Estéticas da oralidade

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Esse é o universo de personagens austeras que percorrem os cenários idealizados pela autora. E, como afirma Prado (2000, p. 84)22: “No teatro [...] as personagens constituem praticamente a totalidade da obra: nada existe a não ser através delas”. Ao indagar-se acerca da caracterização das personagens no teatro, Prado (ibidem, p. 88) indica três vias, através das quais se considera o que a personagem revela sobre si mesma, o que faz, e o que os outros dizem a seu respeito. Lampião revela-se um ser cujo poder é capaz de dominar, pelo temor, a todos; seu comportamento corajoso e sagaz o torna temido e, ao mesmo tempo, prestigiado. Esses aspectos tornam essa personagem no texto dramático, assim como na realidade, uma figura complexa e contraditória. E as personagens secundárias, que em seu derredor circundam, são delineadas a partir das decisões e ações e gestos advindos dele. Em se tratando da importância dessa personagem, nos parece que finalmente chegamos a uma suposta conclusão. Na década de 50, no país, surgiu um público que buscava abordagens mais ideológicas no teatro. Dentre as vertentes surgidas, podemos dizer que o regionalismo e a ideologia se caracterizaram como vieses proeminentes nesse período do teatro brasileiro. A primeira vertente estava vinculada ora à denúncia das problemáticas socioeconômicas, ora à explanação de idiossincrasias regionais reproduzidas com intenso valor estético; e a segunda recorria à ideologia, ou seja, colocava em voga o contexto político nacional, e suas contradições, de modo a denunciar seus absurdos e instigar no povo uma visão menos alienante sobre a política nacional. Nossa proposta não era discutir se na peça de estreia de Rachel de Queiroz seria possível inferir elementos peculiares da teatralidade típica das camadas populares. É óbvio o fato de que a autora não desenvolveu essa obra comprometida com elementos estruturantes típicos do chamado teatro popular. Ao contrário, ela recorre a eventuais recursos tradicionais para contar sua versão da história do cangaceiro PRADO, Décio de Almeida. A personagem no teatro. In: CANDIDO, Antonio; et al. A personagem de ficção. 10. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000. 22

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