Saiba+ - Edição Março de 2014

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Restaurantes sobre rodas ganham espaço entre jovens

Desde 2006

20 de março de 2014

Divulgação

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Faculdade de Jornalismo - Puc Campinas

Campinas registra 3 reclamações por dia contra planos de saúde Segundo levantamento da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as reclamações sobre planos de saúde atingiram 1.003 registros em 2013, contra 840 em 2012, um crescimento de 20%, que envolve todos os 21 convênios que atuam na cidade. Os motivos mais frequentes são a falta de cumprimento de contrato, demora no atendimento e os reajustes nas mensalidades. O presidente do Conselho Municipal de Saúde de Campinas, Paulo Mariante, acredita, porém, que o número de usuários lesados é superior ao registrado pela agência e critica a forma como a ANS administra as reclamações. Pág. 5 Foto: Livro Campinas século XX - 100 anos de história

50 anos de um período negro

Número de jornalistas sem vínculo empregatício chega a 61% em agências Pág. 4

Demolição do Teatro Municipal Carlos Gomes, em Campinas, no ano de 1965

A série Campinas 240 Anos resgata aspectos marcantes vividos pela cidade na época do Golpe Militar que completa 50 anos em 2014. O Saiba+ ouviu militantes contrários à ditadura, jornalistas e especialistas em história. Pág. 8

MPF fecha nove rádios em Campinas Rádios não legalizadas dão espaço à liberdade de expressão, mas sofrem interdição pelo Ministério Público por não possuírem concessão de serviço expedida pelo Ministério das Comunicações e licença para operar a radiofrequência atribuída pela Anatel. A justificativa para o fechamento, contestada por especialistas, é que elas prejudicam a atividade de aviões em Viracopos. Pág. 6

Usuários reclamam da falta de opções para aproveitar Passe-Lazer Pág. 6

Carros alegóricos sem reaproveitamento geram riscos em área ferroviária A área da estação ferroviária de Campinas se transformou em depósito para carros alegóricos utilizados nos carnavais de 2013 e 2014. O abandono gera riscos de perda dos materiais que, deteriorados, não conseguem ser reaproveitados pelas escolas de samba, além de criar entulhos e água parada, potenciais áreas de proliferação do mosquito da dengue. Pág. 3 Foto: Gabriel Luchetti

Foto: Isabelle Granjeiro

Rádio Muda, mantida por alunos da Unicamp, foi fechada

Alegorias carnavalescas recém-abandonadas em área da Estação Ferroviária de Campinas


Editorial

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RÁPIDAS

CARTA AO LEITOR

Começa campanha de vacina contra o HPV Até o dia 10 de abril, Campinas realiza a campanha de vacinação contra o Papiloma Vírus Humano (HPV) em meninas de 11 a 13 anos de idade. A vacina tem como objetivo prevenir as mulheres do câncer de colo de útero e é oferecida nos 63 centros de saúde. A meta é imunizar 25 mil garotas. Para receber a vacina, é preciso apresentar o cartão de vacinação e o documento de identidade.

sta edição do Saiba+ é produzida pelos alunos de Jornalismo da turma 42 da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), e traz na série “Campinas 240 anos”, uma retrospectiva do Golpe Militar de 64, que completa 50 anos em 2014. Já quando os assuntos são empreendedorismo e gastronomia, uma reportagem fala sobre os restaurantes sobre rodas, que conquistam cada vez mais espaço e chamam a atenção dos consumidores. Em relação ao quadro atual do mercado de trabalho, a “Pejotização”, ou seja, a contratação por emissão de notas fiscais referentes à “Pessoa Jurídica”, faz-se muito presente e a reportagem indica quais as vantagens e desvantagens para as empresas e profissionais com este modelo de trabalho. O transporte na cidade ainda apresenta falhas, e é um dos assuntos abordados. Uma das editorias mostra o caso específico dos alunos do Cotuca, que após terem as aulas transferidas para a Unicamp, pedem melhorias no transporte oferecido, além da falta de planejamento de atividades que justifiquem os propósitos do Passe-Lazer. Nesta edição, o leitor ainda poderá ficar por dentro de outros assuntos importantes como: o descaso com os carros alegóricos que estão abandonados na estação ferroviária da cidade; o espaço à liberdade de expressão que as rádios livres oferecem, e a apreensão de nove dessas emissoras existentes em Campinas e até mesmo as diferenças entre a assistência oferecida pelo SUS e pelos sistemas de saúde particulares, que apresenta dificuldades no atendimento. Boa leitura!

Documentarista lança filme sobre o Guarani Para os torcedores do Guarani e fãs do futebol, será lançado no dia 27 de março o longa-metragem “Bugrinos”, dirigido por Samir Cheida. O filme de 1h45 conta a história do clube por meio de depoimentos dos grandes nomes que passaram pelo time, como Dorival, destaque em 1965, João Paulo, o grande ponta-esquerda revelado em 1986, e Amoroso, uma das maiores revelações do clube. O filme será exibido no dia 27 de março e 2 de abril no Museu da Imagem e do Som de Campinas (MIS), às 20h, com entrada gratuita. Já no dia 28 de março, o longa-metragem estará em cartaz no Memorial do Guarani, às 19h. No dia 29 de março, às 18h. No dia 4 de abril, às 19h e no dia 5, será às 17h. Nessas datas, para assistir ao vídeo, será preciso pagar R$ 30,00, com direito a levar para casa uma cópia do filme. Cópias do documentário também podem ser adquiridas na loja do Guarani, no site oficial do time e nas bancas de jornal da cidade. Foto: Divulgação

Cena do filme “Bugrinos” com o jogador Amoroso

Inscrições abertas para a 6ª ONHB Estão abertas as inscrições até o dia 20 de abril para a 6ª edição da Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB), promovida por docentes e pós-graduandos de História da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Podem se inscrever professores de História e alunos do 8° ano do Ensino Fundamental até o 3° ano do Ensino Médio e também alunos do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), cursos profissionalizantes e supletivos, desde que estejam nas séries citadas ou equivalentes. A primeira etapa ocorre no dia 28 de abril e seguirá pelas próximas cinco semanas. Para participar, basta realizar a inscrição por meio da página http://www.olimpiadadehistoria.com. br em que também consta o regulamento oficial.

