Canaletras

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32 xingar ninguém. O respeito pela coisa pública e privada era a minha marca registrada. Um trabalhador eu era.

O ACASALAMENTO Não, aquilo não era o clímax. Mas sim um anticlímax. Porque se nós já transpirávamos feito peles vermelhas sobre a fogueira, ainda assim estávamos próximos do ponto alto, porque, agora, uma força maior nos fazia ficar ainda mais colados um ao outro, de maneira que eu sentia todo o corpo da mulher magricela. Quer dizer, o corpo não; os ossos, bem dito. Pensei nessa “força maior”. Quem seria a dita cuja? Por que Deus estaria nos proporcionando esse momento? Qual o seu desígnio? Havia alguma coisa muito imperceptível aos nossos olhos humanos? Eram perguntas de um pobre filósofo apertado contra uma mulher descarnada. Se bem que se ela fosse do meu tipo, eu acho que não trairia a Madalena. Mas assim já estaria traindo a Solange! Já não sabia mais o que fazer mesmo. Se essa força estranha me empurrava contra a mulher, e esta, não saía do lugar, era porque alguma coisa precisava acontecer, ora pois pois! Eu, um legítimo descendente dos Oliveiras, parrudinho e peludo do jeito que a mulherada gostava, só poderia mesmo fazer sucesso. Ainda mais em uma circunstância daquelas. “Eu não posso pensar desse jeito, que afronto contra a moralidade de Deus!” Estava parecendo um imbecil a ponto de misturar as bolas. Se eu estava pensando naquilo, que assumisse sozinho a fantasia e ponto. A “força maior” que nos fazia ficar ainda mais grudadinhos um ao outro a ponto de sentir todo – eu disse, todo! – corpo do outro não era divina coisa nenhuma. Era o nosso limite para suportar a nossa necessidade de viver em sociedade. Eu sempre pensei que sozinhos jamais poderíamos chegar a algum ponto, porque mesmo que chegássemos, sozinhos, não haveria ninguém para reconhecer o nosso feito. Sozinhos, não poderíamos nos reunir com os


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