Os novos alquimistas

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Os novos alquimistas Cervejarias investem na produção de estilos alternativos

Cervejarias artesanais crescem 37,7% no Brasil pág 1 Cerveja com casca de laranja é uma das novas opções pág 3 Sommelier recomenda kit de copos para degustar cervejas pág 4


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QUARTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2017

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Aumento das cervejarias artesanais reflete novos hábitos de consumo A produção de cerveja artesanal não é um processo recente, mas está ganhando espaço no mercado Crédito: Natália Tonhati

Natália Tonhati O setor cervejeiro artesanal atualmente corresponde a 1,6% do PIB nacional e a 14% da indústria de transformação, ou seja, que transforma a matéria-prima bruta para o consumo. Segundo uma pesquisa feita em 2017 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) para a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), o mercado cervejeiro artesanal é uma cadeia produtiva que movimenta cerca de R$74 milhões anualmente. De acordo com dados divulgados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), em 2017 as cervejarias artesanais registradas no Brasil cresceram 37,7%, isto é, cerca de 8 mil cervejas foram registrados pelos negócios e marcas. Em 2016, o país encerrou com 493 cervejarias registradas e, no ano seguinte, com 679. O balanço de 2018 ainda não foi realizado. Com a proposta de fomentar o mercado das cervejas artesanais na Região Metropolitana de Campinas (RMC), no ano passado foi criado o Polo Cervejeiro da RMC, uma entidade sem fins lucrativos formada por 11 microcervejarias. O presidente do Polo, Samuel Mendonça, afirma que o interesse do público pela cerveja artesanal aumentou e a união dos produtores busca atender as demandas das empresas e do consumidor final. “O Brasil tem tudo para a produção de bons estilos e bons processos de cerveja. Acho que isso tem feito o mercado crescer bastante”, comenta. As cervejarias independentes não possuem relação com grandes empresas, o que pode ser um empecilho econômico para os produtores, visto que é muito caro abrir uma fábrica no Brasil. Consequentemente, muitos cervejeiros estão utilizando o método “cigano” para aproveitar o espaço ocioso de cervejarias com estrutura e litragem maior. Esse é o caso de Lucas Cremasco, sócio proprietário da cervejaria Mafiosa em Valinhos, que desenvolve as receitas com um mestre cervejeiro e aluga o espaço da cervejaria Dádiva em Várzea Paulista para a produção. Para Lucas este é um negócio que está crescendo devido à mudança de hábitos do consumidor e ao fácil acesso a esses produtos, o que desperta a curiosidade do público. “As cervejas artesanais são muito melhores que as cervejas da grande indústria. Elas têm muito mais sabor, muito mais aroma e é um caminho sem vol-

ta, depois que você experimenta uma cerveja artesanal é muito difícil você dar um passo para trás e ficar na mesma cerveja de sempre”, justifica. Já Marcelo Souza, sócio proprietário da cervejaria Macondo em Jaguariúna, crítica o discurso que exalta a cerveja artesanal e rebaixa a cerveja de mercado. “Acho que são propostas diferentes. Comparando com comida, existe restaurante que você vai para se alimentar e existe restaurante que você vai para ter uma experiência e degustar sabores”, defende. O cervejeiro sempre adorou o conceito de “faça você mesmo”, que se tornou um gatilho para ele tentar entrar no mercado. “Fui conduzido pela tocada americana que ressuscitou a ideia de Home Brewery. Eu adoro cozinhar e fazer cerveja é um processo muito parecido, porém mais encantador”, conta. “A única questão profunda é política. As grandes cervejarias desfrutam de privilégios fiscais que acabam inibindo a competitividade”, encerra Marcelo. A variedade de sabores e combinações é um fator atrativo para os consumidores. O supervisor de compras de 27 anos, Márcio Carandina, considera a bebida artesanal para degustação, mas ainda bebe a cerveja industrial em grande quantidade. “Eu procuro sempre as misturas de aromas, muitas vezes cítricas, com ingredientes mais maltados ou um lúpulo diferente”, conta. “Em uma long neck eu pago na faixa de 15

reais e em uma garrafa de 600 ml, já cheguei a pagar 25, 30 reais”, acrescenta. Foto: Natália Tonhati