Expediente Jornal laboratório produzido por alunos da Faculdade de Jornalismo da PUC-Campinas. Centro de Comunicação e Linguagem (CLC): Diretor: Rogério Bazi; Diretora-Adjunta: Cláudia de Cillo; Diretor da Faculdade: Lindolfo Alexandre de Souza. Tiragem: 2 mil. Impressão: Gráfica e Editora Z Professor responsável: Fabiano Ormaneze (Mtb 48.375). Edição: Gabriela Meneguim Edição de capa: Marcella Contrucci Diagramação: Bárbara Mangieri e Mariana Ignácio

E

CRÔNICA

“Longe de casa, há mais de uma semana...” Beatrice Costa Estudante de Jornalismo

Mais algumas garfadas e ela estará pronta para conversar. Comida de mãe é sempre mais gostosa, todo mundo sabe. As últimas semanas longe de casa não foram nada fáceis. Lavar e passar as roupas, manter o apartamento limpo e organizado e, ainda por cima, cozinhar a própria comida! É, morar fora de casa com certeza parecia mais fácil quando ela só pensava na liberdade que teria. “E o que você tá achando da faculdade, filha?” - interpelou a mãe. “Tá tudo ótimo, mãe”respondeu. “Tá conseguindo manter tudo organizado?” “Tô, mãe, relaxa”. “Olha lá, hein, lembrase do que combinamos? Eu vou aparecer lá de surpresa pra ver se tá mesmo”. “Ai, mãe, tá, tô fazendo tudo direito. Me deixa”- agora num tom irritado. “Vou pro quarto, tá? Preciso descansar”. Irritada, joga seu corpo sobre a cama, exatamente como sua mãe odeia e pensa que precisa mesmo é descansar o corpo e a mente. Aí o bicho pega: não consegue desligar. A cabeça fica a mil pensando nas últimas experiências e o sentimento é misto demais para conseguir classificá-lo como bom ou ruim. Vira de um lado para o outro, até que o cheirinho de roupa de cama que só nossa casa tem faz com que adormeça. Num sono tranquilo, sonhos bons preenchem sua cabeça. TRIIIIIM! Toca o despertador e ela corre se arrumar. É dia de rever os amigos da cidade em

que crescera e botar o papo em dia. Conseguir arranjar a roupa ideal fica ainda mais difícil quando metade do seu guarda-roupa reside noutra cidade. Quando chega do encontro, mais uma novidade: sua mãe já não a espera acordada. E isso faz com que ela se sinta vitoriosa por alguns minutos, mas a verdade é que naquela noite era ela quem queria um beijo de boa noite. TRIIIIM! Já é domingo, dia oficial de ficar com a família e, a partir de agora, dia de voltar para a cidade onde estuda. Começa a arrumar a mala e aquele sentimento confuso aparece de novo. “Por que os finais de semana tem que durar tão pouco?”. Se visitar o núcleo familiar já não é tarefa simples, imagine enfrentar todo aquele questionamento que só tios e tias são capazes de fazer: “Como está a faculdade? E os namorados? Nada de aprontar muito, hein?”. Desnecessário. Pelo menos ajuda a ter vontade de ir embora, correr para um canto em que seu espaço é respeitado (ou mais ou menos, se você divide com um amigo). Beijos e abraços, lá está ela, acenando da janelinha do ônibus. Ainda não consegue definir o que sente. Tem saudade, irritação, cansaço, diversão e mais saudade. E novidade. E as coisas de sempre também. O celular dela vibra: duas mensagens: “Filha, já estamos com saudade. Avise quando chegar”. “Amiga, cadê você? Vem logo pra casa, vamos sair hoje?”.


Meio Ambiente

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Estação ferroviária vira cemitério de alegorias Carros do Carnaval de 2013 não conseguiram ser reaproveitados; água parada e entulho dividem espaço Gabriel Luchetti Carcaças de alegorias utilizadas pelas escolas de samba de Campinas em 2013 estão esquecidas, no meio do mato, em terreno atrás da antiga estação ferroviária. A elas, já se juntaram também metade dos carros que desfilaram neste ano, transformando o lugar num verdadeiro cemitério. As peças estão sob a chuva, sol, vento e correm o risco de não poderem ser reaproveitados, além de serem potenciais criadouros de animais peçonhentos e da dengue. Os carros são avaliados em aproximadamente R$ 5 mil cada, e foram confeccionados com a verba de R$ 84 mil dada a cada uma das agremiações da cidade para o Carnaval de 2014. Como nem todas possuem espaço próprio para abrigar as alegorias, elas acabam por ser colocadas no terreno – considerado, pela Prefeitura, um lugar provisório. Até o ano passado, os carros do Carnaval ficavam guardados no Barracão de Lemos, também na antiga estação ferroviária, mas que precisou passar por uma reforma no telhado. A proposta era que os carros ficassem por pouco tempo no terreno onde estão, somente até o final do conserto. No entanto, a Prefeitura decidiu abrigar no local os ensaios da Orquesta Sinfônica. Em abril de 2013, a Prefeitura concedeu um novo barracão, também na estação, com a finalidade de abrigar os carros alegóricos, mas até hoje eles continuam abandonados. Apenas uma das 11 escolas de samba está com os carros guardados no barracão. Quando questionado sobre o motivo que as outras alegorias de 2014 não terem ido direto para o barracão, Edson Jóia, presidente da Liga das Escolas de Samba de Campinas (Lesca), informa que os carros precisam primeiro ser desmontados para depois transportados: “É preciso retirar as esculturas, guardar e analisar o que vai poder ser reaproveitado, sem contar as que foram vendidas para outras cidades e só depois que vão

ser levados para o barracão”. Sobre o prazo para isso acontecer, o presidente da Lesca afirma que deve ser em breve: “Os carnavalescos estão descansando do Carnaval ainda, mas logo vamos ter uma reunião para estabelecer uma data de desmonte da estrutura de todas as alegorias para dessa forma serem transportadas até o barracão”. A respeito do descuido dos carros estarem expostos ao sol e chuva, Jóia disse

caso. Se ficarem aqui por muito tempo vão virar destroços iguais alguns carros do Carnaval de 2013 e não vai ter como serem reformados. É um dinheiro gasto que poderia ser reaproveitado se fosse cuidado de forma correta”. Fantasias e adereços carnavalescos também são encontrados jogados em meio ao lixo e entulhos que dividem espaço com as alegorias. Muito desses entulhos e até alguns carros alegóri-

