sistema é o melhor do que propõe a PEC? Rodolfo Laterza | O atual sistema, tal como ressaltado, sequer foi aplicado em suas premissas básicas até hoje, pela simples razão de as polícias no Brasil sofrerem de um revanchismo velado de segmentos da sociedade e um empoderamento constante do Ministério Público em suas ações, que não age na sua função constitucional de controle externo, de modo a fortalecer as instituições policiais. Além disso, as polícias têm sido progressivamente sucateadas, a ponto de alcançarem um estado de indigência. Essa imprevidência com os órgãos policiais leva à criação de representações sociais negativas que geram o estigma, o preconceito e, finalmente, o estereótipo, tão úteis para se atacar a própria existência e legitimidade das instituições policiais no Brasil, como se fossem as

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REPORTAGEM

lugares onde já existe ciclo completo de polícias é de 14% do efetivo na investigação. IMPRESSÕES | Qual sua opinião sobre a unificação das polícias? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | Não concordo por vários motivos, no entanto, existe um que, para mim, por si só justifica. Você não vê uma tese de unificação das polícias do Brasil, a tese é unificar as Polícias Civil e Militar. É querer dizer que o problema está só nas duas e não é verdade. Essa tese não responde ao problema colocado, que é a solução da continuidade da atuação das polícias. Não tenho a ingenuidade de achar que o ciclo completo resolverá o problema de segurança no Brasil. Ele é uma solução para o baixo índice de elucidação de crimes no País e uma resposta à ampliação do potencial de prevenção, porque vai ter menos distanciamento do policial de rua para fazer registro de ocorrência. IMPRESSÕES | Qual tem sido a participação dos delegados nesse debate? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | O fato de haver poucas pessoas com a competência de investigar – que são os delegados –, eles acabam tendo um domínio grande sobre os detentores do poder. É visível a retração de muitos políticos nesse debate, porque são orientados por esse segmento, que exerce sobre eles uma grande influência. Isso é complicado, pois temos, hoje, decisões tomadas com base em escolhas pessoais de delegados. IMPRESSÕES | Deputado, quais são as grandes dificuldades com o tema? Subtenente Gonzaga (PDT/MG) | A grande dificuldade que vejo é o baixo conhecimento da população sobre o tema. Todo mundo tem clareza sobre a violência... e, devido à obviedade que o ciclo completo possui, fica até difícil explicar. Por outro lado, nós temos uma cultura centenária, no Brasil, de que ocorrência policial se encerra na delegacia. Então, quando você introduz esse assunto, você tem que explicar demais. Outra dificuldade é que as Polícias Militares ainda pagam o preço da ditadura, justo ou injusto, ainda pagam o preço e, no final das contas, quem mais se manifesta contra é quem rejeita o poder do militar. Esse é outro problema sério, a estigmatização do militar como truculento, e cabe a nós, policias militares, provarmos o contrário. E isso nós ainda não conseguimos fazer, é um desafio.

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responsáveis pela situação de miserabilidade por que passam. Portanto, mudar o sistema por legislação constitucional derivada não resolverá as mazelas estruturais que nos afligem. Somos o país (sem guerra civil ou declarada) que possui o maior número de morte de policiais, embora muitos considerem que o estado de anomia social se assemelha a uma realidade de guerra civil, mesmo não havendo grupos militares ou civis identificáveis que estejam polarizados em disputa de poder político, fundamento básico na definição do conceito de guerra civil. IMPRESSÕES | O que o senhor considera ser um modelo ideal de polícia para o Brasil? Rodolfo Laterza | Antes devemos fortalecer o sistema atual, para depois evoluirmos para uma nova instituição policial, não militarizada, com aparato uniformizado e estrutura de investigação autônoma. A criação de uma nova polícia deve ter caráter civil e não militar, conforme os modelos institucionais vigentes em todos os países democráticos, com plano de carreira digno e autonomia institucional respaldada em arcabouço legal. IMPRESSÕES | O senhor acredita que a unificação das polícias pode tirar autoridade e competências exclusivas dos delegados? Rodolfo Laterza | Não creio que uma análise estritamente corporativista de algo tão complexo possa dar efetividade ao problema, portanto, a discussão não pode ser pelo viés puramente corporativista. O cargo de delegado de polícia historicamente adveio da necessidade de se ter uma autoridade policial com formação técnico-jurídica, tanto que originalmente os delegados de polícia eram oriundos dos antigos juizados de instrução. A unificação poderia conciliar a existência de um cargo com tal formação jurídica e que absorvesse a essência da complexa realidade policial. O mais importante é que haja uma discussão enfocada em investimento; uma valorização, em todos os níveis, dos operadores do sistema de segurança pública (sem estereótipos que os condenem a se tornarem soluções para as constantes crises sociais do País e, ao mesmo tempo, a serem criminalizados e rebaixados como grupos sociais predestinados a críticas) pela sociedade; e a garantia de autonomia para o funcionamento das instituições. Portanto, devemos inicialmente aplicar de verdade o sistema atual antes de reformá-lo. IMPRESSÕES | A unificação valorizaria ou desvalorizaria os profissionais de segurança pública? E por quê? Rodolfo Laterza | Creio que, com coesão doutrinária, sem militarização, mas com preservação de mecanismos que assegurem a hierarquia e disciplina peculiares às instituições policiais, a valorização técnica dos profissionais e os planos de carreiras consolidados, certamente poderia haver tal valorização. Porém ressaltemos um detalhe: em países com grandes extensões territoriais, em que vige a forma federativa do Estado, é inaplicável pensar em unificar todas as polícias em um único órgão. Os Estados Unidos possuem mais de 15 agências federais de natureza policial; a Rússia recentemente aglutinou quatro agências na Guarda Nacional, mantendo, no entanto, outras três instituições; a China também possui cerca de quatro agências de natureza policial. Portanto, valorizar as instituições do sistema atual, integrando-as, é mais relevante, econômico e racional que simplesmente unificar sem se defrontar com os problemas estruturais do modelo atual, vinculados, acima de tudo, pela falta de recursos e desvalorização dos profissionais de segurança pública.

