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Artigo

DUAS FACES DA LÚXURIA: PROSTITUIÇÃO E ALCOVITAGEM NA BAIXA IDADE MÉDIA CASTELHANA Por Pâmela Viegas

RESUMO: Este artigo científico propõe o estudo da prostituição e da alcovitagem castelhana.Analisando a prostituição como prática marginal,porém não criminosa.Já a alcovitagem constituía um prática marginal e criminosa. Palavras Chaves: História, Idade Média, Prostituição, Alcovitagem

Introdução

O

presente trabalho tem por objetivo analisar a questão da prostituição e da alcovitagem na Baixa Idade Média em Castela.1 Contudo, im-

O termo “Idade Média” foi empregados pelo humanistas, a partir do século XIV. Os homens do Renascimento tinham a ideia que a Idade Média teria sido um período de escuridão. Intermediário entre a Antiguidade e a época em que viviam; época esta que teria renascido as artes, o culto das letras (LE GOFF, 2011, p.27). Os homens das luzes, do século XVIII irão intensificar essa “desvalorização” da Idade Média, pelo fator de que neste período reinava a ignorância religiosa e intelectual. Será Chateaubriand, Lessing, Victor Hugo e Balzac que deram uma reviravolta neste quadro, transformando a Idade das trevas na do Ouro. Le Goff diz que a Idade Média teria se estendido até o século XIX. O ensino e a pesquisa nos mostra que a Idade Média teria delimitado a construção do Império Romano, século V até o triunfo do humanismo, fim do século XV. Para ele isto é um monstro cronológico (LE GOFF, 2011, p.29). 1

porta ressaltar que a temática da prostituição e da alcovitagem neste período, nem sempre foi palco de interesse dos historiadores. Tal abordagem começou a ser mais largamente discutida a partir dos anos 60/70, quando a 3° geração da Escola dos Annales interessou-se por pesquisar os grupos/indivíduos que eram representados como marginais na sociedade medieval. Desde então muitos estudos dedicaram-se a tal temática. A prostituição nunca foi constituída um crime, embora sendo vista como algo impuro pela sociedade, era considerada algo necessário. Pois poderia proteger as “boas moças” da

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GNARUS - 33 violência masculina. Visto que estes poderiam procurar prostitutas para que satisfizessem suas necessidades sexuais; testando o homem assim, sua virilidade, antes de constituir matrimônio.

financiados com dinheiro do governo. Era dado a uma abbesse ou um administrador, que recrutavam e colocavam ordem nos prostibulum. Caso este(a) falecesse, o governo se incumbia de administrar a casa.

Neste artigo iremos analisar primeiramente a prostituição em âmbito geral, visto que esta se deu de forma “parecida” em toda a Europa Ocidental, mas neste estudo o foco será a região de Castela, sob o governo de Afonso X e, mais tarde, em finais do período medieval.

Os bordéis não eram uma casa fechada, as prostitutas que moravam nas ruas, que eram consideradas desonestas, podiam circular pelas tabernas ou em outros lugares, porém deveriam levar seus clientes aos bordéis, local em que eles festejavam e depois iam para os quartos.

A fim de realizar tal tarefa, utilizou-se como fontes primárias os documentos normativos de Afonso X, As Siete Partidas e material literário: La Celestina, de Fernando Rojas como forma de verificar através de diferentes olhares a realidade da prostituição e da alcovitagem castelhana.

Além dos bordéis públicos, havia as casas de banho. Muito embora fosse proibida a presença de prostitutas, estas iam para fins profissionais. Existiam regulamentos que estabeleciam dias e horas para mulheres e homens reservadamente frequentassem as casas de banho. Havia diversas camareiras, embora houvesse as salas de maquinas e cubas, os quartos eram numerosos, com camas suntuosas. Assim, as casas de banho eram lugares de prostituição, por servirem de locais de encontros e alcovitagem.

