NO MIOLO DO BAGULHO (Dênis Petuco)

Page 40

sociologia, diante de um sem número de manifestações de emergência de distintas expressões culturais arredias ou mesmo descoladas do mundo do trabalho. Para Robert Castel (2003), a questão social na contemporaneidade é a questão salarial. Não há um fim do emprego, e o trabalho segue sendo uma categoria central: O trabalho, como se verificou ao longo deste percurso, é mais que emprego, e portanto, o não-trabalho é mais que desemprego, o que não é dizer pouco. Também a característica mais perturbadora da situação atual é, sem dúvida, o reaparecimento de um perfil de “trabalhadores sem trabalho” que Hannah Arendt evocava, os quais, literalmente, ocupam na sociedade um lugar de supranumerários, de “inúteis para o mundo”. (CASTEL, 2003, p. 496)

Castel não está dourando pílula. O trabalho segue uma categoria central, não porque sua condição siga com o mesmo estatuto que teve ao longo do Pacto Fordista, mas justamente pelo valor que adquire um produto que se torna escasso no mercado. Em sua crônica do salário, o sociólogo francês demonstra o quanto o emprego é não só uma forma de se garantir a sobrevivência, mas mesmo uma forma de existir socialmente. Do mesmo modo, o desemprego não significa tão somente a impossibilidade de sustentar-se por seus próprios meios; diante do desaparecimento de políticas de compensação, estar desempregado significa emergir como público-alvo de políticas de controle que inscrevem o sujeito numa outra condição, num outro estatuto social: Para essas novas populações, as políticas de inserção vão precisar inventar novas tecnologias de intervenção. Vão situar-se aquém das ambições das políticas integradoras universalistas, mas também são distintas das ações particularistas com objetivo reparador, corretivo e assistencial da ajuda clássica. Aparecem numa conjuntura específica em que, no fim dos anos 70, começa a se abrir uma zona de turbulência na sociedade salarial. Será que estão a altura desta perturbação? (CASTEL, 2003, p. 542)

Castel lança uma pergunta, que encontra diferentes respostas. Para muitos, trata-se de garantir a universalização das políticas públicas capazes de oferecer suporte aos supranumerários; para outros, é mais interessante que se reeditem os debates seculares (acerca dos quais Foucault tanto escreveu), em torno da definição do público-alvo das políticas sociais. Quem é o pobre que merece o benefício das políticas de saúde, renda

40


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.