Fotos: Gabriel Luchetti

Carcaças de carros de 2013 estão sem destino na estação

Após o desfile nos Amarais, alegorias das escolas foram parar em área de ferrovia, ainda sem previsão de retirada

que, como faz pouco tempo que estão lá, não há perigo de estragarem: “O Carnaval acabou recentemente, os carros não estão há muito tempo expostos ao sol e chuva. É algo recente, então acaba nem danificando as alegorias”. As estruturas mais antigas, utilizadas em 2013, no entanto, já estão em situação que impede o reaproveitamento. A prova disso é que nem todas as alegorias de 2013 foram reformadas e utilizadas no desfile deste ano. O gari Pedro Augusto, que trabalha na limpeza do terreno ferroviário, diz que é um descaso. “O Carnaval terminou e os carros já voltaram para o terreno junto ao mato alto e entulho, só que, por enquanto, ainda estão novos. Isso é um des-

cos acumulam água parada de chuvas das últimas semanas e acabam se tornando foco de dengue, o que é um perigo para a população dos arredores. A Prefeitura de Campinas, por meio da assessoria de imprensa, informou que as alegorias são de responsabilidade das escolas de samba e que é função delas fazerem a retirada dos carros alegóricos, já que o barracão destinado a essa finalidade foi entregue ainda no ano passado. Em relação à água parada que se acumula, a assessoria diz que a Prefeitura sempre manda grupo da vigilância epidemiológica ao local e, caso encontre algum foco de dengue, as escolas de samba são alertadas para fazer limpeza no local.

Sucata e restos podem se tornar criadouros da dengue e insetos


Mercado

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Terceirização já atinge 25% das redações

Em agências de comunicação e outros segmentos, número sobe para 61% segundo dados da Fenaj Luis Fernando Moreira

Para as empresas, um bom negócio. Para os jornalistas, um prejuízo que, talvez, só seja sentido mais à frente, na hora da aposentadoria ou numa necessidade, como um afastamento por doença. O número de jornalistas que trabalham sem carteira assinada no País, segundo pesquisa da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), atinge 25% dos profissionais em redações. Já em agências e outros segmentos fora da mídia, esse valor é de 61%. A prática já ganhou até um nome: “pejotização”, uma referência ao fato de que a maioria emite notas fiscais pelos serviços prestados, transformando-se em “pessoa jurídica” (PJ). A vantagem para as empresas é uma diminuição nos gastos com benefícios trabalhistas previstos em Convenção Coletiva de Trabalho, como aviso prévio, FGTS e a sua multa rescisória de 40%, décimo terceiro salário, férias acrescidas de um terço, Descanso Semanal Remunerado, entre outros. Para alguns profissionais, no entanto, este tipo de contrato pode ser considerado positivo pela aparência de liberdade e pelo maior valor da hora trabalhada. A empresária Luciana Dantas, dona de uma agência de comunicação, já trabalhou em uma agência de assessoria de imprensa como pessoa jurídica. Segundo ela, tinha consciência das condições do contrato com a empresa. “O grande problema é que existem os vínculos trabalhistas.

veja a diferença entre ser pj e clt

Eu estava ciente, mas muita gente não põe tudo na balança”. Mesmo assim, ela afirma que teria optado por um emprego como CLT se tivesse a chance: “A única vantagem de ser PJ é poder prestar serviço para várias empresas ao mesmo tempo. Eu só aceitei pois não tinha outra oferta na época. Certamente optaria pelo CLT, pois os benefícios fizeram falta depois”. A pressão dos empresários,

que não dão outra opção para o funcionário, também contribui para o fenômeno, afirma o diretor da unidade campineira do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo (SJSP), Agildo Nogueira. “É difícil para o sindicato combater a pejotização e defender os direitos do trabalhador quando muitas vezes o próprio empregado, por medo do desemprego e sofrendo pressão do patrão, não quer

reivindicá-los”. Nogueira afirma ainda que a sensação de liberdade que esse tipo de relacionamento gera para o empregado é pura ilusão. “É claro que depende de cada caso, pode ser que a empresa faça tudo direitinho e os dois fiquem felizes, mas não é o que acontece na maior parte das vezes, pois embora o trabalhador esteja como PJ, ele vive a jornada de trabalho de CLT”. O jornalista Marcelo Furtado já trabalhou como pessoa jurídica para uma agência de comunicação, e afirma que embora soubesse das condições do contrato com a emFuncionários podem ser responsabilidade de outra empresa presa, não tinha noção de que É importante não confun- vidade base de uma empresa. de lei, de autoria do deputa- as exigências que sofria eram dir o fenômeno da “pejotiPor exemplo, hoje, uma do Sandro Mabel (PL/GO) irregulares. “Se eu soubesse zação” com a prática de ter- agência bancária pode ter- visa permitir essa prática, e ceirização da atividade-fim. ceirizar um serviço de lim- vem sendo combatido pelo A “pejotização” acontece peza para trabalhar em sua Sindicato dos Jornalistas e quando a pessoa não empre- sede, no entanto, não pode pela Fenaj, que, no ano pasgada que prestou um serviço fazer o mesmo com um pro- sado, apoiaram manifestacontinua prestando o mes- fissional especializado na ati- ções contra a aprovação do mo serviço sob a fachada vidade-fim da empresa, ou projeto. O projeto foi retirade “pessoa jurídica”, ou seja, seja, um bancário. Caso pu- do da pauta de votação da como se fosse uma empresa. desse, seria uma forma de di- Câmara dos Deputados, mas Já a terceirização é caracte- minuir os custos da empresa não arquivado, o que signifirizada pela contratação de ao substituir a contratação ca que pode voltar à pauta a terceiros para realizar a ati- de uma pessoa. Um projeto qualquer momento.

