Revista Chibé

A

REVISTA

QUE

TOCA

MÚSICA

EDIÇÃO 1 ANO I JANEIRO A JUNHO DE 2019

CULTURA MARANHENSE EM EVIDÊNCIA

CHIBÉ A REVISTA QUE TOCA MÚSICA FICHA TÉCNICA COORDENAÇÃO PROFESSOR BRUNO FERREIRA CAROLINA PRAZERES FERNANDA ASSUNÇÃO NÁDIA BARROS ORLANDO EZON PAULA CERES QUECIA CARVALHO RODRIGO BOMFIM RÔMULO RIBEIRO WANDERSON MOTA

PRODUÇÃO LABORATÓRIO DE JORNALISMO IMPRESSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO AV. DOS PORTUGUESES, 1966 VILA BACANGA, SÃO LUÍS - MA 65080-805

CHIBÉ A REVISTA QUE TOCA MÚSICA

ÍNDICE 04 VITRINE MUSICAL MARANHENSE 10 TAMBOR DE CRIOULA FLOR DE SUMAUMEIRA 12 O MOVIMENTO DO RAP 18 CHIBÉ ENTREVISTA GILBERTO MINEIRO 28 MAMMA MIA! 32 CULTURA E POLÍTICA ENTRELAÇADAS: 35 ANOS DE AKOMABU 36 PERCUSSÃO, RESISTÊNCIA E CULTURA POPULAR: BANDA AFRÔS PREPARA NOVO ÁLBUM 38 DESVENDANDO A MÚSICA ALTERNATIVA LUDOVICENSE

VITRINE MUSICAL

MARANHENSE O Festival BR-125 proporciona, há sete edições, um verdadeiro intercâmbio cultural na capital do estado.

- POR FERNANDA ASSUNÇÃO -

I

dealizado pela dupla Criolina (Ale Muniz e Luciana Simões), o Festival BR 135 proporciona há 7 marcantes edições um verdadeiro intercâmbio cultural na Ilha de São Luís. Quando

surgiu em 2012, os shows eram mensais, realizados na base da colaboração e ocupando o palco do Circo da Cidade. O evento chamou a atenção de investidores, e em setembro daquele ano, uma edição em parceria com o Sebrae e com o Sesc fez do festival parte da programação da I Mostra Cultura Ativa, que ocorreu no Ceprama, e também da Mostra Guajajara de Arte, meses depois.

Em 2013, com o nome “Projeto BR 135 – Energia Musical” o festival promoveu quatro shows, ao longo de todo o ano, em diferentes locais de São Luís.

Foram eles “Bandeira de Aço 35 Anos”, em maio, no Teatro Arthur Azevedo em homenagem ao álbum de mesmo nome gravado por Papete, em 1978; “Arte e Cidadania - Essa é a nossa praia! ”, no mês de julho, na praia de São Marcos, em parceria com o Movimento Nossa São Luís – SLZ (o show contou com músicos como Nathalia Ferro e Phill Veras, etc); o “BR-135 - Energia Musical”, durante o mês de setembro, na Praça do Pescador - que funcionou também como um evento beneficente, já que o público foi convidado a doar 1 quilo de alimento não perecível; e por fim, o BR 135 encerrou suas atividades do ano em outubro com o evento “João do Vale 80 Anos”, no Teatro Arthur Azevedo.

Desde então o festival vem crescendo nacionalmente. Em 2014, por exemplo, além da edição tradicional do ano, foi realizado um show extra no mês de dezembro com patrocínio da Cemar. A festa, que ocupou o Centro Histórico de São Luís pela primeira vez, aconteceu entre os dias 18 e 20, no Teatro Arthur Azevedo e nas praças Nauro Machado e Criança.

CONECTA MÚSICA Ainda em 2014, o Festival sentiu a necessidade de trazer também, fora a música e o entretenimento, discussões acerca

de

questões

culturais

e

Circo da Cidade O Circo Cultural Nelson Brito, mais conhecido como Circo da Cidade, foi um espaço cultural da cidade de São Luís, inaugurado em 1999, no Aterro do Bacanga,

suas relações com o trabalho que

ao lado do Terminal de Integração da Praia Grande.

já desenvolvido até então. Neste

eram voltadas para o público infantil e de baixa

No começo as atividades que aconteciam no local

momento surge o “Conecta Música”,

renda. Porém, posteriormente, passou a abrigar

um espaço de troca de saberes

nacionais.

shows, peças, e espetáculos de artistas locais e

e tecnologias, com o objetivo de promover diálogos e apontar propostas para o desenvolvimento da música na diversidade cultural.

Em 2012, a estrutura do Circo da Cidade foi desmontada para instalação do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), com a proposta de ser reinstalado em outro endereço. Entretanto, a obra do VLT foi abandonada e o Circo não foi remontado no local.

Diversos movimentos protestam pelo retorno do

Na edição de 2019, por exemplo, o Conecta trouxe temas que propuseram

espaço cultural, que ficava em local acessível e promovia apresentações de artistas locais.

alinhar o imaginário popular, a inovação e as tecnologias no contexto da economia criativa e suas estratégias para resistir através da arte. As atividades foram gratuitas e ocorreram na casa do Tambor de Crioula e no Casarão Tech, ambos na Rua da Estrela, no Centro Histórico de São Luís. O evento contou também com palestras, rodas de conversa e uma rodada de negócios - esta teve um número limitado de vagas, apenas vinte.

Consolidou-se a partir daí um modelo de singular para o Festival BR 135. Desde então, o evento vem acontecendo ao final do ano, durante os meses de novembro ou dezembro, com shows, rodas de conversa, rodadas de negócios, oficinas e muito mais. Tudo isso se resume ainda em geração de renda, além de representar uma grande oportunidade para os artistas e comerciantes locais, que tem no festival a chance de fazer um intercâmbio de experiências com profissionais do país inteiro.

O Projeto BR 135, que inclui o Conecta Música, foi aprovado pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura da Secretaria de Estado da Cultura e têm patrocínio da Budweiser.

o Br ercad M o es d Ediçõ 2015 s essoa p l i s m anda b co: 36 i l iva 0 b 3 ú P s: 3 timat a s t i e r c e os as ins vidad n Band o c s 14 pante sica: i ú c i redes t m r m a a e t p l c a e 0 t Con de 80 alcance to : s 6 rede 91.26 e em s c i n a i a c c so Al

2017 Público: 53 mil pessoas Bandas insc ritas: 400 b andas Conecta mú sica: 20 con Mercado br: vidados 51 exposito res movime ntação de 50 mil re ais Alcance em redes: 302.6 00 de alcan ce no instagram e facebook

2016 Púb lico: Con B 4 a 5 nda ecta mil p s ins mús esso Mer crita ica: as cado s: 33 140 Br: 0 pa 6 ba 33 e r n ticip das xpo ante Alca sito se3 res e nce 3 co em mov nvid mil r rede ime ado eais s: es n t s ação tima d t e 40 face iva d boo e 40 kei 0m nsta gram il pesso as v ia

2018

ssoas e p il m 0 Público: 7 itores s o p x e 6 br: 6 Mercado

TAMBOR DE CRIOULA FLOR DE SUMAUMEIRA Como estudantes da UFMA misturam saber popular com saber acadêmico - POR RÔMULO RIBEIRO -

D

as diversas manifestações culturais existentes no Maranhão, o tambor de crioula é uma das mais tradicionais, comportando elementos históricos de grupos negros com sua ancestralidade e possuindo uma estrutura rítmica musicalmente singular e de execução ímpar.