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PELOS ESTADOS

CAPELA DE CIANOACRILATO Com criatividade, visão de futuro e uma necessidade motivada por forças da natureza, o Grupo de Identificação do Rio Grande do Sul construiu a própria capela de fumigação

Por Simone Andrade Especial para a revista Impressões

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PELOS ESTADOS

PPF FELIPE FERREIRA

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o início de 2016, devido a uma forte tempestade que atingiu Porto Alegre (RS), quase todos os equipamentos do Laboratório de Perícias Papiloscópicas do Grupo de Identificação da Polícia Federal do Rio Grande do Sul (GID/RS) foram destruídos, dentre eles, a capela de fumigação. O custo de uma nova capela seria de, aproximadamente, R$ 100 mil, o que exigiria uma licitação, e o tempo que levaria para realizar o processo licitatório comprometeria todas as investigações que necessitassem de fumigação de cianoacrilato no ano. “Com esse problema, decidimos confeccionar, novamente, nossa própria capela”, conta o Papiloscopista Policial Federal (PPF) Felipe Ferreira, idealizador da proposta. Ele disse, “novamente” porque a que fora danificada com a queda de raios já havia sido construída pelos papiloscopistas em 2013, quando o GID foi criado. Com menos de R$ 2 mil, os PPFs construíram a nova capela com capacidade de

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PPF FELIPE FERREIRA

Senicorum dic tra L. Gra oris in simum tu intui su quam quem tata ditestr ibussil cone oreti, vilium patiae anum avem pridem orte cuteren

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720 litros (possui 80 cm de largura, 60 cm de profundidade e 150 cm de altura). Composta por dois compartimentos independentes com abertura frontal, possibilita o uso em perícias diversas e por mais de um colega simultaneamente. A capela ainda oferece a flexibilidade de unificar os dois compartimentos, tornando-os um só, conforme o volume de material a ser periciado. Segundo a Papiloscopista Kristiane Mariotti, que também trabalhou no projeto, a construção da própria capela por parte do GIDS/RS trouxe ganhos nos quesitos custo, dimensões e personalização de controles automatizados. “A nova capela possibilitará o aumento da qualidade e da quantidade de revelações com cianoacrilato realizadas no GID hoje”, observa Mariotti. A CAPELA A capela conta com iluminação de LED independente no compartimento superior e inferior, tomadas internas para

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acionamento do que os papiloscopistas chamam de primeiro e segundo estágios (umidificação e fumigação respectivamente), além de exaustor e roletes para a realocação e limpeza. Para as etapas de umidificação e vaporização do cianoacrilato, foi desenvolvido um microcontrolador que permite a automatização e o ajuste dos tempos ideais para cada um dos processos, de acordo com o material que esteja sendo submetido à perícia papiloscópica. Após os tempos de umidificação e fumigação, a exaustão do gás também é acionada automaticamente, evitando que ocorra a saturação do material pelo reagente e impedindo a exposição do papiloscopista ao gás de cianoacrilato. Depois de todo o processo, um aviso sonoro e uma mensagem em tela informam que o processo foi concluído e que o material pode ser retirado. A partir do levantamento estatístico das revelações realizadas utilizando a capela de cianoacrilato, foi possível iden-

tificar o nível de umidificação e o tempo de fumigação ótimos para cada tipo de material, o que, agregado ao controlador eletrônico, permite aplicar esse conhecimento em benefício da produção da prova técnica. “Consideramos essa capela como um protótipo de uma versão final”, revela o PPF Felipe. A capela pode ter seu potencial ampliado, pois possui previsão para outros sensores, como higrômetro, termômetro e acoplamento de sistemas computacionais de extração de dados. “Isso permitirá ao processo ser cada vez mais controlado em seus parâmetros fundamentais e, portanto, padronizado, trazendo a melhor qualidade possível para a revelação com cianoacrilato, aprimorando a qualidade dos vestígios papilares produzidos e facilitando, assim, a busca de traços individuais nos mais diversos sistemas automatizados de identificação de impressões digitais e a realização de confrontos papiloscópicos”, conclui Felipe Ferreira.

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REPORTAGEM

EM MATO GROSSO, 66 MIL LAUDOS PAPILOSCÓPICOS NÃO SERVEM DE PROVA Sem chegar à identidade dos criminosos, o estado acumula casos não resolvidos desde 2005. Por Simone Andrade Especial para a revista Impressões

