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Chevrolet Kadett

Chevrolet Kadett

Você sabe quantos modelos de automóveis estão disponíveis para os brasileiros atualmente? E sabe quantos novos modelos foram lançados neste ano? Muitos. Desde a abertura das importações de veículos, no início dos anos 90, mais e mais marcas foram chegando, instalando subsidiárias e abastecendo o nosso mercado com que há de melhor no mundo em termos de automóveis e motocicletas. Mas não era assim.

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Desde a implantação da indústria automobilística nacional, em 1956, os brasileiros se acostumaram com as poucas marcas de carros, com poucos modelos de cada uma. Os modelos estrangeiros eram raros,

O início da renovação custando muito caro e com imensa dificuldade de importação. Nos anos 70 essa realidade foi consolidada, com a proibição definitiva das importações de veículos. Restavam, então apenas Volkswagen, Chevrolet, Chrysler, Ford e, chegando por último, a Fiat. Com modelos já existentes em seus países de origem, a indústria nacional de automóveis se contentava em dar um “tapa” no visual de alguns deles, sempre que o mercado exigia algum tipo de renovação. Até que chegou ao Brasil um automóvel que em nada ficava devendo ao que existia de melhor no mundo, em seu segmento, o novo Chevrolet Kadett.

Motor do Chevrolet Kadett GS

O Chevrolet Kadett foi lançado no Brasil em 1989 com muito alvoroço, afinal, era um modelo mundial, com inovações tecnicamente superiores ao que se conhecia por aqui. E algumas dessas novidades seriam conhecidas pelos brasileiros em primeira mão, como computador de bordo, vidros colados, suspensão traseira com regulagem pneumática e um projeto aerodinâmico de baixo coeficiente de resistência.

A ideia inicial era lançar o Kadett nas versões hatch e perua, que ainda não tinha nome, e só no fim de 1989 disponibilizar a versão esportiva GS, mas, felizmente, mudaram de ideia e lançaram o esportivo como o objeto de desejos do novo modelo. A perua Ipanema chegou em setembro. ç

Raio X da versão GS do Chevrolet Kadett, que tinha motor de maior cilindrada e algumas diferenças mecânicas

Para aquele fim de década, as novidades tecnológicas que vieram no Kadett, apesar de atualmente parecerem brinquedos ultrapassados, eram muito interessantes. O que se chamou de computador de bordo nada mais era que um medidor de fluxo de combustível, de distância e de tempo, o que resultava em dados de consumo instantâneo e médio, distâncias percorridas, velocidade média e autonomia do tanque. Ainda tinha cronômetro e mostrava a hora.

Outro item interessante no Kadett era o painel do Check Control, com sete luzes que, se acesas, indicavam algum problema. Todas acendiam ao dar a partida no carro, e todas deveriam apagar caso estivesse tudo ok. Mas esse foi um dos defeitos crônicos do modelo, pois elas não apagavam, mesmo se não houvesse problemas. Nos meus três Kadett, isso aconteceu o tempo todo (tive também um Turim). A suspensão traseira com auxílio pneumático também deu o que falar, mas, no fim, era apenas um artifício para manter a altura do carro de acordo com a carga no porta-malas. O ar comprimido era colocado por um bico no porta-malas, da mesma forma que se calibrava um pneu, e não afetava no funcionamento da suspensão nem no desempenho dos amortecedores. O Chevrolet Kadett foi lançado com motor 1.8 a gasolina ou álcool (ainda não existiam os motores flex), de 99 cv e 95 cv, respectivamente, e 2.0 a álcool no GS, de 110 cv. Este tinha as relações de transmissão mais curtas, assim como os pneus de perfil mais baixo, tornando o carro mais esperto e mais esportivo. No ano seguinte, isso mudou.

Kadett GS vermelho, o mais bonito no lançamento

Para ficar mais silencioso e mais confortável, além de economizar um pouco de combustível, o Kadett GS de 1990 tinha relação de transmissão alongada e pneus maiores (passaram de 185/60-14 para 185/65-14). Isso incluía a nova opção do motor 2.0 a gasolina para o GS, com potência declarada de 99 cv.

Em maio de 1990 surgiu o Kadett Turim, série especial comemorativa da Copa do Mundo daquele ano, na Itália. Era uma versão simplificada do SL/E, mas com detalhes como rodas de liga leve espelhadas, bancos Recaro do GS, aerofólio e detalhes pintados de cinza. Com o tempo, o Kadett Turim se mostrou uma opção bem interessante na relação custo/ benefício e hoje é muito procurado por causa dos bancos especiais. ç

A família Kadett, no ano de seu lançamento

Chevrolet Kadett GSi conversível

A família Kadett ganhou injeção eletrônica em 1992, monoponto no 1.8 e multiponto no 2.0, no mesmo ano em que chegou o Kadett GSi conversível. Esse modelo cativou uma legião de admiradores, na época, e os mantém até hoje, sendo um modelo altamente cobiçado e de grande valor.