Sabendo dessas características, estudantes do curso de Música da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), juntaram-se para promover uma oficina de aprendizado sobre o estilo.

Foi a partir do incentivo do professor do Departamento de Música, Renato de Castro, que alguns alunos reuniram-se todas as sextas no

Centro de Ciências Humanas (CCH) para fomentar o aprendizado do ritmo, sempre com esclarecimentos pontuais técnicos e históricos, demonstrando o diálogo que existe entre as manifestações, a musicalidade, a religiosidade e as referências étnico-culturais que os grupos negros carregam consigo.

Rafael Neves, estudante de música e um dos líderes da proposta, comenta que, apesar da Universidade ser um ambiente de diversidade de saber e de possuir propostas vinculadas à pluralidade de conhecimentos e práticas, o grupo sofre com a falta de reconhecimento e incentivo institucional, além do descaso do corpo docente em aceitar a prática, principalmente por questões religiosas, apesar de o grupo não se direcionar para a religiosidade, já que a propos-

ta de oficina é voltada mais especificamente para a atuação musical e da prática manifestativa.

Outro ponto importante é que o tambor de crioula é uma manifestação tradicional baseada em conhecimento popular, portanto vinculado a saberes não técnicos ou científicos. Por conta disso, há uma falta de apoio por grande parte do corpo discente do curso que estão mais vinculados à conhecimentos ao viés erudito da música, deixando de lado abordagens com tal cunho.

Os encontros acontecem nos finais de tarde da sexta-feira no espaço Ágora do CCH e conta com participação aberta, ou seja, o grupo possui participantes fixos – cerca de 15 pessoas – que se apresentam, porém incentivam a entrada de qualquer integrante que se interesse em conhecer e tocar.

Por conta da repercussão que o grupo tomou, alguns convites são feitos para apresentações tanto em eventos de cursos na Universidade, quanto em eventos fora da UFMA que possuam a mesma proposta.

Foto: Divulgação 5ª de Arte

Dessa forma, a Flor de Sumaumeira se sustenta e mantém instrumentos e equipamentos necessários para sua existência.

Os instrumentos utilizados pelo grupo foram doações do professor Renato de Castro que possuía alguns tambores usados para a prática do tambor e propôs o encontro do grupo com o intuito de fomentar o conhecimento sobre a manifestação devido a seu trabalho envolvendo a etnomusicologia, área na qual é doutor pela Queen’s University Belfast (QUB).

Já em relação as vestimentas utilizadas nas apresentações, o grupo encomendou confecções a partir dos cachês recebidos pelos eventos.

As manifestações populares possuem ainda pouco reconhecimento e incentivo regular tanto por parte das instituições quanto da população. O Tambor de Crioula Flor de Sumaumeira reflete isso, assim como revela uma dimensão igualmente presente nas práticas de mesmo cunho: o de resistência, evidenciando um caminho árduo a ser trilhado que dialoga tanto com o conhecimento e saber popular quanto com a sustentação das identidades étnico-culturais.

O MOVIMENTO DO RAP A atuação da Cangaço Records vai do ritmo até a poesia.

- POR QUECIA CARVALHO -

Década de 1960. Os anos rebeldes. Época de guerras e divisões políticoeconômicas, mas, também período de descobertas e revoluções. Na música, por exemplo, o mundo passava a conhecer o poder dos quatro garotos de Londres. Era o início da beatlemania.

surgia nas ruas da Jamaica o gênero dos ritmos e poesias de uma “vida comum”. Contudo, foi nos Estados Unidos da década de 1970 que o RAP se popularizou, encontrando força nos guetos - sobretudo, em Nova Iorque. Os conflitos reais e diários dos jovens negros e pobres estrelaram os discursos em forma de versos ritmados, com muita e

pouca

melodia,

acompanhados por rápidas batidas que, aos poucos, deram forma ao gênero. Cansados do dançante disc music, muitos jovens norteamericanos

passaram

várias músicas.

Contudo, muito além de um simples ritmo musical, à medida que crescia, o RAP se mostrava também - e, sobretudo - como um movimento cultural, um estilo de vida dos grupos que o cantavam. As gírias,

Longe de toda essa histeria global,

informação

Brown serviu de inspiração para

a

mixar

diversas músicas e criar sobre elas algo novo e diferente, com arranjos específicos do RAP. O próprio James

características

desses

bairros,

foram incorporadas às letras; as danças rápidas e os movimentos de malabarismos corporais foram acrescidos ao movimento; e o cenário urbano passou

a ser o

visual representativo dos grupos, principalmente com a arte dos grafites.

No Brasil, o RAP só chegou no fim da década de 1980, época de auge para o movimento norte-americano, com Snoop Doggy e LL Cool J, por exemplo. O gênero se concentrou inicialmente em São Paulo e os primeiros shows eram apresentados no Teatro Mambembe pelo DJ Theo Werneck. A imagem de violência e periferia, geralmente, associada ao estilo tardou a sua difusão pelo país,

que esperou quase dez anos para ter

Latifah, Eminem, Notorious, etc.

a atenção da indústria fonográfica e dos veículos de comunicação.

Frequentemente, alguns MCs se reúnem em pontos específicos dos

Nos anos 90, surgem os principais

grandes centros urbanos e duelam

nomes do estilo aqui no Brasil:

entre si com rimas e improvisações.

Racionais MCs, Pavilhão 9, Detentos

São as famosas batalhas de RAP.

do Rap, Câmbio Negro, Xis &

Cada

Dentinho, Planet Hemp e Gabriel, O

batalhas tem atraído dezenas de

Pensador, entre outros.

pessoas, desde àquelas que se

vez

mais

populares,

as

identificam com o movimento até os

PARA ENTENDER O RAP

mais curiosos transeuntes. Forma-

O RAP é geralmente

cantado e

se uma roda e, no meio, ficam o

tocado por uma dupla composta

apresentador e os dois primeiros

por um DJ (disc-jóquei), que fica

MCs que iniciarão a rinha de RAP.

responsável pelos efeitos sonoros

Cada um tem 30 segundos para

e mixagens, e por MCs que se

improvisar nas rimas. O público

responsabilizam pela letra cantada.

é quem define o vencedor que

Quando o RAP possui uma melodia,

passará para a próxima fase. Assim

ganha o nome de hip hop.

segue até a final com apenas um vencedor.

Um efeito sonoro muito típico do RAP é o scratch, que é o som

Há dois tipos de batalha: a do

provocado pelo atrito da agulha do

conhecimento e a de sangue. Na

toca-discos no disco de vinil. O efeito

primeira, os MCs têm que desenvolver

foi uma criação do rapper Graand

as rimas a partir de temas que

MasterFlash, depois dele outros

podem ser pré-estabelecidos pelos

começaram a utilizar o recurso,

organizadores ou escolhidos pela

entre eles Ice Cube, Ice T, Run DMC,

plateia no momento. Já a segunda,

Tupac Shakur, Salt’N’Pepa, Queen

é caracterizada pelo ataque verbal

ao adversário. No entanto, ambas

que este refletisse exclusivamente

são duelos de improvisação.

a

realidade

presente

naquele

lugar. Na capital maranhense, por

O MOVIMENTO RAP EM SÃO LUÍS: CANGAÇO RECORDS

exemplo, inúmeros são os grupos e

A partir da década de 1990, quando

letras a realidade das ruas de São

o RAP começou a se expandir por

Luís.

artistas que levam no nome e nas

outros estados brasileiros, diversos núcleos e vertentes do movimento foram se consolidando em todo

“VAMOS TER PRODUTORA”