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REPORTAGEM

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ato Grosso (MT) é o único estado brasileiro que não faz perícia papiloscópica. Você deve se perguntar como os casos são resolvidos no estado. Pois bem. Quase nunca são resolvidos. Só este ano, 18 mil boletins de ocorrência (furtos e roubos) registrados em Cuiabá e em Várzea Grande, município vizinho à capital mato-grossense, ficaram sem laudos papiloscópicos. Desde 2005, quando a Lei Estadual 8.321 entrou em vigor, o estado coleciona casos sem solução e pelo menos 66 mil fragmentos que não servem de prova nos processos criminais. A Lei reviu a atuação dos peritos criminais e papiloscopistas e quem mais perdeu com a revisão foi a sociedade, que passa sem respostas quanto aos crimes registrados em MT. “Até 2005, nos solucionávamos em média 85% dos casos, hoje reduziu a zero quando as respostas estão no local do crime”, comenta o presidente do Sindicado de Papiloscopistas de Mato Grosso, Idejair Macêncio Conceição. Antes, o papiloscopista tinha autonomia para atuar nas cenas dos crimes, fazer os confrontos e emitir os laudos. Entretanto, as mudanças previstas na Lei limitaram a atuação dos papiloscopistas, que passaram a ter autonomia apenas sobre os laudos de necropapiloscopia e participam da perícia na cena do crime apenas quando solicitados pelos peritos criminais. A atuação do papiloscopista limitou-se a colher o fragmento no local do crime. Feito o levantamento, o material é encaminhado para o suporte com todas as informações que dão ideia da dinâmica do fato: a localização, os dados possíveis do local, a direção. Os papiloscopistas fazem este relatório e solicitam o exame ao laboratório. Deste momento em diante, o papiloscopista não participa mais do processo de investigação e a identidade dos envolvidos nos crimes tornou-se um eterno mistério para o estado.

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“Até 2005, nós solucionávamos em média 85% dos casos, hoje reduziu a zero quando as respostas estão no local do crime” De acordo com a Lei, a atuação do papiloscopista da área criminal em Mato Grosso é identificar as pessoas presas ou detidas; emitir atestados, certidões e informações criminais de competência da Coordenadoria Geral de Identificação; tomar nota das passagens criminais; entregar relatório das identificações procedidas e dos documentos expedidos; prestar esclarecimentos perante o juízo competente; praticar a necropapiloscopia; e auxiliar as Coordenadorias Gerais de Criminalística e de Medicina Legal, quando solicitados. Para o presidente do Sindicado de Papiloscopistas de Mato Grosso, a aprovação da lei, na época, foi resultado de ARQUIVO PESSOAL

Presidente do Sindicado de Papiloscopistas de Mato Grosso, Idejair Macêncio Conceição

uma perseguição velada por parte dos peritos criminais. “Nós deixamos de entregar um produto para a sociedade. Em 2004, fazíamos em média cinco mil vestígios de crime por ano. Agora em 2016, temos de 25 a 30 mil vestígios devido o aumento da criminalidade, mas que não servem de prova”, conta Idejair Conceição. A estrutura da Perícia Oficial e Identificação Técnica de Mato Grosso (POLITEC) é dividida em diretorias e em 2010 foi criada a Gerência de Perícias em Vestígios de Impressões de Pele, seção responsável pelos confrontos. Contudo, essa gerência compreende a organização da Diretoria de Criminalística, enquanto a atuação dos papiloscopistas é prevista dentro da Diretoria de Identificação Técnica. “Houve uma transição da atribuição de uma categoria para outra”, observa Idejair. Com isto, as comparações dos fragmentos coletados pelos papiloscopistas, quando estes vão a campo, só são feitas sob ofício e o resultado é o acúmulo de trabalho.

“A atuação do papiloscopista limitou-se a colher o fragmento no local do crime. Feito o levantamento, o material é encaminhado para o suporte com todas as informações que dão ideia da dinâmica do fato: a localização, os dados possíveis do local, a direção. Os papiloscopistas fazem este relatório e solicitam o exame ao laboratório. Deste momento em diante, o papiloscopista não participa mais do processo de investigação e a identidade dos envolvidos nos crimes tornou-se um eterno mistério para o estado.”

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REPORTAGEM

[...] Art. 6º São atribuições do Papiloscopista:

LEI ESTADUAL

Nº 8.321/2005

I - que atuam na área civil: a) realizar o completo processamento da emissão do Documento de Identidade Civil, Registro Geral Numérico, do requerimento do interessado até a expedição do documento; b) realizar o completo processamento da emissão de Atestados, Certidões e Informações Civis, da alçada da Coordenadoria Geral de Identificação, do requerimento do interessado até a expedição do documento, conforme a legislação vigente; c) zelar pela boa coleta das impressões das linhas papilares das extremidades digitais das mãos, sua classificação e pesquisa, bem como o arquivamento dos prontuários e documentação; d) preencher e efetuar a entrega, ao órgão encarregado da estatística, da relação das identificações procedidas e dos documentos expedidos, com discriminação do respectivo motivo; e) comparecer, perante o juízo competente, quando requisitado pela respectiva autoridade, para prestar esclarecimentos;

II - que atuam na área criminal: a) realizar o completo processamento de Identificação Criminal das pessoas presas ou detidas, tomando as impressões digitais em prontuário específico, na forma da lei, quando requisitado por autoridade competente; b) realizar o completo processamento da emissão de Atestados, Certidões e Informações Criminais, da alçada da Coordenadoria Geral de Identificação, do requerimento do interessado até a expedição do documento, conforme a legislação vigente; c) anotar, em prontuário próprio com o respectivo registro geral numérico, as passagens criminais e os respectivos qualitativos; d) preencher e efetuar a entrega, ao órgão encarregado da estatística, da relação das identificações procedidas e dos documentos expedidos, com discriminação do respectivo motivo; e) zelar pela boa coleta das impressões das linhas papilares das extremidades digitais das mãos, sua classificação e pesquisa, bem como o arquivamento dos prontuários e documentação; f) colher impressões digitais de cadáveres, classificando e catalogando-as em arquivo próprio; g) comparecer, perante o juízo competente, quando requisitado pela respectiva autoridade, para prestar esclarecimentos; h) prestar auxílio, através de suas atribuições, às Coordenadorias Gerais de Criminalística e de Medicina Legal, quando solicitados; i) tomar as impressões das linhas papilares palmares e plantares, na forma da alínea “h”; j) assegurar o sigilo necessário à elucidação dos fatos e às investigações.

