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Pareceristas Prof.ª Dnda. Núbia Ferreira Administradora, Economista, FCETM - nubiaf@terra.com.br Prof. MSc. Carlos Eduardo do Nascimento Advogado e Consultor Tributário - censo@terra.com.br Link para currículo: http://lattes.cnpq.br/7861147311654699 Prof.ª MSc. Eliana Freitas Silva Pedagoga e Mestre em Educação/ Professora e Coordenadora do Curso de Pedagogia / CESUBE elianafreitassilva@hotmail.com Prof.ª Dr.ª Renata Teixeira Junqueira Freire Mestrado (1997) e Doutorado (2004) na PUC - São Paulo em Educação: Psicologia da Educação. Diretora do Colégio Marista Diocesano - rjunqueira@marista.edu.br Prof.ª Dr.ª Andréa Queiroz Fabri Doutora em Direito Econômico pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora de cursos de graduação e pós-graduação, atualmente, diretora do curso de Direito da Universidade de Uberaba. afabri@terra.com.br Prof.ª MSc. Edileuza Pereira Silva Mestre em Economia / UFU - Professora e Coordenadora na Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro – FCETM - edisilva@hotmail.com)

O domínio do conhecimento é representado por esta imagem onde o mapamundi está estampado na cabeça, sobrepondo-se ao cérebro.

Prof. Dr. José Querino Tavares Neto Professor Adjunto da Faculdade de Direito da UFG, Professor Titular do Mestrado em Direito da UNAERP. Doutor e Sociologia pela UNESP-Araraquara e Pós-doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra. - josequerinotavares@gmail.com Prof.ª MSc. Rosemar Rosa Mestre em Educação; Professora do CESUBE - rosemarosa@hotmail.com Prof.ª MSc. Marta Candido Moreira Mestre em Educação; Esp. Em Alfabetização e Psicopedagogia, Pedagoga, Coordenadora de Ensino Fundamental I, Professora do CESUBE. - martacmoreira@terra.com.br Prof. MSc. Carlos Roberto Souza Carmo Mestre em Ciências Contábeis e Financeiras pela Universidade de Uberaba carlosjj2004@hotmail.com Revisão e organização Prof. Esp. Mariângela Castejon (FCETM – mastejon@yahoo.com.br) Prof. MSc Rodrigo Henrique Batista (UFU - nhegrayz@yahoo.com.br) Dezembro / 2010 ACIU / FCETM / CESUBE – Todos os direitos reservados

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Revista Saberes Acadêmico. -- v.2, n.2, novembro 2010 Uberaba, MG: Távola, 2009 Semestral Publicação do Sistema ACIU ISSN 2177-7381 1.Educação. 2. Direito. 3. Responsabilidade Social. 4. Cultura. 5.Contabilidade. I. Título. CDD 370

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EXPEDIENTE

Associação Comercial, Industrial, e de Serviços de Uberaba

Av. Leopoldino de Oliveira, 3433 • Cep:38010-000 Uberaba/MG • Fone: (34) 3331.5500 Presidente: Karim Abud Mauad Executiva: Ana Paula Cunha de Oliveira Editora e Jornalista responsável: Carmen Amancio - MTB 10.941

DIRETORIA EXECUTIVA

Presidente: Karim Abud Mauad Vice Presidente: Samir Cecílio Filho 1º Diretor Tesoureiro: Manoel Rodrigues Neto 2º Diretor Tesoureiro: Nardival Sebastião da Silva 1ª Diretor Secretário: Victor Aragão Netto 2º Diretor Secretário: Mauro Cezar Barbosa Diretor Executivo: Arnaldo Prata Filho Diretor Executivo: Luiz Artur Paiva Correa

DIRETORIA TITULAR Agnaldo José Silva Alceu Chrusciak Altamir Araújo Roso Filho Ângela Maria Pena R. Oliveira Antônio José Bessa Arão Rodrigues Sousa Carlos Alberto Saraiva Célio Pio de Faria Freitas César Augusto de Morais Cristiano Vilaça Fernando Cecílio Helbert F. Higino de Cuba

José Carlos de Mello José Maria M. C. Junior José Saad Duailibi Kenedy Carvalho Lenira Boscolo V. Riceto Leonice Maria P. Capucci Márcio Elísio de Oliveira Marcos Juliano Bordon Nádia Alves de Carvalho Nilton Luiz Camilo Paulo Fernando Mattar Rodrigo Felipe Lisboa Weber Pimenta de Melo

CONSELHO FISCAL

Anderson de Melo Cadima • Florêncio Guimarães Borges Pedro Umberto Carneiro • Rodrigo Prata Laterza José Ferreira Peixoto

CONSELHO CONSULTIVO

Adilson Pereira de Almeida • Carlos Eduardo R. C. Colombo César Sebastião Martins • Flamarion Batista Leite Hugo Rodrigues da Cunha • José Curi Peres José Victor Aragão • Marcos Felipe Abud Milton Duarte Vilela • Sérgio Bóscolo • Wilson Pinheiro

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apresentação O gosto pela escrita cresce à medida que se escreve. Erasmo de Rotterdam Organizar e revisar uma obra literária ou técnica, não é nada simples, uma vez que se deve respeitar a autoria, mas destaco que é um privilégio. E ainda, contar com o apoio de pessoas amigas e influentes; é um privilégio ainda maior. Dessa forma, aumenta a responsabilidade e a preocupação com a qualidade e eficiência do trabalho, que deverá ter sequência e contribuir com os estudiosos, no sentido de enfrentar os desafios para reafirmar a identidade de valores, de sonhos e de compromissos com a transformação da sociedade numa perspectiva multicultural que nutra a vida. Abrir possibilidades uma vez que os temas ora abordados levam seus construtores e leitores à reflexão e, não raro, a se redimensionarem enquanto sujeitos-protagonistas na história que escrevem/leem. Abrem espaços à reinvenção de novas formas de estarem no mundo e com o mundo, tendo como referencial a ética e o diálogo. Toda a ciência físico-humano-psicológica, toda a tecnologia, todo o milenar progresso da humanidade encolhem-se diante do vigoroso pensamento de Sócrates: o princípio da sabedoria consiste em saber que nada sabemos. Lutas e conquistam se processam. Teorias sucedem teorias. A própria ciência abdicou da estabilidade. Não obstante, gradativamente lançam-se fundamentos para uma luminosa ciência da vida, uma ciência da pessoa humana, uma ciência, sobretudo da mente humana. Na encruzilhada histórica em que vivemos, o ser humano tateia e apela por critérios seguros para entender sua própria condição e para reorientar suas programações mentais. E, parafraseando Bertold Brecht, “Eu sustento que a única finalidade da ciência está em aliviar a miséria da existência humana.” Desse modo, a leitura e feitura de textos devem constituir o ponto de partida e o ponto de chegada nos estudos, já que nos utilizamos de recursos/elementos históricos, políticos, sociais e estilístico para a sua compreensão. Como nada acontece por acaso ou por simples geração espontânea. Tudo tem um começo, um porquê, uma história, também este livro não caiu pronto do céu, nem nasceu da noite para o dia. Ele é fruto de um processo e trata-se, portanto, de uma experiência concreta. No trabalho educativo não há conclusões, nem formaturas, somos todos eternos estudantes. Assim, é que se pode dizer que as contribuições reunidas neste volume são também uma tentativa de estabelecer uma relação politicamente significativa para todos os que dela participaram, no sentido de fazer ver a possibilidade de uma cena ou plataforma comum em que se possam construir novos percursos. Esperamos que continuem nos inspirando, como testemunhar nossos trabalhos escritos e que possam, de agora em diante, também inspirar seus leitores. Deixo, assim, meus sinceros agradecimentos a direção da Aciu, da Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro, do CESUBE, da equipe da Távola, aos pareceristas e a todos que direta ou indiretamente nos ajudaram. Mariângela Castejon

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sumário ARTIGOS

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A Construção do Conhecimento Ensino e Aprendizagem: Perspectivas e Desafios de Docentes da Administração Estupro Marital Mensuração de Resultado: Uma abordagem baseada na Gestão Econômica Reorganizações Societárias de Empresas do Agronegócio Responsabilidade Social Corporativa e a Superficialidade do Marketing Social Teste de Impairment e sua Evidenciação: Uma análise sobre as práticas adotadas por algumas entidades em 2008, para atendimento às determinações do pronunciamento técnico CPC01

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Textos Literários Até onde vai Alan Damas

Um pouco do cotidiano de todos nós... Antônio Fernando

Dentro de mim

Bruno Henrique Pereira

Quero te amar Danilo

Enquanto chovia... Gilson Crispin

Contradição

Juliana Naves

Ponto de Vista Juliana Naves

Felicidade e Sucesso

Lucas Amoni Leite Lemos

Lá vem o Censo de novo!!! Lúcio A. Silva

O dilema da escolha

Marcelo Henrique Pereira

Deixa eu te contar

Sidney Alvim Pimenta

Domingo outra vez Sidney Alvim Pimenta

“Escutatória”... A arte de saber ouvir para gerir Tallita Machado de Oliveira

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A Construção do conhecimento

Tássia Beatriz Machado Alvim1

RESUMO Este paper tem como objetivo a realização de algumas reflexões quanto ao processo de construção do conhecimento, bem como quanto ao posicionamento da Escola Cidadã frente o conhecimento e ainda quanto aos desafios educacionais envolvidos ao tema. Entende-se que a construção do conhecimento requer uma atividade reflexiva, não podendo ser o sujeito alheio ao contexto social, humano e político que o cercam. Diferentemente de um ato de transmissão, a construção requer envolvimento e consciência crítica. Não obstante a isso, defrontamo-nos com as inúmeras dificuldades e desencontros vividos pelos educadores diante dessa necessidade de construção do conhecimento e formação de cidadãos ativos, capazes de participar e transformar a sociedade de maneira a libertar os oprimidos do estado de carência intelectual, humana, social e política em que muitos ainda se encontram. Palavras-chave: conhecimento - construção - consciência crítica

RESUMÉN Este trabajo pretende realizar algunas reflexiones sobre el proceso de construcción del conocimiento, así como en el posicionamiento de la Escuela Ciudadana y siguen afrontando el conocimiento sobre los desafíos educativos que participan en el tema. Se entiende que la construcción del conocimiento requiere una actividad reflexiva, el sujeto no puede estar ajena al entorno social, humano y político que lo rodea. A diferencia de un acto de transmisión, la construcción requiere el compromiso y la conciencia crítica. A pesar de ello, nos enfrentamos a las muchas dificultades y problemas que tienen los educadores en esta necesidad de creación de conocimientos y la formación de ciudadanos activos, capaces de participar y transformar la sociedad con el fin de liberar a los oprimidos el estado de falta de intelectual humana , y la política social en el que muchos todavía lo son. Etiquetas: conocimiento – La construcción – conciencia crítica 1. O Conhecimento Nas palavras do professor Rosas (2003, p. 01), o “conhecimento é a relação que se estabelece entre sujeito que conhece ou deseja conhecer e o objeto a ser conhecido ou que se dá a conhecer”. Nessa perspectiva, fica clara a dinâmica existente entre sujeitos e objetos do conhecimento, uma vez que é necessário a interação destes para que o conhecimento verdadeiro se forme. Logo, a simples transmissão de dados, conceitos, teorias, técnicas, etc., não caracteriza a “construção” de conhecimento por parte do sujeito, e sim a mera apreensão das informações que lhe foram disponibilizadas sobre o objeto. Como ver-se-á, o conhecimento verdadeiro carece de conduta ativa à sua frente, devendo este ser não apenas apreendido, mas construído pelo sujeito. Veja-se a contrubuição de Moreira (2001) para a solidificação da idéia de dinâmica do conhecimento:

Olhando para o significado do conhecimento, percebemos que o conhecimento não é só produto mas também processo e, como processo, é perpassado pela ideologia. Considerando o significado do conhecimento, identificamos dois momentos dinamicamente dependentes mas, ao mesmo tempo, relativamente autônomos. O conhecimento é simultaneamente processo de construção do real e produto, ou seja, um corpo de informações sobre o real, sistematizado, elaborado, organizado. ( Moreira, 2001, p. 12)

Em outro trecho do mesmo autor; Em outras palavras, isso quer dizer que o conhecimento não é algo dado e acabado, produzido por determinados gênios. O conhecimento é um produto bem-determinado, situado dentro de relações sociais bem específicas, e orientado, de modo consciente ou inconsciente, para uma dada concepção de mundo. (Moreira, 2001, p. 23) Verifica-se nos trechos acima a consonância com as ideias já apresentadas. Ao afirmar que o conhecimento é processo e também produto, o autor mostra-nos como é necessária a transformação interna e pessoal do produto inicial recebido, a fim de que com o processo de construção real — que é realizado internamente a partir da reflexão e análise deste produto inicial 1 Bacharel em Direito. Advogada. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Direito Público Material pela Universidade Gama Filho. Pós-graduanda em MBA Gestão Empresarial pela FCETM. E-mail: tassiaalvim@ hotmail.com

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— seja construído então, esse novo produto, que será o conhecimento construído. Para que haja conhecimento, é necessária a atitude reflexiva do sujeito, devendo este, como se verá mais detalhadamente, se posicionar frente aos fatos, agregando ao objeto seus valores sociais, o contexto em que está inserido, o espaço e o tempo em que se situa, entre outras coisas. 2. A Construção do conhecimento Após observar o que se entende por conhecimento, falar-se-á sobre a construção deste, parte de uma atividade diária de aprendizado, reflexão, dinâmica e interatividade de cada um dos sujeitos que se encontrem envolvidos nesse processo. Pimenta (2002) define e explica, de maneira incisiva, a atividade de “construção do conhecimento”: A construção do conhecimento é o momento do desenvolvimento operacional, da atividade do aluno por meio da pesquisa, do estudo individual, dos seminários, dos exercícios, no qual se explicitam as relações que permitem identificar como o objeto de conhecimento se constitui (Libâneo, 1985). Nesse momento, a análise constitui a essência das atividades propostas pelo aluno, de modo que possa superar sua visão inicial, caótica, sincrética sobre o objeto do conhecimento. Mediante a análise, poderá construir uma visão qualitativamente superior, uma síntese nova e reelaborada. (Pimenta, 2002, p. 215)

Ao ressaltar a necessidade de análise do objeto do conhecimento, o autor mostra como é importante que seja feita uma reflexão e avaliação minuciosa e contextualizada do objeto, para que este passe de algo alheio para algo que faça sentido e se enquadre dentro das percepções e sensações vividas pelo sujeito. Após passar por todo este processo interno de reflexão que deve ser vivenciado pelo sujeito, é que será possível a ele ser capaz de assimilar e reelaborar as informações recebidas. E, frente a isto, ter a sua própria visão do objeto inicial do conhecimento que lhe foi apresentado, sendo esta crítica que dê origem a um novo objeto, reelaborado, que carregue em si algumas das características de quem ajudou mais uma vez a reconstruí-lo. 3. A Escola Cidadã e a Construção do Conhecimento Nos itens anteriores falou-se sobre o que se entende por conhecimento e sobre a necessidade de “construção do conhecimento”. Com tais esclarecimentos, procurou-se mostrar o quanto é importante a atividade reflexiva e a formação da consciência dos sujeitos, a fim de que estes sejam capazes de atuar ativamente neste processo, não sendo apenas meros receptores apáticos de informações, ato este de recepção que alguns nomeiam como “transmissão de conhecimento”. Ver-se-á, neste item, a relação entre a escola cidadã e esta concepção de conhecimento tratada neste ensaio. Observe-se o parágrafo de Krug e Azevedo (1999) sobre o tema: Na concepção da Escola Cidadã, o conhecimento buscado pelas professoras e professores é trabalhado como algo que se constrói e se reconstrói permanentemente, fruto da ação individual e coletiva dos sujeitos, apontando para a necessidade de sua democratização. Esse conhecimento busca superar a dicotomia teórica/prática, trabalho manual/trabalho intelectual, o caráter artificial e abstrato do ensino tradicional. Assim, tem na realidade a base da sua produção, constituindo conhecimentos que sejam socialmente úteis e que estejam articulados organicamente com o sistema produtivo, contrapondo-se à concepção de conhecimento pronto e acabado, que pode ser guardado, transmitido e manipulado, como pretendem os neoliberais com a imposição de um currículo hegemônico. (Silva, 1999, p. 11-12)

O parágrafo corrobora com a ideia de necessidade de dinamismo no ato de conhecer, bem como, contrapõe-se à mera atividade transmissiva de saberes. É pautada por esta concepção dinâmica e interativa da formação do conhecimento em que a escola cidadã atual trabalha. Nada mais de “decorebas” desvinculadas de quaisquer fatos e acontecimentos; nada mais de reprodução apática de saberes; é necessário que se construa o conhecimento. É necessário que as ideias sejam desenvolvidas e amadurecidas frente à atividade reflexiva ativa dos educandos. É necessário que eles não só participem, mas também se identifiquem com as situações, com as informações e com as experiências que lhes são propostas. Somente com toda esta interatividade e identificação é que se acredita ser possível que seja construído um conhecimento rico e satisfatório, que seja capaz de formar verdadeiros cidadãos que, por sua vez, sejam capazes de atuar ativamente na formação de sua sociedade, assim como foram capazes de se colocar de maneira ativa diante da construção e reconstrução de seus conhecimentos. Diante desta visão do conhecimento pela escola cidadã moderna, acrescenta-se os ensinamentos de Pimenta (2002): Nesse sentido, é função do ensino o desenvolvimento da capacidade de pensar e a aquisição de instrumentos necessários à ação, mediante a “interfluência entre o objetivo e o subjetivo, cuja essência é a experiência social em toda a sua multilateralidade e complexidade que se transforma em conhecimentos, habilidades e hábitos do educando, em ideias e qualidade de homem em formação, em seu desenvolvimento intelectual, ideológico e cultural geral” (Pimenta, 2002, p. 205)

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Depreende-se, pois, que a atividade educacional deve contribuir para que essa “interfluência” seja estabelecida e que, com isso, possa ser despertada a atividade reflexiva consciente do sujeito e, então, possa o conhecimento ser construído e reconstruído constantemente no transcorrer do processo educacional, mesmo na vivência cotidiana dos homens. 4. O desafio educacional A preocupação com a formação dos seres humanos, bem como com a questão do conhecimento, não é observada apenas nas áreas filosófica e educacional. O Estado tem preocupação constante com estes aspectos sociais, o que pode ser facilmente constatado com o trecho da legislação jurídica vigente contida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBn/9394/96), que em seu artigo 2º diz: “A educação é dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1996)” Ao falar em desenvolvimento pleno do educando, não se pode remeter a outra forma de pensar o conhecimento, senão aquela apresentada no transcorrer deste ensaio. Para que possa ser possível a formação para a cidadania, reflexão, consciência e atividade são características imprescindíveis. Dessa forma, a mera transmissão de saberes não seria suficiente para garantir, ou mesmo para auxiliar no desenvolvimento pleno do educando. No máximo, seria capaz de qualificar para o trabalho massificado. Esse que exige apenas a repetição de técnicas mecanizadas que, ao contrário de libertar e desenvolver os ideais de solidariedade humana, apenas garanta a sobrevivência física do indivíduo. Não é suficiente que se possa sobreviver. Espera-se mais dos seres humanos, que são seres aptos à evolução. Esperase construção de um futuro melhor. Para completar estes dizeres, valer-se-á das palavras de Rodrigues (2001): Isso significa, de outro lado, permitir que a cultura do povo, da forma como ela se manifesta em nível das tradições, de sua concepção de mundo, possa, também, ser atravessada pela escola. Não para moldar, fixar e limitar a atividade educacional, mas para estabelecer por onde ela deve iniciar, desenvolvendo a cultura do povo, ampliando a sua visão de mundo, dilatando a sua perspectiva de atuação político-social, econômica e cultural. Fazer com que a atividade educacional não seja, apenas, uma atividade de transmissão de um saber - sabido; nem seja apenas transmissão de uma tradição, mas que possam ir além. (RODRIGUES, 2001, p.39).

O referido autor, ao propor que a cultura do povo seja atravessada pela escola, pretende demarcar o ponto de partida da atividade educacional, que deve ser a observação do passado e do presente que envolve o educando. Salienta, ainda, que esta análise da cultura do povo deve servir ao trabalho de construção e reconstrução deste e, por meio da construção de novos conhecimentos, espera-se que seja possível “ir além”. Todavia, frise-se, a transmissão de saberes não é o que se pretende. O que se pretende é que, a partir da reflexão, da conscientização e atividade dos educandos, estes estejam aptos a construir novos conhecimentos e transformar sua realidade. Para finalizar estas reflexões, remeter-se às palavras do saudoso Paulo Freire (1987), sempre enriquecedor: Os oprimidos de ontem, que detêm os antigos opressores na sua ânsia de oprimir, estarão gerando, com seu ato, liberdade, na medida em que, com ele, evitam a volta do regime opressor. Um ato que proíbe a restauração deste regime não pode ser comparado com aquele que o cria e o mantém; não pode ser comparado com aquele através do qual alguns homens negam às maiorias o direito de ser. No momento, porém, em que o novo poder se enrijece em “burocracia” dominadora, se perde a dimensão humanista da luta e já não se pode falar em libertação. (FREIRE, 1987, p. 49)

Freire (1987), ao enfatizar a dinâmica do saber, traz para o debate uma importante questão, qual seja, a necessidade de nortear bem a construção do conhecimento. Para ser capaz de refletir, de agir e transformar, é necessário ter a preocupação constante de trabalhar a fim de que esse conhecimento volte-se em favor de garantir que os ideais anteriormente observados, de liberdade e solidariedade social, sejam postos em prática. Não é o bastante que a escola contribua para que o educando seja capaz de construir conhecimento, é necessário que este seja aquele capaz de “levar além”. Levar não apenas a um indivíduo, mas sim a toda a coletividade. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBn). Brasília: MEC, 1996. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987. MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa (Org.). Conhecimento educacional e formação do professor: questões atuais: In: ____ Políticas Educacionais. 4ª ed. Campinas: Papirus, 2001.

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PIMENTA, S. G. (Org.). Formação de professores: identidade e saberes da docência: In: _____. Saberes Pedagógicos e atividade docente. 4 ed. São Paulo: Cortez,2005. RODRIGUES, Neidson. Da mistificação da escola à escola necessária. São Paulo (SP) 10ª ed., Cortez, 2001. ROSAS, Vanderlei de Barros. Afinal, o que é conhecimento? Rio de Janeiro, 2003. p 01. Disponível em ‹http://www. mundodosfilosofos.com.br/vanderlei22.htm›. Acesso em 01 de maio de 2010. SILVA, Luiz Heron da (Org.). Século XXI: qual conhecimento? Qual currículo?: In:_____Século XXI: qual conhecimento? Qual currículo?. 1ª ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

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Ensino e Aprendizagem: Perspectivas e Desafios de Docentes da Administração Bruno Ricardo Teixeira1 Mateus Ferraz Prado2

Resumo O presente artigo aborda o ensino da Administração, sob o prisma das perspectivas e desafios inerentes à profissão docente na área. Ao discutir a capacitação profissional, as estratégias de ensino disponíveis e os vieses paradigmáticos que permeiam o processo ensino-aprendizagem da Administração, apresentamos os pontos nevrálgicos que acompanham diretamente os professores ao longo de sua carreira, e os alunos de Administração ao longo de sua permanência na graduação. Para ensinar, é preciso ser inicialmente um aprendiz inveterado, com olhares e perspectivas que bendizem as mudanças e adaptações sob as quais estão expostas as organizações e os mercados nas quais elas se inserem. E é esse aspecto camaleônico que rege os ditames da profissão docente na área da Administração, que se apresenta aos professores como desafio rumo à construção do conhecimento discente. Este não apresenta resultados formais, mas incita o leitor a despertar para alguns aspectos vitais que acompanham o dia-a-dia da docência na administração. Palavras-Chave: Administração, Ensino, Aprendizagem

Abstract This article is intended to discuss the teaching of administration, under the prism of the perspectives and challenges inherent to the professor of this area. By discussing the professional capacitation, the teaching strategies available and the paradigmatic biases that lies in the teaching-and-learning of administration, we shall present the neuralgic spots that straight follow the professors along their carreer , as well as the administration students along their path through graduation. One is only able to teach only after he becomes an inveterate learner, with eyes and perspectives that welcome the changes and adaptations under which the organizations and markets are exposed to. And that’s the chamaleonic aspect that runs the dictates of the teaching of administration, presented to the professors as the challenge toward the student’s building of knowledge. This article does not present formal results, but incites the reader to arouse for some vital aspects that accompany the daily situations of the teaching of administration. Key-words: Administration, Teaching, Learning. I. Introdução Neste ano de 2010, a profissão do administrador completa 45 anos de reconhecimento legal, cuja demanda por cursos de administração, que tiveram início na década de 60, apresentou acréscimo acentuado nos últimos 20 anos em nosso país, tanto pelo reconhecimento da necessidade do profissional da Administração pelo mercado, quanto pelo incentivo governamental de inserção no ensino superior. Com essa expansão, aumentou também a demanda pelo corpo docente, parte fundamental na formação qualificada destes profissionais. Admite-se que, para atingir esse objetivo, é preciso que o professor seja devidamente capacitado, possuindo as características didático-pedagógicas inerentes ao caráter docente, bem como as habilidades teórico-práticas intrínsecas à disciplina que leciona. Em meio a uma diversidade de disciplinas que compõem o curso de Administração, encontram-se os professores, responsáveis pela transferência do conhecimento para a composição profissional de cada um de seus alunos. No entanto, a responsabilidade do docente vai além do mero domínio de sua disciplina, estendendo-se ao conhecimento da pluralidade de conceitos e ao ecletismo que abrangem o ensino da Administração. Diante dessa realidade, o objetivo desse artigo é versar sobre o processo de ensino e aprendizagem no curso superior de Administração, apresentando as perspectivas e desafios que permeiam a atividade docente nessa área. A maneira como este artigo está organizado é a seguinte: neste primeiro tópico, elabora-se esta introdução para apresentar o tema do mesmo; no segundo, aborda-se a capacitação docente como ponto de partida do processo ensinoaprendizagem; no terceiro, discute-se o perfil técnico do professor de Administração, abordando-se a dualidade existente entre 1 Mestrando

pela Universidade Federal de Uberlândia em Gestão Financeira e Controladoria. Pós-graduado em MBA Gestão Empresarial – Lato Sensu. Graduado em Administração com Habilitação em Comércio Exterior. Professor pela Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro. (34) 3325-4685 // 9996-9118 – brunort@netsite.com.br 2 Mestrando pela Universidade Federal de Uberlândia em Gestão Financeira e Controladoria. Graduado em Administração pela Universidade Federal de Uberlândia. (34) 3213-1388 // 9169-2609