O Kadett GSi conversível passava por muitas etapas em sua fabricação: a parte frontal do monobloco era enviado para o estúdio Bertone, na Itália, para completar a carroceria com elementos exclusivos dessa versão – que era também vendida na Europa – voltando para a fábrica brasileira para receber a mecânica do Kadett nacional. Essa operação, que durava cerca de seis meses, encarecia bastante o Kadett conversível.

O Chevrolet Kadett Sport, de 1996, com alguns elementos estéticos do extinto GSi

Passada a euforia do lançamento, o Kadett passou a ser visto como um modelo corriqueiro, começando a perder atrativos devido aos carros importados que começavam a chegar com a abertura do mercado. Mas as novas opções de motor e versões o mantiveram até sua reestilização, em 1996. O Kadett GSi e sua versão conversível foram fabricados só até 1994, os últimos como modelo 1995. Os novos Kadett ganharam uma aparência mais moderna, com nova grade e novo para-choque, além de muitos detalhes renovados, mas a gama resumia-se apenas nas versões GL e Sport, além da perua Ipanema. O Chevrolet Kadett foi produzido até setembro de 1998, quando foi substituído pelo Chevrolet Astra. l

A história da história

E a confusão dos nomes Kadett, Astra e Chevette

OChevrolet Kadett brasileiro era praticamente o mesmo produzido na Alemanha, pela Opel, que naquela época era uma marca pertencente ao grupo General Motors. Desde os anos 60, a GM mantinha aqui os modelos da marca alemã com o nome Chevrolet, caso do Opala, do Monza, do Chevette e do Omega. A história do Kadett, no entanto, ou pelo menos do nome, começou muito antes, em 1936.

A marca Opel foi criada em 1862 por Adam Opel, que começou com máquinas de costura, entrando no segmento dos automóveis em 1899. O Opel Kadett foi produzido a partir de 1936, na Alemanha, mas teve a produção interrompida em 1940, devido à guerra. Após o conflito, os russos retomaram a produção do modelo em seu país, denominando-o de Moskovich 400, o que durou até o ano de 1954.

O Opel Kadett voltou à produção na Alemanha em 1962, pela Opel, já incorporada à General Motors, com o modelo A. O modelo B surgiu em 1965 e é um dos modelos da marca mais conhecidos dos brasileiros.

O Opel Kadett foi lançado na Alemanha em 1936 e a produção foi encerrada em 1940, devido à guerra

Na foto maior, o Opel Kadett A, de 1962, e nas menores o Kadett B, de 1965 e o Kadett C, de 1973, “nosso” Chevette

Já o Opel Kadett C é ainda mais conhecido, mas com outros nome e sobrenome: Chevrolet Chevette. O Opel Kadett C foi lançado em 1973 na Alemanha, o mesmo ano em que a Chevrolet apresentava seu carro compacto para disputar com o VW Fusca esse segmento no Brasil.

O Opel Kadett D chegou em 1979, com drásticas mudanças: motor transversal e tração dianteira, antecipando o Opel Ascona, que foi produzido no Brasil a partir de 1992 como Chevrolet Monza.

Finalmente, a Opel lança Kadett E em 1984, o último modelo a ter esse nome e cinco anos antes do nosso Chevrolet Kadett. O visual mudou do D para o E, que abandonou o tradicional estilo quadrado e adotou linhas arredondadas. Daí o baixo coeficiente aerodinâmico.

O Opel Kadett E foi substituído pelo Opel Astra em 1991, onde, em alguns mercados, como o inglês, ele manteve o nome Vauxhall Kadett.

Aqui, o Kadett quase se chamou Astra, mas alguém alertou, a tempo, que esse era o nome de uma tampa de bacia sanitária. l

uM LAnçAMEntO MEMOráVEL

O Chevrolet Kadett foi apresentado oficialmente à imprensa especializada em abril de 1989, em um grande evento no Club Med de Angra dos reis, em rio das Pedras, no rio de Janeiro. A festa noturna contou até com um Kadett colocado no alto de uma enorme pedra, com helicóptero, bem iluminado. O impacto visual foi surpreendente. Apenas no dia seguinte iríamos dirigir a novidade, que para mim era só meia novidade, pois já havia pilotado o Kadett Gs 2.0 no Campo de Provas da General Motors. restava, então, conhecer as versões com motor 1.8, o Kadett sL e o Kadett sL/E. Como era de costume na época, uma festa desse calibre sempre rendia algumas boas lembranças, e não só de recordaçôes de bons momentos. Para um colecionador de tudo como eu, fiquei muito feliz em acrescentar em minha coleção de itens automotivos as duas lembranças oferecidas pelo fabricante na ocasião, uma caixa metálica de ferramentas, com a inscrição Kadett nas laterais, e uma luminário de neon com a silhueta do novo modelo. Feliz até lembrar que fomos ao rio de janeiro de avião, e agora teríamos que retornar levando uma pesada caixa de ferramentas. E o pior: a lãmpada de neon em forma de Kadett poderia se quebrar facilmente, além de ter um reator elétrico pesando uns dois quilos. Mas o pior se transformou no melhor. A caixa de ferramentas está devidamente guardada e a silhueta de neon está acesa até hoje, em uma prateleira no alto da parede. Funcionando, 33 anos depois.

