MUITO PARA VIVER - Claudia Bartelle

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MUITO MUITO MUITO MUITO MUITO MUITO MUITO

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MUITO

MUITO MUITO MUITO MUITO PARA VIVER

MUITO

MUITO PARA VIVER

CLAUDIA BARTELLE

EDIÇÃO

www.tabeditora.com

Bartelle, Claudia Muito para viver / Claudia Bartelle. -- 1. ed. -Porto Alegre, RS : Tab Editora, 2022.

ISBN 978-65-998412-0-0

1. Bartelle, Claudia Núbia Warken 2. CâncerPacientes - Biografia 3. Diários 4. MulheresBiografia 5. Relatos pessoais 6. SuperaçãoHistórias de vida I. Título.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) 22-121305

Índices para catálogo sistemático:

1. Câncer : Pacientes : Cura : Biografia 616.9940092

Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129

CDD-616.9940092

Todos os direitos reservados, no Brasil, por TAB Marketing Editorial Felicíssimo de Azevedo 1020/701 - Porto Alegre - CEP: 90540-110 Fone: 55-51-3276.1900 - www.tabeditora.com

FÁ CIO

PRE

A vida é uma linha delicada que bordamos no tecido do tempo.

A trama é puro mistério, liturgia que pede reverência, disposição interior, prontidão de alma. Para cada estação, uma cor, um alinhavo que obedece aos comandos das mãos que ordenam os acontecimentos.

Em última instância, em qualquer que seja o movimento das mãos, como bem sugeriu Guimarães Rosa, “o que a vida quer da gente é coragem”.

E foi com coragem que Claudia Bartelle descobriu que os riscos do bordado modificariam os destinos do seu coração. Viveria um processo naturalmente purificador, que expurgaria os excessos, retiraria a névoa que ofusca a essência, desvelaria o inédito que dela se imporia.

Foi o inevitável e tortuoso caminho das perdas, o ritual que desfolha o que temos, o processo normativo que nos devolve ao estado de semente.

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A dor da travessia foi honestamente assumida, pois o sentido ofe receu a côdea da proteção. O sofrimento humano só é suportável quando batizado pela fé existencial, a convicção que transcende o que sabemos de nós e que amarra as pontas soltas da tragédia, reu nindo-as num único novelo, pronto para ser colocado no tear onde tecemos o manto que nos abriga.

Assim como acontece no útero, a dor nos impõe a solidão. Não se trata de nos faltar alguém, de ausentarem-se o abraço, a mão estendida, o colo pronto, o abrigo que descansa; não, a solidão que a dor nos pede nos ata ao cordão umbilical da divina compreensão, concedendo-nos a graça de redescobrir o essencial, o esclarecimento que nos permite estabelecer o próprio juízo final, condenando o que de nós não merece viver e absolvendo o que de nós merece ressurgir.

A solidão nos educa, põe nos trilhos o que antes estava desencarri lhado, devolve equilíbrio ao que antes estava desequilibrado, reordena o que antes estava desordenado.

Para quem quer, para quem pode e para quem souber, toda travessia, sob sombras, pode dar aos olhos o encantamento de uma ressurreição.

E Claudia quis, pôde e soube. Fez a travessia, bordando, no tecido do tempo, o risco de cada instante. Passeou pela dor, amparada, mas também sozinha, alinhavando horas, minutos, segundos, arregimen tando sorrisos e lágrimas, transformando tudo num mosaico delicado, complexo, que só poderá ser contemplado em sua totalidade quando nos for permitido o distanciamento que o tempo realiza.

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Enquanto isso, no agora que temos, olhamos para o seu rosto glo rificado, delicadamente selado pela coragem, e dizemos: “Passou, Claudia, a lágrima já virou memória, há um novo chão sob os seus pés. Desfrute-o, ainda há muito para viver!”.

PADRE FÁBIO DE MELO

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DEDI CATÓ RIA

Dedico este livro, em primeiro lugar, aos meus filhos, Pedro Paulo e Vittorio, razão do meu viver. Aos meus pais, Paulo e Verna, que me ensinaram o poder da fé, me educaram no caminho do bem e do amor.

Ao meu marido, Pedro, que trouxe a minha força de volta e com o seu amor me tirou do fundo do poço algumas vezes.

E às minhas amigas e médicos citados nestas páginas. Vocês foram essenciais para eu vencer essa batalha.

Em memória do meu tio, frei Benício, que me ensinou a acreditar que existe algo além desta vida e que, tenho certeza, esteve ao meu lado todos os dias dessa luta!

A vocês, leitores e seguidores que me acompanharam, rezaram e tor ceram muito pela minha recuperação.

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MUITO PRA ZER,

sou Claudia Núbia Warken Bartelle!

Nasci em Novo Hamburgo, cidade a cerca de 50 quilômetros de Por to Alegre e conhecida nacionalmente como a capital do calçado. Sou a mais velha de três irmãos. Tenho uma irmã, que se chama Emanuela, dois anos mais nova que eu, e um irmão, José Paulo, três anos mais novo.

Meus pais se conheceram nos anos de 1970 durante uma festa ju nina na minha cidade natal. Minha mãe, Verna Ivone, também nasceu em Novo Hamburgo, e meu pai, José Paulo, filho de um professor e uma dona de casa, nasceu em Não-Me-Toque, cidade do interior do Rio Grande do Sul.

Em busca de uma condição melhor de vida, ainda jovem, ele se mu dou para Novo Hamburgo para estudar e trabalhar, pois na época a indústria calçadista já havia se consolidado e abria várias portas para quem procurava trabalho. Filho de uma família de 10 irmãos, ele sem pre acreditou em conquistar seu espaço sozinho.

Já minha mãe era filha de dono de uma fábrica de sapatos e cartona gem e uma dona de casa que tiveram seis filhos, sendo ela a terceira. Sempre foi muito bonita, e chamava a atenção por onde passava, tendo participado de alguns concursos de beleza da época. Trabalhou na em presa do meu avô, adorava o que fazia, mas deixou tudo para se dedicar ao papel de mãe, quando eu nasci. Meu pai diz até hoje que se apaixo nou imediatamente por ela logo que a viu na festa.

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Uma das coisas que marcaram minha infância foram as vezes em que íamos visitar a família do meu pai no interior. Que saudade! Passávamos o dia inteiro brincando com meus primos, tomando os longos e rechea dos cafés da tarde. Corríamos nas plantações de soja, nos campos com vacas, bois e outros animais, além de brincar nos gelados riachos. Às vezes íamos também na casa dos meus avós maternos, que foram morar em São Francisco de Paula, na Serra Gaúcha, passar os finais de semana, onde também todos os primos se encontravam. Lá adorávamos fazer fo gueiras com os galhos secos de araucárias, árvore típica da região.

Já nas férias de verão, íamos para a nossa casa de praia, no litoral gaúcho. Quando o dia era ensolarado, não saíamos da água até o sol se pôr, e minha mãe ficava cansada de tanto nos chamar. Se chovesse, era hora de nos ensinar a costurar, bordar, tricotar e fazer crochê, entre outras coisas. Agora, durante a pandemia, retomei o bordado e o tricô só para matar as saudades daqueles tempos de final de ano. Tive uma infância muito feliz e os ensinamentos passados pelos meus pais nes sa fase da vida foram essenciais para a minha formação como mulher, como ser humano e como profissional. Tenho muito orgulho e admira ção por eles e sempre agradeço a Deus pela linda família em que nasci.

A adolescência chega e junto com ela as primeiras preocupações com o futuro. Fiquei pensando durante os três anos do ensino médio que curso escolher para fazer na faculdade, que profissão seguir. Pres tei vestibular para Direito, mas abandonei a ideia ali mesmo durante a prova, pois caiu a ficha de que não tinha nada a ver comigo.

No vestibular seguinte, optei por Psicologia. Sempre gostei de li dar com o ser humano, entender as pessoas e seus comportamentos.

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Concluí o curso e gosto de pensar que foi uma faculdade pra vida. Uso diariamente o que aprendi. Depois de formada, trabalhei por um ano em uma empresa na área de Recursos Humanos, seleção de pessoal e qualidade total. Mas algo dizia que ainda não era bem isso que me deixaria plenamente feliz profissionalmente. Nessa época morava em Novo Hamburgo e já namorava o Pedro Bartelle, que estava vivendo em Buenos Aires. Decidi então que queria mudar para uma grande cidade, respirar novos ares e ter outros horizontes. Coloquei no papel os prós e contras de alguns locais que me interessavam, e São Paulo ganhou. Fui, então, de mala e cuia, com se diz, para a capital paulista.

Foi lá que minha vida profissional começou a se desenhar e se con cretizar. Resolvi seguir o caminho que meu coração apontava: a pai xão que nutria por moda e design em geral, mas especialmente por design de joias.

Mas primeiro fui fazer o curso de Administração de Empresas, com o apoio do meu pai, que sempre quis que eu trabalhasse com ele. Em paralelo, comecei a trabalhar numa loja de sapatos – acho que está no sangue – de uma marca inglesa. Assim que terminei o curso, finalmen te iniciei o de Design de Moda. Era realmente o que eu queria. Lembro que passava as madrugadas fazendo desenhos do jeito que sempre so nhei. Sou filha de uma mãe que é uma excelente pintora, tem um atelier em casa, e volta e meia eu ficava lá fazendo algumas telas e desenhos, bem amadores ainda, reconheço. Concluí o curso de desenho e iniciei o de Design de Moda, mas acabei não terminando, pois nesse meio -tempo eu e Pedro nos casamos e voltei então a morar no Sul. Levava na bagagem muito conhecimento, sonhos e cada vez mais a paixão pela moda e tudo o que faz esse mundo fascinante girar.

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Em Porto Alegre, alcei meus primeiros voos solo nesse sentido. Mas eu queria mais espaço para mostrar e falar sobre o que pode deixar uma mulher, um ambiente ou uma ocasião mais bonitos, belos e inesquecí veis. Assim começou minha experiência no dinâmico e diversificado mundo das redes sociais.

Ser influencer era a porta que eu esperava abrir.

Minha vida como blogueira teve início a partir de um convite da em presária e expert em marketing digital Alice Ferraz, para escrever uma coluna semanal para o blog dela, sobre look do dia e tendências. Es crevi para esse canal por um ano e posso dizer que foi uma experiência fascinante. Me identificava completamente. Mas tive que parar quando engravidei do meu segundo filho. Entretanto, sentia que aquilo fazia uma grande falta para mim. Um ano depois estava de volta a esse mun do, novamente na empresa FHITS, mas agora como influenciadora e escrevendo o meu próprio blog, que falava sobre moda, tendências, viagens e lifestyle. Foi quando deslanchei de vez. Passei a cobrir as principais semanas de moda do mundo, como as de Londres, Paris, Nova York e Milão, fazendo parte da plataforma de influenciadoras dessa empresa, onde estou há 10 anos.

São vários os trabalhos, desde falar de um produto, uma empresa até desenvolver e fazer curadorias. Já fiz diversas ações sobre roupas, sapatos, óculos, louças, joias, etc.

Adoro me comunicar com as pessoas, influenciar sobre algo bacana, mostrar como elas podem usar determinada roupa, se maquiar, usar produtos de beleza, arrumar uma mesa, a casa. Gosto também de mos

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trar caminhos que ajudem pessoas a fazer o bem ao próximo. E quando uno os dois objetivos, então, tudo faz sentido para o meu ideal de vida. Felicidade dupla.

Posso afirmar que conquistei quase tudo o que almejava: formei uma linda família, com um marido maravilhoso e dois filhos que amo de mais; tenho muitos amigos, trabalho com o que gosto, mas nem por isso a vida deixa de nos brindar com surpresas, nem sempre agradáveis, que balançam nossa estrutura, como a descoberta do câncer de mama. O meu, graças a Deus, precocemente. Foi isso que aconteceu comigo, a doença mexeu com minha saúde, abalou meu emocional e minha au toestima aos 40 e poucos anos de idade.

Este livro é sobre a trajetória de um ano em que tive que lidar com essa nova realidade. Nas páginas seguintes exponho o processo, as emoções, as certezas e incertezas de se viver sob o jugo dessa tão te mida situação. Escrevi por acreditar que minha experiência pode aju dar outras pessoas a enfrentarem momentos como esse. E porque meu coração pediu que dividisse tudo que se passou comigo. Aqui está o caminho que percorri…

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Sua vida sera o que voce construir.

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MEU DIÁRIO

Este meu diário é fruto de um acontecimento que marcou minha vida para sempre: a chegada de um câncer de mama. A suspeita, os pri meiros exames, o diagnóstico, a confirmação, a difícil e dolorosa bata lha, mas imprescindível, para enfrentar o tratamento, com cirurgia e quimioterapia, até chegar o momento mais esperado por um paciente oncológico, que é ouvir dos médicos: você está curada!

Mas este diário também tem um objetivo, que é dar andamento ao meu novo propósito de vida. Decidi que esse nódulo que descobri era um desafio, que iria vencê-lo e sairia curada. Por isso, faço deste relato um instrumento para dizer às mulheres de todas as idades e classes sociais a importância do autoexame, da visita regular ao seu médico, do desco brimento precoce e do tratamento quando a doença ainda está no início.

Depois desse episódio, passei a entender que a vida da gente pare ce estar sempre por um fio, mesmo sem nos darmos conta disso. Num curto período de cinco meses, em 2021, saí de uma vida confortável, com muita saúde e alegria para viver os dias mais tensos e difíceis de toda minha existência. De uma simples consulta de rotina em maio, com o meu ginecologista, à retirada das minhas mamas e à quimiotera pia pouco tempo depois.

Foram momentos de angústia, sofrimento, dor, desânimo, novi dades e muitas surpresas a cada minuto. Mas também de períodos de amor, compreensão, amizade, gratidão, reconhecimento do profissio

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nalismo da equipe médica e muita, muita fé em Deus e em Nossa Se nhora, e de orações.

Estão descritos aqui dias em que aprendi e compreendi o quanto é importante ser forte, positiva, contar com o apoio das pessoas que você ama e se apegar à espiritualidade. São ensinamentos que te levam a su perar toda essa dor e atingir a tão esperada e desejada cura.

E foi esse nódulo de 6,6 mm que por pouco não causou um estrago fatal em minha vida. Se avançasse no meu corpo ele teria me derrubado, jogado na lona, me nocauteado. Quando o diagnóstico chega, o chão se abre sob seus pés e você fica sem piso, sem teto, sem nada. O câncer é impiedoso e te faz repetir várias vezes a mesma pergunta: por que eu?

E aí, nesse momento, você aumenta seu universo de questionamen tos: e agora, o que será dos meus filhos que nem os vi crescer ainda, do meu marido, da minha família e amigos, do meu trabalho, da minha vida? De um minuto para o outro você sente na pele o verdadeiro sen tido da frase “meu mundo caiu”.

Afirmo, mais uma vez, que foram os piores dias já vividos ao longo dos meus 40 e poucos anos. Apesar de todo o turbilhão de notícias nada positivas que viriam ainda no início do descobrimento da doença, decidi tornar aquela surpresa o início do restante da minha vida, NOVA!

Agora uma vida vista com diferentes olhares e conceitos, como o de valorizar cada minuto vivido, cada amanhecer e ar respirado, cada rela cionamento, independentemente da pessoa, do ser humano, conheci

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do ou que você nunca tenha visto. E, principalmente, procurar ajudar cada mulher que está passando, ou que ainda vai passar, pelo que vivi.

Quero tornar este meu diário um instrumento de esclarecimento para quem o ler, pois fala dos medos, aflições, sentimentos que nos afetam e de momentos de superação. Com isso, amenizar ou pelo me nos preparar a pessoa minimamente para o que vier pela frente.

O câncer de mama é apontado como o tipo de câncer que mais incide em mulheres no Brasil, depois do câncer de pele não me lanoma. E também a primeira causa de morte entre elas. Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão do Minis tério da Saúde, são esperados mais de 66 mil novos casos e cerca de 18 mil mortes, somente em 2022.

E a entidade faz um alerta: a incidência e a mortalidade por câncer de mama tendem a crescer progressivamente a partir dos 40 anos de ida de. Por outro lado, é um dos tipos de câncer com os mais altos índices de cura quando descoberto e tratado precocemente.

“Por que eu?” Hoje sei a resposta. Sobrevivi para dizer: fé na vida e jamais desista dela. Nunca deixe de lutar. O diagnóstico precoce é a melhor prevenção e, consequentemente, o início da cura. Quem se ama se cuida!!!

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MUITO ANTES DE TUDO

20 de maio de 2021 | Quinta-feira

“As melhores coisas acontecem para quem se levanta e faz.”

Ao acordar, numa manhã cinzenta e com um friozinho mais acentua do, que dá sinais de que o inverno está chegando, ainda na cama penso nos afazeres do dia.

Além da rotina habitual – filhos indo para a escola e os compromissos profissionais –, lembro que tenho consulta com meu médico, o doutor João Steibel, conceituado ginecologista e obstetra do Rio Grande do Sul, mas pelo tempo em que me cuido com ele, há vários anos, para mim ele lembra mais aqueles tradicionais médicos de família.

Seria essa mais uma consulta que faço anualmente. Mas dessa vez tem algo diferente, que vem me deixando intrigada: faz três semanas, mais ou menos, que estou com dor nas mamas. Elas estão doloridas como se eu estivesse grávida; além de me incomodar, isso está mexen do até com meu humor.

Durante a consulta o doutor João me examina e dá o seu parecer: estou com o exame clínico sem nódulos palpáveis, mas com a mama en tumescida. Fala que pode ser por uma alteração hormonal, um excesso de progesterona ou talvez pelo ciclo menstrual.

Como de rotina, pede exames de sangue, mamografia, eco mamária e eco abdominal. Isso me deixa mais tranquila, mas não menos intriga da com meu desconforto na mama.

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26 de maio de 2021 | Quarta-feira

“Se você tiver força e fé, hoje vai dar tudo certo.”

Marquei a mamografia e outros exames para hoje. Quando eram duas horas da tarde eu não sabia se sentia mais fome, pelo jejum, ou frio, pois tanto lá fora quanto na sala de espera do setor de mamografia o ar estava bem gelado. Sentia meu corpo tremer.

Chegou minha vez. Nunca me doeu fazer a mamografia, mas nesse dia minha mama direita estava um pouco mais sensível, e pensei: que chato isso!

Me chamaram novamente para outro exame, agora o ultrassom. Vol tei para a espera e depois de longos 40 minutos aguardando, finalmente a médica me atendeu para fazer a eco mamária.

Deitada de braços para cima, sendo examinada, escuto:

“Encontramos um nódulo aqui. Seria bom você fazer uma ressonân cia e uma biópsia. Ele tem 8 mm e está no início. É bom falar com o seu médico”, disse a doutora, sem muito alarde.

Não sei exatamente o que pensei naquele momento. Mas foi algo que parecia congelar o meu cérebro.

“Nódulo? Como assim? Eu nunca tenho nada!!!”, disse, de forma in crédula, sem processar direito o que ela havia acabado de falar.

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Rapidamente me veio à cabeça o que tinha dito ao doutor João, na consulta da semana passada: que em dezembro último tinha feito um exame genético para câncer de mama e tinha dado negativo. Cheguei a comemorar! Falei para ele como tinha ficado feliz, que era menos uma coisa para me preocupar. E confesso: cheguei a pensar que os exames de mama já não seriam a coisa mais importante a fazer.

Caminho para fora da sala meio em estado de choque, mal sabendo onde era a porta da saída do consultório. De imediato, disparo mensa gem para o meu médico. Na sequência, ligo para o Pedro, meu marido, já quase aos prantos. Estava completamente desnorteada.

Mesmo sem saber o que o nódulo significava, se era apenas um susto sem consequências maiores, não posso negar que o medo tomou conta de mim. Sentia meus neurônios fervilhando em minha cabeça. A sensa ção de fragilidade é enorme e senti o chão se abrindo aos meus pés.

Fui para casa com uma sensação de vazio. O pensamento meio perdi do. Nunca havia me sentido assim tão amedrontada.

Lembrei que tinha marcado um encontro com as minhas amigas, mas não tinha a mínima condição de ir. Justo eu que sempre me considerei uma mu lher forte, segura, física e mentalmente. Via essa fortaleza saindo de cena.

Pedro chegou em casa sem demonstrar qualquer desespero e calma mente disse que tudo iria dar certo. Que eu era forte, positiva e que tinha certeza de que não seria nada grave. Mas disse também que se fosse algo mais complicado iríamos resolver juntos, com fé e coragem, e que no final tudo ia ficar bem.

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Não demorou muito e o doutor João me ligou. Com sua voz tranqui lizadora, foi logo dizendo para eu não ficar pensando bobagem, pois sabia que era isso que estava passando pela minha cabeça naquele mo mento. Concordei com ele, mas mesmo assim não consegui segurar as lágrimas. Combinamos que ele veria os exames no dia seguinte.

É muito difícil não chorar numa hora dessas. O tempo todo você fica refletindo sobre sua vida e pensando: será que chegou minha hora? Lembra de todas as histórias sobre o câncer de que já ouviu falar, das que venceram e das que não venceram. Estou vivendo os piores minu tos da minha vida, pensei.

À noite, a Cynthia Requena e a Anelise Goldsztein, duas grandes amigas, me mandaram mensagens. Elas sabiam que algo não estava bem, porque nunca desmarco um compromisso. Sempre dou um jeito de resolver as coisas e ir aonde tenho que ir.

Ao ver as mensagens fiquei na dúvida se queria dividir os aconteci mentos, mas pensei que seria melhor elas saberem de uma vez. Tomei coragem e escrevi para as duas contando tudo o que estava acontecendo.

É incrível a sensação de vulnerabilidade que toma conta da gente em uma situação como essa. “Nada está confirmado, pode não ser nada…”, fico falando para mim mesma. Mas a possibilidade de ser um câncer é um fantasma tão apavorante que ronda os meus pensamentos sem trégua.

Deitada em minha cama, não sei se para buscar uma resposta sobre tudo o que está acontecendo, por alguns instantes faço uma retros pectiva de como estava sendo minha vida nos últimos anos. Venho de

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uma rotina de trabalho intensa, mas muito satisfatória e compensado ra. Faço o que gosto, mexo com moda, beleza e meu trabalho atinge pessoas que gostam disso. Sou influenciadora digital com milhares de seguidores em todo o país e até no exterior.

Meu lado familiar é muito harmônico. O Pedro, meu marido, é muito mais que um companheiro. Sempre penso que existe um certo milagre em nosso encontro. Temos dois filhos, o Pedro Paulo, cari nhosamente chamado de PP, e o Vittorio. Sem modéstia, sinto orgu lho em dizer que somos a síntese de uma família feliz, que transborda e irradia amor e cumplicidade. Não nego que temos nossas diferenças e opiniões divergentes e, bem de vez em quando, algumas pequenas desavenças. Mas nada que abale nossa união. Felizes e ponto. Só te nho a agradecer!

Para completar minha rotina, prezo muito por minha saúde. Me exercito regularmente, procuro me alimentar da forma mais correta possível. Raramente esse meu ritual é quebrado, e o exagero, na quan tidade e na qualidade, não acontece com frequência.

Minha vida social e meu lado espiritual vão bem, obrigada! Participo de diversas ações sociais que beneficiam e procuram melhorar, direta e indiretamente, a vida de centenas de pessoas mais necessitadas, além de instituições de amparo.

Sempre me preocupei muito em ajudar as pessoas. Acho que vem de berço, herança dos meus queridos pais. Fazer o bem, sem olhar a quem! Carrego esse lema comigo. Acredito também que muito disso tem a ver com minha religiosidade. Tenho muita fé em Deus e em

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Nossa Senhora, que guiam meus dias, meus passos, minha alma e meu coração. Isso me faz crer que nunca devemos desistir de viver. A vida nos prega muitas surpresas, algumas delas indesejáveis, como o mo mento que estou passando.

Depois de uma noite em que demorei a pegar no sono e de uma madrugada agitada, com pensamentos inquietantes, acordei com um monte de interrogações na cabeça. Mas algumas insistiam em ficar martelando o tempo todo: Por que eu? Por que isso agora?

Tinha combinado almoçar com minha mãe. Era o momento de dar a notícia a ela, mas não queria mostrar meu abalo, porque sabia que ela ficaria muito triste. Com voz firme e expressão serena, falei o que es tava acontecendo e, na sequência, completei dizendo que meu médico estava vendo tudo e que era para ficar tranquila. Percebi que ela sentiu firmeza em mim, no que dizia, mas só eu sabia o quanto estava angus tiada por dentro.

Na oportunidade, recordamos que muitos anos atrás ela também teve dois nódulos e que os tirou e nunca mais teve nenhum problema. A conversa estava tão envolvente que mal demos conta de que a comida já estava servida. Aproveitou e me deu a receita que seguiu: fé inaba lável e força do pensamento positivo. Essas também são heranças que carrego comigo, na mente, no coração e na alma.

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“Antes de tudo, fé. Depois de tudo, gratidão.”
27 de maio de 2021 | Quinta-feira

Mas quem é mãe sabe do que os filhos precisam em momentos di fíceis. Providência de mãe, acredito. Desta vez a minha acertou em cheio. Trouxe para mim uma linda imagem de Nossa Senhora das Gra ças, que depois coloquei em um lugar especial em meu quarto. Era o presente pelo Dia das Mães que, neste ano, ainda estava atrasado.

Estou vivendo uma fase muito ligada a ela. E isso me enche de con forto e paz. Me sinto segura e protegida com sua presença. Ela é uma mulher de muita fé, que reza por todos, muito forte e resoluta. Me en sinou a ser assim também. Pensamento positivo é a chave!!! Saí desse encontro mais fortalecida. E acredito que ela também teve esse senti mento. Ao levantar da mesa do almoço senti meu coração dizer: como é bom ter pessoas amadas para compartilhar momentos como este.

O dia prometia ser ainda mais intenso. Ou seria tenso? À tarde en contrei a Anelise e a Cynthia, num clima de bastante expectativa e an siedade para as três. Com a intenção de tornar sua história de vida um remédio tranquilizante para mim, Anelise nos contou que sua expe riência com essa terrível possibilidade de doença foi bem difícil, mas que no final a biópsia tinha vindo boa. Ela falava que o nódulo dela era BI rads 4B, e eu ainda não sabia qual era o meu nem o que essas letras e números significavam realmente.

Assusto-me com o meu celular tocando naquele exato momento. E mais ainda quando aparece “Dr. João” no visor. Fiquei nervosa. Por um instante, hesitei em atender. Medo do que poderia ouvir? Acho que sim, mas logo veio à mente o que conversamos, minha mãe e eu, horas antes. Fé inabalável!

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Atendo e o doutor João vai direto ao assunto e fala que realmente vou ter que fazer biópsia, mas que não era para me preocupar. Percebo que essa frase começa a ser frequente: “Não se preocupe”. Disse que tinha 97% de chances de ser um tumor benigno, mas por causa desses 3% tínhamos que checar. Ele estava falando com o doutor Daikir Lou renço, para agendar um dia e horário para fazer a biópsia.

Sempre fui católica e devota de Nossa Senhora. Agora, mais do que nunca, pedia fervorosamente a ela que me iluminasse e que se tivesse algo ruim ali no meu seio, que sumisse de algum jeito. E ao mesmo tempo já agradecia por ter descoberto tão cedo e tão pequeno. Isso era a certeza de que ela estava comigo!

Lembrei da minha psiquiatra, doutora Alina de Paiva, que cuida de mim há muitos anos. Liguei e contei tudo. Ela também já passou por um câncer, e conhece bem essa sensação de incerteza e insegurança. No final me deu os parabéns por fazer os exames anualmente. Pensei: que curioso receber os parabéns por isso, mas tem tanta gente que não faz seus exames periodicamente, não é?

O doutor João liga e diz que a minha biópsia está marcada para as 7h15 de amanhã, com o doutor Daikir.

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O ENCONTRO COM O INESPERADO

28 de maio de 2021 | Sexta-feira

São sete horas e já estou no hospital. E, obviamente, apreensiva. En contro o doutor João, que me entrega a requisição e diz pra ficar tran quila. Como tranquila? Eu não conseguia estar calma naquele momen to, nem por decreto. Impossível! Mesmo assim agradeci imensamente suas serenas palavras.

Eu não me reconhecia. Todos sabem que sou uma pessoa falante, que pergunto tudo, falo até pelos cotovelos. Estava muda, calada. Pare cia que um gato tinha comido minha língua, como falamos às crianças quando estão emburradas.

Não perguntei nem como seria a biópsia. No meu pensamento, es tava ali para fazer o que tinha que ser feito. Não interessava se seria do lorido, ruim, desconfortável. Tem que fazer, vamos fazer. Sem drama, na medida do possível.

Fiz a biópsia e não foi tão ruim, com certeza pelo efeito da anestesia. Mas sentia que o ar estava denso, a energia pesada. Sim, obviamente minha própria energia não estava normal como o habitual. Eu estava sentindo tudo, minha sensibilidade estava à flor da pele. A sensação era de alerta, de atenção a tudo que se passava à minha volta. Nunca tinha vivenciado minha percepção de forma tão acentuada. Estava absoluta mente presente naquele lugar e naquela hora.

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“Foco, paciência, dedicação e autocontrole.”

Hoje é sexta-feira. Disseram que o resultado sairia em cinco dias úteis. Para complicar, tem um feriado no meio da semana seguinte. Muito tem po para quem espera um resultado de exame de tamanha importância. Mas conseguimos saber que meu nódulo é BI rads 4A. A letra “A” era uma coisa boa. Mas não o suficiente para dizer que posso ficar aliviada.

O doutor João mandou mensagem dizendo que iria acompanhar o resultado mais de perto. Que não poderia prometer, mas que iria tentar conseguir antecipar. Essa notícia ajudou a me tranquilizar um pouco.

De repente me peguei pensando na importância que o doutor João tem em minha vida. Ele cuida da minha saúde desde antes do nasci mento do meu filho mais velho, o PP. Esteve ao meu lado em diversos momentos, bons e ruins, e sempre me tratando com muita dedicação. Quando tenho algum “probleminha” em casa, ligo pra ele. Um espirro mais forte das crianças e até mesmo quando meu marido precisa de al gum atendimento, é nele que penso.

Na volta do hospital encontro a Rose, que trabalha para mim há mais de 18 anos, desde que fui morar sozinha em São Paulo. De lá para cá, cuida de mim, das crianças e do Pedro, como se fôssemos sua própria família. Ela abriu a porta de casa e me deu um forte abraço. Nos emo cionamos e, entre as lágrimas, ela disse que me amava. Meu coração pulou de emoção e gratidão.

Desmarco todos os meus compromissos do dia. Mas à tarde deci do cuidar um pouco de mim, pois tenho uma campanha fotográfica no início da próxima semana, em São Paulo. Será o lançamento da minha coleção de joias chamada “Minha Essência”, programada há meses.

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Estou ansiosa e bastante empolgada, apesar de tudo. É a primeira vez que vou fotografar uma campanha de joias desenhadas por mim na ca pital paulista. Promete ser um sucesso!

Me cuidar e direcionar a cabeça para o trabalho me faz muito bem. Para minha alegria, a Cynthia foi me encontrar no salão. Ainda bem, por que ela me conhece e sabe me fazer dar boas risadas. Mesmo com minhas energias em baixa, ela sempre consegue me deixar com um ótimo astral.

Mais tarde, já em casa, liguei para a Lalá Noleto, uma alma que Deus me deu de presente. Não sei explicar, mas temos uma ligação muito forte. Sinto como se já a conhecesse de outras vidas, se é que isso exis te. Sou madrinha de casamento dela e em todas as provas do seu vestido de noiva eu estava lá, ao lado dela. Na última prova a emoção tomou conta de mim. Era como se estivesse acompanhando uma irmã.

Pra variar, como já estava ficando corriqueiro, me abalei quando contei pra ela sobre o nódulo. Lalá também é uma pessoa muita reli giosa e falou para ter fé, que tudo iria dar certo. Suas palavras me deram muito conforto.

À noite, Pedro e eu ficamos assistindo TV. Mas logo me dei conta de que havia algo diferente no ar. A mesma sensação de presença que havia sentido pela manhã voltou a tomar conta de mim. Sentia o ar, a energia, a mão dele segurando a minha, cada toque de pele, tudo de forma dis tinta e intensa. Acho que nunca estive tão no aqui e agora na minha vida. Acredito que uma sensação parecida com essa deve emergir com boa parte das pessoas que se veem em uma situação de perigo eminente. Mas minha percepção é que passei a viver a vida de forma mais intensa

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por entender que tudo nela pode ser efêmero, passageiro e que de uma hora para outra tudo pode mudar. Uma doença pode surgir, alguém pode partir… A verdade é que nunca sabemos qual será o último dia feliz e com saúde que teremos. Vivemos correndo e não paramos para aproveitar cada instante que temos. Muitas vezes não enxergamos, nos pequenos detalhes, nas coisas que achamos serem simples, algo que pode nos trazer alegria, sabedoria, paz e felicidade. Então, naquele momento, sentada naquele sofá, decidi que iria aproveitar cada minuto de forma absoluta, com toda calma e atenção. E assim o fiz.