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especialização e polivalência; no tópico, são apresentados alguns dos desafios existentes na implementação de mudanças na forma de ensinar a Administração. A partir dessas evidências, no quinto e último tópico, são tecidas algumas considerações finais. II. Ponto de partida: capacitação docente O cenário mundial, arraigado no processo de globalização e ditado pela competitividade, demanda de cada um de nós, resultados cada vez mais pontuais e tangíveis. A manutenção do status quo afasta-se cada vez mais da realidade vivenciada em qualquer empresa, exigindo que o profissional pragmatize suas habilidades, desenvolvendo seu diferencial de mercado, açambarcando o real sentido de competência. Semântica ou etimologicamente, várias são as classificações para a palavra “competência”. Certo mesmo é que não há consenso definido sobre sua real tradução para o âmbito de sua aplicabilidade no mundo competitivo moderno. Em contrapartida, parece haver um claro consenso das exigências e expectativas oriundas do mercado para com seu capital intelectual, no qual o administrador, por ser o provedor sinergístico de uma organização, encaixa-se perfeitamente nessa regra. As demandas sobre suas competências são transformadas imediatamente em números, em resultados. O administrador competente é aquele que produz, na transcendência do defasado conceito de lucro, em direção da agregação de valor ao seu escopo de atuação. Ter competência não se restringe mais ao acúmulo de conhecimento ou de habilidades dissociadas de suas práticas. “Saber”, é diferente de “saber fazer”; “saber” e “saber fazer” é diferente de “saber ser”. Competência é a capacidade de unir estes três conceitos (SIROOBANTS, 1997; LE BORTEF, 1994; apud SANT’ANNA, 2007). No entanto, ninguém nasce sabendo nada, a não ser o saber reagir ao meio no qual estamos inseridos de forma instintiva. Ao longo de nossas vidas, adquirimos conhecimento, interagimos com realidades diversas, nos capacitamos direta ou indiretamente, ao passo que nos desenvolvemos intelectualmente em concomitância com nosso desenvolvimento biológico natural. Em princípio, a abordagem francesa primava que competência era a capacidade ou qualidade que devemos possuir para ocupar uma vaga de trabalho (Zarifian, 1996). Por essa ótica, o profissional da administração, ou o docente em uma instituição de ensino superior, em um curso de Administração, basta ter um acúmulo de pré-requisitos técnicos necessários à execução de sua atividade. Para Nunes e Barbosa (2003), esse pensamento distancia o “ser” competente de suas iniciativas e de sua subjetividade em detrimento do raciocínio taylortista da rotina e da automação. Para Ferretti (1997), essa premissa do “ser” competente abre espaço ao “ser competente” no complexo mundo globalizado em que vivemos hodiernamente. Para o autor, admite-se um deslocamento do modelo de qualificação para o de competência, esta última relacionada com a capacidade de mobilizar conhecimentos e saberes (...) adquiridos por meio da formação, da qualificação e da experiência profissional (Desaulniers, 1997). Sant’Anna (2007) vai além e pondera a competência como resultante da combinação de múltiplos saberes – saber-fazer, saber-agir, saber-ser – capazes de propiciar respostas com bom êxito. Desta maneira, é possível entender a competência em seu contexto moderno, como a capacidade de pragmatizar conhecimento e habilidades nas variadas situações cotidianas e contingenciais, na transformação de problemas em soluções, ditadas pela performance de agregação de valor em cada ação de um indivíduo. Tal discussão, inerente à docência no ensino superior, em enfoque principal da graduação em administração, faz emergir disputas entre concepções essencialmente complementares, pois, apenas consideradas assim, são capazes de enriquecer o campo em questão. Entre os diversos embates, pode ser citada a tentativa da gênese de uma abordagem megaparadigmática ante a multiparadigmática (FISCHER, 2001); a valorização do conhecimento teórico ante o prático (MATTOS, 2003); a formação de profissionais para a academia ou para o mercado (FESTINALLI, 2005) e a valorização da experiência docente ou da vivência gerencial para a formação do professor (SOUZA-SILVA e DAVEL, 2005). Na tentativa de descrever a capacitação ideal para a prática docente em administração, diversas abordagens podem ser relacionadas. De acordo com Souza-Silva e Davel (2005), o modelo ideal de professor para a área seria alguém com alta experiência docente e alta vivência gerencial consiga transitar tanto no campo da docência quanto da vivência gerencial, além da capacitação de contextualizar o conhecimento na prática. Estes autores ainda discutem a necessidade de capacitação dos docentes, o que implica na busca por novas abordagens (mais sócio-práticas) para o melhor desenvolvimento dos professores. Segundo Fischer (2001), quanto ao campo de organizações e gestão, afirma que “reconhecer a sua complexidade e discutir alternativas para ensinar e aprender a partir da natureza pluriparadigmática da área é o nosso desafio a seguir”. Ou seja, a autora defende a impossibilidade de surgir uma síntese dos paradigmas (um megaparadigma) capaz de representar a pluralidade e suprir as necessidades do campo. Ainda, para Fischer (2001), o docente deve estar inserido em um contexto em que ocorre a adoção de um currículo que fuja da abordagem funcionalista e consiga relacionar-se com o contexto cultural e da natureza da área, além de desenvolver nos discentes competências socialmente desejáveis. Já Salm et al. (2007) enfocam o fato de que “torna-se imperativo que o curso de administração incorpore esses novos valores, [...] que privilegiem o bem comum – a biosfera – sobre o interesse próprio [...] promova pesquisas associadas a eles e defina uma prática docente mais coerente”. Logo, volta-se a atenção para a formação de um aluno consciente, dotado de senso crítico, melhor cidadão, além de profissionalmente competente.

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III. Estratégias de Ensino e a Orientação do Docente: Polivalência ou especialização? A ciência da Administração per se traduz-se na visão ampla e sistêmica de uma miríade de teorias arraigadas em áreas diversas que convergem direta ou indiretamente aos interesses de uma organização. E esse ambiente no qual o professor de Administração requer ecletismo teórico e versatilidade lúdico-pragmático. Em um mercado cada dia mais globalizado e competitivo, entendemos e vivenciamos a necessidade de o profissional da administração trazer consigo habilidades teóricas e práticas que o permitam tomar decisões acertadas sob as mais variadas circunstâncias. Para fazê-las, o arcabouço de conceitos e vivências adquiridos ao longo de seu curso de graduação deve estar em consonância com os ditames do mercado. Essa é a responsabilidade pela qual arcam os docentes de administração, que devem estar aptos a prover estas experiências e conceitos múltiplos. Para tanto, escolher as estratégias de ensino, independente da matéria a ser lecionada, é o fator crucial do sucesso docente. E, como forma de trazer o mundo profissional para dentro da sala de aula, existe uma perceptível tendência dos professores do curso de Administração fazem uso estudos de caso (IKEDA, VELUDO-DE-OLIVEIRA, CAMPOMAR, 2005). Estas estratégias objetivam inserir o aluno no contexto organizacional, colocando-o no papel de quem toma a decisão, possibilitando a simulação dos desafios e os riscos envolvidos com os resultados de suas decisões, na visão de BRUNSTEIN e MIGUEL (2007). Tal ferramenta encontra-se disponível em livros, embora a adequação ao assunto ou ao tema abordado nem sempre seja possível, o que exige do professor habilidades para formatar um estudo de caso fictício relacionado à sua abordagem, ou de trazê-lo de suas experiências de mercado. Mas essas demandas podem ir além. Lima (2003) apresenta uma proposta digital dos estudos de caso, através da navegação hipertextual por meio de interfaces gráficas, corroborando com as exigências de um professor da administração na atual era do conhecimento. Ademais, Silveira et al (2007) salientam a importância de uma metodologia de ensino da lógica aplicada à administração, calcada no ensino através de algoritmos computacionais, que requerem do professor uma maior proximidade da informatização. Vale destacar que inovar em metodologia de ensino pode fazer com que os alunos vivenciem na prática como é estar dentro de uma organização. E é nessa vertente que muitas Instituições de Ensino Superior (IES) disponibilizam aos seus alunos a Empresa Júnior, onde ele tem a possibilidade de relacionar-se e adaptar-se com o mercado de trabalho (BICALHO, PAULA, 2009). Para tanto, o aluno deve estar assistido por professores competentes e familiarizados com o mercado de trabalho, para que os serviços de consultoria e/ou assessoria sejam prestados a contento, em harmonia com os preceitos teórico-práticos. Em parceria com essa metodologia de ensino, é possível que o professor inove ainda mais, com a utilização do software EDUMAP, que proporciona o mapeamento das competências profissionais do aluno, na perspectiva de ITUASSU, GOULART, e DURÃO (2009). Dessa maneira, poder-se-ia fazer com que o aluno executasse estrategicamente atividades na empresa júnior de acordo com suas aptidões. Mas antes de buscar uma estratégia de ensino adequada ao desenvolvimento pessoal e profissional dos egressos, é preciso ter como norteador deste processo o apontamento de que “A significância da aprendizagem está, em grande parte, diretamente vinculada com a sua funcionalidade” (BRUNSTEIN e MIGUEL, 2007, p. 3). Destaca-se (grifo no original dos autores) nesta afirmação a capacidade de utilização dos conceitos e métodos aprendidos na vida profissional do egresso. Ou seja, para garantir a eficácia da estratégia de ensino, é preciso que a mesma esteja alinhada com a aplicação prática na atividade administrativa. Nessa lógica, as famosas perguntas “no que isso vai me ajudar no futuro enquanto profissional?” não podem figurar entre os alunos; e se aparecerem, a estratégia está inadequada e exige correção. Outro ponto digno de análise é o envolvimento dos discentes com o processo, afinal, a motivação e interação entre a estratégia, o conteúdo, o professor e o alunado representam o pré-requisito para a implantação de uma estratégia de ensino eficaz. (BRUNSTEIN e MIGUEL, 2007; SILVEIRA et al. 2007). Assim, determinadas as condições necessárias para a implantação das estratégias de ensino, torna-se possível a discussão referente às mesmas. De acordo com diversos autores, o método de ensino que melhor se alinha aos objetivos estabelecidos (desenvolvimento pessoal e profissional dos discentes) é dos estudos de caso. Bhatti (1985 apud LIMA, 2003) apresenta as competências desenvolvidas ao adotar este método: (1) capacidade de pensar e analisar as situações criticamente; (2) o processo decisório – identificar o problema, elencar alternativas, selecionar a adequada e aplicá-la; (3) discernimento entre as diversas opções de ação; (4) o estudo das variáveis envolvidas e das hipóteses de ação; e (5) a verificação da funcionalidade prática dos conceitos estudados. Parece-nos inquestionável que o professor de administração deva ser realmente polivalente e tenha, ao mesmo tempo, conhecimentos aprofundados sobre sua área de atuação e da(s) disciplina(s) que ministra. No entanto, o jargão popular “quem faz de tudo, não faz nada bem feito” deve ser levado à reflexão, contextualizada ao âmbito do ensino da Administração. Fica, portanto, a pergunta: qual o denominador comum entre o ganho na abrangência e a perda na profundidade? IV. O desafio da ruptura de paradigmas Mudanças nunca são fáceis de serem implementadas, independente do contexto que elas se apresentem. Se transcender as barreiras de nossas próprias zonas de conforto comumente demanda um grande esforço de cada um de nós,

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não é difícil imaginar o quão árduo pode ser romper com paradigmas que vigoram em uma sociedade. O papel do docente da Administração está calcado na lógica da reprodução, herdado por uma academia conservadora e elitista, que reproduz o modelo mecanicista das organizações do mundo industrializado (AKTOUF, 2005; CROSS, ANTONELLO, 2007). Inovar, portanto, no ensino da ciência da Administração, requer transpor desafios. Modelos — estão presentes em todos os âmbitos de nossas vidas, apresentando-se como estereótipos do fazercorreto, agir-correto, pensar-correto e ser-correto. A ciência da Administração não se furta a esses vieses, e, conforme Paula e Rodrigues (2006), vivenciamos a era de sua “macdonaldização” do ensino, em que a qualidade da formação discente dá espaço à obtenção das melhores curvas de retorno e da busca pelos diplomas de ensino superior (CRUZ, 2009). Dessa forma, tanto professores quanto alunos acabam sendo agentes de manutenção do status quo, alheios aos seus reais interesses, sentimentos e valores, em detrimento de soluções prontas e respostas inquestionáveis (PAULA, RODRIGUES, 2006), mas que, para os autores, acaba gerando uma constante insatisfação com os cursos na área da Administração. Nessa lógica, diversos autores discutem a mercantilização do ensino e as implicações na experiência do docente. Cruz (2009), através de um artigo particularmente interessante, relata “causos” ocorridos ao longo de sua incipiente carreira docente, sendo que se destacam neste relato algumas percepções, como a de que, aparentemente, os alunos não cultuam o conhecimento, mas sim o diploma; que os sujeitos alunos perderam suas referências; mas, principalmente, que a nova relação vigente (principalmente dentro do ambiente privado) em sala de aula: o aluno é agora um cliente da escola. Ainda sobre esta questão, Paula e Rodrigues (2006) apontam para o insucesso tanto do conteúdo quanto dos métodos e estratégias de ensino resultantes desta “mercadorização” do ensino e da massificação da educação superior, sem uma respectiva contrapartida na qualidade resultante do aprendizado. No trabalho desses autores, fica retratada uma questão, no mínimo, interessante: ao tentar implementar uma disciplina voltada para o raciocínio crítico, os alunos não adotaram a ideia como algo adequado. Ao contrário, avaliaram a experiência como desaconselhável. Este resultado encontrado faz emergir outro questionamento: o aluno cliente está realmente interessado em tornar-se um indivíduo crítico, ou quer repetição, modelos de aplicação prática, soluções prontas e respostas irretocáveis, obtidos mediante um referencial adequado, mastigado e aulas expositivas? Sobre isto, Cross e Antonello (2007) discutem as críticas a este modelo de ensino positivista e formatado de gestores que, em comum, abordam a necessidade de novas formas de aprendizagens. Os grupos de críticas, tal qual afirmam os autores em questão, centram-se, principalmente, em dois núcleos: Henry Mintzberg e colaboradores, que questionam “a eficácia dos programas, acusando-os de não capacitar para a gestão, embora façam crer que capacitem” (MINTZBERG, 2006, apud CROSS e ANTONELLO, 2007, p. 2). Por outro lado, autores filiados aos Critical Management Studies (estudos críticos de gestão), entre os quais Reynolds, apresenta-se como um dos maiores representantes, apontam para: simplificação dos fenômenos e relações estudadas; aprendizagem através da memorização de modelos e técnicas de gestão; diminuto incentivo à autonomia e raciocínio crítico; e ao “processo de ‘mercadorização’ do ensino” (WOOD JR; PAES DE PAULA, 2004, apud CROSS e ANTONELLO, 2007, p. 2). Outro autor que apresenta uma crítica em relação ao atual modelo de ensino é Aktouf (2005), que discute a importância de alterar a visão de gestor que vem sendo reproduzida, em que o único balizador capaz de orientar as ações dos profissionais é o lucro econômico. Ele ainda apresenta a necessidade de inserir, na lógica do gestor (e do mundo corporativo como um todo), a sensibilidade às questões ambientais e à responsabilidade social. Ou seja, o indivíduo precisa perceber-se inserido na sociedade e agente catalisador de mudanças. O autor afirma, em suma, que “o papel do professor é, por conseguinte, o de suscitar sensibilidade para os aspectos humanos e não o de formar futuros estrategistas ou futuros técnicos em administração” (AKTOUF, 2005, p. 158). Todavia, se inovar é preciso, acaba, por dedução, sendo possível, uma vez que para Freitas (2007) basta “aceitar outras perspectivas e outras visões, abdicando do narcisismo teórico (...), pois o mundo é muito mais complexo que qualquer modelo possa dar conta de explicar”. De acordo com Barros e Souza (2009), um bom começo na tentativa de quebrar esse paradigma é inserir os estudantes de forma ativa no processo de aprendizagem, transformando-os em co-autores na construção do conhecimento, encorajando-os a construírem uma reinterpretação crítica da gestão e da teoria organizacional, no processo da pedagogia crítica, apresentado por Paula e Rodrigues (2006). Aktouf (2005) ainda propõe, neste processo de mudança, dar maior atenção ao estudo de monografias ao invés de estudos de caso, e privilegiar os estudos in locus, na promoção de uma abertura à sensibilidade dos alunos frente a problemas como o desemprego, o meio-ambiente e as desigualdades sociais. Podemos transformar a aprendizagem de alunos de Administração com o estratégico uso, em sala de aula, de filmes, artigos, recortes de jornal, excertos de notícias de TV, fotografia, literatura, belas artes e música, contextualizadas ao conteúdo de interesse ou como coadjuvantes em um processo de desconstrução de dogmas e convicções viciosas que permeiam muitos temas abordados em salas de aula. Para Souza, Barros e Souza (2009), fugir dos objetivos programáticos da disciplina pode ser enriquecedor, pois pode abrir espaço para outras análises e pontos de vista não passíveis de abordagem na metodologia de ensino convencional.

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V. Considerações Finais A arte de ensinar a ciência da Administração traduz-se na busca incessante da melhor forma de transferir conhecimento docente ao discente. Essa busca é composta de inúmeras variáveis, cujas combinações retratam o perfil de cada professor e seu comprometimento com seu trabalho. Para isso, pode-se escolher os caminhos pré-existentes, arraigados na máxima “se sempre foi assim, assim continuará sendo”. No entanto, se o profissional da Administração precisa estar em consonância com o mundo globalizado, preparado para trabalhar num ambiente de constantes mudanças, o ensino dessa ciência também deverá fundamentar-se nesses parâmetros. Para tanto, os professores, atores responsáveis pelo processo ensino-aprendizagem, devem buscar sua capacitação condizente com esses ditames e sua conscientização da responsabilidade que lhes é confiada, aliando senso crítico e habilitação técnica intrínsecas ao perfil do profissional da administração, esteja ele dentro da academia, ou pragmatizando teorias no ambiente organizacional. Este é o resultado principal deste trabalho: apontar para as perspectivas na docência da Administração, apresentando os desafios que acompanham a trajetória dos professores dentro e fora da sala de aula. Referências AKTOUF, Omar. Ensino em administração: por uma pedagogia para a mudança. Organizações & Sociedade, Salvador, v. 12, n. 35, p.151-159, out. 2005. BASTOS, Fabrício César et al. Formação de administradores: um estudo sobre competências docentes na ótica de alunos e professores. In: ENEPQ, 2., 2009, Curitiba. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2009. v. 01, p. 01 - 16. CD-ROM. BICALHO, Renata de Almeida; PAULA, Ana Paula Paes de. Empresa Júnior e a reprodução da ideologia da administração. In: ENEPQ, 2., 2009, Curitiba. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2009. p. 01 - 16. CD-ROM. BRUNSTEIN, Janete; MIGUEL, Lilian Aparecida Pasquini. Aprendizagem significativa, memorização compreensiva e funcionalidade do conhecimento: reflexões sobre casos para ensino como trabalho de curso no ensino superior. In: ENEPQ, 1., 2007, Recife. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2007. p. 01 - 10. CD-ROM. CROSS, Lisiane; ANTONELLO, Claudia Simone. Aprendizagem transformadora: integrando a reflexão crítica na formação gerencial. In: ENEPQ, 1., 2007, Recife. Anais... . 2007: Anpad, 2007. p. 01 - 13. CD-ROM CRUZ, Breno de Paula Andrade. “Causos” de um professor de administração na hipermodernidade. In: ENEPQ, 2., 2009, Curitiba. Anais... . 2009: Anpad, 2009. p. 01 - 13. CD-ROM. FESTINALLI, Rosane Calgaro. A Formação de Mestres em Administração: por onde Caminhamos? Organizações & Sociedade, Salvador, v. 12, n. 35, p.135-150, out. 2005. Trimestral. FISCHER, Tânia Maria Diederichs. A Difusão do Conhecimento sobre Organizações e Gestão no Brasil: Seis Propostas de Ensino para o Decênio 2000/2010. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, Edição Especial, p.123-139, out. 2001. Trimestral. FREITAS, Maria Ester de. A carne e os ossos do ofício acadêmico. Organizações & Sociedade, Salvador, v. 14, n. 42, p.187191, jul. 2007. IKEDA, Ana Akemi; VELUDO-DE-OLIVEIRA, Tânia Modesto; CAMPOMAR, Marcos Cortez. A tipologia do método do caso em administração: usos e aplicações. Organizações & Sociedade, Salvador, v. 12, n. 34, p.141-159, jul. 2005. Trimestral. ITUASSU, Laura Trindade; GOULART, Íris Barbosa; DURÃO, Edson Andrade. Inovação em sala de aula: mapeamento de competências profissionais de alunos de pós-graduação. In: ENANPAD, 33., 2009, São Paulo. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2009. p. 01 - 17. CD-ROM. LIMA, Marcos Cerqueira. Estudos de casos hipertextuais: rumo a uma inovação no método Harvard de ensino de gestão. Revista de Administração Contemporânea, Salvador, v. 7, n. 3, p.77-99, jul. 2003. Trimestral.

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MATTOS, Pedro Lincoln C. L. de. Teoria Administrativa e Pragmática da Linguagem: Perspectivas para Problemas que Afligem as Relações entre Acadêmicos e Consultores. Educadores e Educandos. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v. 02, n. 07, p.35-55, abr. 2003. Trimestral. NUNES, Simone Costa. O ensino de administração com base na abordagem das competências: da inserção no projeto pedagógico a prática em sala de aula. In: ENANPAD 2009, 33, 2009, São Paulo. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2009. p. 01 - 16. CD-ROM. NUNES, Simone Costa; BARBOSA, Allan Claudius Queiroz. A inserção das competências no curso de graduação em administração: um estudo em universidades brasileiras. In: ENANPAD, 27., 2003, Atibaia. Anais EnANPAD 2003. Rio de Janeiro: Anpad, 2003. p. 01 - 16. OLIVEIRA, Michelle Cristina de Souza Mendes de et al. A influência da “vivência docente” na formação e desenvolvimento de competências profissionais docentes: uma percepção de mestrados em administração. In: ENEPQ, 2., 2009, Curitiba. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2009. v. 01, p. 01 - 16. CD-ROM. PAULA, Ana Paula Paes de; RODRIGUES, Marco Aurélio. Pedagogia crítica no ensino da Administração: desafios e possibilidades. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 46, n. , p.10-22, 2006. Edição Especial Minas Gerais. SALM, José Francisco; MENEGASSO, Maria Ester; MORAES, Mário Cesar Barreto. A Capacitação Docente em Administração: Referenciais e Proposições. In: 1º EnEPQ, 2007, Recife. Anais EnEPQ 2007. Rio de Janeiro: Anpad, 2007. v. 01, p. 01 - 10. CD-ROM. SANT´ANNA, Anderson de Souza. Modelo de competências e formação de administradores: algumas considerações. In: ENEPQ, 1., 2007, Recife. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2007. v. 01, p. 01 - 10. CD-ROM. SILVEIRA, Denis Silva da et al. Uma metodologia de ensino de lógica aplicada em cursos de ciências humanas. In: ENEPQ, 1., 2007, Recife. Anais... . Rio de Janeiro: Anpad, 2007. p. 01 - 10. CD-ROM. SOUZA, Susane Petinelli; BARROS, Maria Elizabeth Barros de; SOUZA, Eloísio Moulin de. Problematizarão e (re) significações sobre o trabalho docente em administração. In: ENEPQ, 2., 2009, Curitiba. Anais... . 2009: Anpad, 2009. p. 01 - 15. CD-ROM. SOUZA-SILVA, Jader C. de; DAVEL, Eduardo. Concepções, Práticas e Desafios na Formação do Professor:Examinando o Caso do Ensino Superior de Administração no Brasil. Organizações & Sociedade, Salvador, v. 12, n. 35, p.113-134, out. 2005. Trimestral.

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ESTUPRO MARITAL

Anna Tereza Castro1 Maísa Terra de Oliveira2 Rodolfo Almeida Prata Junior3

RESUMO

Atualmente, a violência contra a mulher tem sido refletida no meio jurídico e acadêmico, relevando desse modo o estupro marital face aos vários fatores legislativos e sociais que não permitem um tratamento isonômico nos processos judiciais. O presente trabalho tem como objetivo analisar como é a constituição social e jurídica no que tange ao estupro marital. O trabalho foi desenvolvido por meio de uma pesquisa bibliográfica e científica cujas considerações indicam a dificuldade das mulheres em denunciar e dar andamento a um processo de estupro marital. Observou-se que tais considerações estão ligadas ao imaginário do sistema jurídico brasileiro e à legislação, representando um cenário de falta de respeito e discriminação à liberdade e aos direitos da mulher. PALAVRAS-CHAVE: Mulher, Crimes Sexuais, Violência doméstica, Estupro marital.