As cervejas artesanais destacam-se pelo sabor intenso e pelo alto teor alcoólico

Movimentação da economia As cervejas artesanais possuem um custo mais elevado que as cervejas massificadas, ou seja, produzidas em grande escala por indústrias de bebidas. Para Samuel, o que explica o preço elevado é o tempo de produção, os insumos mais nobres e os impostos. “O preço depende muito de carga tributária e de volume de produção. Quanto mais o mercado quiser, porque o mercado depende de oferta e demanda, mais aquele produto vai encarecer e isso faz com que a gente tenha cervejas mais caras do que vinhos, por exemplo”, explica. O processo de produção da cerveja artesanal leva em média 25 dias até o envasamento e o preço é relativo aos insumos utilizados. A produção de uma receita padrão de India Pale Ale (IPA), cerveja carregada de lúpulo e alto teor alcoólico, chega a custar R$50 mil por 2 mil litros. Do ponto de vista comercial, o litro é vendido por uma média de R$7 a R$25.

Ingredientes como lúpulo e malte são mais caros e, muitas vezes, as cervejas artesanais são puro malte, diferente das indústrias que utilizam adjuntos como o arroz e o milho para baratear a produção. “A artesanal assusta um pouco, tem muito gosto, algumas são bem amargas, outras bem escuras e lembram café. Mas as variações são quase infinitas”, conta Lucas. Além do boom de consumo das artesanais, o mercado cervejeiro independente também está impulsionando a geração de novos empregos. De acordo com informações divulgadas pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), cervejarias com menos de 100 funcionários geraram 723 novas ocupações de janeiro a novembro de 2017. A Associação Brasileira de Cervejas Artesanais (Abracerva) realizou um levantamento preliminar no ano passado, e informou que a contratação em cervejarias artesanais também cresceu.


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QUARTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2017

Duopólio dificulta diversidade no setor, diz economista Ambev está entre as primeiras posições na lista de empresas mais valorizadas do país Crédito: Isabela Moraes

Isabela Moraes A duopolização do setor de cerveja das empresas AmBev e Fensa dificulta a entrada das microcervejarias no mercado, aponta o professor e doutor do Instituto de Economia da Unicamp Marco Antônio Martins da Rocha. As macroempresas investem em comerciais, eventos, patrocinadores, além de já possuírem a centralização de supermercados e pontos de vendas, enquanto que as pequenas e médias empresas enfrentam dificuldade em atender escalas de produção e ter o retorno financeiro esperado. “As pequenas empresas conseguem um espaço de concorrência quando voltam apenas para o mercado local, pois a distribuição é mais simples, a produção é menor e não precisa de circulação de propaganda em grandes veículos nacionais”, explica Marco da Rocha. A AmBev, por exemplo, possui 67% do mercado nacional de cervejas. O aumento da renda da população é outro fator que influencia na concorrência, pois abre espaço para a diferenciação do consumo. Marco da Rocha esclarece que elasticidade de renda é o termo econômico que explica esse fenômeno, ou seja, se a renda da população cresce, o consumo de cerveja também eleva e por essa razão, as pessoas tendem a buscar por produtos de melhor qualidade. Isso é visto no crescimento de cervejarias no país que quase dobrou nos últimos três anos, passando de 356 unidades em 2014 para 679 em 2017, mesmo período do ciclo do crescimento econômico do país. De modo geral o setor de cerveja está vinculado a uma indústria que não produz só cerveja, mas uma gama de bebidas. Isso faz com que a cadeia de mão de obra seja ampla e envolva agricultura, varejo, embalagens, logística, maquinário, publicidade, importação de insumos, construção civil, entre outros. “É um setor que produz franjas no mercado em nível local, então você tem empregos de forma diferente nesse mercado, tem um grosso do pessoal que vai estar empregado na estrutura das grandes empresas e tem outro contingente de pessoas que vai estar empregado no nível local produzindo”, completa Marco da Rocha. A Fundação Getúlio Vargas