Pejotização e terceirização trazem exigências diferentes

dos meus direitos na época, poderia me defender melhor na justiça. Eu tinha medo de largar o emprego e por isso não reclamava.” Vantagens e perigos De acordo com o contador Antônio Alves, o salário do profissional que trabalha como PJ deve ser de 20% a 30% maior que o salário do profissional com carteira assinada para compensar a ausência de todos os benefícios. A tabela ao lado mostra uma simulação em que as diferenças podem ser avaliadas para o empregador e o empregado. Nada disso importa, no entanto, se o trabalhador for contratado como PJ e estiver cumprindo a jornada de um CLT. É o que explica o advogado trabalhista Denis Pedroso: “Todo trabalho realizado de forma pessoal, subordinada, contínua e que gera gastos é um vínculo empregatício e, mesmo que por intermédio de uma pessoa jurídica, estaremos diante de um contrato de trabalho regido pela CLT”. Neste caso, o especialista em direito do trabalho explica que a prática é considerada ilícita e, portanto, imoral, o que prejudica tanto o empregador, quanto o empregado. Portanto, quando dentro das normas legais, o contrato PJ oferece ganhos imediatos e maiores no curto prazo. Já o CLT, embora não resulte em ganhos imediatos tão atraentes, oferece mais segurança ao trabalhador pelos benefícios trabalhistas e da contagem obrigatória do tempo de serviço perante a Previdência Social. Para Denis Pedroso, o cenário ideal seria “a prestação dos serviços para diversos tomadores, de forma diversificada e pulverizada, em que a rescisão de uma relação jurídica não afetasse o equilíbrio financeiro do prestador”.

“ Muitas vezes o próprio empregado, por medo do desemprego e sofrendo pressão do patrão, não quer reivindicar seus direitos.” Agildo Nogueira


Saúde

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Planos de saúde recebem 3 queixas/dia

Entre 2012 e o ano passado, crescimento das reclamações atingiu 20% segundo ANS Arthur Menicucci

Campinas registra, em média, três reclamações por dia contra planos de saúde, segundo levantamento feito, a pedido do jornal Saiba +, pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O balanço indica, ainda, que o número de queixas registradas em 2013 na cidade aumentou 20% em relação ao ano anterior, 2012. Foram 1003 reclamações ao longo do ano passado contra 840 em 2012. A agência registrou cerca de 85 protestos por mês em 2013. A cobertura dos planos de saúde é o tema com maior número de reclamações, segundo a ANS. No ano passado, foram registradas 709 queixas. O descumprimento do contrato e regulamentos teve 220 reclamações, seguido por mensalidade e reajustes, com 69. Ao todo, 21 planos de saúde estão registrados em Campinas, segundo levantamento do Procon. Com o aumento no número de queixas, a ANS passou a, além de receber as denúncias, mediar os conflitos entre os pacientes e as operadoras de saúde. Segundo a agência, desde 19 de março deste ano, as reclamações de beneficiários sobre reajustes indevidos, quebra de contratos, rescisão unilateral de contrato e alteração de rede credenciada são acatadas pela agência e é

em nota, o órgão. Para o presidente do Conselho Municipal de Saúde, Paulo Mariante, o número de reclamações registradas pela ANS não reflete o total de pessoas afetadas. “É provável que o número real seja maior, uma vez que ouvimos de muitas pessoas usuárias de planos de saúde que os serviços de atendimento ao cliente têm pouca resolutividade”, afirmou. Mariante critica, ainda, a forma como a agência é dirigida. “ANS sequer tem uma estrutura adequada para tais fiscalizações, e o que é pior, tem dirigentes com relações pouco transparentes com estes mesmos planos de saúde”. Segundo ele, “isso tudo acaba resultando em pouca eficácia neste trabalho de fiscalização”. O aposentado Verneles Alves da Silva, de 69 anos, está há um ano e seis meses aguardando a liberação para fazer uma cirurgia de carótida após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) em novembro de 2012. O usuário do plano do Hospital Beneficência Portuguesa teve de utilizar o serviço do Hospital da Unicamp para conseguir tratamento. A mulher do aposentado, Cleusa Salin Alves da Silva, 67 anos, critica a falta de atenção que o marido recebeu e relata que em nenhum momento deixou de reivin-

“ Tivemos a sorte de conseguir que o tratamento dele fosse feito de outra forma, mas e os que não têm essa opção?” Cleusa Salin Alves dado um prazo para que os planos de saúde resolvam. “Ao serem notificadas eletronicamente pela ANS sobre a queixa do beneficiário, as operadoras deverão resolver o problema do consumidor em até dez dias úteis, contados a partir do primeiro dia após o recebimento da aviso”, explicou,

dicar os direitos. “Depois que ele [Verneles] passou pelos exames e o médico pediu a cirurgia de emergência, fiquei em cima do plano, diariamente, para que ela fosse marcada”, explicou. Verneles da Silva estava em Santos (SP) quando sofreu o AVC. Ao ser socorri-