ABSTRACT

Currently, violence against women is reflected in judicial and academic fields, revealing that, in this way, marital rape is before various legislative and social factors that do not allow for equal treatment in judicial proceedings. The objective of the present work is to analyze how the social and judicial constitution respects marital rape. The analysis was developed through means of bibliographic and scientific research whose findings point to the difficulty that women have in detecting and proceeding with marital rape; it was observed that such findings are linked to the imaginary judicial and legislative system of Brazil, exhibiting a scenario of discrimination and lack of respect for the liberties and rights of women. KEYWORDS: Women, Sex crimes, Domestic violence, Marital rape. 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho traz como conteúdo e pesquisa a questão do estupro marital. Tal fato, acometido às mulheres, possui amplo embasamento em lei, uma vez que o estupro, nos últimos tempos, vem sendo punido com mais rigor, principalmente após o crescimento e visibilidade da mulher na sociedade atual. A punição para os crimes sexuais sofreu várias mudanças com o advento da Lei 12.015, de 2009, bem como o Código Civil de 2009 definiu os deveres conjugais. Embasado nesses temas, pode-se, de uma maneira melhor, compreender o estupro marital. Questões relevantes sobre tal assunto foram expostas no presente trabalho, como, por exemplo, se a mulher pode acusar o marido de estupro. A punição e os meios para tal também são aqui discutidos, sendo a Lei Maria da Penha uma das principais defesas para as mulheres na conjuntura atual. 2. A MULHER NO CONTEXTO DA SOCIEDADE ATUAL Primeiramente, dissertar sobre a mulher requer duas análises essenciais no mundo moderno, sendo a primeira perspectiva o fato de ser ela reconhecida através de seu romantismo, caracterização dada por meio do encantamento descrito em versos e prosas de grandes escritores. A segunda refere-se à mulher pelo lado de sua integração social, à procura de seu espaço, construindo, dessa forma, um mundo sem discriminação, do qual todos, homens e mulheres, buscam um bem-estar numa só voz. Pelo lado romântico, a mulher é considerada um ser sublime, capaz de transmitir amor e inspiração, mesmo nos momentos de mais terríveis dissabores. Essa é possuidora de uma magia, encontrada em muitos relatos em clássicos da história, como, por exemplo, Eva quando influenciou Adão e esse pecou contra Deus; e Dalila, que por meio de sua sedução, destruiu a força de Sansão. Sendo assim, a mulher é superestimada como símbolo da humildade e simplicidade, seja pela sua maneira de agir, falar ou até mesmo de se apresentar, já que é dotada de uma beleza única. Ademais, a sua ausência seria capaz de ocasionar injustiça em todo o mundo, pois ela é considerada como a única alternativa de salvar a humanidade de todas as atrocidades feitas pelo homem perverso. 1 Graduanda

em Direito na Universidade de Uberaba. E-mail:annatcastro@hotmail.com Graduanda em Direito na Universidade de Uberaba. E-mail: maisaterra30@hotmail.com 3 Graduando em Administração com ênfase em Comércio Exterior-FCETM e Graduando em Direito-UNIUBE. E-mail: rod_apj@yahoo.com.br 2

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Já pelo lado da mulher, enquanto agente social, econômico e político, torna-se trabalhadora e participativa, visando contribuir para o progresso da humanidade, por ela ser também um ser pensante, sendo assim útil para todos. Enquanto ser humano, compete à mulher, naturalmente, reivindicar seus direitos, embora, cabe salientar que tal reivindicação não se pode confundir com os movimentos feministas, pois neste a mulher se sobressai em detrimento do homem. Ancorado em Sullerot (1978, p.23), pode-se notar que a mulher também tem conseguido grandes progressos no âmbito da estrutura econômica. O autor coloca que: [...] diante disto, é inevitável que as mulheres sintam cada vez mais a necessidade de uma identidade social que não seja exclusivamente definida a partir do papel econômico do homem. As mulheres, menos presas ao lar devido à maior facilidade de desempenho das tarefas domésticas e maternidades menos frequentes, e, por outro lado, mais instruídas e preparadas naturalmente desejam utilizar suas capacidades, seus conhecimentos e sua competência para assegurar a sua própria independência e participar de modo mais completo e influente na vida da sociedade.

É evidente o anseio das mulheres e suas conquistas em busca de uma participação nos cenários sociais, ao levar em conta a estigmatização de uma sociedade machista por considerar a fragilidade feminina sinônimo de incompetência, sendo essa, portanto, incapaz de decidir sobre determinado assunto de relevância social. Assim, o ato de “estigmatizar” indica tomar qualquer marca diferencial de um indivíduo e reduzi-lo a esta característica. Ou seja, estigmatizar é atribuir um rótulo a alguém, tomando, como sinal emblemático, elementos como a gordura ou magreza, a cor da pele, o sexo, a estatura, o comportamento, a situação econômica ou geográfica, enfim, qualquer traço que carregue alteridade frente aos padrões considerados “normais”. Susman (1994) define estigma como qualquer traço persistente de um indivíduo ou grupo que evoca respostas negativas ou punitivas. Condições consideradas incapacitantes são estigmatizantes à medida que evocam respostas negativas ou punitivas. Já para Goffman (1994), o estigma refere-se a uma situação em que o indivíduo está inabilitado para a aceitação social plena, configurando-se como algo externo ao indivíduo. Quanto à participação da mulher no mercado de trabalho, essa posição varia muito de lugar para lugar. Em determinadas regiões, algumas vezes, ou quase sempre, a participação da mulher no mercado de trabalho ocorre por imposição do marido, situação que ocorre, por exemplo, no setor agrícola, como apresenta Sullerot (1978, p.25): “[...] nas regiões em que o setor agrícola é importante as diferenças chegam a surpreender; pelas estatísticas, Turquia é um dos países europeus onde a proporção feminina na força de trabalho total é das mais elevadas; na Grécia, é das mais baixas.”

No que tange ao Brasil, por exemplo, grande parte do percentual de mulheres trabalhando no comércio e na indústria configura-se como esquiva do trabalho pesado das atividades rurais, em razão da imposição feita pelos pais para que os filhos possam colaborar nas atividades do campo, não tendo acesso, portanto, à educação. Se considerar o lado externo ao ambiente familiar, observando o aspecto econômico, são evidentes as desvantagens da mulher, já que as desigualdades ocorrem em todo o mundo. Sullerot (1978) salienta, com grande sapiência, que uma sociedade só calcula com exatidão o que lhe parece importante e a impressão das estatísticas acerca do emprego feminino é prova de que o papel econômico das mulheres foi considerado marginal durante muito tempo. Nota-se que a mulher servia apenas para o trabalho doméstico, para a satisfação dos desejos sexuais de seus cônjuges e para atuar no papel de mãe cuidando de seus filhos, não tendo independência cultural e financeira, por conta de uma sociedade preconceituosa que não as vê como diferentes. Ademais, as atividades desvalorizadas, ainda hoje, perduram como atividades de mulheres e, por consequência, de baixa remuneração, porque somente agora elas têm conquistado o seu espaço, de forma lenta e progressiva, por não contar com a consciência plena de suas companheiras, salvo os momentos em que essas são surradas por seus maridos ou escravizadas em pleno século XXI. As mulheres há muitos anos têm buscado o seu reconhecimento por meio de lutas oriundas do anseio de terem seus direitos respeitados como seres humanos. O dia 8 de março traz à reflexão (ou pelo menos deveria trazer) a luta das mulheres operárias de uma indústria têxtil que, em meados do século XIX, morreram queimadas ao ocuparem a fábrica, numa greve contra a exploração patronal. A aceitação plena do capitalismo faz com esta data, colocada como comemorativa, seja deturpada face à beleza desejada pelos homens, singularizando a memória, apenas ao batom vermelho e ao perfume francês, vendendo a busca da participação e conscientização social como um produto de consumo. No entanto, na sociedade atual, a postura que a mulher deve assumir é a de ser humano capaz de exercer suas atividades conforme seu grau de intelectualidade e situação social, sempre sendo respeitada em seu ambiente de atuação. Atualmente, não se pode pensar em uma mulher submissa, deve-se compreender a função social que ela representa enquanto companheira do homem, sendo capaz de participar, seja no contexto social, político ou econômico, em iguais competências.

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3. A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E OS DIREITOS HUMANOS A violência, segundo o dicionário Houaiss (2009), é a “ação ou efeito de violentar, de empregar força física (contra alguém ou algo) ou intimidação moral contra (alguém); ato violento, crueldade, força”. Já a Organização Mundial da Saúde (OMS) define violência como “a imposição de um grau significativo de dor e sofrimento evitáveis”. Todavia os especialistas afirmam que o conceito é muito mais amplo e ambíguo do que essa mera constatação de que a violência é uma imposição de dor, ou agressão cometida por uma pessoa contra outra; mesmo porque a dor é um conceito difícil de ser definido, por ser subjetivo. No âmbito jurídico, conforme o dicionário Houaiss (2009), violência significa uma espécie de coação ou forma de constrangimento, posto em prática para vencer a capacidade de resistência de outrem, ou a levar a executá-lo, mesmo contra a sua vontade. Alguns autores ressaltam que a preocupação com a violência é fato recente na história, por essa estar relacionada à modernidade e o valor da liberdade, solidificado na concepção de cidadania e dos direitos humanos e, embasado nesses valores, determinadas ações passaram, então, a se configurar como formas de violência. A violência contra a mulher pode se manifestar de diversos modos, como, por exemplo, a lesão corporal, caracterizada por uma agressão física por meio de pontapés, socos, entre outros; a violência carnal ou o estupro, podendo ser todo atentado contra o pudor de alguém, por meio de grave ameaça ou força física, na intenção de satisfazer no outro seus desejos lascivos; e, a ameaça de morte, podendo ser feita por palavras, por escrito ou até mesmo por gestos. Sendo assim, a violência não necessariamente deixa marcas físicas, como é o caso das ofensas morais e verbais, podendo causar dores que superam uma dor física. A humilhação, por exemplo, é uma forma de fazer com que as mulheres percam a sua referência de cidadania. Portanto, a violência contra a mulher é uma expressão que inclui agressões à integridade corporal, sexual e psicológica. Ressalta-se que entre as pessoas de maior poder aquisitivo, as mulheres acabam se silenciando sobre a violência recebida, podendo ser a razão desse comportamento a vergonha, o medo ou até mesmo a dependência financeira. A Delegacia de Defesa da Mulher é quem recebe as queixas de violência contras as mulheres, tendo a competência de investigar e punir os agressores. A queixa é feita por meio de um Boletim de Ocorrência (BO), um documento no qual constam todas as informações sobre o fato ocorrido, com a finalidade de instruir as autoridades policiais acerca de quais foram os crimes cometidos e quais os procedimentos que devem ser tomados nas investigações. Apenas realizando esse procedimento, a mulher consegue se proteger contra as agressões futuras que poderiam ocorrer, caso ela se omitisse sobre a violência sofrida, seja física ou moral. Vale ressaltar que a violência contra a mulher ocorre com maior frequência em seus lares, sendo o agente ativo, autor do crime, seus cônjuges, ou qualquer outra pessoa que a vítima se relacione afetivamente, podendo ser seus filhos, sogros ou qualquer outro. Destaca-se, nesse contexto, a violência sexual, marcada pelos estudiosos como um dos modos de agressão mais predominante. As meninas submetidas ao abuso sexual, ou as mulheres estupradas, na maior parte das vezes, são espancadas e ameaçadas. Diante do medo, não procuram ajuda e preferem guardar esse segredo, sofrendo em silêncio. A Convenção de Belém do Pará (1994) define que “a violência contra a mulher constitui uma violação aos direitos humanos e às liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente à mulher o reconhecimento, gozo e exercício de tais direitos e liberdades. (...) violência contra a mulher é qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado”.

Cabe mencionar duas manifestações de violência que se definem pelos agentes que a praticam ou pelo espaço em que ocorrem, sendo essas, segundo Garcia (2005), a violência intrafamiliar e a doméstica. A primeira é definida pelos agentes que a praticam e se refere aos membros da própria família, podendo ser o pai, a mãe, os filhos, a esposa, o sogro, etc. Exemplo dessa violência é a conjugal. Já a segunda, é definida pelo espaço e se refere ao âmbito doméstico, ocorrendo entre pessoas da família. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), “as consequências do abuso são profundas, indo além da saúde e da felicidade individual e afetando o bem-estar de comunidades inteiras”. Portanto, a violência de gênero refere-se a um problema que atinge a saúde mental e física das mulheres, gerando consequências econômicas e sociais. Salienta-se que a violência contra as mulheres ocorre em um contexto específico referente às relações de gênero. As mulheres não são as maiores vítimas por acaso. O fato destas, naturalmente, serem submissas ou frágeis não é a razão da violência cometida contra si. Essa violência advém de um contexto histórico e social em que elas são discriminadas, tendo menor acesso aos recursos materiais, à educação e ao poder, seja no âmbito público ou no privado. Em oposição a esse cenário, nos últimos tempos, graças à persistência feminista e pela constatação das perdas econômicas e sociais, a violência contra a mulher foi inserida na agenda política dos acordos internacionais e dos governos.

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4. DOS CRIMES SEXUAIS Em sete de agosto de 2009, com o advento da Lei 12015, houve sérias mudanças no Código Penal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei dos Crimes Hediondos. A polêmica redação trazida pela nova lei pune com mais rigor os que cometem crimes contra a liberdade sexual. 4.1 A REFORMA DO CÓDIGO PENAL De acordo com a legislação anterior, só cometia estupro quem sujeitasse a mulher à conjunção carnal (cópula vagínica). Outros atos libidinosos eram considerados como atentado violento ao pudor. Todavia, com a Lei 12015/2009, o estupro passou a ser tanto os atos libidinosos como a conjunção carnal. Além disso, a vítima pode ser tanto homem como mulher. Assim, atentado violento ao pudor passou a integrar o artigo 213 do Código Penal. Também, a posse mediante fraude, no artigo 215 do CP, não ocorrerá mais somente com as mulheres, mas também com qualquer pessoa, sendo que haverá multa se o crime for cometido com o fim de se obter vantagem econômica (parágrafo único do artigo 215 do CP). Ainda com o advento da Lei L2015/2009, a redação do artigo 216-A caput continuou a mesma e a pena passou a ser aumentada em até um terço, caso seja cometido crime contra menor de 18 anos. Ademais, o Capítulo II do Título VI da parte especial sofreu algumas alterações e passou a ser intitulado: dos crimes sexuais contra vulnerável. Assim, a redação do artigo 217-A, estupro de vulnerável, passa a definir: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: pena reclusão de oito (oito) a 15 (quinze) anos. § 1º incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou doença mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. § 2º vetado. § 3º se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. § 4º se da conduta resulta morte: pena reclusão de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

O artigo 218, após a Lei 12015/2009, assim define; “induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem; pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos”. Nesse contexto, o estupro de vulnerável ocorrerá quando houver conjunção carnal ou ato libidinoso contra menores de catorze anos. Quem praticar tais ações contra quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver discernimento para o ato e nem poder oferecer resistência, incorrerá nas mesmas penas. O crime de corrupção de menores ocorrerá, somente, quando a vítima for menor de 14 anos. Assim, define o artigo 218A: “Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer a lascívia própria ou de outrem; pena - reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.” A nova lei também traz punição para a exploração da prostituição de vulnerável. Assim, define o artigo 218-B sobre favorecimento da prostituição ou contra forma de exploração de vulnerável: “Submeter, induzir ou atrair a prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: pena – reclusão de 4(quatro) a 10 (dez) anos.” De acordo, também, com o § 1° do artigo 218-B, ocorrerá multa se o crime for praticado com o fim de se obter vantagem econômica. O § 2° do artigo 218-B define que incorrerão nas mesmas penas aqueles que praticam conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 18 anos e maior de 14 anos na situação descrita no caput (inciso I), bem como o proprietário, o gerente ou responsável pelo local onde se verifiquem as práticas referidas no caput (inciso II). O § 3° do artigo 218-B define que “na hipótese do inciso II do parágrafo segundo, constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e do funcionamento do estabelecimento”. A ação penal nos crimes sexuais, antes da redação da Lei 12015/09, definida no artigo 225, proceder-se-ia mediante queixa. Porém, após a reforma, o caput do artigo 225 assim manteve-se: “nos crimes, definidos nos capítulos I e II deste título, procede-se mediante ação pública condicionada à representação”. O parágrafo único do mesmo artigo define, porém, que será ação pública incondicionada quando a vítima for menor de 18 anos ou pessoa vulnerável. O capítulo V do título VI passou a ser chamado: do lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual. O artigo 228, favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual, sofreu a seguinte mudança: antes era induzir ou atrair alguém à prostituição. Agora é, além disso, induzir e atrair alguém também para outra forma de exploração sexual. No § 1° do artigo 228 ocorre um aumento da pena se o crime for cometido por ascendente, padrasto, madrasta, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por agente que assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Além disso, o artigo 229 do Código Penal faz menção às casas de prostituição. Antes da redação da Lei 12015, o crime era manter, por conta própria ou de terceiro, casa de prostituição ou lugar destinado a encontro para fins libidinosos, haja ou

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não intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente. Com o advento da lei, ocorreu a mudança de casa de prostituição ou lugar destinado a encontros libidinosos para estabelecimento em que ocorra exploração sexual. O artigo 230 do CP, o rufianismo, após a lei de 2009, teve mudança no aumento da pena como causa do agente ser ascendente, padrasto, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Houve também o aumento da pena por fraude. O artigo 231 do CP passou a ser definido da seguinte forma: “promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro. Pena reclusão de 3 a 8 anos”. O § 1° do 231 define que terão as mesmas penas quem agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada ou, conhecendo tal situação, transportá-la, transferi-la ou alojá-la. O § 2° define que a pena será aumentada pela metade quando a vítima, por enfermidade ou doença mental, não tiver discernimento (inciso II), quando a vítima for menor de 18 anos (inciso I) ,quando há emprego de violência, grave ameaça ou fraude (inciso IV) ou nas hipóteses do inciso III. E, ainda, de acordo com o parágrafo terceiro, haverá multa se o crime for praticado com fim econômico. Assim, define o artigo 231-A caput, tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual, após a Lei 12015/09: “Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual: pena- reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos.” Houve a inclusão no artigo 231-A dos parágrafos primeiro, segundo e terceiro, sendo o conteúdo dos mesmos idênticos aos do 231 caput. E, com o advento da Lei 12015/09, houve a inclusão do artigo 234-A, que aumenta a pena para os crimes do título VI nos casos do inciso III (de metade, se do crime resultar gravidez), e do inciso III (de um sexto até a metade se o agente transmite doença sexual, de que tinha conhecimento, a vítima). Ademais, o artigo 234-B define que “os processos em que se apuram crimes definidos neste título correrão em segredo de justiça”. Após a Lei 12015/2009, passou a vigorar o artigo 244-B com a seguinte definição: “Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la: pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.” O § 1° deste artigo define que terão as mesmas penas do caput quem praticar tal conduta por meio eletrônico. E o § 2° define que as penas serão aumentadas de um terço se a infração estiver no rol do artigo primeiro da Lei 8072/90. 4.2 O ESTUPRO COMO CRIME HEDIONDO Tanto o estupro, mencionado no artigo 213 do CP, como o estupro de vulnerável passaram, com o advento da Lei 12015, a fazer parte dos crimes hediondos. A lei dos crimes hediondos, número 8072, de 25 de julho de 1990, trazia em seu inciso V do artigo primeiro a redação de que o estupro, combinado com o artigo 223, caput, e parágrafo único, seria considerado crime hediondo. Com o advento da nova lei, o confuso inciso V foi modificado apenas para estupro, sendo desnecessária sua cumulação com outro artigo. 5. DEVERES DOS CÔNJUGES Os deveres conjugais estão estabelecidos no artigo 1566 do Código Civil de 2002 e revelam determinadas condutas e comportamentos ideais para serem assumidos pelos cônjuges para que, de fato, haja a comunhão plena de vidas. Caso haja a infração de tais deveres, abre-se a possibilidade ao cônjuge de pedir a separação judicial nos termos do artigo 1572, caput, do Código Civil (separação culposa). De acordo com o artigo 1566 do Código Civil de 2002, as condutas ideais para a vida comum plena são fidelidade recíproca; vida comum; mútua assistência (econômica e moral); sustento; guarda e educação dos filhos e respeito mútuo. 6. O ESTUPRO MARITAL Com a nova redação dada ao artigo 213 do Código Penal, o crime de estupro se caracteriza pela conduta de “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, com a mesma pena de outrora: reclusão de 6 a 10 anos. Nesse contexto, a violência sexual marital nega valores de ordem matrimonial infraconstitucional e constitucional, submetendo a mulher a uma condição degradante, seja moral ou física, embora, de acordo com o artigo 1511 do Código Civil de 2002, o casamento estabelece a comunhão plena de vida entre os cônjuges, com base na igualdade de direitos e deveres. 6.1 ESTUPRO MARITAL, VIOLÊNCIA DO COTIDIANO

Negar a admissibilidade do estupro marital é afrontar o princípio da dignidade humana, da liberdade e da igualdade

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entre os sexos, é destruir conquistas positivadas constitucionalmente, apoiando a impunidade de mais um tipo de violência tão frequente na sociedade. Assim, o direito deve ser visto como um reflexo dos costumes e da cultura de uma sociedade, cuja legislação penal brasileira, por muito tempo, foi espelho da mentalidade machista enraizada na cultura da sociedade. No entanto, a questão do estupro marital gerou polêmicas doutrinárias em relação ao posicionamento em torno da aceitação ou não, e da existência do delito. Mirabete (2002, p.412), relata a divergência doutrinária sobre o assunto, mas entende que o estupro pressupõe cópula ilícita, e que a conjunção carnal é dever recíproco dos cônjuges. De acordo com ele, autores como Hungria e Noronha negaram a existência do crime, excetuando apenas os casos em que houvesse ponderáveis razões para que a mulher se recusasse a manter relações sexuais. Mirabete (2002, p. 413) ainda relatava que Fragoso não aceitava a possibilidade do crime de estupro de marido contra mulher, e Bento de Faria analisava, na expressão conjunção carnal, outras espécies de coito, em que este apenas via a possibilidade de delito quanto aos atos de libertinagem diversos da cópula normal e naqueles em que o marido é portador de moléstia venérea. Hoje, porém, há grandes conquistas feitas pela mulher, consubstanciada em sua cidadania baseada na liberdade de escolha digna, fundada na proteção estatal e nos princípios constitucionais de igualdade de direitos e obrigações. 6.1.1 O marido comete estupro contra sua esposa O estupro é a conduta de constranger alguém e não apenas a mulher, à prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal, antes era tipificado no crime de atentado violento ao pudor, art. 214 do Código Penal, revogado posteriormente. Assim, para configurar o estupro, uma pessoa obriga outra a, com ela, praticar qualquer ato libidinoso. Pode-se afirmar, portanto, que o marido, sendo homem, poderá sujeitar sua esposa, sendo mulher, a sofrer violência de ordem sexual. Capez (2005, p.4) faz uma indagação se o marido poderia praticar estupro contra a mulher, e responde o questionamento baseando-se em duas correntes a respeito do tema. Doutrinadores mais antigos, como Nelson Hungria e E. Magalhães Noronha sustentam que não há o crime de estupro marital, pois é preciso que tenha a cópula ilícita, isto é, fora do casamento. Ademais, exercer o direito de cônjuge está direcionado ao coito normal, inerente à vida conjugal do casal. Nessa lógica, o abuso de direito por parte do marido transforma a cópula em ilícita. Ainda segundo Capez (2002, p.5), sustentar que não é possível o estupro marital com argumentos no exercício regular do direito, por a relação sexual figurar entre os deveres conjugais, atenta contra o princípio da dignidade humana. O Código Civil de 2002, em seu art. 1566, V, estabelece que é assegurado aos cônjuges o respeito e consideração mútuos, inovação trazida pelo novo código. Portanto, embora com o casamento surja o direito de manter relacionamento sexual, tal direito não autoriza o marido a forçar a mulher ao ato sexual. Bitencourt (2003, p. 486) relata que o marido pode ser sujeito ativo de estupro contra a própria mulher, o chamado “débito conjugal”, embora este não assegura ao marido o direito de estuprar sua mulher, mas garante o direito de o mesmo postular o término da sociedade conjugal. Na visão de Capez (2002, p.5), para a esposa é previsto também pedir a separação judicial pela impossibilidade da vida comum, caso o marido cometa ou tente estuprá-la. Um marido que possuir uma esposa que não quer com ele manter relações sexuais terá o instituto da separação judicial, em razão da violação de um dos deveres conjugais, se isso tornar insuportável a vida comum do casal. Como comenta Capez (2002, p.5), a mulher possui como direito a inviolabilidade de seu corpo, e por isso não poderá ser constrangida a praticar atos sexuais contra sua vontade. E, como menciona Nucci (2009, p. 875), a mulher não é objeto sexual do homem, possuindo direitos iguais na sociedade conjugal, assegurados constitucionalmente. O autor relata também a existência de penalistas que defendem a idéia de que, para a esposa se recusar a manter relações sexuais com seu marido, deve haver justo motivo. É inacreditável, portanto, a idéia de não admitir que o cônjuge varão seja sujeito ativo do crime de estupro, haja vista que a violência empregada em um estupro, seja ele feito por um homem qualquer ou pelo próprio marido, consiste em um fato que acarreta para o cônjuge virago conseqüências morais e físicas, às vezes irreparáveis. 6.1.2 Motivos que levam a mulher a aceitar o estupro marital e por que o homem o pratica: impunidade do estupro marital. Ainda hoje, se percebe uma cultura em que há a supremacia do homem sobre a mulher. Isso desestrutura a convivência conjugal, levando à construção de relações desiguais de gênero. Porém, na mesma proporção que a sociedade avança em suas concepções, o Direito, como parte dessa sociedade, também sofre injunções, necessitando se adequar aos novos momentos

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históricos. Em relação à mulher, houve época em que era propriedade do marido, não votava e não possuía direitos. Como relata Nucci (2009, p. 875), a mulher foi considerada objeto sexual do homem e submissa durante décadas. Vale ressaltar que o que acontece com os crimes sexuais é que as vítimas dessa violência sofrem preconceitos, são criados estereótipos e mitos, cuja ocultação da ocorrência do crime se dá em virtude de diversos fatores sociais, como a falta de conscientização da população, preconceito, pudor, dependência econômica e emocional da vítima para com o marido agressor. Para Nucci (2009, p. 875), é considerável a dificuldade probatória em relação à violência sexual no âmbito familiar, porém, não pode haver empecilho para punições deste tipo de crime, ainda se argumentado pelo exercício regular de direito conjugal. O princípio da dignidade humana protege a mulher de situações degradantes ou desumanas e, pelo princípio da legalidade, ela não é obrigada a se prestar sexualmente ao parceiro sem a sua vontade, pois não há dispositivo legal que a obrigue. Para Nucci (2009, p. 875), não é razoável, na atual sociedade, o homem possuir o direito de subjugar a mulher sexualmente, por meio de violência ou grave ameaça, com base nos deveres conjugais. Pela Lei do Divórcio ( 6515/77), art 5º, a separação judicial pode ser pedida por um só dos cônjuges quando imputar ao outro conduta desonrosa ou qualquer ato que importe em grave violação dos deveres do casamento e tornem insuportável a vida em comum. Como relata Nucci (2009, p. 875), o desrespeito do dever conjugal dá ao marido o direito de romper o matrimônio por separação judicial, e não o direito de estuprar a sua esposa, uma vez que o desejo sexual é pelo amor e não por imposição jurídica. Ademais, acima do desejo sexual está a condição de ser humano e, por conseguinte, o direito à liberdade, á vida, à segurança Colnago (2009, p.170) ressalta a existência da Lei 11.340, de 07/08/2006, que criou mecanismos coibindo e prevenindo a violência contra a mulher, com medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Apesar de ser essa lei ser recente, há uma dinâmica social que deve ser observada. Houve uma evolução na defesa dos direitos da mulher, provocando a conscientizações nos segmentos da sociedade, criando postura desprendida de preconceitos e de convenções machistas, de forma a buscar o reconhecimento da mulher como cidadã, detentora de direitos e obrigações. 7. UNIÃO ESTÁVEL E ESTUPRO MARITAL Um novo questionamento pode surgir com o advento de uma modalidade inédita de entidade familiar: a União Estável. Se há ou não a possibilidade do convivente ser o agente do estupro. Constitucionalmente se estabelece pelo art. 226, em seu parágrafo 3º, “que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado e para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Igualam-se os objetivos do casamento ao da União Estável, reconhecendo-a como entidade familiar, de acordo com o artigo 1723 do C.C. de 2002: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família” Quando um casal estabelece a comunhão plena de vida, se compromete a respeitar e a prestar assistência um ao outro e aos seus filhos, o que significa dizer que é irrelevante se são casados ou vivem em União Estável. Como reforça Nucci (2009, p. 875), homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, previstos como norma constitucional. Isso faz deduzir que tanto seja no âmbito sexual e matrimonial. Portanto, o convivente, ao se utilizar de violência ou de grave ameaça para a realização da conjunção carnal contra a companheira, poderá figurar como sujeito ativo do crime de estupro. Observando o que se estabelece no artigo art. 1.724 do C.C., que versa que as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo deste trabalho foi analisar aspectos relevantes a serem discutidos sobre o estupro marital, baseando-se em considerações doutrinárias, jurídicas, e em questões de ordem infraconstituicional e constitucional, estruturadas na evolução social e no crescente papel da mulher na sociedade. Foi possível perceber que o crime existe em grande proporção, porém, há a dificuldade das mulheres em denunciar e levar adiante um processo de estupro marital, evidenciando um cenário de discriminação e desrespeito aos direitos e liberdade da mesma, já conquistados. Princípio este que possibilita à mulher o direito de escolher se quer ou não manter relações sexuais. Tal Reforço é dado também pelo princípio da igualdade, que equipara marido e mulher no exercício de suas vontades e ações na relação matrimonial. Logo, a mulher não está sujeita aos desejos sexuais do marido. Ademais, é verdade que a relação sexual configura-se um dever recíproco entre os cônjuges, embora a forma utilizada para obter a mesma é juridicamente intolerável, além de imoral. Portanto, a relação sexual de forma voluntária é lícita ao