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O estudante de Sociologia da Universidade de Brasília Matheus da Costa Lavinscky desenvolveu uma dissertação sobre a relação entre economia e cerveja, e ele destaca que a cultura duopolista é comum nas indústrias de cerveja em todo o mundo., a diferença é que os países da América Latina não possuem a tradição do consumo e da produção da cerveja artesanal. “O que temos observado nos anos recentes é uma espécie de descoberta do fato de que cerveja não é necessariamente sinônimo do tipo de bebida mais frequentemente disponível nos bares e mercados, mas participa de um universo com inúmeras possibilidades ainda pouco exploradas”, completa. O professor de economia também acredita que para competir com as grandes marcas é necessário investir em diferenciações do produto “é difícil ser competitivo em estratégia de preço com a AmBev, por exemplo”, explica. Em meio a uma crise, por exemplo, as grandes empresas têm a capacidade de reduzir preços substituindo insumos, reduzindo custos e adaptando a mercados mais estreitos, enquanto que as microempresas dependem da capacidade de compra da população. A revista americana The Economist realizou uma pesquisa comparando o preço das cervejas em diversos países e o tem-

BREJAS 2 po necessário de trabalho para comprá-las. No Brasil, são necessárias cerca de 20 horas de trabalho para comprar 20 garrafas de cerveja, enquanto nos EUA é possível comprar 80. O professor de economia explica que essa pesquisa reflete que a cerveja é um produto caro no Brasil. Isso acontece porque grande parte dos ingredientes é importada de outros países, e a tarifa de importação é alta no Brasil. Os maltes vêm da Alemanha, Bélgica, EUA e Reino Unido. Os lúpulos vêm dos mesmos países, incluindo a República Tcheca, França, Austrália e Nova Zelândia. Até mesmo as leveduras são importadas, muitas vezes, da França ou dos EUA. Isso explica porque a cachaça, que possui insumos domésticos, tem menor valor comercial do que a cerveja. Outro ponto que faz o preço da cerveja ser alto é a tributação imposta sobre ela, que chega a mais de 60% do total, são eles: PIS (litro/garrafa), COFINS (litro/garrafa), IPI (litro/ garrafa), ICMS (percentual que varia de estado para estado), ICMS-ST (substituição tributária que varia de estado para estado). “A cerveja tem uma carga tributaria parecida com as outras bebidas alcoólicas, e está tudo relacionado com a média salarial brasileira, que é próxima ao salário mínimo”, contextualiza Marco da Rocha. Apesar do duopólio, o estudante de sociologia conta que o setor de cerveja é um investimento seguro, principalmente as artesanais, “a particularidade de diversificar as possibilidades de sabores, matérias-primas, aromas e texturas da bebida é importante a ponto de fazer diferença significativa na disputa pela atenção dos consumidores”, acrescenta. Foto: Isabela Moraes

indica que para cada emprego gerado em uma fábrica de cerveja, outros 52 são criados na cadeia produtiva. E segundo dados da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), o setor emprega 2,7 milhões de pessoas e paga R$28 bilhões em salário. “Nosso setor está diretamente conectado com o progresso e o desenvolvimento do país”,

afirma o presidente da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja, Paulo Petroni. O setor de cerveja também é representativo no Produto Interno Bruto (PIB) do país. A indústria de transformação - tipo de indústria que transforma as matérias-primas em utensílios para o homem - representa 12%, do total do PIB, e a indústria de cervejas 2,1% disso.

Professor de Economia da Unicamp Marco da Rocha


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QUARTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2017 Foto: Vivian Vital

Akayá, Labirintite e Uruvaia, ambas da Cervejaria Daoravida, de Campinas - SP

Cerveja com raspas de casca de laranja é uma das novas opções Criatividade e precisão são fatores decisivos para a criação de aromas e sabores únicos Foto: Vivian Vital

Vivian Vital A cerveja com adição de raspas de casca de laranja é a Labirintite, criada por Wagner Falci e Michele Gimenez, fundadores da cervejaria Daoravida, de Campinas – SP. A cerveja de estilo Belgian Tripel foi criada com assistência de Wagner por telefone, que estava no hospital com a mãe, que sofria com crises de labirintite. A bebida também leva Candy Sugar artesanal na composição e é vendida a R$ 20,00. A partir da base das cervejas – malte, água, lúpulo e fermento – diversos outros ingredientes podem ser acrescentados de acordo com a criatividade de quem está produzindo, e é isso o que torna o sabor único, novo e surpreendente. Dentre os diferentes ingredientes, podem ser usadas frutas, especiarias, condimentos, grãos não maltados, raízes, ervas, flores e muito mais. A adição de ingredientes como a raspa da casca de laranja, por exemplo, não é uma novidade, tendo em vista que os sumérios fazem isso desde 2100 a.C, quando criaram a bebida conhecida por cerveja. Atualmente, os arranjos ganharam força no mercado em razão da ascensão das cervejarias artesanais, que experimentam novas combinações e geram curiosidade. “Um diferencial que essa adição traz, pensando no mercado de hoje, é atrair o consumidor para que ele possa enxergar a cerveja de uma nova forma, e, também, trazer novos consumidores que não gostam de cerveja porque estão acostumados com aquela mesma coisa. Eu acho que isso só traz mais curiosidade para experimentação”, comentou a sommelière de cervejas e mes-

