Luz Quebrada

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ESPECIAL

GOIÂNIA, SEGUNDA-FEIRA, 13 DE MAIO DE 2019

AO LEITOR O artigo começou a ser digitado, à máquina, em 2015, e foi elaborado, frequentemente, até o póseleições 2018 e início de 2019. Diagramação, edição e ilustração: Arthur da Paz

BATISTA CUSTÓDIO ESPECIAL PARA

A

água nasce pura e doce na fonte. Corre cristalina e forma o córrego fértil de peixes e abundante de farturas no verde das margens. Panha afluentes e banha as planícies. Roda o céu nas ondas calmas e rega sonhos na água de joelho nas cachoeiras. Desenrola distancias envolta das serras e se expia bebida na secura dos ermos áridos. Corta pedras na quina das curvas estreitas, rasga chão na beira dos barrancos e se descansa na lagoa das chapadas. Ouve o canto dos pássaros no baile das revoadas, dá de beber aos bichos no namoro dos acasalamentos e contempla o poema das campinas floridas. Segue, às noites, com um colar de estrelas à tona e, aos dias, com uma galeria de luzes se penteando na vitrine das águas boiando Sol. A fonte cumpre o seu destino no itinerário do rio. Lava-se nas bacias do sertão e despeja-se doce no oceano salgado. As nuvens bebem na evaporação. A água da fonte volta pura e doce no choro das chuvas. O fluxo natural das águas cumpre o determinismo da evolução regente de todas as vertentes da vida no útero do Universo. É o maktub nas escrituras da Lei Maior, que codifica também o fundamento do postulado ético na divisão equânime, para todos, dos bens auferidos na Terra. Mas quando a fluência natural é alterada na ordem dos valores, o interesse coletivo flui para as vantagens individuais no vau do livre-arbítrio das pessoas egoístas. E elas fazem açude na fonte. Abrem rego-d’água na vastidão sedenta. Captam a água para o benefício exclusivo de suas casas. Usam-na restrita a si. Cobram o fornecimento de água dos vizinhos que o rego não passa nos terreiros deles. Abastecem-se à vontade, e seus quintais a entornam poluída para o consumo dos moradores à beira do riacho. É a Lei de Causa e Efeito. A culpa pela degradação da água não é apenas do primeiro residente, ou só dos domiciliados no meio, ou única do último habitante, mas de todos os que sujaram a água no uso exclusivo do rego para eles. Moral da história; qualquer semelhança entre os moradores à beira do rego e os poluidores da água nascida limpa na fonte com os políticos condutores dos governos e geradores da corrupção nos mananciais do poder, não é mera coincidência.

Pessoas que judiam de sua alma

A poluição retida nas águas é decantada ao volatizar da evaporação. A devassidão também será coada e contida no filtro da purificação humana. O materialismo egoísta gerou a poluição moral que, se puxada a ponta do fio, desfia-se a linhagem da corrupção tecida na capa das ideologias políticas, no manto das teologias religiosas, na cortina das vocações empresariais, no trapo das aptidões dos ofícios profissionais, na pluma vestal das autoridades, no véu doméstico dos familiares. Aparências paramentadas esfiapam-se nas máscaras das recosturas do pacto entre ricos e pobres alinhavados à mentalidade de se tirar proveito de tudo, a quaisquer custos, com o caráter amassado na consciência. São auréolas adereçadas por grinaldas rotas. Ou são laços em fitas que, se estendidas nos varais do verídico, rasgam-se os remendos do cínico tecido no pano de muitos coletes encorpados de civismo e o cordão na haste de tantos guardanapos flamulando como bandeira de lutas nas causas do idealismo.

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A Natureza enfureceu-se no mastro glacial. Fenômenos sísmicos enfileiram-se nas hecatombes, tão ferocidas como se fossem demônios soltos em iras, retorcendo dores nas tragédias, tantas como nunca visto antes ao mesmo tempo em regiões diferentes. Flagelos percorrem crueldades abismantes nas fatalidades, como se desgraças passeassem com as doenças nas visitas das mortes. Tornados promovem festivais aos empurrões dos mares, para beberem vidas humanas nos colos do sertão e nos braços das cidades. Vulcões acordam no silêncio das montanhas, vomitam fogo nos relentos empinados, cozinham a paisagem no topete das matas, derretem pedras nas encostas emborcadas, derramam caldeiras no chão encolhido e tosse fumaça preta no azul dos céus claros. Terras tremem de medo. Lugar que era seco, inunda-se. Local que foi água, esturrica-se. O que está imóvel, deslo- Anteu, filho da Terra, ca-se. Tudo se com- Gaia: mitologia grega plica, como se Anteu houvesse se libertado do anátema no subterrâneo e levantasse abrindo erupções na superfície do chão. Nada se explica, como se uma ameaça nos olhasse imantada do etéreo no azul, aquém das nuvens, acima das estrelas e além da compreensão humana. A realidade inverte-se nas estabilidades, de instantâneo, e a preocupação destampa-se na tranquilidade dos corações. A vida se refaz dos erros na forja do sofrimento. É a colheita em toda tulha do que cada um plantou. Pobres roubam dos ricos a safra acumulada que os ricos roubaram dos pobres. Pais estupram filhas nos lares e filhos drogados matam pais amorosos. Milhões lucrados nos enriquecimentos rápidos viram tostões nos empobrecimentos ligeiros. Autoridades despencam-se súbito do poder para o inesperado nas celas das prisões. Mercadorias vão às prateleiras da pirataria de preços dos comerciantes de alimentos. Personalidades emproadas na arrogância esborracham-se na humilhação pública. Amigos abandonam companheiros leais que os carregaram nas adversidades para o triunfo. Povos concentram riquezas extraídas de povos na pobreza. São pessoas que judiam de suas almas, porque ignoram que nas coisas que trazem alegrias a certas pessoas, estão as coisas que levam tristezas ao seu espírito. Estão vindo dias em que pobres agradecerão a Deus por não terem sido ricos. Serão tempos duros. Não será o fim do mundo. Será fim do imundo. O que se assiste, atualmente, é o princípio do desmantelo gradual e em definitivo da corrupção milenar na Terra. Estamos sob o cutelo das mudanças revirantes do mal encoberto quais ciclopes com o olho enorme e fixo nos que serão expurgados para um planeta primitivo, sobre o baque ruidoso das expiações, entre gemidos dos maus e choros dos bons, até que só o Bem fique de pé. Soou a undécima hora no