E

SER

UMA

o país. Em cada região, um estilo

Entre esses “inúmeros”, a Cangaço

único de RAP foi construído, a fim de

Records. Editora audiovisual

fundada em novembro de 2016

(muitos

trabalham

vendendo

no bairro do Bequimão, Alameda

bombons em coletivos), mas têm

Perimetral Sul, Bloco E, em São Luís,

no RAP um suporte para manifestar

a partir do grupo AliadosRap95. O

indignação e cobrar sobre questões

grupo tinha na formação inicial

políticas, sociais ou, simplesmente,

Pedro Victor Silva (Pvs), Pedro

cantar sobre o que sentem e

Joaquim Moreira (Preto Thug) e

sonham. Os custos da editora são

André Granado (Granado). Contudo,

pagos pelos próprios integrantes, já

a Cangaço só passou a operar

que não possuem nenhum tipo de

oficialmente em junho do ano

apoio financeiro.

seguinte. O projeto, que nasceu do sonho de alguns garotos, começou

“CANGAÇO É NORDESTE”

a ganhar espaço no cenário do

Entre os projetos desenvolvidos

RAP Maranhense. Hoje, a Cangaço

pela editora estão o Arquivo CR (10

Records é uma das referências do

edições), o Sarau do RAP (2 edições),

RAP na Zona Leste da Ilha de São

a Roda Cultural Cangaço RAP -

Luís - Paço do Lumiar e regiões

RCCP - (10 edições), seis edições

adjacentes.

da Batalha da Cangaço e mais recentemente a 1ª Liga Nordestina

“Investimento não é só no dinheiro,

de MC’s, que aconteceu no mês de

investimento é também dedicação,

maio, no Piauí, em parceria com a

disciplina,

Projeto1Records (Piauí ) e FlowTal85

comprometimento

e

amizade. Tudo isso é investimento”

(Ceará).

O grupo já contou com dezessete integrantes,

mas

atualmente

é formado por nove: Granado,

“NÃO SER APENAS O FOCO, MAS TAMBÉM, O REFLEXO”

Saltitão, MT$, BielDmic, Felinho,

Apesar

Zook, Krustty (do grupo DMT) e

interestadual, com projetos cada vez

Anna Karla. Todos possuem outras

maiores e mais abrangentes, talvez

atividades como fonte de renda

o grande diferencial da Cangaço

de

ter

uma

atuação

“INVESTIMENTO NÃO É SÓ NO DINHEIRO, INVESTIMENTO É TAMBÉM DEDICAÇÃO, DISCIPLINA, COMPROMETIMENTO E AMIZADE. TUDO ISSO É INVESTIMENTO”

as lutas são constantes e diárias, desde o mais inofensivo xingamento até a mais vulgar discriminação velada em forma de crítica. Contudo, Records seja a ligação entre o grupo

uma coisa que não falta para essa

e a comunidade local. Se no futebol

galera é determinação, foco e fé.

existe o “vestir a camisa do time”,

São pessoas que já passaram (e

na Cangaço cada integrante veste

ainda passam) pelas mais diversas

e leva, no pensamento e nas letras

situações e julgamentos, mas que

que cantam, o lugar onde vivem.

se recusam a desistir. Cada um

O grupo DMT, por exemplo, é uma

deles tem consciência de quanto o

sigla para Diamante, comunidade

caminho pode ser duro e até fatal,

de São Luís, localizada na região do

em alguns sentidos, mas também

Centro.

acreditam que enquanto houver estrada para seguir, há opção. De

“A CIDADE PERDIDOS”

DOS

SONHOS

fato, a Cangaço Records é formada por homens e mulheres sonhadores,

O RAP hoje, apesar de estar mais

não importa quantas vezes alguém

incorporado ao cenário musical e

ouse dizer que eles não conseguirão

cultural do país, deixando, inclusive,

por milhões de fatores diferentes,

as

um

sempre os veremos lá, nos palcos

público cada vez mais heterogêneo,

(ou atrás deles) fazendo o que

ainda é alvo de diferentes tipos de

sabem de melhor: cantar de onde

preconceito. Para os que vivem RAP,

vieram.

periferias

e

ganhando

CHIBÉ ENTREVISTA

GILBERTO MINEIRO Gilberto de Jesus Campos Filho, mais conhecido como Gilberto Mineiro. Tem entre 20 e 100 anos de idade (depende do dia, de acordo com o próprio), é jornalista, radialista e pesquisador musical, já trabalhou em jornais impressos, rádio e televisão.

Lançou o primeiro programa local com videoclipes, o Revista 10, na TV Mirante em 1996. Atualmente ministra aulas de oratória no Senac-MA, professor de Comunicação, Consultor de Comunicação, Diretor do Teatro João do Vale, é produtor cultural e apresenta o programa Companhia da Música que está há 30 anos no ar pela Rádio Universidade FM. Adora pesquisar sobre músicas e bandas novas (de qualidade, claro!) no cenário musical.

- POR CAROLINA PRAZERES -

COMO COMEÇOU TUA CARREIRA NO RÁDIO? O primeiro a me dar oportunidade no microfone foi o Rubinho Jones. Eu era só um colaborador, levava os discos no dia de sábado pra Mirante e ele insistiu que eu devia falar porque eu entendia de Rock e abriu o microfone pra mim. Passei um ano tremendo na base.

NO COMPANHIA DA MÚSICA SÓ TOCA SE TIVER QUALIDADE. COMO COMEÇOU ESSE CONTROLE? É um conceito de vida. Desde as primeiras audições em família, com 8 anos e reafirmou na adolescência com uma turma focada em música com discurso e confirmou como programador da Mirante FM. Veio muito de família, a gente acaba criando um gosto musical inicialmente obrigado. Minhas irmãs mais velhas ouviam jovem guarda, Chico Buarque. Meu pai ouvia grandes cantores de sua época e na adolescência entrou rock de qualidade, de contracultura, movimento hippie, ou seja, música com discurso. Na adolescência também descobri Vandré, Itamar Assumpção, Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal e quase enlouqueci com aqueles sons.

E COMO TU ESCOLHE O QUE VAI TOCAR OU NÃO? Esse critério é automático e mesmo a chamada “nova safra” passa pelo crivo. Desde sempre coloquei meu molho e meu estilo sempre foi próprio, observando a dinâmica da cultura.

Sempre disse, música ruim não toco, nem chinesa, nem americana nem maranhense. A gente tem obrigação de tocar música boa. O artista tem que ter a responsabilidade de fazer a função social da música. Aí eu toco.

E AS VINHETAS DO PROGRAMA? COMO FORAM CRIADAS? Eu sempre achei que o humor é o melhor condutor de marketing de uma ideia. Daí vieram as ideias de brincar nas vinhetas. Essa coisa ridícula da gente mesmo não gostar de se criticar eu acabei trazendo para as vinhetas. Tem a história do debilóide que gosta de axé, que tinha o cérebro de gelatina e só ouvia axé, aí começou a ouvir o Companhia da Música cresceu e aprendeu a falar ‘papai e mamãe’.

O QUE MUDOU NO RÁDIO E NA MÚSICA DE QUANDO TU COMEÇASTE (COMPARANDO COM HOJE)?

Mudou muito o mercado, que já foi ditado pelo rádio que era parâmetro de música de qualidade. Hoje com as redes tudo passa, pois a porteira alargou. A música de qualidade está segmentada e esse contexto é cada dia mais difícil de se achar, pois a galerinha quer resposta fáceis e dinheiro rápido.