31 de maio de 2021 | Segunda-feira

“Não há sucesso sem dificuldade, como não há vitória sem luta.”

Começa uma nova semana, e eu cheia de expectativas, em relação à saúde e também ao lançamento da minha campanha. Como iríamos viajar pra São Paulo à tarde, decidi fazer uma escova bem caprichada no meu cabelo, pois estaria cheia de reuniões e compromissos com algu mas marcas de moda.

Quando estava quase pronta, dei uma espiada no celular e havia uma mensagem do doutor João.

“Posso te ligar?”

Ao ler, senti meu corpo estremecer. Pressenti que o que viria a se guir não seria bom nem tão fácil. Mas pensei de imediato: medo agora não cabe. Vou sair desta, sem nem saber o que realmente era.

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O doutor João disse, sem rodeios, que o resultado da biópsia não ti nha sido o que nós esperávamos. Que ele realmente não queria dar aque la notícia, mas era a verdade. Eu tinha células malignas no seio. Isso, tor nei-me uma pessoa portadora de câncer. “Repete, por favor”, pensei! Enquanto parte de mim tentava negar aquela dura realidade, outro pen samento me invadiu e me atingiu, como um raio: lembrei dos meus filhos e do meu marido. Foi nesse exato momento que exclamei com força para mim mesma: quero viver muito, vê-los crescer, para ensinar tudo o que ainda não deu tempo de ensinar. Para amar tudo o que ainda tenho para amar, tanto para ajudar. Eu tenho tanto para fazer na vida ainda!!!

Para não deixar eu desabar de vez, imediatamente ele diz que havia fa lado com um amigo mastologista de extrema confiança e experiência, o doutor Antônio Frasson, e que ele esperava a minha ligação. Disse que ha via muitos bons médicos nessa área e que o doutor Frasson era um deles.

Já falei o quanto confio no doutor João, né? Então tinha plena cer teza de que sua indicação seria o melhor pra mim. Não perdi tempo, pois passei a considerar esta palavra “tempo” uma coisa preciosa no vocabulário da minha vida. Liguei na hora e, de imediato, ele atendeu.

Perguntou se poderia ser por meio de chamada de vídeo, pois gos taria de me olhar nos olhos. Gostei dessa atitude, que me passou con fiança logo no primeiro contato. Me conta que divide seu atendimento entre a PUC-RS e o Hospital Albert Einstein, na capital paulista. Mas que hoje estava no consultório da PUC, em Porto Alegre. Perguntou se eu não poderia ir lá para nos conhecermos pessoalmente e ele explicar como iríamos proceder dali pra frente. “Meu Deus, tudo muito rápido, tudo ao mesmo tempo.”

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Aos poucos a ficha começa a cair e meu mundo, a girar. Liguei para o Pedro, aos prantos. Perdi o controle naquela hora. Me via como um pe queno barco durante tempestade em alto-mar. “Eu estou com câncer!” Essa frase martelava insistentemente em minha cabeça, sem dar trégua. Se misturava com pensamentos arrepiantes, como o medo de morrer. O Pedro estava na academia e imediatamente veio pra casa.

Fomos juntos para a PUC. Ele dirigindo e eu totalmente perdida, sem saber em que plano estava. Muita coisa passando pela minha cabe ça, o que aumentava ainda mais a sensação de desespero. Tentava pisar em terra firme, sem sucesso.

Finalmente chegamos ao consultório. Minhas conturbadas condi ções no momento impediram de me apresentar melhor. Mas o doutor Frasson, superatencioso e profissional, explicou de forma bem didáti ca todos os procedimentos que iriam acontecer de imediato. Tínhamos que tirar aquelas células que não estavam se formando corretamente. Disse também que precisava repetir os exames em São Paulo, fazer uma ressonância para ter maior precisão do tamanho do nódulo e uma investigação genética mais específica.

Ficamos quase duas horas conversando. E eu pensando que todo aquele assunto sobre o qual não sabia nada até agora passaria a fazer parte do meu cotidiano dali pra frente.

Afirmou também que, provavelmente, depois de uma semana após a cirurgia teria que enfrentar três semanas de radioterapia, todos os dias, exceto sábado e domingo, e que não precisaria de quimioterapia. Menos mal, pensei. Mas por outro lado, teria de tomar uma medicação

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por um tempo. Falou também que já que estávamos indo a São Paulo, na manhã seguinte eu iria repetir todos os exames por lá, pois ele pre tendia operar já na quarta-feira. Fiz um sinal de positivo com a cabeça e falei que queria tirar logo isso do meu seio.

Saio do consultório tão perdida como quando cheguei. Minha mente continua numa turbulência só. Mas uma luz surge e diz que vou pre cisar de muito pensamento positivo, orações, a força e o carinho da minha família e amigos, e, o que não poderia faltar, a proteção de Deus e de Nossa Senhora. Sei que enfrentaria horas de muito medo. Medo do desconhecido, da doença, da morte, medo de viver tão pouco. Medo de tudo o que me esperava pela frente.

Sempre fui muito orgulhosa dos meus seios. Tenho peito peque no, amamentei os meus dois filhos e depois de parar a amamentação eles voltaram exatamente como eram antes, quase que por milagre. Me enchia de orgulho de ter peitos de “adolescente”, dizia. Gostava do tamanho deles e brincava que era “despeitada” com orgulho! Por isso, quando o doutor Frasson estava fazendo o exame clínico e me pergun tou se eu nunca tinha pensado em mexer nos seios, em colocar silico ne, eu respondi que mexer nas minhas mamas sempre foi algo fora de questão. Pelo menos até agora.

Logo que cheguei em casa comecei a desmarcar todos os compromissos, inclusive um presencial que tinha à tarde antes de embarcar a São Paulo.

Mas tinha coisas difíceis para fazer, porém necessárias. Liguei para a FHITS, plataforma em que trabalho como influencer, e falei com a Carol Quinteiro, uma das diretoras. Muito emocionada e com um nó na

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garganta, contei o que estava acontecendo e que não poderia mais fo tografar a campanha da minha coleção de joias que estava marcada para quarta-feira, pois seria o dia da minha operação. Muito delicadamente, ela falou para não me preocupar que elas dariam um jeito. Que agora a minha prioridade era outra. Isso me deixou tranquila.

Sou comprometida com tudo que faço. Nunca desmarquei nenhum trabalho. Confesso: fazer isso me deu uma certa chateação, mas a se riedade do problema pedia mais atenção. Eu simplesmente não tinha condições emocionais de fazer mais nada extra, que não fosse cuidar da minha saúde a partir daquele momento.

O doutor Frasson falou por mensagem comigo mais algumas vezes e sempre dizia para ficar tranquila, que tudo iria dar certo. Acreditava fir memente nisso!

Mas eu continuava mental e emocionalmente perdida, mesmo estan do dentro da minha própria casa, rodeada pelas pessoas que amo. Fiz as malas com a cabeça sei lá onde. Parecia uma barata tonta. Não sabia o que exatamente iria acontecer. Era muita informação em um curto espaço de tempo. Aliás, tinha de ficar atenta ao tempo. Eram quase três da tarde e não tinha almoçado ainda, não tinha a menor fome e não esta va conseguindo me concentrar. Nunca coloquei tanta coisa numa mala. E nem sabia quanto tempo iria ficar fora.

Liguei para a Cynthia e disse que iríamos adiantar o voo, e perguntei se eles ainda gostariam de ir para São Paulo, pois os planos foram alte rados. Ela e o José Luiz, seu marido, já iam conosco para ir a um aniver

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sário que tínhamos à noite. Ela falou que não me deixaria sozinha nesta hora e que mesmo que os planos tivessem mudado eles iriam também.

Sabia que uma das situações mais difíceis por que passaria nesse iní cio de tratamento seria o momento de dar tchau aos meus filhos. Quando chegou a hora, enfraqueci e chorei. Meu filho mais velho olhou pra mim e disse carinhosamente: “Mas, mamãe, não precisa chorar, pois não vão ser muitos dias!”. Com a voz um tanto embargada, disse que os amava e que já estava com saudades e por isso tinha me emocionado. Ele veio e me deu um abraço que jamais vou esquecer pelo resto da minha vida!

Para mim, filhos são tudo! Tenho esse sentimento mesmo antes de ser mãe. Na minha cabeça a vontade de ver meus filhos crescerem e de estar presente na vida deles o tempo todo é o meu plano para o futuro e minha maior motivação para vencer este câncer!

“Deus, não me tira isso, por favor!!!”, dá vontade de gritar.

Mas sou forte e vou aguentar. Comecei a pensar que sou muita aben çoada, sortuda, pois como disse o doutor Frasson na consulta, menos de 5% das pessoas descobrem um tumor tão pequeno.

Sempre acreditei que na vida há coisas que temos que passar, que encarar, e que vão nos tornar seres humanos melhores, mais fortes e com mais coragem. E se isso veio para mim, então vamos lá!

Peguei minha Nossa Senhora das Graças (uma miniatura da santa que tenho) e coloquei no meu bolso! Quando entrei no avião e contei para a Cynthia que meu médico era o doutor Frasson, ela disse:

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“Olha, ele é muito bom. Curou minhas duas tias e uma amiga há muitos anos e nunca tiveram reincidência!”

Bom saber disso. Vai nos aliviando e nos deixando mais fortes. Mas volta e meia meu pensamento se perdia. Esquecia o que estava falando, ia para um território desconhecido, onde nunca tinha posto meus pés. Parecia um fluxo automático, que não conseguia dominar.

Foi uma viagem cheia de emoções, apoio e reflexões. Pousamos em São Paulo, cidade que tem de tudo. Inclusive os principais avanços ao que se refere à saúde, à medicina, à tecnologia e aos profissionais da área.

Decidimos cancelar a ida ao aniversário. Até queria me distrair, mas sentia que não tinha clima, além de ter que acordar supercedo no outro dia para ir ao hospital.

Sabia que seria uma estadia de muita correria, exames, notícias tal vez complicadas, mas também repleta de carinho e atenção por parte do Pedro e dos meus amigos, os que estavam próximos e os distantes. Logo quando cheguei no quarto do hotel, recebi um lindo arranjo de flores, todo em tons de rosas e lilases, com um cartão cheio de amor e esperança da Lalá, Diego, Pedro e Lulu.

Lalá e Diego Sala foram nos visitar. Quando ela chegou nem falamos nada, só nos abraçamos e choramos. Pedimos room service e jantamos todos os seis juntos no quarto.

Mais tarde, recebi ligação da Alice Ferraz e Carol Quinteiro, direto ras da FHITS, querendo saber como eu estava. Falaram também sobre

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a campanha das joias e que elas pensaram em colocar alguém próximo a mim para fotografar. Na mesma hora falei o nome da Lalá e que não teria melhor pessoa para fazer isso. A minha amiga que amo tanto iria fotografar as peças que eu tinha desenhado. Então decidimos mudar o nome da coleção para “Amizade”.

Já falei que a Lalá e eu somos como irmãs. Nos conhecemos em fe vereiro de 2015, em uma semana de moda em Londres. Ficamos no mesmo quarto sem nunca antes termos conversado. Estranho ficar com alguém que você não conhece, né? Pois de cara ficamos amigas, parecia que nos conhecíamos há anos. Depois disso nunca mais nos separamos. Fui madrinha de casamento e também do primeiro filho dela, o Pedro. Passamos por muitas coisas juntas. Hoje a família dela é também a mi nha família.

Ao me deitar, no momento em que coloco a cabeça no travesseiro, sinto em minha mão a delicada forma da miniatura de Nossa Senhora das Graças que trouxe comigo. Ouvindo a respiração do Pedro ao meu lado, penso em tudo o que aconteceu no meu dia. Como imaginava, não consegui dormir direito. Eram muitas coisas para pensar. Acordei diversas vezes.

Desde sábado comecei o processo de limpeza e cura do Arcanjo São Miguel que escuto antes de dormir. Isso me traz uma tranquilidade na hora de pegar no sono. Com a música, parece que me transporto para outro lugar. São 21 dias e vou fazer até o dia 18 de junho, aniversário da Cynthia. Aliás, foi ela que me passou esse link. (https://youtu.be/sQCkmJLqDyY)

A Cynthia e eu nos conhecemos há mais de 20 anos. Mas nossa ami

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zade se estreitou há uns dez anos. Ela é uma pessoa especial, outra irmã que Deus me deu. Superespiritualizada, sempre tem algo bom pra di zer. Positiva, proativa e parceira pra tudo. Vê o lado bom das situações e das pessoas. Fazemos muitas coisas juntas. Sabe aquela amiga que você chama pra ir pra guerra do seu lado e ela topa? Essa é ela.

Mas mesmo com esse território desconhecido que se avizinha, den tro e ao redor de mim, penso em cada uma dessas pessoas que me dão tanto suporte e força. E aposto no meu novo propósito de vida. De cidi que esse nódulo era uma missão que estava recebendo. Que iria vencer, que sairia curada e que iria fazer disso uma lição. E o melhor: poderia ajudar várias mulheres com a minha experiência. Mulheres que me escutam, querem e devem se cuidar. O diagnóstico precoce é a me lhor prevenção e o início da cura.

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A HORA DA VERDADE

1º de junho de 2021 | Terça-feira

“Se não puder fazer tudo, faça pelo menos tudo o que puder.”

Acordei às cinco e meia da manhã, mas fiquei na cama até as seis e meia, quando tocou o despertador. Tinha um pouco de fome, mas não podia tomar café nem comer nada, precisava estar em jejum para os exames. Percebi que o Pedro também não dormiu direito, se virou à noite inteira. Mas sempre disposto e encorajador, assim que despertou disse que não era para me preocupar e que íamos resolver o problema. Vamos lá, então…

Tenho que confessar que meus pensamentos ficam pra lá e pra cá. Oscilo em estar superforte, confiante, positiva e com a ideia de que tudo vai dar certo, misturado com o medo do que pode acontecer, do que pode dar errado. E aí às vezes me emociono, mas logo penso: força! “Agradeço. E agradeço por tudo estar no início”, digo em voz baixa.

Em meio a toda essa situação, em muitos momentos, me vem a lem brança do meu querido tio Benício. Uma figura inesquecível, única. Ele era um padre franciscano que me ensinou a dirigir, quando eu era ainda bem nova, no período de férias que passávamos na praia. Fez o meu ca samento, batizou meus filhos e me explicou muito sobre a vida e sobre a fé. Ensinou-me também a respeitar outras religiões e sempre dizia que entre o céu e a terra existem muitas coisas de que não podemos duvidar. Me mostrou o poder do Espírito Santo, assim como a minha mãe. Era uma pessoa leve, divertida e querida por todos. Conhecia meus amigos e não tinha um que não gostasse dele. Convivemos muito juntos.

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E o que eu mais gostava de escutar, e ainda está registrado nas suas men sagens no meu celular, é que se eu já não fosse dele, ele mandava me com prar! Ele era especial. Sua perda foi algo que senti muito. Sempre lembro dele como um anjo que cuida de mim e tenho certeza de que ele está ao meu lado nesse e em todos os momentos da minha vida, alegres e difíceis.

Durante toda a longa manhã a miniatura de Nossa Senhora das Gra ças estava comigo, no bolso, e eu a segurava forte e rezando a todo mo mento. Pedindo que ela me desse força e clareza. Logo que chegamos ao Hospital Albert Einstein, o doutor Frasson veio ao nosso encontro para perguntar como estávamos. Mais cedo ele já havia mandado men sagem questionando se eu me encontrava bem e falando que precisa ríamos ver o resultado da ressonância. Disse que se algo mudasse nós teríamos que conversar novamente sobre a cirurgia. Quando nos viu, repetiu mais uma vez essa informação. Isso encheu minha cabeça de in terrogações. Parecia que já estava avisando para nos prepararmos para alguma mudança.

Fiz todos os exames. E foram vários. Todo o processo me fez lem brar as tentativas de engravidar que havia passado anos antes de ter o Pedro Paulo. Eu tinha parado com a pílula logo depois que Pedro e eu nos casamos, em outubro de 2007. Em janeiro do ano seguinte, junto com minha cunhada Giovana, passamos um período em Punta del Este, no Uruguai. O Pedro vinha nos finais de semana, pois estava preso com diversos compromissos da empresa.

Em fevereiro, já de volta ao Brasil, comecei a sentir muitas cólicas e achei que era por causa da menstruação (estava com sangramento fora de época). Pedro, como vira e mexe fazia, estava se preparando para ir

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pescar na Amazônia. E eu fui para a casa dos meus pais, em Novo Ham burgo. Nessa época ainda morávamos em São Paulo.

Como já havia oito dias que o sangramento não parava, liguei para minha ginecologista. E ela me mandou direto fazer uma ecografia. An tes do exame, a doutora perguntou se eu estava grávida. Disse, espan tada, que acreditava que não. Então ela disse: você pode estar.

Na realidade, estava com uma gravidez tubária já com hemorragia. Um perigo! Foi uma correria e fui direto para a emergência do hospital de Novo Hamburgo. Pedro cancelou a viagem e foi para o local junta mente com toda a minha família.

Passado o susto, que foi grande, consultamos um médico especialis ta, que disse que minhas chances de engravidar sem tratamento eram muito pequenas, porque a trompa que sobrou estava obstruída. Realizei ainda alguns tratamentos e acompanhamentos, e nada. Decidimos não pensar mais em gravidez e deixamos a ideia para o próximo ano. Não tínhamos uma gestação como projeto imediato, estávamos tranquilos quanto a isso. Mas em dezembro, sem nenhum tratamento e depois de uma visita a Caravaggio, fiquei grávida do meu primeiro filho, o PP. Era só alegria que transbordava em nossos rostos e corações. Inesquecível.

Voltando ao hospital, o último exame do dia era a eco de mama. Quan do começamos, o doutor Frasson entrou na sala para acompanhar, com uma expressão de atenção. A doutora que estava fazendo a eco disse:

“Em Porto Alegre fizeram exatamente o que era para ser feito, mas o que eles viram era apenas a pontinha do iceberg.” Congelei! Como

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assim? Se era a ponta do iceberg, então a coisa era mais preocupante do que imaginava.

Como no Einstein os aparelhos eram mais modernos, de última ge ração, dava para ver mais detalhadamente tudo o que estava acontecen do no meu seio. Até para mim, para quem tudo era novidade, deu para perceber perfeitamente meu nódulo e vi que tinha “perninhas”, como se fosse um polvo. E que havia mais alguns focos na mama.

Enfático, o doutor Frasson disse que nós precisaríamos conversar novamente sobre a cirurgia, e que agora o procedimento seria um pou co diferente. A cada exame, a cada reunião, uma novidade… Exclamei em silêncio! Falou para irmos para a sala de imagens e pediu para cha mar o Pedro, que veio com ar de preocupado. De novo, muitas coisas passaram pela minha cabeça em fração de segundos.

Na sala, a doutora mostra todas as minhas imagens. Apontou os fo cos e como a circulação nesses pontos estava maior. Falou que isso já era esperado, pois esse exame consegue mostrar muito melhor e com mais precisão a mama. Alívio ou medo? Verdadeiramente não sabia di zer o que pensar naquele momento.

A cada minuto ouvia algo novo dos médicos. E, para me deixar ain da mais tensa, quase nada era satisfatório. Uma nova vida que estava começando para mim. Mas uma que eu não tinha a menor vontade de conhecer. O doutor Frasson explica então que teria que fazer a retira da da mama e colocar silicone. Essa notícia cai como um gigantesco e pesado sino batendo em minha cabeça. Nessa hora entendi que minha

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situação tinha mudado, que tudo era mais sério do que eu imaginava até então e que meus riscos seriam muito maiores se não tivesse encon trado esse nódulo tão no início.

Perguntei qual era a probabilidade de isso se repetir na outra mama. Estava tão atordoada que não lembro exatamente o que ele respondeu. Me sentia como se tivesse saído daquele brinquedo de criança, o gira -gira, sabe?! Mas não estava amando aquela sensação de tontura na quele momento. Não estava conseguindo raciocinar direito. Meu chão se abria mais uma vez e tinha a certeza de agora estar em queda livre. Era um pesadelo que não terminava nunca.

Voltei a prestar atenção no que o médico dizia quando ele falou que o ideal era retirar as duas mamas, para não ter nenhum risco. Isso di minuiria muito as chances de o câncer voltar e que com isso não iria precisar, muito provavelmente, fazer radioterapia. Colocando silicone, as duas mamas ficariam simétricas e o resultado seria muito bom. Não queria acreditar que tudo que estava ouvindo era pra mim. Na realida de, só queria que arrancassem “aquilo” do meu seio!

Era muita informação, aliás um bombardeio de informações. Apesar de sentir segurança nos médicos, muito carinho e acolhimento, não teve jeito: desabei aos prantos. Chorei muito. E aquela pergunta insis tia em ficar martelando a minha cabeça: “Por que eu???”.

Já tinha lido que as doenças cardíacas são as que mais matam em todo o mundo. Mas sabia também que o câncer figura entre as princi pais causas de morte, e especificamente o da mama é a principal entre as mulheres no Brasil. São mais de 60 mil novos casos anualmente, se

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gundo o Inca – Instituto Nacional de Câncer, do Ministério da Saúde. São números alarmantes, que assustam qualquer pessoa.

O doutor Frasson, calmamente, falava para ficar tranquila que tudo iria ficar bem. Que tinha acabado de fazer a cirurgia, igual à minha, nú mero 1.110. Na hora só consegui sussurrar para mim mesma que não queria ser a número 1.111. Resolvi reagir. Parei de chorar e agradeci por toda a situação, sim. Por poder ter condições de estar ali, naquele hospital supermoderno, por ter um médico tão competente e por ter o meu marido do meu lado me animando e pedindo para ser aquela mulher que ele sabia que eu era: forte e extremamente positiva. Decidi que quero viver e não será esse nódulo que vai me impedir…

Pedro e eu nos encontramos na metade de 1999 e ficamos supera migos. Tínhamos muitas coisas em comum e, principalmente, muitas coincidências de vida também. Adorava estar com ele e conversávamos muito, de forma fluida e natural. No dia 14 de dezembro, lembro muito bem, ele me roubou um beijo que, juro, foi o melhor da minha vida. No dia 1º de fevereiro de 2000 ele me pediu em namoro. Começou aí nossa história de amor. Já passamos muitas coisas juntos, algumas bem difíceis. Sempre que penso nele, imagino nós dois juntos até o fim de nossas vidas. Mas prometo a mim mesma que o fim não vai ser agora!

O doutor Frasson falou que iria conversar melhor conosco às 16 ho ras no consultório dele e que na sequência falaríamos com a cirurgiã plástica. Antes disso, ainda tive que fazer um eletro. Foi difícil, pois não parava de tremer. Estava congelada e nervosa, mas tremia também por outras razões. Tremia de medo.

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Fomos almoçar perto do hotel em que estávamos hospedados. Pedro ligou para o José Luiz e a Cynthia para eles descerem e almoçarem co nosco. Nessa hora é muito bom estar junto de pessoas que você ama e sabe que elas sentem o mesmo por você.

Enquanto aguardávamos eles, aproveitei para ligar para a minha mãe e pensei: não quero assustá-la. Não deve ser fácil saber que a filha está com uma doença dessas. Então, comecei a falar de forma calma, tran quila e confiante, tentando não me emocionar. Disse que estava bem, que o médico era maravilhoso e que tudo estava encaminhado da me lhor maneira possível. Consegui não desabar. Quando desliguei, vi a Cynthia saindo da porta do hotel. Ela não conseguia disfarçar. Estava com o rosto de quem tinha chorado muito. Conheço bem ela! De ime diato, perguntou se aceitava um presente. Respondi que ela era o meu presente. Quando olho para o lado vejo a Anelise saindo de surpresa de trás da porta. Não aguentei. Abracei elas e chorei. A Anelise disse que não conseguiu ficar em Porto Alegre e que veio para estar junto porque eu não iria passar por aquilo sem ela por perto!

Anelise é a minha amiga mais recente. Uma mulher forte, com um co ração gigantesco como poucos. Uma sabedoria e clareza das coisas que nem parece a mais nova de nós três. Há pouco quase perdeu o marido para a Covid-19. É uma mulher muito positiva e com muita fé, além do alto-astral e uma garra que vi em poucas pessoas. Somos muito parecidas.

Durante o almoço, mesmo estando rodeada de amigos e com o Pedro ao meu lado, me sentia longe, muito distante. Mas, ao mesmo tempo, perce bia que era bom estar acompanhada, todos me distraíam, me confortavam.

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Terminamos o almoço e voltamos para o hospital. Os consultórios do doutor Frasson e da cirurgiã plástica são no Einstein mesmo. Ao passar pela porta senti segurança e também medo. Segurança porque agora sa bia exatamente o que tinha em meu seio. Medo... É melhor não escrever.

Na sala de imagens foi dito que a localização do meu tumor era a me lhor possível, pois estava bem no centro, nem perto do bico nem perto do tórax, e que isso era bom na hora de retirar. Dentro das notícias ruins sempre tem as boas!

O doutor Frasson nos recebeu e conversamos durante pelo menos um hora. Ele me explicou tudo o que iria acontecer, passo a passo. Fa lou que agora a cirurgia seria bem maior que a inicial e que poderia levar até seis horas, o que me impressionou um pouco. Teria que ficar no hospital três dias, e mais duas semanas ainda em São Paulo para a recuperação, porque os drenos ficariam comigo por até dez dias.

Decidimos que a cirurgia não seria mais no dia seguinte, mas sim na terça-feira, 8 de junho, às 13 horas. Eu precisaria chegar às sete da manhã para fazer todas as marcações. Uma nova data e eu firme no propósito de que se tem de ser feito, “bora lá fazer então”.

Ele indicou a doutora Mônica Frasson, que trabalha com ele há 12 anos, e nos contou que ela era a sua esposa e que estavam acostumados a trabalhar juntos, o que eu achei muito bom. E que ela tinha ótimos re sultados. Vi algumas fotos e realmente achei bonitos os seios daquelas mulheres que já tinham passado pela cirurgia que iria fazer. Mas tudo é novidade e não sei bem como avaliar todo o cenário, confesso.

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Ela, assim como ele, me tranquilizou, explicou o que iria acontecer detalhadamente. Disse que não precisava me preocupar, que meu peito ficaria praticamente do mesmo tamanho. Falei, então, que nunca havia pensado em silicone e que não sabia nada sobre o assunto. Ela mostrou alguns tipos, falou que não gostava de falar em tamanhos porque eles iriam avaliar primeiro o que será retirado e depois ver o que fica melhor.

Fomos para a sala ao lado, onde ela me examinou minuciosamen te. Falou que a minha mama era proporcional para o meu tamanho e que não parecia que havia tido dois filhos e amamentado tanto tempo. Traduzi isso como um elogio. Ela disse também, num tom de encora jamento, que o resultado iria ficar muito bom. Era só o que eu queria ouvir naquela hora.

Voltamos para a sala de atendimento. Olhou nos meus olhos com ternura e firmeza e disse que era um momento muito difícil para mim e que sabia o que eu estava passando. Que ela via aquilo todos os dias, mas que para mim era tudo novo, pois estava recebendo muitas infor mações, e que entendia o quanto o cenário era difícil. Para variar, co mecei a me emocionar. Ela falou então para não segurar e colocar tudo pra fora, que era para deixar sair, que seria bom.

Não me contive e caí em lágrimas, pensando em todas as consequên cias que aquela situação poderia causar. O medo de deixar meus filhos, meu marido, meus pais, meus amigos. O medo do que viria pela frente, a ideia disso poder voltar algum dia. Medo da minha vida não voltar ao normal, medo da cirurgia, da dor… o medo do fim… e o medo de ainda não ter feito tudo o que precisava fazer. Chorei, chorei muito e vi pela primeira vez o meu marido muito emocionado. O chão dele também

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devia estar se abrindo, mas mesmo assim estava tentando ser forte, re solvendo tudo pra mim, porque eu não conseguia mais nem pensar.

A doutora Mônica, então, segurou firme na minha mão e perguntou:

“Você acredita em Deus?”

Respondi fervorosamente:

“Sim, e muito!”

Ela continuou dizendo que eu precisava acreditar que talvez Deus tivesse mandado isso para mim por uma razão especial. Já que falo e influencio tantas pessoas, isso seria uma missão para ajudar ainda mais gente. Que devia falar para as mulheres se cuidarem, se prevenirem e terem a possibilidade de descobrir cedo, como eu descobri. Definitiva mente, uma missão a ser cumprida. Ela me abraçou e falou para contar com ela, como médica e como amiga. Que ela estava lá pra me ajudar.

Quando estávamos indo para São Paulo, a Cynthia falou a mesma coisa. Disse que tinha certeza de que isso se tornaria uma missão pra mim. Que deveria pegar essa situação e ajudar ainda mais as pessoas, já que tantas mulheres me seguem. Depois de várias notícias nesse dia turbulento, relembrar essas mensagens vindas das duas serviu com uma tremenda injeção de ânimo.

Depois de refletir sobre essas conversas entendi que poderia trans formar o que estava acontecendo comigo em um propósito mesmo. Lembrei que tinha em mãos uma poderosa ferramenta. Um grande gru

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po de seguidores nas redes sociais, sendo a maioria formada por mulhe res. Por que não usar meu exemplo de vontade e superação que determi nei a mim mesma e repassar a várias mulheres que estejam vivendo o que estou passando com essa doença? Elas me escutam, querem e devem se cuidar. A partir desse momento converti minha dor em uma missão.

No caminho de volta para o hotel, falei ainda com a minha psiquia tra. Como sou formada em Psicologia, sei da importância de se ter uma saúde mental em dia, firme e forte. Já fiz várias vezes terapia, já ganhei alta, mas no último ano voltei para uma manutenção, talvez por estar mos vivendo esse ano louco da pandemia, de uma avalanche de notícias fortes e imagens pesadas.

Nessa hora já estava bem, mais confiante. Acho que tinha colocado tudo pra fora lá no hospital. Ela falou que eu estava com o melhor médi co que poderia ter (ela também faz parte do corpo clínico do Einstein) e que retirar as duas mamas era a melhor decisão que poderia tomar. Que de agora em diante precisava comemorar a vida e não pensar no pior. Essas palavras me deram uma certa paz, confiança. Ela me conhe ce há anos, sabe como sou resolvida e sem muitos dramas, mas falou que deveria chorar quando tivesse vontade e colocar pra fora tudo o que sentia. Por experiência própria ela sabia exatamente o que eu esta va passando. Conhece perfeitamente os traumas e medos que pipocam em nossas mentes nessa hora.

Mais tarde fomos eu, Pedro, Cynthia, José Luiz e Anelise num restau rante japonês. Falei que queria beber sakê pra celebrar a vida, a chance que Deus me deu de poder encontrar isso tão no início, poder fazer uma cirurgia e sair curada! Meu ânimo melhorou. Todos brindamos!

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ANTES DA TEMPESTADE

Nenhum outro desejo pode vir antes do desejo de estar viva.

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2 de junho de 2021 | Quarta-feira

“Vai dar certo, porque eu farei com que dê certo.”

Finalmente havia tido uma noite boa de sono. Talvez tenha sido fru to da resolução que tive em transformar tudo isso em missão. Para co meçar o dia, resolvi fazer um post no Instagram com uma foto dos meus filhos que o hotel tinha colocado no porta-retrato. O hotel sempre faz isso pra mim, e eu adoro, me faz sentir em casa. Mas aquela foto era especial. Era a foto do último Dia das Mães, no mês passado.

“Bom dia! Filhos são uma bênção. Nos tornam muito mais fortes, mais humanos, mais amorosos e nos fazem acreditar que há um futuro e que vale a pena lutar para estar lá! Por eles tudo vale a pena! Quero es tar assim pra sempre, como nesta foto, sempre juntinhos! Mesmo quan do estamos longe, nossos corações são inseparáveis”, escrevi no post.

