Fepiano 25

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Bem vindos à caverna de Platão

L

embro-me do primeiro dia em que entrei na Faculdade de Economia da Universidade do Porto. A minha noção de Academia foi desafiada. Quando entrei, vi pessoas ressacadas a dizer “Foste ontem à noite do VR, foi tão altamente, estou de direta aqui” e perguntei a mim mesmo, estou na Academia? Lembro-me de, no outro dia, entrar na faculdade, sentir o cheiro a vómito da festa do dia anterior, e de os meus pés colarem no chão como se de uma discoteca se tratasse. E voltei a perguntar a mim mesmo, estou na Academia? A Academia foi fundada por Platão nos Jardins de Academo, herói grego (tenho a certeza de que daria voltas no seu túmulo se soubesse de algumas blasfémias cometidas nos dias de hoje). Foi erguida sobre valores de conhecimento, triunfo sobre a verdade e com uma relação aluno-professor baseada no conhecimento, em que os alunos realmente se importavam por

aquilo que aprendiam. In vino veritas, mas não exageremos. Não encontrei nada disto. Impuseram-me dogmas como se de uma igreja se tratasse, modelos micro e macroeconómicos, tecnicidades de quem não pensa e professores que despejam a matéria, dizendo “É isto que têm para o teste, não querem tirar boa nota?”, perguntando-o de uma maneira autoritária, fazendo-o parecer a única coisa importante. As aulas de pensamento crítico eram quase inexistentes e, as que havia tinham poucos alunos. Entramos todos algemados a ver sombras passar diante de nós, sem saber o que fazer. Podemos continuar assim ou questionar por quê. Lembrarmo-nos de que só estamos dois mil e poucos anos à frente dos gregos. Isto não é nada se pensarmos que apenas fazemos parte de um processo de desenvolvimento da espécie e que estamos para os Homens do futuro como os macacos estão para nós. A Odisseia ainda agora começou. Os 6

RUI MACIEL

perpetuadores da ignorância e formatação continuam por aí; é necessário lutar contra este espírito, desde conversas a atitudes. Os universitários estão descredibilizados. Quando veem um trajado na rua, as pessoas pensam “Mas que bêbedo”. A massificação da universidade em Portugal levou, de certa forma, a uma plebeização da universidade, onde valores de conhecimentos são rejeitados em detrimento da obediência cega, recompensada com largos baldes de cerveja e vinho. No início, a FEP desilude. Começamos no chão a ver sombras passar à frente. Prometem-nos os melhores anos da nossa vida. Mas eu não vos desejo isto. Desejar-vos isto é dizer que nunca serão melhor do que aquilo que são agora. Os vossos melhores anos estão para vir, aqui apenas aprenderão como chegar lá. A vida ainda agora começou. É imperativo largar as sombras e o negro e enfrentar olhos nos olhos a ignorância. Valete, Frates.


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