NA TUA OPINIÃO, QUAL A IMPORTÂNCIA DA MÚSICA NO CENÁRIO SOCIAL E POLÍTICO DA SOCIEDADE? A música tem o papel fundamental enquanto transmissão de ideias. Na época da ditadura por exemplo, se algo fosse considerado subversivo, aquela artista, aquela arte era cerceada.

Se levar em consideração, as músicas quando lançadas, sempre levará um pouco do contexto do que o artista está passando, a inspiração do que o artista já viveu acaba indo parar na arte. E assim acaba atingindo a massa. A arte tem o papel de mostrar o sentimento, a ideia, tem por obrigação mexer com nossa consciência, nossa capacidade de julgamento. É um dos objetivos da arte, é o de criar um senso crítico em quem a admira.

QUAL A IMPORTÂNCIA DOS FESTIVAIS MUSICAIS NO CENÁRIO ATUAL DA MÚSICA MARANHENSE? O maior ganho com certeza é a valorização da música, principalmente a local. O festival reúne uma galera bacana e é sempre importante abrir espaço para os novos talentos.

VAMOS FALAR AGORA UM POUCO SOBRE O NOVO. AS NOVAS BANDAS E ARTISTAS QUE TÊM DESPONTADO NO CENÁRIO MUSICAL MARANHENSE. O QUE TU ACHAS DESSA GALERA QUE TEM SURGINDO COM DIVERSOS RITMOS, SEJA NO POP NO DANCE, NO REGGAE. FALA SOBRE A QUALIDADE, APONTA GENTE NOVA QUE TU ACREDITES QUE TENHA QUALIDADE E CUIDADO NO SEU TRABALHO. Primeiro eu sou contra essa história de nova cena. Não gosto dessa divisão de águas. É como se a música maranhense, a música brasileira feita no Maranhão, se estabelecesse, só existisse a partir de agora, então virou uma chocadeira elétrica produzindo e nasceu a música brasileira maranhense a partir de agora! Tudo de uma vez só! Sem o diálogo adequado com os nomes que sempre quebraram brita para construir estradas pavimentadas no período mais difícil: Beto Pereira, Josias, Chico Maranhão, o próprio Carlinhos Veloz, Mano Borges, devo estar esquecendo de alguns nomes, mas deixando de lado a nomenclatura, eu vejo a música de uma geração bem mais nova, com bastante entusiasmo. Principalmente pela sonoridade que é mais cosmopolita, que era uma reivindicação que sempre fazia na nossa música pop maranhense. Eu gosto muito do som do Vinaa, por causa do discurso, com um texto bem contundente em cima do que ele defende. O Beto Ehonque é invencível, o grande alquimista sonoro e musical. Não escondo de ninguém que gosto do artista que tem respeito pelo social, a música em si precisa ter uma função social. Tem também o Maci que também vem fazendo um bom som. Não deixar de citar os Ornitorrincos do Sertão Turu foram ao Time Rock e eu gostei muito. Tem também os Faróis Vermelhos, que deram uma sumida.

MAGNO SOARES (ESQ.) E GILBERTO MINEIRO (DIR.) NO SALADA MISTA

UM CONSELHO PARA A GALERA QUE ESTÁ ENTRANDO NO MERCADO AGORA. A comunicação abriu muitos mercados e é no mundo virtual que o trabalho está e os melhores salários. Vale a pena investir.

“QUERO DEIXAR BEM CLARO QUE SINTO FALTA DESSE “APPROUCH” DAS GERAÇÕES SE ENCONTRANDO. VEJO QUE TEM UMA GERAÇÃO BEM ANTERIOR A ATUAL QUE SEMPRE ESCREVEU POESIAS MARCANTES, ESSA FALTA DE PROXIMIDADE, FALTA ROLAR ESSE ENCONTRO. SEJA PELOS FESTIVAIS, PELAS INICIATIVAS INDIVIDUAIS, ATRAVÉS DE SHOWS, TEM QUE CHAMAR A GALERA QUE JÁ ESTÁ HÁ MAIS TEMPO NA ESTRADA PARA COMPOR ESSE DIÁLOGO, ESSA FORMATAÇÃO DE MOVIMENTO. É ISSO.” - GILBERTO MINEIRO -

Paixão de muitos admiradores do teatro e também da música, os musicais estão ganhando espaço no Brasil. Seja por remontagens de obras da Broadway, adaptação de filmes ou produções locais, o musical hoje se insere cada vez mais no cotidiano,não apenas do brasileiro, mas também do maranhense.

Inúmeras são as academias, casas de arte ou grupos independentes que produzem esse tipo de montagem.

Movendo grupos de vários artistas, esses profissionais trabalham por meses, abdicando de horas e horas do seu dia a dia pelos ensaios.

Guilherme Chung, 21, é um deles.

Em alguns momentos, fica difícil até de respirar, mas o impacto proporcionado pela arte é percebido internamente.

“Por trabalhar com teatro musical, acabo buscando notar detalhes nas pessoas. A forma como andam, pegam um copo, como se sentam, coisas que geralmente passariam despercebidas, uma vez que tudo

MAMMA MIA! - POR PAULA CERES -

pode ser utilizado para compor

palavra de ordem para eles. Sobre

um personagem. Já teve casos

a estrutura que dá suporte para

em que eu usei características de

todo esse elenco? Eis a equipe de

colegas da faculdade para compor

especialistas do backstage: Josué da

um figurante, em Mamma Mia, por

Luz, ator e diretor, Rebeca Carneiro,

exemplo.”

dançarina e coreógrafa e Paulo Cardoso, cantor.

Chung faz parte do elenco de uma das maiores “escolas” de musicais

Em 2017, 26 atores se juntaram

da capital maranhense. Foi a partir

por meses ensaiando o que seria

dela que ele participou de Mamma

apresentado apenas em fevereiro

Mia, uma adaptação do jukebox de

do ano seguinte.

Catherine Johnson de 1999.

Ensaios encaixados nos horários Fazem parte do grupo Vertu Casa de

livres (ou nem tão livres assim),

Arte inúmeros atores, dançarinos,

análises de personagens, figurinos

cantores, etc. A lista é longa. Fazer

e cenários inovadores, tudo isso

de tudo um pouco parece ser a

com objetivo de chegar à perfeição

da produção e, claro, tomando

“É difícil conseguir apoio financeiro

como

de

em tempo hábil e não é incomum

formação de personagens, focados

adiarmos apresentações por falta

em transformar a pessoa da obra

de apoio. Além disso, locais e

histórica em algo pessoal, tanto do

horários de ensaio costumam ser

ator quanto do próprio público que

limitantes, principalmente quando

assiste, no caso, nós maranhenses.

estamos próximos da estreia e

Um enriquecimento a mais para a

precisamos ensaiar várias vezes

arte regional.

com figurino/cenário, ou pelo menos

alicerce

o

processo

algo próximo, isso sem contar com Porém,

o

Vertu

trabalha

com

o cansaço. ”

independência, em outras palavras, isso significa que a “escola”

é

Mas, sim, vieram os refrescos.

responsável por arcar com todos

Mamma Mia, foi um sucesso de

os

público, lotando o maior teatro

sem

custos

de

suas

interferência

patrocinadores.

produções, alguma

de

de São Luís, em 2018, por três temporadas de duas apresentações

cada, sendo uma delas na abertura

como Mamma Mia. O crescimento

da Semana do Teatro, em novembro.

do

A Vertu foi a pioneira nesse tipo de

notável pela quantidade de cursos

trabalho no Maranhão - palavras

da área que foram abertas no final

do diretor -, tendo como principal

do ano passado/início desse ano. ”

trabalho o próprio Mamma Mia.