Pedro e eu resolvemos ficar descansando um pouco mais. Ele me abraçou e acabamos dormindo novamente. Quando finalmente des pertamos, mandei mensagem para a Alice Ferraz falando que minha cirurgia não seria mais naquele dia, que tinha sido transferida para a próxima terça. Ela me perguntou se não queria realmente fotografar a coleção de joias, pois tinha sido idealizada por mim. Disse que estava muito fragilizada e não tinha condições. Lalá também perguntou no vamente se tinha certeza de que não queria fotografar. Falei a mesma coisa e disse que estava extremamente feliz por ela estar em meu lu gar! Apesar de tudo que surgia a cada novo dia, estava tranquila com as demais coisas, como trabalho, por exemplo, pois contava com pessoas especiais ao meu redor. Cada uma ajudando à sua maneira.

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De manhã fui em uma loja especializada em roupas de pós-operatório que a doutora Mônica havia indicado. Comprei sutiãs com fechamento na frente, um kit de travesseiros e duas “camisetas” com botões na frente e bolsinhos internos para carregar os drenos. Nunca tinha usado nada parecido. A Anelise e o Pedro foram comigo. Como ela havia passado por uma cirurgia nas mamas, não fazia muito tempo, falou que essa peça seria muito útil, pois poderia ficar com as mãos livres, sem o medo de perder o dreno. Falei pra vendedora – que foi muito atenciosa, inclusive deu uma aula para meu marido de como me ajudar a deitar e levantar da cama – que eles precisariam fazer uma cinta com bolsos de telinha para as mulheres poderem tomar banho com os drenos. Eu inventando moda!

Antes de voltarmos a Porto Alegre, passamos no shopping para almo çar. Senti que minha ansiedade misturada com angústia tinha voltado. Parecia que estava caindo a minha ficha, de novo.

Em pouco mais de uma semana fui de um simples exame de rotina para um diagnóstico de câncer com a retirada das duas mamas e colo cação de silicone. A gente demora pra raciocinar e assimilar tudo isso! É muito complicado.

No almoço, estava distraída. Escutava as pessoas, mas de repente minha cabeça ia para outro lugar. É difícil não pensar no que está acontecendo. É a mesma cena de quando você quer engravidar e não consegue. Todo mundo fala pra não ficar pensando que aí você engravida. Sei disso, por ter tentado engravidar e não ter conseguido outras vezes, como já contei. Mas como não pensar nessa nova realidade inóspita, desconhecida e cheia de medos que atinge inúmeras mulheres e agora também a mim.

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Não vou negar que num momento desses o pensamento voa, e voa muitas vezes para lugares nem um pouco agradáveis. Não tem como impedir essa viagem. A única coisa que podemos fazer é trazê-lo de volta com ideias positivas e de esperança. Não via a hora de sair daquele restaurante e voltar pra casa.

Chegamos em Porto Alegre quase à noite. Agradeci muito aos ami gos por estarem comigo dando apoio e carinho. Eles tornaram aquilo um pouco mais leve e, principalmente, me distraíram. Quando cheguei em casa tinha um buquê de flores lindo e gigante enviado pelo casal Márcia e João:

“Clau, Contigo estamos Sempre juntos

Para o que der e vier E para tua pessoa linda, Sempre virá luz!

A gente te ama Márcia e João”

A Márcia e o João Hartz também são muito presentes em minha vida. A Márcia é a “mãe” da turma, artista, com gosto refinado, carinhosa e amorosa. Já esteve comigo em muitos momentos importantes. Certa vez, há alguns anos, eu pensava em voltar a morar em São Paulo. Nós estávamos em Miami, juntas, nas férias das crianças, passando uma se mana. Conversamos muito sobre a minha mudança, e ela sempre ficava em silêncio, me escutando, sem se manifestar. No dia em que ela retor nou ao Brasil me senti bastante triste, e foi aí que me dei conta de que

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não queria deixar minha vida em Porto Alegre. Cheguei à conclusão de que meu coração estava em paz na cidade em que vivia. Que era feliz perto dos meus amigos.

Quando voltei da viagem contei pra ela sobre minha decisão. Notei em seu sorriso e nos seus olhos o quanto ela ficou feliz, e confessou que não sabia o que fazer para eu não ir pra São Paulo, mas que não queria interferir na minha decisão. Ela é assim, quer te ver feliz, apenas isso.

Combinei com o Pedro que precisávamos contar alguma coisa para as crianças sobre o que estava acontecendo. De uma forma leve, mas que elas precisavam participar de alguma maneira, pois minha recupe ração seria longa e, ainda por cima, o aniversário do meu pequeno seria nesse período.

Durante o jantar ficamos conversando sobre muitos assuntos e, de repente, senti que era a hora. Tentei ficar tranquila porque não queria passar nenhum medo a eles. Disse que tinha ido fazer exames nos seios e que o médico descobriu um machucado dentro da minha mama. Con tei também que iria precisar fazer uma cirurgia em São Paulo para não ter nenhum problema no futuro. Ufa! Falei tudo sem titubear.

Meu pequeno se emocionou e me abraçou. Senti que balancei, mas disse que não precisava se preocupar e que depois iríamos fazer uma festa linda de aniversário para comemorar com os amiguinhos.

Ficamos um pouco mais na sala e depois fui para o quarto. Estava exausta. Também, pensei, depois de um dia como esse, não era pra me nos. Sentei na minha escrivaninha e tive uma vontade imensa de escre

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ver. Sempre achei que escrever me faz bem, organiza as ideias, clareia a mente. Escrever me tranquiliza e me dá paz! Talvez sirva com uma válvula de escape para mim. Por isso aqui estou agora…

3 de junho de 2021 | Quinta-feira

“Persistência é o caminho para a vitória.”

Abri os olhos às cinco e meia da manhã. Dormi bem, mas não con segui prolongar muito o sono. Normalmente acordo cedo, mas ultima mente tenho acordado antes de o sol nascer e com a cabeça pensativa, levemente tumultuada, um pouco perdida mesmo.

Hoje é feriado de Corpus Christi. Senti vontade de postar uma men sagem de carinho e paz ao coração de quem sofre, que precisa de uma palavra amiga, um conforto espiritual.

Fiz um post de #tbt de uma foto minha com o Papa Francisco, pois meu encontro com ele em Roma foi muito especial.

“A ternura é o amor que se torna próximo e concreto. É um movi mento que brota do coração e chega aos olhos, aos ouvidos e às mãos. A ternura é o caminho que percorrem os homens e as mulheres mais corajosos e fortes!” – Papa Francisco.

O dia em que conheci o Papa Francisco foi único em minha vida. Admiro seu jeito de ser, o modo como vê a vida, como fala com as pes soas. Na ocasião pude sentir nele toda a ternura que descreve acima. Um homem que olha nos seus olhos, segura a sua mão e faz você se

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sentir especial. Sensação de paz e alegria simultâneas que não sei ex plicar. Foi inédito!

“Deus dá as batalhas mais difíceis aos seus melhores soldados.” – Papa Francisco.

Li também essa frase e minha fé falou alto: sou um bom soldado e vou vencer essa guerra. Tenho as melhores pessoas ao meu redor e to das me amam, como eu as amo. Essa é a melhor receita para a vitória.

O almoço de hoje foi com meus pais. Pronto, será um cardápio rechea do de muitas emoções, pensei pela manhã. Minha mãe mandou mensagem ontem e falou que eles queriam me ver. Como era de se esperar, ao vê-la percebi que ela já estava emocionada e, na hora, também amoleci. Mas busquei me recompor porque sabia que se desmoronasse ia ser difícil me recuperar. Me aprumei e já fui logo falando que tudo já tinha dado certo.

Sentamos na varanda e ninguém tocava no assunto, pois as crianças estavam ao redor. Bastou elas darem uma saidinha e contei tudo o que tinha se passado. Como eles ainda não sabiam do diagnóstico de cân cer, a emoção tomou conta da sala. Definitivamente não deve ser fácil saber que isso está acontecendo com um filho. Mas à medida que ia fa lando, ao mesmo tempo contava sobre superações e casos de final feliz. Foi ruim dar a notícia, mas tinha de ser feito por mim e eu havia pro metido que tentaria fazer da melhor maneira possível. Falei que meu médico era um dos melhores, enalteci seu trabalho e profissionalismo e que estava superbem assistida. Depois de toda essa emoção o almoço seguiu de forma tranquila.

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À noite o doutor Fernando Lucchese ligou. Além de ser um grande amigo da família, é um cardiologista muito conhecido e respeitado em todo o país e é também nosso médico. Foi por meio dele que conheci a Santa Casa de Porto Alegre e comecei a dar os primeiros passos como voluntária, algo extremamente gratificante, que acredito que todo ser humano deveria vivenciar algum dia.

Esse trabalho social que faço, além de ajudar diversas pessoas e en tidades, aquece meu coração e me deixa com a sensação de estar sendo útil como cidadã, como pessoa. Entre outras atividades, sou também madrinha da Casa de Acolhimento Madre Ana, onde ele é diretor. An tes da pandemia fizemos um bazar/brechó beneficente e doamos 100% do lucro arrecadado. Em 2019, arrecadamos R$ 350.000,00 em oito horas de evento, o que garantiu o sustento da casa por sete meses. Essa Casa recebe crianças que estão ali à espera de um transplante ou em tratamento de câncer. Elas vêm de todos os lugares do Brasil. É um local espaçoso, um antigo convento das irmãs franciscanas e possui até agora 60 quartos. Isso quer dizer que eles precisam de muita ajuda, o que me comove muito. Por isso, meu projeto é continuar fazendo anualmente o maior bazar/brechó do Rio Grande do Sul!

Bom, de volta ao doutor Lucchese, ele falou por telefone primeiro com o Pedro durante uns dez minutos, e depois comigo. No momento em que dei o “oi” já balancei. Mas ele não enrolou e foi direto ao ponto. Disse que agora queria ver eu mostrar toda a força que tenho. Que a imagem que ele tinha de mim era de uma leoa, uma gigante, e ele sabia que não iria es morecer. Falei, na maior convicção, que seria forte! Lacrimejei algumas vezes na ligação, claro, pois ele falou coisas lindas e, o mais importante, disse que eu estava em ótimas mãos. Desliguei o telefone mais confiante.

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Percebi hoje que estou mais aliviada. As ideias e a mente estão mais claras. Não estou mais tonta como se tivesse saído do tal gira-gira. A poei ra deu uma assentada. Que bom!

4 de junho de 2021 | Sexta-feira

“Não desista, tenha fé e deixe o tempo agir para tudo melhorar.”

Hoje amanheci bem. Agradeci a Deus por isso e por permitir acordar para mais um dia. Pedro e eu tomamos o café da manhã com as crianças. Sempre acordo cedo para tomar café com eles. Isso é sagrado. Acho um momento importante, onde conversamos um pouquinho sobre como será o dia deles e repito como aquela refeição é importante para a saúde de todos.

Antes de sair, os meninos sempre me dão um beijo e um abraço bem apertado. Acredito que assim os dias começam melhores.

Fui para o banho e pensei: vou me arrumar, me maquiar e vou escre ver. Tudo ajuda na hora de levantar o astral. Decidi que nesses dias não iria trabalhar. O Guilherme Marcondes, meu assistente e braço direito, está fazendo alguns posts pendentes em que já tínhamos as fotos, mas o resto cancelei tudo. Quero me concentrar para reunir todas as forças possíveis e energias para o que vem pela frente. Não pretendo ver nin guém, além das minhas amigas e família, que sabem sobre o que está acontecendo, e vou me guardar para terça-feira.

Já havia me esquecido. Na quarta-feira passada também falei com a minha cunhada, a Giovana Velloso. Somos muito próximas. Coisa de afi nidade que não dá para explicar direito. Sempre brinquei que casei com o Pedro porque ela vinha junto! Na época em que morei em São Paulo,

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ela era minha grande amiga, e continua sendo até hoje. Falou que estaria comigo lá na recuperação e que me faria rir muito. Sempre demos muitas risadas juntas. É cunhada, amiga, companheira, tudo ao mesmo tempo.

Passei a tarde toda escrevendo, e estou me dando conta de como isso me faz bem. Acho que o “meu eu” voltou ao normal. Parei de pensar bobagem e me concentrei em colocar essas palavras no papel. Passei a ter cada vez mais certeza de que essas minhas escritas poderão ajudar no futuro, o mínimo que seja, alguém que passará pelo que estou pas sando agora. Nessas horas sempre é bom ter histórias onde nos iden tificamos para saber que não estamos sós e que não somos os únicos. Isso, muitas vezes, alivia a nossa tensão e diminui os nossos medos.

Recebi da Cynthia uma citação da grande poetisa brasileira, que eu adoro, Cora Coralina. Acredite se quiser, eu já tinha dado print nessa frase ontem. Temos muita sincronicidade, o que é muito bom. É impor tante saber que temos por perto pessoas que estão vibrando na mesma frequência, que prestam atenção nas mesmas coisas.

“Mesmo quando tudo desabar, cabe a mim decidir entre rir ou cho rar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.” – Cora Coralina.

Cynthia, Anelise, Lalá, Márcia e Giovana me mandaram mensagens. Cada vez mais tenho a certeza de que em uma amizade a simples lem brança de desejar sucesso e superação a um amigo não tem preço, toca profundamente o coração de quem deseja e quem recebe.

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Pedro também ligou várias vezes para saber como eu estava e dizendo que daqui a pouco tudo isso já terá passado. Esses cuidados e preocu pações me enchem de alegria e confortam meu coração. Não vejo a hora de chegar o momento da cirurgia. Ansiedade, ansiedade, ansiedade…

Ainda falando de cuidados, a Lalá deixou boa parte das suas ocupa ções de lado para cuidar da festinha de 8 anos do Vittorio, que vamos fa zer no quarto do hotel. Já pediu bolo, docinhos, pirulitos e balões. Será diferente das festas anteriores, mas tenho certeza de que ele vai amar.

Vittorio, meu pequeno, é um menino lindo, sempre muito sapeca e superativo. Ele conquista todos com suas covinhas, pele bronzeada, cabelo loiro e seus olhos verdes. Não é discurso de mãe babona, não. É pura verdade. Tem sempre uma resposta para tudo, mas é muito sensível. Parece durão, mas é um doce de criança.

Já Pedro Paulo, o mais velho, é superinteligente, se interessa por tudo, é carinhoso e vive me abraçando. Tem a pele clara, cabelos escu ros e olhos azuis de uma profundidade incrível. Mas percebo ele agora muito sensível e vejo que ambos estão entendendo a gravidade da situa ção que estou passando.

Hoje também costurei um cinto elástico com dois bolsos de cada lado para poder usar no banho enquanto estiver com o dreno, e penso nova mente que eles já poderiam ter feito isso para vender. Comecei a arru mar a minha mala para as duas próximas semanas. Muita roupa confor tável e com abertura na frente, pois por um tempo não poderei levantar os braços. Não tem um ditado que diz que a ocasião é que faz a moda?

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A FÉ QUE MORA EM MIM

5 de junho de 2021 | Sábado

“Olhe para cima, que é de lá que vem tua força.”

Logo que acordei, agradeci a Deus por mais um dia. E resolvi pensar na parte física que iria me deixar. Antes do banho, diante do espelho, fi quei observando meus seios, tocando-os e começando um processo de despedida. Mesmo sabendo que ainda vou ficar com a pele e os mami los preservados, sei também que eles não serão mais como antes. Fico olhando como nunca os olhei antes. Até mesmo quando eles surgiram ainda na puberdade, quando tudo era novidade e surpresa.

Ao mesmo tempo que vem uma tristeza, vem um sentimento de gra tidão. Afinal, eles ainda estarão ali depois da cirurgia, apenas de um jeito “diferente”. Mas lembro de tudo o que meu médico disse: que é muito mais difícil de ver na mamografia e na eco quando o seio é assim, denso. Até então eu não tinha ideia de que havia diferença na densida de dos seios e que isso poderia dificultar qualquer diagnóstico, muito menos que os meus eram densos. Olho para eles novamente, olho para cima e penso: que sorte de acharem logo o nódulo e ter a possibilidade de a cura ser rápida. É o que espero e desejo fervorosamente.

“Isso é uma bênção, Claudia!”, penso de novo!

Por outro lado, imagino quantas mulheres não tiveram essa chance, ou por não fazerem os exames anualmente ou por não irem ao médico ou mesmo por não se tocarem executando o autoexame. Me dá cala frios ao imaginar a sensação de descobrir algo maior, com mais tempo de existência, algo que tenha de ter um tratamento mais longo, doloro so e de muitos riscos. Não deixo de pensar como deve ser difícil estar

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em uma situação como essa. Me sinto triste quando imagino as mulhe res que podem estar passando por isso hoje e agradeço, mais uma vez, pela situação em que me encontro, com grandes chances de cura.

Hoje resolvemos que nós quatro – Pedro, PP, Vittório e eu – vamos para Caravaggio, um lindo santuário que fica em Farroupilha, cidade da Serra Gaúcha, conhecida por ter água milagrosa e lugar de muitos fiéis de Nossa Senhora de Caravaggio que buscam por cura e graças. Sou muito religiosa desde criança, graças aos meus pais, ao meu tio e à fé que tenho em Deus e em Nossa Senhora. A devoção à Nossa Senhora de Caravaggio, que é Maria, mãe de Jesus, segundo a tradição católica, se dá devido à sua aparição na localidade de Caravaggio, na Itália, no ano 1432. Aqui no Brasil, o seu maior santuário é esse em que vamos hoje, em Farroupilha.

A ideia partiu do Pedro quando estávamos em São Paulo. Ele sabe como sou devota e confio em Nossa Senhora e sabe também como esse lugar é especial para mim. Acredita que nossa ida até o santuário vai dar uma boa injeção de ânimo e fé em mim, e nele, para ajudar a superar e vencer o que virá pela frente. Ele sempre sabe o que preciso, mesmo antes de mim.

Já fui diversas vezes a esse santuário beber a água milagrosa, orar e pedir proteção a mim e à minha família e amigos. Mas, principalmente, para agradecer todas as bênçãos que recebo diariamente! A gratidão faz parte de mim, da minha existência. Sempre entro nas igrejas em que passo. Uma vez, quando entrei em uma em Gramado, um amigo per guntou quando saí o que tinha pedido e eu respondi: nada! Eu só agra deço. Fui assim a minha vida toda e ensino isso aos meus filhos. Muito mais importante do que pedir é saber agradecer do fundo da alma e do

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coração a alegria de viver. E devemos fazer isso todos os dias por meio de oração, conversa ou meditação. Cada um escolhe sua forma, o im portante é ser grato. Diariamente somos abençoados. Então devemos perceber isso, estar de olhos abertos, atentos a todas as bênçãos, por mais simples que elas sejam. Um rápido abraço em um filho, uma pala vra de conforto a um amigo ou um ato em favor de um necessitado são formas de agradecimento. Eu sempre agradeço.

Não demorou muito e chegamos ao santuário. Cada um com a sua garrafinha, fomos encher na fonte. Mas ficamos um tanto decepciona dos. Todas as torneiras estavam secas. Certamente que era por causa da pandemia. Na hora fiquei um pouco triste. Mas como não tem nada mais forte que uma oração com fé, fui para a menor capela de lá rezar. Essa capela é bem pequena e me transmite aconchego. Sinto que lá sou abraçada e acolhida por Nossa Senhora.

Entramos e fomos direto para a frente do altar, os quatro. Não sei quanto tempo fiquei ali ajoelhada. Percebi que o Pedro saiu com os meninos. Eles queriam me deixar um pouco a sós. Rezei com toda minha devoção. Imaginei a cena da cirurgia com vários feixes de luzes douradas vindos do céu e passando pelas mãos de toda a equipe. Ima ginei tudo dando muito certo, e eu, curada. Me emocionei muito e, de repente, dois bracinhos me cercaram. Era o Pedro Paulo que tinha voltado para ficar comigo. Rezei, rezei e rezei. Conversei com todos que estavam naquele altar e imaginei Nossa Senhora me segurando no colo. Agradeci!

Então sentei e abracei meu filho. Aliviada e ao mesmo tempo me sentindo bem amparada. Quando olho para o teto vejo a pomba do Es

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pírito Santo pintada dentro de um triângulo. Expliquei para o PP que aquilo era a Santíssima Trindade e que aquela imagem era poderosa, pois representava o Espírito de Deus. Quando pedimos alguma coisa para ele com fé, acreditando de coração, ele sempre atende.

Missão cumprida!!! Estava me sentindo leve e confiante.

Voltamos para Porto Alegre. Vi o pôr do sol sozinha na minha varan da à beira do rio. Pedro estava fazendo ginástica, e as crianças, brincan do no jardim. Foi um lindo pôr do sol, único, cheio de significados para mim. Que dia inesquecível.

Nesse exato momento recebi mensagem da doutora Mônica pergun tando se estava bem, mais tranquila e se tinha alguma dúvida. Respondi que estava bem. E ela escreveu:

“Não esqueça de colocar toda a equipe cirúrgica nas mãos de Deus.”

Logo pensei: que coincidência! Era exatamente isso que tinha feito naquela manhã!!! Então ela mandou umas figurinhas:

“Entrego Confio

Aceito Agradeço”

Contei para ela o que tinha feito naquela manhã em Caravaggio, sobre meu pedido aos médicos celestiais de iluminarem toda a equipe e também traba lharem todos juntos. E enviei uma figurinha de Nossa Senhora das Graças.

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Ela respondeu:

“Sou consagrada à Nossa Senhora das Graças.” E me enviou a me dalha milagrosa. Falei que confiava muito nela e de pronto respondeu:

“Fica tranquila. Irá dar tudo certo com essa equipe maravilhosa.”

“Amém!!! ”, respondi.

Sempre acreditei que os médicos, como seres da ciência, em geral são céticos em relação a religião, milagres, coisas espirituais. Entre tanto, eu estava nas mãos de uma médica que, além de religiosa, era devota da mesma santa que eu! Quantas coincidências. Terminei a conversa emocionada e com o pôr do sol de cartão-postal bem na mi nha frente. Toda aquela natureza, o rio, os barcos e o céu, que estava em um degradê perfeito, lindo e deslumbrante, e eu ali presente para admirar tudo aquilo!

Escutei um barulho e percebi que alguém se aproximava. Era a mi nha amiga Márcia. Levantei-me e fui abraçá-la. Conversamos por um longo tempo. Ela contou que ficou procurando toda a tarde a medalhi nha de Nossa Senhora das Graças que trouxe de viagem, mas que não a encontrou. Então mostrei todas as mensagens da doutora Mônica. Aproveitei e disse que se achasse a medalha era pra ficar com ela e que rezasse por mim. Fé nunca é demais!

Como o dia não terminava, os amigos também não paravam de chegar. Na sequência, vieram a Kelly e o Daniel Bartelle, primo do Pedro. Um casal que é presença constante em nossas vidas. Mais tar

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de, foi a vez da Anelise e do Eduardo. Definitivamente era um dia inesquecível para mim.

Lembrei que perguntei para o doutor Frasson se o câncer poderia ter surgido por algo que fosse de minha responsabilidade. Enfático, disse que isso era uma fatalidade. Que era como se eu estivesse caminhando pela rua e um tijolo tivesse caído em minha cabeça. Achei engraçada a comparação e até consegui rir na hora. Que a cada 500 mulheres, na minha faixa etária, uma apresenta esse diagnóstico. Pensei. Realmente fui escolhida, e escolhida por alguma razão: ajudar as pessoas a se cui darem! Isso está muito claro para mim. Será meu objetivo de vida quan do essa fase da cirurgia passar e estiver recuperada. Missão a seguir!

Recebi da doutora Mônica uma foto de Nossa Senhora das Graças. Disse que foi à missa e quando viu a imagem não tinha como não se lembrar de mim. Que dia!

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AS HORAS QUE ANTECEDEM

6 de junho de 2021 | Domingo

“Motive-se constantemente. Esse é o combustível que lhe trará as vitórias desejadas.”

Acordei hoje determinada a malhar. Talvez seja pelo fato de saber que terei de ficar um bom tempo sem poder fazer qualquer tipo de exercício depois da cirurgia. Não gosto de ficar muitos dias assim, pa rada, sem me movimentar. Ainda mais nesse friozinho de quase inver no. A coragem tem de falar mais alto!

Então coloquei uma roupa de ginástica e fui. Fiz 40 minutos de es teira, e me senti muito bem. Como tudo na minha vida gira em torno da enfermidade desde que a descobri, me pergunto se a minha disposição e meu pique para os exercícios continuarão após a operação.

O que sei é que decidi viver bem e intensamente cada minuto a par tir de agora. O tempo é valioso, em todos os sentidos. E ele não para, como disse o poeta Cazuza. Por isso, reuni marido e filhos para tomar mos o café da manhã recheado de um gostoso bate-papo, cada um fa lando um pouco de si. Juntos, assistimos à Fórmula1, para dar ainda mais a cara do domingo.

Aproveitei também para organizar o quarto dos meninos. Não tem jeito, onde tem criança… tem bagunça. Dei umas boas agarradas e apertadas no Vittorio. Sabia que depois ficaria um bom tempo com meus braços imóveis, sem poder cometer esses “atos de fofura”.

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O domingo prometia ser movimentado. Vieram almoçar conosco a minha irmã Emanuela, meu cunhado Matheus Rosa, meu afilhado Pie tro, a Cynthia e o José Luiz. Como hoje estou tranquila, consegui con versar com eles sem me emocionar nem um minuto. Estou aprendendo a me controlar.

Minha irmã é dois anos mais nova que eu, mas sua personalidade é mais formal que a minha. É superdeterminada, com muita fibra, traba lhadora e uma mãe maravilhosa. É também braba, mas só na hora que tem que ser. Sempre falo que preciso um pouquinho do seu jeito. Ela também é muito engraçada e divertida. Logo que me ligou disse que queria me ver antes da cirurgia para dar tchau para os meus “titis”.

Quando chegou, logo pegou nos meus seios e disse, apertando-os, com um ar risonho:

“Tchau pra vocês! Agora vão vir outros mais bonitos.” E demos muita risada. Ela põe meu astral lá em cima!

Todos conversamos até o final da tarde e combinamos que iríamos comemorar muito depois que tudo isso passasse. À noite nos despedi mos e minha irmã se emocionou. Mas nada de tristeza. Nos abraçamos e falamos: tudo já deu certo! Pedi pra ela ficar firme e cuidar da mãe e do pai, e disse que sabia que, apesar de toda fé e confiança, eles estavam sofrendo. Não importa a idade do filho, amor de pai e mãe é eterno.

Mas outro fato tem me chamado a atenção: as crianças estão visi velmente sensíveis. Tenho certeza de que, mesmo sem eu ter conta do exatamente o que está acontecendo, elas percebem a intensidade do momento. Sempre foram carinhosas, mas estão muito mais agora.

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Todo o tempo PP e Vittorio vêm me abraçar e me beijar. Aproveito a oportunidade de dizer o quanto os amo.

Recebi uma mensagem linda da Anelise hoje:

“Amiga,

Ontem ouvi você falar sobre um monte de coisas que me deixaram perplexa. Positivamente, é claro. Como a mudança na tua percepção das coisas simples do cotidiano, na valorização daquilo que é funda mental na vida se intensificou. Da necessidade de encontrar um propó sito nesse obstáculo que se colocou no teu caminho. Do acesso a águas mais profundas, aquelas onde habitam os sentimentos mais relevantes. Do fortalecimento da fé, da certeza da presença de Deus na tua vida e da missão espiritual que Ele te incumbiu. Ouvindo você falar todas es sas coisas, senti ainda mais admiração e orgulho por você. Pela forma como está atravessando este momento, a generosidade que demonstra com a preocupação em fazer disso um alerta para outras mulheres, de encontrar através da tua vivência uma forma de ajudar outras pessoas. Refleti sobre tudo isso e pensei: Deus não poderia confiar essa missão a qualquer um, porque você vai saber extrair tudo o que esse momento de vida pode significar. Você é porreta! Te admiro cada vez mais!”

Pedro chegou no quarto enquanto eu estava escrevendo essas pa lavras. Ele me abraçou em silêncio e ficamos juntos num momento só nosso. Um entendia o outro e nossos sentimentos não precisavam ser ditos. Eles eram transmitidos no olhar, nos gestos e na ausência de nossas vozes.

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Como as crianças, ele também vem todo tempo me abraçar, me dar beijos e perguntar se estou bem. Ele me deixa tranquila, com a sensa ção e a certeza de que estou muito bem amparada. Não canso de agra decer por ter ele como marido, melhor amigo e companheiro. Por ele ser minha fonte de energia nesse momento.

Adormeci escutando o Arcanjo São Miguel. Estou no sétimo dia agora, mas logo depois acordei com um pesadelo. Rezei, senti um forte alívio e voltei a dormir.

7 de junho de 2021 | Segunda-feira

“Eu quero. Eu posso. Eu consigo.”

Tomei meu café com as crianças, abracei e beijei muito elas, para não perder o costume. Aproveitei um breve momento sem afazeres para es crever no diário ainda pela manhã. Terminei de organizar minhas coi sas para hoje à tarde. Partimos no voo das 15h30 rumo a São Paulo. A cada minuto que passa fico mais apreensiva. Afinal, estou a poucas horas da minha cirurgia. É estranho, pois parece que tudo se desenrola sobre uma linha bem fina e frágil. Que pode se romper a qualquer ins tante. Mas ao mesmo tempo reúno forças e penso em Nossa Senhora das Graças e na equipe médica que está preparada e abençoada para me curar. Daí será só seguir a minha nova missão.

O celular emite um sinal e vejo mensagem da minha mãe:

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“Oi, filha!

Já de mala pronta para fazer uma viagem e repouso diferentes? Deus estará ao teu lado e vai iluminar as mãos dos médicos e te proteger. Es tarei presente a partir deste momento em oração. Tudo dá certo quan do se tem fé. Pai eterno está nos protegendo e o Espírito Santo vai estar te iluminando. Lembra. Se precisar de mim estou aqui. Pode contar comigo! Um grande e forte abraço. Te amo, filha…”

Prometi que com muita força de vontade e a ajuda de todos superaria essa barra, que não tem tamanho nem peso, mas é um fardo incalculável sobre as costas. Depois que tudo passar, tenho certeza de que estarei dotada de forças, fé, experiências e palavras que irão ajudar muito as mulheres que viverão num futuro próximo.

Recebi também uma mensagem da minha tia Christel, casada com o irmão do meu pai e que mora na Alemanha, sobre a importância de carregar o rosário e a história dele. Falou que quando dormimos com o terço embaixo do travesseiro isso nos dá paz e um sono tranquilo! Coincidência ou não, ela não sabe que estou com câncer, nem que eu já estava segurando o terço em minhas mãos no momento em que recebi suas palavras. Quanta sincronia, não? Amém!

As mensagens dos meus amigos são muitas e não param de che gar. A Alice Ferraz me mandou uma mensagem bastante interessan te. Disse que entrevistou Edith, uma húngara de 93 anos, sobrevivente de Auschwitz e que mora nos Estados Unidos. Contou que ela escreveu um livro retratando sua vida e elas conversaram muito sobre força e re siliência. A Alice falou que não tinha como não lembrar de mim, desse

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momento de transformação que estou vivendo e que ela queria me enviar o livro. Aceitei de imediato, e pedi para a Alice agradecer a ela também.

Aproveitei e contei que estava escrevendo um diário. E que ele tam bém poderia virar um livro para ajudar outras mulheres no futuro. Acre dito que exemplos de vida e de superação sempre são muito valiosos para quem está vivendo situações difíceis como a que estou passando. Disse também que o ato de escrever, para mim, ajudava a organizar as ideias, além de me deixar mais forte e com clareza mental! Acredito que muita gente tenha sentimentos e pesares parecidos, e saber que não es tamos vivendo sozinhos situações dolorosas pode ser acalentador.

Logo depois chegou uma mensagem da Lalá, que dizia que tinha desmarcado tudo e que estava 100% disponível para me ajudar e tam bém ajudar o Pedro a me cuidar. Disse que sabia que meu marido não iria querer sair um minuto do meu lado, mas se ele precisasse ela es taria ali. Ela também mandou fotos dos detalhes para o aniversário do Vittorio que está organizando para mim. Sem medir esforços, parecia que estava fazendo como se fosse para seu próprio filho. Saber que posso contar com tanta ajuda, força e energia faz toda a diferença.

Deparei hoje com essas duas frases que me fizeram muito sentido e resolvi deixar elas registradas neste diário para poder lê-las sempre que precisar:

“A compreensão deve vir aos poucos, caso contrário pode se tornar insuportável.” – Idries Shah, escritor indiano.