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cônjuge, e constranger ilegalmente a esposa a manter conjunção carnal é abuso de direito. E, por último, sendo o Brasil um Estado Democrático de Direito, é exigível das autoridades competentes atitudes que não ignorem a violência sexual marital, por uma questão de segurança jurídica e paz social, trazendo dignidade dentro do seio familiar, que é a base de toda a sociedade. REFERÊNCIAS BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal Parte Especial. 3ª edição, revista e ampliada. Editora Saraiva, 2003. BRASIL. Código Civil. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2002. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL - Código Penal. Coordenação Mauricio Antonio Ribeiro Lopes - 5.ed.ver., atual.e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. - (RT Códigos). BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), especialmente dados sobre a população e indicadores de saúde. Acesso em: 05/06/2010. Disponível em: (http://ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/indic_sociosaude/2009/indicsaude.pdf) BRASIL. Ministério da Saúde do Brasil. Uma análise da situação de saúde. Brasília, Ministério da Saúde: 2008. CAPEZ, Fernando Capez. Curso de Direito Penal. Volume 3 - Parte Especial, 2ª ed. Editora Saraiva, 2005. CAPEZ, Fernando. COLNAGO, Rodrigo. Direito Penal parte especial II. Coleção Estudos Direcionados, Perguntas e respostas. Editora saraiva 3ª Ed. 2009. CIDH. Comissão Interamericana de Direitos Humanos, referente à Convenção de Belém do Pará. Disponível em: <”http:// www.cidh.org/Basicos/Portugues/m.Belem.do.Para.htm”>. Acesso em: 05/06/2010. ELUF, Luiza Nagib - Crimes contra os costumes e assédio sexual - Ed.condensada - São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1999. GARCIA - A, Anna Paula Oliveira. Quem Cala, Consente? Violência Dentro de Casa a Partir da Perspectiva de Gênero, Família e Políticas Públicas. Dissertação - Mestrado em Família na Sociedade Contemporânea – Universidade Católica do Salvador, 2005. GOFFMAN, Erving. Estigma – Notas sobre a Manipulação da Identidade deteriorada. Rio de Janeiro. Zahar Editores, 1994. MARTINS, Cyro. A mulher na sociedade atual. In: A mulher na sociedade atual (ensaios). Porto Alegre, Movimento, 1986. MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal Parte Especial. arts. 121 a 234 do C.P. 2002, 19 ed. Volume 2. NAÇÕES UNIDAS. Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination Against Women. United Nations General Assembly, 1979. NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 9º edição, revista atualizada e ampliada, 2009. OMS. Guidelines for medico-legal care for victims of sexual violence. World Health Organization: Geneva, 2003. Disponível online no site da OMS (http://www.who.int) . Acesso em: 05/06/2010. SCHRAIBER, L.B., D’OLIVEIRA, A. F.L.P. Violência contra mulheres: Interfaces com a Saúde. Interface, Comunicação, Educação, vol 3, n. 5, 1999.

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Mensuração de Resultado: Uma abordagem baseada na Gestão Econômica Carlos Roberto Souza Carmo 1 Igor Gabriel Lima 2 Renata de Oliveira 3

Resumo

A abertura dos mercados e a globalização apresentaram como resultado imediato o crescimento da concorrência e da competitividade, devido à elevação dos padrões do mercado e a possibilidade de escolha. Assim, o preço já não é mais um fator decisivo para a escolha desse ou daquele produto, pois seu grau de importância na decisão da compra não é mais considerado isoladamente. Dessa forma, outros indicadores, além do resultado financeiro (compra e venda), passaram a ser desenvolvidos para se mensurar o resultado econômico da empresa, uma vez que o potencial de gerar riqueza não está somente nessas atividades, mas na forma de gerenciar o negócio, reconhecendo que esses resultados são obtidos em cada departamento da empresa, a partir de suas atividades individuais. As empresas, então, necessitam de uma ferramenta de apoio ao processo decisório que seja eficaz e contemple a mensuração do resultado econômico gerado por sua operacionalidade. O presente estudo teve como finalidade, por meio da pesquisa exploratória, apresentar os conceitos e fundamentos da Mensuração do Resultado a partir da visão do modelo de Gestão Econômica – GECON, bem como apresentar um exemplo prático da referida mensuração, adaptado da bibliografia estudada sobre o tema. Além da constatação de que modelo GECON se caracteriza como uma ferramenta adequada para a mensuração do resultado econômico da entidade como um todo, este ensaio teórico permitiu concluir que, mediante o emprego da modelagem de gestão econômica, é possível avaliar o efetivo resultado de uma área específica da organização, tanto no seu contexto operacional quanto no plano financeiro. Palavras Chave: GECON, Mensuração de Resultado, Gestão Econômica. Área Temática: Controladoria

Abstract

Open markets and globalization resulted in immediate growth of competition and competitiveness, due to the raising standards of the market and the possibility of choice. Yet, price is not a key factor to the choice of this or that product, because its degree of importance is not considered in isolation. Other indicators, besides the financial result (purchase and sale), were developed in order to measure the economic result of the company, once the potential to generate wealthness is not only present in these activities, but also in the manner the business is managed, recognizing that these results are obtained in each department of the company, from its individual activities. The companys, then, require an effective supportive tool to its decision making, which contemplates the measurement of results generated by its operational feature. This study, of exploratory nature, aimed at presenting the concepts and the principles of the measurement of the result based on the System of Economic Management (GECON), as well as present a practical example of the mentioned measurement, adapted from the researched bibliography of the theme. Besides verifying that GECON model is an effective tool for the measurement of the economic result of the entity as a whole, this theoretical essay allowed to conclude that, by means of the use of the model of economic management, it is possible to evaluate the effective result of a specific area of the entreprise, both in its operational and financial context. Key words: GECON, Measurement of Results, Economic Management. Thematic area: Controllership 1. Introdução A abertura dos mercados e a globalização apresentaram como resultado imediato o crescimento da concorrência e 1

Mestre em Ciências Contábeis e Financeiras Pontifícia Universidade Católica - São Paulo Avenida da Saudade, 1090 - ap. 802 - Santa Marta - 38061-000 – Uberaba-MG Telefone: (34) 9996-3924 (34) 33150832 e-mail: carlosjj2004@hotmail.com 2 Mestre em Contabilidade Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Av. Liberdade, 532 – CEP 01502-001 – São Paulo-SP Telefone (11) 32722264 e-mail: igorgabriellima@gmail.com 3 Especialista em Língua e Literatura Inglesa Universidade de Uberaba Avenida Nenê Sabino, 1801 - Santa Marta - 38050-501 – Uberaba-MG Telefone: (34) 33385797 / (34) 88235797 e-mail: renata.oliveira@uniube.br

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da competitividade dada a elevação dos padrões do mercado e a possibilidade de escolha. Assim, o preço já não é mais um fator decisivo para a escolha deste ou daquele produto, pois seu grau de importância na decisão da compra não é mais considerado isoladamente. Dessa forma, outros indicadores, além do resultado financeiro (compra e venda), passaram a ser desenvolvidos para se mensurar o resultado econômico da empresa, uma vez que o potencial de gerar riqueza não está somente nessas atividades, mas na forma de gerenciar o negócio, reconhecendo que esses são obtidos em cada departamento da empresa, a partir de suas atividades. Assim, essas necessitam de uma ferramenta de apoio ao processo decisório que seja eficaz e contemple a mensuração do resultado econômico gerado por sua operacionalidade. Sobre a mensuração utilizada pelas empresas, Iudícibus (2000, p. 133) expõe que “[...] no âmago de todas as teorias para mensuração dos ativos se encontra a vontade para que a avaliação represente a melhor quantificação possível dos potenciais de serviços que o ativo represente para a entidade”. Pereira (2001, p. 54), comentando sobre a necessidade da continuidade da entidade baseada na geração de resultados, evidencia que “[...] a empresa realiza suas atividades por meio do uso dos fatores de produção, obtidos em seu ambiente externo, retornando produtos e/ou serviços que satisfaçam alguma necessidade do ambiente. Esse é o meio básico pelo qual a empresa procura garantir sua continuidade”. Dessa forma, o trabalho, que ora se inicia, não tem como foco a avaliação dos ativos da entidade, mas tomará como base uma forma de quantificação do resultado da empresa que considera, além dos fatores financeiros da contabilidade ortodoxa, os fatores econômicos, expressando os resultados da empresa com uma maior fidedignidade. Na visão de Lozecky (2004), apesar da grande evolução contábil, o processo de mensuração utilizado pela contabilidade financeira não é suficiente para satisfazer as necessidades informativas de alguns tomadores de decisão. Uma vez que, com o passar dos anos, o processo decisório tornou-se mais complexo, a tomada de decisões requer informações que fogem da esfera contábil tradicional e ingressam no âmbito das de natureza econômica. O Modelo de Gestão Econômica – GECON, objeto deste estudo, foi desenvolvido na Universidade de São Paulo e tem como seu idealizador e coordenador de vários trabalhos na área, o Prof. Dr. Armando CATELLI. Sendo que, sob a orientação dele, vários pesquisadores contribuíram para o desenvolvimento do modelo GECON, destacando-se Reinaldo GUERREIRO, Cláudio PARISI e Carlos Alberto PEREIRA. Catelli (2001) explica que a metodologia de gestão econômica apoia-se no sistema GECON e caracteriza-se pela administração baseado-se no resultado econômico que, por sua vez, conduz à eficácia do processo de gestão empresarial como um todo. Conforme Mosimann e Fisch (1999), a gestão econômica pode ser entendida como um conjunto de decisões e ações baseadas em resultados, segundo o enfoque econômico. Para tanto, é necessário buscar um equilíbrio nas ações, pois, no ambiente interno da empresa, um excelente resultado de uma área pode ter ocorrido em virtude de um sacrifício maior ainda de uma área fornecedora, prejudicando o resultado global. Dessa forma, a gestão econômica ao procurar entender a organização de uma forma mais ampla, considera seus setores e processos como um todo, e evidencia o valor que cada um desses agrega ao resultado final. 2. Questão de pesquisa e metodologia A pesquisa realizada neste trabalho buscou evidenciar as características que um modelo de mensuração deve apresentar sob os pressupostos do GECON, bem como, conceituar o modelo de mensuração de resultado, apresentando, a partir de um exemplo prático, sua aplicabilidade e seu poder de explicação da situação econômica da empresa. Pois, considerando que o GECON evidencia o resultado econômico das entidades, como esse resultado é mensurado e qual o seu reflexo na situação econômica e patrimonial da empresa? A fundamentação metodológica do trabalho dar-se-á pela pesquisa bibliográfica e exploratória, uma vez que essas abordagens da pesquisa abrangem a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo proporcionando maior conhecimento dos autores sobre o tema. 3. O modelo de Gestão Econômica – GECON O Modelo de Gestão Econômica objetiva, em seu escopo, abarcar toda a atividade realizada no âmbito empresarial, desde sua base estrutural, passando fatores inerentes à cultura empresarial, pelo planejamento estratégico, até chegar à gestão do resultado, chamado resultado econômico. Catelli (2001, p. 31) explica que “o modelo GECON estrutura-se com base em um entendimento da missão da empresa, do conjunto de crenças e valores da organização, da estrutura organizacional, da realidade operacional e das características dos gestores empresariais”. Os conceitos do Modelo de Gestão Econômica devem estar amparados por questões que representam, na realidade, a consciência organizacional da administração. Conceitos como missão e valores organizacionais podem traduzir essa consciência, ou seja, podem evidenciar o comprometimento dos administradores na continuidade da empresa. Quando são medidos por prismas financeiros e econômicos, tais evidências dão margem à obtenção de valores que poderão ser

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mensurados à luz desse modelo de gestão. Estes serão objeto de confrontação em cada transação ou em cada evento passível de mensuração. Neste sentido, Mosimann e Fisch (1999) entendem que a mensuração baseada em princípios e normas contábeis ou legais não são capazes de atribuir o correto valor a produtos e serviços de uma organização e, portanto, ao resultado oriundo do seu processo de gestão. Portanto, se o GECON tem como finalidade a geração de resultados e sua abordagem considera valores estritamente econômicos, os resultados gerados pela empresa, a partir desta metodologia de mensuração, serão definidos como resultados econômicos. 4. O processo de gestão Para uma compreensão mais abrangente da gestão econômica, faz-se necessário elencar alguns conceitos de gestão. Segundo Cruz, (1991, p. 38) “Gestão é o processo de decisão, baseado em um conjunto de conceitos e princípios coerentes entre si, que visa garantir a consecução da missão da empresa”. Já para Catelli apud Fernandes (2004) a gestão consiste na tomada decisões capazes de conduzir a organização para os objetivos previamente traçados. Se o objetivo principal da empresa é a geração de resultados, para que ela possa manter a continuidade de seu processo; e, se nesse processo estão inclusos fatores financeiros e econômicos, é primordial que se considere, na base estrutural da empresa, um processo de gestão que contemple as características econômicas e financeiras dos fatos ocorridos em cada setor da empresa. Pereira (2001, p. 58) diz que “[...] o processo de gestão deve assegurar que a dinâmica das decisões tomadas na empresa conduzam-na efetivamente ao cumprimento de sua missão, garantindo-lhe a adaptabilidade e o equilíbrio necessários para sua continuidade”. O autor continua dizendo que, com esse propósito, o processo de gestão deve: • ser estruturado com base na lógica do processo decisório (identificação, avaliação e escolha de alternativas); • contemplar, analiticamente, as fases de planejamento, execução e controle das atividades da empresa; • ser suportado por sistemas de informações que subsidiem as decisões que ocorrem em cada uma dessas fases. Dessa forma, o modelo de gestão econômica influencia as decisões da empresa, partindo da missão e embasando seu processo de gestão num tripé, qual seja: planejamento (estratégico e operacional), execução e controle, que, se suportados por um sistema de informação eficiente, oferecerão subsídios consistentes para a tomada de decisão da empresa. 4.1. Planejamento Fernandes (2004) considera que o planejamento é caracterizado por decisões presentes tendo em vista um estado futuro desejável e os caminhos a serem tomados para atingi-lo. Tomando a citação de Fernandes, pode-se verificar os dois âmbitos do planejamento: (1) “decisões presentes tendo em vista um estado futuro desejável”, sendo considerado a estratégia que a empresa tomará para atingir os resultados definidos em sua missão; (2) e “os caminhos a serem tomados para atingi-lo”, a operacionalização das decisões estratégicas visando atingir os objetivos propostos. 4.1.1. Planejamento Estratégico Para Druker apud Fernandes (2004), processo de planejamento estratégico consiste na tomada de decisões no presente, com o objetivo de se obter um resultado projetado para o futuro. Ou seja, o planejamento estratégico traça as diretrizes tentando prever resultados. Sobre o planejamento estratégico Pereira (2001, p. 59) afirma que: “A fase do planejamento estratégico tem como premissa fundamental assegurar o cumprimento da missão e da continuidade da empresa. Essa fase do processo de gestão gera um conjunto de diretrizes estratégicas de caráter qualitativo que visa orientar a etapa de planejamento operacional.” Pelo exposto, o planejamento estratégico fornece as bases e a direção para que outra área do planejamento possa atuar, sendo esta a do planejamento operacional. 4.1.2. Planejamento Operacional Após definir sua estratégia, a empresa entra na fase do planejamento operacional. Este planejamento está voltado à operacionalização das estratégias propostas, ou seja, nessa fase, as decisões estarão voltadas para a verificação das alternativas necessárias para que os resultados esperados e as metas impostas na fase do planejamento estratégico sejam alcançados. 4.2. Execução É a etapa do processo de gestão na qual os objetivos propostos na fase do planejamento serão alcançados. Pereira (2001, p. 61) descreve que “é exatamente na fase de execução que as ações são implementadas e surgem as transações realizadas. Nessa etapa, procura-se alcançar os objetivos e metas estabelecidos no planejamento operacional de curto prazo,

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de forma a otimizar cada negócio/evento”. 4.3. Controle O processo de gestão deve possuir todas as suas etapas fundamentadas em um sistema de informação gerencial que proporcione o planejamento e o controle. Nakagawa (1997, p. 38) cita quatro fases que compõem o controle: I – Conhecer a realidade; II – Compará-la com o que “deveria ser”; III – Tomar conhecimento rápido das divergências e suas origens; IV – Tomar atitudes para sua correção

O controle consiste na comparação do esperado/planejado com o efetivamente ocorrido, fornecendo, assim, meios para que o gestor realize os ajustes necessários no processo para que este atenda ao plano estratégico. 5. Eventos econômicos Para a introdução sobre o tema, destaca-se, aqui, o evidenciado por Hendriksen apud Parisi e Nobre (2001, p. 113): [...] um evento econômico é uma ocorrência, um fenômeno ou uma transação, o qual é separado para ser observado e ter uma melhor interpretação semântica do que a mensuração de ativos e passivos. No entanto, somente certas características dos eventos podem ser mensuradas e reportadas; na abordagem contábil do evento, mudanças de preços são assumidas por serem observáveis, verificáveis e relevantes.

A esse respeito, os autores concluem: Evento pode ser entendido como um conjunto de transações, cujos atributos lhe dão forma e consistência, ou seja, um conjunto de transações da mesma natureza ou classe que pode envolver uma ou mais entidades e estar relacionado com um produto, com um serviço, ou ainda com um lote de produtos e/ou com o centro de responsabilidade que o causou. (PARISI; NOBRE, 2001, p. 113)

Cada atividade desenvolvida dentro de cada setor da empresa é definida como um evento. Quando um evento ou um conjunto de eventos são passivos de mensuração econômica, tem-se uma definição de eventos econômicos, conforme explica Pereira (2001, p. 75): O resultado econômico da empresa é formado pelos resultados econômicos das áreas que a compõem. Essas áreas são definidas como “centro de responsabilidade”, ou seja, possuem um gestor específico com responsabilidade sobre determinadas atividades. Os resultados das áreas, portanto, são formados pelos resultados proporcionados pelas atividades que gerenciam. Os resultados de uma atividade, por sua vez, é formado pelo resultado dos eventos necessários para realizá-la, como, por exemplo: compras, produção, estocagem, vendas, captação, aplicação, etc. Por impactarem a situação patrimonial da empresa, esses eventos são denominados eventos econômicos.

A integração e a avaliação das áreas, mantendo a visão holística da organização, são feitas pela ótica da controladoria na gestão econômica, a partir dos resultados econômicos. Cada gestor de área será considerado como o “dono”. O autor ainda afirma que afirma que: Um evento econômico refere-se a um conjunto de transações de mesma natureza, cujo impacto econômico pode ser mensurado da mesma forma (modelo de mensuração econômica dos eventos). A transação consiste, portanto, no menor nível em que pode ser identificado o resultado econômico. Os resultados econômicos das transações podem ser acumulados por eventos, produtos, atividades, áreas e empresa. Desse modo, evidencia-se onde, quando e como são formados os resultados da empresa, capacitando seus gestores à otimização dos resultados de suas decisões. (PEREIRA, 2001, p. 75).

Verifica-se que os resultados econômicos da empresa serão otimizados, quando ocorrer a otimização de cada evento econômico. Logo, o resultado econômico dar-se-á após a contínua melhoria dos eventos econômicos ocorridos em cada setor da empresa. 6. Resultados econômicos O resultado econômico pode ser considerado como o objetivo da gestão, uma vez que todos os esforços serão canalizados para que este seja maximizado. Segundo Pereira (2001, p. 72), “o resultado econômico de uma empresa pode ser entendido como variação positiva de sua riqueza entre dois momentos. Isto é, refere-se ao incremento de sua riqueza e espelha, portanto, o aumento de seu patrimônio, em determinado período”. Maroni Neto (2001, p. 108) acrescenta que o resultado econômico:

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[...] consiste na variação da riqueza da entidade, gerada por meio das operações, cuja mensuração se pauta por critérios não contemplados no Modelo Contábil. Sua identificação e acumulação parte da transação – menor unidade de transformação de recursos e decisão – para toda a empresa, por meio de três vetores. O primeiro vetor é o funcional, que enfoca os eventos e as áreas de responsabilidade. O segundo concentra-se no campo de atuação, envolvendo os negócios, os clientes, o segmento e o mercado. Por último, está o vetor da função dos produtos, que focaliza os produtos, as famílias de produtos e as áreas de negócios.

Os autores citados enfatizam que o resultado econômico está além do resultado gerado na contabilidade societária. Evidenciam que esse resultado demonstra, com maior abrangência, a realidade do patrimônio da empresa, uma vez que considera também o valor econômico gerado pela atividade empresarial. Para Pereira (2001, p. 70), “o resultado econômico reflete as dimensões operacional, econômica, financeira e patrimonial da gestão, que se associam, respectivamente, aos fluxos físicos, econômicos, financeiros e patrimoniais dos eventos econômicos [...]”. Sobre dimensão operacional, entende-se o aspecto físico ou a quantidade de serviços e produtos gerados, quantidade de recursos consumidos, qualidade e cumprimento dos prazos. Na dimensão econômica, considera-se a mensuração econômica das quantidades físicas levantadas pela dimensão operacional, como os valores de mercado na condição do pagamento à vista. A dimensão financeira diz respeito ao fluxo de caixa trazido ao valor presente, ou seja, considera o “valor do dinheiro no tempo”, tomando como princípio o fato de que a concessão ou a obtenção de prazos de recebimento ou pagamento podem gerar um fluxo financeiro que produz, segundo a ótica do GECON, receitas e custos, caracterizando o resultado econômicofinanceiro da atividade. Por fim, a dimensão patrimonial evidencia as mutações ocorridas entre as contas patrimoniais nos instantes iniciais e finais da apuração do patrimônio. Essas mutações serão geradas pelos impactos que os resultados econômicos e financeiros trarão à entidade. A figura 1, a seguir, apresenta as quatro dimensões do resultado econômico:

Figura 1: Dimensões operacional, econômica, financeira e patrimonial. Fonte: Pereira (2001, p. 70).

Até aqui, o trabalho demonstrou que o processo de gestão econômica tem como finalidade a eficácia do processo da empresa que visa o atingimento de sua missão, e, como consequência, a geração do resultado econômico. Verificou-se que esse resultado é obtido após a definição da missão e do planejamento, para que o resultado esperado seja atingido. Esse plano (estratégico e operacional) é um modelo a partir do qual se definem metas (responsáveis pela execução) e parâmetros (responsáveis pelo controle do alcance destas). Quando as metas são atingidas de maneira eficaz, a partir da otimização de cada evento, valores econômicos são gerados no processo da empresa e apresentados como resultado econômico. O processo descrito é exemplificado por Parisi e Nobre (2001, p.127), conforme representação na figura 2, a seguir.

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Figura 2: Tomada de decisão e processo de gestão. Fonte: Parisi e Nobre (2001, p. 127).

7. Mensuração dos resultados econômicos A gestão econômica buscará a maximização do resultado econômico objetivando a mensuração econômica dos eventos e das transações. Tal mensuração possui um caráter complexo, mas, caso atinja seu objetivo, significará que a empresa, como um todo, estará quantificada em termos econômicos. Isto é, o seu patrimônio líquido expressará o valor efetivo da sociedade e não um mero valor representativo de custo. Em sua tese de doutorado Beuren (1995) explica que, uma vez que a contabilidade tradicional tem como bases de mensuração a unidade monetária e custos históricos, as informações contábeis tradicionais precisão ser ajustadas a fim de tornarem-se válidas, confiáveis e apropriadas ao processo de gestão com enfoque econômico. Isso posto, qual modelo escolher para a obtenção de uma mensuração econômica mais adequada às necessidades das entidades em geral? Quais atributos um modelo de mensuração econômica deve possuir para atender às expectativas da sociedade? A autora continua esclarecendo que um modelo de gestão deve estar voltado para mensuração da eficácia empresarial, para a geração de resultados econômicos, para delegação e apuração de responsabilidades, preços de transferências, entre outros fatores de natureza qualitativa e econômica. Com essas características, o modelo de mensuração será capaz de abranger todas as atividades desempenhadas pelos departamentos da empresa, e, ainda, se estabelecer como principal ferramenta gerencial para a tomada de decisões. 8. Aplicação do Modelo de Gestão Econômica - GECON Escolhido o modelo de mensuração, a etapa seguinte será a criação de um sistema de informações, que leve os resultados à controladoria. Os sistemas mais conhecidos trabalham com base em unidades monetárias, dentro da premissa de que o valor do dinheiro muda, conforme o tempo. Entretanto, não basta entender que o dinheiro tem um valor diferente em diversos momentos cronológicos. Não basta estabelecer o uso de uma moeda constante ou de pensar em custo de oportunidade. A fundamentação do modelo é o resultado econômico que reflete algumas dimensões já citadas neste trabalho. A produção de bens e serviços envolve, em um primeiro momento (dimensão operacional), aspectos como quantidades produzidas e geradas, prazos, qualidade e conformidade. Nesse momento, a mensuração é meramente quantitativa. No segundo momento, esses recursos consumidos e gerados são avaliados no contexto econômico (dimensão econômica), com base no valor de mercado para a condição à vista. O cotejo entre o custo econômico e a receita econômica indicará o resultado econômico da atividade. O terceiro momento diz respeito à utilização dos recursos financeiros atinentes à compra e venda dos produtos e serviços consumidos e gerados (dimensão financeira). Partindo da premissa de que o dinheiro tem valor no tempo e que, muitas vezes, os recebimentos e pagamentos não são feitos na mesma data do consumo ou da geração do produto e/ou serviço, deve-se mensurar as receitas e os custos daí decorrentes, cujo confronto corresponde ao resultado econômico financeiro da atividade.