(Guilherme Chung)

“O que eu percebi ao longo do tempo que isso foi crescendo, e que nós temos um público, e um público grande, para o teatro musical. Então, essa é a melhor resposta. Como eu valido isso? Pela frequência do público, pelas casas lotadas, pelo valor do ingresso que não era um valor muito barato, pelo número de pessoas envolvidas sem nenhum patrocínio. [...] o espetáculo se auto sustentou, então isso pra mim é o reconhecimento e perceber que a gente deixou frutos. ” (Josué da Luz) “Vejo que o teatro musical está abrindo novas oportunidades e experiências para o público. Além disso, é uma área em crescimento, 4 anos atrás não era comum termos peças musicais com o público em peso,

entretanto,

ano

passado

pudemos notar o sucesso de peças

teatro

musical

também

é

CULTURA E POLÍTI 35 ANOS D - POR NÁDIA BARROS -

F

undado em 19 de setembro de 1979, o Centro de Cultura Negra do Maranhão - CCN é uma entidade que desenvolve ações e projetos sociais objetivando a promoção do diálogo e construção da identidade negra diante do cenário cultural, religioso, político e educacional maranhense.

Com sede no bairro do Barés, localizado na zona periférica de São Luís, suas atividades não possuem fins lucrativos e são geralmente associadas a instituições e órgãos formuladores de políticas públicas para garantia de direitos e visibilidade das condições de vida das crianças e adolescentes do estado,

como o Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).

Através de oficinas, cursos e programas sociais, auxilia a formação identitária do jovem negro, promovendo o resgate de suas origens, o reconhecimento de seu papel dentro da sociedade e seu orgulho na luta contra as formas de intolerância motivadas pelo racismo.

Dentro de suas práticas, o bloco afro Akomabu é um dos destaques no combate à desigualdade racial por meio da atuação cultural. Há 35 anos, sua mensagem é transmitida para foliões durante o período de Carnaval.

INSPIRAÇÃO PARA CRIAR O processo de criação do Akomabu começou a 1575km de distância de São Luís: na cidade de Salvador. Em uma viagem à capital baiana, integrantes e fundadores do CCN tiveram contato com o Ilê Aiyê, primeiro bloco afro do Brasil. O interesse foi inevitável, já que seus desfiles carregavam, além da folia, a energia da beleza negra e uma proposta política e social de narrar a história do povo africano.

Tadeu Obatalá – cantor, compositor e um dos mais importantes integrantes do Akomabu – explica como a história continuou de volta às terras ludovicenses: “Aqui, as

pessoas já se encontravam para sair na ala de alguma escola de samba. Em 79, já tinha surgido o Centro de Cultura Negra e estava tudo muito novo. Então, por que não ficar todo mundo junto no Carnaval para não se dispersar? ”, questiona Tadeu.

A partir daí, em 1984, o bloco saía às ruas pela primeira vez tocando pouquíssimos instrumentos – dois atabaques emprestados, dois agogôs e duas cabaças –, com 45 integrantes enrolados apenas em lençóis, mas com um vigor inquestionável: o bloco se tornava um sucesso.

Foto: Jorrimar Carvalho

ICA ENTRELAÇADAS: DE AKOMABU

“A CULTURA NÃO DEVE MORRER” Sintonizando ritmo, folia e religiosidade, atraía atenção por onde passava. Exaltando a raiz negra, as canções inicialmente eram de blocos afro da Bahia e de terreiros de mina do Maranhão, depois os integrantes começaram a compor as próprias músicas.

No ano seguinte ao seu surgimento, o bloco ainda não tinha nome. Foi então que um professor africano sugeriu a expressão “Akomabu” que, em iorubá, significa “a cultura não deve morrer”.

Com nome e missão determinados, o Akomabu incorporou-se ao Carnaval, levando história, cantando o povo negro nas ruas e avenidas da capital e suscitando o debate político, social e cultural durante o ano inteiro.

A ORGANIZAÇÃO, AS ROUPAS E O SOM Para montagem da agenda e organização das apresentações, todos os anos acontecem seminários de avaliação através dos quais são escolhidos os temas que serão abordados pelo bloco nos anos seguintes. Após a escolha da temática, a coordenação entra em contato com representantes do Governo do Estado e Município, além de outras instituições, como o Sesc, para discutir a oferta de apresentações durante o período carnavalesco.

Fora deste período, Tadeu explica: “A gente faz apresentações em seminários, feiras e outras coisas. Às vezes, levamos a proposta; às vezes, chegam ao bloco. Assim montamos a agenda, não tem uma coisa mais sistemática. É a partir da demanda mesmo”, reforça o compositor.

Se o planejamento da agenda é indefinido, a confecção das vestimentas e instrumentos, por outro lado, é bastante delineada. Isto porque, após a escolha do tema, profissionais vinculados ao CCN desenvolvem as artes que, sob votação, são utilizadas no pano das roupas. “Esse pano é confeccionado em Fortaleza onde, inclusive, são feitos também os [panos] do Ilê, Muzenza, Olodum e outros blocos”, comenta Tadeu Obatalá. A estudante Kelly Pereira, instrumentista do bloco, completa: “Tem uma senhora, Dona Flor, que costura pro bloco há muitos anos. Todo mundo leva a roupa lá e ela entrega no dia”, finaliza a tocadora de agogô e cabaça.

Foto: Jorrimar Carvalho

Os instrumentos são geralmente comprados em São Luís, com exceção dos atabaques, que são confeccionados por meio de oficinas realizadas no próprio CCN. Em um período próximo do Carnaval, os integrantes verificam se algum precisa de reparos.

AKOMABU É IDENTIDADE “Eu sou compositor. Quando eu falo na minha música: ‘Treze de maio a nação nagô não faz festa não, não faz festa não.

Quem protesta o dia diz que o libertou, o marginalizou jogou a outra escravidão. Eu não vou festejar redentora que a história diz por aí. Redentora pra mim foi Luiza Mahin, Nelson Mandela, Negro Cosmo e meu grande Zumbi...’. Eu estou negando o falso treze de maio. Quando eu digo que ‘toda nação nagô vai festejar a ideia de libertação levada pelos ares. Zumbi não morreu e nem acabou o Quilombo dos Palmares’, eu estou dizendo que todos os dias são dias de luta e que todos os dias estamos construindo um novo quilombo”.

A fala de Tadeu Obatalá reitera a contribuição do Centro de Cultura Negra e do bloco Akomabu para a construção de personalidades que

reconhecem a si próprias e reconhecem sua história.

A voz de um povo escravizado, marginalizado, estigmatizado ecoa através da cultura e da música. Crianças, jovens e adultos negros desenvolvem um olhar crítico e artístico diante daquilo que lhes é nocivo para, através deste olhar, reivindicarem seu espaço, o respeito à diversidade e a garantia de direitos.

“Eu me redescobri”, afirma Kelly. “Eles explicaram sobre como a gente era, como deveríamos nos posicionar e como algumas pessoas viam na gente o fato de estar errado. Errado por ser negro. Lá, eu fui buscando alicerce e informações que eu até tinha, mas que eram rasas. Eu fui aprofundando, pesquisando, entendendo. Fui aceitando. Eu sinto que faço parte desse movimento”, enfatiza a estudante.

35 ANOS DE BLOCO E UM LEGADO À CULTURA MARANHENSE O Akomabu, que foi pioneiro no surgimento dos blocos afro maranhenses, completa 35 anos em 2019. Hoje, existem 12 blocos só na grande São Luís. Todos possuem o mesmo propósito de contar a história e os ideais do povo negro e das religiões de matriz africana, falar da violência contra a mulher, do extermínio da criança e jovens negros, das terras quilombolas, políticas de cotas e outros assuntos que circundam os debates para uma sociedade inclusiva.