tre em estilos, Priscilla Colares. A sommelière explica que “as cervejarias artesanais e caseiras tem liberdade para testar uma infinidade de combinações para convencer o consumidor de que existe uma gigante variedade de sabores, cores, texturas e aromas”, e isso movimenta as grandes empresas, fazendo com que elas queiram correr atrás do prejuízo, mesmo com o segmento de artesanais representando cerca de 1% do mercado cervejeiro brasileiro. Após a escolha da combinação a ser feita, é preciso que o ingrediente esteja na quantidade correta para que se alcance o resultado desejado, possibilitando a obtenção de uma cerveja com características únicas e marcantes. A cervejaria Daoravida possui, além da Labirintite, outras três cervejas com adição de ingredientes diferentes dos comumente utilizados. Cajá, lichia e kiwi são as escolhas feitas por eles na hora de inovar. “A escolha da fruta é muito semelhante a cozinhar ou a compor um prato. Você tem que imaginar as características sensoriais daquela fruta combinadas com outros ingredientes da cerveja, e a técnica é das mais variadas; você pode usar o suco da fruta, polpa ou geleia desidratada”, explica Falci. A cervejaria, que está presente nos principais bares cervejeiros do país, produziu a colaborativa Akayá junto da cervejaria italiana Birrificio Del Ducato. A bebida que custa R$ 20,00 é uma New England Juicy IPA que possui em sua composição a fruta cajá (daí o nome Akayá, cajá em tupi-guarani). Após o sucesso dessa, a Daoravida e a Birrificio

Del Ducato produziram a Uruvaia, de preço R$ 20,00, cerveja no estilo Brazilian Juizy IPA com adição de lichia em seu arranjo. “Após a criação da Akayá e da Uruvaia, fizemos contato com a cervejaria Dois Corvos, que fica em Lisboa, para fazer uma cerveja com adição de kiwi, a Cardinalis, já que Portugal é o décimo maior produtor de kiwi do mundo. E foi assim, a partir de colaboração, que nasceram as nossas cervejas com frutas. Nós já tínhamos a Labirintite, mas com a fruta mesmo foram essas três”, contou. A Cervejaria Landel (de Campinas – SP) possui, dentro diversos rótulos, a Cafetina, de preço R$ 24,90, uma English Brown Porter sazonal preparada com a adição de café em sua composição. O café não é um ingrediente novo no universo cervejeiro, mas antes era utilizado sem grande destaque, apenas em alguns pontos para correção de cor e sabor das cervejas. “O café possui aromas e sabores únicos, que não vem de um composto isolado, então tivemos a ideia de elaborar uma cerveja que tivesse o espírito da Landel; mais leve, sem muito álcool, com um café autentico, 100% brasileiro e de pequeno produtor. O desafio foi tentar utilizar esse café de maneira com que o aroma fosse o mais preservado possível”, explicou o mestre cervejeiro, beer sommerlier e sócio da Cervejaria Landel, Marcelo Crósta. Desde o primeiro lote da Cafetina, foram selecionados três fornecedores de café. O primeiro

“A escolha da fruta é muito semelhante a cozinhar ou a compor um prato” Cerveja Cafetina, da Cervejaria Landel, de Campinas - SP Crédito: Vivian Vital

era um café produzido no Espírito Santo, de uma lavoura pequena e selecionado a mão; um café mais intenso e mais tostado. Para o segundo e terceiro lote, foi utilizado um café 100% arábica, produzido na região metropolitana de Campinas; mais caramelizado, com corpo alto e paladar intenso. “Já nas últimas versões, utilizamos o café de um fornecedor que tem uma cafeteria em Barão Geraldo e ele faz as torrefações em uma microtorrefadora, então esse foi um café muito elaborado porque foi pensado por mim e pelo mestre torrefador. Esses últimos lotes levam um café com altíssima qualidade e procedência, o qual foi escolhido os tipos de grão, as varietais de grãos, blendado e torrado num perfil de tosta especialmente para cerveja. Com isso, conseguimos uma bebida de aroma muito intenso do café, extremamente floral, lembra jasmim, algo de chá preto e notas cítricas bem delicadas. É um café bem complexo que podemos sentir na bebida”, finaliza.