A prostituição na Idade Média Buscou-se analisar aqui a prostituição a partir das teorias, principalmente, de dois historiadores: Jacques Rossiaud (1991), com sua pesquisa sobre a França e Jeffrey Richards (1993), a partir de sua experiência de Europa Ocidental. Ambos os pesquisadores, apresentam uma discussão muito parecida, mostrando que a prostituição se deu em toda a Europa de forma equivalente. Rossiaud, (1991, p.20) observa que a prostituição se deu tanto nas cidades como no âmbito rural embora tenha sido na cidade que a Prostituição desabrochou. Lugar este de escolha da presente abordagem. A Prostituição em sua grande parte acontecia em prostibulum. Estes eram públicos,

Outro meio de prostituição eram pequenos bordéis privados, que eram dirigidos por uma alcoviteira. Estes bordéis eram na própria casa dessas intermediarias, lá elas tinham duas ou três mulheres que faziam a prostituição. Este será o objeto de análise deste estudo. E por último a prostituição por conta própria. Estas conseguiam seus clientes nas tabernas e nos mercados (ROUSSIAUD,1991). As mulheres entravam na prostituição por razões basicamente iguais, pobreza, perda de status, passado familiar perturbado, violência, incesto ou inclinação natural. A maioria dos clientes eram de jovens e não - casados. Nickie Roberts (1998, p.89-90) explica o

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GNARUS - 34 muitas prostitutas seguiram juntamente com os exércitos cristão para a Terra Santa, nas Cruzadas, afirmando que em 1189, soldados franceses se recusaram de partir viajem sem o navio de mulheres que haviam recrutado.

Iluminura medieval: Mulheres no inferno sistema feudal como sendo de advento da prostituição, muito embora o feudalismo fosse um sistema rural e este artigo discorra da prostituição urbana. Em meio ao sistema feudal, o servo que prestava serviços ao senhor poderia ter seu trabalho interrompido a qualquer momento, para servi-lo na ocasião de combates. Assim, estes teriam que migrar em busca de trabalho. Entre esses servos itinerantes, havia muitas mulheres, viúvas, filhas e esposas, que se submetiam à prostituição como meio de sobrevivência. Assim como os produtos eram vendidos em mercados rurais e feiras, a prostituição também. Algumas prostitutas serviam os peregrinos, viajantes pagadores de promessa, que precisavam de entretenimento. Havia também as prostitutas peregrinas, que vendiam sexo nas cidades onde passavam. Outras iam juntos com os exércitos e exerciam não somente a função de prostitutas, mas também de cozinheiras, enfermeiras e faxineiras. Estas eram consideradas essenciais e suas condições variavam de acordo com o soldado ao qual acompanhavam. Nickie Roberts (1998, p.92) afirma que

O governo determinava regras sanitárias, religiosas e de vestimentas. Na época de epidemias como a peste, os prostibulum eram fechados. Era proibido realizar eventos escandalosos na Semana Santa e no Natal. As prostitutas não deveriam vestir-se de forma luxuosa, para não incitar as “moças puras” e pobres a perdição. Contudo, essas determinações não eram obedecidas. Por isso, impôs-se o controle da prostituição através dos prostibulum público. Richards (1993, p.121), trata das zonas conhecidas como da Luz Vermelha. Ele diz da rua da Rosa, onde toda a cidade Medieval possuia uma. Eram nessas zonas onde ocorria a prostituição. A sociedade medieval aceitava que homens buscassem prostitutas para divertir-se. Era um meio dos jovens afirmassem sua masculinidade. Richards (1993, p.122) diz que a partir dos dezesseis/dezoito anos os jovens do sexo masculino podiam frequentar bordéis. Muito embora fosse proibido a entrada de judeus, leprosos, homens casados e clérigos nos bordéis, estes os frequentavam esporadicamente. De acordo com Jacques Rossiaud (apud RICHARDS,1993, p.123), 20% dos que frequentavam os bordéis privados e as casas de banho eram membros do clero. Embora a Igreja tolerasse em parte a prática da prostituição, alguns dos meios adotados com os leprosos eram usados com as prostitutas. Elas deveriam ser diferenciadas do res-

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GNARUS - 35 tante da população, através das vestimentas, bem como não viver nas cidades, devendo ser colocadas a parte, assim como os leprosos. Com o crescimento das cidades, a prostituição passa a ser vista como um fenômeno social, que precisava de regulamentação. A Igreja via a prostituição como um mal necessário, segundo Agostinho, pois a prostituição poderia manter os padrões sexuais e sociais estáveis. A Igreja estimulava a regeneração das prostitutas. Era oferecido a remissão dos pecados a quem se casasse com uma prostituta. Muitas casas religiosas foram criadas, para receber as prostitutas regeneradas. Os bordéis ainda assim, eram vistos como perigosos para a ordem pública. Em Londres foi constituído um toque de recolher, em 1393, proibindo que qualquer homem circulasse pela cidade depois das nove da noite, e que nenhum estrangeiro pudesse circular depois das oito da noite (podendo ser multado ou preso), ou ainda que ninguém poderia andar mascarado. As prostitutas ocupavam um lugar seme-