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Várias situações poderiam ser levadas à aplicação numérica do modelo de mensuração do resultado econômico. A proposta é aferir esse resultado econômico em uma operação comercial de compra e venda, cujos dados são os demonstrados no exemplo da “Cia. Estrela”. Para a resolução deste exemplo, será utilizado o modelo de decisão definido pelo GECON, que trabalha com o conceito de margem de contribuição englobando cada uma das dimensões supracitadas, estabelecidas num demonstrativo que será apresentado, a seguir. Partindo-se da Receita Operacional, desconta-se o Custo Variável Operacional, obtendo-se a Margem de Contribuição Operacional (1). Desta, desconta-se o Resultado Financeiro, obtido pelo confronto entre a Receita e o Custo Financeiro, dando origem à Margem de Contribuição Financeira (2). Da Margem de Contribuição Financeira são descontados os Custos Fixos das áreas de responsabilidade, obtendo-se o Resultado Econômico por área (3), abordando-se, assim, as dimensões supracitadas. A figura 3, apresentada, na sequência, ilustra o modelo de decisão preconizado pelo GECON.

Figura 3: Modelo de Decisão proposto pelo GECON. Fonte: Lozecky (2004).

A seguir, será apresentado um exemplo prático sobre a aplicação do Modelo de Gestão Econômica – GECON numa empresa comercial. O exemplo é uma adaptação do modelo utilizado por Pereira (2001). A Cia. Estrela (empresa fictícia utilizada no exemplo) apresentará as operações de Compra a Prazo (Evento 01) e Compra à Vista (Evento 03), tendo, entre elas, o período classificado como Tempo Conjuntural, que será apresentado como Evento 02. 8.1. O Exemplo da Cia. Estrela A Cia. Estrela é uma empresa comercial (atacado) que, no ano de X1, incorreu nas seguintes operações de compra e venda a prazo: Evento 01 (Compra a Prazo) – Aquisição de 10.000 unidades da mercadoria Alfa na data inicial T1. As mercadorias serão pagas em T3 sendo o preço unitário a prazo de R$ 20,00 e o preço à vista de R$ 19,00. No mercado, a mesma mercadoria Alfa é negociada à vista por R$ 19,00. Considerar um percentual de aplicação de 6% a.p. e um percentual de captação de 4% em T2. Resolução – Compra a Prazo: Quadro 1: Evento compra de mercadoria.

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As 10.000 unidades da mercadoria Alfa foram adquiridas ao custo de R$ 20,00, cada. Porém, no AC, a contabilização da conta Mercadorias será dada considerando o Valor de Mercado por ser mais baixo (R$ 19,00) que o valor desembolsado na compra. Para o cálculo da Margem de Contribuição Operacional (R$ 12.000,71), considerar-se-á como Receita de Compras (R$ 190.000,00) o valor que o mercado atribui às mercadorias adquiridas, ou seja, o valor de mercado (R$ 19,00) vezes a quantidade adquirida, e, como Custo das Compras (R$ 180.000,00), será contabilizado o valor que a empresa pagaria caso a compra fosse à vista (preço à vista R$ 18,00 vezes 10.000 unid). A Receita Financeira de R$ 22.000,71 é o ganho da empresa por postergar o pagamento da mercadoria, ou seja, é o valor a pagar trazido ao valor presente. Para composição da Margem de Contribuição Financeira de R$ 2.000,71, faz-se necessário subtrair da Receita Financeira o Custo Financeiro, que é o valor acrescido pelo fornecedor pela referida postergação no pagamento das compras (valor a total à vista menos o valor total a prazo). A Margem de Contribuição de Compras é obtida pela adição da Margem de Contribuição Operacional à Margem de Contribuição Financeira, resultando em R$ 12.000,71, que irá compor o resultado do evento no Balanço apurado pelo GECON. Evento 02 (Tempo-conjuntural) – Considera-se que, no segundo período (T2), o preço da mercadoria a valor de mercado sofre um aumento caracterizado a R$ 21,00 a unidade de Alfa. Sabe-se também que a taxa de captação no mercado é de 4% a.p. Resolução – Tempo Conjuntural Quadro 2: Tempo-conjuntural.

Segundo Guerreiro (2001, p. 98): A simples passagem do tempo gera impactos financeiros e patrimoniais. Esses impactos podem ocorrer em função dos prazos de financiamentos (compras a prazo, vendas a prazo, empréstimos, etc.) alterando o valor presente destes e de alterações de preço, taxa de inflação, taxa de juros, taxa de câmbio. Esses impactos são denominados tempos-conjunturais.

Passado um período do evento de compra de mercadorias, a empresa deve encerrar suas demonstrações financeiras. A despeito do que ocorre na metodologia da contabilidade ortodoxa, na metodologia do GECON, as informações e resultados estão expressos no Quadro 2. A Margem de Contribuição da Estocagem é obtida pela subtração do ganho de estocagem e o custo financeiro

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do estoque. O ganho de estocagem de R$ 10.000,00 se deu pelo aumento do preço de mercado à vista de R$ 19,00, por unidade, para R$ 20,00, por unidade. Pois, segundo Pereira (2001), ocorrendo qualquer alteração no valor de mercado dos estoques, o ganho ou perda oriunda dessa variação de preços, devem ser considerados no resultado econômico da entidade. O custo financeiro do estoque representa o quanto a empresa deixou de ganhar no mercado financeiro se, ao invés de adquirir estoques, tivesse aplicado seus recursos a uma taxa de 4% ao mês no período de T1 a T2, ou seja, R$ 190.000,00 vezes 4% = R$ 7.600,00. A Margem de Contribuição Financeira é o resultado da receita de financiamento dos estoques menos o custo financeiro das exigibilidades e o custo do capital investido. A receita de financiamento de estoques de R$ 7.600,00 é obtida pela multiplicação do valor dos estoques no balanço do GECON de R$ 190.000,00 pela taxa de captação de 4% ao mês. O custo financeiro das exigibilidades de R$ 10.680,90 é obtido da diferença entre as exigibilidades de T1 e T2, considerando que tais valores (Juros Diferidos) já foram consumidos em parte no período T1. O custo do capital investido de R$ 720,04 é obtido mediante a multiplicação do resultado do Evento Compra (R$ 12.000,71) pela taxa de aplicação mensal (6%). Dessa forma, obtém-se a Margem de Contribuição Total pela soma da Margem de Contribuição de Estocagem e a Margem de Contribuição de Financeira. Evento 03 (Venda a Prazo) – Em T2, a empresa vende 5.000 unidades do produto Alfa com data de recebimento em T3. O preço praticado foi de R$ 25,00, porém, se o produto fosse vendido à vista, o preço seria R$ 22,00. Considerar um percentual de aplicação de 4,00% a.p.

Resolução – Venda a Prazo No ativo, a conta Clientes é composta pelo valor integral a receber ajustado por Juros Diferidos, que corresponde ao ajuste da conta Clientes ao valor presente. O custo das vendas (R$ 100.000,00) reduz a conta Mercadorias. Guerreiro (2001, p. 103) explica que “pelo modelo GECON, o procedimento adotado quanto ao tratamento do evento de venda a prazo é o mesmo dado ao evento de compra a prazo. Desdobra-se a apuração da margem de contribuição total do evento de venda a prazo em seus aspectos operacionais e financeiros”. A Margem de Contribuição Operacional resulta da Receita de Venda de R$ 125.000,00 (5.000 unidades vendidas ao preço à vista de R$ 22,00 por unidade) menos os R$ 100.000,00 do Custo das Vendas (5.000 unidades vendidas com custo unitário de R$ 20,00). A Margem de Contribuição Financeira de R$ 10.000,00 é a subtração da Receita Financeira, composta pelo resultado da subtração do preço à vista e a prazo (R$ 25,00 – R$ 22.00 = R$ 3,00 x 5.000 = R$ 15.000,00), menos o Custo Financeiro de R$ 7.074,53, que é obtido trazendo ao valor presente o valor a receber de clientes. Assim, a Margem de Contribuição de Venda (R$ 17.925,47) é a soma do resultado operacional e financeiro. Esse valor é carregado ao balanço patrimonial, configurando um resultado acumulado de R$ 28.525,24. A seguir, no Quadro 3, apresenta-se o Balanço Patrimonial sob a ótica da mensuração econômica do GECON.

Quadro 3: Evento venda de mercadoria – B.P.

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Quadro 3: Evento venda de mercadoria – D.R.E. (continuação)

9. Análise dos resultados Com os dados obtidos nos quadros 1, 2 e 3, pode-se formatar um novo demonstrativo expondo todos os resultados que cada departamento gerou à Cia. Estrela. A possibilidade de fornecer dados para que o gestor possa analisar cada departamento e seu respectivo resultado é o que faz com que o GECON se fortaleça como uma ferramenta eficaz para a gestão da empresa.

Quadro 4: Análise dos dados.

Percebe-se, pelos dados anteriores, que todas as atividades da Cia. Estrela geraram algum tipo de resultado em seu processo, essa análise não seria possível no modelo contábil societário. Os departamentos de Compra e Venda geraram resultados econômicos positivos, enquanto o departamento de Estoques acumulou um resultado negativo de R$ 1.400,94. Dessa forma, a gerência da empresa tem a oportunidade de verificar o que trouxe tal resultado a esse departamento em sua atividade. O que na contabilidade ortodoxa seria um resultado de R$ 25.000,00 (Receita de R$ 125.000,00 menos Custo de R$ 100.000,00), é, na realidade, pelo modelo de mensuração do GECON, um resultado econômico de R$ 28.525,24, adicionado de tais conceitos econômicos e ainda proporcionando uma visão mais abrangente do resultado da empresa. 9. Conclusão Os dados apresentados, mediante quadros-resumos 1, 2, 3 e 4, permitem concluir que, no modelo da gestão econômica, é possível ao gestor avaliar o efetivo resultado de uma área específica da organização, tanto no seu contexto operacional quanto no plano financeiro. O “lucro contábil” de R$ 25.000,00, na verdade, significa um resultado econômico de todo um período no valor de R$ 28.525,24, em T2, fruto da comparação do negócio com os valores praticados no mercado e com as receitas e custos financeiros incorridos, quando valores futuros são trazidos para valores correntes. Fica evidente que o fato de reconhecer os resultados ocorridos a cada evento econômico dentro da empresa torna o GECON, poderosa ferramenta para a gestão da empresa, uma vez que, partindo de sua forma de mensurar o resultado, o GECON deixa transparecer os pontos fortes e fracos da empresa. Ou seja, os locais em que ela está perdendo ou criando valor e, consequentemente, em que a gestão deve voltar os olhos para a tomada de decisões. Referências BEUREN, Ilse Maria. Modelo de mensuração do resultado de eventos econômicos empresariais: um enfoque de sistema de informação de gestão econômica. Tese (Doutorado) – FEA/USP. São Paulo, 1995. CATELLI, Armando (coord). Controladoria: uma abordagem da Gestão Econômica – GECON. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

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FERNANDES, José Luiz Nunes. O Modelo de Mensuração de Gestão Econômica – GECON – como uma efetiva resposta para a área de controladoria. Adcontar, Belém. v. 5, n.1, p. 15-34, jun. 2004. GUERREIRO, Reinaldo. Mensuração do resultado econômico. In: ______ (coord.). Controladoria: uma abordagem da gestão econômica – GECON. São Paulo: Atlas, 2001. IUDICIBUS, Sérgio de. Teoria da Contabilidade. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2000. LOZECKY, Jéferson. Mensuração de Resultado. Revista Contemporânea de Contabilidade. a.1, v. 01, p. 97-114, jan/ jun. 2004. MARONI NETO, Ricardo. Análise comparativa entre modelos de mensuração de resultados: uma abordagem teórica sobre os fatores do ambiente econômico. Dissertação (Mestrado) - UNIFECAP. 2001. ______. Algumas considerações sobre aspectos conceituais dos modelos EVA, GECON e BSC. Revista Brasileira de Contabilidade. n° 147. Mai/jun. 2004. MOSIMANN, Clara Pellegrinello e FISCH, Silvio. Controladoria: seu papel na administração de empresas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. NAKAGAWA, Massayuki. Aspectos Comportamentais da Contabilidade Gerencial. São Paulo. FEA-USP. 1997. PARISI, Cláudio; NOBRE Waldir de Jesus. Eventos, gestão e modelos de decisão. In: CATELLI, Armando (coord.). Controladoria: uma abordagem da gestão econômica – GECON. São Paulo: Atlas, 2001. PEREIRA, Carlos Alberto. Ambiente, empresa, gestão e eficácia. In: CATELLI, Armando (coord.). Controladoria: uma abordagem da gestão econômica – GECON. São Paulo: Atlas, 2001.

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REORGANIZAÇÕES SOCIETÁRIAS DE EMPRESAS DO AGRONEGÓCIO Carlos Roberto Souza Carmo 1 Igor Gabriel Lima 2 José Orcélio do Nascimento 3 Mauro Fernando Gallo 4 Vanderley Guerra 5

Resumo

Este artigo teve como objetivo apresentar a necessidade da observação dos aspectos contábeis e tributários nas reorganizações societárias de empresas. Os aspectos contábeis foram delimitados aos custos antes e após a mudança societária. Em relação ao planejamento tributário, este estudo analisou o Imposto Territorial Rural – ITR, o Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU e o Imposto sobre Transmissão Onerosa de Bens Imóveis – ITBI. A reorganização societária tem, entre os seus objetivos, a redução de custos e despesas, em que estão incluídos os tributos pagos pelas empresas. Porém, não deve ser confundida evasão tributária (em que são utilizados meios fraudulentos para se obter uma economia tributária), com elisão tributária (que é o meio legal, formalmente lícito, utilizando o princípio da legalidade). Neste trabalho, foram apresentados os reflexos dos tributos ITR, IPTU e ITBI e, ainda, identificada uma redução de custos proveniente da reorganização societária de duas empresas, localizadas em uma cidade na região de Araçatuba, no Estado de São Paulo, que atuam no setor rural, mais especificamente na pecuária e na agroindústria canavieira. Palavras Chave: Planejamento Tributário. Reorganizações Societárias. Tributos.

Abstract

This article was to present the need of the observation of accounting and tax aspects in corporate reorganizations of companies. The accounting aspects were delimited cost before and after the corporate change. In relation to tax planning, this study analyzed the Rural Territorial Tax – ITR, Property Tax and Urban Territorial – IPTU, and Costly Tax Transfer of Immovable Property – ITBI. The reorganization has among its objectives the reduction of costs and expenses which included are taxes paid by enterprises. However should not be confused tax evasion (using fraudulent means to obtain a tax savings) with tax avoidance (which is the legal environment, formally allowed using the principle of legality). Were presented the reflexes of tributes ITR, IPTU and ITBI and a cost reduction with the reorganization of two companies, located in a city in the region of Aracatuba, in São Paulo State, who work in the rural sector and more specifically in livestock and cultivation of sugar cane. Keywords: Tax planning, Corporate reorganizations, Tributes. 1. Introdução O estudo de temas tributários pelos pesquisadores de Ciências Contábeis no Brasil é ainda pouco explorado, e tópicos complexos como a reorganização societária apresentam ainda menos trabalhos científicos e livros publicados. Desta forma, é difícil encontrar uma definição para reorganização societária. Conforme Gallo (2002, p.20), as reorganizações societárias ocorrem há anos, embora nota-se que até hoje não foi apresentado um conceito claro sobre essas operações. Para a viabilidade de uma reorganização societária, torna-se necessária, em especial, uma análise com ênfase nos aspectos contábeis como, por exemplo, os custos antes e depois da mudança societária e o aspecto legal tributário. Em outros termos, o que pretende ser realizado é se a respectiva operação obedece à legislação ou é uma tentativa de enganar a Administração Tributária, ou seja, o Fisco. Este artigo tem como objetivo apresentar os reflexos da reorganização societária no planejamento tributário de entidades de direito privado interno, isto é, organizações que não possuem imunidade tributária. Portanto, são sujeitos passivos das obrigações tributárias como contribuintes ou responsáveis tributários, em especial, as entidades que atuam no setor rural, ou mais especificamente na pecuária e na agroindústria canavieira, lembrando que o Brasil é um dos países com maior potencial no agronegócio na comunidade internacional. Mestre em Ciências Contábeis e Financeiras - PUC-SP; professor da Universidade de Uberaba; (34) 33198996 / (34) 99963924 / (34) 33198910; e-mail: carlosjj2004@hotmail.com Mestre em Ciências Contábeis – FECAP - Faculdades Integradas do Vale do Ribeira; (13) 38642745 / (13) 97732665; e-mail: igorgabriellima@gmail.com Mestre em Ciências Contábeis – FECAP - Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP-SP; (11) 3272-2222; e-mail: jorcélio@uol.com.br Doutor em Controladoria e Finanças – FEA-USP - Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP-SP; (11) 3272-2222; e-mail: mauro.gallo@fecap.br Mestrando em Ciências Contábeis – FECAP - Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP-SP; (11) 3272-2222; e-mail:deleyguerra@gmail.com

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Para a realização deste artigo, foram utilizados dados de um estudo para reorganização societária de duas empresas situadas em uma cidade do Estado de São Paulo que atuam na plantação de cana-de-açúcar e criação de gado para corte. Os custos das empresas apresentados referem-se somente a estas atividades, e o planejamento tributário foi delimitado ao Imposto Territorial Rural – ITR, ao Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, e ao Imposto sobre Transmissão Onerosa de Bens Imóveis – ITBI. 2. Fundamentação Teórica Atualmente, no Brasil, um dos setores da economia que se destaca é a agroindústria, cujos custos e despesas, entre estes o pagamento de tributos, tornam sua continuidade comprometida, devido à voracidade da administração tributária. Nesse sentido, uma alternativa para a redução dos custos das empresas é a reorganização societária, desde que realizada dentro da legalidade, que não seja contrária à lei. 2.1 Planejamento tributário O Código Tributário Nacional, no artigo 3º, conceitua tributo como toda prestação pecuniária compulsória, em moeda, ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Logo, o pagamento dos tributos é uma prestação pecuniária compulsória, ou seja, obrigatória. A finalidade do planejamento tributário é que o contribuinte consiga uma economia tributária das suas obrigações com o fisco, isto é, evitar que pague valores desnecessários. Desta forma, possibilita uma redução de custos e despesas, prática já utilizada por diversas pessoas físicas e jurídicas. O planejamento tributário é definido, conforme Young (2008, p.99), em observar a legislação pertinente e optar, ou não, pela ocorrência do fato gerador. É uma forma de projetar dados e, assim, determinar resultados, os quais poderão ser escolhidos para serem realizados ou não. Para Fabretti (2008, p. 152), o planejamento tributário ou elisão tributária é a atividade preventiva que estuda, a priori, os atos e negócios jurídicos que o agente econômico (empresa, instituição financeira, cooperativa, associação etc.) pretende realizar. Sua finalidade é obter a maior economia fiscal possível, reduzindo a carga tributária para o valor realmente exigido por lei. De acordo com Gutierrez (2006, p. 17), a finalidade do planejamento tributário é prever e dispor os negócios jurídicos do contribuinte de forma que haja uma economia de tributos, sempre respeitando os limites impostos pela lei. No entanto, antes de ocorrer o fato gerador, não há obrigação tributária e, portanto, o contribuinte pode se esquivar de adentrar na situação legal de tributação, ou mesmo escolher situações legais que resultem numa menor incidência tributária, ou mesmo num adiamento de suas responsabilidades fiscais. A Constituição Federal, no artigo 5°, II, estabelece que: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Este inciso apresenta o princípio da legalidade. Além disso, o texto constitucional, nas limitações do poder de tributar, determina, no artigo 150, I, que: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I- exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça (BRASIL, 1988)

Segundo Carvalho (2007, p.174), qualquer das pessoas políticas de direito constitucional interno somente poderá instituir tributos, isto é, descrever a regra-matriz de incidência ou aumentar os existentes, majorando a base de cálculo ou a alíquota, mediante a expedição de lei. E, ainda, conforme os ensinamentos de Carvalho (2007, p.174), o veículo introdutor da regra tributária no ordenamento há de ser sempre a lei (sentido lato). Vale ressaltar o princípio da estrita legalidade diz mais do que isso, estabelecendo a necessidade de que a lei adventícia traga no seu bojo os elementos descritores do fato jurídico e dados prescritores da relação obrigacional. De acordo com as definições apresentadas, o planejamento tributário deve ser realizado antes do fato gerador da obrigação tributária. Chaves (2008, p.5) afirma que fazer planejamento tributário não é apenas um direito garantido pela Constituição Federal, mas também um dever legal determinado pelo artigo 153 da Lei n° 6.404/76. Art. 153. O administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios. (BRASIL, 1976)

Fabretti (2008, p.153) observa que é necessário pesquisar, antes de cada operação, suas conseqüências econômicas e jurídicas, porque uma vez concretizadas, considera-se ocorrido o fato gerador e existente seus efeitos, conforme art. 116 do Código Tributário Nacional, surgindo a obrigação tributária.

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SISTEMA ACIU DE ENSINO • NOVEMBRO / 2010 Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (BRASIL, 1966)

Ainda, conforme Fabretti (2008, p.153), torna-se necessário estudar e identificar todas as alternativas legais aplicáveis ao caso ou à existência de lacunas “brechas” na lei que possibilitem realizar a operação pretendida, da forma menos onerosa possível, para o contribuinte, sem contrariar a lei. Nessa lógica, a economia tributária resultante da adoção da alternativa legal menos onerosa ou de lacuna da lei denomina-se elisão fiscal. O objetivo do planejamento tributário é possibilitar uma economia tributária obedecendo à lei, ou seja, não ser um ato ilícito. Ademais, todas as situações que resultem em economia tributária não podem ser consideradas como planejamento tributário. Para melhor exemplificação deste aspecto, vale mencionar GRECCO (2005, p.35), que demonstra três figuras que devem ser afastadas do planejamento tributário: a prática de atos ilícitos; a extrafiscalidade e a concessão de incentivos; e as opções fiscais. A prática de atos ilícitos não é planejamento tributário, mas evasão tributária, que é um ato ilícito. Quanto à extrafiscalidade, Grecco (2005, p.35) expõe que não configura planejamento tributário a fruição de menor carga tributária em razão de: regras informadas pelo objetivo da extrafiscalidade; e engajamento em programas de incentivo governamentais. Em relação às opções fiscais, de acordo com Grecco (2005, p.35), estas são escolhas que o contribuinte pode fazer entre modos distintos de apuração do imposto ou do cumprimento da obrigação tributária (por exemplo, a opção pelo lucro presumido no âmbito do imposto sobre a renda), expressas e positivamente previstas no ordenamento. Contudo, devem ser respeitados pela administração tributária os limites para que não sejam cometidos excessos. Para que não ocorram, deve ser observado o princípio da capacidade contributiva que consta no artigo 145, III, § 1º da Constituição da República Federativa do Brasil. Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: III – [...] § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (BRASIL, 1988)

Porém, mesmo o texto constitucional adotando o princípio da capacidade contributiva, ou seja, possibilite uma proteção aos contribuintes, é interessante lembrar o comentário de Fabretti (2008, p.153) de que “às vezes, o Governo tenta passar para a sociedade a falsa idéia de que o planejamento tributário é algo que prejudica o país, o que, no mínimo, é uma postura lamentável.” O planejamento tributário hoje é uma necessidade para os contribuintes sejam pessoas físicas ou jurídicas, em razão da grande carga tributária e da rapidez das mudanças da legislação tributária dos fiscos federal, estaduais e municipais a que são submetidas. Por outro lado, o contribuinte deve obedecer aos limites da lei, ou seja, não pode ser confundido planejamento tributário ou elisão tributária, que são meios lícitos, com a evasão tributária, que é ilícita porque é tênue a linha que separa esta última daquela. 2.2 Evasão fiscal A evasão tributária, conforme Gutierrez (2006, p. 58), consiste nas práticas ou omissões do contribuinte tendentes a suprimir, reduzir ou retardar o cumprimento de uma obrigação tributária. Para Fabretti (2008, p.154), a evasão tributária, ao contrário da elisão, consiste em prática contrária à lei, geralmente cometida após a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, objetivando reduzi-la ou ocultá-la. Conforme Young (2008, p.75), a evasão fiscal é um ilícito tributário sobre o qual caem as normas pautadas na lei que dispõe sobre os crimes contra a ordem tributária, a Lei nº 8.137/90, em conjunto com a Lei nº 9.249/95. A autora afirma que, na evasão tributária, são utilizados meios fraudulentos para se obter uma economia tributária, diferentemente da elisão tributária, cujo meio é legal, formalmente lícito, ao empregar o princípio da legalidade. Como foi comentado anteriormente, a evasão tributária é contrária à legislação, é punível por esta conforme a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, no capítulo referente aos crimes contra a ordem tributária, na seção dos crimes praticados por particulares. Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante

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as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. (BRASIL, 1990)

Como o objetivo da administração tributária é a arrecadação dos tributos, mesmo com a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que define os crimes contra a ordem tributária, o legislador pátrio criou a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, que, no artigo 34, determina: Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia. (BRASIL, 1990)

Pode ser notado que, ao contrário de outros ilícitos, o tributário pode ser extinto desde que ocorra o pagamento dos valores devidos ao fisco, porém, o não pagamento destes valores pode resultar no artigo 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996. Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária definidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, será encaminhada ao Ministério Público após proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. Parágrafo único. As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz. (BRASIL, 1996)