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Sommelier indica kit com copos ‘coringas’

Crédito: Caroline Da Vinha

Identificando copos e taças

Weissier, tulipa belga, pint, pokaler formam o time de copos principais que potencializam os sabores e aromas das cervejas Caroline Da Vinha A arte de degustação não se restringe apenas ao universo dos vinhos. As cervejas também exigem que sejam bebidas em copos corretos, que além de trazer elegância e uma boa apresentação, influenciam diretamente no sabor. De acordo com o sommelier Waldemar Sto a taça adequada potencializa a percepção de sabores e aromas da cerveja, tornando a degustação mais agradável. “O copo correto valoriza o ato de degustar a cerveja, conserva a temperatura, favorece a ‘carbonatação’ e formação da cabeça de espuma que facilita a percepção aromática”. As taças e copos, desde a antiguidade, são utilizados para serviço da cerveja, mas, com o passar dos anos, esses objetos evoluíram e foram aperfeiçoados. “A cerveja tem sua história datada começando com os sumérios há quase cinco mil anos, assim, pode-se dizer que não foi uma taça ou um copo utilizado para beber, mas sim, pequenos jarros. Quanto aos copos propriamente ditos para cervejas, os primeiros eram canecas de cerâmica e mais tarde até o final do século XIX eram de estanho. A primeira produção industrial de copos de vidro é datada no início de 1920 e foi uma caneca canelada de 10 facetas”, explica Sto. A partir dessa produção, os copos tiveram seu desenvolvimento acelerado em diferentes geometrias e tamanhos e, para que o apreciador não se perdesse na infinidade de modelos, Sto esclarece que alguns modelos são considerados ‘coringas’. “Existem inúmeras copos, taças e canecas, cada produtor pode mandar fabricar o seu, mas tecnicamente falando são 15 modelos, sendo que, de fato, quatro são possíveis beber todos os estilos de cervejas produzidas no mundo”, defende. O primeiro copo ‘coringa’ é o Weissier, específico para cervejas de trigo, que além de serem leves e aromáticas, foi um dos primeiros estilos a chegar no Brasil. O copo dessa cerveja deve ser longo com base afinalada, corpo alto e boca larga, pois mesmo após derramar toda a bebida no copo, ela deve continuar ‘carbonantando’, ou seja, soltando ‘bolinhas’. “Elas se propagaram ainda no final da década de 80, talvez seja por isso que se falam tanto em seu copo, o Weissier que embora haja de outras

medidas, o de 500 ml, se sobressaiu aqui por conta do modo de servir, onde o conteúdo total da garrafa mais a grande cabeça de espuma devem estar contidos no copo”, esclarece o especialista. O segundo copo dessa lista é o Tekué, ou popularmente conhecido como ‘tulipa belga’. Essa taça é indicada para as cervejas que apresentam maior teor alcoólico e que são mais aromáticas. “A Tekué foi desenhada para ser a taça universal para se degustar uma cerveja, é um misto de taça de vinho com pokaler, tulipa belga é um snifter. Com a borda para fora, ela facilita o beber e ajuda a capturar os aromas e na retenção da espuma”. Outro copo indicado é o Pint. Esse é um dos mais versáteis copos que existem, com seu formato simples e que comporta uma boa quantidade de cerveja. As bases são mais estreitas que a boca e, assim, ajuda a não esquentar rapidamente a cerveja. “São os copos mais usados nos pubs da Inglaterra e da Irlanda, sendo famosos por acomodar cervejas no estilo Stouts. Também é considerado uma unidade de medida sendo equivalente a 473ml nos Estados Unidos e 568 ml na Inglaterra”, acrescenta. O último copo é o Pokaler, um clássico modelo para diversos estilos. Possui uma boca mais estreita, que proporciona a retenção e direcionamento de aromas não tão evidentes, ajudando a sustentar a espuma por mais tempo. COLEÇÕES Para tornar a degustação ainda mais prazerosa da bebida mais popular do Brasil, alguns ‘cervejeiros’ passaram a colecionar as taças em suas casas, para que, pudessem ter maior apreciação até mesmo assistindo televisão, como é o caso do engenheiro civil e produtor de cervejas artesanal Eduardo Frederico de Moraes. “O meu interesse em colecionar as taças e copos surgiu quando comecei a fazer cerveja para meu próprio consumo. Atualmente tenho cerca de 42 taças e almejo adquirir mais algumas no futuro”, conta. O valor de cada copo é diferente, por isso, os preços podem variar de R$ 7 reais até R$ 50 reais. “Os valores são diferentes, pois depende do material que são feitos. Por exemplo, uma taça Windsor está na média de