lhante aos judeus e leprosos. Os três deveriam usar uma roupa que os especificasse, eram segregados e todos os três poderiam arrepende-se e regenera-se. Eram igualmente tolerados, pois desempenhavam uma função necessária. No caso dos judeus e das prostitutas, os judeus praticavam a usura e as prostitutas o sexo. Ambos necessários, contudo, abomináveis. Ainda que tenha havido evidências que mostram que as prostitutas, tinham tido uma melhoria na posição legal, o historiador Otis (apud, RICHARDS, 1993 p.134), encontrou exemplos de prostitutas que foram levadas como testemunhas e até levando acusações aos tribunais. Algumas fizeram testamentos e se casaram, as penas se abrandaram a quem desrespeitasse os estatutos municipais. Nos séculos XIII, eram açoitadas e perdiam as roupas, nos séculos XIV e XV eram multadas. Rossiaud (apud.RICHARDS,1993 p.134) explica que essa mudança se dá por uma mudança de atitude em relação às prostitutas, sendo elas mais integradas à sociedade. As monarquias da Europa Ocidental interessaram-se em regulamentar a prostituição,

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GNARUS - 36 com o intuito de ter mais responsabilidades pelas vidas dos súditos. Eram criados bordéis para a satisfação sexual, mas que não ofendessem a decência pública e manutenção da ordem. O primeiro rei a regulamentar um bordel foi Henrique III da Inglaterra. Algumas regras que foram estabelecidas a que mulheres grávidas, casadas ou freiras não podiam ser aceitas como prostitutas. A prostituta não deveria aceitar dinheiro sem ter se deitado com um homem por toda a noite, nem morar no mesmo local em que oferecia seus serviços. O rei Luís IX, da França, também se preocupou com a prostituição. Tentando elimina-la, pois acreditava que era seu dever moralizar o reino, ele ordenou que todas as prostitutas públicas fossem expulsas das cidades e dos arredores rurais. Ordenou que fosse confiscada qualquer casa que alugasse um quarto a uma prostituta, contudo, isto não ocorreu na prática. O que fez com que em 1256, Luís fizesse algumas modificações. Ordenou que as prostitutas ficassem somente fora dos muros e longe de lugares sagrados. Já em 1269, voltou a questão, e véspera antes de partir para as Cruzadas, como forma de purificação do reino, ordenou que todos os bordéis fossem fechados, isto também valia para os bordéis de fora da cidade. Prometeu pensão as prostitutas que se regenerassem e fundou retiros para as regeneradas. Muito embora, apenas duzentas haviam se apresentado para pedir a pensão. Filipe III (1270-85) e Luís Filipe IV (12851314), também tomaram iniciativas para limitar a prostituição. Depois ficou por quase um século sem haver mais iniciativas. Richards (1993, p.127), atribui este intervalo das tentativas de eliminar com a prostituição, a Guerra

dos Cem Anos, pois os reis estavam ocupados. Carlos V(1364-80), em 1367, foi quem voltou a limitar a prostituição. Era determinado ruas para que elas circulassem e, se fossem encontradas em outras ruas, seriam banidas. Assim como as monarquias, as municipalidades também tentaram manter a moralidade pública. No decorrer da Idade Média, a prostituição foi fundamente a mesma. As autoridades tentando regulamenta-la, apesar dos limites impostos a sua prática, oscilando assim entre períodos de maior e menor tolerância. Em 1417, foi ordenado o fechamento de todos os bordéis da cidade. Sobe o precedente de que causava perturbação, assassinatos, furtos, entre outros prejuízos. O rei Henrique VI, em 1460, ordenou que todas as prostitutas em Southwark, fossem removidas para a prisão, junto com seus cúmplices. Isto devido ao alto número de homicídios e saques que ali ocorriam. A coroa procurava manter a segregação, com o objetivo de criar um local de ordem, que de forma eficiente satisfizesse o ato sexual.