A perua Ipanema, amada e odiada

Pouco tempo depois do lançamento do Chevrolet Kadett hatch, veio a esperada perua. Os berros de reclamação podiam ser ouvidos por todos os cantos, o que, na minha opinião, foi uma grande injustiça para aquele carrinho. Mesmo com a modernidade do projeto, a traseira truncada causou ódio. Menos para mim. um dos modelos de automóvel prático e de espaço interno otimizado, na minha concepção, era a perua DKW Vemaguet, justamente por não desperdiçar volume de bagagem com visual. A ipanema era bem parecida nesse ponto. Chamada até de carro funerário (o que ficou consolidado com a perua Chevrolet Omega suprema, poucos anos depois), a perua ipanema, de cara, sofreu enorme preconceito. sorte de quem não pensava dessa forma e aproveitou um dos carros nacionais mais coerentes daquela época. na pista, a peruinha que havia sido carro de resgate da Fórmula 1 era ainda mais veloz e gostosa de ser pilotada do que o Kadett Gs, que ficou para a posteridade. Mas isso tem uma boa explicação: feita na engenharia da GM, ela era uma ipanema Gs 2.0 completa e autêntica. E única.

MinhA históriA COM O KADEtt

O velho Chevrolet Kadett Gs 1990, Pace Car oficial da Fórmula 1, em sua aposentadoria Em 1989, eu trabalhava para a revista Oficina Mecânica, avaliando automóveis, fazendo testes e escrevendo sobre técnica automotiva. Assim como acontecia com as motocicletas, poucas eram as novidades que surgiam em relação aos automóveis. Mas qualquer lançamento, mesmo que fosse para mostrar apenas um novo motor, era levado muito a sério. O que dizer, então, de um novo modelo, mundial, mas inédito em nosso país, cheio de inovações? nessa década de 1980, os lançamentos importantes foram o Chevrolet Monza, o Fiat uno e o Vokswagen santana. O VW Gol Gti também foi um lançamento de peso, mas não era um carro novo. Fui para o Campo de Provas de Cruz Alta, a pista de testes da General Motors em indaiatuba, interior de são Paulo, ansioso em conhecer o novo Chevrolet Kadett. isso foi bem antes do lançamento e a versão que avaliei foi a esportiva Gs (Gran sport). Além de ter motor 2.0 de maior potência, o Kadett Gs tinha suspensões mais firmes, relações de marchas mais curtas, rodas de liga leve com pneus de perfil baixo, grade dianteira diferenciada, saídas de ar no capô do motor, luz traseira de neblina, espelhos na cor da carroceria, kit aerodinâmico (spoiler, defletores, aerofólio e minissaias), lanternas traseiras com filetes, tampa traseira pintada de preto, faróis auxiliares, defletores de ar nas hastes dos limpadores do para-brisa e bancos recaro. É claro que eu fui ler o que escrevi em 1989, para poder lembrar de isso tudo. Aquele dia no Campo de Provas foi mais do que divertido. saí de lá achando que, enfim, teríamos um automóvel atual. Queria um. Mas a história não para aí. Em pouco tempo

O Pace Car antes da F1 de 1990, durante reportagem que fiz para a Oficina Mecânica

Quando chegou, o Gs perdeu a “roupa” da F1 e foi trabalhar nas instruções de pilotagem a General Motors preparou o maior evento de lançamento que já se havia visto até então, em um resort no rio de janeiro, com o test drive oficial em todas as versões (sL e sL/E). na última noite, houve um bingo para os jornalistas presentes, e advinhem qual era o prêmio para quem completasse a cartela? sim, um Chevrolet Kadett Gs vermelho. Foi quase: me faltava o número 11 e um colega ao meu lado precisava apenas do número 60. Ele levou o carro. Mas não demorou para eu ter o meu. no ano seguinte, a General Motors patrocinou a reforma do Autódromo de interlagos, para o GP Brasil de 1990, e cedeu sete Kadett para serem usados como Pace Car e veículos de apoio. Para uma das edições da revista, fui para interlagos experimentar o Kadett Gs de Pace Car, que ganhou uma preparação “secreta” da turma de engenharia, bancos de competição, cintos de quatro pontos e gaiola de proteção. Além de equipamentos para a corrida, como rádio e giroflex. não deu outra, no ano seguinte, quando o Kadett Gs foi substituído pelo Gsi, que ganhou injeção eletrônica, comprei duas daquelas belezinhas para usar na minha escola de pilotagem. Depois que o Curso Marazzi passou a ser dirigido pelo Manzini, dez anos depois, o querido Kadett Especial de Fórmula 1 (designação oficial do carro, conforme adotado pela Engenharia da General Motors) foi aposentado, passando a ser apenas um item de coleção. totalmente original, exatamente como saiu do departamento de engenharia para a pista, em 1990, só falta recriar o grafismo usado na Fórmula 1 para voltar a ficar famoso.