R$7,00 lisa; o copo Weissier de vidro em média R$24,90; o copo da Leal com suporte de madeira em média R$135,00, sendo esse um dos mais caros; o Pint, R$9,00; a taça Teku, R$50,00 o modelo original; e uma Spigelau IPA R$50,00”, afirma. Para completar uma coleção, o valor total deve superar R$ 800 reais, mas para aqueles que não querem gastar todo esse preço, o indicado segundo o sommelier Waldemar Sto, é adquirir os quatro copos ‘coringas’, pois assim, o preço cairá para R$150 reais. Moraes já gastou aproximadamente R$500 reais na coleção, e afirma que após descobrir a utilização dos copos corretos, poucas vezes tomou uma cerveja em outro copo. “Quando comecei a fazer minha própria cerveja, passei a valorizar mais todo o processo, além de entender que os copos são sim, fundamentais para sentir mais prazer ao beber uma cerveja”, finaliza. ONDE DEGUSTAR Em alguns bares em São Paulo, as bebidas podem ser encontradas servidas nos copos e taças corretas, como é o caso dos seguintes bares: FrangÓ que fica na Largo da Matriz Nossa Senhora do Ó;

Âmbar em Pinheiros; Empório Alto dos Pinheiros

(EAP) em Pinheiros; Cervejaria Trilha em Perdizes. Foto: Caroline Da Vinha

O engenheiro Eduardo Frederico de Moraes coleciona 42 taças em sua residência


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Por contraste, semelhança e corte

Foto: Barbara Carvalho

Sommelier ensina harmonizar cerveja na gastronomia Barbara Carvalho As cervejas podem ser harmonizadas de três formas principais: pelo contraste, quando as diferenças entre a comida e a bebida vão realçar os sabores dos dois; por semelhança, quando tanto a comida quanto a bebida possuem elementos em comum que chamam atenção; ou por corte, quando a bebida é usada para cortar algum componente da comida como, por exemplo a gordura, limpando o paladar. Além desses tipos de harmonizações, ainda é possível fazer por tipo de cerveja. O bom da harmonização por cerveja é que a bebida possui uma enorme classe de sabores. Entre os diversos tipos de cervejas, algumas das principais são: Pilsen Conhecida também como Klar originada na Checoslováquia, mais especificamente na cidade de Plzeň, por volta de 1840. Este tipo de cerveja é o mais consumido no Brasil e tem uma coloração dourada, sabor leve e refrescante. Combinam com harmonizações despreocupadas, de acordo com Beatriz Amorim sommelier de cerveja “Não podem ser pratos com personalidade muito forte, que matem a cerveja”. Dunkel Conhecida como cerveja preta, é um tradicional tipo com origem na cidade de Munique, região da Baviera. Tradicionalmente ela possui suave amargor, distinta coloração escura e um característico sabor de malte torrado. Combinam com pratos de carnes, queijos e sobremesas que contem chocolate por exemplo ou frutas, pois as notas presentes aproximam sabores da bebida e comida. Weizen Significa trigo em alemão. Este estilo de cerveja teve origem na região da Baviera e seu registro arqueológico mais antigo remete a era do bronze, há mais de 2.800 anos. Esta cerveja tem um paladar equilibrado, com notas de cravo-da-índia e banana somados ao sabor agradável do trigo. A textura presente nela traz