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ESPECIAL

DESAPARECIDOS Banco de dados pode mudar o panorama de pessoas desaparecidas no Brasil Por Simone Andrade e Vitor Ferns

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ESPECIAL

“J

á volto”, disse. Foi e nunca mais voltou. Grande parte dos casos de desaparecimento é decorrente de conflito familiar e envolvimento com drogas. No Brasil, a cada hora, 23 pessoas desaparecem. Em média 200 mil por ano, sendo, destas, 50 mil crianças, e apenas 10% dos casos têm relação com causas criminosas. Para contribuir com a solução dos casos, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) criou, em 2009, o Programa de Localização e Identificação de Pessoas Desaparecidas (PLID), que opera de forma integrada com outros órgãos no cruzamento de informações para gerar um banco único de dados. O sistema apresenta resultados positivos, mas, apesar de a maioria dos Estados já terem feito a adesão via convênio, apenas o Rio de Janeiro e São Paulo possuem implementação efetiva do programa. Essa implementação em todo País é um passo importante para a criação

do banco de dados nacional de pessoas desaparecidas. A Promotora de Justiça de São Paulo, Eliana Vendramini, defende esse caminho. “Iremos trabalhar, em 2017, para a implementação efetiva em todos os Estados, o Procurador-Geral do Ministério Público de São Paulo (MPSP) irá propor uma reunião com todos os procuradores-gerais do Brasil, via Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), para que todos entendam o quanto o programa é importante dentro do MP e os frutos que se vem colhendo no RJ e em SP”, contou a Promotora. Um dos exemplos dos “frutos colhidos”, citados pela promotora paulista, é que, com o estreitamento de relações com a Secretaria de Segurança Pública, já se tem todos os dados digitalizados de 2013 a 2015. “Com isso, nosso banco consegue oferecer, em tempo real: quem está desaparecido, a idade, por que está desapareci-

do, onde, como e quando”, compartilha. No Estado existe uma lei, desde 2014, que exige a existência do banco de dados. “Junto ao trabalho com a Polícia Federal (PF), nós pretendemos fazer um projeto de lei federal que acabe com essa omissão nacional”, completa Vendramini. REALIDADES LOCAIS – A ideia é formar uma rede que tenha o dado comum e que também possa atender às vítimas de seu Estado. Há Unidades da Federação nas quais a maior demanda é o trafico de pessoas, em outros são os homicídios, ou problemas com população de rua e a violência urbana. A promotora conta que essas realidades seriam identificadas pelo responsável no local e replicada ao banco nacional. Assim, os dados do PLID poderão reverberar em políticas públicas mais eficientes para cada localidade. “Em São Paulo estamos bem focados na questão

PROGRAMA DE LOCALIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DE PESSOAS DESAPARECIDAS (PLID) O PLID reúne informações detalhadas de diferentes fontes, proporcionando o compartilhamento de informações com diversas instituições que enfrentam o desaparecimento de pessoas. Assim, auxilia no processo de localização e identificação de óbitos, na identificação e localização de pessoas desaparecidas e no combate eficiente do tráfico de seres humanos. O PLID é um cadastro que usa e sistematiza dados. Num primeiro momento, o programa é abastecido com dados fornecidos pela Secretaria de Segurança Pública, pelo Instituto Médico Legal (IML) e pela própria população, via preenchimento de formulário on-line ou pessoalmente, na promotoria. Também são acrescidos ao banco de dados informações sobre óbitos registrados em cartórios e fornecidos pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). O programa comporta, também, registros dos cadáveres sem identificação e que não tenham sido reclamados, tendo sido sepultados como desconhecidos pelo IML. Antes do sepultamento, o órgão coleta impressões digitais para futuro confronto e anotações de sinais característicos particulares que possibilitem uma futura identificação. A meta é uniformizar o tratamento, a criação e o uso de bases de dados referentes a pessoas desaparecidas ou vítimas de tráfico de pessoas. Na medida em que o processo de cadastramento de informações for evoluindo, será possível a construção de estatísticas e a geração de relatórios que possam subsidiar a atuação de Promotores de Justiça criminais de todo o País.

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ESPECIAL

dos desaparecimentos de vulneráveis”, exemplificou a promotora. PLID E CADÊ – O PLID trabalha em parceria não oficializada com o Cadastro Biométrico de Pessoas Desaparecidas (CADÊ), da PF. Já existe a troca de dados, o trâmite é via convênio assinado pelo jurídico do MP e da PF. “Nós contamos com todo o apoio do CADÊ”, disse a promotora e explicou como funciona esse processo passo a passo: “Primeiro nós fazemos o trabalho local, que começa com as parcerias municipais e estaduais. Não raro, obtemos dados para começar a busca da pessoa no Estado. Porém, se falhou toda essa busca, temos que ir para um ‘olhar nacional’, e o CADÊ tem esse ‘olhar nacional’ e a digital que facilita muito. Por exemplo, se a pessoa saiu do Pais por avião ou contraiu uma pendência em outro Estado, isso facilita a busca”, contou Eliana Vendramini. “REDESAPARECIMENTO” – O PLID também trouxe um ganho de informação estatística para o tema. Segundo a promotora, em 2014, por intermédio do cruzamento de dados, descobriu-se que muitas das pessoas procuradas por seus familiares estavam exumadas como indigentes. “Inclusive nós batizamos esse tipo de caso em artigos científicos de ‘redesaparecimento’, porque essa pessoa apareceu e o serviço público sumiu com ela novamente. Nesses casos, “...a pessoa foi localizada, mas o Estado não sabia, devido a uma falha grave de ausência de dados”, completa Vendramini. DESAPARECIDOS POR DIREITO – Segundo ela, no trabalho de busca pelo desaparecido, há muita cautela quanto ao