As manifestações culturais de origem afro ganham visibilidade para que aceitação passe a ser um processo natural.

“Ao longo desses 35 anos, o Akomabu vem contribuindo para a conscientização do negro no Maranhão, mostrando para a sociedade maranhense que o negro pode e tem lugar na cultura. Mantem aquela mensagem para que nossas raízes não morram; mantem viva a tradição que, muitas vezes, por ser de matriz africana, as pessoas desprezam. Mas sim, é uma cultura bonita de se ver e sentir”, conclui Kelly.

PERCUSSÃO, RESISTÊNCIA E CULTURA POPULAR: BANDA AFRÔS PREPARA NOVO ÁLBUM - POR WANDERSON MOTA Cultura popular e empoderamento feminino regido ao som de tambores é a mistura ousada de uma banda maranhense formada por mulheres. Para a Afrôs não basta só fazer música boa, tem que fazer música boa e, de quebra, promover engajamento social. Este recado já foi dado no primeiro registro fonográfico da banda, o EP Afrôs de 2015. O grupo trabalha agora em um novo álbum que tem previsão de lançamento para o primeiro semestre de 2020, e segue a linha de exaltação a feminilidade e defesa das causas sociais.

Conhecida na cena musical maranhense, a banda começou a dar seus primeiros passos em 2007. A proposta inicial não era bem formar uma banda no sentido mais restrito da palavra. Ao final daquele ano, a integrante Chris Campos tinha retornado do Rio de Janeiro inspirada pelo “Mulheres de Chico”, um bloco carnavalesco que reunia mulheres ao som das canções composições do músico brasileiro. Ela resolveu convocar mulheres para uma iniciativa baseada na ideia do bloco carioca.

“Só que a essa turma que veio não foi uma turma suficiente para montar um bloco, não eram sessenta mulheres, como é o Mulheres de Chico no Rio de Janeiro, mas um grupo foi se firmando. Um grupo de quinze mulheres” relata Fernanda Preta, vocalista e percussionista do grupo.

Elas não eram musicistas, mas isso não representava nem de longe um problema. Uma das propostas nesse primeiro momento, segundo Fernanda, era que o grupo servisse para experiência de desco-

berta musical daquelas mulheres. O início é marcado por estudos do cancioneiro popular maranhense, que marca profundamente sonoridade da banda, assim c omo o popular nordestino no geral. Posteriormente, outras influências contemporâneas como o rock foram incorporadas ao perfil musical do grupo.

Entre estudos e descobertas, surgiu convite para um show.

Espontaneamente aceito e realizado.

O contato Atual formação da ba com o palco e o público foi determinante para que o grupo decidisse formar de fato uma banda.

Nesse momento surge a figura de Erivaldo Gomes, artista maranhense, que encantado pela ideia da banda, se torna o primeiro mestre delas. A partir disso, a banda começa a ganhar contornos mais sérios e profissionais. Shows em eventos oficiais, por exemplo, vão se tornam mais frequentes, atraindo reconhecimento para a banda que, a princípio de chamava Afrodites, que fazia evocação a ideia da fe-

minilidade. O nome acompanhou a banda por dois anos até descobrirem que ele já batizava um grupo de forró eletrônico.

O neologismo Afrôs passou a intitular a banda fazendo referência ao nome usado inicialmente e também a influencia da música afro-brasileira. Internamente o nome já era usado pelos amigos mais próximos para se referir carinhosamente ao grupo.

Em 2013, a banda inicia carreira fora do estado com show na Feira da Música em Fortaleza, no Ceará integrando o projeto Caravana BR-135.

No ano seguinte, a banda vence uma seleção do SESC com artistas da Amazônia Legal. Pelo projeto, fez uma turnê nacional em dez estados com o espetáculo intitulado Inoromô pelo SESC Amazônia de Artes, anda. Foto: culminando com a gravação do EP Afrôs. Foi nessa época que o grupo, diante da necessidade de um integrante que tocasse violão, abriu as portas para o sexo oposto. Atualmente a banda conta com dois homens na formação.

Mesmo assim, segundo Fernanda Preta, no começo havia certa resistência por parte do público, e até mesmo um preconceito, pelo fato do grupo ser formada majoritariamente por mulheres tocando instrumentos de percussão, já que o espaço é convencionalmente dominado pelo sexo masculino. Resistência supe-

rada também com resistência. O tempo foi conferindo maturidade e visibilidade, afastando a concepção frágil atribuída pelo senso comum ao gênero e tornando a ideia cada vez mais robusta à medida que conquistam o próprio espaço.

Há dois anos a banda trabalha em composições para o novo álbum que vai falar sobre os mais diversos arquétipos femininos nas civilizações ao longo da história. As inspirações para isso passeiam pela cultura egípcia até o quilombo Santa Rosa dos Pretos, no município de Itapecuru-Mirim, interior do estado, no qual uma faixa do álbum homenageará Anacleta, uma líder quilombola da localidade.

O novo disco recebeu o nome “AJÉ”, que em Iorubá, idioma africano, significa feiticeira, e que expressa muito da proposta sobre liberdade, engajamento social e militância.

“A gente entende essa mulher que está descobrindo o sagrado feminino, que está descobrindo o seu interior, aquilo que é importante para ela. A gente fala de um feminismo aguerrido nesse momento, por que a gente sabe que mulheres estão morrendo” afirma Fernanda Preta.

A produção do disco é dividida entre o próprio grupo e o músico paulista Marquinho Mendonça, renomado diretor musical de programas da TV Cultura. O álbum está em fase de estúdio, gravado no Deu Na Telha Audiolab, em São Luís, mas será finalizado em São Paulo. O objetivo da banda é lançar o CD no cenário nacional no primeiro semestre de 2020.

A banda é formada por Cris Campos, Fernanda Preta, Hugo César, Jânia Lindoso, Melannie Carolina, Rebeca Alexandre, Thierry Castelo e Tieta Macau, performer que acompanha os shows com intervenções artísticas.

DESVENDANDO O MUNDO DA MÚSICA ALTERNATIVA - POR ORLANDO EZON -

M

Apesar de não haver uma coesão

engloba uma gama de significados.

dentro do alternativo se constituem

úsica alternativa é um termo que

Era comumente atribuído a grupos musicais que apareciam na cena underground

de

cidades

como

Seattle, nos EUA, ou em Crawley, na Inglaterra, em meados dos anos 1980.

Fortemente

influenciados

pelo punk e pós-punk dos anos 70, eram grupos que buscavam uma estética que os afastassem da imagem mainstream, daquilo que era popular na época e que não alcançavam grande visibilidade.

Com o álbum Nevermind (1991), o Nirvana surge como uma das bandas mais conhecidas no mundo e com ela, o rock alternativo deixa o underground e se populariza.

Nos dias de hoje, este conceito é usado para identificar diversos tipos de música e grupos, que vão desde o primeiro LP do The Velvet Underground (1960) até o último álbum do Arctic Monkeys (2019), passando por subgêneros como o shoegaze, indie, grunge, britpop, etc.

sonora entre as bandas que caem geralmente

como

grupos

que

buscam diferenciar-se pelo som que fazem e pela estética que tomam para si. Não se trata de um gênero específico, de uma fórmula a ser seguida. O mais importante é celebrar as múltiplas formas e expressões artísticas que o termo permite. Isso não é diferente para a música autoral feita em São Luís. É só frequentar alguma casa de show no centro histórico para ver que as bandas que por lá tocam possuem sons umas

completamente das

outras,

diferentes mas

estão

ali ocupando o mesmo espaço, dividindo os mesmos aparelhos de som e tocando para as mesmas pessoas.

