Revista Científica da Escola Superior de Advocacia: Direito das Mulheres - Ed. 34

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-maternidade. Esse custo, portanto, deve ser as- zindo a sua renda líquida em comparação com sumido por um sistema público de seguro obriga- a dos consumidores (e contribuintes) homens. tório (seguridade social). Agora, para se chegar a essa conclusão, é fundamental ter em mente que os tributos sobre Por isso, a partir da vigência dessa norma consumo são indiretos, é dizer, o ônus tributáno ordenamento jurídico brasileiro, o custeio do rio não é economicamente assumido pelo consalário-maternidade, nos 120 (cento e vinte) dias tribuinte “de direito” (fornecedor do produto ou de afastamento da empregada, passou a ficar a serviço), na medida em que é considerado, inclucargo da Previdência Social e não do emprega- ído e repassado dentro no preço do produto ou dor. A legislação brasileira observa essa regra, serviço, logo, transferido para o consumidor, que transferindo apenas o pagamento para o empre- atua como um “contribuinte de fato”. Acerca dos gador, que se credita do montante para fins de tributos indiretos, leciona Leandro Paulsen: compensação automática (administrativa) com débitos previdenciários.10 Tratando-se de tributos indiretos, asConforme advertido, muito embora a licença maternidade não seja um tema ou instituto diretamente tributário, há uma evidente repercussão de natureza fiscal, na medida em que o salário-maternidade (benefício custeado pela Previdência Social) entra na base de cálculo das contribuições sociais incidentes sobre a folha de salários, ou seja, na prática, o empregador acaba arcando com altos encargos tributários que recaem sobre essa licença, a saber: cota patronal (20%), SAT/RAT (1% a 3%, dependendo do grau de risco da atividade) e terceiros (5,8%). Consequentemente, em comparação com o trabalhador do gênero masculino, a mão de obra feminina sofre um tratamento tributário majorado durante o período de licença-maternidade. Daí a necessidade de uma abordagem sobre a (in) constitucionalidade da incidência de contribuições sociais sobre a licença-maternidade, que será enfrentada doravante. Por outro lado, no que concerne à tributação sobre o consumo de produtos e serviços, há pesquisas e estudos que revelam um tratamento tributário discriminatório contra as mulheres, levando ao encarecimento daqueles produtos e serviços de consumo exclusivo ou preponderantemente feminino. Em outras palavras, essa distorção tributária detectada no consumo tem por consequência final uma obrigação tributária majorada contra as contribuintes mulheres, redu-

sim considerados aqueles relativamente aos quais o próprio legislador estabelece que sejam destacados no domicílio fiscal de venda e que componham o valor total da operação, como é o caso do IPI, do ICMS e, via de regra, também do ISS, aplica-se o artigo 166 do CTN. Nesses casos, teremos duas figuras a considerar, a do contribuinte de direito e a do contribuinte de fato. Contribuinte de direito é a pessoa que, por realizar o fato gerador, é obrigada por lei ao pagamento do tributo. Contribuinte de fato é outra pessoa que, não estando obrigada a efetuar o pagamento do tributo perante o fisco, suporta indiretamente o ônus da tributação na medida em que a ela é repassada a carga tributária.11

Dessa forma, uma tributação sobre o consumo que, em última instância, deságua para renda da consumidora de produtos e serviços exclusiva ou preponderantemente femininos, pode ensejar também um tratamento tributário desigual entre homens e mulheres. Estudo divulgado pelo INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos em 201412 expõe a perversidade da tributação sobre o consumo no País, concluindo que a contribuinte mulher, negra e pobre é quem mais paga tributos no Brasil!

10 Assim estatui o art. 72, §1º, da Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios Previdenciários): “Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço”. O §3º ressalva que essa regra não se aplica aos empregadores microempreendedores individuais (MEI). 11 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014, p. 234. 12 SALVADOR, Evilásio. As implicações do sistema tributário brasileiro nas desigualdades de renda. INESC: Brasília, 2014. Disponível em: https://www.inesc.org.br/wp-content/uploads/2019/04/Sistema_tributario_e_desigualdades_ evilasio.pdf. Acesso em: 30 jan. 2020.

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