Capitulo inicial do ebook mocinho bao

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MOCINHO BÃO FELIPE MORENO

Série "Psicor, os tipos de caráter em ação"

2013 - LetrasCriativas


Moreno, Felipe Mocinho Bão Série PSICOR, os tipo de caráter em ação eBook Aqui disponíveis nos formatos ePub 1. Literatura Brasileira. 2. Novela. 3. Eneagrama. ........................................................................... Revisão, Capa e Editoração: Letras Criativas 1ª edição versão digital - Julho 2013 ISBN: 978-85-65942-02-7 LETRAS CRIATIVAS São Paulo (SP) - Brasil www.letrascriativas.com.br


Prefácio Como com quase todas as breves narrativas que escrevemos para essa série chamada "PSICOR, Os Tipos de Caráter em Ação", o objetivo foi criar uma forma original de transmitir caracteres dos tipos do Eneagrama. Com essa história não foi diferente. Buscou-se criar uma narrativa especial, com as idiossincrasias próprias de um brasileiro iletrado (há tantos brasileiros ainda nessa situação infelizmente), o qual narra a história de seu irmão, que também participa ativamente dessa história. Aliás, essa é a historia de um tipo 2, só que contada na versão e na visão de outra pessoa, que faz tecnicamente o papel de um narrador-testemunho, acompanhando os eventos de bem próximo. Essa estratégia permitiu que o autor pudesse atribuir ao personagem de ponto de vista, ou seja, o narrador-testemunho, pintar de forma bastante peculiar a vida daquele que foi escolhido para representar o eneatipo conhecido no meio eneagramático como "dador", ou "sedutor", ou mesmo "presenteador". Como um dos representantes-tipo do centro emocional do Eneagrama, o tipo 2, nessa história representado pelo personagem chamado na história de Mocinho Bão, fornece bons predicados de como atua e se comporta frente às situações corriqueiras, sobretudo como tenta a seu modo manipular as emoções para obter privilégios ou vantagens egoísticas, tendo em vista que todos os tipos de personalidade agem motivados egoisticamente quando submersos na mecânica do respectivo tipo. Aqui nessa história, o autor busca uma linguagem radicalmente coloquial, isto é, procura proporcionar que a linguagem tenha os timbres e os colóquios da fala regional, com seus maneirismos típicos. A escolha recai sobre uma forma mais nordestina de falar, por assim dizer. Assim, por força de opção narrativa, a história é contada através de uma linguagem que visa também caracterizar certas carências linguísticas ao mesmo tempo em que reforça um pouco da riqueza idiomática daquela região. Ao se prescindir da linguagem culta para discorrer sobre os eventos dessa história, a ideia foi mesmo buscar uma proximidade com o que ouvimos em várias regiões do pais onde as mazelas e a própria miscigenação de nossa cultura parece dar as cartas. Com essa novela, então, encerra-se esse ciclo de "narrativas eneagramáticas" sob uma roupagem digamos mais "psicossocial" dos eneatipos em ação. "Psicor, os tipos de caráter em ação" foi pensada desde o início para servir a uma literatura digital, cujo formato eBook tem como trazer uma nova maneira de ler e também escrever ou fazer literatura.


Em quase todas as 9 novelas escritas e publicadas sob essa série (contando com esta narrativa inclusive), a média foi de 10 capítulos breves que de alguma forma tentaram mesclar entretenimento com conhecimentos especificos como se trata da propria ciência do Eneagrama. Esperamos que o leitor tenha, além do prazer inerente de se entreter, a chance de aprender um pouco desse maravilhoso esquema representativo dos tipos de caráter que buscamos ficionalmente transmitir com essa série de literatura digital. Boa leitura! Felipe Moreno Editor - Letras Criativas


Sumário Prefácio Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9 Capítulo 10