Desta forma, o poder do fisco sobre os contribuintes é grande e muitas vezes estes procuram meios para pagar o valor menor de tributos e, conforme demonstrado, estará ocorrendo evasão tributária. 2.3 Reorganizações societárias A competitividade entre empresas sempre existiu e atualmente está mais evidente. Isto pode ser confirmado quando se percebe o número de empresas que encerram suas atividades por problemas como falências. E, caso as empresas não cheguem à situação falimentar ou pré-falimentar, seus proprietários têm a opção de vender suas participações ou procurar novos sócios para que não saiam dos negócios ou venham a perder seus investimentos no futuro. Então, surgem vários questionamentos destes empresários: O que fazer? Como fazer para não perder os investimentos ou mesmo muitos anos da vida dedicados às empresas, sejam estas pequenas ou grandes, situadas em cidades ou na região rural? Algumas das soluções sempre apresentadas às pessoas que fazem tais perguntas é a redução de custos e despesas, adaptação a novas tecnologias ou a entrada de mais capital com novos sócios. Desta forma, empresários e executivos podem utilizar a reorganização societária, que pode ser realizada com a transformação de um tipo de sociedade para outro, ou pela fusão, ou cisão ou incorporação. Durante a pesquisa para este trabalho, percebeu-se a dificuldade em encontrar uma definição para reorganização societária, fato que já havia sido observado por Gallo (2002, p.20) “embora as reorganizações societárias já venham ocorrendo há um bom número de anos nota-se que até hoje não foi apresentado um conceito claro sobre essas operações.” Além disso, vale ressaltar, a reorganização societária nem sempre é vantajosa para o fisco, porque um dos objetivos da reestruturação das sociedades é a redução de custos e despesas, incluídos os tributos pagos pelas empresas. Para tentar reduzir esta perda de arrecadação, a administração pública conta com o artigo 116, parágrafo único do Código Tributário Nacional. Art. 116. [...] Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de

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SISTEMA ACIU DE ENSINO • NOVEMBRO / 2010 dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela Lei nº 104, de 10.1.2001) (BRASIL, 1966)

Quanto ao parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional (CTN), vale mencionar Fabretti (2008, p.155): “A lei complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, alterou vários dispositivos do CTN, alegando como finalidade a de combater a elisão fiscal, quando na verdade essas alterações referem-se à evasão fiscal, que, como se demonstrou, são coisas diferentes.” E, conforme os ensinamentos de Fabretti (2008, p.155), a análise do parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional apresenta a desconsideração de atos e negócios jurídicos. Conforme o ilustre tributarista, este parágrafo único não passa de uma simples declaração de propósitos que, para sua aplicação efetiva, é necessário uma lei ordinária. Esta preocupação das operações de reorganizações societárias já foi observada por Gallo (2002, p.20) A maior dificuldade encontra-se em diferenciar as reais operações de reorganização societária – no caso das fusões, incorporações, e cisões – “das falsas” (sic), assim chamadas por envolver a simulação de operações de vendas de ativos, parciais ou totais. Uma reorganização pode gerar um monopólio, ou seja, uma concentração econômica que é prejudicial a toda sociedade e contrário ao que estabelece o artigo 170 da Constituição Federal, que protege a livre concorrência. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. (BRASIL, 1988)

Tendo em vista esta possibilidade, o poder público exerce o controle sobre estas possíveis situações através do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, que tem suas atribuições estabelecidas na Lei nº 8.884/96. Para realizar uma reorganização societária devem ser observados alguns procedimentos que, conforme Fabretti (2005, p.146148), são: A – Auditoria da documentação jurídica: Livros e documentos societários: livros societários (inclusive os já encerrados), exigidos pelo artigo 100 da Lei 6404/76; cópias das atas de assembleias ou alterações contratuais dos últimos 20 anos; cautela de ações; cópias das procurações vigentes; acordo de acionistas ou de quotistas e composição do quadro acionário. Propriedade imobiliária: cópias de todas as escrituras dos imóveis e respectivos registros, acompanhadas de certidões de propriedade e negativa de ônus e alienações; e cópias de plantas dos imóveis, regularizadas na prefeitura; habite-se ou conservação e laudo técnico do corpo de bombeiros. Propriedade mobiliária: prova na contabilidade de aquisição de todos os bens móveis, dos títulos e valores mobiliários e as respectivas declarações de inexistência de ônus. Propriedade imaterial: verificar o registro no Instituto Nacional de Propriedade Industrial de todas as marcas e patentes, cópias dos contratos de assistência técnica, de transferência de tecnologia e licença de marcas e patentes, bem como documentos referentes a processos e sistemas utilizados na área industrial; relação de todas as patentes requeridas, avaliação das marcas e de suas regularizações. Capital estrangeiro: via original do certificado do Banco Central do Brasil. Tributos Federais: cópias das guias de recolhimento DARFs referentes aos impostos e contribuições federais, das declarações e informações fiscais, livros e documentos fiscais dos últimos cinco anos para os impostos e contribuições federais. Tributos Estaduais: cópias das guias de recolhimento do ICMS dos últimos cinco anos, acompanhadas dos livros de apuração, e comprovantes do pagamento do IPVA dos veículos automotores dos últimos cinco anos. Tributos Municipais: guias de recolhimento do ISS, IPTU, taxas e licenças dos últimos cinco anos, e livros fiscais do ISS. Contencioso fiscal: certidões negativas de tributos federais, estaduais e municipais, acompanhadas das respectivas certidões de objeto e pé (breve relato), quando forem positivas; lista de processos fiscais às ações ajuizadas pelas empresas envolvidas no evento.

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Trabalhista: listas dos processos trabalhistas, cópias de convenções ou dissídios coletivos; cópias dos contratos de trabalho de todos os executivos; especificação dos benefícios concedidos e relação nominal de todos os empregados. Vale pontuar que a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT- no artigo 10, estabelece que qualquer alteração na estrutura jurídica da empresas não afetará os direitos adquiridos por seus empregados e, ainda, o artigo 448 da CLT assevera que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados. Previdenciário: cópias das guias de recolhimento do INSS (últimos dez anos), do FGTS (últimos 30 anos) e relatórios sobre a última fiscalização. Cível e Comercial: lista de todos os processos judiciais, no país e no exterior onde a empresa seja autora ou ré; pontos conflitantes que possam resultar em litígios; cópias dos contratos firmados com terceiros; cópias das apólices de seguro e verificar se cada empresa está respeitando o Código de Defesa do Consumidor. Meio Ambiente: registro em órgãos de controle ambiental e verificação da existência de passivos ambientais. B – Procedimentos contábeis: As empresas devem elaborar suas demonstrações financeiras trinta dias antes da realização do evento. A reavaliação dos ativos e a verificação de passivos ocultos devem ser feitos por uma empresa de auditoria para certificar que os valores apresentados representam a exata situação das empresas envolvidas e, também, se foram observados os princípios e normas contábeis. C – Direitos dos credores: O Novo Código Civil de 2002 assegura o direito do credor que se sentir prejudicado, desde que o seu crédito seja anterior a um desses eventos, no prazo de 90 dias após a publicação dos atos relativos à incorporação, fusão ou cisão para promover judicialmente a anulação deles. Art. 1.122. Até noventa dias após publicados os atos relativos à incorporação, fusão ou cisão, o credor anterior, por ela prejudicado, poderá promover judicialmente a anulação deles. (BRASIL, 2002a)

E quanto à responsabilidade tributária não pode ser esquecido o artigo 132 do Código Tributário Nacional. Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas. (BRASIL, 1966)

Este artigo do CTN demonstra a responsabilidade tributária da pessoa jurídica resultante da reorganização societária. Deve ser lembrado, ainda, que a Lei nº 6.404/76, a Lei das Sociedades Anônimas, nos artigos 220 a 234, trata da transformação, incorporação, fusão e cisão das companhias. 3. Metodologia Para a realização deste artigo, foi utilizada a metodologia conhecida como estudo de caso. Foram apresentados os conceitos teóricos para definir o que é planejamento tributário, evasão fiscal e reorganizações societárias, sendo demonstrado que a evasão tributária, ao contrário da elisão, consiste em prática contrária à lei. Os valores apresentados foram obtidos com os produtores de cana-de-açúcar e criadores de gado para corte no município em que foi realizado este trabalho de reorganização societária. As empresas envolvidas neste estudo serão chamadas de empresa A e empresa B. 4. Análise dos Dados e Discussões O planejamento tributário apresentado neste trabalho foi realizado com objetivo de uma fusão entre duas empresas rurais de uma cidade situada na região de Araçatuba, no Estado de São Paulo, sendo que, a cidade em que estão situadas as empresas deste estudo, ou melhor, da reorganização societária, tem como grandes atividades econômicas o cultivo da canade-açúcar e a criação de gado para corte, que, para questão de estudo, serão tratadas como empresa A e empresa B. A empresa A possui uma propriedade rural e a empresa B também possui uma propriedade rural. Um dos sócios desta tem um escritório na área urbana do município e pretende incorporar este escritório ao patrimônio da nova. As duas propriedades rurais são vizinhas, o que facilita a administração e uma possível redução de custos e despesas operacionais da futura empresa. A fusão das duas resultará em outra de nome Ponte Preta, que terá como atividades o cultivo de cana-deaçúcar e a criação de gado para corte. Conforme Marion (2007, p.29), as pessoas físicas tidas como pequeno e médio produtor rural não precisam, para fins de Imposto de Renda, fazer escrituração regular em livros contábeis, podem utilizar apenas um livro-caixa e efetuar uma escrituração simplificada. Porém, conforme a legislação do Imposto de Renda, as pessoas físicas, classificadas como grande produtor rural, serão equiparadas às pessoas jurídicas para fins contábeis, devendo fazer escrituração regular.

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4.1 Características das empresas: Empresa A A empresa A possui uma propriedade rural com 71 alqueires, sendo que 50 destes são utilizados no plantio da canade-açúcar e 20 para a criação de gado. O rebanho é de 200 bois para corte. Um (1) alqueire da propriedade é destinado a instalações da administração da propriedade e às casas dos empregados. Empresa B Esta empresa possui uma propriedade rural de 60 alqueires, dos quais 20 são utilizados no plantio de cana-de-açúcar, 39 não são utilizados e 1 é destinado às casas dos empregados e instalações da administração. Um dos proprietários tem um escritório que não está incluso no patrimônio da empresa B, este imóvel é utilizado nas atividades de consultoria prestadas por este proprietário, que pretende encerrar suas atividades como consultor para dedicar-se as atividades da empresa que está sendo constituída com esta fusão. 4.2 Situação atual das empresas Os custos para o preparo de um alqueire de terra para a plantação de cana-de-açúcar são apresentados nas tabelas 1 e 2. Estes possibilitam que a cana possa ser cortada até 5 vezes, no mínimo, e 6 ou 7, no máximo.

Tabela 1 – Custo para o preparo da terra

Tabela 2 – Custo para o plantio

Para o segundo corte, são necessários os outros custos que podem ser verificados na tabela 3.

Tabela 3 – Custos a partir do 2º corte

Quando da verificação dos valores dos custos apresentados, também foram apurados os valores de venda e a tonelada da cana-de-açúcar valia, no mercado, R$ 28,00, embora 1 alqueire produza 300 toneladas de cana-de-açúcar. Outra atividade exercida pela empresa A é criação de gado, e os gastos desta atividade são apresentados na tabelas 4, sendo que o preço de compra de um boi magro é de R$ 700,00.

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Tabela 4 – Custo para o confinamento de gado por mês para 200 bois

São necessários 60 dias para engordar um boi, cujo preço de venda é de R$ 85,00 a arroba, sendo que um boi pesa de 13 a 18 arrobas. Para facilitar os cálculos, convencionou-se considerar que cada boi pesa 15 arrobas. Conforme as tabelas apresentadas sinteticamente, os resultados das Empresas A e B são: Empresa A

Receita com a plantação de cana-de-açúcar: 50 alqueires X 300 toneladas X R$ 28,00 p/tonelada

R$ 420.000,00

(-) Despesa com a plantação de cana-de-açúcar no 1º ano 50 alqueires X R$ 6.210,00 p/alqueire

R$ 310.500,00

(=) Resultado

R$ 109.500,00

Receita com o confinamento de gado: 200 bois X 15 arrobas X R$ 85,00 p/arroba

(-) Despesas com o confinamento de bois 200 bois X R$ 700,00 + R$ 57.200,00 custo p/engorda R$ 197.200,00

(=) Resultado

Parcial A

Parcial B

R$ 255.000,00

R$ 57.800,00

O Resultado Total (Parcial A + Parcial B) foi de R$ 167.300,00, sem considerar os demais custos e despesas.

Empresa B

Receita com a plantação de cana-de-açúcar: 20 alqueires X 300 toneladas X R$ 28,00 p/tonelada

R$ 168.000,00

(-) Despesa com a plantação de cana-de-açúcar no 1º ano 20 alqueires X R$ 6.210,00 p/alqueire

R$ 124.200,00

(=) Resultado

R$ 43.800,00

Total

Assim como o Resultado Total da Empresa A, o resultado aferido na Empresa B não considerou os demais custos e despesas. Observou-se que, com a fusão destas empresas, torna-se necessário a utilização dos 39 alqueires pertencentes à empresa B que não são utilizados, lembrando que sobre as propriedades rurais incide o Imposto Territorial Rural (ITR), conforme o artigo 153 da Constituição Federal. Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: VI - propriedade territorial rural; § 4º O imposto previsto no inciso VI do caput: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) I - será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) (BRASIL, 2002b)

De acordo com o texto constitucional o ITR, é um imposto extrafiscal por ter como uma das suas finalidades desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, bem como a alíquota aplicada obedecerá aos artigos 34 e 35 do

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Decreto nº 4.382, de 19 de setembro de 2002. Art. 34. A alíquota utilizada para cálculo do ITR é estabelecida para cada imóvel rural, com base em sua área total e no respectivo grau de utilização, conforme a tabela seguinte (Lei nº 9.393, de 1996, art. 11 e Anexo)

Art. 35. O valor do imposto a ser pago é obtido mediante a multiplicação do VTNT pela alíquota correspondente, obtida nos termos do art. 34, considerados a área total e o grau de utilização do imóvel rural (Lei nº 9.393, de 1996, art. 11). § 1º Na hipótese de inexistir área aproveitável após as exclusões previstas nos incisos I e II do art. 16, serão aplicadas as alíquotas correspondentes aos imóveis rurais com grau de utilização superior a oitenta por cento, observada a área total do imóvel (Lei nº 9.393, de 1996, art. 11, § 1). (BRASIL, 2002b)

Conforme pode ser observado, as alíquotas do ITR variam de 0,03% até 20%. Com isto, não é aconselhável uma propriedade rural possuir uma área sem utilização. E ainda quanto à empresa B, um de seus proprietários está disposto a incorporar ao patrimônio da empresa Ponte Preta o escritório que possui na área urbana da cidade é uma atitude interessante tendo em vista que com isto o valor do IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano será uma despesa da nova empresa. Ademais, deve-se lembrar que estas transferências de imóveis para a nova empresa não terão a incidência do Imposto sobre Transmissão Onerosa de Bens Imóveis – ITBI, como pode ser constatado no artigo 156 da Constituição Federal. Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: II - transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; § 2º - O imposto previsto no inciso II: I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. (BRASIL, 1988)

Com a fusão das empresas A e B, será possível um aumento na produção de cana-de-açúcar, ou seja, um aumento de receitas e uma redução no valor do ITR pago, bem como as despesas com o escritório na área urbana passarão a ser consideradas despesas da empresa e deixarão de ser pagas pelo antigo proprietário, que é uma pessoa física. 5. Considerações Finais A reorganização societária sem dúvida é o instrumento de planejamento tributário mais completo, porque, para realizar a reestruturação de uma sociedade, seja fusão, cisão ou incorporação, devem ser verificados os aspectos contábeis, jurídicos, econômicos e financeiros. A proposta deste artigo foi apresentar a possibilidade de se utilizar a reorganização societária em empresas rurais, sendo que hoje se encontra pouca pesquisa contábil referente à reorganização societária. Vale ressaltar que é mais complexo tratar deste assunto no meio rural, o que pode ser constatado nas referências utilizadas para a elaboração deste trabalho foi constatado que as empresas rurais representam um pequeno número de registros na Junta Comercial de São Paulo. Contudo, não pode ser esquecido que estas são responsáveis por um grande volume de exportações do país. O presente trabalho também constatou que a reorganização societária e o planejamento tributário ou elisão tributária são confundidos com evasão tributária. Tal equívoco parte dos contribuintes que utilizam meios escusos para pagar menos tributos, alegando ser um planejamento tributário, embora, na verdade, seja uma evasão tributária não permitida por lei.

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Em relação à Administração Tributária, esta sempre acusa o contribuinte de agir de maneira ilegal, nas situações em que utilizam a evasão fiscal. Porém, quando é utilizada a elisão fiscal e o contribuinte realiza uma economia tributária não contrariando a lei, o fisco também acusa estes contribuintes de lesarem o país, apesar de a administração tributária esquecer que a Constituição Federal, no artigo 145, III, § 1º, defende a capacidade contributiva do contribuinte. Como a proposta foi escrever um artigo sobre planejamento tributário, mais especificamente reorganização societária, o tema foi delimitado ao máximo, sendo que, para tratar do referido assunto, um artigo não basta. Sugere-se, portanto, como pesquisa para os próximos trabalhos, a aplicação da reorganização societária em empresas de pequeno porte e microempresas e, também, a empresas rurais em que se torna necessária uma pesquisa mais ampla. 6. Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988. ________. Lei Federal nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. ________. Lei Federal nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. ________. Lei Federal nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. ________. Lei Federal nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências. ________. Lei Federal nº 8.884, de 11 de junho de 1996a. Transforma o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providências. ________. Lei Federal nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996b. Dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências. ________. Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002a. Institui o Código Civil. ________. Decreto Federal nº 4.382, de 19 de setembro de 2002b. Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural ITR. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. rev. São Paulo: Saraiva. 2007. CHAVES, Francisco Coutinho. Planejamento tributário na prática: gestão tributária aplicada. São Paulo: Atlas. 2008. FABRETTI, Láudio Camargo. Código tributário nacional comentado. 8. ed. São Paulo: Atlas. 2008. ________. Fusões, aquisições, participações e outros instrumentos de gestão de negócios: tratamento jurídico, tributário e contábil. São Paulo: Atlas. 2005. GALLO, Mauro Fernando. Uma contribuição ao estudo do planejamento tributário nos processos de fusão, incorporação e cisão. 2002. Dissertação (Mestrado em Controladoria e Contabilidade Estratégica) – Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP, São Paulo, 2002. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1996. GRECCO, Marco Aurélio. Reorganização societária e planejamento tributário. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de, ARAGÃO, Leandro Santos de. (Coord.) Reorganização societária. São Paulo. Quartier Latin. 2005. P. 30-49. GUTIERREZ, Miguel Delgado. Planejamento tributário: elisão e evasão fiscal. São Paulo. Quartier Latin. 2006. MARION, José Carlos. Contabilidade rural: contabilidade agrícola, contabilidade da pecuária imposto de renda

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pessoa jurídica. 8. ed. São Paulo: Atlas. 2007. MARTINS, Gilberto de Andrade. Estudo de caso: uma estratégia de pesquisa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008. YOUNG, Lúcia Helena Briski. Planejamento tributário: fusão, cisão e incorporação. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2008.

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RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA E A SUPERFICIALIDADE DO MARKETING SOCIAL

Camilla Lazak RODRIGUES 1 Maraisa Bernardes SEGAVA 2 Tássia Beatriz Machado ALVIM 3

RESUMO

Tendo em vista a complexidade e abrangência do tema, buscar-se-á, neste ensaio, conhecer a influência da Responsabilidade Social nas estratégias de comunicação e visibilidade das empresas e, ainda, o real comprometimento de algumas condutas apontadas como socialmente corretas. Demonstrar-se-á o quanto a Responsabilidade Social está ligada ao marketing social, embora tal marketing deva ser cuidado de forma a não cair na proposta capitalista de propaganda, bem como quanto tais atividades são salutares para o dia-a-dia corporativo, para as atividades empresariais e para todos os membros envolvidos direta e indiretamente o processo. A partir da compreensão da dicotomia destas ações, é que será construída uma crítica quanto ao comprometimento empresarial com o meio ambiente, com a sustentabilidade e as demais questões sócioambientais que preocupam o planeta. O compromisso deve ultrapassar a mera pretensão capitalista de aumentar o número de vendas e criar uma boa imagem frente ao consumidor. Palavras-chave: responsabilidade social, marketing social, sustentabilidade, empresas.

RESUMEN

Em vista de la complejidad y la amplitud del tema, verificación si corregir lãs influencias de responsabilidad social em comunicación estratégica y la visibilidad de lãs empresas y incluso el compromiso real de algunas tubenías identificado como socialmente. Se muestra la responsabilidad social corporativa cómo está vinculada al mercadotecnia social, pero que esto debe tener cuidado de no caer em la propaganda capitalista propuesto, y cómo lãs actividades como estos son saludables para el dia a dia, corporativas y actividades para todos los miembros implicados directamente e indirectamente em el proceso. De comprender la dicotomia de estas acciones, construímos um compromiso corporativo a los críticos como el médio ambiente, sostentabilidad y otras ambientales cuestiones de interes para el planeta. La compañia debe superar el mero pretexto capitalista para aumentar el número de vendas y creae um buen frente al consumidor. Etiquetas: responsabilidad social, mercadotecnia social, sostentabilidad, lãs compañias. Entre os temas que vêm ganhando destaque na atualidade, vemos com frequência a discussão quanto à necessidade corporativa da inserção de estratégias focadas em responsabilidade social. No entanto, as ideias sobre como alcançar as metas almejadas são um tanto quanto dissonantes, o que nos leva a questionar a eficiência e o comprometimento de algumas condutas socialmente apontadas como de alta responsabilidade social e que, em verdade, acredita-se serem meras estratégias capitalistas de obtenção de lucro. Ao transcorrer deste ensaio, serão tecidas observações quanto a diferença existente entre a verdadeira preocupação com a responsabilidade social e a conduta essencialmente capitalista praticada pelo marketing social empresarial. Para que melhor se entendam as observações vindouras, vejamos as palavras de Kotler (2000), que define marketing, de forma clássica, “é um processo social por meio do qual as pessoas e grupos de pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor com outros” (KOTLER, 2000, p. 20). Diante desta definição de marketing, pode-se constatar com clareza o caráter capitalista que lhe é atribuído, uma vez que é visto como um processo no qual são criadas estratégias para aumentar as negociações e, com isso, gerar lucro empresarial. O objetivo buscado pelo marketing é o de obtenção de lucro, fazendo-se valer de todo e qualquer elemento social para que o caminho seja tão possivelmente mais curto. Se a forma de chegar ao lucro for usando de estratégias ambientalmente corretas, tão somente a preservação ecológica será o caminho, não alterando em nada o objetivo capitalista almejado. Melo Neto (2001) destaca o objetivo, também almejado pela responsabilidade social, que inclui todos e cada um dos indivíduos. A Responsabilidade Social busca estimular o desenvolvimento do cidadão e fomentar a cidadania individual e coletiva. Sua ética social 1

Bacharel em comunicação social com habilitação em publicidade e propaganda.Assessora de comunicação e marketing. Pós-graduanda em MBA Gestão Empresarial pela FCETM. E-mail: camillalazak@ hotmail.com 2 Bacharel em Administração com Habilitação em Comércio Exterior. Administradora. Pós-graduanda em MBA Gestão Empresarial pela FCETM. E-mail: masegava@hotmail.com 3 Bacharel em Direito. Advogada. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Direito Público Material pela Universidade Gama Filho. Pós-graduanda em MBA Gestão Empresarial pela FCETM. E-mail: tassiaalvim@hotmail.com

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SISTEMA ACIU DE ENSINO • NOVEMBRO / 2010 é centrada no dever cívico [...]. As ações de responsabilidade social são extensivas a todos os que participam da vida em sociedade – indivíduos, governo, empresas, grupos sociais, movimentos sociais, igreja, partidos políticos e outras instituições. (MELO NETO, 2001, p. 26-27)

Como se observa pelas palavras do autor, a ação responsável busca o desenvolvimento da cidadania individual e coletiva, a fim de que tal consciência participativa seja capaz de transformar de maneira significativa os ambientes em que se inserem os cidadãos. A preocupação aqui é com a sustentabilidade e otimização do espaço e da qualidade de vida dos indivíduos. Para a responsabilidade social, o objetivo tem haver com o ser humano, com o meio ambiente; e não com o capital. Vale destacar as palavras de Kotler (1999) por meio das quais é possível visualizar a importância do marketing social nas organizações modernas: O marketing social é uma estratégia de mudança do comportamento dentro das organizações. A sua combinação com elementos das abordagens tradicionais da mudança social dentro de um processo integrado entre planejamento e ação, aproveitando os avanços da tecnologia das comunicações e as técnicas de Marketing. (KOTLER, 1999, p.25).