Vamos mostrar um pouco dessa diversidade da música alternativa ludovicense,

apresentando

três

bandas, cada uma com seu estilo próprio, além de apresentar um pouco dos seus trabalhos mais recentes.

ORNITORRINCO DO SERTÃO: VANGUARDA MARANHENSE? Lembro-me de ter assistido a um show da Ornitorrincos do Sertão Turu e Orquestra pela primeira vez em 2015, na casa de um amigo músico,

que

havia

convocado

algumas bandas locais para o festejo do seu aniversário. Na época, não conhecia o som da banda, e falava pouco com seus integrantes, com exceção de uma das guitarristas da época, que estudou comigo. A festa foi feita no estilo palco livre. Alguns aproveitavam para mostrar suas próprias músicas. Outros faziam

em acompanhar o som autoral

covers, que iam desde Talking

produzido na ilha.

Heads até Papete.

Nos últimos quatro anos, a banda Por último, a Ornitorrincos entrou

passou por várias mudanças. Hoje,

na roda. Na época um conjunto de

com menos integrantes e menos

9 integrantes, o grupo abriu com

palavras no nome, a ‘Ornitorrincos

uma homenagem ao Cacuriá da

do Sertão’ se difere muito do que

Dona Teté, com uma interpretação

costumava ser em seus primeiros

estranhíssima de ‘Choro da lerá’,

anos. Semelhantemente ao seu xará

seguida pela versão avassaladora

no reino animal, a ‘Ornitorrincos’ é

de ‘A Praieira’, de Chico Science. De

um cruzamento de vários elementos

cara aquele som bizarro oriundo

estranhos, fruto de sua trajetória

daquelas 7 pessoas me cativou e

evolutiva

desde então tenho me interessado

Marques, baixista presente desde

peculiar.

Fernando

a formação original da banda, nos

E QUANTO SÃO AGORA ?

conta um pouco sobre a origem

Na época dos primeiros ensaios a

da banda, relembra alguns de seus

banda tinha 5 integrantes, os 4 lá

shows e comenta sobre trabalho

de cima e eu, mas a banda já teve

mais recente deles, o EP AFRPNK,

até 9 integrantes em 2015. Hoje os

lançado no final do ano passado.

membros fixos são 3, eu, Fernando Marques, a Joyce Veceli e o Fernando

QUANDO E COMO A ORNITORRINCOS

Moreira.

COMEÇOU? A ornitorrincos começou em 2013

QUAL FOI O MAIOR SHOW QUE A

com

Nascimento,

BANDA JÁ FEZ?

Caio Mattos, Letícia e Barbara

Definitivamente

Botega se reunindo de maneira

ano passado. Tocamos na Nauro

despretensiosa pra tocar e compor.

Machado e foi uma experiência

Posteriormente outros integrantes

ímpar, ao menos pra mim.

foram chamados. Na época, o nome

QUAL É O GÊNERO MUSICAL DA

da banda era Ornitorrincos do

BANDA?

Sertão Turu Orquestra.

No decorrer dos anos isso foi

Caetano

do

o

BR

135

no

sofrendo algumas mudanças. No POR QUE O NOME ORNITORRINCOS

início tinha um quê de psicodelia

DO SERTÃO?

nordestina, muita influência do

Ele surgiu como uma piada interna

início da carreira do Alceu Valença

e eventualmente virou o nome

e uma galera de PE da época dele.

de fato. Tá relacionado com uma

Depois de uma reformulação em

premissa da banda, que hoje tem

2016 a banda voltou com um pé no

um esmero e uma maturidade

progressivo, a gente se espelhava

maiores, de unir a música brasileira

bastante no Mars Volta e em

com nossas influências gringas.

algumas coisas do King Crimson.

Do ano passado pra cá a gente

QUANTOS MEMBROS ERAM NO COMEÇO

teve muita influência da vanguarda

paulista, principalmente do Arrigo

de

reformulação.

No

momento

Barnabé e de nomes mais recentes

estamos conjecturando a formação

como o MetáMetá e a Quartabê,

para os shows, fechando novas

além de jazz e ritmos brasileiros em

composições e pensando em como

geral, que é o caminho que vamos

lançá-las. A ideia é começar com

seguir.

apresentações ainda no primeiro semestre e soltar algo novo no

SOBRE O EP “AFR PNK”: POR QUE

segundo.

ESSE NOME ?

O nome foi uma sugestão do

DESDEMONA ETC

baterista, Fernando Moreira. Tá

A ‘Desdemona Etc’ é uma banda

ligado ao estudo dele de ritmos

natural de São Luís, formada em

africanos e a aplicação disso no

meados de 2016. Seu nome foi

EP, além de ser uma forma que ele

tirado

encontrou de reagir à, na época,

Otelo, O Mouro de Veneza - nesse

campanha presidencial do atual

caso, Desdêmona é a pretendente

“gestor”.

de Otelo, falsamente acusada de

da

peça

Shakespeariana

traição e morta por seu amante. O INFLUÊNCIAS

grupo surgiu a partir da união de

MUSICAIS PRESENTES NO ÁLBUM?

compositores que frequentavam a

Ele ainda tem um eco do progressivo,

mesma escola de música (Galeria

especialmente

Senhora,

44) e possui um repertório autoral

mas Guerreiro e Lânguida são

que tem influências que vão desde

resultado da nossa interpretação

Mutantes a Reginaldo Rossi.

da vanguarda paulista e do jazz

Os integrantes da banda são os

contemporâneo.

músicos

QUAIS

SÃO

AS

em

Hugo

“Hurak”

Rangel

(guitarra e voz) - estudante de DEPOIS DE AFRPNK, QUAIS SÃO

Comunicação Social na UFMA e do

OS PLANOS PRA BANDA?

curso técnico na Escola de Música

A gente tá em outro processo

do Estado do Maranhão – Lilah

Lisboa de Araújo, Lucas Kruk (baixo

Seu EP de estreia “ETC”, lançado

e voz) – estudante de Administração

em Janeiro de 2017 foi responsável

na FAE-PR; Orlando Ezon “Ro

pela introdução e acolhimento da

Lando” (guitarra e voz) – estudante

cena local. Com composições em

de Comunicação Social na UFMA,

português e letras contundentes,

Samuel Dreher (bateria e voz) –

a banda se comunica através da

estudante de Arquitetura na UEMA

música para falar sobre temas do

e Fernando Marques (Baixista) –

cotidiano, como relacionamentos,

estudante de Psicologia na UFMA

resiliência e tentações.

e do curso técnico na Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo.