1 Já não teria ido dizer ou falar alguma coisa pra ela que ela não sabia. Ia mesmo é ver suas bochechas rechonchudas que toda vez que vejo, vejo assim é trepicar por conta do riso fácil. Ela é única, minha avó. Eu sei faz tempo; sou prova. Cuidou tão bem de todos os netos, mas do meu irmãozinho era aquele que mais gostava. Ela sempre chamava ele de “mocinho bão”, porque o menino sempre adivinhava o que ela queria ou precisava, e como de bobo não tinha nada, ia ele lá e fazia algo para esfuziar de alegria a véia avó. Estou aqui nesses arrabaldes faz trinta e dois anos, e não saio daqui. Vó Laurinda sabe bem do que falo, de minhas promessa de nunca desleixá de minhas origem, memo sabendo que num aprendi a falá certo, tampouco escrevê. Mas estou aqui de peito aberto, e também gosto de ajudá gente, talvez não tanto que nem meu irmãozinho, que vive rindo à toa de ajudá ozotro. Quer ouvir essa? Te conto já. Aí vai dizer se ele era ou não era um “mocinho bão” como falava a véia avó Laurinda. - Ei moço, o que ta fazendo aí? - Pegando um balde pra gente lá de casa. - Água tem muito pouca aqui. Mal dá pra gente. - É, mas gente lá é tão gente quanto as daqui! - Ocê é trem bão, mineiro? - Sô não. Sô só um mocinho bão. - Que desgraça te pegô? - Qual nada! To fazendo isso porque amo Laurinda. - Sua mãe? - Minha vózinha. - Então ta bom. Pode pegar um pouco de água pra ela. Mocinho bão... E daí que ele pregô no rosto um riso mais largo que o de Sezefredo, o qual, sortudo como o diabo, ganhô sozinho na megassena e desapareceu feito um grão de poeira ao vento. Então catô e encheu o balde fazendo até cair umas cortina d’água, passô um pau na alça e ergueu o balde cheio por cima dos ombro e foi em frente, rio adiante, levando aquele balde por sobre os ombro. Certo que parô várias vezes para trocá de braço e de ombro, mas chegô em casa com a água prometida. Vó Laurinda viu o menino chegar com as vermelhidão no pescoço, e sabia que ele se esforçava pra fazê-la feliz. Se perguntasse a ele por que corria tanto pra alegrá vó Laurinda, ele não tinha muita explicação, mas sobre as pessoa achava tudo. Tudinho. Só de olhar pra cada uma delas pra achá o que


lhes faltava. Nisso e na mosca sabia acertá. Exagero? Qual nada! Ele matava as mosca que rondavam a cabeça de Laurinda. De um tabefe só. Na oreia delas que zonzeavam assim com as asa toda dura para em seguida forrá o chão do quarto. - Ocê já chegou, lindinho? - Sim, vó. Vo enchê as garrafa e já te levo aí. - Ta bem, meu lindo. - Vó! - Que foi, meu amor? - A senhora acha alguma coisa dos Silva? - De quem? - Dos Silva! - Ah! Eles... São bão, meu fio. Como você, lindinho. - Òia que que nem eu não tem não... Pode é ficá atrás... Bão bão, acho que não! - Tá fresquinha a água, meu fio? - Ta, ta sim. Se quisé preparo aquele chá, vó. Quer? - Tu é mesmo bão hein, meu fio. - Se sô é porque Deus me fez assim, vó. Pega a água enquanto eu preparo um chá de dormideira. - Tu vai sair? - Acho que não. Num sei. - Tome o chá comigo, menino. - Quero dormir não, vó. - Quem te disse que vamo dormí? - Dormideira, uai! Pra que então? Pra vomita é que não é. - Boldo, meu fio. Amargo que só a desgrama. - Vó, diz sério: a senhora precisa de alguma coisa mais? Eu vô buscar. - Tu é ouro, meu fio. Mocinho bão... - Por que a senhora sempre repete isso? - Por quê? Ora, porque bãodade não tem todo mundo, não. - Mas se todo mundo não é bão, quem é bão então? - Tu, já falei. Já num posso dizê o mesmo de Josevaldo. Aquele home ali não sabe oiá os otros. - E eu sei, vó? A senhora que diz... - Sabe, meu fio. Sabe muito! - Sei não vó. Sô só mais um. - É nada. Pregunta pra Dondoca. Veja lá o que ela vai dizê a seu respeito. - Dondoca diz isso porque gosta de mim. É suspeita... - E da onde vem a suspeição? - Sei lá, vó! E isto é lá coisa de sabê? - Não sabê é deficiência, meu fio. Quem não sabe, não tem juízo. - Ah é? Eu pensei que juízo fosse otra coisa.