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“O ato de compreender algo exige uma transformação total de um indivíduo. Se você diz que compreendeu tal coisa e isso não afeta sua conduta, sua postura, seu pensamento, seu discurso, suas dúvidas e sua perspectiva, então você não compreendeu nada. Por essa razão, compreender algo deve acontecer gradativamente. Caso contrário, nos assustamos ao percebermos que compreender faz de nós pessoas diferen tes. E aquele que somos reluta e se defende para existir. Tenha carinho por quem você é: compreenda e mude, mas muito gentilmente.” – Nilton Bender – Exercícios d’alma, a cabala como sabedoria em movimento.

Mais tarde a Kelly veio me visitar. Kelly é uma mulher de iniciativa, nunca está parada. Maratonista, adora esporte. Brinca com meus filhos com muita alegria. Ela e o Daniel são as pessoas em quem confio para estarem com meus pequenos quando viajamos. Levam pra passear, para comer churrasco, coisa de família mesmo. Ela trouxe um buquê lindo de flores, rosas cor de rosa e uma carta emocionante:

“Clau, querida!

Demorou para cair a ficha da notícia de sábado. Não consigo enten der como uma pessoa tão saudável, alto-astral, cheia de vida e luz possa passar por uma adversidade dessas. Mas como disse seu médico: é uma fatalidade. Acredito que nada na vida é por acaso, que Deus escreve cer to por linhas tortas e tudo tem uma razão de ser.

Termos ido jantar com vocês depois de todo esse tempo longe por causa da pandemia, mesmo sem saber de nada, não foi por acaso. Me deu a oportunidade de te ver, te abraçar e desejar força antes da cirurgia. E tam bém dizer agora que a Claudia que conheço vai tirar tudo isso de letra!

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Tenho certeza de que isso é apenas uma passagem que Deus colocou na tua vida para chegar mais forte do outro lado, com a linda missão de inspirar e influenciar ainda mais as pessoas que te seguem.

E para esse bichinho abusado e intrometido, você vai dizer o seguinte: ´Esse corpo não te pertence!´

E aí serão só mais duas semaninhas de cuidados na recuperação para estar arrasando com os teus new-boobs, versão ´nódulos-free´, dos seios lindos, pequenos e firmes que sempre teve!

Brincadeiras à parte, amiga, prima que a vida me deu, te desejo BOA SORTE, que nunca é demais, mesmo estando nas melhores mãos. Muita força, que sei que tem de sobra, mas que também te permite ser cuidada, receber da sua família e dos amigos que te amam e te querem tão bem. Todo o carinho, o amor e o acolhimento que merece!

E reiterando o que a Lalá falou: já deu certo! Estou aqui para o que precisar. Grande beijo com carinho, Kelly”

Adorei ler cada palavra. Ela também falou que virá com o Daniel du rante a semana para ver os meninos e jantar com eles.

Ainda procurando coisas para colocar em minha mala, que já está parecendo uma bagagem de quem está se mudando, achei perdido na minha estante o livro “O Poder do Agora”, de Eckhart Tolle. Trata-se

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de um guia para o entendimento da importância de se viver o agora. Tenho certeza de que será um excelente companheiro de cabeceira. Já está na mala e vai comigo para São Paulo.

Almocei com as crianças. Logo depois, a Rose veio no quarto trazer um chazinho. Como já disse, ela está comigo desde quando fui morar em São Paulo. Foi ela que me mostrou o apartamento que aluguei. Sem rodeios, perguntou se precisava de alguém para a limpeza. Disse que sim e nunca mais nos separamos. Veio morar comigo em Porto Alegre quando o PP nasceu. Assim que ela entrou no quarto percebi em seu rosto o quanto estava emocionada. Falei que logo vou ficar bem e que tenho muito o que viver ainda. “Cuida bem das crianças enquanto esti ver fora”, disse a ela só para quebrar o clima, pois nem precisava falar.

Estou impressionada com a quantidade de cartas, mensagens, off e online, que recebi nas últimas horas das pessoas que estavam sabendo da cirurgia. Eram palavras lindas, de apoio, amor, confiança e fé. Mui to combustível para encher minha mente e coração nessa longa estrada de superação.

Dediquei mais um tempo para meus filhos. Nos abraçamos aperta damente. Falei pra eles não brigarem, se comportarem, lerem, estuda rem, rezarem, essas coisas que toda mãe fala quando se ausenta, mes mo que seja por algumas horas. E completei: já já estaremos juntos.

Encontrei o Pedro no hangar e embarcamos para São Paulo. Quando chegamos, fomos direto para o Einstein, pois tinha que fazer o exame de Covid. A pandemia está no auge, afeta toda a população e o sistema de saú de, público e privado. Que momento para se ter que fazer uma cirurgia!

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Para completar, nesse dia estava com uma dor forte nas costas do lado direito que irradiava para a frente. Então fui para a emergência. O médico falou, de forma direta, que poderia ser trombose, pedra na vesícula, que o câncer podia ter se espalhado. E que como era paciente oncológica poderiam ser mais coisas. Foi a primeira vez que escutei que era uma paciente oncológica e foi aí que me dei conta do tamanho do problema e de tudo o que essa palavra pode acarretar.

“Não! Por favor”, pensei. Chega de problema. Sempre fui supersau dável e agora é uma atrás da outra!!!!!

Lembrei que a Alina, a minha psiquiatra, havia pedido para ligar quando chegasse para dizer como estava. Como ela mora bem perto do hospital, veio me ver. Chegou no meio do ultrassom, entrou na sala dizendo ao médico:

“Essa é minha querida!”

Por fim, uma boa notícia. Os médicos descartaram qualquer outro problema, pois o ultrassom estava ótimo e os exames de sangue tam bém! Ufa!!! Deve ser emocional ou um mau jeito. A Alina disse que isso é bem comum pela ansiedade pré-cirúrgica.

Enfim, chegamos ao hotel, quase 11 horas da noite. Pedimos um jantar leve seguido por um chá de hortelã, muito saboroso, por sinal. Aproveitamos e solicitamos o café da manhã para as 4h45, pois a partir das cinco não poderei mais comer, devido ao jejum de oito horas. Acho que terei fome durante a manhã, mas a tensão será tanta que possivel mente nem me atentarei aos protestos do meu estômago.

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Quando abrimos a porta do quarto para receber o jantar nos deram também uma sacola do FHITS. Logo imaginei que fossem os dois li vros de que havíamos falado: A Bailarina de Auschwitz e A Liberdade é uma Escolha, ambos da húngara Edith Eva Eger. Coloquei na mala do hospital “A Bailarina”.

Na contracapa estava escrito:

“Claudia,

Que esta leitura lhe traga força, amor e confiança.

Te admiro e estou com você.

Beijo muito carinhoso, Alice”

8 de junho de 2021 | Terça-feira

“Você pode tudo, menos desistir.”

Ao acordar e abrir os olhos com o telefone despertando pontual mente às 4h45, a primeira coisa que me veio à mente foi: finalmente chegou o dia “D” da minha cura. Tomamos nosso café e voltamos para a cama para dormir um pouquinho mais, mas não foi possível. Às seis levantei, segurei minha Santinha, ajoelhei e rezei, rezei muito, para que a minha cirurgia fosse um sucesso. Ao final desses momentos de oração sempre me sentia mais forte, mais confiante e com a certeza de que a batalha já estava ganha.

Na sequência, mandei mensagem para as minhas amigas e, como se fosse resposta automática, todas mandaram palavras de conforto, confiança e fé.

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Entrei no banho e fiz um rito de passagem com meus seios. Me despedi deles, mas não sem antes agradecer por eles terem estado até aquele momento comigo. Resolvi agradecer por eles terem amamen tado meus filhos e terem cumprido sua principal função em um dos momentos mais maravilhosos na vida de uma mulher. Literalmente os “abracei”, chorei, agradeci mais uma vez e disse tchau. Que venham os novos peitos. Que venha uma nova fase! Tchau!

Assim me arrumei e fomos para o hospital, e no caminho fiz o se guinte post:

“É exatamente disso que a vida é feita, de momentos. Momentos que temos que passar, sendo bons ou ruins, para o nosso próprio aprendi zado. Nunca esquecendo do mais importante: nada nessa vida é por acaso. Absolutamente nada. Por isso temos que nos preocupar em fa zer a nossa melhor parte, da melhor forma possível. A vida nem sem pre segue a nossa vontade, mas ela é perfeita naquilo que tem de ser!” – Chico Xavier.

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DEPOIS DA TEMPESTADE

Na fragilidade todos os superfluos perdem o encanto.

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18 de junho de 2021 | Sexta-feira

“Seja você a principal razão da sua vitória.”

Começa mais um dia desta nova fase. De vez em quando tenho “recaí das” de pensamentos. Vem à mente um monte de ideias sinistras, opacas, de que tudo poderia voltar algum dia, de que seria uma sina a carregar e daí por diante. Sombras que insistem em me visitar, mas eu rebato e tento não ceder.

Hoje, dez dias depois da cirurgia, é o dia de tirar os drenos, conforme combinei com o doutor Frasson. Ele me deu alta e paramos com toda a medicação. Aliás, acredito que a quantidade de remédios que tomei desde a cirurgia seja maior do que todos que já tomei a vida inteira. Era medi camento para a dor e antibióticos a cada duas horas. Eram muitos, mas essenciais para amenizar minhas dores intensas e acelerar a minha recu peração. O que importa é que me liberto um pouco mais a cada dia. E em breve poderei gritar para todo mundo ouvir. Agora estou livre. Ufa!

Hoje também é um dia muito especial por outros motivos. É aniversário da Cynthia. Mas fui eu que ganhei o presente. Ela veio de Porto Alegre passar a data comigo aqui em São Paulo. E não para por aí, a Anelise e a Márcia acabaram de chegar. Todas com seus respectivos maridos. Gos taria de poder colocar em palavras minha gratidão pela injeção de força, coragem, superação e vontade de viver que esses amigos me dão.

Definitivamente hoje era um dia de comemoração. Brinquei que foi tudo cronometrado para terminar numa sexta-feira e podermos comemo rar a vida com uma taça de vinho. Foi o que fizemos.

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19 de junho de 2021 | Sábado

O dia amanhece com São Paulo me lembrando um pouco o céu de Porto Alegre, meio cinzento, meio friozinho. E eu morrendo de sauda des da minha cidade, da minha casa e do meu trabalho. Parece que estou na capital paulista muito mais do que duas semanas.

Lembrei que hoje é batizado e aniversário de 1 aninho da filha da Lalá, a Maria Luísa, já carinhosamente apelidada de Lulu. O batizado será na Nossa Senhora do Brasil, igreja que fica nos Jardins e que acho uma das mais belas de todas em que já entrei. Chegamos no horário, mas como o padre se atrasou, aproveitei para ir, sozinha, bem próximo ao altar. Ten tei me ajoelhar, mas ainda não podia, me sentia um tanto fraca e achei melhor não arriscar. Então, sentei, fechei os olhos e agradeci, mais uma vez, por estar viva e pronta para começar uma nova vida.

Agradeci por tudo ter dado certo até ali, pela família, amigos, equipe médica e pela missão que irei cumprir a partir do instante em que es tiver recuperada para poder ajudar, de uma forma ou de outra, mulhe res que estejam na mesma situação que eu. Até mesmo as que não têm nada, ou pelo menos não sabem. Falar aos quatro ventos que o autoe xame e as idas periódicas ao médico são fundamentais para a detecção de qualquer nódulo que ainda esteja em fase inicial. Essa será minha missão. É uma promessa!

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“Faça dos seus sonhos um objetivo.”

20 de junho de 2021 | Domingo

“Não coloque limite em seus sonhos, coloque fé.”

Nasce mais um dia que posso chamar de inesquecível. Aliás, todos esses meses têm sido inesquecíveis. A cada amanhecer um monte de coisas para fazer e outras para aprender. Mas hoje é especial. Final mente chegou o dia de arrumarmos as malas e voltarmos para casa. Em alguns momentos pensei que esse dia nunca iria chegar.

Talvez pela ansiedade de voltar para casa, acabei dormindo muito mal a noite inteira. Acordei várias vezes durante a madrugada. Cansada de ficar na cama, às seis e meia levantei e fiz, com calma, alguns exer cícios de fisioterapia que precisava fazer. Tudo nesse momento tem de ser aos poucos, com cuidado e lentamente. Comecei a arrumar o que conseguia, o nécessaire e algumas roupas. Pedro levantou na sequên cia e já veio me ajudar. Ele disse que também estava ansioso e não via a hora de voltar para Porto Alegre. Foram longos 13 dias.

No avião, sentamos perto eu, a Marcia, a Anelise, o Vittorio e a Fer nanda Machado, a babá dos meus filhos. No exato momento em que de colamos, senti uma sensação diferente, mas agradável. Me emocionei repentinamente e me dei conta de que era mais uma ficha caindo. Uma nova fase chegando. E que tudo já tinha passado desde o dia em que, na sala de ecografia do hospital, a doutora disse: “Você tem um nódulo”.

Elas viram que eu estava emocionada, e se emocionaram também. Como estavam grudadas em mim desde o início, entendiam perfeita mente o que se passava em minha cabeça e em meu coração. Peguei nas

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mãos de cada uma delas e agradeci muito. A Fernanda, que cuida dos meus filhos, foi a minha verdadeira cuidadora nesses dias de recupe ração. Estava ao meu lado a todo instante. Até parecia minha sombra. Sempre disse a ela que estaríamos juntas até a minha velhice, e assim será. Ficarei velha, não sairei de cena tão cedo! Enxuguei as lágrimas e disse: “Acabou!!!”.

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O PROPÓSITO

21 de junho de 2021 | Segunda-feira

“Nunca desista, tem sempre alguém que se inspira em você.”

Mal clareia o céu e já penso na agenda do dia, da semana, e pratica mente tudo é referente à minha saúde. Ainda na parte da manhã tenho horário com a doutora Mônica para tirar os curativos. Ela também tem consultório em Porto Alegre. Aproveitei para ver como os meus “no vos” seios estavam. Tudo ótimo. Tirando o incômodo causado pelas faixas apertadas e pelo sutiã, tudo melhorou. A dor passou, aquele mal-estar contínuo devido à quantidade de remédios que tomava pas sou. E o que é melhor, eu estou achando “eles” lindos.

Na volta pra casa, decidi dar início à nova missão de vida que prome ti que seguiria. Ajudar a “salvar” mulheres dessa assustadora doença. Vou primeiro gravar um vídeo contando minha experiência. Sei que por meio dos meus canais digitais posso atingir uma infinidade de mu lheres. Graças à tecnologia, à internet e até mesmo no tête-à-tête vai ser possível reverberar minha mensagem. Então vou direto ao ponto. Os exames de mama são muito importantes para o diagnóstico preco ce. Em outras palavras, defino como o início da cura.

Para dar início à gravação do vídeo, coloquei uma playlist de alta fre quência para me “conectar” comigo mesma. Invoquei o Espírito Santo para me iluminar e fazer com que a minha voz chegasse aos corações e às almas das pessoas. Mirei, inicialmente, naquelas mulheres que me per guntaram nos últimos dias por que andava tão calada, tão sumida. Sentia que devia uma explicação a elas. Comecei a falar com todo meu coração, da forma mais sincera possível. Nunca havia me exposto daquela ma

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neira. Me emocionei, engasguei, mas não parei minha voz um minuto sequer. Percebi que, ao mesmo tempo que falava, também sentia um alívio. Uma sensação de que seria ouvida, com toda atenção do mundo, por uma, duas, dezenas, milhares de mulheres com aquele depoimento.

Ao apertar o botão para postar o vídeo me desfiz em lágrimas. Uma catarse. Era uma mistura de medo, de felicidade, mas principalmente de alívio. E perguntei a mim mesma: meus Deus, será que fiz a coisa certa? Será que as pessoas vão entender a minha intenção?

Para meu espanto, em poucos minutos comecei a receber uma en xurrada de mensagens vindas de todos os cantos, de todos os meios, whatsapp, direct, comentários… São amigas emocionadas, seguidoras parabenizando e dizendo que foram tocadas. Outras revelando que há tempos não fazem qualquer tipo de exame de prevenção por causa da pandemia. Muitas relatando suas histórias com o câncer, de luta, de amor, de vitória. Na sequência começaram a chegar flores, cartões, mensagens lindas e que me fizeram ir aos prantos novamente.

Rapidamente vieram as respostas dos meus questionamentos. Eu fiz a coisa certa sim, acertei. Eu não me omiti, estou apenas cumprindo minha missão de ajudar as pessoas, mulheres, mães, irmãs, amigas, colegas de trabalho e todas aquelas que possam escutar a minha voz. Esse é meu objetivo de agora em diante. Em resumo, digo do fundo do coração que achei meu propósito de vida!

Esse momento mexeu tanto comigo que decidi passar o resto do dia respondendo às mensagens que recebia. E não paravam de chegar. Eu queria dar atenção, colo, carinho, um abraço, mesmo que virtual, em

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todas aquelas pessoas. Queria que elas soubessem o quanto eram es peciais para mim.

Junto ao vídeo escrevi a seguinte mensagem:

“O chão sob meus pés se abriu. Foram vários nocautes e eu caí na lona. Mas depois do último golpe decidi que isso era um presente de Deus, uma missão que estava recebendo. Decidi que iria vencer, que sairia curada e que iria fazer disso um propósito. Tomei isso como uma lição de vida e que poderia ajudar várias mulheres com a minha expe riência. Mulheres que me escutam, querem e devem se cuidar. É preciso saber que o diagnóstico precoce é a melhor prevenção e início da cura. Fui diagnosticada com câncer de mama.

A minha gratidão a Deus, à Nossa Senhora, aos médicos João Stei bel, Antônio Frasson e Mônica Frasson, que são anjos na Terra e cui dam dos seus pacientes com tanto zelo, carinho e amor.”

Não imaginava que esse vídeo pudesse mexer com tanta gente, des pertar o interesse, principalmente de mulheres, o que é muito bom. Queria muito com ele ressaltar a importância dos exames e do diagnós tico precoce, que são os principais cuidados que se deve tomar para evitar a evolução do câncer. Acredito que consegui! Disseram que é o vídeo mais comentado no momento na cidade e que já há uma procu ra grande de mulheres querendo agendar seus exames. As mensagens não param de chegar, e as flores também não.

Ao ver tantos comentários, tantas histórias, chego a me arrepiar só de pensar na situação se não tivesse feito a minha consulta de rotina

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por causa da pandemia, descoberto o nódulo bem no início, como es taria hoje. Sinceramente, não sei dizer. O que sei é que muitos desses “bichinhos” são vorazes e impiedosos. Surgem de uma hora para outra e às vezes se desenvolvem numa velocidade impressionante. Alguns meses, e pronto. O mal já está feito e as chances de cura ficam remotas. Nos relatos que recebi, têm mulheres que descobrem que esse intruso estava em seus seios há mais de dois anos. Terrível!

Para quebrar um pouco o clima e mostrar que família e amigos po dem ajudar e muito quem está vivendo esse drama, amanhã vou postar umas fotos dos dias que sucederam a cirurgia. Uma homenagem pra lá de justa às amigas e à Kenia (a enfermeira instrumentadora do hospital que cuidou de mim), que estiveram grudadas comigo o tempo todo. Fo tos que representam amizade, carinho, cuidado e fé, como a da Cynthia apagando velinhas com as mãos em forma de oração. É muita emoção!

Aí escrevi o post:

“Foram poucas as fotos que tirei nesses últimos dias, mas essas três aqui são para registrar momentos e algumas pessoas especiais que esti veram presentes comigo nesse período delicado da minha vida. A Lalá é uma delas. Mandou essa foto do último sábado, que foi o batizado e aniversário de 1 aninho da sua filha Lulu. Além de marcar presen ça para homenageá-las, fui à igreja também para agradecer as graças recebidas. Ela me fez companhia em muitos momentos desses dias que passei em recuperação. Organizou uma festinha para o meu filho que estava de aniversário no meio disso tudo e foi uma amiga e irmã ímpar como sempre. Te amo, Lalá! A Cynthia também estava de aniversá rio naquele sábado. Ela adora uma festa. Mas abriu mão da sua para

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estar ao meu lado. Te amo, Cy! Você foi meu maior presente no seu aniversário. E a Kenia, enfermeira da doutora Mônica, mas também cuidadora, massagista, ouvinte com um carinho e dedicação sem igual. Cuidou de mim, deu banho e trocou meus curativos todos os dias. Obri gada, Kenia. E ainda tem minha cunhada Giovana, a Jô, que sempre me faz rir e estava comigo como uma verdadeira irmã, como ela sem pre foi para mim. Te amo, Jô! A Anelise, que debandou de Porto Ale gre para São Paulo só para me ver e dizer que ficaria de mãos dadas comigo. E minha querida Márcia, que fez de tudo para ficar ao meu lado. Amo vocês. Obrigada a todas essas mulheres que têm um coração do tamanho de um gigante. Minha gratidão eterna e todo meu amor! #amigosdavida - #opoderdaamizade”

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O DIA “D” E SUAS REPER CUS SÕES

22 de junho de 2021 | Terça-feira

“Você merece todo amor que tenta dar aos outros.”

Hoje faz exatamente duas semanas desde a minha cirurgia. Lembro perfeitamente daquele 8 de junho. No caminho do hotel para o hospi tal, meus sentimentos eram intensos e borbulhavam por todo o corpo. Uma mistura de nervosismo, confiança, do medo do desconhecido, mas eu sempre buscando pensamentos positivos. E declarei: não che gou minha hora, pois tenho muito para viver, filhos para criar, marido para amar, amigos para celebrar e muito a fazer por mulheres que estão passando por essa fase que eu estou enfrentando agora. Bora viver!

Pedro não saiu do meu lado, e uma das últimas coisas que lembro antes de ser levada para o centro cirúrgico, já meio tonta pela injeção que me deram no quarto, é dele me dando a mão, um beijo e dizendo que se pudesse trocaria de lugar comigo. Todas as vezes que repeti isso ao contar para as minhas amigas me emocionei muito. Me sentia grata por ter esse companheiro tão maravilhoso.

Pedro e eu estamos juntos há mais de 20 anos. Como num conto de fadas, o vejo como o homem da minha vida e eu sei que sou a mulher da vida dele. Sabe aquela história de almas gêmeas? Pois é, nós somos! Conhecemos perfeitamente um ao outro. Nos entendemos só no olhar. Eu sinto quando ele vai ligar. Sei como ele pensa. Somos muito compa nheiros, parceiros, gostamos de muitas coisas parecidas e nos amamos muito. É claro que temos nossas diferenças, mas nunca passamos um dia brigados. Eu agradeço a Deus todos os dias por ele ser meu marido e pai dos nossos filhos.

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Lembro também de forma meio vaga, já na sala de cirurgia, falando algo com o doutor Frasson e a doutora Mônica. Ele dizia que eu não lembraria do que estávamos falando, mas sei que era sobre Nossa Se nhora. Apaguei dizendo que ela estava ali com a gente.

A Kenia, que ficou responsável por cuidar de mim nos dez dias se guintes, tornou-se uma pessoa muito especial. Ela me relatou, depois, que apaguei quando a doutora Mônica fez o sinal da cruz em minha testa. Chorei quando soube disso.

Aos poucos fui lembrando de algumas coisas que aconteceram no dia da cirurgia. Naquela manhã, quando a doutora Mônica foi no quar to marcar minhas mamas, ela disse que na hora da anestesia era para eu pensar em algo bom, pois era assim que iria acordar. Adormeci tranquila, confiante em toda a equipe médica, em Nossa Senhora e em Deus. Acordei do mesmo jeito, tranquila e agradecida.

Outra coisa que lembrei é que quando estava saindo do quarto para a cirurgia, chegou um vaso de flores lindas em tons de rosa com um cartão:

“Amiga, você não pode ficar em nenhum lugar sem flores! Então, re ceba essas para comemorar esse dia de vitória. Te amamos muito.

Beijos, da família Sala”

Lalá sabe o quanto amo flores. Esse ser vivo lindo, muitas vezes sua vemente perfumado e colorido, com que a natureza nos presenteia. Coloco flores em todos os lugares! Mais um motivo para ir feliz e con fiante para a cirurgia!

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A operação foi um sucesso. Durou mais de sete horas, o que me faz crer que não tenha sido nada fácil. Mas difícil mesmo era o que estava por vir. Os primeiros dias da recuperação. E afirmo categoricamente que não foi simples. É muito dolorida e demorada, tenho de admitir, mas faz parte do jogo, se quiser vencer. Quando tentei levantar pela primeira vez, achei que seria impossível. Minha pressão foi lá embaixo, tive náuseas e tudo começou a rodar. A dor mais forte que já senti. Foi horrível. Não consegui ficar em pé. Tive sucesso somente na quarta -feira à tarde, ou seja, mais de 24 horas depois da cirurgia. Isso porque já tinham tirado a minha sonda e queria ir ao banheiro. Reuni todas as minhas forças e fui. Tive a sensação de que tudo iria rasgar por den tro. Mas a luta contra a dor não terminou por aí. Como ela continuava muito forte e intensa, sem trégua, mesmo com todos os remédios, o Núcleo da Dor do Hospital Einstein foi acionado para organizar outra medicação. Doses de morfina de 3 em 3 horas foram receitadas. Um alívio parcial. E os dias foram passando, e a cada novo amanhecer, real mente, sentia que ficava melhor.

Para minha alegria, o melhor remédio para amenizar a dor estava comigo, ao meu lado todo o tempo: o Pedro. Disse que teria trocado de lugar comigo na cirurgia, mas depois do que viu, revelou: já teria morrido! Rimos muito.

Alina foi me visitar. A Lalá também, pois trocou o “turno” por algumas horinhas para o Pedro poder ir ao hotel, tomar um banho e comer algu ma coisa com o Diego Sala (marido da Lalá) e minha cunhada Giovana. Já disse que ela sempre me diverte, não importa a ocasião, né? Chegou na hora em que a enfermeira veio para tirar o curativo e colocar aquele sutiã especial pós-cirúrgico. Viu meus peitos e logo disparou uma:

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“Cunhada, acho que você saiu ganhando, deu um belo up-grade!” Rimos muito. Tudo tem seu lado bom!

A previsão era para eu ter alta na quinta-feira, dois dias após a ci rurgia, mas por causa do meu nível de dor só saí na sexta. Eu e meus “gêmeos” (drenos) fomos para o hotel.

Um dos momentos do dia que mais esperava acontecer era a chegada dos meus filhos que vieram à tarde de Porto Alegre. Além de emocio nante, foi maravilhoso e até engraçado ver a carinha deles, chegando bem devagarinho, cheio de cuidados como se estivessem pisando em ovos, me deram um abraço de leve e um beijinho cada. Tão bom ter eles pertinho. Meu coração se enche de amor e de paz. Tem algo mais revigorante do que ter os filhos por perto? Não sei exatamente o que acontece, mas sempre que me sinto sem energia ou pra baixo, ficar per to deles me recarrega. Que coisa boa!!!

No passar dos dias, a rotina do hotel era sempre a mesma. Kenia, com seu jeito supercalmo, vinha de manhã, fazia drenagem bem de leve nas pernas e na barriga (eu fiquei muito inchada, quase seis quilos só de líquido). Me dava banho, esvaziava os drenos e trocava os curativos.

Como já havia me programado para não cair no tédio, passava os dias lendo. Realmente o livro A Bailarina de Auschwitz superou minhas ex pectativas. Amei. Fiquei perplexa em saber tudo o que a Edith passou. Mas o que mais me marcou é como ela lidou com os acontecimentos externos para que não afetassem sua alma e seu coração. Um dos meus lemas é buscar sempre a força interior que existe em cada um, e nos relatos dela identifiquei muito essa mensagem.

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Decidi que iria ficar longe do celular, o que por um lado foi bom. De tox digital quase total. Pegava, vez ou outra, para responder a algumas mensagens e dar uma espiada no que estava acontecendo no Brasil e no mundo. E o que mais estampavam as manchetes era a ação devastadora do coronavírus. Triste. Afetava todos sem distinção nenhuma. Optei, então, por tornar aquele período um tempo de recolhimento e reflexões.

No domingo, como combinado, festejamos o aniversário do meu pe queno, o Vittorio, ali mesmo no restaurante do hotel. Afinal, por conta da dor e dos meus drenos, não poderia ir muito longe. O que importava mesmo é que estava ali, ao lado dele, para mais um aniversário. Viva, vencedora e “quase” recuperada.

Como já disse, Lalá providenciou o bolo e os doces e a Giovana as lembrancinhas da “festinha”, que foi só pra nós e pouquíssimos amigos. Na realidade foi um almoço na varanda do hotel. Mas fiquei feliz em ver todos ali. Eu bem quietinha na cadeira, observando a alegria do Vittorio.

Depois de ler algumas das dezenas de mensagens que recebi sobre o que se passou comigo e pelo aniversário do Vittorio, ele me chamou di zendo que queria mostrar uma coisa. Na verdade, era falar algo. Disse, docemente, que ficou triste porque eu estava doente, e também porque eu não podia agarrá-lo e fazer um ataque de beijos, como sempre faço. Sorri e fui logo avisando que assim que ficasse boa era pra ele se pre parar, que o ataque viria, forte e com infinitos beijos. Então pedi que ele chegasse perto para dar “apenas” um beijo nele. Obediente como sempre, encostou sua cabeça delicadamente no meu rosto e pude dar um beijo bem demorado. Agradeci a Deus por aquele momento!!!

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As crianças absorveram tudo, apesar de não saberem exatamente todo o contexto do que está acontecendo. Vejo que elas compreendem a complexidade da situação, o que acaba as afetando muito. Como sem pre digo, até nos momentos mais difíceis da vida podemos aprender, extrair coisas boas. Então, eu e o Pedro resolvemos ter outra conversa com o PP e o Vittorio para explicar que tem coisas na vida que não te mos controle, e que cuidar um do outro e da família são as coisas mais importantes que devemos fazer numa situação de fragilidade. E que nem sempre podemos viver o que estava planejado, mas sim o que im porta para aquela hora. Parece meio filosófico, mas é o que a realidade nos proporciona. Como disse Chico Xavier, a vida nem sempre segue a nossa vontade, mas ela é perfeita naquilo que tem de ser.

E assim foi passando a minha segunda semana de recuperação. Na quarta-feira pós-alta tive consulta com a doutora Mônica e o dou tor Frasson. Enquanto a doutora Mônica trocava os curativos, falamos muito sobre Nossa Senhora de Guadalupe. Na sequência, o doutor Frasson entra na sala com o Pedro e começa a contar sobre a cirurgia e quando o resultado do exame da biópsia iria chegar. Disse que o nó dulo tinha exatos 6,6 mm. Mas que havia mais três nos dutos mamários e que o maior já tinha 1,5 cm. Então tínhamos feito a escolha certa. Mesmo assim, falou que agora eu teria que consultar um oncologista para ver se precisaria fazer algum tratamento pós-cirúrgico.

“Como assim, não terminou?”, pensei, quase em voz alta.

Não consegui me conter. Comecei a chorar, não foi só o chão que se abriu, o céu também despencou sobre minha cabeça. O doutor Fras son olhou para mim e disse, com a voz firme e ao mesmo tempo suave:

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“Você achou que tinha terminado, né? Não sabia que vinha isso depois?”

No transcorrer dos dias fui sendo bombardeada de informações no vamente. Nem tudo processava e realmente não havia pesquisado nada sobre o assunto. Talvez por não querer contaminar minha mente com coisas ruins ou erradas. Eu só ia para onde me mandavam ir, sem pen sar! Ou melhor, eu pensava:

“Se vou ter que fazer igual, vou lá e faço, não preciso saber como é”, e me veio à cabeça o ditado “A ignorância é uma bênção?”. Pois é, foi ele que segui.

Como não poderiam faltar as frases de conforto, o doutor foi logo dizendo que era para ficar tranquila, que meu resultado tinha sido mui to positivo e que cirurgia tinha sido um sucesso. E foi além. Disse que, provavelmente, não teria de fazer quimioterapia e radioterapia. Mas que tomaria um bloqueador de hormônio, pois pelo teste o meu tumor foi alimentado pela produção de estrogênio e progesterona.

Fomos para a sala dele, eu agarrada no Pedro, e nos mostrou um aplicativo que ele foi preenchendo com os meus dados: idade, tipo de tumor, tamanho, etc., e ali dava que em cinco anos eu tinha 98% de chances de cura. Eu queria 100%! Sempre fica um fantasma no ar. Queria que essa história tivesse terminado ali, e ponto final.

Voltando pra casa fragilizada novamente, meu marido disse:

“Claudia, 100% não existe, tem variantes, mas nós vamos chegar no melhor! Onde está seu positivismo? Você é a pessoa mais positiva que conheço!”