prazo para a remissão. Mas ilustres expoentes da sociedade continuam indiferentes, como se tivessem luz quebrada na visão perceptiva. Os com a venda do materialismo mercenário, competem na corrida dos imediatistas. Guiam-se pelo faro do oportunismo utilitarista. Juntam bens que não encherão, sequer, o buraco no chão em que o corpo será pó, e subirão pobretões no espírito. Não escutam a voz da razão na experiência dos velhos e não enxergam o puro na inocência das crianças. Supõem ter o poder de alterar o trajeto para a sepultura parada à espera de cada um de nós em todos na vida. Seguem o designado dos coelhos, correndo de uma comida para outra e vão depressa, aos 8 anos, enquanto que as tartarugas andam devagar e chegam aos 100 anos.

Transformações permanentes nas convulsões

Para se fazer a leitura correta dos mistérios ocultos nos fenômenos sísmicos, ou saber discernir o verdadeiro do falso na abrangência dos acontecimentos históricos, é essencial possuir embasamento cultural profundo e a dotação intuitiva do pressentimento. Também para ler e entender corretamente a dimensão do conteúdo do escrito nos livros, ou distinguir no texto se o autor é um sábio ou um equivocado, é fundamental ter erudição no conhecimento e o dom da percepção na inteligência. Os episódios extemporâneos nos ciclos naturais que obrigam nações a se acudirem umas às outras nas intempéries imponderáveis. A impotência dos governos para reaverem a credibilidade abatida nos vendavais da corrupção. Os estralos das convulsões

sociais dão medo do dia de amanhã. As fortunas estão torres de papel ao balanço das corrupções abertas. Os poderes estão pilastras de vidro no tapete de cinzas estendidas nas nações em chamas nas crises. A paisagem alargada no longínquo desola-se nas terras rachadas a golpes das hecatombes. O panorama econômico desorganiza-se a saques nas fraudes. O cenário político dissolve-se a golfadas do imoral. O mundo se engole, se engasga, se vomita e se retorce encalhado na excreção das excrescências. Os líderes estão empanturrados de erros nos governos e não encontram a solução capaz de resolver os efeitos da crise econômica na política. Porque são eles a causa da desordem nas instituições públicas e da instabilidade nos organismos sociais. Por isso remanejam-se nas alternativas de embromações implícitas nas tretas dos culpados. Em vão. Quebrou-se o lacre no invólucro das farsas. Os ribombos brutescos nos fenômenos da Natureza e a enormidade de atropelos cravados na Humanidade, como se havido um desmoronamento de pesadelos, são atípicos na reincidência galopante das ocorrências e na fulminância absurda das calamidades. Normal, não é o verificado. Paira no indecifrável um alerta explícito do enigmático. Ou é reação do meio ambiente à devastação formadora de desertos nas florestas. Ou será prenúncio da construção de searas morais na inospidão árida na dureza do caráter humano. Medito sobre o inusitado na montureira de pandemônios alarmantes, uns tão iracundos como se forças doidas se esmurrassem nas catástrofes da Natureza; outros, tão rigorosos como se castigos educassem pela dor dos sofrimentos a Humanidade, mas todos, tão imantados de complexidade, que não intuo outra explicação para tantas contorções descomunais na Terra, senão a da gestão de um Mundo Novo que nascerá para nós o Tempo de Luz. A maioria das pessoas não consegue fazer a leitura com entendimento preciso dos episódios, notórios na ebulição dessas mudanças épicas e inéditas nas eras transatas. Os desconexados de juízo na mente não perce-

bem o grandioso no incógnito das turbulências que desastram os endeusados dos poderes terrenos. É o que se consuma na tábua dos martírios nessas mudanças redentoras. O que se presencia na roldana dos suplícios faz parte das lâminas no crivo da depuração. Será o fogo que queimará nas chamas os maus e iluminará a luz dos bons.

Deus, retratado por Michelangelo, no teto da Capela Sistina CONTINUA


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