- Pensô que fosse o quê, menino? O que um menino de dezessete ano pode sabê? - Òia vó... Eu sei, eu sei... - Por que disse que Dondoca é suspeita de achá que tu seja bão? - Tem coisa que fazemo que vale uma vida. Nem sei como não faria. - Mas na vida não é só fazê para os otro lhe agradecê como tu acha, porque sabe que gostam de ti. - Então num sô tão ignorante assim. Pra falá a verdade, eu sinto que sem mim muitas delas nem sei o que fariam. - Sabe por quê? Porque tu faz pra elas, meu fio. Isso é como tomar o lugar delas. - Pode ser... E assim os dias iam passando; assim eles iam se somando como pingos numa tempestade, e parecia mesmo que não acontecia nada de diferente em Ubuntu. As coisa tavam eram com gosto de picolé de chuchu! A avó Laurinda sempre recebendo todos os afago do mocinho bão do meu irmãozinho. Acho que merecido, quem sou eu pra dizê o contrário. Se Nozô nasceu só pra fazê os favô pra véia, eu ia ficá lá discutindo com o Senhô das artura? Se tá escrito há de se cumprí e não é nem mocinho bão nem mocinho mau que vai conseguir evitá. Não é bem assim que acontece? Mas o destino pôs tudo à prova, inclusive eu, que amava vó Laurinda, que, de repente, foi chamada pro andar de cima. Assim mesmo como acontece a muita gente. A véia já tava passada, é verdade, sei lá quanto somava, uns noventa e dois talvez... Mas foi Nozô que sentiu muito, a ponto de ficá assim meio desembestado por algum tempo depois que ela partiu. Ele ficô acho que mais briguento... nervoso, muito nervoso. E despois foi achá graça lá com a menina Ana Quitéria dos Silva. Aquela que deixô ele pegá água pra vó Laurinda muitas veiz. Brigava tanto que sobrô até pro pai de Ana Quitéria, que queria que noivassem antes de ele tocá um dedo nela. E assim, de mocinho bão, Nozô virô é “bicho ruim”, para o qual bastava apenas riscá um palito de fósforo pra ele esquecê tudo que ele era. Dizia ele que era por amô a Quitéria, mas convenhamo que ele tinha piorado o seu comportamento. Ana Quitéria, por seu lado, também era preguntadora e gostava de desafiá as autoridade. Por isso, seu pai enchia-lhe de bolacha, pra desespero de Nozô que queria matá o véio quando descobria a cara marcada da menina. O que restava aos dois então? O que acha? Fugir, né? Eles foram pará no meio do furdúncio da cidade. E aí tiveram que se virá frente a vida dura de se sustentá numa cidade maior. Era o diabo! Mas este tava nem aí. Porque quando o diabo gosta, sai pra lá coisa ruim!... Passou três ano e a primeira notícia que tenho de Nozô é que engravidô umas três lá em


Coração das Dô, e quem era pra ficá prenhe no fim não ficô. Por isso o pai de Ana Quitéria. seu Genivaldo, quando descobriu a cachorrada de Nozô, foi atrás dele e só não o matô porque o desgrama foi chamado pruma entrevista de emprego notra cidade. Quase. Mocinho bão tinha dons de seduzi toda a gazela que ia visitá seu pasto. Mulherengo era pouco, gostava mesmo era de ficá com as muié até fazê elas entendê que estavam apaixonada tanto quanto ele por elas. Por isso mesmo as muié nem queriam saí de perto dele. Se sentiam amadas, desejadas o tempo todo porque mocinho bão tinha é uma sanha pra fazê elas ainda mais apaixonadas que ele. Mocinho bão era danado que só vendo! Mas a esta altura, Nozô já tinha ficado de maior e a responsabilidade era toda dele. Se gostava de arranjá trapaiada ninguém tinha era vê nada com isso. Nem mesmo Dondoca, que fugiu pra ir atrás dele. Uma esfarrapada das ideia. Era isso que ela era. Ou foi, sei lá. Onde fica a história passada também dorme o tempo. Mas ele acorda e brilha logo nas memória da gente. Só que Dondoca nem fazia ideia que é que acontecia ali em Coração das Dô. Foi a desgraça. Ao sabê da “embuchada” de todas elas ali por Mocinho Bão, tratô logo de dizê que ia matá o desgramado antes de ele acabá com todas elas junta. Resolveu logo então é juntá as ferida das muié e pregá uma peça em Nozô. Assim que ele voltasse de onde tinha ido conseguir emprego, ele teria uma boa surpresa. Ah se teria... Nozô, enquanto isso, tava é se lascando todo numa entrevista de emprego. Nem sei bem o que ofereciam, mas Nozô, qual um chamado do céu, saiu para Trisdócimo com as venta assim abanando igual à mula de seu Gotardo. Tava é nervoso, disse que o emprego dava era pra sustentá um monte de muié e uma penca de criança. E ainda sobrava pra ele. Por isso saiu pra lá, nervoso, comendo as unha, e isso dizia que era bom porque num precisava cortá as pontiaguda quase nunca porque num dava tempo delas crescê. E foi assim que ele chegô lá. Fazia muito calor em Trisdócimo. Mas Nozô tinha era pregado na fuça uma alegria que queria dizê simpatia. Um jeito meio falso, porque nos íntimo mesmo tava é nervoso de num consegui o emprego. Por isso teve uma ideia. Tinha que fazê eles acreditá que ele sabia onde poderiam encontrá a jazida de minério. Era pra isso que ele tinha ido até lá. Pra garantí a eles que sabia de uma coisa importante. E a voz que tava gravada ainda era da avó Laurinda: “Quem não sabe, não tem juízo”. Mas ele sabia, não sabia? Pelo menos eles teriam de acreditá nisso. Mas será que conseguiria? Dúvida ele não tinha. Era nervoso... Era nervoso o que estava sentindo.


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