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Organizei as ideias, tranquilizei a mente e pensei:

“ É verdade, por que eu estou assim? Isso é uma notícia boa!”

Nessas horas, em momentos como esse, é que a gente se dá conta: você é e será pelos próximos anos uma paciente oncológica. Você teve câncer, isso não se apaga assim. Essa é uma doença que traz muitos medos, muitas fantasias e até incertezas, que insistem em levar seus pensamentos para um abismo de tristezas.

Mas é exatamente nessas horas que você precisa se agarrar aos fa tos e não às fantasias. Você precisa controlar sua mente e suas ideias. Eu controlei. Tenho 98% de chances. Eu estou curada. Mesmo se a porcentagem não fosse essa, o pensamento deve ser! Afinal, é a nossa mente que controla tudo. Então vamos controlar ela!

Para fechar a consulta, o doutor Frasson pediu para mandarmos o material anatomopatológico para ser examinado nos Estados Unidos. E foi enfático:

“Vamos pecar pelo excesso!”

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23 de junho de 2021 | Quarta-feira

“Não ceda ao medo, ao fracasso, ao desânimo. Acredite em você, na sua força e na sua fé.”

Depois de dois dias intensos de bate-papos e muita troca de infor mações sobre a minha vida, minha experiência, minha saúde e o firme propósito de alertar mulheres sobre o câncer de mama, resolvi dar um tempo e fazer um post para o Pedro. Ou seria sobre o Pedro? O que importa é que quero falar do papel como marido, companheiro, amigo, pai dos meus filhos e meu grande amor que ele desempenhou duran te todos esses dias. E posso afirmar categoricamente que não foi um fardo fácil para ele carregar não. Amor, cumplicidade e dedicação são algumas palavras que podem definir o que senti com sua presença, me dando energia, esperança e fé para superar cada momento difícil que surgia com um novo dia.

Post:

“Ele esteve ao meu lado a cada momento! Não esmoreceu nem por um segundo sequer. Me deu forças quando já não tinha mais nenhuma. Praticamente me carregou no colo e disse que daria tudo para estar em meu lugar. Não consigo falar isso sem chorar. Como te amo, Pedro. Na hora em que não sabia mais para onde ir, você me conduzia com maes tria. Mostrando quem eu sou, a mulher que carrego dentro de mim. Foi você que me resgatou do escuro, me fez abrir os olhos e ver que sempre há luz. Você sempre foi, agora mais do que nunca, a minha fortaleza. Você mostrou e conversou com os nossos filhos e disse que a vida nem sempre é como a gente gostaria, mas o mais importante era estarmos

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juntos, porque em primeiro lugar vem a família. Que aula você nos deu. Te amo para sempre. Obrigada, lindo. Eu sempre soube que você é o amor da minha vida e não sei se é possível te amar mais do que já te amo. Mas se é, eu te amo mais que tudo e para sempre.”

Como tudo para mim foi rápido, da notícia do nódulo até o pós-ope ratório, têm coisas que ainda não processei direito. Por que não dizer, que nem cheguei a pensar. Mas vira e mexe uma ficha cai e a mente viaja. Quando você descobre um câncer na sua vida, a sensação de fi nitude fica muito presente no seu cotidiano. Você repensa muitas coi sas, valores, amizades. Aí vêm vários questionamentos na sua cabeça, como, por exemplo, pelo que vale a pena viver de verdade? É muito traumático, pra não dizer desesperador.

A verdade é que em todo o processo de um paciente oncológico o medo é constante. Como se você estivesse todo o tempo com uma cor da no pescoço. E passei a perceber que quando você está com medo seus instintos se aguçam. A mente vai a mil e todo o corpo se protege. Uma forma natural de defesa, acredito. Em outras palavras, é uma forte descarga de adrenalina constante.

Também me sentia muito atrapalhada, confusa, sem orientação. En tão dizia para o meu marido: fala pra onde que é pra ir, que eu vou. Em nenhum momento pesquisei ou fui questionar o que deveria fazer. Sem rodeios, era muito objetiva e prática. Se tenho que fazer de qualquer maneira, quero fazer sem criar fantasias. Isso adquiri da confiança que tenho na equipe médica e em todos os profissionais envolvidos. E sigo a teoria: quem confia se entrega. E para se curar, é preciso se entre

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gar de corpo e alma. E eu me entreguei. Parece um pouco complicado, meio utópico. Mas foi a regra que segui, e pronto!

Hoje, por exemplo, se perguntam que tipo de câncer era o meu, por que decidi tirar as duas mamas, etc., respondo: não sei, quem sabe disso é a equipe médica que cuida mim. Eles estudaram para isso, não eu!

Aprendi também que cada caso é um caso. Cada um é único e terá um tratamento especial, personalizado. Não se pode comparar os ca sos. Temos, sim, que nos cercar de bons profissionais e confiar, acre ditar com fé e muitos pensamentos positivos.

Algumas pessoas podem achar que é balela, conversa fiada ou coi sa parecida, mas sempre fui apegada a tudo que possa gerar saúde e bem-estar. Não importa se tem cara de crendice ou qualquer coisa pa recida. Ser positiva, pensar positivo, acreditar que tudo vai dar certo faz uma diferença muito grande durante o tratamento e a recuperação. Pelo menos é certo que se tem um prognóstico muito melhor agindo assim. É sabido, não sei se cientificamente comprovado, que a men te tem um papel fundamental na cura de muitas doenças, inclusive do câncer. Então fiz tudo para dominá-la. Por isso, fica a lição: a mente deve dominar o corpo, e não ao contrário. E lembrando: a ciência e o estado emocional (o psicológico) formam uma dupla infalível nessa luta, lenta e incansável, mas que tem tudo para ter um final feliz.

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AINDA NÃO TERMINOU?

14 de julho de 2021 | Quarta-feira

“Não há sucesso sem dificuldade, como não há vitória sem luta. Nunca deixe de lutar.”

Como já foram tantos outros recentemente, hoje é mais um dia especial neste novo capítulo da minha vida. É o dia em que sai o resultado do meu Oncotype, um exame genético que revela a probabilidade da reincidência de células cancerígenas pelo corpo. Procuro ficar tranquila e confiante. Semana passada fiz um PET Scan, outro exame que faz um mapeamento completo do corpo ou apenas de parte dele, e deu que estava tudo “lim pinho”. Isso quer dizer que não tenho nenhum outro tumor no corpo.

Um detalhe que ainda não comentei foi que, durante o período pós -cirúrgico, passei a fazer sessões de fisioterapia. Era como beber um copo de água gelada quando você está morrendo de sede debaixo de um forte calor. Eram duas sessões por semana, que não via a hora de acontecerem. Uma com a fisioterapeuta Alessandra Tessaro, especia lista em pós-operatório de câncer de mama, e a outra com a Carol, mi nha fisioterapeuta de anos.

A Carol Webber é, além de muito experiente, uma pessoa especial. Nossos encontros iam além de cuidar de mim. Falávamos de tudo, mas, principalmente, sobre as questões de família, religiosidade, pois ela é uma pessoa muito espiritualizada. Sempre comentava como a minha exposição sobre o câncer ajudava pessoas que estavam passando o mes mo que eu. Sentia, mesmo que de forma indireta, que minha recupera ção e superação já estavam servindo de exemplos para outras mulheres na mesma situação que a minha. Isso me deixava feliz e me confortava.

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Continuando no “meu” noticiário médico, ontem fiz a retirada do DIU com o doutor João. Antes do procedimento, ficamos conversando e ele elogiou minha atitude de fazer o post falando da minha descoberta do câncer, meus enfrentamentos e, principalmente, do alerta às mulhe res sobre a importância do diagnóstico precoce, com o autoexame e os exames de prevenção.

Enquanto falávamos ele começou a contar sobre as possibilidades dos resultados do Oncotype de hoje. Disse que deveria estar pronta para que se viesse qualquer coisa diferente das expectativas eu enfren tasse de cabeça erguida. Que contasse até 10 e bola pra frente. De novo, me questionei. Tudo isso pra mim já não é passado? Eu já não estava curada? Não entendi muito bem a colocação que ele fez. Mas ok, pensei. Temos de estar pronta e forte pra tudo nessa vida.

De volta ao exame, mandei mensagem para o doutor Frasson per guntando se ele poderia enviar o resultado. Respondeu, de forma curta, que me ligaria no final da tarde. Estranho, pensei. Quando a Cynthia e a Anelise chegaram em minha casa, contei a elas que estava aguardan do, bastante ansiosa, o resultado do Oncotype, que sairia hoje. Que o doutor Frasson disse que me ligaria e não tinha me enviado o resultado ainda. Percebi que elas também ficaram preocupadas.

Logo depois das seis da tarde, o Pedro chegou em casa, horário que não é habitual dele chegar, pois sempre é um pouco mais tarde. Ficou ao meu lado, de mãos dadas, assistindo a uma série na TV. De vez em quando, dava uma leve apertadinha em minha mão como se ele dissesse: “Tô aqui do seu lado”. De novo, percebi minha sensibilidade aflorando. A mesma sensação que tive no início do descobrimento dos nódulos.

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Minutos depois, toca o telefone e um calafrio sobe em mim dos pés à cabeça. Era o doutor Frasson me chamando por vídeo. Começou per guntando como estavam os filhos, meus cachorrinhos, pressenti que algo não estava certo. Depois de alguma conversa jogada fora, come çou a falar sobre o que eu realmente aguardava, impaciente. Iniciou dizendo que o que iríamos fazer era para eu viver mais 50 anos e que nós estávamos “indo no detalhe”.

Disse que o resultado do meu exame apontava pra eu fazer a quimio terapia, mas que isso seria uma decisão exclusiva minha, pois algumas pessoas optavam por não fazer e outras por fazer, mesmo sem ter feito o Oncotype. Como assim? Fiquei confusa. Perguntei se essa químio seria via oral. Ele disse que não, que teria de ser na veia. Não estava nem de longe esperando por isso, confesso, mas ouvi tudo com muita atenção e calma.

De forma tranquila, ele explicou que essa ação aumentaria a possibi lidade de o câncer não voltar e que teríamos de fazer tudo o que fosse possível para isso não acontecer. Concordei e disse que faria o que fos se preciso. Na sequência, falou que iria ligar para o oncologista doutor Barrios, que é referência em tratamento de câncer, para me atender amanhã, e que me retornaria em seguida.

De novo, fui a nocaute. Olhei para o Pedro, que, muito emocionado, disse que o doutor Frasson já havia ligado para ele mais cedo. E elogiou a forma toda cautelosa como deu a notícia. Foi aos poucos nos passan do essa delicada e ao mesmo tempo terrível informação. Eu, “pacien temente”, fui digerindo a notícia sem me dar conta do que realmente era, do que estava por vir. Só dizia sim, sim, sim! Afinal, ele é o meu

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médico, ele é quem cuida de mim e sabe o que é melhor. Me entrego em suas mãos e nas mãos de Deus.

Um pouco mais tarde, o doutor Frasson ligou dizendo que havia marcado para as 4 da tarde de amanhã a consulta com o doutor Barrios. Como ainda estava baqueada, fragilizada e emocionada com o impac to da notícia, não quis falar muito na ligação. Ele percebeu meu jeito e disse: “Não fica pensando bobagens. Isso que vamos fazer é apenas mais ação preventiva, uma segurança”.

Vou revelar uma coisa, que sei que já falei aqui anteriormente: por mais que sejamos fortes, com o pensamento positivo sempre, acreditando que tudo vai dar certo, nessas horas é muito difícil controlar tudo o que passa pela nossa cabeça. O principal é o medo de perder a batalha pela vida.

Mas pra espantar todos esses fantasmas que me rondavam, disse firme mente: estou curada. Isso nunca mais vai voltar, sou forte, sou saudável e abençoada. Nossa Senhora sempre me cobre com o seu manto e me protege.

Mas já sabia que não conseguiria me esquivar de uma coisa: os efeitos colaterais que a quimioterapia gera. Ninguém nem os médicos, nem a minha família, nem a minha fé vai conseguir me proteger disso. Ao conversar isso com o Pedro, ele imediatamente já coloca as coisas de uma maneira mais tranquila, menos dolorosa, só para eu não ficar ainda mais triste. Disse que já tinha falado com os médicos e que todos foram unâni mes em dizer que os medicamentos hoje evoluíram muito e que amenizam consideravelmente os efeitos colaterais. Concordo, na esperança de que isso seja verdade, dou um sorriso meio de lado e um beijo em seu rosto.

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15 de julho de 2021 | Quinta-feira

“Aprenda a focar na solução e não no problema.”

A primeira coisa que veio à minha mente pela manhã foi: mais um dia “D” na minha vida, mas hoje estou com “D” de Deus. Conforme combinado ontem, Pedro e eu fomos para o consultório do doutor Barrios um pouco antes das 16 horas. Eu estava estável, concentrada. No caminho para o consultório comecei a pensar nas pessoas que não conseguem descobrir precocemente essa doença. Às vezes por falta de condições, de informação ou mesmo por não acharem tão importante o autoexame e o exame anual. São tantos os motivos, mas o resultado é sempre o mesmo no caso de a doença chegar e se instalar: um sofri mento maior no tratamento e chances menores de recuperação.

Eu consegui descobrir ele no início, bem pequeno ainda, tudo gra ças a uma simples consulta de rotina com meu ginecologista. Para mim ficou claro a importância do autoexame, da visita regular ao médico, do descobrimento precoce da doença e do tratamento.

Para complicar ainda mais, vivemos o auge de uma pandemia mun dial onde hospitais estão lotados e sem condições de atender a todos. Fico imaginando quantas consultas, exames, tratamentos e cirurgias eletivas foram postergados ou mesmo cancelados.

É muito sofrimento e tristeza, especialmente aos pacientes de cân cer, qualquer que seja o tipo, pois trata-se de uma doença que não cos tuma dar tempo ao tempo. Quanto mais rápido for o ataque a ela, mais resultados positivos o paciente tem.

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A consulta foi ótima. Saí do consultório do doutor Barrios muito mais esperançosa do que quando entrei. De uma forma bem calma e voz tranquila, ele disse que atualmente os efeitos colaterais da qui mioterapia são muito mais brandos e que eu usaria uma touca de res friamento para diminuir a probabilidade de queda do cabelo. E disse: “Vamos combinar que o cabelo não é prioridade. Se cair, ok!”. Falou também que meu tratamento iria durar cinco meses no total. Primeiro, quatro sessões de 15 em 15 dias do que chamam de “químio verme lha”, depois três meses com sessões semanais, totalizando 12 sessões, de “químio branca”. Explicou ainda que iria colocar um cateter para facilitar as aplicações. Só de pensar, já sentia calafrios.

16 de julho de 2021 | Sexta-feira

“Algumas vezes, coisas ruins acontecem em nossas vidas para nos colocar diante das melhores coisas que poderíamos viver.”

Hoje relembrei por que estou escrevendo este diário: escrevo na tentativa de poder deixar uma mensagem de esperança para as mu lheres que estão ou estarão na mesma situação que eu. Escrevo por que acredito que posso ajudar uma mulher que seja a passar por esse turbulento caminho em que me encontro de uma forma mais suave, vendo em mim uma irmã de fé e de esperança. Por isso todas estas palavras nestas folhas!

Por indicação dos meus médicos, fomos ao consultório do doutor Márcio Boff, o cirurgião oncológico que irá colocar o cateter em mim. Também de uma forma bem calma e tranquila, ele fez um passo a passo sobre como se dará todo o processo. Será por meio de uma sedação

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média profunda e anestesia local. O corte será feito na axila, para não aparecer a cicatriz, e o cateter ficará posicionado acima do meu seio. E surpresa: já marcamos para amanhã a colocação.

Aproveitei o dia para poder arrumar meu cabelo e ir à dermatologista. Tenho de aproveitar enquanto posso, pois durante todo o período da quimioterapia, aqueles longos cinco meses, não poderei fazer essas coi sas. À noite, sem estar esperando, tive uma surpresa bastante agradável. A Cynthia e a Anelise vieram em casa e conversamos por horas e horas. Não queria que aquele momento terminasse. É lógico que demos mui tas risadas e também choramos juntas. Faz parte! De forma bem séria, a Anelise disse que se eu ficasse careca ela ficaria também. Pensou até em raspar a cabeça ontem mesmo quando soube que teria de fazer químio. Disse a ela que não era preciso e que não queria que ela fizesse isso. Bastava uma careca só na turma. E completei: “Se ficar careca, ela vai ficar muito bem escondida embaixo de uma linda peruca”.

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MUITO AINDA PELA FRENTE

O cancer de mama me trouxe a percepcao do que e essencial.

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17 de julho de 2021 | Sábado

Abro os olhos hoje com a cabeça a mil. Tomei o café às oito da manhã e caí na cama novamente. Dormi mais, coisa rara. Tinha de ficar em jejum. Antes de sairmos de casa, às 13 horas, rezei o terço da libertação para pedir a minha cura. Não posso negar, bateu o desespero. E o Pedro do meu lado, sempre confiante, dizendo palavras de conforto e otimismo.

Fico pensando no que vem pela frente. Dei conta de que o cabelo vou conseguir preservar, pelo menos um pouco graças à touca, mas os outros pelos irão cair. Para uma pessoa vaidosa como eu, que nunca saio de casa sem rímel, isso não vai ser muito fácil.

Na minha cabeça fica um conflito de agradecer que não tenho mais tumor, que a químio é profilaxia, que é para minha cura total, e sentir ao mesmo tempo o medo de todos os efeitos colaterais que ela pode causar.

Tropeço também em outros diversos medos: medo de ficar feia e en velhecida com o tratamento, medo do meu marido não me achar mais atraente, etc. Mas ao mesmo tempo penso que não posso sentir e não devo sentir essas coisas. Afinal, tenho de entender que tudo isso é su perficial e que o mais importante é que estou viva, bem, forte para fazer esse tratamento. Tarefa nada fácil manter esse equilíbrio mental nesse momento. Parece uma constante e interminável queda de braço. Da for ça de vontade de quem quer viver por muitos e muitos anos contra um “bichinho” que pode voltar a se apropriar de mim no futuro.

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“Os dias cinzentos existem para você os colorir.”

Bom, vamos ao procedimento. Até que foi rápida a colocação do ca teter, que através de um corte na axila foi posicionado um pouco acima do seio esquerdo. Será por meio dele que vou receber toda a medicação que vai limpar definitivamente meu corpo. Às cinco da tarde já estáva mos de volta em casa. Tomei uma sopinha de capeletti e fui pro quarto descansar um pouco. Toca o meu celular. Era a Giovana. Durante nos sa conversa percebi que minha voz dava umas embargadas, mesmo não querendo, e que depois viraram choro. Não conseguia mais falar, só chorar, chorar, chorar. E novamente algo dentro de mim pedia para eu levantar a cabeça, criar forças e subir mais um degrau nessa luta. Me re cuperei. Disse a ela, mas acredito que estava falando para mim mesma, firme e convicta de que tudo iria ficar bem.

18 de julho de 2021 | Domingo

Tive uma noite bem dormida, de sono tranquilo, uma café da manhã agradável com nós quatro reunidos. Mais tarde, para não perdermos as tra dições gaúchas, fomos almoçar juntos com a Cynthia, José Luiz, Anelise e Eduardo em uma churrascaria. Aproveitei a oportunidade e pedi a elas me acompanharem, no dia seguinte, à clínica, onde receberei todas as orienta ções de como será o tratamento e também a minha primeira químio. É sem pre bom ter amigas ao lado da gente. Nesse momento, então, ainda mais.

Mais para o final da tarde, o Pedro saiu e fiquei em casa pesquisando so bre alimentação durante a químio, como usar cílios postiços e como fazer uma maquiagem para não ficar com cara de doente. Do nada voltei a ter uma

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“Busque sempre a sua melhor versão.”

crise de choro. Só parei quando olhei pro lado e vi a contracapa do livro do neuropsiquiatra austríaco Viktor Emil Frankl, que tinha o seguinte dizer:

“A liberdade espiritual do ser humano, a qual não se pode tirar, per mite-lhe, até o último suspiro, configurar a sua vida de modo que tenha sentido. Pois não somente uma vida ativa tem sentido (...) . Se é que a vida tenha sentido, também o sofrimento necessariamente o terá.”

Parei de chorar, mas não de pensar. Achei estranho ter encontrado tão poucas informações sobre formas e jeitos para as pessoas que estão em tratamento oncológico se arrumarem. Muito pouca coisa sobre cabe los, perucas, maquiagem, etc. Tive que pesquisar muito na internet até encontrar informações adequadas que me ajudassem nessa caminhada.

Hoje também foi um dia em que me perguntei várias vezes por que eu, mas depois me dei conta: por que não eu???

20 de julho de 2021 | Terça-feira

“Você só vence amanhã se não desistir hoje.”

Acordei bastante ansiosa. Posso dizer que mais que o normal. Afinal hoje é o dia da primeira químio. Antes de sair de casa recebi um buquê de flores da Lalá, e um cartão dizendo que ela adoraria estar ao meu lado.

Pedro e eu partimos para a clínica em busca da primeira dose da cha mada, no meu caso, cura definitiva. Um pouco antes do início da aplica ção do medicamento coloquei a touca que gela o couro cabeludo a uma temperatura de menos 4 graus. “Será que vou suportar?”, pensei. Muita

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gente não suporta, mas eu achei até tranquilo. Ainda bem. Como já é de costume, principalmente quando vou para os ambientes hospitalares, levei meu terço e minha santinha. Como tínhamos combinado, a Cyn thia e a Anelise estavam comigo também. A companhia delas faz o tempo passar muito mais rápido. Sem contar a energia positiva e a descontração que elas emanam. Me senti bem o tempo todo e bebi muita água, que é para ajudar a eliminar as toxinas mais rapidamente. Quando saí da clíni ca, me senti um pouco tonta, mas achei que estava tudo tranquilo e fiquei orgulhosa de mim. Venci a primeira tranquilamente, pensei.

Logo que cheguei em casa, a Giovana me ligou. Ficamos uns 30 mi nutos no telefone. Só quando desliguei é que dei conta de que estava bastante enjoada e com vontade de vomitar. Corri para o banheiro. Em seguida coloquei a calça do meu pijama e fui para a cama, fiquei parada, imóvel, sem mexer um pelo sequer. Mas não adiantou. Confesso, fiquei me sentido muito mal em seguida. Não conseguia me mexer e sentia que só aumentava. Apertei forte minha santinha e pedi para que ela fizesse esse tormento sumir do meu corpo. Pensei comigo sem contar a nin guém: não vou conseguir chegar até o final. É por isso que muita gente desiste na metade do caminho.

Fiquei na cama na mesma posição das seis da tarde até por volta das onze e meia da noite, quando me levantei e fui tomar banho. A madrugada tam bém não foi nada fácil. Acordei diversas vezes para ir ao banheiro. Ama nheceu e me sentia bem melhor e com muita fome. Tomei um bom café da manhã, mas em seguida me senti muito cansada. À noite já estava melhor.

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24 de agosto de 2021 | Terça-feira

“Viver não é esperar a tempestade passar. É aprender a dançar na chuva.”

Hoje está fazendo 34 dias da minha primeira químio. E confesso, agora estou respeitando e muito essa minha nova “amiga”. Em resumo, as duas primeiras foram muito parecidas. Então quando fiz a segunda sessão, logo que cheguei em casa tomei um banho e fui direto para a cama deitar bem quietinha, parada. Doze horas depois, eu já estava bem.

Com o passar dos dias fui me adequando, me adaptando, para cada vez mais atingir uma breve e boa recuperação. Inclusive, no intervalo da segunda para a terceira sessão deu até para tirarmos umas férias de uns dias no Caribe. Pedro e eu fomos para a paradisíaca ilha de Saint Barth’s. Estava superanimada e curti intensamente cada minuto. Pare cia que era a primeira viagem que fazia na vida. Nunca estive tão atenta a cada detalhe em um passeio como fiquei nesse. A cada caminhada que dava ou a cada mergulho no mar eu internalizava aquela sensação da areia tocando meus pés, da água abraçando meu corpo e o sol na minha pele. Parecia uma nova vida, pois tinha uma nova percepção de tudo. Muito diferente e maravilhoso ao mesmo tempo. Até hoje consi go reviver aquela sensação perfeitamente e sentir tudo de novo. Foi o melhor presente que poderíamos dar a nós mesmos depois de vários dias tensos, de angústia e tristeza. Curtimos muito.

De volta à vida de paciente oncológica, a terceira sessão de quimio terapia não foi de rápida recuperação como foi a segunda. Estou muito enjoada, nauseada e cansada. Já se passou uma semana e as reações nem dão sinais de que estão chegando ao fim.

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Meu cabelo começou a cair durante a viagem, o que me deixou as sustada e bastante abalada. Apesar disso não ser o importante, mas sim a cura, é ruim quando passo os dedos na cabeça e eles ficam cheios de fios. Estão caindo parelho, não em chumaços, o que me deixa mais aliviada, pois é sinal de que a touca está fazendo seu papel. E toda vez que o pente fica recheado de fios, penso: o remédio está fazendo efeito.

Mas não é fácil enfrentar o mal-estar, que parece interminável, e a queda de cabelo, que me deixa triste. Mas meu alento e onde busco forças para superar são o meu marido, que está sempre ao meu lado, meus filhos, minha família e minhas grandes amigas. Sem eles e Deus, não sei se estaria resistindo. Verdade!

Uma curiosidade: ontem quando estava almoçando sozinha com o Vittorio, do nada ele me perguntou se eu estava com câncer. Achei es tranho porque nunca tínhamos usado essa palavra em casa, e fiquei na dúvida do que dizer. Resolvi falar a verdade. Disse que sim, mas que já havia tirado e o tratamento que estava fazendo era justamente para ele nunca mais voltar e eu ficar boa para sempre. Então ele disse:

“Mamãe, você é igual ao Dead Pool (personagem infantil que teve câncer e ficou com superpoderes). Ele também pegou câncer!”

Dei uma risada, e disse:

“Exatamente, meu amor. E depois desse tratamento vou ficar super poderosa igual a ele.”

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Achei essa conversa bastante interessante, lúdica, e percebi que ele entendeu um pouco mais sobre a doença e a forma que ela afeta a pes soa e seus familiares. Depois fiquei sabendo que ele já havia pergun tado para a babá Fernanda se as pessoas sobrevivem ao câncer. E ela respondeu com veemência que sim! Aí ele disse: “Então minha mãe vai sobreviver!”.

Toda essa conversa despertou em mim outras reflexões, de que nós todos temos superpoderes, basta ativá-los. Eles estão dentro de nós e os trazemos à tona por meio do amor. Do amor próprio, do amor que você dá ao próximo e também do amor que você recebe. Quem planta amor sempre colhe superpoderes de volta.

Uma outra forma de poder é a fé. Sempre tive a convicção de que acreditar com força, sem dúvidas, te dá o poder de realizar, de curar. Quem acredita trabalha sua mente e seu coração e o corpo todo respon de positivamente. Por isso, sou da teoria de que o poder do amor e o po der da fé são mágicos, e que todos podem ter acesso a eles, basta querer!

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MAIS UMA SURPRESA

31 de agosto de 2021 | Terça-feira

Hoje é o dia da minha última químio vermelha, o final das sessões quinzenais. Uma verdadeira conquista! Não tenho como negar que, apesar de tudo, estou muito feliz por ter chegado até aqui. Esses dias de tratamento não são fáceis, mas sei que são extremamente necessá rios para a vitória.

Os efeitos colaterais não dão trégua. Meu cabelo continua caindo sem parar e estou pensando seriamente em abandonar o uso da touca gelada e raspar a cabeça. Sei que é muito boa e eficiente, mas seu uso demorado deixa a cabeça dolorida e não sei se meu cabelo vai aguentar até o final. Mas ainda a usarei na sessão de hoje. Lembrei que tinha dito que se ficasse careca iria usar uma peruca, imaginei que já era hora de considerar essa aquisição.

Peguei meu terço, minha santinha e fui pra químio, mas não foi como esperava, pois aconteceram imprevistos. As enfermeiras não conseguiam “pegar” meu cateter, que não refluía. Depois de umas três tentativas, injetaram o soro e tive uma dor violenta perto da clavícula. Imediatamente elas disseram que algo estava errado e que não podiam continuar com a aplicação. E pediram para eu fazer um raio-X.

Em todas as tentativas delas eu pedia à Nossa Senhora que iluminasse aquela pessoa para que desse tudo certo, mas realmente havia um pro blema no cateter. Mesmo assim disse à enfermeira que não sairia dali sem fazer a químio. Queria porque queria, pois era a última dessa fase.

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“O que não te desafia, não te transforma.”

Calmamente, ela falou que seria muito perigoso, pois a medicação é vesi cante, machuca os tecidos e poderia causar necrose da pele caso vazasse. Mas eu estava decidida a correr esse risco, e pedi que fizesse de qualquer jeito. Disse que tinha a certeza de que ela conseguiria pegar minha veia e que não iria acontecer nada comigo. Tamanho era o perigo que ela foi falar com a médica, que só autorizou devido à grande experiência das en fermeiras. Mesmo assim, trocaram de atendente. A que veio me atender disse que ficaria ao meu lado o tempo todo, caso a medicação extravasas se ela tiraria a tempo de não machucar minha pele. Ela puncionou minha veia acima do pulso e eu evoquei Nossa Senhora e o Espírito Santo para iluminá-la. Foi de primeira. Conseguimos com sucesso.

Não vou negar, mas senti um certo medo ao insistir na realização da sessão. Mas estava convicta de que não poderia sair da clínica sem rea lizar minha última químio vermelha. Eu precisava terminar essa etapa.

1º de setembro de 2021 | Quarta-feira

“A vida é uma série de pequenos milagres.”

Acordei, agradeci a Deus por mais um dia, por mais um mês que se inicia, pela primavera que está chegando, pela luz que ilumina cada ser humano e pela divina e maravilhosa vontade de viver.

Depois de tomar minha injeção para a imunidade, fui ao Hospital Mãe de Deus fazer um raio-X do tórax. Na sequência, fomos, eu e o Pedro, direto para o consultório do doutor Boff. Ele nos deu a notícia de que meu cateter tinha simplesmente arrebentado, passado pelo meu coração e parado em uma veia na entrada do meu pulmão.

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De um jeito bem calmo, sem querer causar alarde, perguntou se não lembrava de eu ter sentido nenhuma arritmia ou algo parecido nos úl timos dias. Lembrei que na quinta-feira passada, quando escrevia uma oração do Papa Francisco no meu caderno de orações, senti umas três palpitações e pensei comigo: como essa mensagem me tocou, mas não era para tanto! Inclusive, liguei para o Pedro para dizer o que havia acontecido, mas que depois passou.

Sem muita enrolação, o médico falou que provavelmente foi nesse momento que o cateter passou pelo coração. E disse de forma enfática: temos de tirar esse cateter daí o mais rápido possível e colocar outro de volta no devido local. Comentou também que isso é algo bem raro de acontecer. Talvez uma ocorrência a cada dois anos. E eu fui a “privile giada” da vez.

“E agora, como tirar ele daí?”, perguntei ao médico. “Simples”, dis se ele. “Um radiologista entra com um ´laço´ pela veia da virilha, passa pelo coração e vai até o pulmão, enlaça a mangueirinha do cateter e traz de volta.” Segundo ele, um procedimento simples, mas que se não fosse possível fazer, ele teria de abrir meu peito.

Curiosamente não me impressionei e disse que queria fazer já. Ele pediu, então, que fosse para casa ficar em jejum para a anestesia ge ral, mais tarde. Percebi que o Pedro estava bastante nervoso, o que é raro. Eu estava confiante, era mais uma etapa e experiência que teria de passar. Ao chegar em casa, a primeira coisa que fiz foi pegar as imagens das minhas duas santas, Nossa Senhora Aparecida e Nossa Senhora das Graças, e levá-las para o meu quarto. Acendi a vela do Espírito Santo, ajoelhei e comecei a rezar. Pedi, fervorosamente, que

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elas iluminassem a equipe médica durante o procedimento. Rezei o terço da libertação e entrei num estado de paz e calma que não sei explicar. Penso que momentos de fé como esse, que já tive algumas vezes desde o descobrimento do nódulo, são formas de fortalecimen to espiritual e mental. Fico mais preparada para enfrentar o que ainda está por vir e por me preparar acabo entendendo melhor como vou poder transmitir para outras pessoas que possivelmente estarão pas sando pelo que estou vivendo hoje.