Fotos: Larissa Alves

Verneles e mulher, Cleusa; o aposentado procurou o serviço público no lugar do convênio

do pela mulher, o aposentado foi encaminhado para o Hospital Ana Costa, na cidade do litoral. “Por termos um plano que cobre atendimento em todo o país, achamos que ele iria ficar internado em Santos, mas fomos avisados que teria de ser transferido”, relatou Cleusa. Ao vir para Campinas, Silva ficou cinco dias internado no Hospital Metropolitano, que atende conveniados do Beneficência Portuguesa. Segundo a mulher do paciente, foi solicitada uma cirurgia de emergência. “Depois da internação, o médico que o atendeu fez os exames e pediu uma cirurgia de emergência. Nunca imaginamos que iria demorar tanto.” De acordo com Cleusa, após aproximadamente um mês, em janeiro de 2013, a família foi buscar ajuda no Hospital da Unicamp. “Fi-

zemos os exames lá e eles agendaram a cirurgia, nem acreditamos”. Segundo ela, em agosto o marido foi operado. Refém do descaso “Fico imaginando quem não consegue arrumar uma ajuda extra e depende exclusivamente dos planos de saúde”, disse a mulher do paciente. Segundo ela, buscar a Unicamp foi o que resolveu o problema de saúde do marido. “Nós tivemos a sorte de conseguir que o tratamento dele fosse feito de outra forma, mas e os que não têm essa opção?”, refletiu. Segundo ela, o pedido de cirurgia pelo convênio ainda não foi liberado. “Sempre que vou ao hospital, vejo se o pedido foi respondido. A única resposta que recebo, há mais de um ano, é que temos que aguardar”. A assessoria do Hospi-

tal Beneficência Portuguesa de Campinas não informou quais os prazos para agendamento de cirurgias de emergência e nem se posicionou sobre o caso do paciente Verneles da Silva. O que fazer? A recomendação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em casos semelhantes, é que o usuário que for lesado por algum procedimento da operadora do plano deve oficializar a situação junto ao plano de saúde, informando o médico, a clínica e a data. Se não houver retorno, o segundo passo é informar a ANS, por meio de telefone ou e-mail, incluindo a oficialização enviada ao plano. Em casos de urgência, a OAB orienta o conveniado a procurar um advogado que atue na área e entrar com medida na Justiça para ser atendido.


Cotidiano

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MP fecha 9 rádios não legalizadas na cidade

Alegação, que causa controvérsia, é que emissoras teriam atrapalhado 23 pousos e decolagens no Aeroporto de Viracopos

Isabelle Grangeiro

Nove rádios não legalizadas de baixa potência foram alvo de buscas e apreensões feitas pelo Ministério Público em Campinas no mês de fevereiro, entre elas está a Rádio Muda, mantida por estudantes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), há 30 anos. As emissoras não possuem a concessão do Ministério das Comunicações e licença para operar a radiofrequência atribuída pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O alcance de seu sinal é restrito e usam espaços vazios do dial para ir ao ar. Segundo a nota de esclarecimento do Ministério Público Federal havia, até o fim de fevereiro, 23 Relatórios de Perigo feitos por pilotos de aviação comercial sobre a interferência de sinais de rádios não legalizadas, durante pousos e decolagens no Aeroporto Internacional de Viracopos. Essa é a justificativa oficial para as apreensões dos aparelhos e o fechamento das rádios. “O Ministério Público está levando o juiz ao erro com essas afirmações de que podem, ou poderiam causar danos, que é o que poderia legitimar uma ação judicial, e na rea-

lidade não há nenhum laudo pericial, algum documento seja da própria Anatel ou da Infraero que aponte a materialidade de rádio interferência. O fechamento das rádios é uma questão política, não técnica”, afirma Jerry de Oliveira, membro do Movimento das Rádios Comunitárias Brasileiras. Nos últimos 15 anos foram protocoladas 600 concessões de rádios comunitárias em toda Região Administrativa de Campinas que compreende 98 municípios, mas apenas 64 foram autorizadas. Para Oliveira, a não autorização se dá devido ao descaso do Estado. “O Ministério das Comunicações tem apenas cinco funcionários pra cuidar de todas as rádios do Brasil. Então, a maioria entra no ar irregularmente porque não consegue ver uma perspectiva em curto ou médio prazo para que essas outorgas sejam autorizadas.” A demora do Ministério fere a legislação. “Alei é bem clara: um pedido de qualquer solicitação para o Estado deve ser respondido em 180 dias. Existem rádios que estão aguardando há mais de 10 anos. Não há uma política do estado em relação à garantia da liberdade de expressão e o funcionamento dessas rádios. A rigorosidade do processo de

outorga faz com que muitas pessoas fiquem desacreditadas em buscar essa concessão.” A criminalização das rádios não legalizadas de baixa potência é regulamentada pelo Código Brasileiro de Telecomunicações que prevê multa e detenção para quem montar um rádio de forma ilegal. As leis estabelecidas pelo Ministério da Comunicação não se adaptam com alguns tratados internacionais, aos quais o Brasil é signatário, como o da liberdade da expressão e o tradado do São José da Costa Rica, que diz que não deve haver controle de cerceamento da liberdade de expressão por meio do cerceamento das correntes eletromagnéticas. “O fechamento das rádios é uma tentativa do Estado de limitar a liberdade de expressão, então nós entendemos como legítima, essas emissoras funcionarem sem a autorização tendo em vista a burocracia do Estado em conceder as concessões”, argumenta Oliveira. Embora o Ministério Público Federal atribua o fechamento das rádios a um suposto perigo para a comunicação com aeronaves, o Serviço Regional de Proteção ao Vôo de São Paulo, afirma que

Foto: Isabelle Grangeiro

Rádio Muda foi apreendida dia 23/02 após resistência de estudantes

desconhece a existência dos 23 registros de interferência. Segundo Jerry de Oliveira, a interferência das rádios de baixa potência não legalizadas no pouso e decolagem de aviões não é recorrente, porque atualmente as emissoras usam o dispositivo chamado Phase-Locked Loop (PLL), que faz com que as frequências sejam fixas, sem a condição de fugir da frequência original. O engenheiro de Sistemas e Soluções da Diretoria de Redes Convergentes do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), Carlos Henrique Rodrigues de Oliveira, afirma que, mesmo com o dispositivo PLL, ainda é possível a

ocorrência de interferência das rádios. “PLL é um dispositivo eletrônico utilizado para proporcionar estabilidade e controle digital da frequência. A interferência ocasionada por emissoras não autorizadas ocorre em função da emissão fora da faixa de frequências”, explica. De acordo com o engenheiro, isso normalmente ocorre porque são utilizados equipamentos de baixa qualidade, que não passaram por testes de certificação e não foram homologados pela Anatel. Sobre a demora para regularizar rádios e pedidos de concessão, o Ministério das Comunicações não se manifestou sobre o assunto até o fechamento desta edição.