A prostituição como elemento marginal A prostituição também foi analisada pela historiografia como um elemento marginal diante de uma sociedade cristã medieval. Jean-Claude Schmitt (apud GONÇALVES, 2010, p.27) ressalta a dificuldade em tratar sobre a marginalidade. Segundo Schmitt, a condição marginal poderia ser temporária, podendo perder o status de marginal. As autoridades regias e eclesiásticas eram quem qualificavam os indivíduos como um tal.

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GNARUS - 37 Bronislaw Geremek, (apud GONÇALVES, 2010, p.28) diz que a condição de marginal era dada àqueles que se encontravam dessimetria com a sociedade. Sendo por conta de não estarem de acordo com o estatuto social, ou condição material, ou mesmo formação profissional ou por não participarem do processo de produção, por não participarem de uma célula familiar ou não obtiverem uma moradia fixa. Por não estarem de acordo com as normas de comportamento impostas pela sociedade em que situasse. Muito embora, não significava que estariam excluídos aqueles que não acatassem as regras da sociedade.

Alcovitagem em Castela pelo olhar de Fernando Rojas

Muitos indivíduos que eram inseridos na sociedade, seguiam seus pleitos e em um dado momento rompiam com as estruturas e ficando as margens da sociedade. No medievo eram constantes as alterações do marginal/ criminoso e criminoso/marginal, que moviam o espaço de inclusão e exclusão. Como mencionado antes a prostituição não configurava um crime, contudo explorá-la sim. Este era o caso da alcoviteiras e rufiões.

Celestina, uma típica alcoviteira, que usava de suas artimanhas para convencer Melibéia, uma moça de família abastada, muito bela e pura, que por sua beleza faz Calisto apaixonar-se. Calisto, moço belo, de posses, o que vai fomentar Celestina a ajudá-lo a conquistar Melibéia.

Geremek (2004, p. 243 -244) ao falar sobre a prostituição, diz que sob o ponto de vista moral e cultural cristã, não era aceito ou visto como algo suspeito. A prostituição está na lista de profissões em que eram inconciliáveis. Impedindo o acesso à carreira eclesiástica e, em algumas cidades, era proibido ocupar cargos cívicos. Contudo, o tipo de vida tinha uma importância capital. A marginalização dependia da situação econômica. Os que possuíam bens, mesmo exercendo atividades marginais, não eram marginalizados. A Igreja usava a ideia de restituição e do purgatório. Assim dando a possibilidade de salvação da alma e uma posição na sociedade.

Segundo Rossiaud (1991, p.39), a alcovitagem vem a ser uma atividade realizada por mulheres, visto que dos 83 bordeis privados de Dijon, 75 eram comandados por mulheres. Apesar da existência de homens neste tipo de atividade, a maioria era exercida por mulheres, ou seja, pelas alcoviteiras. A literatura nos mostra a alcoviteira como uma velha, feiosa, onde a alma depravada é correspondida com às suas feições. Esta descrição da alcoviteira é vista em La Celestina de Fernando Rojas.2

De início, Melibéia não corresponde ao amor de Calisto, o que o faz ficar louco de amores por ela. No desenrolar da história, o servo de Calisto, Semprônio, oferece ao seu amo buscar ajuda de Celestina, mesmo Parmeno, um outro servo de Calisto, dizendo que era para ele não confiar em Celestina, pois está era uma feiticeira, alcoviteira e muitos outros ofícios que não eram bem vistos.3 Fernando Rojas nasceu no povoado de Montalban, hoje município da Espanha, na província de Toledo. Residiu em Talavera de La Reina. Era um alcaide. Não sabe-se a data de seu nascimento, mas há evidencias que em 1538 ainda vivia, 40 anos depois de escrever La Celestina, obra que escreveu em sua juventude. Esta foi escrita nos fins do século XV, num momento de plenitude da sociedade espanhola, sob o governo de reis católicos. La Celestina seria hoje a obra literária que ocuparia o primeiro lugar, entre as espanholas, se não fosse por Quixote. 3 Tem esta boa senhora, perto do curtume, à margem do rio, uma casa afastada, meio caída, pouco composta e menos abastecida. Ela praticava seis ofícios: bordadeira, perfumista, mestra em confeccionar adornos e virgindades, alcoviteira e um pouquinho de feiticeira 2