fornecimento de dados preliminares aos requerentes. Um dos motivos é percebido nos casos de desaparecimento por “opção”, muitas vezes feito por questões de segurança. Nesses casos, quando encontrado, o procurado pode ter o direito de não revelar sua localização. “Temos um exemplo bem atual. Há mulheres que estão fugindo da violência de relações íntimas de afeto e dadas como desaparecidas pela família. E, quando as encontramos, nós não franqueamos o endereço, pois consideramos que nesta hipótese ocorre o direito ao desaparecimento”. A promotora reforça que “o desaparecimento, via de regra, é uma questão pública, mas há exceções importantes” como esta da preservação da própria vida. Como ela enfatiza, outra exceção lida com valor privado de uma escolha consciente, analisada de forma criteriosa. “Se a pessoa for maior capaz e não deseja ser

“O PLID trabalha em parceria não oficializada com o Cadastro Biométrico de Pessoas Desaparecidas (CADÊ), da PF” contatada, nós apenas retornamos à família que o desaparecido foi encontrado e está bem, mas não damos o endereço, porque é um direito dela. O desaparecimento turba a família e a sociedade, ou seja, é uma causa pública. Porém, se, depois de trabalhado, percebermos que ali existe um valor privado maior, ele é resguardado. O que não podemos é minimizar a gravidade do desaparecimento, como se tudo fosse uma opção, porque nós temos os vulneráveis usados para tráfico de pessoas, outros estão em hospitais e até presos sem que a família esteja ciente dessa informação, porque só são descobertas com a devida investigação”, contextualizou Vendramini. MARCELO CAMARGO/ AGÊNCIA BRASIL

“Nosso banco de dados consegue oferecer, em tempo real: quem está desaparecido, a idade, por que está desaparecido, onde, como e quando”, explica a promotora de Justiça de São Paulo, Eliana Vendramini.

COMO CADASTRAR UM DESAPARECIMENTO O cadastro de um caso de desaparecimento é simples e pode ser feito por qualquer cidadão, basta acessar o site do programa do Ministério Público do Estado e seguir as orientações. O formulário a ser preenchido reúne dados da ocorrência, bem como qualificação e características do desaparecido (altura, cor da pele, sinais particulares como tatuagens, cor dos olhos, vestimenta, dentre outras), e há um campo para anexar foto da vítima.

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PELOS ESTADOS

O RETRATO MENOS PROVÁVEL O caso que envolveu o agente Luís Márcio Alvarenga, segundo o PPF Gilmar Silva, ambos da Superintendência Regional do Pará. Por Simone Andrade Especial para a revista Impressões

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agente Luís Márcio Alvarenga (37 anos) chegou em estado grave a um hospital da capital paraense. Era madrugada do dia 2 de junho de 2016, colegas de trabalho e familiares esperavam por notícias médicas. O policial federal fora baleado na cabeça, passava por cirurgia e naquele momento tudo era incerto. Alvarenga foi vítima de um assalto, por volta das 23h do dia 1º, quando chegava do trabalho. O fato comoveu a todos e a mobilização foi geral na Superintendência

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Regional do Pará, que solucionou o caso em 10 dias. “Foi incrível o envolvimento dos colegas, todo mundo se dedicou ao máximo”, destaca o Papiloscopista Policial Federal (PPF) Gilmar Silva, responsável

“O chefe do Núcleo de Operações veio me parabenizar ao final porque também achava que estávamos sendo enganados pelo bandido.”

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PELOS ESTADOS

ARQUIVO PESSOAL

pelo retrato falado de um dos suspeitos. Retrato este que, a princípio, trouxe dúvidas mais que no fim foi um importante instrumento na solução do caso. Luís chegou em casa, estacionou e foi abordado por dois homens enquanto o terceiro dava apoio em um carro próximo. Um se aproximou pela frente, o outro por trás deixando o agente cercado. “Temos imagens, ele não teve chance. Quando percebeu já estavam em cima e o da frente atirou”, assim, a queima roupa, sem que Luís tivesse reagido ou dado qualquer outra resposta a situação, conta o PPF Gilmar. Os criminosos fugiram no carro que os acobertavam levando apenas a arma do policial. A Polícia Federal prendeu Rafael de Souza Barbosa, autor do disparo, logo no dia seguinte graças ao trabalho intenso de investigação de rua realizado por todas as polícias (PF, PRF, PC e PM). Quando encontrados, Rafael estava na companhia de Samuel Felipe Dias Rocha, que planejou o roubo, mas ele conseguiu fugir. Além das imagens do prédio onde o agente reside, a polícia tinha agora o retrato falado descrito pelo próprio autor do disparo. “O retrato falado inicialmente foi desacreditado, inclusive por mim, que fiz, acreditamos que ele estaria descaracterizando o retrato para proteger o comparsa”, confessa Gilmar. No dia 09, o segundo integrante do grupo, Samuel, se entregou. O PPF conta que quando Samuel foi questionado sobre a identidade do motorista do carro utilizado na fuga, categoricamente ele afirmou ser o cara da foto que saiu no jornal. “Ou seja, o retrato falado”. Segundo Gilmar, neste momento os colegas o elogiaram ironicamente. “Continuamos acreditando que ambos estavam protegendo alguém, provavelmente, com medo”, concluiu.

“Os bandidos disseram que não sabiam que ele era policial e que queriam um carro para assalto.”