Às dez da noite seguimos rumo ao hospital. O procedimento atrasou mais de uma hora e sentia o quanto o Pedro estava preocupado. Quan do chegou minha hora de entrar, dei minha correntinha do Espírito Santo com Nossa Senhora das Graças para ele e disse: “Preciso que você reze. Acredite!”. E fui.

Tudo certo com o procedimento. Só foi um pouquinho mais de morado porque a linha do cateter estava levemente presa na entrada do pulmão, mas no final acabou sendo tranquilo. Despertei na sala de recuperação com o Pedro ao pé da cama tenso e aflito, mas ele rapida mente se acalmou ao me ver acordada. Chegamos em casa às três horas da madrugada. No outro dia eu estava cheia de energia e com muita fome. Minha mãe me ligou cedo dizendo que quando foi à igreja rezar durante o procedimento encontrou meu irmão saindo de lá. Ele tam bém tinha ido rezar por mim. Vida nova, cateter novo e bola pra frente, pois temos toda a químio branca pela frente e a vida toda para viver.

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CONTAGEM REGRESSIVA

5 de outubro de 2021 | Terça-feira

“Para cada fim, um novo recomeço.”

Hoje é dia de outra químio branca. A mais branda de todas. Não sin to nada de efeitos colaterais. Sou eu de novo. Mas hoje estou sensível, emocionada. E não é para menos. Só faltam nove sessões para o tér mino. E quando chego na clínica, na minha salinha de sempre, a de número 13 (para mim sempre foi um número de sorte), tem um cartaz bem na minha frente:

“Contagem regressiva – 9”

A Cacá, uma das enfermeiras que cuidam de mim, é a autora dessa simples lembrança fixada na porta e foi a responsável por marejar meus olhos de emoção, alegria e gratidão. Chorei. Ela perguntou se podia me abraçar.

“É claro”, disse. E senti nesse abraço uma mistura gigantesca de tudo de bom que um ser humano pode dar e receber. Hoje está sendo o melhor dia de todos desde que comecei esse tratamento.

Apesar da químio branca ser tranquila, como já disse, ela é bem mais demorada por causa das pré-medicações e da touca. Adormeci logo após o Pedro ter saído. Quando acordei e abri os olhos, vi a Cynthia e a Anelise entrando na sala, ainda faltando 25 minutos para o fim da ses são. E essa químio tem um tempo de duração de cerca de quatro horas. Terminamos a sessão juntas.

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6 de outubro de 2021 | Quarta-feira

“As melhores coisas da vida não são coisas. Pense nisso.”

Hoje está fazendo 14 anos que Pedro e eu nos casamos. Aproveitei a inspiração e a felicidade que reinam em meu coração, em minha vida e escrevi a seguinte carta para ele:

“Pedro,

Nunca houve uma resposta mais certa e abençoada na minha vida. O dia 6 de outubro marca essa resposta: na alegria e na tristeza, na saú de e na doença, enquanto viver eu vou estar ao seu lado. Obrigada por estar sempre comigo, em todos os momentos, sendo a minha fortaleza!

Se não fosse você, neste ano eu teria sucumbido e não teria forças para enfrentar tudo o que aconteceu. Você foi meu braço direito, esquer do, minhas pernas e, principalmente, meu coração. Você me pescou do fundo do poço, e fez me encontrar com minhas forças. Você foi o meu norte, a bússola que me deu a direção de volta. O mais importante, você trouxe a Claudia de volta.

Obrigada, lindo, por esses 14 anos de casados, mas principalmente por este ano de um amor intenso e forte, sem medidas. Sei que deste teu coração por mim. Te amo mais que tudo. E quero viver muitos e muitos anos de amor e casamento com você. Pra sempre, pra eternidade!

A cada notícia que te levava, sentia você do meu lado, de mãos da das comigo. Talvez você tenha sofrido até mais que eu em alguns mo

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mentos, mas ficou forte, às vezes com lágrimas nos olhos, mas nunca deixou de me passar confiança, sempre dizendo que tudo vai dar certo.

Eu mesma me achando feia, cansada, e você olha para mim com ad miração, e você não sabe como isso é importante. Como eu te amo.

Obrigada por ser esse homem, esse cara tão bacana e com o coração mais lindo que já conheci.

Agora só felicidades e comemorações!”

11 de outubro de 2021 | Segunda-feira

“Assim como os pássaros, precisamos aprender a superar os desafios que nos são apresentados, para alçarmos voos mais altos.”

Mais um dia rumo à felicidade. Fiz a químio de manhã e às nove da noite embarcamos para São Paulo. Nosso destino? Não, não é o Eins tein. Vamos passar uns dias em Dubai, nos Emirados Árabes, onde há tempos planejávamos ir. Estou com toda a minha mala de remédios na mão. Tecnicamente sou uma farmácia ambulante. O doutor Barrios até fez piada com minha escolha de destino, perguntando se não tinha um país mais distante para conhecer. É muito bom poder viajar novamen te. Isso nos deixa muito felizes. Partiu para o Oriente…

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14 de outubro de 2021 | Quinta-feira

Hoje não tem como o dia ser mais especial. É o meu aniversário, e sempre gostei de comemorar a data, desde criança. Conheço pessoas que não gostam muito de festejar o aniversário. Outras que até nem querem felicitações, festa ou coisa parecida. Cada um, cada qual. Eu sempre adorei este dia, pois representa vida, alegria, abraços e beijos dos pais, irmãos, filhos, marido, amigos e, muitas vezes, até de pessoas com quem você tem pouco contato ou nem conhece.

Fiz até um post para expressar minha alegria por este dia, que não tinha dúvidas de que seria pra lá de emocionante:

“Hoje faço 45!

Uma data marcante. Todas são, mas esta, com certeza, está sendo es pecial. Uma ano que ficará marcado para sempre na minha vida. Um ano de transformação, reinvenção, força, luz, batalha vencida e prin cipalmente de muito amor. Amor pela minha família, pelo meu marido, pelos meus amigos, mas, especialmente, uma ano de amor comigo mes ma! Como é importante se amar e não desistir de viver. Amar para se co locar no colo e dizer a você mesma: você pode, você consegue, você é forte e vai passar por tudo isso de cabeça erguida e ainda dando força pra quem precisa. Talvez a resposta esteja aí. Sempre disse que fazer o bem faz bem e comprovei isso mais uma vez. Toda vez que levava uma pala vra de amor a alguém, passava a minha experiência para ajudar, eu era ajudada 100 vezes mais. Aprendi nesses 45 anos, mas principalmente

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“Ser feliz na vida tem de ser sua maior motivação.”

nesse último ano, que ajudar o outro me ajuda ainda mais. O contrário de depressão é expressão, e eu nunca me expressei tanto. Obrigada por me ouvirem e me ajudarem. A lição desse ano foi: dê a mão ao outro que você receberá abraços de todos os lados.

Quero agradecer esse ano tão especial e inesquecível. Talvez o câncer tenha sido realmente um presente, pois recebi tanto em troca, e só coisas boas. Já ouvi dizer que muitas pessoas mudaram depois de uma doen ça. Eu acho que não mudei tanto assim, mas que melhorei muito, isso sim. Abri meus olhos ainda mais e dei valor maior para o que realmente é importante na vida. O amor que sinto faz todo o sentido. Obrigada, Deus, pela minha vida maravilhosa, com tudo o que ela me trouxe. Os momentos felizes, os difíceis, aqueles em que caí na lona mesmo e cho rei, me senti perdida, sem chão. Mas esses com certeza foram os mais importantes para minha evolução, amadurecimento. Momentos fáceis e felizes são maravilhosos, mas não ensinam tanto. Momentos de difi culdade te deixam menos frágil (antifrágil) e hoje me sinto mais forte do que nunca!!! A minha casca tá dura!!! Eu abri os olhos na escuridão e nunca enxerguei tão claro!!! O amor sempre foi e será a resposta para tudo e quero agradecer por tanto amor na minha vida. Ele vem de todos os lados. E é por causa dele que sei que vou viver muito e cheia de saúde, rodeada das pessoas que me amam e que eu amo. Porque o amor cuida, o amor cura e com amor nada pode dar errado!”

Tomamos café da manhã no hotel e, mais tarde, fomos para a piscina, eu, Pedro, Cynthia e Giovana. No caminho, Pedro pediu para chamar as crian ças, que estavam em um quiosque próximo. Foi então que PP e Vittorio me fizeram uma linda surpresa. Eles seguravam dois lindos e exuberantes buquês de rosas vermelhas. Imagina receber de surpresa essas flores das

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duas “pessoinhas” que você mais ama? Ainda bem que não sou cardíaca, e meu coração, depois dessa, comprovadamente está muito bem, obrigada.

Nos reunimos todos ao redor de uma mesa cuidadosamente decorada, abrimos um champanhe e cantamos parabéns. A cada palma, uma lágri ma caía de alegria. Estar ali, naquele momento, significava a vitória sobre tudo o que tinha se passado. E no auge dessa emoção, pensei: que maravi lha poder estar viva, bem e comemorando meu aniversário com todos ali.

Mal terminaram os parabéns, o Pedro, com alegria, disse:

“Têm mais pessoas que vieram a Dubai para lhe dar os parabéns!”

Dei um rápido giro de 360 graus, e não vi mais ninguém. Aí ele deu play num vídeo que estava no seu iPad. Só de bater os olhos e começar a ouvir o áudio… mais lágrimas. O vídeo se inicia com a minha mãe dizendo:

“Tá chorando por quê?”

Esse é o nome e a primeira frase da canção escrita por Filipe Escan durras e que a dupla César Menotti e Fabiano canta para mim no vídeo. Pois o Pedro sabe o quanto a amo, o quanto me identifico com ela, o quanto ela mexe com meus sentimentos. A música também é interpre tada primeiramente pela minha mãe e depois pelas minhas amigas e também por praticamente todas as pessoas presentes ali, e termina com uma mensagem linda do Pedro e dos meus dois filhos. Emocionante!

Foi o presente mais lindo que já ganhei em toda a minha vida. Sim ples, mas cheio de amor de todos que vivem no meu mundo.

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Abaixo escreverei a letra da música Tá chorando por quê? Porque eu soluço toda vez que a ouço. Me identifico tanto que parece que ela foi feita sob medida para o que aconteceu na minha vida.

Tá chorando por quê? Se você tem um Deus Que cuida de você, oh E jamais te esqueceu Ele sabe de tudo

Que você tá passando E mandou te dizer Que Ele tá cuidando.

Lembra de onde você veio E onde você chegou Lembra de todos os livramentos

Que você já passou.

Nem era para você estar aqui Mas Deus falou assim Esse aí vou levantar E onde colocar a mão

Eu vou abençoar!

Não chore, quem cuida de você não dorme Levanta, tem muita gente que te ama Deus mandou te dizer que vai acontecer Deus mandou te falar que tudo vai passar.

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MOMENTO DA FÊNIX

A cada manha eu resgatava a Claudia que precisava renascer.

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20 de outubro de 2021 | Quarta-feira

“Ao acordar, olhe-se no espelho e tente se apaixonar por quem você vê.”

Despertei, passei as mãos na cabeça e lembrei de uma frase que já disse aqui: eu sou uma paciente oncológica. É que meu cabelo não para de cair. Estou parecendo um filhote de passarinho quando nasce, quase pelado, sem penas. No meu caso, cabelos. Cílios tenho só um pouquinho, pra não dizer nada, e acima dos meus olhos estão apenas dois rastros que lembram leve mente as minhas sobrancelhas. Meu rosto está diferente. Estou inchada por causa do corticoide e também pela longa viagem, que foi lindíssima, mas um tanto cansativa, não posso negar.

Estar diante do espelho é difícil. Ando sem coragem de me olhar. Mas quando sento a sua frente, o momento se torna único, exclusivo e íntimo.

Foi ali que passei a dizer coisas que muitas vezes não teria coragem nem de pensar. Mas hoje, em especial, foi um dia em que me olhei e decidi que não iria fraquejar, não ficaria triste com meus cabelos, cílios ou sobrancelhas, e disse: bola pra frente. Esse é o processo da cura! Força! Vamos lá! Falta pouco! Optei pela vida.

Mas minha questão agora está sendo o cabelo, quero achar uma solução. Então, resolvi pesquisar vários cortes bem curtinhos e estou me preparando para aparar o que ainda tenho. Vou ser sincera, na realidade já quase não tenho mais nada na cabeça, só uns fiapos que uso para prender uma borra chinha e segurar meu “topinho” (uma pequena peruca apenas para a parte frontal da cabeça). A boa notícia é que me disseram que depois da oitava quí mio branca o cabelo para de cair. Oba! Faltam duas para essa conta chegar.

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23 de novembro de 2021 | Terça-feira

Finalmente tudo está acabando, quero dizer, chegando ao fim. Hoje foi o dia da minha penúltima químio. Nem acredito, quanta felicidade, transbordo alegria e vontade de gritar para todo o mundo que está che gando a hora.

De volta à questão do cabelo, que muito me incomodava, tomei uma decisão. Decidi cortá-lo. Toda vez que levantava de manhã com aqueles poucos fios compridos espetados, tipo um pra cada lado, me via como uma pessoa doente. Eu não sou doente, estou doente! E bem perti nho da cura. Por isso, decidi finalmente passar a tesoura. Foi a melhor decisão que tomei. A sensação de liberdade é imediata. Me libertei do topinho, da peruca e assumi como realmente estou. Olhei no espelho, com muita coragem, e disse:

“A Claudia de cabelo curto é bem bonita, sabe?” Ri sozinha...

Já que estava de look novo, o que me deixou feliz, de cabeça erguida e dona de mim, saí para mostrar ao mundo a nova Claudia. Fui a um evento de luxo na condição de embaixadora da marca, com o cabelo penteado com gel e me achei realmente bonita. Uma sensação indes critível, confesso. Aproveitei e também fotografei uma campanha com a minha coleção de joias chamada Amizade, e arrisco dizer que foram as fotos mais lindas que já fiz.

Faço agora uma revelação. Durante as químios nunca deixei de tra balhar. Tinha medo de que os clientes não quisessem uma paciente

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“Um dia que começa agradecido termina realizado.”

oncológica ou que vinculasse ao câncer seu produto. Mas ao contrário do que pensei, os contratos não pararam. Isso me fortaleceu e deixou ainda mais encorajada a tocar a vida, os negócios, o trabalho que amo.

Como ficava muito cansada após as sessões, que fazia geralmente às terças-feiras, me organizei às segundas para gravar, fotografar e fazer coisas que tinham que ser feitas. Assim, nos dias em que me recuperava, postava o que já tinha gravado. E foi tudo dando certo, se encaixando.

Foi um período de recolhimento, claro, mais que normal nas con dições em que me encontrava. Mas quando me sentia melhor, ia para a academia, fazia fisioterapia e recebia minha família e meus amigos em casa. Tinha dias em que acordava cheia de energia, mas à tardinha me batia o cansaço. Minha resistência e disposição iam embora conforme as horas se passavam. Parece que a bateria ia se esgotando, e ia mesmo.

Gravei um comercial para a TV aberta, fiz várias campanhas e com o Outubro Rosa consegui ajudar algumas instituições. Foi nesse mês que fui fazer um bate-papo com mulheres da empresa Vulcabras para falar sobre o câncer de mama, além de diversas lives que abordam o tema. Para mim, a doença deveria estar em evidência nos 365 dias do ano, no maior número possível de ambientes, nos órgãos de saúde, em eventos sociais, nos salões de beleza, nas escolas, na mídia, enfim, em toda a parte.

A perda do cabelo talvez tenha sido uma das coisas mais difíceis de aceitar em todo esse processo da quimioterapia. Mas aos poucos fui entendendo que era o que eu precisava para ficar curada. Afinal, não tem outro caminho e o mais importante, claro, é a saúde. Por isso, tam bém não procurei esconder minha “quase calvície”. Só usava peruca

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quando fazia alguma campanha ou em ocasiões muito especiais, como, por exemplo, quando fui mestre de cerimônia em um evento. Nas ou tras oportunidades, usava tiara, toucas ou bonés para cobrir as falhas de cabelo no meio da cabeça.

Vou ser sincera. Não há dúvidas de que a peruca deixa a mulher mais bonita e esconde por completo os poucos fios de cabelo que ain da restam em pessoas que, como eu, passam por esse tratamento. Mas ao mesmo tempo ela incomoda, porque é pesada, quente e ainda por cima não tem como prendê-la sem pressionar o cabelo que ainda resis te. Ficava solta e limitava meus movimentos com a cabeça. Confesso que, antes de cortar o cabelo, achava bem chata toda essa função, mas mesmo assim usei em diversos momentos e em outros disfarcei com o “topinho”. O processo não foi simples, mas era o caminho para ter minha saúde completa de volta, e eu sabia disso.

De volta às químios, hoje fiz a 15ª e de lá segui para o consultório do doutor Barrios, onde discutimos os próximos passos, que gostaria que fossem largos para tudo acabar logo. Com esse meu jeito, poderia tranquilamente trocar minha condição de paciente para “impaciente”. Falamos do tratamento para bloquear a produção dos meus hormônios e a retirada dos ovários. O meu tumor é Receptor Hormonal positivo, isso quer dizer que ele cresce sob estímulo hormonal. Como na minha idade posso entrar na menopausa a qualquer momento, tirar os ovários não é algo tão dramático, mas antes de tudo isso acontecer eu não queria nem ouvir falar em menopausa. Relutava diante do assunto. Hoje estou encarando isso de uma forma natural. A vida muda e a gente muda junto.

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No final da consulta, ele falou uma coisa que me emocionou. Disse que são poucas as pacientes que passam pelo tratamento tão bem como eu passei. Que fui olímpica! Ninguém tem a ideia de quanto amei escu tar isso. Fiquei tão feliz que quase saí do consultório dando pulinhos.

Mas tenho de ir com calma, pois ainda não atingi o tão sonhado mar de rosas, o meu porto seguro. As semanas que antecedem a última quí mio, o ponto final da contagem regressiva, são recheadas de um mix de sentimentos: ansiedade, esperança, excitação, felicidade. Aliás, felici dade é algo que transborda em mim neste momento. Ela está quase pal pável, irradia pela pele, olhos, cabelos... Nesses não tanto. Piadinha!

Muitos podem até não acreditar, mas espero cada sessão de químio como uma criança espera pelo presente do Papai Noel. Sei perfeitamente que cada aplicação feita é menos uma e que indica o caminho da reta final, do pódio, do lugar de vencedora, e o mais importante, o da cura!!!

Na última semana qualquer coisa me emocionava. Só de lembrar toda caminhada que passei, trombando com cada notícia, cada susto, cada batalha que parecia não ter fim. Mas agora estava ali, me sentindo mais forte e imbatível do que nunca, mais feliz do que antes, com meu novo cabelo curto e me sentindo na potência máxima. Apesar de tudo, era incrível superar cada obstáculo. Muitas conquistas!

De repente me dei conta de que ao relatar minha história eu literal mente abri meu peito, me mostrei na crueza da doença e na nudez dos meus sentimentos. E nesse processo passei a entender como eu era real mente, com todas as minhas fragilidades e fortalezas. E quando fiz essa abertura, brotou em mim uma potência tão grande que me deu forças

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para pisar firmemente nos caminhos mais irregulares que apareciam à minha frente. Poderia cair todo o cabelo, os cateteres poderiam arre bentar, eu faria todas as químios... e nada iria me derrubar. Aprendi que quando buscamos a força interior não há nada que não possamos vencer.

Em homenagem a esse momento fiz o seguinte post:

“Simples assim! Esta sou eu! Preto no branco, sem filtro, quase sem cabelo e às vezes, quando eu tô a fim, de peruca. Mas sou eu, Clau dia, no meu dia a dia, de cara lavada, cabelo bagunçado, lutando, sempre com um sorriso no rosto. Procurando e achando forças pra co memorar a vida! Essa é a Claudia, amiga, irmã, mãe, mulher, traba lhadora, positiva e guerreira, porque precisamos achar motivos para sermos felizes. A vida é cheia de obstáculos, mas eles não podem nos parar. Nascer é difícil e viver também. Mas é um presente. Este vídeo é pra todos. Porque todos nós somos vencedores de dificuldades, sejam elas quais forem. Estamos aqui vivendo o presente. Então aproveita ele da melhor maneira. Faça do limão uma limonada, doce e geladi nha! Ache motivos pra agradecer e comemorar o hoje. Ache no beijo do seu filho, no olhar do seu marido, no abraço de um amigo, no nas cer do sol, no pôr do sol, na comida que você tem a sua frente, na casa em que você mora, no banho num dia quente, nas bênçãos que recebe todos os dias mas não para pra se dar conta!

Eu estou tão feliz. Agora tá cada vez mais perto e eu só vejo LUZ no fim do túnel e um caminho lindo e longo pra percorrer! Tenha fé. Tenha força. E não desanime jamais. Sempre teremos o amanhã, e por ele tudo vale a pena.”

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Na noite anterior da químio final, achei que não iria conseguir dor mir de tanta ansiedade. Mas foi exatamente o contrário. Dormi feito um anjo, como dizem. Senti uma paz tão grande que adormeci e fiz uma das melhores noites de sono nesses últimos tempos.

RETAFINAL

29 de novembro de 2021 | Segunda-feira

“E a vitória deve ser o principal objetivo, a cada minuto e sempre.”

Amanheci tranquila e feliz, mais feliz do que nunca. Fiz meu yoga, que pratiquei durante todo o tratamento, e meditação. Ainda no café da manhã, falei para os meus filhos que depois do dia do meu casamento e do nascimento deles, hoje é o dia mais importante da minha vida. Fui ao meu altar, acendi a vela do Espírito Santo que ganhei do meu tio Benício. Dias antes eu havia encontrado uma carta dele que tinha o se guinte trecho: “Mas depois da noite vem o dia; da tempestade a calma, do inverno a primavera e nisso se encontra a beleza e o gozo da vida”. Agradeci mais uma vez a Deus e à Nossa Senhora por tudo. Depois PP e Vittorio também foram fazer o agradecimento.

Chegou a hora da químio final. Nem preciso dizer que estava pra lá de ansiosa. Minha pressão, que é sempre baixa, estava levemente al terada, e meus batimentos, é claro, acelerados. Foram poucos os mo mentos da minha vida em que me senti assim. Mas como é por um bom motivo, tudo é permitido.

E fiz todo o meu ritual de sempre, incluindo a presença do Pedro em sua cadeira cativa, bem ao meu ladinho e com seu chimarrão na mão. Disse que não faltaria nessa derradeira hora por nada nesse mundo. Coloquei minha música, rezei meu terço da libertação e escutei logo a meditação do Arcanjo São Miguel. Um detalhe: a sala estava toda deco rada com balões coloridos e frases de vitória. Todos emocionados. Mas mesmo com todos esses estímulos consegui adormecer meu último sono da cura. O sono do pódio. O sono dos vencedores.

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Acordei feliz, não sei quanto tempo depois. Tudo já tinha termina do. Não demorou muito e Cynthia, Anelise e Lalá chegaram. Lalá, pra não quebrar a regra, com flores na mão. Os integrantes da equipe da clínica também me trouxeram flores. Que Deus os ilumine sempre, dando-lhes força e saúde para continuarem ajudando quem está pas sando por essa situação. Disse que nunca iria esquecer toda atenção e que “até” iria sentir saudades. Antes de sair da clínica, abracei todos os enfermeiros que cuidaram de mim com um imenso sentimento de gratidão. Eles foram instrumentos da minha cura.

Ao chegar em casa escrevi a seguinte carta:

Minha querida químio:

“Vivemos uma história que será inesquecível. Foram muitos meses e no começo, confesso, achei que não conseguiria chegar com você até o final. Não sei se já te falei, mas você entrou na minha vida devagarinho, a conta gotas, mas com uma força descomunal, me paralisando comple tamente. Nunca havia sentido nada parecido. Nos primeiros momen tos, depois que te conheci ´pessoalmente´, só conseguia respirar bem quietinha na cama, sem me mexer. Não sei se lembra, mas você me tirou a fome muitas vezes, a força física, fiquei fraca, tonta, fez queda livre em muitos fios do meu cabelo, transformou meu corpo e, principalmen te, mudou a minha mente e me deu uma força interior que não conhecia. Em resumo, transformou a forma de eu ver a vida.

Como a vida é linda e maravilhosa, apesar de tudo!!! Você subiu com certeza a minha régua sobre meu mundo. Você me fez sentir ainda mais amor por tudo e por todos.

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Você foi uma escola de empatia e talvez sem você eu não existiria mais em pouco tempo. Quando perguntaram se aceitaria você, rapida mente disse SIM, claro! Pois jamais a teria ignorado sabendo do seu potencial e poder de transformação.

Quando você era ´vermelha´, bem no início, nosso relacionamento foi mais delicado, diria até bem difícil, mas tinha certeza do seu poder de cura. Então eu só agradecia.

Imaginava você como uma luz, bem forte, entrando no meu corpo, limpando e lavando tudo o que não precisava ficar ali. Arrancando o mal pela raiz, no mais puro e verdadeiro sentido da palavra. Não quis lutar contra você, pelo contrário. Te dei a mão, o braço, meu pulmão, meus ossos, meu sangue, meu peito, meu coração, todo o meu corpo. Me entreguei a você com tudo. E toda vez que via algo de mim cair, pensa va: é a cura! Está funcionando. Obrigada, Senhor, por essa oportuni dade. Porque eu sei que pensamento positivo, fé em Deus e você, juntos, são imbatíveis. Um trio de força brutal, diria.

Mais tarde você veio como´branca´ e aí eu te amei mais ainda. Vivia falando que se você fosse uma pessoa, diria: amada, você é maravi lhosa! Você trouxe de volta minha energia, minha disposição, fez meu cabelo voltar a crescer e, principalmente, trouxe minha esperança de viver. Repetia sempre: ´A Claudia estava voltando, a Claudia estava sendo curada´. Sabia que eu fazia um sono reparador durante as ses sões com você? Rezamos muito juntas também. Você me fez acreditar ainda mais em Deus e me aproximar cada vez mais d’Ele.

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Eu sempre te esperava ansiosa por nossos encontros. E também sem pre me despedia com: menos uma!

Mas o que eu queria dizer, minha querida químio, é que nunca vou te esquecer. Você foi a coisa mais importante para mim nessa fase de cura. Uma companheira e tanto. Minha inseparável amiga, obrigada por trazer saúde, vida, mais conhecimento e sabedoria. Pois foste uma professora rígida e competente. Jamais esquecerei suas lições. Mas hoje encerramos esse ciclo com muito amor e gratidão. Fique aí agora, pois muitas pessoas precisam de você e tantas outras vão precisar, infeliz mente. Cure todas como você me curou.

Você é uma bênção na vida das pessoas. Obrigada por tudo, de cora ção. Saiba que não vou sentir saudades, mas minha gratidão por você é eterna. Nossa história termina aqui, mas vou agradecer todos os dias por você ter passado pela minha vida.”

4 dezembro de 2021 | Sábado

“O melhor está por vir. Acredite nisso.”

Abri as janelas do quarto e vi que havia amanhecido um lindo sábado, ensolarado. Prometia ser mais calor que nos dias anteriores. Mesmo já sendo final de primavera o friozinho do inverno gaúcho não tinha se dissipado de vez ainda. Os dias anteriores tinham sido frios.

Um dia perfeito para realizarmos o que havíamos combinado duran te a semana. Um descontraído churrasco com apenas alguns parentes e amigos próximos, os de sempre que já relatei neste diário. O motivo

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era um encontro para quebrar a rotina dos últimos meses em minha vida, onde só falávamos sobre a doença, consultas, exames, mais exa mes, resultados, quimioterapias e coisas afins. A ideia é promovermos um ambiente de descompressão de toda a situação.

O local escolhido é o nossa casa de final de semana, que fica numa ci dade vizinha a Porto Alegre. Muita natureza, ar puro, plantas e animais, nada que lembra o ambiente gelado e frio dos hospitais, consultórios e clínicas que tenho frequentado ultimamente, mas reconheço que foi esse inóspito ambiente que ajudou e muito meu tratamento e minha cura.

Mas uma coisa me chamou a atenção. Achei o pessoal de casa meio confuso, diferente do habitual. O Pedro disse que iria fazer ginástica pri meiro. E fez por mais tempo que o de costume, o que me causou estra nheza. Depois de um longo banho, disse calmamente que ainda não havia comprado as carnes e as bebidas para o churrasco, e é fato que ele sempre toma a iniciativa e nunca esquece de nada. Festeiro como é, ele está sem pre à frente de todos. Mesmo assim disse que hoje poderíamos atrasar um pouquinho. “Será que ele está sentindo alguma coisa?”, pensei.

A Lalá, que estava em Porto Alegre e iria conosco de carro para a casa, ligou dizendo que nos encontraria direto no churrasco. Então, re laxei e fui tomar um banho demorado. Como meu cabelo tinha parado de cair, lavei a cabeça e fiz uma “superescova” nos poucos curtos fios que restavam. Afinal, um pouco de vaidade não faz mal para ninguém.

Levamos muito tempo ainda para sair. Até as crianças estavam meio lentas nesta manhã. Nem com tudo isso desconfiei por um minuto da grande surpresa que estava por vir. Na estrada, percebi que o Pedro

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dirigia bem mais devagar que o normal. Sem contar que vira e mexe ele dava uma olhada no celular, costume que não tem quando está dirigin do. Além disso notei que ele estava um pouco emocionado durante o trajeto, mas eu ainda não tinha entendido o que poderia ser.

Só comecei a ter certeza de que tinha algo diferente acontecendo quando chegamos próximo ao sítio. Na entrada, vi vários carros esta cionados e um serviço de valet park bem na frente do nosso portão. Olhei para ele e perguntei:

“O que você aprontou?”

Como ama festa, logo deduzi que ele arquitetou uma linda surpresa para mim junto com minhas amigas. Mas foi além, se superou. Logo na entrada, uma bela imagem de Nossa Senhora das Graças desejando saúde e dando boas-vindas para mim e para todos. Isso já foi o suficien te para tocar meu coração. Mas não parou por aí, tinha mais. Quando entrei na casa quase desmaiei com tanta gente gritando: SURPRESA!

Acho que demorei uns “longos” dois segundos para ir aos prantos. As lágrimas caíam vertiginosamente e não conseguia me conter de tan ta emoção. Meu corpo inteiro tremia. Como já disse anteriormente, graças a Deus não sou cardíaca.

Em seguida, todos vieram me abraçar e falar o quanto torceram e re zaram por mim. A cada um, eram abraços e beijos misturados com um toque pra lá de especial de muita gratidão, amizade e amor. Estavam to dos lá, minha família, meus amigos e amigas, alguns dos meus médicos e pessoas que vieram de outros estados para me ver. Quanta emoção!

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Nos últimos tempos, por causa da doença, tive a oportunidade de vi venciar emoções que até então nunca havia sentido. A maioria preferia não ter conhecido. Mas aquele momento de festa e alegria foi um dos melhores que já experimentei. A energia era maravilhosa, contagiante. A sensação de ser tomada de amor e carinho é indescritível.

Depois dançamos, brindamos e comemoramos a vida por mais de 12 horas. No final, mesmo sem vontade de que tudo aquilo acabasse, eu estava exausta, mas com o coração cheio de amor e felicidade.

9 de dezembro de 2021 | Quinta-feira

“Que nenhum problema seja maior que sua fé.”

Bom dia e até logo, meu querido e inseparável diário, que me fez com panhia por quase duzentos dias, seja na cabeceira da minha cama em casa, na minha escrivaninha, num quarto de hotel ou até mesmo no hos pital. Fiel companheiro, emprestou suas páginas para registrar os meus momentos, sentimentos de dor e alegria, de fragilidades e superação.

Sobrevivi e sei que hoje dou muito mais valor ao ver a simples luz de um novo dia raiando, ao sentir o vento bater em meu rosto e esvoa çar meus ainda poucos cabelos, sentir o perfume de uma flor, decifrar detalhadamente o toque e o beijo das pessoas que amo e ver o pôr do sol, mesmo que ele seja rapidamente engolido pela noite que vem pedindo passagem.

Encontrei toda essa paz e percepção dentro da minha doença, que também me fez enxergar a paz em Deus. E ver que os problemas quan

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do acontecem são uma oportunidade para nos colocar em contato com nossos anjos e com o nosso coração. O câncer fez também com que me conectasse com muitas pessoas, principalmente os meus seguidores nas redes sociais. Ele me permitiu conhecer histórias que nunca ima ginei, receber o carinho de pessoas que nunca vi. Por isso, este diário tem a intenção de ser um instrumento para ajudar e alertar as mulheres a não deixarem para depois a realização do autoexame, a visita regular ao seu médico, pois o descobrimento precoce da doença é fundamental para o sucesso do tratamento.