Transporte

Falta opção de destino para usar Passe-Lazer

Durante dois domingos do mês, usuário do transporte público paga metade da passagem, mas faltam alternativas para se divertir Felipe Cifarelli

Os campineiros passam a ter desconto de 50% no valor da passagem de ônibus em dois domingos do mês. O benefício recebeu o nome de Passe-Lazer, mas os usuários reclamam da falta de destino. “São poucas as opções de lazer em Campinas, principalmente quando falamos em áreas, espaço, convívio”, ressalta o geógrafo Tobias de Oliveira, de 26 anos. “Os espaços de convívio não são mais priorizados em políticas públicas municipais e estaduais, dão lugar a precarização dessas áreas”. “Não adianta dar a passagem na metade do preço se não tem pra onde ir”, diz a emprega doméstica Fátima da Silva, de 47 anos. “Temos que visitar o bondinho da Lagoa do Taquaral todos os domingos?”, pergunta,

fazendo referência ao cartaz-divulgação do programa Passe-Lazer, espalhado pelos ônibus e terminais. No cartaz, a Prefeitura dá uma dica: “Aproveite o Passe Lazer duas vezes neste mês para visitar importantes pontos turísticos da nossa cidade e curtir o tradicional passeio de Bondinho na Lagoa do Taquaral”. No entanto, apenas dois dos três veículos estão em funcionamento. Segundo a Secretaria de Cultura da Prefeitura de Campinas, um dos bondes está em finalização de reforma para entrar em circulação. Ainda segundo o órgão, “as atividades de lazer são muitas em Campinas: a população pode usufruir de parques, museus, teatros, atrações gratuitas que podem eventualmente acontecer no município, tudo isso disponível no portal

online da prefeitura”, informa nota enviada ao Saiba+. “Áreas como praças, praças de esportes, bibliotecas públicas, atividades culturais, entre outras são abandonadas, e as poucas que existem não possuem acesso aos cidadãos”, replica Oliveira. Para Fátima, as atividades culturais nem sequer existem. “Nada é divulgado. Eu, que não tenho muito o costume de usar a internet, fico completamente por fora”, desabafa. Segundo a Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), responsável pelo Passe Lazer, há um esforço entre as secretarias municipais para que haja uma sincronia entre os eventos realizados pela administração e os dias do benefício. De acordo com a Emdec, outro ponto importante do projeto Passe-Lazer é esti-

mular o uso do transporte público coletivo na cidade de modo geral, inclusive, durante os dias em que ele não é válido. O desconto deve ser estendido a todos os domingos do mês até o final da atual administração. Para Tobias, o programa estimula o uso dos ônibus apenas no domingo. “Em relação à utilização do transporte público durante a semana e na jornada de trabalho, tenho certeza que não influenciará no estimulo ao uso do transporte público durante a semana. Isso não acontece”, diz. Fátima acredita que o verdadeiro estímulo seria uma melhoria no transporte público em geral. “O maior estímulo seriam ônibus melhores, que passassem com mais frequência”, diz. Já Tobias admite que não deixaria de usar o carro nos dias do Pas-

se-Lazer. “Trocaria apenas se houvesse passe livre e mais horário de ônibus próximo a minha casa e aos lugares que convivo aos domingos”. Subsídios De acordo com a Associação das Empresas de Transporte Público de Campinas (Transurc), o projeto Passe -Lazer não é custeado com o subsídio que a Prefeitura repassa às empresas responsáveis pelos ônibus. O valor atual do subsídio é de R$ 71 milhões, praticamente o dobro dos R$ 36 milhões pagos até o ano passado, quando, em agosto, o valor foi reajustado. Em nota, a Emdec informou que o Passe-Lazer é um benefício que não é custeado pelo dinheiro público e existe para incentivar o uso do transporte público coletivo aos domingos.


Gastronomia

20 de março de 2014

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Food Trucks são nova opção de investimento Alternativa é bem aceita por estudantes, pelo preço baixo e pela qualidade de restaurantes em ambientes públicos descolados

Catharine Trepichio

Uma nova opção de fast food nas ruas de Campinas já atrai um grande número de jovens, acostumados a refeições em lugares animados e baratos. São os food trucks, tradicionais em vários países do Exterior, mas que ainda são novidades no Brasil. São trailers que, em vez de lanches como o conhecido cachorro quente, especializaram-se em comidas mais sofisticadas e com qualidade. Esses veículos customizados começaram a aparecer, inicialmente, em metrópoles dos Estados Unidos e Europa, após a crise econômica de 2008, quando jovens chefs e empreendedores resolveram apostar no ramo. Hoje, esse tipo de empreendimento já faz parte do dia a dia dos moradores e, segundo a Associação Nacional de Restaurantes dos Estados Unidos, arrecadou no ano de 2013, mais de 68 milhões de dólares. Um dos pioneiros em trazer os food trucks para Campinas é Lucas Gaio Silveira, proprietário da kebaberia Spiro Giro. Com o propósito de ter um restaurante que

pudesse se deslocar para diversos locais e apresentar seu produto para públicos diferentes, Gaio afirma ter feito um pequeno investimento, comparado ao que gastaria com um restaurante de pequeno porte num endereço fixo. Fabricio Pessato, professor de Economia, explica que o aspecto positivo desse tipo de negócio é o pequeno investimento (veja quadro nesta página). “Embora o faturamento tenda a ser menor em termos absolutos, como os custos tendem a ser mais baixos, a lucratividade pode ser proporcionalmente maior. A rentabilidade, ou seja, a comparação entre o valor investido e os lucros obtidos, também pode ser maior.” Ao contrário de restaurantes comuns, o cardápio dos food trucks deve ser reduzido. Desse modo, os alimentos não são estocados, dinamizando o atendimento e, por fim, podendo haver a elaboração de um prato com muito mais qualidade ao cliente. A relação com os clientes também é um aspecto positivo neste tipo de negócio:

é muito mais informal, próxima e cuidadosa. Assim, os próprios clientes viram propagandistas do serviço. Rodrigo de Oliveira, estudante de engenharia mecânica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que frequenta os food trucks por preferir o atendimento especial, pela localização e a música diferenciada. “Acredito que o preço que pago compensa pela comida e pelo serviço oferecido.” Contudo, todo o cuidado é pouco quando se trata de alimentação. Para que os trailers possam estar nas ruas, é necessáriaa apresentação de todos os documentos requeridos, um alvará da Vigilância Sanitária e a aprovação da Secretária de Saúde do Município, como afirma a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Urbanismo de Campinas. Há seis meses no mercado, o retorno da kebaberia Spiro Giro agrada o proprietário que conta com o auxílio de dois funcionários. “Já temos um bom retorno até o momento, e pensamos em um segundo trailer ainda para esse ano”, explica.

Foto: Cathatine Trepichio

Spiro Giro: tipo de restaurante pretende atrair consumidores jovens

Fonte: Fabrício Pessaio

Educação

Alunos pedem melhorias em transporte Aulas do Cotuca ocorrem agora na Unicamp, mas quantidade de ônibus não são suficientes Foto: Mariana Ignácio

Beatriz Pusso

Após a interdição do prédio do Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), localizado na Rua Culto à Ciência, no Centro, no dia 13 de fevereiro, os quase 2 mil alunos foram transferidos para o campus da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em Barão Geraldo. A mudança divide opiniões. Os alunos concordam que o prédio-sede do colégio estava deteriorado: “Em um dia de chuva, o forro do teto ficou cheio de água e não aguentou – desabou na biblioteca. Por sorte não atingiu o acervo”, relata Christian Sousa, integrante do grêmio estudantil do colégio. Por outro lado, a mudança para o campus de Barão Geraldo tornou difícil o acesso dos alunos às aulas. A reitoria da Unicamp oferece ônibus fretados, que saem da antiga sede e levam os alunos ao campus. O problema, segundo relatam

Alunos do Cotuca competem por lugar em ônibus fretado, que sai da Unicamp de volta para o colégio

os estudantes, é que a quantidade não tem sido suficiente: “Todos ficaram indignados com a quantidade de ônibus e horários que eles ofereceram, porque alguns acabam saindo lotados. A estrutura aqui no campus pode até ser melhor que a do outro prédio, mas pra chegar até aqui nós tivemos que mudar nossos horários de uma hora para outra para conseguirmos cumprir os com-

promissos acadêmicos”, explica a estudante do segundo ano do curso de técnico de enfermagem, Larissa Loyola. Como os ônibus fretados do colégio levam os alunos do distrito de Barão Geraldo de volta à Rua Culto à Ciência, a demora para conseguir voltar para a casa tem sido incômoda para quem passa o dia todo no colégio, como afirma o estudante do curso técnico de alimentos,

Gabriel Visintini. “Mudou demais a situação. Saindo todo dia às 5 horas da manhã de casa e chegando às 8h da noite, como os alunos fazem pra estudar, manter as tarefas em dia? Tudo isso está sendo prejudicado.” Segundo a diretora geral do Cotuca, Teresa Celina Meloni Rosa, o colégio não tem como tomar outras providências em relação à quantidade de ônibus.

“A situação não está fácil, mas é o que pode ser feito.” Ela ainda informou que o colégio, juntamente com a pró -reitoria da Unicamp, está buscando outro imóvel, mais perto do centro da cidade. “Há fortes indícios de que seja o prédio do antigo Anglo Taquaral, mas estamos estudando ainda.” Apesar dos problemas atuais com o transporte fretado, no dia 28 de fevereiro o grêmio estudantil convocou uma assembleia e protocolou um documento, no qual reivindicava a permanência dos ônibus fretados, independente do prédio escolhido pela direção para a mudança de sede. A diretora discorda do pedido: “Não é obrigação do colégio oferecer ônibus fretados aos alunos. Acho que eles deveriam pedir o aumento do número de bolsas de auxíliotransporte. Eu espero que eles reivindiquem a coisa certa”.


Campinas 240

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20 de março de 2014

1964: A ditadura militar em Campinas Reflexos envolvem repressão às redações, ações públicas injustificadas e crescimento desordenado da cidade Larissa Alves

31 de março de 1964. Há 50 anos, começava no Brasil um período marcado pela falta de liberdade e pela obscuridade: a ditadura militar. Durante 21 anos, o regime instaurou no país uma série de atos autoritários, repressões e censuras que mudaram a vida de milhares de pessoas. Os governos que se seguiram tentariam mascarar a repressão por meio da censura, do controle dos meios de comunicação e por venderem uma imagem de desenvolvimento, por meio de obras de grandes proporções, como é o caso da Rodovia Transamazônica. Em Campinas, apoiada pelo então prefeito Ruy Novaes (1924-2000), a ditadura também trouxe, sob a justificativa do progresso, um crescimento desordenado que hoje se expressa em problemas urbanos e de infraestrutura. Isso se explica porque não houve, na época, um plano urbanístico na cidade. Se de um lado o desenvolvimento da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o título de Pontifícia dado à então Universidade Católica representam um crescimento, por outro a demolição do Teatro Municipal é assunto controverso até hoje. Segundo dados da Prefeitura, durante as décadas de 60 e 70 o crescimento na cidade ultrapassou os 5%. Entretanto, a maneira intensa e desordenada como aconteceu, gerou, além

