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OPINIÃO - Marcelo Bertoluci A racionalidade jurídica no tempo das incertezas

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MARCELO BERTOLUCI Advogado, Doutor em Ciências Criminais, Professor da Escola de Direito da PUCRS, Ex-presidente da OAB/RS

A revolução tecnológica acelerou a potência da transformação. As instituições, por sua vez, precisam absorver em suas estruturas a inovação. A lógica das redes é, por certo, a expressão desse mundo múltiplo, veloz, regido por relações de simultaneidade e interconexão. Exige-se outro tipo de conduta do litígio em resposta às demandas do século XXI

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A RACIONALIDADE JURÍDICA NO TEMPO DAS INCERTEZAS

Os institutos democráticos que se insculpiram ao longo de um exaustivo percurso histórico não podem ir a pleno desterro em momentos de tensão. Para encontrar alicerces que sustentam a conflituosa travessia de um tempo que assistiu à queda de suas certezas, é indispensável que o cidadão seja capaz de se manter lúcido e independente, pesando com autonomia e uma necessária dose de pragmatismo. Por certo, a insegurança dos conceitos e o questionamento das verdades até então assumidas como absolutas fazem parte de um fenômeno mais amplo, que não se reduz ao setor jurídico, muito menos ao território brasileiro: trata-se de um abalo pragmático amplíssimo, cuja nascente é impossível de ser determinada, pois remonta a focos dispersos por muitas áreas do conhecimento. Pontuar esses focos de crise poderá ajudar a estabelecer a dimensão da angústia epistemológica da contemporaneidade. A física clássica, construída sobre o racionalismo cartesiano, pretendeu submeter a leis universais e deterministas os fenômenos da natureza. No século XX, experiências empíricas expuseram as falhas e insuficiências das fórmulas que prometiam ao ser humano o controle sobre quase tudo. A física quântica e a teoria relatividade de Einstein acrescentaram novos problemas à ciência, registrando resultados inconciliáveis com ideias anteriores. Corroeram-se, assim, as estruturas sobre as quais o século

XIX havia confiantemente assentado a sua verdade. A ausência de respostas absolutas varreu todos os âmbitos do conhecimento com uma sensação de incerteza e insegurança. A ideia de leis imutáveis da natureza era compatível com a doutrina do jusnaturalismo que fundamentava o direito na razão, no bom senso e na preexistência de valores morais e éticos autoevidentes.

Na virada do século, a própria capacidade humana de compreender a realidade foi posta sob o signo da dúvida, abalando a credibilidade dos institutos clássicos, como demonstram no livro “A evolução da física” Albert Einstein e Leopold Infeld, notadamente sobre o caráter especulativo e instável do modelo cognitivo emergente. Esses movimentos científicos culminaram naquilo que o químico russo Ilya Prigogine (19172003) chamou de fim das certezas, impondo a visão múltipla de uma sociedade instável e efêmera. A dificuldade da busca de uma racionalidade ética capaz de mediar relações plurais e instáveis é descrita por Ricardo Timm de Souza como uma radical insegurança.

A revolução tecnológica acelerou a potência da transformação. As instituições, por sua vez, precisam absorver em suas estruturas a inovação. A lógica das redes é, por certo, a expressão desse mundo múltiplo, veloz, regido por relações de simultaneidade e interconexão. Exige-se outro tipo de conduta do litígio em resposta às demandas do século XXI. A lógica emergente se traduz pela transdisciplinaridade e o Direito deve avançar como construtor de uma sociedade mais horizontal e contribuir verdadeiramente para a paz social e para a redução de tantas incertezas...

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