Quem se ama, se cuida!

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Viva um dia de cada vez;Tire alguma licao;Tranquilize suamente e nao crie expectativas.

DEPOIS DISSO TUDO, TENHO MUITO PARA VIVER!

“Claudia, talvez pelo caminho da felicidade você não tivesse recebido tanto.”

Pe. Fábio de Melo

Termino este diário com muita gratidão no meu coração. Agora posso dizer que, olhando para trás, exatamente para o ano de 2021–período em que descobri um câncer de mama e em que me despedi dele –, foi também o ano em que pude testemunhar todo amor que uma pessoa pode receber.

Descobri que a maioria das pessoas se unem, dão carinho e atenção nos momentos difíceis. Prova disso foi que quando coloquei no meu Instagram o que estava se passando comigo, imediatamente recebi uma avalanche de mensagens repletas de amor e de energias positivas, força e coragem.

Chegaram mensagens, orações, dicas, conselhos e li muitas histó rias parecidas com a minha. O que foi maravilhoso e confortante. Me aproximei de pessoas que nem conhecia pessoalmente e foi aí que me dei conta de que quando ouvimos histórias semelhantes percebemos que não estamos sozinhos. Existem muitas pessoas, homens e mulhe res, passando pela mesma situação.

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Tenho certeza de que o câncer veio para me dar um propósito: ajudar de alguma forma quem está enfrentando essa situação, mostrando a minha caminhada, a minha experiência, minha superação e a força da minha fé.

Hoje posso falar sobre o assunto com propriedade e sei que esse é um período extremamente difícil. Mas que tem muita vida, luz e espe rança nesse processo. A maior mensagem talvez seja esta: jamais tire a ideia da cura do seu foco, mesmo que sofra muito e pense em desistir.

Todos os dias penso e rezo por todas as almas que estão vivendo es sas condições. Peço a Deus para que elas tenham a certeza de que dias melhores virão. E quem sabe este diário, que acabou virando um livro, ajude de alguma forma quem está passando por isso.

Agora quero aproveitar cada instante que a vida me der e ter sem pre comigo as pessoas que amo, pois quando a gente se der conta, tudo já passou.

Até este livro ser editado estou deixando meu cabelo crescer, curtin do cada pedacinho, cada fiozinho dele. Mas quero ele longo novamen te, pois tenho a sensação de que preciso encontrar aquela Claudia que deixei para trás, no dia 31 de maio de 2021.

Preciso colocar as Claudias juntas, a de antes e a de agora. Sempre na companhia de Deus!

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CARTAS

Minha querida irma Cynthia!

MINHA QUERIDA IRMÃ CYNTHIA!

“O que te escrever em um dos dias mais importantes da minha vida? Primeiro, que te amo. Não vivo mais sem você!

Amiga, você esteve presente comigo desde a hora 1. Você foi meu braço direito, esquerdo, minha base. Eu caí algumas vezes e você esteve lá em todos os momentos pra me dar a mão. E me puxou para o alto todas as vezes. Estar com você me enche de energia, de força, de espiritualidade e, principalmente, de amor. Jamais esquecerei você na minha frente no avião!

Se eu passei por isso com garra é porque tive pilares muito fortes, e você foi um deles! Tenha certeza absoluta disso. Eu não tenho como agradecer por tanto. Digo apenas obrigada por fazer parte da minha vida. Por dar força para o meu marido, por cuidar dos meus filhos e por SEMPRE estar ao meu lado. Você é muito mais que uma amiga. Você é uma irmã que Deus colocou na minha vida.

Te amo muito e nunca vou esquecer este ano tão especial. Porque o câncer foi só um detalhe. Eu vou lembrar de 2021 como o ano do amor, da força, da resiliência, superação, fé, risos, choros, mas, princi palmente, o ano da amizade pura e verdadeira.

Você é um presente! E obrigada por estar comigo no meu renascimen to. Eu renasci por causa de vocês. Minha eterna gratidão. Eu agradeço todos os dias a Deus por ter colocado vocês na minha vida.”

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Clau!

“E eu já disse hoje que te amo? Pois saibas que te amo mais. Feliz de mim por você não viver sem mim, pois eu também não imagino trilhar essa caminhada sem você ao meu lado, crescendo juntas e somando o tanto que a gente soma, multiplicando muitas vezes. Nossa amizade de irmandade é bênção.

Amiga, você é presente desde o dia 1 em minha vida. Já conversa mos muito sobre e sabes que a convivência contigo me trouxe de volta uma beleza da vida que estava anestesiada. Me lembrou do quanto eu amava flores, do mundo colorido, de ser feliz falando bobagens, de um romantismo tão essencial em minha vida, dos benefícios da leveza e da importância da fé e da esperança.

Desde o dia 1 senti sua luz. Eu via, além de uma loura, linda e de sor riso enigmático, a profundidade do seu olhar azul. Eu via o que para muitas pessoas era invisível.

E a convivência contigo me fortaleceu. Sua luz para mim foi luz, sua alegria era minha alegria e a gente foi somando e aprendendo uma com a outra a cada dia onde eu sempre dizia: e só melhora.

A ponto de apenas na troca de olhar sabermos tudo o que uma que ria dizer para a outra. Quanta conexão, quantos momentos indescrití veis vivemos, quanta luz. Mas como sabemos, onde há luz, há sombra, e no dia da grande sombra que pairou em sua vida eu também estava ao seu lado e pensei: agora é minha vez de retribuir.

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Mas daí refleti melhor e tive a certeza: retribuir não, agora você vai ter mais uma aula e assistir ao mundo vendo o que você sempre viu. Agora as pessoas terão acesso ao lado de dentro, tão lindo e iluminado. que você sempre sentiu. Agora as pessoas conhecerão a Claudia por inteiro.

Feliz do mundo.

E você, com a maestria, sabedoria e fé que um dia ajudou a me forta lecer, deu AULA de AMOR À VIDA.

Deu aula de como se enfrenta a sombra e como se faz ser luz na escu ridão. Você foi potência, você é bomba de amor, é usina de luz. Todos falam do quão linda é nossa amizade, cumplicidade e lealdade, do fato de estar contigo nessa provação.

E sempre o mesmo pensamento me ocorre: e onde mais eu estaria? Onde mais faria sentido?

E como foi esse processo? Foi como sempre, é como quando estamos juntas em ‘dias comuns’: leve, cheio de amor, espiritualidade, fé, espe rança, alta energia e cura.

Sua cura curou algo em nós. Crescemos na dor e hoje seguimos cres cendo no caminho do amor. Foi um acontecimento que mudou para sempre nossas vidas, e para muito melhor.

E hoje muito emocionada escrevo esta carta no lugar em que mais amo ocupar na sua vida, na primeira fila do seu palco de batalhas e

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conquistas, aplaudindo de pé que você venceu uma gigante luta e está brilhando e mais linda do que nunca.

Te amo, e sabes que um dia de joelhos pedi a Deus uma irmã, mas nem em meus melhores sonhos imaginei que Ele iria ser tão generoso.

Sempre e para sempre aqui para você, com amor.

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Minha querida Anelise!

“Eu já te disse, mas nunca vou esquecer aquela cena de você saindo da porta do hotel. Naquele momento, eu desmoronei porque sabia que não precisava mais ser forte, pois eu tinha vocês ao meu lado. Você e a Cyn thia estavam desde a primeira notícia. E quando caí algumas vezes vocês estavam lá, prontas, firmes, para me dar a mão, me puxar para cima.

Eu passei por isso com garra porque tive mãos muito fortes me segu rando, e a sua foi uma delas. Eu não tenho como agradecer por tanto. Pelo amor, pelo carinho, pelas suas palavras que sempre caíam como uma luva, pelas mensagens, pelas orações...

Você é muito mais que uma amiga, é uma irmã que Deus colocou na minha vida!”

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Minha querida Clau!

“Quando recebi a tua ligação para contar do diagnóstico, senti que não havia outro lugar para estar que não fosse ao teu lado. Por isso, quando menos percebi, tomada por um impulso, estava na porta do teu hotel em São Paulo.

E esse foi o sentimento que me inundou durante cada uma das tuas químios, durante cada cirurgia.

Onde mais eu poderia estar, o que mais poderia estar fazendo, que fosse mais importante do que segurar a tua mão?

Você não imagina o quanto aprendi e cresci ao teu lado nesse pro cesso. Vivenciar todos esses momentos, desde o diagnóstico até a cura, curou muitas coisas em mim também.

Me fortaleci ao testemunhar o tamanho da tua força. A minha fé se expandiu unida a sua e sentimos juntas a presença de Deus em incon táveis momentos.

Você me ensinou lições que levarei para sempre comigo, e uma delas foi a coragem para mostrar a própria vulnerabilidade. Se expor emo cionalmente para ajudar os outros é coisa para os grandes de alma, e você, minha amiga, é uma gigante de alma.

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Aprendi tanto sobre a vida quando te escutei falar que este ano foi um dos mais importantes da tua história, que as lições aprendidas não seriam possíveis pelos caminhos da alegria. Pude ver, bem dian te dos meus olhos, como se abraçar um momento de dor, de incerteza, de medo, com tamanha resiliência e transformar tudo isso em força e aprendizado.

Te amo muito, sou muito grata a Deus pela tua vida e pela tua cura. Te admiro profundamente e desejo o mais lindo da vida para esse teu momento de redenção. Você é a nossa fênix.

Com muito amor, da tua irmã de coração.

Anelise”

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Minha querida Lala!

“Nunca vou esquecer você entrando no quarto do hotel em São Paulo e me dando aquele abraço tão cheio de amor. Como te amo, minha irmã!

Você mesmo longe se fez presente o tempo inteiro. Sentia que estava comigo de coração e alma, o tempo todo. Você, suas flores e seus cartões que fizeram a contagem regressiva com tanto amor e delicadeza.

Se passei por isso com garra é porque tive estruturas inabaláveis ao meu redor, e você é uma delas.

Obrigada por estar na minha vida!”

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Clau!

“Minha irmã, falar sobre você, sobre o quanto te amo e admiro, cor rem dos meus olhos lágrimas de alegria. Nosso encontro, já na maturi dade da vida, foi um dos melhores presentes que Deus me deu.

Quando soube da batalha que você iria enfrentar fiquei sem chão por um instante, mas imediatamente lembrei que tenho um Deus que nunca falha e que sua cura era certa.

E você nesse tempo de luta me deu mais uma aula. Aula de força, de resiliência, de fé, de empatia e de solidariedade. Mostrou para quem ainda não sabia que a Claudia é muito mais maravilhosa por dentro do que ela é por fora. A Claudia é a pessoa que em qualquer situação sabe ver beleza, sabe escolher o melhor ângulo! Sou testemunha desse seu talento único que admiro tanto.

Obrigada por me deixar fazer parte dessa sua trajetória, da sua vida e aprender tanto com você. Agradeço a Deus por me dar uma irmã tão especial que é um raio de luz por onde passa, que é unanimidade, que é fonte de amor! Sorte a nossa ter você! Sorte a nossa poder aprender e conviver com você!

Te amo e peço a Deus pela sua vida e de toda a sua família sempre!

Lalá”

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DEPOI MENTOS

VERNA IVONE WARKEN E JOSÉ PAULO WARKEN

“Claudia é uma filha surpreendente nas suas atitudes e decisões, sen do uma ótima ouvinte, seguindo os conselhos e exemplos positivos da família e mestres.

Aprendeu, pelo exemplo de casa, a fazer o bem e ajudar o próxi mo, dando atenção, sem distinção, principalmente às pessoas ca rentes e necessitadas.

É de uma grande sensibilidade e se comove com situações que neces sitam de auxílio e amparo. É uma guerreira para enfrentar situações inusitadas e desfavoráveis. Diante de situações difíceis recorre a sua fé e seu otimismo que lhe é peculiar.

Passou por situação de saúde delicada que foi superada com força, orações e com apoio dos seus muitos amigos. É um exemplo de mulher forte, comunicativa e decidida, recorre à fé em Deus e em si mesma para dar sentido e finalidade à vida.”

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“Já eram meados do ano de 2021 quando a minha esposa, após uma visita de rotina ao seu médico e alguns exames, recebeu a notí cia de ter um nódulo no seio. Esse dia era apenas o começo de uma batalha, que teria vários momentos de angústia, tudo num curtíssimo espaço de tempo. O ano que se passou depois do diagnóstico foi muito intenso, preocupante, porém também cheio de otimismo.

Por mais que eu estivesse aflito, pensei na Claudia, nas crianças e percebi que a melhor atitude que poderia ter naquela hora era de espe rança, motivação. Eu queria muito manter nosso ambiente familiar o mais normal possível. Desejava que tudo ao redor da Claudia ajudasse a tornar o fardo menos pesado. Pois não adiantava só ela ser positiva, todos ao redor dela teriam de estar com a mesma postura. Mesmo que a preocupação fosse grande, tínhamos de emanar a melhor energia pos sível, acreditando que tudo ia acabar bem.

Alguns momentos foram inquietantes, porque determinadas coisas não saíram como o planejado: a cirurgia que era para ser uma extra ção de nódulo acabou sendo muito mais invasiva, o cateter arrebentou e uma nova cirurgia teve de ser feita às pressas. Hoje, pensando nesse dia, digo que esse foi o momento em que tive mais medo. Estávamos em um bom hospital, ela bem cuidada, com bons médicos, mas ter de fazer uma cirurgia assim, complexa, foi complicado! Sou uma pessoa prag mática que calcula os prós e os contras de tudo, então em uma situação como essa eu sabia os riscos que ela estava correndo.

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Me lembro, como agora, do imenso alívio que senti ao ver seus olhos abrindo no quarto do hospital. A anestesia passando e ela voltando a recobrar os sentidos.

Em todo esse período tivemos muitas coisas favoráveis para derrotar esse inimigo, e entre elas, a postura adotada pela Claudia foi decisiva. O positivismo e a serenidade de como ela enfrentou a doença foram im pressionantes. Até mesmo quem estava fora da nossa rotina diária per cebia como ela enfrentava a situação. Sempre serena, e mesmo quando surgia algum problema, ela dizia: tudo bem, vai dar certo. Claro que ela teve algumas recaídas ao longo do processo, e então era minha vez de lembrá-la o quanto ela estava disposta a viver, a lutar e a passar bem por essa fase.

Nossas viagens também foram um bálsamo em meio a isso tudo. Me lembro que em St. Barth, ao caminhar com ela no final da tarde, de frente para o mar, percebi que muita coisa tinha mudado em mim e nela. Começamos a ver algumas coisas de forma diferente, uma mu dança de perspectiva de vida mesmo. Agora todos os dias são impor tantes e tentamos aproveitar ao máximo cada momento.

A Claudia tem uma maneira diferenciada, diria especial, de ver as coisas, a vida. Mesmo diante do momento de indagação do´por que co migo´, ela dizia:´Foi comigo, mas poderia ser com outra pessoa. Mas já que aconteceu, vou sair bem e também vou ajudar quem estiver pas sando por essa intensa batalha, mostrando que a gente tem de ser forte, incansável, ter muita fé e jamais desistir´. Foi surpreendente a forma como ela lidou com a situação, e tudo isso fez com que meu respeito e minha admiração aumentassem muito. Eu a amo mais que tudo!”

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“Foi um susto! Em um dia normal, recebi a notícia por uma ligação do meu irmão: ´Oi, Gio, tudo bem? Estou em São Paulo, a Claudia foi diagnosticada com câncer e vai fazer mastectomia total amanhã´. Inicialmente, fiquei processando a informação, porque, além de a no tícia ser terrível por si só, minha imaginação se inundou com muitas perguntas ainda sem resposta. A preocupação sobre o quanto a doença atingiria ela, meu irmão e sobrinhos.

No dia seguinte, acompanhei o processo por constantes ligações para o meu irmão, que me aliviou com a notícia de que a cirurgia havia sido um sucesso. Fui ao hospital visitá-los (no plural, pois o Pedro não saiu do lado de Claudia em hora alguma). Quando cheguei, a vi bastante aliviada e confiante. Percebi que mesmo que o diagnóstico tivesse sido tão preocupante, foi rapidamente ´resolvido´.

Minha forma de ajudar sempre foi a mais positiva que encontrei, e sempre que pude, brincava para deixar o clima menos tenso. Quando ela me mostrou o resultado da cirurgia, disse: ´Cunhada, ganhaste seios de menina… Que alegria!´. Brincadeiras à parte, o assunto ainda era sério, e muito. Recebemos a notícia de que só a cirurgia não seria o sufi ciente e que agora Claudia teria de enfrentar um novo desafio, a quimio terapia. Desde o diagnóstico, aquele foi o único momento em que a senti um pouco mais frágil, com medo. Entretanto, isso passou logo. Encarou o tratamento bravamente e hoje, com a bênção de Deus, está curada.

Concluo que o mais importante em nossas vidas é realmente viver de forma plena, tendo a certeza de que a vida é bonita, mas que o amanhã

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pode não existir. Honestamente, acredito que todos devemos ter isso em mente para vivermos cada dia melhor.

A medicina está aí para nos ajudar e ela foi muito importante na cura da Claudia. Friso a importância dos checkups anuais e o cuidado espe cial com a nossa saúde, que no final das contas é nosso maior tesouro. Pessoas boas existem e chegam à nossa vida conforme estamos abertos para recebê-las, e por isso, sou muito grata aos médicos que salvaram a vida da minha cunhada. Sinto que fomos muito sortudos de detectarmos o câncer de forma tão precoce, o que permitiu que Claudia estivesse co nosco hoje. Muitas pessoas, infelizmente, não têm a mesma sorte.

A jornada até aqui não foi das mais fáceis, mas a família é o alicerce que permite que tudo seja mais leve. Juntos, seguimos.

Vida nova para a minha cunhada que eu amo tanto.”

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DOUTOR JOÃO STEIBEL

“Um ser humano com saúde quer um milhão de coisas. O mesmo ser humano, quando doente, quer somente saúde.”

“Dentro das doenças da mulher, uma das mais impactantes é o cân cer de mama. Ele, em geral, desestrutura a paciente na sua confiança de mulher, de mãe e de amante. É preciso um grau muito intenso de altruís mo, maturidade interna e muita força de vontade para enfrentar essa si tuação. E é nesse espaço, nesse contexto, que coloco a Claudia como um exemplo do que devemos fazer. Ensinar pelo exemplo foi o que ela fez.

Primeiro por ter feito simplesmente o que seu médico recomendava, ou seja, mamografias e ecografias mamárias no tempo certo, sem negli genciar nenhum dia. Isso tornou possível o diagnóstico precoce, funda mental para termos chances de cura dessa patologia.

Segundo, por não se deixar abalar completamente (um abalo inicial é inevitável e até saudável) quando recebeu a notícia da doença e ter força e coragem de enfrentar o problema buscando as melhores alter nativas possíveis para a resolução do mesmo.

Terceiro, por não se achincar frente a dificuldades que surgiram, como a necessidade de quimioterapia, sabidamente agressiva e cau sando deterioração no corpo e na alma, mas extremamente necessária quando bem indicada, pois tem o poder de livrar o paciente da doença.

Transformando o ´bicho-papão´ da quimioterapia em aliada, pres tando atenção somente nos dados positivos da quimioterapia e supor tando com galhardia e força mental os dados negativos (como fraque

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za, náuseas, vômitos), a Claudia mostrou como se enfrenta esse tipo de situação e deixou o caminho traçado para toda mulher que tiver o mes mo desafio. É com orgulho e muita alegria que posso dizer que a Clau dia curou-se por intervenções médicas bem-sucedidas, mas também e muito pela sua coragem, determinação, pensamento positivo e amparo irrestrito de seu esposo e filhos. Parabéns a esse quarteto maravilhoso completado pelo Pedro, PP e Vittorio.”

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DOUTOR ANTÔNIO FRASSON

“O diagnóstico de câncer é uma das notícias mais tristes que pode mos receber. Primeiro pensamos nos filhos, depois na família, depois em nós mesmos. Essa é a sensação que tenho toda vez que vejo alguém que acabou de receber o diagnóstico. Aconteceu um acidente grave, e para quem recebe a notícia, parece que foi fatal.

Mas o que percebi quando vi a Claudia foi que essa sensação pas sou muito rapidamente em sua cabeça. Em seguida entendi que ela era uma pessoa pronta para enfrentar, resolver. Quando a encontrei pela primeira vez, apesar de recém ter recebido o diagnóstico, já me pareceu disposta a lutar. Vi uma pessoa com um dom de bondade e carisma imensos, pronta para resolver o que viesse, e continuar sua vida de mãe, esposa e empreendedora.

Quando a vejo, percebo alguém doce. E foi assim que ela se compor tou durante todo o tempo, positiva, resolutiva, gentil, grata, brilhante e iluminada. Uma pessoa que veio para não passar em branco, disposta a dar sua contribuição, por onde passa, para a construção de um mun do melhor. Alguém que chegou para marcar, e para ficar!!”

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DOUTORA MÓNICA RODRÍGUEZ FRASSON

“´A vida é como uma montanha-russa com altos e baixos, assusta e diverte. Imagina se fosse sempre igual. Seria muito chata.´

Isso é o que sempre falo para minhas pacientes para descontrair em um momento em que a vida parece não ter uma saída. Quando uma pes soa recebe o diagnóstico de câncer até a expressão do rosto muda. Todos os sentimentos mais escuros afloram. Como pessoa, dou minha mão para segurar nesse momento de medo, de incerteza. Como médica, devo orien tar e explicar da melhor maneira qual tratamento cirúrgico vai ser feito.

Quando Claudia entrou no consultório vi uns maravilhosos olhos azuis brilhosos com algumas lágrimas que tinha derramado. Um rosto angelical que transmitia medo. Apesar da notícia e do momento, tinha na minha frente uma pessoa receptiva, otimista, atenta ao tratamento e confiante com a equipe cirúrgica e com a cura. Primeira coisa para ter sucesso: confiar e se entregar. Claudia sempre teve uma boa atitude. Posi tiva, alegre. Tem que fazer, vamos fazer. E o mais importante, com Deus na vida, com Deus guiando o caminho, com Deus segurando tudo.

Não esqueço quando no primeiro pós-operatório ela me perguntou: ´Você acha que devo contar o que está acontecendo comigo?´. Eu dis se: ´Faz o que teu coração mandar. Você é muito querida pelas pessoas. Teu exemplo pode ajudar muitas mulheres. Você está passando por este momento difícil e pode compartilhar. Assim outras mulheres que estão na mesma situação vão sentir que não estão sozinhas, que alguém entende elas, porque está sentindo o mesmo´. Ela disse: ´Vou pensar´.

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Logo veio seu depoimento e claramente ajudou, ajuda e estará aju dando muitas pessoas com seu exemplo: querida, com muita fé, alegria, muito amável e com algo muito importante que muitas vezes é esque cido – muito agradecida com tudo e com todos. Claudia nos ensinou que apesar de um dia estar sem sol, pode brilhar. Continuou com seu trabalho, sua vida de mãe, esposa e amiga concomitantemente com seu tratamento. Obviamente vêm os dias em que física e humanamente não há muita energia. Mas no outro dia vai sair o sol novamente.

E assim é a Claudia para mim.”

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DOUTOR CARLOS H. BARRIOS

“Por mais que tentemos controlar e prever o que vai nos acontecer, a vida é por natureza imprevisível. Temos surpresas positivas e ao mes mo tempo, sem aviso prévio, imprevistos, problemas pequenos ou gran des e até mesmo tragédias que fazem parte da nossa caminhada.

Não é escolha, é destino. Isso é universal e vale para todos. Mesmo que muitos procurem incessantemente, e geralmente sem sucesso, saber do futuro, a magia do inesperado em último caso é o que faz com que nossa vida tenha sentido.

Como enfrentamos tanto as coisas boas quanto as adversidades que aparecem na nossa frente parece ser uma medida, entre tantas, de quem somos, do nosso caráter, da nossa fibra. Isso também não é uma esco lha. Carregamos e desenvolvemos aos poucos um conjunto básico de mecanismos emocionais que definem nossa capacidade individual de enfrentamento. Embora possamos educar ou até mesmo treinar nossas capacidades de reação, é difícil fugirmos de quem realmente somos.

Como não poderia ser diferente, uma doença séria, grave e impre visível como o câncer é uma dessas pedras que se apresentam no ca minho de tantas pessoas. Acompanhar esse processo testemunhando a reação dos que passam pelo desafio de receber um diagnóstico como esse é uma experiência profundamente enriquecedora. Ao contrário da percepção generalizada de que é o médico quem ajuda o paciente nes ses momentos, para mim na realidade sempre foi uma troca. Observar nos pacientes a variedade de alternativas nas suas reações representa um aprendizado inestimável.

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Câncer! No começo, a palavra bate forte em todos. Carrega precon ceitos negativos inevitáveis que se originam em décadas de diagnósti cos tardios, falta de conhecimento, tratamentos cirúrgicos mutilado res e medicações agressivas, tudo isso associado a muito sofrimento e pouca esperança.

O primeiro passo é simples, na realidade até muito fácil. Transmitir a informação. Isso deve ser feito de forma clara, objetiva e urgente. Quan to antes alinhamos cada paciente com uma ideia verdadeira do que está acontecendo com ele e o que deverá acontecer, aliviamos a angústia, mi tigamos o preconceito e diminuímos imensamente o sofrimento.

Todos nós temos medo de muitas coisas, em maior ou menor grau. Mas não saber o que vai acontecer, principalmente quando aliamos a falta de conhecimento com uma perspectiva de morte, representa um desafio particular.

Sou capaz de dizer que essa interação inicial pode ou até deve ser considerada uma emergência médica. A capacidade que a informação adequada, no momento adequado, na intensidade e na dose adequa das tem como efeito terapêutico é certamente das coisas mais importan tes que o médico pode oferecer.

Nem toda a tecnologia desenvolvida até hoje nem a informação am plamente e instantaneamente disponível num click têm sido capazes de superar ou substituir essa´função´ médica, que para mim continuará insubstituível. O Dr. Google consegue dar muitas informações sobre a doença, mas sobre a doença daquela paciente o médico sabe muito mais.

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É nesses momentos que o observador atento identifica a variedade enorme de reações que refletem nossas maravilhosas diferenças que nos fazem infinitamente interessantes. O teor das notícias pode ser melhor ou pior do que o esperado, mas a variedade das reações nunca deixa de me impressionar.

A Claudia chegou com o Pedro. Desde o primeiro momento mostran do confiança e certeza de que, independentemente do que fosse necessá rio, estava ali, parceira e disposta a superar os desafios que poderíamos colocar à sua frente. Determinada. Aquilo tudo, completamente inespe rado, como se não fosse verdade, que por momentos parece não estar acontecendo, não iria atrapalhar a vida, os filhos, os planos, o dia a dia.

Direta e com questionamentos claros e objetivos, o tipo de paciente que ajuda no processo. Já tinha passado por uma cirurgia e o diag nóstico inicial já estava estabelecido. Entretanto, e cada vez mais, a personalização do manejo do câncer de mama demanda um processo diagnóstico que é mais demorado do que simplesmente a análise do pa tologista. A caracterização biológica de cada caso não é somente pos sível, mas necessária para otimizar o manejo, definindo o tratamento adequado. Mas isso leva tempo. E como em todo processo como esse, gera angústia. Sei que tenho câncer, já fiz a cirurgia, sei que vou pre cisar de mais tratamento, mas não sei exatamente qual. O fantasma da quimioterapia aparece e domina os pensamentos. Talvez sim, talvez não. Precisamos aguardar os resultados. Mais tempo.

Confiança, credibilidade, a informação suficiente mas também abran gente, tentando não deixar de fora possibilidades que embora indesejá

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veis fazem parte do melhor tratamento para alguns casos. Essa deve ser a estratégia, esperando a melhor reação e a paciência imprescindível.

A informação encurta o tempo e nesse caso concreto o sofrimento é inevitável. Mas enquanto dura o tempo sem definição, a incerteza gera novas perguntas. Algumas práticas demais. Contar ou não contar para os outros? Manter o segredo é uma alternativa que magicamente nos ajuda a fazer de conta que ninguém vai ficar sabendo. É como se a doença não estivesse acontecendo comigo.

Essa estratégia nunca funciona completamente, às vezes resolve por um período, mas invariavelmente falha. A Claudia fez o que é natural para ela, corajosa e generosa, compartilhou. Esta é outra forma também de dividir a angústia e talvez até mesmo diminua um pouco o tamanho do problema e a intensidade do sofrimento. Mas como tudo, são escolhas. Na realidade não existe certo ou errado. São aqueles mecanismos emo cionais que temos e desenvolvemos e que, em última análise, só somos.

Cada um consegue fazer o enfrentamento que tem condições de fazer. Há muito tempo deixei para trás a ideia de que tem uma forma boa ou correta de suportar o peso.

Para quase todos nós, os filhos são um capítulo à parte, individual e emocionalmente sem tamanho em comparação a qualquer outra coisa. Sem quase nenhuma possibilidade de estar enganado, acredito que o exemplo que damos para todos, mas particularmente para nossos fi lhos, em situações como essa, é que nos diz como somos na realidade, sem maquiagem, sem subterfúgios, sem defesas. São escolhas impossí veis de esconder e que comunicamos da forma mais serena, sem perce

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ber. Não participei da conversa nem da reação deles ao saberem sobre a doença, mas o conselho é sempre ser direto, simples, claro, na lingua gem compreensível para cada um.

Apesar da angústia, o tempo termina passando, é inexorável. Nesse sentido, o tempo nos ensina que o processo vai mudando o motivo da preocupação. É o nódulo, é a biópsia, é o diagnóstico, é a confirmação do diagnóstico, é a cirurgia, é o tratamento, é a pergunta sobre o que vai acontecer depois. Não é uma paulada só. Novamente, continuar a viver durante todo o enfrentamento é um desafio e tanto.

O resultado do exame do tumor indicou que era necessário adminis trar quimioterapia. As características da doença e a forma como esta va se apresentando indicavam o caminho. Podemos discutir, debater, considerar possibilidades e alternativas? Claro! Mas em última análi se, existe o que é mais seguro e o que é menos. Certezas não fazem parte importante das imprevisibilidades da vida. Sempre é necessário tomar uma decisão, mesmo que seja a de não tomar uma decisão.

Novo momento de mostrar quem somos. Quantas dúvidas! O pre conceito transformado em perguntas joga pesado aqui. Será que minha vida vai mudar? Será que vai mudar muito? Qual o tamanho das li mitações que a quimioterapia vai impor? Vou poder fazer a coisas que faço no dia a dia? Cuidar dos filhos? Novamente, a transmissão de informação bem colocada, realista e direta se transforma no melhor remédio. Mas não funciona melhor do que fazer o tratamento e sentir na pele o que acontece com cada um. A individualidade e a capacidade de tolerar a quimioterapia, a experiência em si, em última análise, é o que a define. A Claudia foi novamente valente e decidida. Acho que o

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raciocínio foi o de fazer tudo o que deve ser feito para acabar com as eventuais dúvidas e ficar segura, o mais segura possível.

Não tem nada mais emblemático nessa fase do que o cabelo. Se não é a primeira pergunta, é a primeira que todas gostariam de fazer e que talvez por algum constrangimento fica para um pouco depois na con sulta. Mais do que pura vaidade, que é a motivação de muitas pacien tes, parece que a perda do cabelo representa um sinal, uma marca, um carimbo público e até um atestado de fragilidade. Aquelas que têm difi culdades em compartilhar a informação do diagnóstico sofrem particu larmente mais frente à perspectiva da perda do cabelo. É uma dificul dade a mais, sim, mas é particular e diferente das outras. Cortar ou não cortar o cabelo antes? Algumas, mais corajosas e atrevidas, ostentam a careca até com um certo orgulho, mas são uma minoria. Outras até aproveitam para ostentar um novo corte, um novo visual.

Olhando a totalidade da experiência, não podemos deixar de abra çar empaticamente o acúmulo de perdas e perspectivas de perdas que se acumulam à medida que se dá o enfrentamento. Não podemos esquecer que muitas vezes a paciente já sofreu a mutilação da cirurgia. Em ou tras, tem a perspectiva de fazer a quimioterapia antes do procedimento cirúrgico. É inevitável que tudo vá se somando.