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PPFs Moacyr Regis e Gilmar Silva, o agente Luís Alvarenga e os PPFs Roberto Andrade e Luiz Augusto Mota. Todos atuaram no caso.

Até que, no dia 10, chegou a denúncia IML e presídio”. Tudo que sabe provêm dos sobre o local exato da pessoa do retrato. relatos que ouviu dos colegas e familiares. “Os colegas saíram e quando chegaram, Mesmo com uma fala comedida, Alvarenpara surpresa de todos, as características ga demonstra reconhecer o empenho batiam”. Maiko Luciano Silva dos Santos que os colegas de trabalho fizeram para confessou o crime. Só a arma do agente solucionar o caso. Hoje, dedicado às atiLuís nunca foi encontrada. O caso encervidades de reabilitação, o agente aguarda rou aí, mas a luta do agente pela vida não. sem perspectivas o dia que irá retomar as Depois de meses internado, superar uma atividades policiais. infecção grave, passar por até DIVULGAÇÃO três sessões de fisioterapia por dia, o policial se recupera bem, já está andando e de volta ao convívio com a família desde outubro. Luís conta que suas funções cognitivas estão intact as, mas aquele momento traumático foi apagado da memória do policial. “Minha memória vai até cerca de um hora antes, voltando de um acionamento do plantão. Eu estava de sobreaviso e conduzi Comparação entre o retrato falado feito pelo PPF Gilmar Silva e a foto do terceiro integrante preso, Maiko Luciano Silva dos Santos. uma presa em flagrante para o

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FIM DAS EXPLOSÕES RECORRENTES Solução de um único caso reduziu expressivamente o número de crimes de explosão de caixas automáticos, na capital pernambucana. Por Simone Andrade Especial para a revista Impressões

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SUMAIA VILLELA/AGÊNCIA BRASIL

Explosão de caixa eletrônico destrói frente da Procuradoria da Fazenda no Recife (PE)

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hegar ao autor de um único caso – a explosão de um caixa eletrônico do Banco do Brasil, na sede da Procuradoria Regional da Fazenda Nacional da 5ª Região, no Recife (PE) – resultou na redução desses crimes na Capital pernambucana. “O sujeito identificado era integrante de uma quadrilha que vivia explodindo caixas e correios aqui de Pernambuco. Por incrível que pareça, depois da prisão dele, reduziu,

e muito, a quantidade desse tipo de ocorrência”, conta o Papiloscopista Policial Federal (PPF) Gílson José Padovani, responsável pela perícia papiloscópica do caso. O crime na Procuradoria ocorreu em agosto e a solução veio no mês seguinte. Segundo Padovani, havia muitos casos de explosões a caixas eletrônicos na cidade, porém os criminosos sempre usavam luvas espessas, nem tanto com o objetivo de

evitar o registro das impressões digitais, mas para manipularem os destroços sem ferirem as mãos. Dessa vez, no entanto, foi possível chegar à identidade de Anderson Franklim da Silva Ribeiro, por causa de um fragmento impresso no retrovisor do carro provavelmente um dia antes de cometer o crime. “Se descuidaram e consegui levantar dois fragmentos em condições de confronto”, conta o papiloscopista. SUMAIA VILLELA/AGÊNCIA BRASIL

Explosão de caixa eletrônico destrói frente da Procuradoria da Fazenda no Recife (PE)

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PELOS ESTADOS

“Se descuidaram e consegui levantar dois fragmentos em condições de confronto”

toda a entrada e o teto de gesso do prédio. A explosão foi ouvida pelos moradores, e os ônibus foram desviados para evitar o local de onde se ouviam tiros.

O crime ocorreu no dia 02, por volta das 4h30. O roubo contou com a participação de vários criminosos, que fecharam a rua em frente à Procuradoria e atiraram na guarita de segurança. O terminal de autoatendimento do Banco do Brasil foi aberto com explosivos, que destruíram

AS IMPRESSÕES PAPILARES A solução do caso veio graças a um veículo abandonado numa rua próxima – um Honda Civic com placa de São Paulo. Após trocarem tiros com a Polícia Militar, os criminosos se evadiram do local, mas, possivelmente, uma falha mecânica levou-os a abandonar o carro. “Dentro do veículo havia

muitas munições intactas de .40 e fuzil 5.56, inclusive um carregador contendo 30 destes cartuchos”, conta Padovani. Além das armas e munições, o carro guardava, também, a identidade de Anderson Franklim da Silva Ribeiro. Após procedimentos do PPF, os fragmentos em melhores condições de confronto foram localizados no espelho retrovisor interno. As análises comparativas e os confrontos dos fragmentos resultaram na primeira de 35 prisões a integrantes ANEXO 03 da quadrilha.

ANEXO 03

ANEXO 01 01 01

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02

03 04

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04 11 05 11 05

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06 10 09

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Figura 01: A impressão digita Figura Am esquerdo01: em nom impressão digital Franklim da Silva esquerdo em nome o assinalamento Franklim da Silva característicos coi o osassinalamento da figura 02. característicos coin os da figura 02.

06 07

07 do 09 Figura 1. Ampliação da impressão 08 digital polegar esquerdo em nome de Anderson Franklim da Silva Ribeiro, com o assinalamento dos pontos característicos coincidentes com os da figura 02. 01 01

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03 03

12 12

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0506

11 10

06

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09 09

Figura 02: A melhoramentos d Figura A fragmento02:de im melhoramentos E4 contido nodeA fragmento de 1934 imp criminal nº E4 contido no AF assinalamento criminal nº 1934.0 característicos co assinalamento os da figura 01. d característicos coin os da figura 01.