públicas que caracterizaram a ditadura militar”, ressalta o sociólogo e professor da Unicamp, Alvaro Bianchi. Repressão Apesar de não haver um número exato de vítimas da ditadura em Campinas, quem viveu esse período tem facilidade para associar histórias de conhecidos à tortura e à repressão. O sociólogo Arnaldo Lemos Filho conta que o delegado do Departamento de Ordem e Política Social (Dops), Sérgio Fleury (1933-1979), famoso por seus atos violentos em relação aos procurados pela ditadura, veio à cidade procurar um funcionário do Supletivo Evolução, conhecido como Xandão. Na época, Lemos era diretor da instituição e comenta que a princípio não reconheceu o delegado. “Pedi para outro funcionário do colégio ir avisar o Xandão para não aparecer na escola. Só depois descobrimos que, na verdade, Fleury estava atrás do irmão do funcionário, que era militante”, relata o sociólogo. Sendo campineiros de nascença ou só de passagem, o fato é que muitas pessoas foram presas ou sofreram algum tipo de repressão na época. É o caso de Ricardo Zarattini, deputado federal em 2004 e militante do PT. Zarattini iniciou sua militância no movimento estudantil secundarista do colégio Culto

“ Que a memória sirva para consolidar o repúdio do povo campineiro a qualquer ideia de

golpe militar”

Paulo Mariante dos problemas urbanos e de infraestrutura, grandes problemas de saneamento básico, elevados custos sociais e comprometimento ao meio ambiente. “A cidade paga hoje o preço do autoritarismo, da repressão e da restrição à participação da população nas decisões

à Ciência e foi um dos resgatados do avião Hércules 56 em 1969, em troca do embaixador Charles Burke Elbrick (1908 - 1983). O sequestro de Elbrick foi organizado pelo grupo Dissidência do Guanabara (DI-GB) e tinha por objetivo chamar a atenção do

Foto: Coleção V-8 / Centro de Memória Unicamp

Junto com a Câmara, ajudou a organizar a Marcha com Deus pela Família e pela Liberdade, que reuniu cerca de 70 mil pessoas em 7 de abril de 1964. Ao mesmo tempo da passeata, locais utilizados pelos comunistas eram revistados e líderes sindicais eram presos. Em contrapartida à Marcha com Deus pela Família e pela Liberdade, em maio de 1967 realizou-se em Campinas a Conferência Estadual do Partido Comunista, reunindo mais de trinta membros do partido. Ainda durante o governo de Novaes, o prêmio de cidadão campineiro foi dado a Jarbas Passarinho, nome influente entre os militares por ter participado da artiMarcha das Famílias por Deus e pela liberdade realizada em 7 de abril de 1964 culação do golpe de 64 e ter sido Ministro da educação, mundo sobre a situação de avalia Bianchi. repressão vivida no Brasil Romeu Santini, na época mas cuja única relação com durante a ditadura. Em tro- presidente da Câmara de Campinas era um irmão ca do embaixador, o DI-GB Campinas, também sentiu que aqui morava. que era composto por no- os abusos do período. Em Comissão da Verdade mes como Fernando Gabei- 1970, Santini assumiu a reEm busca das histórias ra, Franklin Martins e Vera dação do Diário do Povo e Sílvia Magalhães, entre ou- relata que o governo pres- e registros da época é que tros, exigiu a liberdade de sionava para saber a exis- surgiu em 6 de agosto de 15 presos políticos, levados tência de comunistas na re- 2012, a Comissão Municiao México pelo avião Hér- dação. “Para tudo o que foi pal da Verdade, Memória e cules 56 da FAB. publicado em reportagens Justiça de Campinas, atuRobeni Baptista da Cos- ou editoriais atingindo o almente composta por sete ta, na época estudante de governo, eu era chamado membros. De acordo com linguística da Unicamp e ao Exército, pressionado a o presidente da comissão, presa aos 24 anos de 1971 dizer o porquê das publica- Paulo Mariante, a maioria a 1973, Tarcísio Malta Si- ções, se havia na redação da população campineira grist, professor aposenta- algum comunista ou se al- desconhece o que acondo que foi preso de 1970 a gum comunista estava me teceu na cidade durante a 1971 aos 22 anos e tortura- pressionando ou inspiran- ditadura. “Que a memória do no DOPS pelo delegado do a escrever aquele tex- sirva para consolidar o reFleury, e Roseli Bianco, to”, conta. Apesar de não púdio do povo campineiro militante da oposição sin- ter sofrido torturas físicas, a qualquer ideia de golpe dical no final da década de Romeu foi vítima da arbi- militar, além de saber que 1970, presa em 1969 pelo trariedade e imposições do personagens que ainda esExército de Campinas, e regime. “Eu sentia que as tão vivos e já atuavam na que teve que se mudar da mãos daquele militar que cena política de Campinas cidade para conseguir um me ouvia, me pressionava, na época, e hoje se afirmam novo emprego, são alguns ameaçava, estavam no po- “democratas”, foram entudos outros nomes englo- der. Os encontros aconte- siasmados apoiadores dos bam a lista de pessoas que ciam depois do assassinato golpistas”, ressalta Marianviviam em Campinas na do jornalista Vladimir Her- te. Ainda segundo o preépoca e foram torturados. zog”. Os militares também Torturas como a cadeira fizeram um levantamento sidente, mais do que um de dragão, em que os acu- da vida de Santini e enca- resgate dessas histórias, sados eram sentados em minharam ao DOI CODI. a comissão pretende dar cadeiras molhadas e rece- Romeu, no entanto, nunca maior institucionalidade biam choques, eram só al- foi chamado a prestar de- à Comissão para que ela se constitua como uma gumas das práticas às quais poimentos. os presos políticos eram Se de um lado os mo- política de estado no submetidos. “Esse ativis- vimentos estudantis e os Município. “Não pretenmo estudantil transformou sindicatos representavam demos encerrar nossos a cidade em um importante a parcela da cidade que trabalhos dentro dos licentro político e um ponto se opunha ao regime au- mites e prazos estabelede referência para os mo- toritário, do outro o então cidos pela legislação que vimentos sociais que ainda prefeito Ruy Novaes decla- instituiu a Comissão”, hoje exerce sua influência”, rou total apoio à ditadura. relata.


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