Dessa forma, é possível constatar o quanto é importante a inserção das estratégias de marketing social nas empresas, sendo possível através destas ações diferenciar produtos e serviços. Podemos observar que, hoje, com a disseminação das tecnologias, a concorrência empresarial tornou-se acirrada e a disputa pelo mercado estipulou novos parâmetros. As palavras de Melo Neto (2001), em sua publicação sobre gestão da Responsabilidade Social Corporativa, comprovam que o papel do marketing social atuante na comunicação corporativa vem aumentando a credibilidade dos produtos e serviços. [...] o verdadeiro marketing social atua fundamentalmente na comunicação com os Funcionários e seus familiares, com ações que visam aumentar comprovadamente o seu bem-estar social e o da comunidade. Essas ações de médio e longo prazos garantem sustentabilidade, cidadania, solidariedade e coesão social [...] a empresa ganha produtividade, credibilidade, respeito, visibilidade e, sobretudo, vendas maiores. (MELO NETO, 2001, p. 74)

Os ensinamentos do referido autor frisam a necessidade de inversão de objetivos para que haja marketing social. É preciso que o fim seja o bem-estar; e a elevação dos lucros, mero desdobramento desta ação consciente. É unanime a afirmação da necessidade da Responsabilidade Social, no entanto, encontram-se diversos posicionamentos quando se parte para o plano da atividade. Como ilustração, no ambiente empresarial, vemos, principalmente a postura capitalista conservadora, que se utiliza do marketing social como forma de promoção empresarial, não tendo real comprometimento com as necessidades globais de responsabilidade social. Um exemplo de tal conduta pode ser observado nas palavras de Friedman (1970): A responsabilidade social da empresa consiste em aumentar seus próprios lucros (...). A maior parte daquilo que se deblatera a propósito de responsabilidade da empresa não passa de tolices. Para começar, apenas indivíduos podem ter responsabilidades; uma organização não pode tê-las. Eis portanto a questão que devemos nos colocar: será que os administradores - desde que permaneçam dentro da lei - possuem outras responsabilidades no exercício de suas funções além daquela que é aumentar o capital dos acionistas? Minha resposta é não, eles não têm (FRIEDMAN, 1970, p. 92)

Não se pretende desmerecer a postura adotada pelo marketing social, pretende-se apenas esclarecer a real atividade realizada por este, além de despertar para o entendimento do quanto mais ampla deve ser a mudança de postura individual e coletiva para que ocorra a prática real da responsabilidade social. Embora não existam ainda muitas verdades absolutas quando o assunto é sustentabilidade, estudiosos do tema são unânimes quanto a um raciocínio: uma empresa só é capaz de ajudar a melhorar de forma efetiva o caos ambiental e social do planeta se levar os preceitos do desenvolvimento sustentável para o centro de seu negócio. O autor Paulo Nassar (2004), em seu recente artigo publicado no site da ABERJ destaca que empresas têm criado institutos e fundações, com atividades principais voltadas para a cultura, a educação e as ações sociais. No Brasil, o maior exemplo desse tipo é o Instituto Ethos, que tem entre seus associados centenas de grandes empresas e cuja missão é: Disseminar a prática da responsabilidade social empresarial ajudando as empresas a compreender e incorporar de forma progressiva o conceito do comportamento empresarial socialmente responsável; implementar políticas e práticas que atendam elevados critérios éticos, contribuindo para alcançar sucesso econômico sustentável em longo prazo; assumir suas responsabilidades com todos aqueles que são impactados por suas atividades; demonstrar aos seus acionistas a relevância de um comportamento socialmente responsável para o retorno de longo prazo sobre seus investimentos; identificar formas inovadoras e eficazes de atuar em parceria com as comunidades na construção do bem estar comum; prosperar, contribuindo para um desenvolvimento social, econômico e ambientalmente sustentável. (NASSAR, 2004, p. 1)

Por meio das palavras contidas na missão do Instituto Ethos, fica mais fácil compreender que a Responsabilidade

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Social implica em projetos destinados à valorização da marca da empresa, indo além da finalidade de competitividade, pois trabalha a imagem e a reputação da mesma perante seus públicos de interesse, e busca o desenvolvimento sustentável da região onde está inserida. O aumento das vendas e da participação de acionistas é consequência dessas ações socialmente responsáveis. Ademais, não se deve retirar a importância do Marketing Social enquanto promoção de ações realmente sérias e necessárias. No entanto, algumas empresas se apropriam da cultura, do esporte, da saúde, da educação, dentre outros, para aprimorar a sua imagem, não adotando uma postura transparente e ética perante seus públicos de interesse. O mesmo acontece com a Responsabilidade Social, que, confundida com outros termos, acaba sendo utilizada para divulgação de uma marca, sem transparência nas ações, sem comprometimento, burlando a ética empresarial. Acredita-se que seja necessário construir uma consciência social verdadeira, a fim de que não só a sociedade em geral, mas também o setor empresarial passem a ter um novo posicionamento frente às necessidades globais de reeducação ambiental, quanto à necessidade de desenvolvimento sustentável e preservação do meio ambiente. Portanto, espera-se que a compreensão da responsabilidade de seus atos e da consciência da não possibilidade de sustentabilidade do descomprometimento sejam sobrepostos pelos ideais capitalistas, necessários para melhor qualidade de vida. REFERÊNCIAS ETHOS. Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Apresenta informações institucionais e sobre responsabilidade social. Disponível em : <www.ethos.org.br>. Acesso em: 15de junho 2010. FRIEDMAN, M. The social responsibility of business is to increase its profits. New York Times Magazine, setembro, 1970. KOTLER, Philip. Administração de marketing. 10. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2000. KOTLER, Philip. Marketing para o Século XXI. Futura, 1999. MELO NETO, Francisco Paulo de; FROES, César. Gestão da responsabilidade socialcorporativa: o caso brasileiro. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001. NASSAR, Paulo. A hora da responsabilidade histórica das empresas. Disponível em : < http://www.aberje.com.br/novo/ revista/3_2004/artigo_paulo.pdf>. Acesso em 15 de junho de 2010.

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TESTE DE IMPAIRMENT E SUA EVIDENCIAÇÃO: UMA ANÁLISE SOBRE AS PRÁTICAS ADOTADAS POR ALGUMAS ENTIDADES EM 2008, PARA ATENDIMENTO ÀS DETERMINAÇÕES DO PRONUNCIAMENTO TÉCNICO CPC01 Carlos Roberto Souza Carmo 1 Maria Elisabeth Moreira Carvalho Andrade 2 Renata Beatriz Silva 3 Renata de Oliveira 4

Resumo

Desde o final do ano de 2007, com a publicação da Lei 11.638/2007 e da Medida Provisória nº. 449/2008 (convertida em Lei nº 11.941/2009), a legislação e as normas contábeis brasileiras vêm sofrendo alterações que têm por objetivo harmonizar estas com as internacionais. Nesse contexto, o presente trabalho de pesquisa teve por objetivo verificar a adoção e aplicação do Pronunciamento Técnico CPC 01, no primeiro ano após a sanção da Lei nº. 11.638/2007 e, ainda, identificar as formas de evidenciação dessa prática escolhida pelas empresas pesquisadas. Primeiramente, realizou-se a revisão bibliográfica acerca da temática envolvendo a normatização e os procedimentos para avaliação de ativos e, ainda, o teste de impairment. Posteriormente, procedeu-se à escolha aleatória de sete empresas cujos demonstrativos contábeis foram publicados no Jornal Valor Econômico do período de março a abril de 2009. E, mediante análise de natureza qualitativa em todos os demonstrativos financeiros apresentados por essas empresas, procurou-se verificar a existência de evidências de práticas que demonstrassem que essas empresas, escolhidas a título de amostra para este trabalho, estariam atendendo à obrigatoriedade de adoção do Pronunciamento Técnicos CPC 01, em conformidade com o estabelecido pela Lei nº. 11.638/2007. Este estudo permitiu constatar que todas as empresas participantes da amostra de pesquisa adotaram os procedimentos contábeis estabelecidos pela legislação em vigor e pelo Pronunciamento Técnico CPC 01. Sendo que, em duas das empresas analisadas, houve a necessidade de se provisionar perdas com a recuperabilidade. Destacam-se o fato de que essas escolheram formas distintas para evidenciar as respectivas perdas, e, uma delas o fez de forma mais clara, em total conformidade com o estabelecido na letra “a”, do item 121, e na letra “a”, do item 125, do Pronunciamento Técnico CPC 01, aumentando, assim, o poder informativo dos seus demonstrativos contábeis. Palavras-chave: Teste de impairment, recuperabilidade, evidenciação.

Abstract

Since the end of year 2007, after the publication of Law 11638/2007 as well as the provisional executive order 449/2008, which has been converted to Law 11941/2009, the legislation and the Brazilian accounting standards have been altered in order to harmonize the national accounting standards with the international ones. In this context, the present study aimed at verifying the adoption and the application of the Technical Pronouncement CPC 01, in the first year after the sanction of Law 11638/2007, besides identifying the forms of disclosure for this practice chosen by the investigated companies. Firstly, a bibliographical review on the rules and measures for the assets evaluation and the impairment test was held. Afterwards, seven companies, whose explicative notes had been published in Jornal Valor Econômico from March to April 2009, were randomly chosen. Then, these explicative notes were undergone to qualitative analysis in order to verify evidences of practices that demonstrated the observance to the adoption of the Technical Pronouncement CPC 01, in accordance with Law 11638/2007. It was noticed that the investigated companies adopted the accounting standards established by the legislation and the Technical Pronouncement CPC 01. However, for two of these companies, the loss provision with the impairment was needed. In addition, it has to be highlighted the fact that these companies chose distinct forms of disclosure for their respective losses, and one of them made it in complete accordance with letter “a”, item 121, and letter “a”, item 125, of the Technical Pronouncement CPC 01, increasing the informational power of its explicative notes. 1 Mestre

em Ciências Contábeis e Financeiras - PUC-SP, prof. Universidade de Uberaba/MG, (34) 33198996 / (34) 99963924 / (34) 33198910. E-mail: carlosjj2004@hotmail.com em Contabilidade e Controladoria - USP-Ribeirão Preto, Universidade de Uberaba/MG, (34) 33198996 / (34) 33198910. E-mail: mbethandrade@terra.com.br em Ciências Contábeis - Universidade de Uberaba/MG, (34) 33198996. E-mail: renatabia_05@hotmail.com 4 Especialista em Língua e Literatura Inglesa - UNAERP, Universidade de Uberaba/MG, (34) 33385797 / (34) 88235797. E-mail: renata.oliveira@uniube.br 2 Mestre

3 Graduada

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Key-words: Impairment test, impairment, disclosure. 1. Introdução Desde dezembro de 2007, com a publicação da Lei nº. 11.638/2007 e da Medida Provisória nº. 449/2008 (convertida em Lei nº 11.941/2009), a legislação e as normas contábeis brasileiras vêm sofrendo alterações objetivando harmonizar as normas brasileiras de contabilidade às internacionais. Dentre essas alterações, percebe-se uma preocupação com a elevação do nível de transparência contida nos demonstrativos contábeis e, ainda, uma preocupação com a produção de informações mais acuradas. O artigo 10 da Lei nº. 11.638/2007, conforme observa Iudícibus, Martins e Gelbcke (2008, p.31), estabeleceu que o processo de normatização contábil fosse centralizado em um órgão que tenha características predefinidas por essa legislação. Para tanto, a partir da Resolução CFC n.º 1.055/2005, foi criado o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Dentre alguns dos procedimentos técnicos instituídos e regulamentados mediante a publicação de pronunciamentos emitidos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis, encontra-se o teste de impairment, instituído pelo Pronunciamento Técnico CPC 01, cuja titulação é “Redução ao Valor Recuperável de Ativos”. O Pronunciamento Técnico CPC 01 tem por objetivo definir procedimentos que assegurem que os ativos das entidades estejam registrados pelo seu valor de recuperação, seja essa pelo uso ou pela venda, provocando, assim, uma correção no seu valor contábil toda vez que esse último for superior ao de recuperação. Além disso, a contrapartida devedora desse ajuste será lançada contra o resultado do exercício. Dessa forma, o teste de impairment obriga as entidades a verificarem a recuperabilidade dos seus ativos e, ainda, a demonstrarem seu valor de forma alinhada com a expectativa de geração de caixa dos respectivos ativos. Nesse contexto, o presente trabalho de pesquisa tem por objetivo verificar a adoção e aplicação do Pronunciamento Técnico CPC 01, já no primeiro ano após a sanção da Lei nº. 11.638/2007 e, ainda, identificar as formas de evidenciação dessa prática escolhida pelas empresas pesquisadas. 2. Problema e Metodologia Uma vez que o Pronunciamento Técnico CPC 01 estabeleceu os procedimentos mínimos a serem adotados para assegurar que os ativos das entidades contábeis não sejam registrados contabilmente por um valor superior ao seu valor de recuperação, definiu quando a entidade deve reverter as perdas decorrentes da aplicação do teste de impairment e, ainda, quais divulgações mínimas a serem apresentadas com relação a esse assunto, questiona-se: dada a relevância econômica da verificação do valor de recuperação de ativos, avaliada mediante a aplicação do teste de impairment, quais as práticas adotadas por algumas entidades contábeis brasileiras para atendimento às determinações do Pronunciamento Técnico CPC 01, em 2008, portanto, no primeiro exercício social após a entrada em vigor da Lei nº. 11.638/2007? Para responder o questionamento direcionador desta pesquisa, inicialmente, realizou-se a revisão bibliográfica acerca da temática envolvendo a normatização e os procedimentos para avaliação de ativos e o teste de impairment. Ainda, dentro do processo de revisão bibliográfica, procurou-se estabelecer as principais diferenças entre o valor recuperável dos ativos e o procedimento de reavaliação, permitido até a entrada em vigor da Lei nº. 11.638/2007. Segundo Diehl e Tatim (2004, p. 59), a pesquisa documental caracteriza-se, principalmente, por valer-se de material que ainda não recebeu nenhum tipo de tratamento. Nesse sentido, procedeu-se à escolha aleatória de sete empresas cujos demonstrativos contábeis foram publicados no Jornal Valor Econômico do período de março a abril de 2009. Em seguida, realizou-se uma análise de natureza qualitativa em todos os demonstrativos financeiros apresentados por essas empresas, objetivando verificar a existência de evidências de práticas que demonstrassem que as empresas escolhidas, a título de amostra para este trabalho de pesquisa, estariam atendendo à obrigatoriedade de adoção do Pronunciamento Técnico CPC 01, em conformidade com o estabelecido pela Lei nº. 11.638/2007. Adicionalmente, foram investigadas quais as formas escolhidas para a evidenciação tanto da aplicação do teste de impairment quanto da apresentação das eventuais provisões e perdas decorrentes dessa aplicação. Conforme observa Martins (2000, p. 30), estudos exploratórios buscam maiores informações sobre determinado assunto e, ainda, permitem a formulação de problemas e hipóteses para estudos posteriores. Assim, este trabalho de pesquisa científica pode ser classificado como exploratório, qualitativo e de caráter documental. Além de utilizar dados primários, estabelecer uma análise qualitativa das práticas adotadas pelas empresas que compuseram a amostra de pesquisa, este estudo pode ser expandido ao ser aplicado a outras empresas enquadradas na atual legislação societária e, consequentemente, no Pronunciamento Técnico CPC 01, a fim de identificar quais as práticas mais utilizadas e relacionadas ao assunto em questão. 3. Revisão Bibliográfica 3.1 A Normatização e procedimentos para avaliação de ativos e o teste de impairment Com a aprovação da Lei nº. 11.638/2007, que alterou a Lei nº. 6.404/1976, caracterizou-se o início da convergência das normas nacionais às normas internacionais de contabilidade. Tal processo, há muito esperado pelos estudiosos da área, provocou consideráveis alterações na estrutura contábil brasileira.

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Dentre essas modificações, percebe-se nitidamente uma preocupação com a adoção do custo histórico como base de valor. Ou seja, no decorrer dos anos, os ativos permaneceram avaliados ao custo histórico, de acordo com os princípios contábeis geralmente aceitos. Entretanto, em virtude das variações econômicas que ocorreram em diversos países, em épocas diferentes, houve a necessidade de se ajustar o valor dos ativos avaliados até então ao seu custo histórico. Para tanto, este foi adaptado para custo histórico corrigido. Com a exigência da nova lei, as formas de avaliar os ativos foram alteradas, e estes serão avaliados comparativamente com o seu valor de mercado. Essa mudança busca transmitir, aos diversos usuários da informação contábil, a segurança de que as demonstrações contábeis não apresentem valores distorcidos em relação à sua recuperabilidade. De acordo com a NBC T19.6 : Valor de mercado é o valor que a entidade despenderia para repor o ativo, considerando-se uma negociação normal entre as partes independentes, sem favorecimentos, e isentas de outros interesses. Esse valor deve considerar o preço a vista de reposição do ativo, contemplando as condições de uso em que o bem se encontra.

Diante do estabelecido pelo Pronunciamento Técnico CPC 01, os ativos que constarem do patrimônio das entidades, com valores contábeis superiores ao seu valor de recuperação, deverão ser ajustados ao seu valor justo. Nessa mesma linha de raciocínio, Iudícibus, Martins e Gelbcke (2003, p.211) observam que “[...] periodicamente as entidades devem efetuar o Teste de Recuperabilidade do Custo, o que na prática implica que o valor de custo dos ativos seja limitado a seu valor econômico”. Para Petterson et al (2009, p. 249), pode-se definir o valor justo como: “o valor recebido pela venda de um ativo ou pago pela transferência de um passivo em uma transação independente entre participantes do mercado na data da mensuração”. Segundo Iudícibus e Martins (2007, p.11), “valor justo é o montante pelo qual um determinado item poderia ser transacionado entre participantes dispostos e conhecedores do assunto, numa transação sem favorecimento”. No entanto, independentemente da discussão acerca da terminologia “valor justo”, o teste de impairment deve ser realizado em ativos, para determinar a diferença entre o valor de registro e o seu valor de recuperação. A esse respeito, Iudícibus, Martins e Gelbecke (2003, p. 211) ressaltam que o teste não deve se restringir a ativos do grupo imobilizado, estendendo-se, assim, a todos os outros ativos de longo. A regulamentação do teste de impairment, no Brasil, foi introduzida pela Deliberação nº. 527, de 01 de novembro de 2007, que aprovou o pronunciamento do Comitê de Pronunciamento Contábil (CPC 01). Percebe-se, então, que antes mesmo da Lei nº. 11.638/2007, a aplicação do teste de impairment, passou a ser obrigatória para as companhias abertas, o que demonstra a sua importância. Dessa forma, aplicável a todos os ativos relevantes, mesmo não apresentando indicação de redução ao valor recuperável, certos ativos deverão passar pelo teste de impairment anualmente. De acordo com o item 9, do Pronunciamento Técnico CPC 01 (2007, p.5-6), são especificados os seguintes ativos: - Ativo intangível com vida útil indefinida; - Ativo intangível ainda não disponível para uso; - O ágio pago por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) em uma aquisição de entidade.

Vale destacar que, antes de ser aplicado o teste de impairment nos ativos imobilizados, a entidade deverá definir quais benefícios futuros espera obter do ativo e qual taxa será usada para trazer tais benefícios ao valor presente, identificando, assim, o seu valor em uso, sendo que, o item 16 do Pronunciamento Técnico CPC 01 define valor recuperável como o maior valor entre o valor líquido de venda de um ativo ou de unidade geradora de caixa e o seu valor em uso. Segundo o Pronunciamento CPC 01, deve ser avaliado se os ativos sofrerão desvalorização a cada fim de exercício social, observando o seu valor de mercado, se as taxas de juros de mercado sobre os investimentos sofrerão aumentos que levarão à redução no retorno sobre os investimentos e se afetará no cálculo do valor em uso dos ativos. Ainda, conforme o Pronunciamento Técnico CPC 01, pode-se considerar outras indicações de desvalorização dos ativos, observando-se tanto as fontes internas quanto as externas de informação, como exemplo: se o valor contábil do patrimônio líquido é maior do que seu valor de ações no mercado (empresa tem patrimônio líquido a custo histórico no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) enquanto o valor de mercado define que o patrimônio líquido é de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); se um ativo apresentar desempenho econômico pior que o esperado através de relatórios internos; entre outros. As desvalorizações dos ativos que forem decorrentes do teste de impairment não poderão ser aplicadas no balanço de abertura. A companhia deverá observar qual foi o início do período ou do exercício que passou a adotar a Lei nº. 11.638/2007 e a Medida Provisória nº. 449/2008 (convertida em Lei nº 11.941/2009) pela primeira vez, para aplicá-la no balanço correspondente. Tais desvalorizações serão reconhecidas na demonstração do resultado no período em que ocorreu. Ademais, toda entidade deverá documentar se aplicou ou não o teste de impairment em seus ativos ao final de cada exercício social e se o ativo sofreu alterações.

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Para o Pronunciamento CPC 01, o valor recuperável pode ser determinado para um ativo isolado ou para uma unidade geradora de caixa a que ele pertencer; e, em muitos casos, os retornos de benefícios futuros são representados por um conjunto de ativos. Entende-se por unidade geradora de caixa o que dispõe o item 5, do Pronunciamento do CPC 01 (2007, p.5), ou seja, “é o menor grupo identificável de ativos que gera as entradas de caixa, que são em grande parte independentes das entradas de caixa de outros ativos ou de grupos de ativos”. A partir do valor líquido de venda poderá ser determinado qual o valor recuperável de um ativo isolado ou a unidade geradora de caixa que ele pertencer. E, quando ocorrer a identificação do valor líquido de venda de um ativo ou unidade geradora de caixa, não há necessidade de saber seu valor em uso. Para melhor obter o valor líquido de venda, o procedimento mais adequado é consultar o contrato de venda firmado entres as partes independentes, excluindo os custos de vendas. Caso exista um mercado ativo para um bem determinado (venda de ativos similares) a entidade poderá levar em conta o valor negociado nesse mercado ou, ainda, considerar o resultado de transações recentes com ativos similares no mesmo ramo de negócio. As despesas de vendas e outros gastos, não lançadas como contas do passivo, deverão reduzir o valor líquido de venda do ativo analisado no momento da sua determinação. Agora, se existirem despesas, após sua baixa, estas não poderão ser consideradas para a redução do seu valor. Por outro lado, caso não seja possível identificar o valor líquido de venda de um ativo ou se ele for inferior ao seu valor contábil, deverá ser conhecido o seu valor de uso, o qual será usado para verificar se haverá a necessidade de aplicar o teste de impairment. Para mensurar o valor de uso de um ativo ou de uma unidade geradora de caixa, deverá ser feita uma análise completa do seu valor. O profissional deverá, primeiramente, verificar o menor grupo de ativos que gera fluxo de caixa. Em seguida, identificar qual o valor contábil líquido da unidade geradora de caixa e certificar-se de que todos os ativos sujeitos ao teste de impairment foram considerados. Após a separação desses ativos, será feita uma estimativa do fluxo de caixa futuro a partir de projeções consistentes, razoáveis e conciliadas com o plano de negócios da companhia, projetando também a inflação do período. Outro ponto a considerar é a determinação da taxa de desconto adequada que deve ser compatível com o retorno esperado. E, finalmente, comparar o valor em uso do valor do ativo. Se o seu valor em uso for inferior ao valor contábil líquido, deverá ser reconhecida a perda por impairment. Mesmo depois da desvalorização de um ativo, deve-se reconhecer algumas de suas despesas, citadas de acordo com o item 60 do Pronunciamento Técnico CPC 01 (2007, p.16), ou seja: “Depois do reconhecimento de uma perda por desvalorização, a despesa de depreciação, amortização ou exaustão do ativo deve ser ajustada em períodos futuros para alocar o valor contábil revisado do ativo, menos seu valor residual, se houver, em uma base sistemática sobre sua vida útil remanescente.” O registro de perda por impairment só deve ser reconhecido se a entidade tiver certeza de sua ocorrência, sendo que uma vez que se registra a perda não é possível reversão. Além do teste de impairment ser aplicado a vários tipos de ativos, ele permite em alguns casos a reversão da sua perda, caso tenha ocorrido sua valorização. Para isso, é necessário que a entidade tenha uma avaliação constante dos seus ativos, assim irá manter todos a um valor justo. Segundo o item 8, do Pronunciamento Técnico CPC 01 (2007, p.05), “A entidade deve avaliar no mínimo ao fim de cada exercício social, se há alguma indicação de que um ativo possa ter sofrido desvalorização. Se houver alguma indicação, a entidade deve estimar o valor recuperável do ativo”. Quando houver a perda de bens do ativo imobilizado, deverá ser contabilizada imediatamente sua redução. Assim, as demonstrações financeiras apresentarão valores atualizados e reais, de acordo com a exigência da Lei nº. 11.638/2007 e com as normas internacionais de contabilidade. As unidades geradoras de caixa devem permanecer com o mesmo grupo de ativo, principalmente se ocorreu uma desvalorização. Caso faça alguma mudança, como transferência de algum ativo, deverão ser divulgadas essas alterações. Além disso, os ativos corporativos, como o prédio de uma sede, equipamentos de processamento eletrônico de dados ou um centro de pesquisas, passam também por teste de recuperabilidade. Entretanto, como estes não possuem entradas de caixa individual, os testes para identificar prováveis perdas de recuperação serão aplicados à unidade geradora de caixa a que o ativo estiver vinculado. De acordo com o item 97, do Pronunciamento Técnico CPC 01 (2007, p. 26): Como os ativos corporativos não geram entradas de caixa separadas, o valor recuperável de ativo corporativo individual não pode ser determinado, a menos que a administração tenha decidido se desfazer do ativo. Em consequência, se houver uma indicação de que o ativo corporativo possa ter se desvalorizado, o valor recuperável deve ser determinado para unidade geradora de caixa ou grupo de unidades geradoras de caixa à qual o ativo corporativo pertence [...].

O reconhecimento de desvalorização de um ativo ou unidade geradora de caixa irá trazer esses ativos ao valor

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justo, e seu impacto refletirá nas demonstrações contábeis. Assim, esse processo procura aproximar a avaliação dos ativos da realidade, aumentando, assim, a confiabilidade dos seus usuários acerca da informação contábil. 3.2. Principais diferenças entre o valor recuperável dos ativos e reavaliação de ativos O procedimento da reavaliação era aplicado aos elementos tangíveis do ativo imobilizado, conforme deliberação da CVM nº183/95, cujo objetivo era trazer o valor do bem, mediante laudo de avaliação, o mais próximo do seu valor de mercado. Ou seja, se um imóvel constasse no balanço da empresa por R$ 100.000,00 (cem mil reais) e, após a reavaliação, o laudo concluísse que o valor de mercado é de R$ 130.000,00 (cento e trinta mil reais), o bem poderia constar no balanço por seu novo valor. Para Iudícibus, Martins e Gelbcke (2003, p. 314), “é de notar que reavaliar significa avaliar de novo, o que implica a deliberação de abandonar os valores antigos”. No mesmo posicionamento, Perez Júnior e Oliveira (2005, p. 220) enumeram possíveis hipóteses para se proceder às reavaliações de ativos previstas nas legislações societária e fiscais, sendo as seguintes: a) Reavaliação voluntária de ativos próprios; b) Reavaliação de ativos por controladas e coligadas; c) Reavaliação na subscrição de capital em outra empresa com conferência de bens; d) Reavaliação nas fusões, incorporações e cisões.