08 07 08 07

Figura 2. Ampliação e melhoramentos de imagem do fragmento de impressão digital E4 contido no AFIS sob caso criminal nº 1934.00356, com o assinalamento dos pontos característicos coincidentes com os da figura 01.

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A OUTRA FACE

THIAGO SOUSA Mais do que Realismo, cenas da vida Por Vitor Ferns Especial para a revista Impressões

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investigação e a arte se misturam: a atenção aos detalhes, o cuidado com os resultados e a entrega do melhor produto possível. Quando a arte e a perícia também passam pelas telas do computador, alguns se destacam em meio aos colegas. É o caso do Papiloscopista Policial Federal (PPF) Thiago Sousa. Natural de Anápolis (GO), o PPF é artista desde criança. Sousa conta que “na infância já gostava de desenhar e fazia cópia de figurinhas de balas e chiclete, ampliava os desenhos dos Looney Tunes para tamanhos A4, à mão livre. No ano de 2002, ganhei de aniversário de meus pais um kit

de pintura com cavalete, pincéis e tinta a óleo. Pintei as primeiras telas e já ganhei alguns elogios da família”, recorda com emoção. “Em 2012 fui aprovado no concurso da Polícia Federal. Minha primeira e única lotação é Vilhena (RO). Sou formado em Química Industrial pela Universidade Estadual de Goiás. Sempre fui interessado em concursos na área de química. E sempre admirei a Polícia Federal”, contou o policial e artista. ARTE Retratando cenas da vida, na quinta ou sexta tela, ele já conseguia comercializar PAULO HENRIQUE

A esposa Danielle apoia o trabalho do marido artista, o PPF goiano lotado em Vilhena (RO), Thiago Souza

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A OUTRA FACE

sua arte pela vizinhança e, com a primeira grana, investiu em um violão elétrico, que se tornou mais instrumento de manifestação artística. “A música e a pintura caminham juntas desde então na minha vida”, disse o PPF, que viu a vida acadêmica afastá-lo dessa trilha, “a vida ficou corrida na faculdade, quando parei com as artes”, aponta. Após a entrada na Polícia Federal, como Papiloscopista Policial Federal, veio novamente a vontade de reatar os laços com a arte e dedicar parte do tempo livre às artes plásticas. “Acredito que a arte tem o propósito de motivar e despertar algo positivo na vida de pessoas que nos cercam. Foi quando comecei a estudar uma técnica que trazia para a pintura os detalhes de uma fotografia. O hiper-realismo”, contou. A paixão visível pela arte também se reflete no trabalho, que é colocado por ele no mesmo patamar quando analisa. “Não há conflitos. Os dois, profissão e o hobby, potencializam um ao outro. Na verdade, não sei bem ao certo qual é profissão ou qual é hobby, acho que os dois são hobbies e/ou profissões. Sou maluco pela atividade policial, tanto a genérica quanto a específica ao cargo de PPF. Ao fazer um local de crime, enxergo as latentes reveladas

como se fossem pinturas”, conta o artista e policial. O tema “policial” está entre as principais inspirações. “Trazer para a tela todas as sombras e luzes que dividem um fuzil, cada arranhão, cada detalhe... acho que está tudo misturado. Não consigo separá-los. Até porque o desejo em seguir a linha hiper-realista surgiu na Academia Nacional de Polícia Federal, quando estudávamos fotografia. Desde então, a pintura, a fotografia e a música se uniram. São complementares e dependentes uma das outras”, explicou Thiago Sousa. Ele explica que fotografia, pintura e música se misturam sempre que vai compor uma nova tela e conta o prazer no tema relacionado às armas. “Já foram duas artes. Uma fiz para estudo da técnica, de minha propriedade, e a outra fiz sob encomenda para um amigo policial. Muitas outras ainda virão”, antecipa. Ele cita que uma das

maiores dificuldades é o tempo que necessita ser dedicado a uma tela hiper-realista. “Preciso de um tempo mínimo de quatro horas de pintura numa etapa diária, pois o processo envolve o preparo das cores, a limpeza dos pincéis, a configuração do estúdio. Consigo isso em média três vezes por semana”, explica. Segundo ele, todo esforço, que conta com o apoio incondicional da esposa, Danielle, vale a pena com o resultado das artes, que de tão perfeitas se confundem facilmente com a fotografia que a inspira. Thiago participa de exposições em Vilhena e também possui trabalhos expostos na Época Galeria de Artes, em Goiânia (GO). E, mesmo assim, considera que “a carreira artística é prematura. Tenho alguns objetivos em relação a minha arte, mas ainda não consigo enxergar onde isso tudo vai estar daqui a alguns anos”, finaliza.

Índia. 2016. Óleo sobre tela. 70 cm x 70 cm

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EVENTOS

CURSO DE NECROPAPILOSCOPIA EM GOIÂNIA (GO) O foco do estudo foi preparação em DVI (Disaster Victim Identification), na identificação papiloscópica de vítimas de desastres

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cidade de Goiânia (GO), sediou, de 16 a 20 de maio de 2016, o Curso de Necropapiloscopia no Contexto de Desastre em Massa, que integrou parte da agenda de capacitações da Coordenação de Grandes Eventos (CGE/DIREX/PF) para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016. O curso foi realizado na Escola Superior da Polícia Civil e no Instituto Médico Legal, com apoio dos colegas e professores papiloscopistas, Simone de Jesus e Antônio Maciel Aguiar Filho, atual Diretor do Instituto de Identificação de Goiânia (GO). O curso contou com a presença de Papiloscopistas Policiais Federais (PPFs) das Superintendências de Polícia Federal e Papiloscopistas da Polícia Civil de Goiás (convidados) e teve como principal objetivo preparar os profissionais para atuação em DVI (Disaster Victim Identification), na identificação papiloscópica de vítimas de desastres.