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GNARUS - 38 Celestina em troca do dinheiro de Calisto, vai até a casa de Melibéia a convencer de dá uma chance a Calisto. Por fim, Melibéia é convencida por Celestina e se entrega ao amor de Calisto. Celestina é morta pelos servos de Calisto, Parmeno e Semprônio, que exigem que ela dívida com eles o que seu amo havia pago a ela. Como Celestina se recusou a dividir o pagamento, os dois servos a matam e acabam sendo presos e mortos em praça pública. Por uma fatalidade Calisto morre e Melibéia, louca de paixão se mata, para assim ficar próximo ao seu amado. Rossiaud (1991, p.39) afirma que havia vários graus na profissão de alcoviteira. Umas se limitavam a organizar encontros amorosos, outras fornecem moças, algumas possuem abertamente um bordel em sua residência. Outras trabalham para pessoas de status elevado, fornecendo moças que são enganadas por elas, para governadores, autoridades; enfim homens que ocupavam altos cargos administrativos.

Castela de Afonso X e as Siete Partidas Em 1252 morre o rei de Castela e Leão Fernando III, no mesmo ano assume o trono o primogênito de Fernando III, Afonso. É denominado de Afonso X, mais tarde conhecido como o Sábio. O reino de Castela e Leão estava estável no que tange as condições financeiras e sociais (MORAIS, 2010, p.12). A situação na Península era extremamente delicada, por conta da convivência de cristãos e mulçumanos. Que era composta de momentos pacíficos e violentos, o que não foi diferente no reinando de Afonso X (MORAIS, 2010, p.12). Na historiografia atual, acredita-se que a legislação afonsina tenha sido um esforço para combater a dissipação das regras, que pode-

Eram ardilosas, persuasivas, acolhem as vítimas de agressões, resgatam mulheres oprimidas pelo casamento, ou mesmo moças pobres, que haviam sido “abandonadas”. Muitas vezes essas alcoviteiras não trabalhavam sozinhas, tinham um marido que ajudavam a dirigir seu comércio. Enquanto a Prostituição era vista como algo necessário a sociedade, isto dito pelo próprio São Tomás de Aquino (apud, ROBERTS,1998, p.100): “a prostituição nas cidades é como a fossa no palácio: tire a fossa e o palácio vai se tornar um lugar sujo e malcheiroso.”

(ROJAS,1988, p.17).

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Capa das Siete Partidas. Exemplar de 1555


GNARUS - 39 riam ser ocasionadas pela multiplicidade que cada localidade obtinha sua regulamentação jurídica (LIMA, 2010, p.88). Segundo Maria Dolores Madrid Cruz (apud LIMA, 2010, p.88), o objetivo da legislação afonsina era haver uma unidade jurídica, onde todos os territórios pudessem ser regidos por um único direito, isso fortaleceriam os poderes do rei, frente aos poderes das cidades (apud LIMA, 2010, p.88). Seguindo a tese de Garcia Gallo (apud LIMA, 2010, p.89), o Especulo foi o texto base para a criação das legislações. Este que foi sendo concebido entre os anos 1255 e 1260 na corte afonsina. O autor diz que a obra foi redigida no ano de 1258 e foi sancionada por volta de 1260.Há indícios que em 1265 foi finalizada a sua segunda versão, onde seu título foi modificado para Libro Del Fuero de las Leyes.4 A alcovitagem era vista com maus olhos. Esta, pela Lei das Siete Partidas, Del Rey Alfonso El Sabio/Título XXII, era considerada crime e associada ao pecado da luxuria. CaNa primeira e na segunda revisão houve pequenas mudanças, somente com o neto de Afonso X, Fernando IV é que houve uma grande revisão. O texto foi revisado por juristas da corte monárquica que tinham grande formação filosófica. Na terceira redação a obra ganha um caráter didático-doutrinário ainda mais acentuado, onde foi incorporado um direito romano-canônico. Foi nesta edição que o livro passou a ser chamado de Libro De Las Leyes ou Partidas, sendo dividido em sete seções. Em 1325 houve uma outra mudança, onde o texto seria modificado significativamente. Onde havia sido intercalado e acrescido. Em 1340 houve uma quinta revisão, esta menos importante para Garcia Gallo. Houve uma modificação na introdução, onde a obra é datada entre 1256 e 1263. O Especulo foi usado por Afonso X como Fuero, era aplicada nos assuntos relacionados a corte real. De início foi um código criado para nível local. Em 1272, as cidade e vilas deixaram de usar a obra. Somente sendo usada para pleitos encaminhados ao rei. Após a morte de Afonso X, esta obra foi reelaborada, onde foi acentuado o seu caráter doutrinário, já que não tinha a força de uma lei. A partir daí que esta obra tornou-se o que conhecemos como a primeira partida.