maciez e cremosidade, progredindo para um sensação final picante na língua, que é reforçada por sua carbonatação fervescente. Combina com pratos grelhados, frutos do mar, saladas e queijos delicados. Sobre a harmonização entre cervejas e comida, é crucial o conhecimento prévio tanto do perfil da cerveja quanto dos ingredientes e do modo de preparo do prato com o qual se quer harmonizar. De outra forma, pode-se correr riscos e aventurar-se por combinações inexploradas e às cegas, o que pode no mínimo ser instrutivo, como também pode ser tremendamente prazeroso. Por tanto é essencial saber como harmonizar a sua cerveja desde a entrada até a sobremesa, para isso é importante ter algum conhecimento sobre o assunto ou ter um sommelier de cerveja a disposição no local, pois ele saberá realçar o sabor da bebida com o prato, criando novas experiências deliciosas para o paladar, e aumentando a presença da cerveja na gastronomia de restaurantes mais refinados, lugar antes ocupado somente por bebidas consideradas refinadas como por exemplo o vinho. Como a gastronomia é uma área em constante evolução, seguir regras sem tentar inovar pode levar a uma estagnação, algo que os amantes da cerveja não podem fazer pois, é através de novas experiências e tentativas que a harmonização da cerveja foi criada e tem hoje variados tipos e combinações. Comumente, a cerveja é vista sem protagonismo no universo da gastronomia, ainda que isso tenha mudado muito, graças ao trabalho de chef’s e mestres cervejeiros. Isso está acontecendo também no Brasil, muito em função de a cerveja ainda ser vista prioritariamente dentro de um contexto associado a entretenimento festivo e descompromissado, o que pode ser ótimo, porém essa visão esconde inúmeras possibilidades sensoriais representadas pelos inúmeros estilos de cerveja aos quais tem hoje no país. Por outro lado, por conta do incentivo de profissionais que trabalham na área, a cer-

Prato Schalachtplatte, de origem alemã, harmoniza com cerveja feitas com trigo Foto: Barbara Carvalho

Yves Lovizaro com cerveja IPA que harmoniza com aperitivos de sabores leves veja vem se destacando mais ao passar dos anos como bebida gastronômica em razão da carbonatação que empresta adstringência a qualquer harmonização, além dos sabores tostados, defumados e caramelizados que são únicos entre as bebidas fermentadas. Alem de a mesma estar atribuída a fatores económicos e com a cultura da “gourmetização” das cervejas, que segundo Samuel Mendonça, Presidente do Polo Cervejeiro da RMC “entendo, na verdade, socialização da cerveja. A cerveja artesanal, que a gente chama de gourmet, na minha opinião ela não deveria ter esse nome”. Cria varias oportunidades de crescimento na área, e em função delas iniciou-se um processo de revitalização da cerveja como acompanhamento de pratos sofisticados nos

melhores restaurantes do mundo, sem que ela perca o aspecto democrático e informal que a popularizou em praticamente todo lugar. Com essa diversidade e potencial para crescer a cerveja tem ganhado mais pessoas que apreciam e buscam entender mais do assunto, através de cursos sobre cerveja para iniciantes e experientes no assunto. Yves Lovizaro, 19 anos, estudante de engenharia de produção, é exemplo disso, pois de acordo com ele o seu interesse de fazer o curso de mestre cervejeiro, para fazer sua própria cerveja, começou quando ele percebeu que ela é sua bebida preferida. Ele começou a beber a cerveja como qualquer outra bebida, e seu gosto por ela só aumenta com o tempo, segundo Yves

“gosto pelo sabor e refrêscancia, por isso acabo buscando cervejas mais complexas em sabor”. E esse gosto pela bebida é grande ao ponto de incentivar os amigos a optarem por ela como bebida escolhida para acompanhar o prato, chegando a ajuda-los a na escolha da melhor cerveja para cada um de acordo com seus gostos. Contudo apesar das diferentes regras, livros e cursos dedicados ao tema da harmonização da cerveja, é valido buscar combinações que agradem o paladar de cada um. Pois tem pessoas que não abrem mão das “loiras geladas” convencionais em seus momentos de apreciação da bebida, ao em vez de uma cerveja mais encorpada e cara, e pelo fato dela ser considerada um “evento social” segundo Samuel, presidente do polo cervejeiro do RMC.


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