Neurociências: diálogos e interseções

Page 58

para que seja possível realizar movimentos coor­denados em que sejam acionados diversos músculos do corpo em uma determinada sequência, existem os planejadores, que produzem essa informação para que ela seja enviada aos ordenadores. No grupo dos planejadores, podemos identificar regiões específicas do córtice cerebral, do cerebelo e dos núcleos da base (Lent, 2005; Machado, 2004). Os motoneurônios, os ordenadores, inervam a mus­ culatura somática. Do ponto de vista anatômico, os neurônios motores inferiores situados no tronco ence­ fálico inervam músculos da cabeça e do pescoço, en­ quanto aqueles que se localizam mais inferiormente, no corno ventral ou anterior da medula espinal, inervam os músculos das outras regiões do corpo e alguns do pescoço. Devemos diferenciar estes neurônios motores inferiores, cuja soma se localiza na medula, daqueles do córtice cerebral, ou neurônios motores superiores, os quais se comunicam com a medula por intermédio de seus axônios. Como são os motoneurônios inferiores que fazem sinapses diretamente com os músculos para a transmissão do potencial de ação, são também eles os controladores diretos da contração muscular (Bear, 2002; Lent, 2005).

Medula espinal e motoneurônios Os motoneurônios deixam a medula através do corno ventral e se unem a uma raiz nervosa dorsal ou posterior, que contém fibras nervosas sensitivas (ou aferentes), para formar um nervo espinal. Esses nervos espinais, deno­ minados mistos por conterem fibras nervosas aferentes e eferentes, atravessam então os forames intervertebrais e se dirigem às estruturas musculares inervadas por eles. Existem 30 pares de nervos espinais, sendo 8 cervicais, 12 torácicos, 5 lombares e 5 sacrais. Como o ser hu­ mano possui maior concentração de músculos e maior variabilidade de movimento nos membros do que no tronco, já era de se esperar que a disposição dos moto­ neurônios na medula refletisse esse padrão. Por isso, os motoneurônios concentram-se na medula em dilatações, que são a intumescência cervical (C3-T1), relacionadas aos plexos cervical e braquial, onde estão os neurônios que controlam a musculatura dos membros superiores, e a intumescência lombar (L1-S3), relacionada ao plexo lombossacral, no qual se localizam as células nervosas que comandam a musculatura dos membros inferiores. Como a musculatura axial é, por sua vez, distribuída mais homogeneamente pelo corpo, também o são, ao

07-Neurociencias.indd 131

longo da medula, os neurônios responsáveis por sua inervação (Figura 7.4) (Bear, 2002; Lent, 2005; Moore & Dalley, 2001). A predominância de neurônios ao longo da medula também varia transversalmente, de modo que os moto­ neurônios dos músculos distais, como os das mãos, fi­ cam localizados mais lateralmente na medula em relação aos neurônios motores dos músculos axiais, como os do dorso, que assumem posição mais medial (Bear, 2002; Lent, 2005).

Neurociência do Movimento

131

Tipos de motoneurônios e unidade motora Podem-se dividir os motoneurônios em três tipos dis­ tintos: os neurônios motores alfa, gama e beta. Os mo­ toneurônios alfa possuem grandes corpos celulares, axônios espessos e muitos dendritos. Eles representam a interface primária entre o sistema nervoso e os múscu­ los, controlando a contratibilidade muscular e, por isso, estão situados no mais baixo patamar da hierarquia de controle do movimento (Bear, 2002; Lent, 2005; Gazzaniga, 2006). A sinapse entre o motoneurônio alfa e a fibra mus­ cular recebe o nome de junção neuromuscular. Quando um potencial de ação chega a essa junção pelo moto­ neurônio alfa, ocorre a liberação do neurotransmissor acetilcolina, que desencadeia um potencial de ação póssináptico na fibra muscular, despolarizando sua mem­ brana e provocando alterações bioquímicas nessa fibra muscular, as quais promovem o deslizamento dos fila­ mentos de actina e miosina e, então, uma sequência de contração e relaxamento. Quanto maior a frequência dos potenciais de ação do motoneurônio, maiores a ten­ são e a contração das fibras musculares, ou seja, o SNC utiliza a somação temporal como uma das maneiras de controlar a intensidade da contração (Bear, 2002; Lent, 2005; Moore & Dalley, 2001). O estudo de ElBasiouny e cols. (2006) sugere que as correntes persistentes de entrada de cálcio nos dendri­ tos dos motoneurônios alfa não são ativadas de acordo com o princípio do “tudo ou nada” durante a geração do potencial de ação, e sim de maneira gradual, de acordo com o potencial sináptico, até atingir um limiar de ativa­ ção a partir do qual as correntes persistentes de entrada de cálcio tornam-se saturadas e sofrem apenas pequenas mudanças com aumentos do potencial de ação sináptico. Também há evidências de que, quando há bloqueio da hiperpolarização pós-potência, as correntes persistentes

24/5/2012 21:57:33


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.