racteriza-se cinco maneiras de alcovitagem: a primeira seria as que possuem um bordel e que usa as moças para ganhar dinheiro, fazendo-as venderem seus corpos. A segunda seriam as que a vão a casa de uma mulher a mando de um homem, ganhando algo para fazer isto. A terceira seria as que usam suas próprias casas para abrigar moças e usarem delas para ganhar dinheiro, fazendo maldades com seus corpos. A quarta seria quando o homem alcovita sua própria mulher. A quinta é quando a alcoviteira deixa com que uma mulher casada ou outras boas moças se encontre com homens em sua casa, em troca de algo que possa receber. Segundo a Lei das Siete Partidas, estas mulheres causam grandes danos, tornando muitas mulheres boas em más. A Lei também se refere que quando for provado a alcovitagem, a mulher deve ser punida. Expulsando das cidades, tirando as casas daqueles que a alugarem sabendo que será um bordel, assim como pagar dez libras de ouro. Sendo assim não somente a alcoviteira era punida, mas também aqueles que facilitassem seus trabalhos.

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Considerações finais Neste trabalho abordamos o exercício da prostituição e da alcovitagem. Pode-se inquirir que a prostituição era um ato marginal, mas não criminoso, diferente da alcovitagem, que era uma realidade marginal e criminosa. Aqui salientou-se que a Igreja em parte, era tolerante para com a prostituição, bem como as monarquias. Contudo, havia um forte controle desta atividade, vez a moralidade, os bons costumes e a ordem social devia ser mantida. Através do olhar literário de Fernando Rojas e dos atos normativos de Alfonso X,

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GNARUS - 40 observou-se a realidade da prostituição e da alcovitagem em Castela em finais da Idade Média, sendo esta última prática considerada criminosa, sendo passível de punição a quem a exercesse. Rojas evidenciou em La Celestina, a alcoviteira como uma velha, astuta, feiticeira, sagaz, o quanto pode-se imaginar de maldades. Alfonso X salientou em as Siete Partidas a alcovitagem como um crime. Concluímos que a prostituição era tolerada, muito embora fosse mal vista, porém a alcovitagem era um contra censo. Cumprimos todos os objetivos aos quais foram propostos, uma vez que o fito era demonstrar a prostituição e a alcovitagem em Castela, focando na análise da alcovitagem como prática criminosa, apesar de sua frequência na realidade cotidiana medieval. Pâmela Viegas De Andrade Ferreira é licenciada em História pela Universidade Cândido Mendes

Obras Consultadas GEREMEK, Bronislaw. O Marginal. In: LE GOFF, Jacques (dir.). O Homem Medieval. Lisboa: Presença,1990. GONÇALVES, Beatris dos Santos. Os Marginais e o Rei. A construção de uma Estratégica relação de poder em fins da Idade Média portuguesa. Tese (Doutorado) em História. Instituto de Filosofia e História. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2010. LIMA, M. P. O gênero do Adultério no discurso jurídico do governo de Afonso X (1252 – 1284). Tese (Doutorado) em História. Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Departamento de História. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2010. MORAIS, Natara Elisa Aguiar. O Escárnio de Afonso X. Os sentimentos de um rei nas cantigas medievais. Monografia em História. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2010. ROBERTS, Nickie. As Prostitutas na História. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos,1998. ROSSIAUD, Jacques. A Prostituição na Idade Média. Rio De Janeiro: Paz e Terra,1991.

Referências Bibliográficas

RICHARDS, Jeffrey. Sexo, Desvio e Danação. As Minorias Da Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge

Fontes primárias

Zahar Ed.,1993.

ALFONSO X. Siete Partidas. Por la Academia de la Historia.1807.Disponível em: http:// b i b . c e r v a n t e s v i r t u a l . c o m / s e r v l e t / S i r v e Obras/89148404329025032610457/ima0674.html. Acesso em 28 de out de 2013. ROJAS, Fernando. A Celestina. Tradução Walmir Ayala, a partir da adaptação de Luís Escobar e Humberto de La Ossa. Rio de Janeiro: Francisco Alves,1988.

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