Uma verdade que vem da experiência ensina que não é possível en carar tudo numa boa, sentada. É um processo. Cada dia é um dia e cada paciente tem seu ritmo. A jornada pode ser parecida, mas nunca é necessariamente a mesma. Por isso, essa história nunca se repete. Cada paciente é um desafio especial e único que exige escutar muito para dese nhar o melhor caminho para cada uma. Como em tantas outras coisas,

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evoluímos. Nas últimas décadas `aquela doença´ passou a ter nome e câncer já está no vocabulário social. Junto com esse reconhecimento corajoso, evoluímos também no tratamento da doença e dos efeitos da quimioterapia. As cirurgias estão cada vez menores e são melhores do ponto de vista estético, o que diminui a percepção mutiladora que por tanto tempo nos assombrou.

Para o cabelo temos hoje alternativas surpreendentes e maravilho sas. Perucas e outros procedimentos que preservam o visual pratica mente inalterado e que ajudam demais. O resfriamento do couro cabe ludo não é solução para todas, e é uma solução trabalhosa, que exige dedicação. Mas que consegue evitar de forma fantástica a perda do cabelo numa boa proporção das pacientes.

Nova etapa, novos desafios, seguimos construindo a jornada de cada uma. Será que consigo ter uma vida normal durante a quimiote rapia? O tamanho do medo e da expectativa é individual.

Será que consigo viajar? Já tinha uma viagem programada, tenho que cancelar? Assim foram eles para o Caribe. Já que da primeira vez foi tudo bem, depois Dubai. Depois disso, Punta del Este passou a ser um curto passeio para passar o ano novo. Nada interrompeu a rotina, mas precisou da coragem de enfrentar o imprevisível e correr os riscos que podemos correr. Obviamente com a cumplicidade do médico.

Um dia, durante uma consulta recebi uma solicitação especial sobre o tratamento do dia seguinte. Não lembro do detalhe, mas o motivo era que logo depois da quimioterapia deveria, durante várias horas, gravar uma propaganda para um empreendimento. Provavelmente, a

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maior parte da equipe de profissionais que participou daquela grava ção não tinha a menor ideia e não ficou sabendo do que a Claudia fez logo antes de aparecer para gravar, uma sessão de quimioterapia.

Atitude positiva não deixou que as limitações do tratamento fossem maiores do que seu desejo de viver. Nem tudo foi perfeito, houve quei xas, fadiga, falta de energia, mas que foram manejadas ou toleradas e não definiram em momento algum o enfrentamento.

Com sua experiência, a Claudia quer deixar algo para todos nós. Para mim fica como exemplo a dignidade com que enfrentou essa pro vação, sem se curvar nem se entregar às dificuldades que o destino co locou no seu caminho. Obrigado, Claudia!”

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DOUTOR FERNANDO LUCCHESE

Uma leoa chamada Claudia

Um provérbio chinês muito antigo sempre mobilizou minhas atitudes.

“Se queres felicidade por algumas horas Tire uma soneca.

Se queres felicidade por um dia Vá pescar.

Se queres felicidade por um ano Herde e gaste uma pequena fortuna.

Mas se queres felicidade por toda a vida Ajude alguém.”

Eu não conheço alguém que tenha sabido absorver melhor a sabedo ria desse provérbio do que a Claudia Warken Bartelle.

Claudia vem de uma família toda coração. Os pais, Paulo e Verna, são afetivos, cuidadosos e tiveram sucesso em transmitir seus sentimen tos aos filhos. Seu tio, frade capuchinho, teve grande presença na fa mília, introduzindo simplicidade e generosidade como ingredientes de felicidade. Seu marido, Pedro, que conheço desde que nasceu, também é todo coração, com um toque pragmático de italiano empreendedor. Tem sido um apoiador irrestrito e importante para os projetos da Claudia.

Os primeiros aniversários do PP, seu primeiro filho, foram já um exercício de generosidade, pois o presente era uma doação para a cons

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trução de uma UTI pediátrica para o Hospital Santo Antônio da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Na época constituí um grupo de jovens senhoras que se intitularam “Voluntárias pela Vida”, que passou a atuar em campanhas para financiamento de projetos da Santa Casa. Claudia foi das mais proeminentes associadas desse grupo. Mas sua real atuação social passou a ocorrer na Casa Madre Ana, um abrigo de passagem e apoio aos pacientes e familiares vindos de 23 estados do país para serem operados na Santa Casa, de anomalias do coração, transplantes de rim e de coração, ou tratamento de câncer. Claudia tor nou-se, pela sua atuação em arrecadar fundos, madrinha dessa Casa, que em 6 anos já acolheu 5 mil hóspedes, 70% crianças de todo o Bra sil. E não usou o método simples de assinar um cheque, pelo contrário, criou um Bazar arrecadando objetos junto à sua atuação profissional, para serem vendidos revertendo recursos para a Casa. Em seu último Bazar, já tornado sucesso, arrecadou o valor necessário para o sustento de um ano da Casa. Reuniu um grande grupo de voluntários e com um trabalho intenso criaram uma marca, o “Bazar da Claudia”, certamente o maior empreendimento social desse tipo já realizado no sul do país.

A leoa é um símbolo entre os animais. Seu marido, o rei leão leva as honras mas tem o apoio da grande batalhadora pelos cuidados da família, que é a leoa. A garra com que a leoa se dedica a essa tarefa é simplesmente imbatível.

Por isso identifico o perfil da Claudia com o de uma leoa.

E a prova veio com sua doença. Um câncer de mama em idade pre coce demonstrou toda a sua garra de leoa. Foi o único apoio que pude

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lhe dar naquele momento difícil cheio de incertezas. “Claudia, eu te conheço, tu és uma leoa, vais lutar e vais vencer. Este câncer não sabe com quem se meteu.” Foi o que procurei lhe dizer.

Mas, mais uma vez a Claudia me surpreendeu. Não pela forma como enfrentou a doença, isso eu já esperava. Mas porque na própria doença ela esteve centrada em ajudar as outras mulheres na mesma situação que ela. Esta foi a razão deste livro. Ajudar as pessoas a evitarem e, se necessário, enfrentarem a doença. Como reconhecida e competente “influencer”, ela expôs suas dificuldades, sua luta, sua forma de enca rar a vida para que outras se beneficiassem. Relembrando o provérbio chinês, Claudia compreendeu claramente que para ser feliz por toda a vida ela devia ajudar alguém.

Esta é a leoa chamada Claudia.

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DOUTORA ALINA DE PAIVA

“Nos meus mais de 35 anos de clínica, embora já tenha tido diver sos pacientes com casos similares, a Claudia me surpreendeu, mostrando uma força realmente extraordinária durante os meses de tratamento. In teressante notar como seu relacionamento com a doença a fez uma mulher ainda mais forte e perspicaz. Talvez o fato de eu já ter passado por algo parecido a fez ter maior empatia comigo perante a situação, e vice-versa.

No dia em que ela recebeu a notícia, lembro-me bem dela ligando e eu a valorizando por ter feito os exames e descoberto precocemente, o que permitiu salvá-la de um mal pior. Sua aceitação do diagnóstico e deter minação para vencer essa etapa foram fatores fundamentais para sua excelente evolução. Desde a escolha da equipe médica até sua vontade de trabalhar e fazer com que nada de estrutural mudasse em sua vida foram atitudes muito positivas para ela. Não é toda mulher que possui a coragem de expor essa difícil fase de sua vida, ajudando também outras pessoas que passaram ou passarão por situações como essa.

Muito importante notar aqui o apoio familiar incondicional, prin cipalmente de seu marido, e de seus amigos nessas horas. Isso é algo que foi construído com muita integridade, amor e carinho, sendo essa pessoa maravilhosa que ela é. Por outro lado, em nenhum momento deixou de exercer sua função materna, confortando constantemente seus dois filhos, fazendo com que fatores fisiológicos não impedissem ela de viver ao máximo os momentos com eles.

Por último, mas não menos importante, vemos o quanto a fé verda deira nos ajuda em momentos como esses. Em períodos difíceis e solitá

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rios, a crença em algo maior faz a diferença. Sua devoção ao catolicis mo e à espiritualidade certamente a ajudou a enfrentar o medo de que algo pior poderia acontecer. Ter fé em santo, médico, psicólogo é fácil, todavia pode ser falsa fé, pois diante de qualquer desilusão, por peque na que seja, advém a infidelidade ou incredulidade.

Esse tipo de fé difere do estado de fé. Poucas pessoas conseguem o estado de fé, pois precisa-se de um contínuo pensamento positivo e construtivo para regularizar-se os campos mórficos, manter-se o equi líbrio, além dos hormônios, neurotransmissores, minerais, enzimas e o metabolismo em geral. Outrossim, a fé é, antes de mais nada, um ato existencial, uma direção dada à vida do indivíduo, capaz de transfor má-lo e não isenta de riscos.

Concluo que durante todo o tratamento, iniciado com a cirurgia e depois a quimioterapia, a Claudia conseguiu sentir o verdadeiro estado de fé. Esses tipos de lutas vencedoras fazem com que eu seja ainda mais grata ao meu trabalho. Sabendo que a Claudia está feliz e querendo escrever sobre isso, me traz orgulho de ter participado dessa etapa.

Beijos especiais de sua médica que sempre estará ao seu lado.”

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“Quando a Claudia voltou de São Paulo após a cirurgia, combi namos de retomar a fisioterapia, que já fazíamos anteriormente para lesões ortopédicas, agora com enfoque no pós-operatório das mamas. Quando tratamos pacientes oncológicos é muito comum nos deparar mos com uma condição psicológica fragilizada, um paciente temeroso, inseguro, o que é uma condição absolutamente compreensível. Porém, quando me encontrei com a Claudia minha surpresa foi a maneira como ela me recebeu. Aquele sorriso contagiante que só ela tem não era tão brilhante como normalmente, mas ainda assim ela estava sorrindo, um sorriso tímido, cheio de amor, feliz em me ver. Feliz em contar que a cirurgia tinha sido um sucesso e estava pronta para começarmos nossa jornada de reabilitação. Uma jornada longa e dolorosa, juntamente com a quimioterapia, que estava prestes a se iniciar.

Íamos seguindo com a fisioterapia respeitando o dia pós-quimiote rapia, normalmente um dia mais pesado para ela. Pesado, mas jamais desprezado. Pois uma das coisas que mais me impressionaram foi o valor que ela deu para cada dia, para cada procedimento, porque ela enxergava isso como uma vitória, pontos importantes somados no ca minho para no final tornar-se campeã. Ela sabia, desde o início, que a jornada era longa, e que cada pedra no caminho deveria ser transpas sada. Cada pedra tinha um nome, um marco, uma importância.

Frequentei seguidamente a casa da Claudia nesses meses de quimio terapia e reabilitação, o que foi nos aproximando e tornando nossos laços profissionais, já que eu a tratava há mais de um ano, em laços de amizade. Eu, com 25 anos de profissão, me vi aprendendo tanto

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com uma paciente, convivendo com suas dores humanas e ao mesmo tempo deparando com sua vontade sobre-humana, com seus questio namentos, mas sua fé inabalável. Com suas limitações humanas, mas sua disciplina sem fim.

Muitas vezes nos emocionamos juntas, pois meus pacientes passa ram a ter a Claudia como referência. Em algum momento ela postou no seu imenso Instagram que eu a tratava. Foi então que pacientes passaram a perguntar se ela era aquela mulher das redes sociais, sempre sorrindo, enfrentando as adversidades de uma doença como o câncer com aquela alegria toda. De repente me vi como um elo entre a Claudia e essas pessoas, que passavam pelo mesmo processo. Para elas eu levava a força e a garra da Claudia, revestidas de uma doçura infinita. E para ela eu trazia os relatos da importância dos seus posts, das dicas, do quanto aquilo estava inspirando e ajudando tanta gente.

Cheguei a pensar se isso não seria mais um peso para ela naquele momento, uma carga de responsabilidade que pudesse sobrecarregá -la. Mas já não tínhamos mais controle sobre isso. Mensagens, recados, orações chegavam a todo momento. Rituais que ela usava nos dias de quimioterapia eram imitados por pacientes nos seus procedimentos.

Frases que ela me dizia eu repito até hoje para pacientes e tantas ve zes para mim mesma. Ela não teve escolha quando recebeu o diagnós tico, mas escolheu como enfrentaria esse turbilhão. Quantas vezes ela conseguiu mudar a forma de o paciente encarar a quimioterapia, tão temida por todos. Em vez de enxergar um veneno, uma droga cheia de efeitos colaterais, ela via´em cada gotinha de medicação uma luzinha de esperança que mandaria aquela doença embora´. Claudia é única.

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Fez da fragilidade uma fortaleza, e dividiu isso com quem tanto preci sava enxergar a dificuldade sob essa ótica tão otimista, carregada de fé e de amor à vida.

Durante a fisioterapia, conversávamos muito, ríamos muito, sim, porque ela não perdeu o senso de humor, a alegria de viver. Tantas ve zes ela mesma fez piada com as situações que enfrentava. Sempre solíci ta, buscando melhorar a cada dia, jamais se queixava dos desconfortos que sabia que enfrentava. E assim era com os demais profissionais da saúde que a atendiam. Ela passava tanta segurança nos procedimentos que deixava todos espantados e absolutamente encantados.

O que posso dizer sobre essa experiência? Foi uma vivência de apren dizado e muita admiração. Sem dúvida, foi um privilégio ter estado com a Claudia nessa jornada. Hoje posso dizer que fiz uma imersão de fé e amor, pois foi assim que ela conduziu todo esse processo. Trabalha mos juntas, oramos, rimos e choramos. No final, saímos vencedoras. Agradeço a confiança nas minhas mãos, agradeço em nome de todos os demais pacientes a generosidade de dividires teus pensamentos, teu dia a dia e tua fé.

Quanto orgulho da minha paciente.

Quanto orgulho da minha amiga.

Conta sempre comigo.

Com amor, Carol.”

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Algumas destas orações recebi de seguidores, pessoas queridas e outras estão comigo há muito tempo.

TERÇO DA LIBERTAÇÃO

Início:

“Creio em Deus Pai”

Creio em Deus Pai Todo-Poderoso, criador do céu e da terra; e em Jesus Cristo, seu único filho, Nosso Senhor, que foi concebido pelo poder do Espírito Santo; nasceu da Virgem Maria; padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; desceu à mansão dos mortos, ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus; está sentado à direita de Deus Pai Todo-Poderoso, de onde há de julgar os vivos e os mortos; creio no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne, na vida eterna. Amém

Nas contas grandes:

“Se Jesus me libertar, serei verdadeiramente livre!”

Nas contas menores:

“Jesus tem piedade de mim! Jesus cura-me Jesus salva-me! Jesus liberta-me!”

Final:

“Salve, Rainha”

Salve, Rainha, mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve!

A vós bradamos os degredados filhos de Eva. A vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. Eis,

pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei, e depois deste desterro nos mostrai Jesus, bendito fruto do vosso ventre. Ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria. Rogai por nós, Santa Mãe de Deus. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

ORAÇÃO DE SANTA TEREZINHA PARA CONSEGUIR UMA GRAÇA

“Oh, Santa Terezinha do Menino Jesus, modelo de humildade, confian ça e amor. Do alto dos céus, despeje sobre nós estas rosas que levas em teus braços: a rosa da humildade, para que vençamos nosso orgulho e aceitemos o jugo do Evangelho; a rosa da con fiança, para que nos abandonemos à vontade de Deus e descansemos em Sua Misericórdia; a rosa do amor, para que abrindo nossas almas sem medida à graça realizemos o único fim para o qual Deus nos criou à sua imagem: amar-Lhe e fazer-Lhe amar. Tu que passas em teu céu fazendo o bem na terra, ajuda-me nesta necessidade e concede-me do Senhor o que te peço, se for para glória de Deus e para o bem de minha alma. Amém.” (Rezar um Pai-Nosso)

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ORAÇÃO À SANTA TEREZINHA (OUTRA)

“Minha Santa Terezinha do Menino Jesus, que prometestes enviar uma chuva de rosas sobre o mundo, eu vos peço: realizai em minha vida vossa consoladora promessa. Preciso de uma chuva de graças que lave minha alma nas águas das bênçãos do Pai. Intercedei por mim junto ao nosso Bem-Amado Jesus. Acompanhai-me com vossas orações, aumentai minha confiança na misericórdia divina. Desejo andar passos largos no peque no caminho que trilhastes. Caminho todo feito de dependência e entrega aos desígnios amorosos de Deus.

Alcançai-me a graça de não duvidar do amor que Jesus tem por mim. Ajudai -me a crer diariamente no amparo de Deus sobre a minha vida quando estou aflito, quando estou ansioso, quando estou enfermo, quando me sinto fraco e desencorajado para orar, trabalhar e amar. Concedei-me, da parte de Jesus, o dom da alegria, a capacidade de sorrir e crer, mesmo quando houver escuri dão dentro de mim. Fizestes do amor o objetivo e sentido de vossa breve vida. Enfrentastes com um sorriso todas as provações e nada negastes ao Bom Deus. Que Jesus, vosso amado esposo, esteja sempre comigo e com as pessoas que amo. Atendei-me nesta graça. Com insistência vos peço (fazer o pedido).”

CONVERSA COM JESUS

(Todos os dias durante nove dias)

“Oh! Meu Jesus, em vós depositei toda a minha confiança. Vós sabeis de tudo, meu Pai. És o Senhor do universo, sois o Rei dos Reis. Vós que fizestes o paralítico andar, o morto voltar a viver, o leproso sarar, fazei com que (pedir a graça). Vós que visses minhas angús tias e lágrimas, sabeis de tudo. Divino Amigo, como preciso (pedir a graça com fé).

Convosco, Mestre, dai-me ânimo e alegria para viver. Só de vós espero com fé e confiança (pedir a graça com fé). Fazei, Divino Jesus, que antes de terminar essa conversa que terei convosco durante nove dias, possa eu alcançar essa graça que peço com fé (pedir a graça).

Como gratidão, mando publicar 1.000 orações para que outras pessoas que precisam de vós aprendam a ter fé e confiança na vossa misericórdia. Ilu mine os meus passos assim como o sol ilumina todos os dias o amanhecer.

E testemunho o nosso diálogo, Jesus, tenho confiança em vós. Cada vez mais aumenta minha fé em ti. Obrigada por tudo, Senhor. Agradeço por uma grande graça alcançada. Acredite. Ele existe. E é muito bom!”

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NOSSA SENHORA

“Minha querida Nossa Senhora, em tuas mãos coloco a minha vida e meus planos. Confio que esta semana será maravilhosa e cheia de bênçãos, porque contigo tudo sairá bem. Amém!”

ORAÇÃO

“Senhor Deus, criador do céu e da terra, poderoso é o vosso nome, grande é vossa misericórdia. Em nome do vosso filho Jesus Cristo recorro a vós neste momento para pedir bênçãos para nossas vidas.

ORAÇÃO À SANTA ÁGUEDA

“Oh, gloriosa virgem e mártir Santa Águeda, que, para não trair a fé em Jesus Cristo, preferistes ter os seios arrancados no martírio e miraculo samente curados na prisão, olhai por vossas filhas que cheias de confiança se dirigem a vós. Vós que soubestes se conservar íntegra diante de Deus, liberta-nos da tentação de trocar nossa fé por valores passageiros que nos afastam do Senhor. Jovem que fostes, livrai nossos jovens das drogas, do consumismo, da prostituição e de todo o tipo de exploração. E como dissestes ao vosso torturador: não te envergonhas de mutilar na mulher o que tua mãe te deu para deles tirar o alimento? Livrai-nos de todos os males da mama para que, a cada dia, vivendo como verdadeiras cristãs, possamos dizer convosco: tenho na minha alma os seios íntegros, com os quais nutro todos os meus sentimentos, que desde a infância consagrei a Cristo Jesus. Amém!”

Que a vossa divina luz incida sobre nós. Com vossas mãos, retrai todo o mal, todos os problemas e todos os perigos que estejam ao nosso redor. Que as forças negativas que nos abatem e entristecem se desfaçam ao sopro da vossa bênção. Que vosso poder destrua todas as barreiras que impedem nosso progresso. Que do céu vossas virtudes penetrem em nosso ser, proporcionan do paz, saúde e prosperidade.

Abra, Senhor, nossos caminhos, que nossos passos sejam dirigidos por vós, para que nós não tropecemos na caminhada da vida. Que nosso viver, nosso lar e nosso trabalho sejam por vós abençoados. Entregamo-nos em vossas mãos poderosas, na certeza de que tudo vamos alcançar.

Agradeço em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, amém!”

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ORAÇÃO DA TERÇA-FEIRA

“Pai, eu sei que o Senhor guarda mila gres e planos abençoados para mim. Eu sei também que meu Anjo da Guar da caminha adiante, abre portas e me conecta a pessoas de paz e de bem. Isso torna mais confiante minha caminhada e me faz compreender que tudo na vida tem seu tempo.

Meu coração se enche de esperança porque sei que o Senhor está ao meu lado, minhas orações são ouvidas e que o dia da vitória está próximo. Eu peço, confio, recebo e agradeço em nome do seu filho Jesus, nosso Salvador. Amém!”

ORAÇÃO DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS

“Senhor, fazei de mim um instrumento da vossa paz.

Onde houver ódio, que eu leve o amor.

Onde houver ofensa, que eu leve o perdão.

Onde houver discórdia, que eu leve a união.

Onde houver dúvida, que eu leve a fé.

Onde houver erro, que eu leve a verdade.

ORAÇÃO DA QUARTA-FEIRA

“Pai, traga paz ao meu coração, felici dade ao meu caminho. Fortalece meu espírito. Pousa a tua mão santa sobre a minha ferida e cure qualquer dor, amplie minha consciência para que eu penetre até onde não tenho consegui do e possa ter mais paz.

Que nesse novo dia eu tenha a chance de recomeçar com forças renovadas, que minha fé transborde e o otimismo seja o parceiro durante todo o dia. Guia-me, Senhor, ilumina meus passos, abençoe minhas escolhas e livrai-me de todo mal. Assim eu oro e agradeço em nome do Santo Jesus. Amém!”

Onde houver desespero, que eu leve a esperança. Onde houver tristeza, que eu leve alegria. Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó mestre, fazei que eu procure mais: Consolar que ser consolado. Compreender que ser compreendido. Amar que ser amado. Pois é dando que se recebe. É perdoando que se é perdoado.

E é morrendo que se vive para a vida eterna. Amém!”

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PAPA FRANCISCO

“Esta vida vai passar rápido, não brigue com as pessoas, não critique tanto seu corpo. Não reclame tanto. Não deixe de beijar seus amores. Não se preocupe tanto em deixar a casa impecável. Bens e patrimônios devem ser conquistados para cada um, não se dedique a acumular herança. Deixe os cachorros mais por perto. Não fique guardando as taças. Use os talheres novos. Não economize seu perfume predileto, use-o para passear com você mesmo. Gaste seu tênis predileto, repita suas roupas prediletas, e daí? Se não é errado, por que não ser agora? Por que não dar uma fugida? Por que não orar agora em vez de esperar para orar antes de dormir? Por que não ligar agora? Por que não perdoar agora?

Espera-se muito o Natal, a sexta-feira, o outro ano, quando tiver dinheiro, quando o amor chegar, quando tudo for perfeito. O ser humano não consegue atingir isso porque simplesmente não foi feito para se completar aqui. Aqui é uma oportunidade de aprendizado. Então, aproveite este ensaio de vida e faça o agora... Ame mais, perdoe mais, abrace mais, viva mais intensamente e deixe o resto nas mãos de Deus.”

Suas Ora coes

Convido e abro um espaço muito especial para você registrar aqui as suas orações preferidas.

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ALGUMAS INFOR MAÇÕES SOBRE O CÂNCER

Inca – Instituto Nacional de Câncer

O Instituto Nacional de Câncer (Inca) é o órgão auxiliar do Ministério da Saúde no desenvolvimento e coordenação das ações integradas para a prevenção e o controle do câncer no Brasil. Tais ações compreendem a assistência médico-hospitalar, prestada direta e gratuitamente aos pacientes com câncer como parte dos serviços oferecidos pelo Sistema Único de Saúde, e a atuação em áreas estratégicas, como prevenção e detecção precoce, formação de profissionais especializados, desenvolvimento da pesquisa e geração de informação epidemiológica.

O Instituto coordena vários programas nacionais para o controle do câncer e está equipado com o mais moderno parque público de diagnóstico por imagem da América Latina.

SOBRE O CÂNCER DE MAMA

O câncer de mama é uma doença causada pela multiplicação desordenada de células anormais da mama, que forma um tumor com potencial de invadir outros órgãos. Há vários tipos de câncer de mama. Alguns têm desenvolvimento rápido, enquanto outros crescem lentamente.

A maioria dos casos, quando tratados adequadamente e em tempo oportuno, apresentam bom prognóstico. O câncer de mama também acomete homens, porém é raro, representando apenas 1% do total de casos da doença.

O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento para o câncer de mama em Unidades Hospitalares especializadas. A informação existente aqui pretende apoiar, e não substituir, a consulta médica.

ESTATÍSTICAS

Estimativa de novos casos: 66.280 (2021 - Inca)

Número de mortes: 18.032, sendo 207 homens e 17.825 mulheres (2020 - Atlas de Mortalidade por Câncer - SIM).

O QUE AUMENTA O RISCO?

O câncer de mama não tem somente uma causa. A idade é um dos mais importantes fatores de risco para a doença (quatro em cada cinco casos ocorrem após aos 50 anos).

Na tabela ao lado veja outros fatores que aumentam o risco da doença.

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FATORES AMBIENTAIS E COMPORTAMENTAIS

FATORES DA HISTÓRIA REPRODUTIVA E HORMONAL

Obesidade e sobrepeso

Inatividade física*

Primeira menstruação antes de 12 anos

FATORES GENÉTICOS E HEREDITÁRIOS**

Consumo de bebida alcoólica

Não ter tido filhos

História familiar de câncer de ovário

Exposição frequente a radiações ionizantes para tratamento (radioterapia) ou exames diagnósticos (tomografia, raio-X, mamografia, etc.)

Tabagismohá evidências sugestivas de aumento de risco

Primeira gravidez após os 30 anos Parar de menstruar (menopausa) após os 55 anos Uso de contraceptivos hormonais (estrogênioprogesterona)

Casos de câncer de mama na família, principalmente antes dos 50 anos História familiar de câncer de mama em homens

Ter feito reposição hormonal pós-menopausa, principalmente por mais de cinco anos

Alteração genética, especialmente nos genes BRCA1 e BRCA2

* Não realizar ao menos 150 minutos por semana de atividade física de intensidade moderada. Para mais informações, consulte o Guia de Atividade Física para a população brasileira. **A mulher que possui um ou mais fatores genéticos/hereditários apresenta risco elevado de desenvolver câncer de mama. Apenas 5 a 10% dos casos da doença estão relacionados a esses fatores. Atenção: a presença de um ou mais desses fatores de risco não significa que a mulher necessariamente terá a doença.

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COMO SE PREVENIR

Cerca de 30% dos casos de câncer de mama podem ser evitados com a adoção de hábitos saudáveis, como:

• Praticar atividade física

• Manter o peso corporal

• Evitar o consumo de bebidas alcoólicas

• Amamentar seu bebê o máximo de tempo possível

• Não fumar e evitar o tabagismo passivo.

SINAIS E SINTOMAS

O câncer de mama pode ser percebido em fases iniciais, na maioria dos casos, por meio dos seguintes sinais e sintomas:

• Nódulo (caroço), fixo e geralmente indolor: é a principal manifestação da doença, estando presente em cerca de 90% dos casos quando o câncer é percebido pela própria mulher

• Pele da mama avermelhada, retraída ou parecida com casca de laranja

• Alterações no bico do peito (mamilo)

• Pequenos nódulos nas axilas ou no pescoço

• Saída espontânea de líquido anormal pelos mamilos.

Esses sinais e sintomas devem sempre ser investigados por um médico para que seja avaliado o risco de se tratar de câncer. É importante que a mulher observe suas mamas sempre que possível (no banho, no momento da troca de roupa, etc.), sem técnica específica, valorizando a descoberta casual de pequenas alterações mamárias. Em caso de permanecerem as alterações, ela deve procurar logo os serviços de saúde para avaliação diagnóstica. A postura atenta das mulheres em relação à saúde das mamas é fundamental para a detecção precoce do câncer.

DETECÇÃO PRECOCE

O câncer de mama pode ser detectado em fases iniciais, em grande parte dos casos, aumentando assim a possibilidade de tratamentos menos agressivos e com taxas de sucesso satisfatórias.

Toda mulher, independentemente da idade, deve ser estimulada a conhecer seu corpo para saber o que é e o que não é normal em suas mamas.

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A maior parte dos cânceres de mama é descoberta pela própria mulher. Além disso, o Ministério da Saúde recomenda que a mamografia de rastreamento (exame realizado quando não há sinais nem sintomas suspeitos) seja ofertada para mulheres entre 50 e 69 anos, a cada dois anos. A recomendação brasileira segue a orientação da Organização Mundial da Saúde e de países que adotam o rastreamento mamográfico.

DIAGNÓSTICO

Um nódulo ou outro sintoma suspeito nas mamas deve ser investigado para confirmar se é ou não câncer. Para a investigação, além do exame clínico, exames de imagem podem ser recomendados, como mamografia, ultrassonografia ou ressonância magnética.

A confirmação diagnóstica só é feita, porém, por meio da biópsia, técnica que consiste na retirada de um fragmento do nódulo ou da lesão suspeita por meio de punções (extração por agulha) ou de uma pequena cirurgia. O material retirado é analisado pelo patologista para a definição do diagnóstico.

TRATAMENTO

Muitos avanços vêm ocorrendo no tratamento do câncer de mama nas últimas décadas. Há hoje mais conhecimento sobre as variadas formas de apresentação da doença e diversas terapêuticas estão disponíveis. O tratamento do câncer de mama depende da fase em que a doença se encontra e do tipo do tumor. Pode incluir cirurgia, radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e terapia biológica (terapia-alvo).

Quando a doença é diagnosticada no início, o tratamento tem maior potencial curativo. No caso de a doença já possuir metástases (quando o câncer se espalha para outros órgãos), o tratamento busca prolongar a sobrevida e melhorar a qualidade dela.

Fonte: Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão do Ministério da Saúde www.inca.gov.br

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MUITO PARA VIVER

CLAUDIA BARTELLE

COORDENAÇÃO EDITORIAL

Simone M. Pontes

EDIÇÃO

Otaviano Guedes

CAPA E PROJETO GRÁFICO

Claudio Franco | Desenho Design

DIAGRAMAÇÃO/FINALIZAÇÃO Desenho Design

REVISÃO

Flávio Dotti Cesa

FOTO CAPA/CONTRACAPA

Eduardo Carneiro

FOTOS: Páginas 02/12/256 - Gabriel Bertoncel Páginas 210/212 - Eduardo Carneiro Demais imagens: arquivo pessoal e Getty Images

Todos os direitos reservados, no Brasil, por TAB Marketing Editorial. Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

Felicíssimo de Azevedo, 1020/701 - Porto Alegre - CEP: 90540-110 Fone: 55-51-3276.1900 - www.tabeditora.com

MUITO MUITO MUITO MUITO MUITO MUITO

MUITO

MUITO MUITO MUITO MUITO

PARA VIVER

MUITO

Todos sofremos, mas somos educados a esconder nosso sofrimento. Colocamos as mãos no rosto, escondemos as lágrimas, choramos a portas fechadas. Somos ensinados que nosso sofrimento é algo íntimo e, assim, privamos os outros de entenderem nossa dor. Privamos outras pessoas de serem ajudadas com nosso sofrimento. De não se sentirem sozinhas.

A dor nos põe em contato com novas partes do que somos. Nos revela para nós mesmos. Admiro a grandeza de quem tem coragem de se expor para que outras pessoas possam se sentir acolhidas, acompanhadas. Quando falamos do nosso sofrimento damos a chance para que outros entendam como se desenrolam os processos do solitário desespero humano.

Leio o relato da Claudia e me emociono como se estivesse ao lado dela. A acompanhamos nas reflexões mais intensas e íntimas. Por mais que estivesse rodeada de anjos e acompanhada pela fé, Claudia escreve seu diário sozinha: tem medos, angústias e extraordinárias vitórias tão particulares e, ao mesmo tempo, tão universais.

O leitor se emociona, torce e comemora com ela.

“Por que eu?”, nos perguntamos quando o chão se abre embaixo de nós. “E se eu não aguentar?”, perguntamos para a vida. O sofrimento serve para nos lembrar do que realmente importa na vida. E, superado, serve para ajudar outros a superarem de maneira mais tranquila. Não menos dolorosa, talvez; mas, pelo menos, acompanhada.

Existe um coração aberto neste livro, que convida o leitor a entrar e diz: “Você nunca vai estar sozinho. Você tem ainda muito para viver. Vem comigo. Te explico no caminho”.

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