A CAPA

por linhas finas sobre um fundo

Às vésperas do lançamento do

branco,

primeiro trabalho, a banda ainda não

Acima, o nome “DESDEMONA”,

tinha uma ideia clara para a capa do

que perde seu acento originário

álbum. Logo, um designer e amigo

da grafia portuguesa, a fim de

de longa data do baixista Lucas Kruk,

representar a universalidade. A

Thiago “DDA” Serra, foi contratado

sigla “ETC”, posicionada no canto

para fazer a arte do material. Como

inferior

a banda ainda não tinha uma ideia

quadrado, representa a pluralidade

clara do que almejava, Thiago teve

do álbum. Por fim, ao canto inferior

toda liberdade para produzir a arte,

direito, as linhas que formam o

tendo como referência as faixas que

quadrado se distorcem, criando

compunham o álbum.

formas geométricas preenchidas

O designer optou por um traço

por cores, representando o caos

simplista,

de

em meio a ordem, o que encaixou

simbolismo: um quadrado formado

perfeitamente com a proposta da

porém

repleta

seguindo

esquerdo,

um

padrão.

dentro

do

banda e a ideia de origem para a

com o uso de guitarras distorcidas,

identidade visual.

um baixo marcante de Kruk e os arranjos guitarra de Hugo Hurak a

AS FAIXAS

transformaram em uma música de

Sendo o primeiro da banda, o álbum

pegada mais pop, mas que ainda

“ETC” é composto por composições

assim mantém sua essência.

individuais

de

cada

integrante.

Tendo isso em mente era de se

HOMENS AO MAR - 06:37

esperar que as músicas fossem

Faixa de coautoria de Ro Lando e

destoantes entre si, no entanto,

Hurak, esta foi a primeira música

isso não ocorre. As músicas, mesmo

a ser trabalhada em conjunto

distante

pela

em

estilo,

conversam

banda.

Frustrado

pela

muito bem entre elas. Isso se

superficialidade do mundo, um

deve,

capacidade

personagem em busca de algo que

dos integrantes de abstrair as

foge aos olhares desatentos, perde-

influências uns dos outros, de forma

se em sua busca e percebe que não

que a presença de cada um torna-

há nada a fazer a não ser “deixar-

se perceptível nas faixas.

se levar”. O uso de modulações na

sobretudo,

a

guitarra de Hurak, belas melodias e SEGUE FUMAÇA - 03:53

camadas vocais de Samuel Dreher

A música escolhida para abrir o

dão à música a maior textura da

álbum, ‘Segue fumaça’, composta

banda.

por Ro Lando muitos anos antes de formar a banda, foi inspirada

CINÉREO - 05: 35

por um grande amigo de infância,

Essa

narrando

participações

uma

os

pessoa

reservada,

pensamentos

de

extremamente

de

uma

Lucas

das Kruk

como compositor. ‘Cinéreo’ traz um tom mais amargo que as

futuro.

músicas anteriores: um romance

Originalmente, um blues bebop,

maldito, desgastado, o desejo não

perspectivas

de

e

engloba

sem

muitas

introvertida

faixa

correspondido, um homem que se

VERMELHO - 06:13

perde por uma mulher.

Fechando

o

álbum,

outra

composição de Lucas Kruk. Feita Kruk

mostra

suas

capacidades

para sua banda anterior chamada

como letrista, com belos versos e

“Verônica e suas bonecas de pano”,

um refrão contagiante. É também

a canção Vermelho traz influências

nesta faixa que o entrosamento

do brega brasileiro, como um culto

e as influências de cada um se

à figura de uma mulher “diabólica”,

tornam perceptíveis: o lado math

dotada de sensualidade, brincando

rock de Hurak é apresentado com

com os sentimentos de um rapaz a

quebras de tempo, a bateria vívida

ela sempre submisso. Novamente,

de Dreher e os vocais combinados

a música apresenta um refrão forte,

de Kruk e Ro fazem dessa uma das

além da participação do guitarrista

melhores músicas da banda

Paulo Muniz, que gravou o solo para a faixa. A música finaliza de forma

UTOPIA - 03:54

intensa, algo que aproxima a banda

Faixa composta e cantada por

de um estilo semelhante ao stoner

Hugo Hurak, ‘Utopia’ se destaca

norte americano - gênero musical

das demais músicas por seu ritmo

que mescla elementos do doom

acelerado. A música narra uma

metal e do acid rock -, fechando o

experiência individual do guitarrista,

álbum com muita energia.

que diz ter conseguido observar o mundo sobre os olhos de uma

ALKALINES

outra pessoa. Aqui o personagem

O termo Lads é usado para endereçar

se maravilha ao ver um universo de

uma cultura surgida na Inglaterra no

cores nos olhos de alguém, mesmo

final dos anos 90, de jovens da classe

sabendo que tudo é uma ilusão

trabalhadora britânica, em cidades

inconclusiva, trazendo para o álbum

como

uma certo tom de psicodélica.

Os Lads (laddetes, no feminino)

Manchester

e

Sheffield.

tinham uma presença forte.

No

pós-expediente,

gostavam

de

Simões (baixo) ainda estavam na

frequentar os pubs da cidade, com

escola. Posteriormente juntaram-

seus cabelos cortados e barbas

se ao baterista-de-nós-todos, Luís

feitas (questão de praticidade),

Cruz (que já esteve es 65% de todas

vestindo camisas do time de futebol

as bandas da cidade) e inspirados

favorito. Tomando cervejas baratas,

pelo blues e o indie-rock que se

esses rapazes gostavam de escutar

popularizava na época, começaram

as bandas de rock locais, cujo som

a compor e tocar para os amigos.

era um retrato daquele estilo:

Em 2015 lançaram seu primeiro

simplório, grosseiro e visceral. Os

compacto,

‘Alkalines’ são uma espécie de Lads

and picks’. Cru e direto, o álbum

de São Luís - se não no visual, ao

abordava uma inspiração vinda

menos no som. Este grupo de bons

das bandas inglesas e americanas

moços se formou em 2013, quando

que surgiram nos anos 2000, como

Marcos Brito (guitarra) e Caio

Arctic Monkeys e The Strokes.

‘Amps,

drumsticks

Em 2017, lançam o álbum ‘The

abordados na letra: a conformidade

calm before the storm’, mostrando

de uma vida sem perturbações,

a busca da banda por um som

que, embora falsa, não é cruel, que

mais maduro, em musicalidade

nunca é suficiente. Uma felicidade

e produção. A entrada de André

distorcida que diminui a cada gole

Pires como segundo guitarrista,

e não importa o quanto se tente,

enriqueceu o arranjos da banda,

nunca será o mesmo.

que passa a almejar um som mais próximo ao stonner e ao psicodélico

O pessimismo ácido das letras

(perceptível na segunda faixa do

contrasta com a leveza que faz o

Ep, Thoughts). No mesmo ano de

charme do clipe. Produzido de forma

lançamento do álbum, a Alkalines

inteiramente independente, a parte

foi a única banda de São Luís a

visual do produto é recheado de

passar na primeira fase do EDP

objetos aleatórios - cabides, vasos,

LIVE BANDS, concurso responsável

uma vitrola antiga e a estátua de

por levar outra banda da Ilha - a

um sapo, a qual Marcos parece ser

Soulvenir - para o exterior.

bastante apegado - intercalando takes da banda realizando atividades

Os Alkalines chegam a 2019 com um

em reverse. Atenção redobrada

novo trabalho para mostrar. O clipe

para as vestimentas: icônico roupão

do single ‘VVV’. Há ali, um quê do

de Papai Noel trajado por Marcos na

“lad-ismo” que caracteriza a banda.

introdução e ao final do clipe, está

Na letra, Marcos aborda o tema do

cobrindo o baixista, Caio, quando

vício, em suas várias facetas, de

chega a metade. Tudo isso envolvido

uma forma peculiar, mas intrigante,

por um filtro de vídeo VHS, dando

quase como uma prosa suja (viciado

um tom retrô que remete ao clipe

à frente da minha porta / cabeça

de “Can’t leave the night”, do grupo

baixa, última gota de respeito,

canadense BadBadNotGood. Trata-

encarando o chão, vazio). Os pontos

se de um clipe que no mínimo, se

positivos dos vícios também são

destaca por ser bem executado.