Da esquerda para a direita: O diretor da Escola Superior da Polícia Civil de Goiás (ESPC/GO),delegado Deusny Aparecido Silva Filho, o diretor do INI-PF, Brasílio Caldeira Brant, o supervisor do curso, Jurandir Júlio Oliveira, o presidente da Fenappi, Antônio Maciel Aguiar, e as professoras Luciene Marques e Simone de Jesus

Abertura do curso

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PPFs

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EVENTOS

IML aula prática

Alunos no IML

Aplicação de técnica

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EVENTOS

DIVULGAÇÃO

MÉTODO SEGURO E EFICAZ

A abertura do Congresso foi prestigiada por diversas autoridades, entidades e Polícia Federal.

O V Congresso Nacional de Necropapiloscopia em Natal (RN), reuniu papiloscopistas de todo o país

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romovidos pela Federação Nacional dos Profissionais em Papiloscopia e Identificação (FENAPPI), foram realizados, em Natal (RN), de 14 a 16 de setembro, o IV Encontro Nacional sobre Pessoas Desaparecidas e Desastre de Massa e o V Congresso Nacional de Necropapiloscopia. Participaram dos eventos, papiloscopistas dos Estados e da Polícia Federal, como também representantes dos Institutos de Identificação e Institutos Médico Legal. Os eventos objetivaram o intercâmbio e a difusão de conhecimento técnico e de informações específicas ligadas à papiloscopia e direitos humanos, buscando o aprimoramento constante dos serviços prestados, tendo em vista a indiscutível importância da Necropapiloscopia como método seguro e eficaz na identificação de cadáveres. Além disso, também foram temas tratados no evento a difusão de conhecimento técnico, com a apresentação de casos e de trabalhos científicos; a discussão de medidas que dizem respeito aos casos

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de pessoas desaparecidas; e a criação de bancos de dados com biometrias para pesquisa nessa área. ABERTURA “A importância da Perícia Oficial e o Papel da Papiloscopia nesse contexto”, com o Ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, Ricardo Brisolla Balestreri, foi a palestra de abertura. Depois, a Companhia de Dança do Teatro Alberto Maranhão (CDTAM) apresentou o espetáculo “Gonzagando”, que homenageia um dos artistas mais queridos da cultura popular nordestina, o cantor e compositor Luiz Gonzaga, mais conhecido como o “Rei do Baião”. Suas importantes e inventivas músicas fizeram com que o Nordeste se propagasse pelo Brasil e pelo mundo por meio do som de sua sanfona, do triângulo e o zabumba. PALESTRAS Algumas das palestras realizadas nos eventos foram: “Acidente aéreo que viti-

mou Eduardo Campos”, proferida pela Papiloscopista Policial Federal (PPF) Luciene Marques da Silva, do Instituto Nacional de Identificação (INI-PF); “Corpos indigentes: a identificação dos corpos com identidade ignorada encontrados no Estado de Goiás”, proferida pelo presidente da FENAPPI e diretor do II-GO, Antonio Maciel Aguiar Filho; e “PROJETO CADÊ – Cadastro Biométrico de Pessoas Desaparecidas”, proferida pelo diretor do INI-PF, Brasílio Caldeira Brant. O presidente da FENAPPI, Antonio Maciel Aguiar Filho, explicou que “os eventos foram exitosos em suas abordagens, já que conseguiram falar sobre como estabelecer a individualidade de cadáveres com identidade ignorada ou supostamente conhecida, em condição de morte recente ou em avançado estado de decomposição, o que constitui um dos mais relevantes trabalhos realizados pelos Institutos de Medicina Legal de todo o País, evitando a troca de cadáveres e proporcionando dignidade e tranquilidade a inúmeras famílias”, disse.

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EVENTOS

A Companhia de Dança do Teatro Alberto Maranhão (CDTAM) apresentou o espetáculo “Gonzagando na abertura do Congresso.

O Diretor do Instituto Nacional de Identificação (INI), Brasílio Caldeira Brant falou sobre o PROJETO CADÊ - Cadastro Biométrico de Pessoas Desaparecidas”

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EVENTOS

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O Diretor do Instituto Nacional de Identificação (INI), Brasílio Caldeira Brant falou sobre o PROJETO CADÊ - Cadastro Biométrico de Pessoas Desaparecidas” DIVULGAÇÃO

Antonio Maciel Aguiar Filho, presidente da Fenappi.

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FOTO GALERIA

CURSO PRÁTICO DE PERÍCIA PAPILOSCÓPICA

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Instituto Nacional de Identificação (INI-PF) realizou em outubro (duas turmas) e em dezembro (uma turma), um curso prático (nos moldes de uma oficina) de perícia papiloscópica integrado ao sistema AFIS. Cada turma era composta por 10 Papiloscopistas Policiais Federais (PPFs). .

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FOTO GALERIA

REUNIÃO DE FIM DE ANO DO INI-PF

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FOTOS/ARQUIVO PESSOAL

o dia 13 de dezembro, foi realizada uma reunião/encontro com toda equipe do Instituto Nacional de Identificação da Polícia Federal (INI-PF) e a direção do órgão. Foi uma reunião de feedback dos trabalhos realizados no ano de 2016 por todos os setores do INI. Aquele foi mais um belo dia, no qual a direção agradeceu o empenho de todos e o espírito de união e a certeza do dever cumprido deram a tônica da fala do diretor do INI, Brasílio Caldeira Brant. .

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