Por ser um procedimento optativo, algumas empresas usavam a reavaliação e outras não, por isso, mesmo que elas pertencessem a um mesmo segmento econômico, haveria dificuldade em comparar os seus balanços. Outro fator importante a ser descrito é o fato de que muitas empresas, ilegalmente, superavaliavam seus ativos. Assim, por apresentarem um patrimônio com valor elevado conseguiam fazer empréstimos e financiamentos com mais facilidade e rapidez, e, consequentemente, sua reserva de reavaliação gerava um acréscimo do ativo correspondente, o que significava uma reavaliação sempre positiva, ao contrário do teste impairment, que apresenta uma redução nos ativos, se for realizado e se comprovar uma perda de recuperabilidade. Em função dos fatores anteriormente citados, entre outros, a reavaliação foi extinta no Brasil. Segundo a Resolução CFC nº. 1.159, “a Lei nº. 11.638/2007 vedou a realização de qualquer tipo de reavaliação espontânea de bens.” Com o advento da lei nº. 11.638/2007, a reavaliação de ativos foi revogada e normatizado o teste de impairment, que, apesar de já existir a vários anos, não era obrigatório. O uso do teste impairment, em um primeiro momento, pode gerar impacto nas futuras demonstrações contábeis da empresa devendo, assim, ter seus saldos do ativo imobilizado reduzido, pois muitas delas anteriormente apresentavam valores irreais pelo uso inadequado da reavaliação dos seus ativos. Apesar disso, o teste de impairment proporciona, aos diversos usuários da informação contábil, maior confiabilidade. 4. Análise dos Dados Objetivando verificar a adoção do Pronunciamento Técnico CPC 01, foram escolhidas, de forma aleatória, sete empresas cujos demonstrativos contábeis do exercício social de 2008 encontravam-se divulgados no Jornal Valor Econômico, no período de março e abril de 2009. São elas: ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A., ULTRAPAR, TIM, PDG RELAITY, OI Tele Norte Celular, MMX Mineração e Metálicos S.A. e o grupo CPFL ENERGIA S/A. Neste processo de investigação científica, foram analisados todos os demonstrativos contábeis publicados por aquelas empresas. Entretanto, foi dada especial atenção à (i) descrição do grupo do ativo imobilizado (Balanços Patrimoniais), a toda (ii) Demonstração do Resultado do Exercício e às (iii) Notas Explicativas. Após concluída a análise dos demonstrativos contábeis da empresas alvo deste trabalho, foram identificados três casos que mereceram destaque em relação ao objetivo da pesquisa. No primeiro deles, descrito no item 4.1, a seguir, a empresa analisada apresentou, em seus demonstrativos, informações bem detalhadas acerca da aplicação do teste de impairment e dos seus reflexos, tanto no Balanço Patrimonial quanto na sua Demonstração do Resultado do Exercício. No segundo caso, descrito no item 4.2, a empresa apresentou informações acerca da aplicação do teste de impairment de forma um pouco menos detalhada, ou seja, informou os reflexos do atendimento ao Pronunciamento Técnico CPC 01 no seu Balanço Patrimonial, embora não tenha apresentado uma linha exclusiva para a provisão em função da perda por redução ao valor de recuperação dos seus ativos. Finalmente, no terceiro, apresentado no item 4.3, semelhante à maioria das empresas que compunham a amostra da pesquisa, foi analisado o caso de uma empresa que não apurou perdas em função da aplicação do teste de impairment. 4.1-Caso 1: OI Tele Norte Celular Participações S.A. A empresa OI Tele Norte Celular Participações S.A., cujo ativo imobilizado e ativo intangível encontram-se detalhados mais adiante no Quadro 1, apresentou suas demonstrações contábeis de acordo com a introdução da Lei nº. 11.638/2007 e

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com o Pronunciamento Técnico CPC 01. No final do exercício de 2008, a empresa constatou variações no valor contabilizado dos seus ativos em relação à sua capacidade de recuperação. Isso gerou perdas em seus ativos imobilizado e intangível. Tais perdas foram provisionadas a título de “Provisão para Ajuste ao Valor de Recuperação” no ativo imobilizado, e lançadas contra o resultado do exercício. Verificou-se que a empresa optou por apresentar, em quadro complementar, a descrição das perdas com recuperabilidade de ativos de forma detalhada por classe de ativos, conforme estabelecido na letra “a”, do item 125, do Pronuncimento Técnico CPC 01. Conforme poderá ser observado um pouco mais diante, no Quadro 2, a empresa OI Tele Norte Celular Participações S.A. reconheceu como redução de seus ativos o valor de R$ 36.567 mil e, ainda, informou esse valor em uma linha exclusiva para essa finalidade na sua Demonstração do Resultado do Exercício, conforme estabelecido na letra “a”, do item 121, do Pronunciamento Técnico CPC 01.

Quadro 1: Ativo Imobilizado e Intangível da Empresa OI Tele Norte Celular Participações S.A.

Quadro 2: Demonstração do Resultado do Exercício da Empresa OI Tele Norte Celular Participações S.A.

4.2-CASO 2: ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A. A empresa ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A., cujo resumo de suas provisões operacionais encontrase reproduzido no Quadro 3, apresentado mais adiante, é uma companhia de capital aberto que elaborou suas demonstrações contábeis de acordo com as alterações da Lei nº 11.638/2007, regulamentadas pelo Pronunciamento Técnico CPC 01.

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Após a aplicação do teste de impairment, ao final do exercício de 2008, verificou-se a necessidade de provisão da perda de recuperabilidade dos ativos em um montante de R$ 770.231 mil, conforme nota explicativa. A contrapartida da provisão, comentada no parágrafo anterior, não recebeu uma linha exclusiva na Demonstração do Resultado do Exercício da ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A., conforme constatado no Quadro 4.

Quadro 3: Provisões Operacionais da Empresa ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A.

Quadro 4: Demonstração do Resultado do Exercício da Empresa ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A.

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4.3 CASO 3: MMX Mineração e Metálicos S.A. A Empresa MMX Mineração e Metálicos S.A., cujo ativo imobilizado encontra-se detalhado no Quadro 5, a seguir, ao encerrar o exercício de 2008, adotou as normas estabelecidas pelo Pronunciamento Contábil CPC 01 na elaboração das suas demonstrações contábeis. Conforme observado em suas Notas Explicativas, a empresa efetuou o teste de recuperabilidade para os seus ativos, os quais apresentaram valores maiores que os registrados pela sua contabilidade. Portanto, não houve necessidade de provisão da recuperabilidade de tais ativos.

Quadro 5: Ativo Imobilizado da Empresa MMX Mineração e Metálicos S.A.

As informações contidas nas Notas Explicativas da empresa em questão foram corroboradas pela Demonstração de Resultado do Exercício, reproduzida um pouco mais adiante, no Quadro 6. E, mediante a análise do demonstrativo, pôde-se constatar que a empresa MMX não apresentou uma provisão para perda de recuperabilidade. Com relação aos procedimentos adotados pelas demais empresas pesquisadas (ULTRAPAR, TIM, PDG RELAITY, e o grupo CPFL ENERGIA S/A.), foi constatado que elas adotaram os métodos e critérios contábeis introduzidos pela Lei nº.11.638/2007 e pelo Prontunciamento Técnico CPC 01. Além disso, todas elas aplicaram o teste de impairment e não houve a necessidade de provisionar uma perda em relação à recuperação dos ativos. Ou seja, essas empresas constataram que seus ativos imobilizados e intangíveis estavam registrados a valores próximos dos respectivos valores de recuperação.

Quadro 6: Demonstração do Resultado do Exercício da Empresa MMX Mineração e Metálicos S.A.

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5. Considerações finais e proposta de trabalhos futuros Este estudo demonstrou que todas as empresas participantes da amostra de pesquisa adotaram os procedimentos contábeis estabelecidos pela legislação em vigor e pelo Pronunciamento Técnico CPC 01. Foi constatado que cinco dessas empresas (MMX, ULTRAPAR, TIM, PDG RELAITY e CPFL ENERGIA S/A.), portanto, a maioria da amostra escolhida, não apuraram perdas com recuperabilidade do valor dos seus ativos mediante a aplicação do teste de impairment. Portanto, nesses casos, não foi necessário realizar o respectivo provisionamento, conforme a análise do Caso 3, apresentado no item 4.3 deste trabalho. Em outras duas das empresas analisadas, constatou-se que, após a aplicação do teste de impairment, houve a necessidade de provisionar perdas com a recuperabilidade do valor dos seus ativos, destacando-se o fato de que essas duas empresas escolheram formas distintas para evidenciar as respectivas perdas. No caso da OI Tele Norte Celular Participações S.A., conforme a análise do Caso 1, apresentado no item 4.1 deste trabalho, optou-se por evidenciar suas perdas, tanto no detalhamento do seu ativo imobilizado e ativo intangível quanto na sua Demonstração do Resultado do Exercício. Aliás, no processo de evidenciação dessas perdas, a empresa informou os respectivos valores detalhados por grupo de ativo mediante a criação de uma coluna própria para tal finalidade, conforme foi destacado e pôde ser visto no Quadro 1. Além disso, a empresa complementou a evidenciação das suas perdas informando esse montante em uma linha exclusiva para tal finalidade na sua Demonstração do Resultado do Exercício de 2008, conforme destacado no Quadro 2. Tudo isso conforme estabelecido na letra “a”, do item 121, e na letra “a”, do item 125, do Pronunciamento Técnico CPC 01. No caso da ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A., conforme a análise do Caso 2, apresentado no item 4.2 deste, foram evidenciadas perdas com o valor de recuperação dos seus ativos mediante o uso de um quadro auxiliar, cujo objetivo era fornecer o detalhamento de todos os valores contabilizados a título de provisionamentos operacionais, conforme pôde ser constatado anteriormente no Quadro 3. Por outro lado, diferentemente da OI Tele Norte Celular Participações S.A., a ELETROBRÁS não destinou uma linha exclusiva na sua Demonstração de Resultados para evidenciar as perdas mediante a aplicação do teste de impairment, conforme pôde ser observado no Quadro 4. Ademais, percebe-se que a prática adotada pela OI Tele Norte Celular Participações S.A., comparativamente à ELETROBRÁS, tornou mais fácil a identificação e a compreensão das perdas apuradas com a aplicação do teste de impairment. Percebe-se também que o fato de a ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A. não destinar uma linha exclusiva na sua Demonstração de Resultados para evidenciar as suas perdas dificultou a compreensão dos usuários interessados nesse tipo de informação contábil. Além disso, em função da expressividade do montante das perdas apuradas pela ELETROBRÁS, cerca de 50% do total das provisões operacionais do período (R$ 770.231 / R$ 1.544.091 = 0,4988), seria razoável que a empresa adotasse uma prática semelhante à da OI Tele Norte Celular Participações S.A. e evidenciasse as suas perdas com recuperação do valor dos seus ativos em uma linha exclusiva na sua Demonstração de Resultados. Levando-se em conta que o teste de impairment realizado no ativo das entidades é um procedimento obrigatório relativamente novo no contexto contábil brasileiro e, ainda, que tem grande importância para o processo de evidenciação da informação contábil, quanto mais claro for o processo de evidenciação dos montantes resultantes desse procedimento, maior o poder informativo dos demonstrativos contábeis. Assim, diante das considerações apresentadas, sugere-se, como pesquisas posteriores, a ampliação da população e da amostra adotadas neste trabalho. 6. Referências BRASIL. Lei Federal 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Altera e revoga dispositivos da Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1976. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/Lei/L11638.htm>. Acesso em: 25/09/2009. ______. Ministério da Fazenda. Medida Provisória nº. 449 de 3 de Dezembro de 2008. Disponível em: <http://www. receita.fazenda.gov.br/legislacao/MPs/2008/mp449.htm>. Acesso em: 07/02/2009. COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS - CPC. Pronunciamento técnico CPC 01: Redução ao valor recuperável de ativos. Disponível em: <http://www.cpc.org.br/pdf/CPC_01.pdf >. Acesso em: 24/08/2008. CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE – CFC. Resolução Conselho Federal de Contabilidade. CFC Nº. 1.159 de 13.02.2009. Publicada no Diário Oficial da União em 04.03.2009. Disponível em: <http://www.normaslegais.com.br/ legislacao/resolucaocfc1159_2009.htm>. Acesso em: 12/01/2009. ______. Norma brasileira de contabilidade. NBC T 19.6 – Reavaliação de Ativos. Disponível em: <http://www. portaldecontabilidade.com.br/nbc/t196.htm>. Acesso em: 25/09/2008.

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DIEHL, Astor Antônio; TATIM, Denise Carvalho. Pesquisa em ciências sociais aplicada: métodos e técnicas. São Paulo: Prentice Hall, 2004. ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras S.A. Demonstrações Contábeis. Jornal Valor Econômico, p. A17-A37, 09, 10,11 e 12 abr. 2009. INSTITUTO DOS AUDITORES INDEPENDENTES DO BRASIL – IBRACON. Normas e procedimentos contábeis NPC 24 - Reavaliação de Ativos. Disponível em : <http://www.portaldecontabilidade.com.br/ibracon/npc24.htm>. Acesso em: 31/08/2008. IUDÍCIBUS, Sergio de; MARTINS, Eliseu; GELBCKE, Ernesto Rubens. Manual de contabilidade das sociedades por ações. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2003. ______. Manual de contabilidade das sociedades por ações: rumo à normas internacionais (Suplemento). São Paulo: Atlas, 2008. IUDÍCIBUS, Sergio de; MARTINS, Eliseu. Uma Investigação e uma proposição sobre o conceito e o uso do valor justo. Revista de contabilidade e finanças da USP. São Paulo, p. 9-18, jun. 2007. MARTINS, Eliseu; MARTINS, Vinicius A.; MARTINS, Eric A. Normatização contábil: ensaio sobre a sua evolução e o papel do CPC. Revista de informação contábil – RIC. Universidade Federal de Pernambuco, v. 1, n. 1, p.7-30, set. 2007. MARTINS, Gilberto de Andrade. Manual para elaboração de monografias e dissertações. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2000. MMX Mineração e Metálicos S.A.: Demonstrações Contábeis. Jornal Valor Econômico, p. A63-A70, 31 mar. 2009. OI Tele Norte Celular Participações S.A. Demonstrações Contábeis. Jornal Valor Econômico, p. A15-A20, 10 mar. 2009. PEREZ JÚNIOR, José Hernandez; OLIVEIRA, Luís Martins de. Contabilidade avançada. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2005. PETTERSON, M. H.; ALMEIDA, S. B. D.; SANTINI, C. C.; COSTA, F. M. Manual de normas internacionais de contabilidade: IFRS versus normas brasileiras. São Paulo: Atlas, 2009.

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Até onde vai Alan Damas, aluno de Administração O Senhor Jack Constantino, homem de 38 anos, nascido no Arraial de Potato Potrid em uma região de Redwood, era um renomado professor dos anos 90. Fora convidado para fazer uma palestra no dia 13 de julho de 1994, na Universidade de Cleanwater, até então, algo extremamente normal para este advogado que há mais de 10 anos percorria a região abaixo da Linha do Equador a discursar sobre política, segurança, desenvolvimento e família. O convite partira de Felipe Crown, um ex-colega de faculdade, mas fundamentalmente grande amigo de Jack. No período em que estudavam juntos travavam belos debates sobre os mais diversos assuntos, de história a direito. Passeavam juntos, farreavam juntos. Felipe pediu para o grande amigo discorrer sobre a estrutura da família e a importância da mesma no novo período que advinha com a constante transformação e incursão da tecnologia na vida das pessoas. Jack acatou o pedido do amigo, mesmo estando um tanto quanto desanimado nos últimos meses por achar que já não conseguia mais envolver as pessoas ou mesmo causar algum tipo de transformação na vida das mesmas. Começou a arrumar as malas para a viagem, visto que morava a uma distância considerável, pois estava fixado em Patagon, província noroeste de Apple, cerca de 3000 quilômetros do novo destino. Enquanto revisava o material que o amigo lhe passara sobre o lugar de destino, percebera uma novidade: aquela universidade era na mesma região em que tinha nascido e se formado. Começou a investigar e descobriu que Cleanwater nada mais era que sua cidade natal, reformulada e expandida, e que agora se destacava no cenário econômico e cultural de Redwood. Muito entusiasmado, Jack resolveu preparar o filho Júlio, de 14 anos, para acompanhá-lo e conhecer as origens. Júlio era o centro de forças de Jack, pois a esposa Fiona havia falecido após um doloroso e sofrido câncer cerebral, quando Júlio ainda tinha 7 anos de idade. De malas prontas, os dois embarcaram em um avião e, após 10 horas de viagem, desembarcaram em Cleanwater. Felipe os esperava no aeroporto. Desembarcaram e, no carro de Felipe, foram conhecer a cidade agora em expansão, à beira de tornar-se uma metrópole. No caminho, Felipe perguntara a Jack o que o levou a pesquisar, entender e discursar sobre família. Um tanto quanto constrangido, Jack respondeu que essa incursão sobre o tema família se deu assim que Fiona morreu. Ele sentiu-se deslocado e perdido do mundo, sentia que não seria capaz de criar e educar Júlio longe de outros familiares, portanto angariou forças do íntimo e partiu para esse universo agora considerado por ele como o cerne de resolução para os problemas da sociedade em expansão. Após rodarem aproximadamente 10 quilômetros, chegaram à casa de Felipe. Uma modesta residência, entretanto muito aconchegante num bairro de classe média próximo ao centro da cidade. Às vésperas da palestra, Felipe informou ao senhor Constantino que o evento seria aberto a todos os cidadãos da cidade, pois Cleanwater estava passando por uma imensa crise social. Segundo Crown, parecia que a Caixa de Pandora fora aberta e todas as desventuras humanas povoavam apenas aquela cidade. A crise era tanta que forças públicas, privadas e do terceiro setor se uniram para conseguir formatar um plano que pelo menos atenuasse aquele momento, porque se não se fizesse algo, logo estaria decretado o fim daquela cidade. Filhos matavam os pais, mães soterravam recém-nascidos, avôs molestavam as netas e primos aliciavam primos sob o anseio da drogadição. Chegado o tão esperado evento. Jack sentia-se mais inspirado e tenso do que nunca. Muitas das pessoas daquela cidade em que cresceu viam-lhe como um salvador, embora, pensara consigo, ser muito pouco aquilo que tinha a oferecerlhes. Após magistral apresentação musical do Coral Municipal, fora dada a palavra ao senhor Constantino. Ele começou sua fala dizendo um pouco da própria história e dos caminhos que percorrera até chegar ali. Abordou desde os princípios do limite nas relações familiares até a importância da conduta, do exemplo e da formação afetiva e, sobretudo, da força que tem o amor, sentimento este que o fez sobreviver a uma das perdas mais terríveis da sua vida – a perda da esposa. Terminada a palestra todos o aplaudiam de pé, como se ele tivesse ditado-lhes o norte da esperança. Após o evento, o nobre professor foi convidado por Felipe, juntamente com o filho que o acompanhava a todos os eventos, para um jantar num restaurante na região central da cidade. O restaurante era um lugar maravilhoso, de ambiente salutar e com comidas exuberantes em beleza e paladar. Comeram, riram, recordaram, enquanto Julio brincava num parquinho que havia naquele ponto comercial. Com o fim do jantar, para acelerar a digestão e ainda matar a saudade das ruas, das veredas e também conhecer o que havia mudado no local, Jack resolveu ir caminhando, acompanhado de Júlio, já que a casa de Felipe não estava muito longe. Alegres e sorridentes pai e filho iam pela avenida do Centro. Em um dado momento, foram surpreendidos por três rapazes, um deles armado. Os mesmos começaram a gritar com Constantino, que logo se abraçou ao filho no intuito de protegê-lo. Eles queriam dinheiro, relógio, tênis, sapato e, com violência, foram tentar arrancar esses pertences dos dois. Contudo, em certa hora, o rapaz que estava com a arma, tomado por insanidade ou talvez desespero, mirou-a para pai e filho e engatilhou o objeto. Os outros dois rapazes estavam tão apavorados quanto Jack e Júlio e não entendiam o que

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o colega de crime pretendia fazer. Aquela situação não estava no plano. Mas logo todos denotaram que ele iria atirar. Numa volúpia de heroísmo, um dos rapazes tomou a frente do projétil e é baleado no coração. Os outros dois saem correndo. Desnorteado e desesperado, o professor perguntou ao jovem porque fizera aquilo. Com lágrimas correndo nos olhos, o jovem respondeu que no decorrer daquela situação, tinha identificado quem era a vitima que eles cortejavam. Disse que se lembrara de cada palavra que ouvira na palestra de mais cedo e o quanto seus pais e seu filho estavam contagiados pelo clima que Constantino criara. E que não se sentiria feliz nem vivo o suficiente sabendo que permitira morrer na sua frente um homem que resgatou a vontade de viver e buscar a felicidade de Cleanwater. Relatou que também tinha um filho e que se pôde ver no lugar de Jack naquele momento. O socorro logo em seguida chegou, mas já era tarde para resgatar a vida de Ícaro. Jack fez questão de procurar a família daquele jovem de 26 anos, providenciou o velório e o enterro de seu tormento e, ao mesmo tempo salvação. Adotou Leônidas, filho de Ícaro. Passou a ajudar os pais e irmãos de Ícaro, família paupérrima, que dali em diante choraria a perda do filho, mas compreendia melhor o que necessitava fazer aos demais para não incutir as mesmas decepções. O professor recuperou a estima de palestrar e percebeu dali em diante, que as palavras tocavam, mas somente os gestos mobilizavam e poderiam mudar as vidas das pessoas. A história de Ícaro passaria a ser a espinha dorsal das palestras e aulas que Constantino desenvolveria a partir daquele dia.

UM POUCO DO COTIDIANO DE TODOS NÓS... Antônio Fernando - aluno de Administração Evitei encontrá-la depois que você não deu nem mais nenhum aceno. Inútil paisagem. Muitas vezes as coisas ocorrem alheias à nossa vontade. Ontem, hoje e amanhã serão sempre conceitos temporais. Algumas realidades são iniludíveis!!! Sua presença continua inebriante e perfumada como a ternura mágica própria dos anjos. Vamos conversar só nós dois. Espero você marcar. Não dá mais para esperar acontecer... E se não acontecer... paciência. Como diz o poeta, “Amo a liberdade, por isso, as coisas que AMO deixo-as livres. Se um dia elas forem e voltarem, é porque as conquistei. Mas... se forem e não voltarem mais... É porque jamais as possui...” Tenho clareza do meu tempo e de minhas limitações. Aprendi que no jogo da vida ...se ganha e... se perde... Não a procurarei mais, tenha certeza disso. Com tristeza... sairei dessa... e encontrarei outro caminho. Por isso, “Navegar é preciso”. Viajarei. Outros Amores... outras relações... algumas até fugazes. Aprende-se nessa nova busca a conhecer outros cenários, paisagens, atores. Enfim, vou tentar encontrar quem goste de mim! Tem-se expectativa e................. se ousa...sonhar....!!! Aí chegou e....... bateu a mais .......difícil e cruel das S a u d a d e s !! ...Aquela que a gente...de repente...nem chegou a ViVenciar....... Essa nova busca... é sempre sedutora. A boa busca eterniza a ternura. Você não quis ou não pôde regar a.....S a u d a d e..... Na boa história que nos fraternizou, atrevo-me a lhe aconselhar que “se o dinheiro é a sua esperança para independência, você nunca a terá. A única segurança real que um ser humano pode ter neste mundo é uma reserva de conhecimento, experiência e habilidade”.

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E para não falar mais neste conto... que lhe contei..., atrevidamente, lembro-lhe que: “A VIDA É CURTA...A ARTE É LONGA.....E A EXPERIÊNCIA...DIFICIL”...!! e, finalmente, que “aos olhos de uma criança você se localiza logo abaixo de DEUS”. Assim, ainda que com as lembranças exauridas, ...até um dia.....até talvez.... ....Até quem sabe... Saud......

Dentro de mim BRUNO HENRIQUE PEREIRA - aluno de Administração Minha mente é um embaralhado de escadas, corredores, andares... Nela não tem elevadores, nem mapa Apenas eu posso voar por ela Quem quiser entrar nela e explorá-la, Terá muita dificuldade Entretanto, a quem me agradar Eu posso segurar na mão para flutuar junto a mim.

Quero te amar Danilo - aluno de Ciências Contábeis No primeiro dia que te vi Me apaixonei, não pude resistir Seus lindos olhos a brilhar Ela estava tão perfeita Era como se fosse uma ilusão Mas, já estava dentro do meu coração De um jeito que não pude evitar Há como eu quero te amar A cada abraço, a cada beijo A cada toque no seu corpo Sinto que é um sonho Me deixando louco Um sonho do qual jamais vou acordar Porque nos seus braços vou estar Eu quero te amar Minha vida não seria a mesma sem você Tudo que eu faço é pensando em te querer Do seu lado sempre vou estar Se for mais um sonho, não quero acordar

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Enquanto chovia... Gilson Crispin, aluno de Administração Olhando pela janela sentia a mais confortável sensação de aconchego, própria a quem, naquele momento, envolvido em um quente agasalho, estava alheio a qualquer intempérie. Afinal, a chuva fria que entoava aquela tarde de sábado parecia-lhe a mais coerente justificativa para tal sentimento. Afastando-se da janela somente pelo tempo de buscar a companhia de uma saborosa xícara de café quente, volta e depara-se com algumas crianças na rua, uns jogando bola com a mais espontânea alegria e outros lançando seus barquinhos de papel na enxurrada que lentamente escorria. Involuntariamente, aquela sensação de aconchego vai contrastando com um saudoso sentimento que o remete à própria infância, quando a satisfação em estar sob a chuva e sobre as correntezas das enxurradas era maior que a de estar nos domínios de seu apartamento. Então, põe-se a refletir sobre como as experiências e as aspirações pessoais relacionam-se com o contexto de cada época e marcam eternamente a vida das pessoas. Tivera uma esplendorosa infância, repleta de saltos em cachoeiras, entradas “secretas” em piscinas de clubinhos, pipas pelos ares nos ventos de agosto e intermináveis partidas de futebol, com direito a camisas pintadas com giz de cera em campinhos de terra cobertos de serragem ou mesmo nas ruas que ainda desconheciam asfalto. Sem dúvida, uma infância incomum em tempos mais recentes, em que o “desenvolvimento” encarregou-se de substituir esses lugares por fábricas e casas. Mas, antes de qualquer coisa, a alegria de suas épocas de garoto refletia-se no semblante dos meninos aos quais observava e, dessa forma, era natural que as agradáveis lembranças infantis ocupassem-lhe a mente naquele momento. As pessoas identificam como “seu tempo” ou “sua época” o período da vida em que se goza de maior lucidez, maior atividade, quando o aprendizado se faz presente em todo momento. Como se, na fase de maior maturidade, estivessem à margem de si mesmos, desprezando toda a importância da sabedoria adquirida que lhes possibilitam ser, ainda, protagonistas na sociedade. Pois como, brilhantemente, disse Rousseau, “na juventude deve-se acumular o saber e na velhice fazer uso dele”. Ainda com as pueris recordações em sua mente, estica-se no convidativo sofá para acompanhar naquele momento o noticiário pela tevê, cujo eufórico e promissor momento econômico brasileiro é destacado em uma das principais notícias. “Nunca antes na história deste país” a população consumiu tanto, obteve um acesso tão facilitado ao crédito, alcançou o sonho da casa própria tão efetivamente e até mesmo comprou tanto carro novo. Ele também partilhava desta idéia e do restante da matéria, que traçava um panorama de épocas anteriores, cujo país não proporcionava tantas expectativas assim. Seguiu com os olhos na tevê e o pensamento retido em uma interessante percepção acerca de como as épocas se tornam lembradas, como os acontecimentos de um período repercutem no futuro. Perto do encerramento da primeira década do século XXI, ele indaga sobre como esta década será vista daqui a vinte ou trinta anos. De uma forma geral, ele pensa, terão destaque o intenso desenvolvimento tecnológico, a avassaladora ascensão chinesa e a emergência econômica de alguns países. Também os Estados Unidos elegendo o primeiro presidente negro de sua história; a Argentina, sua primeira mulher presidente, a crise econômica; e, no Brasil, o mandato do mais popular e carismático presidente dos últimos tempos. Enquanto chovia, já um pouco mais calmamente, resolve ligar o rádio. Poucos instantes depois, a letra de uma já antiga canção prenuncia, ironicamente, que o Brasil “é o país do futuro”. Recorda da notícia que vira pouco antes no telejornal. Seria este Brasil do presente o país do futuro ao qual a música se referia? De certa forma, a identidade de uma época depende do desfecho de algumas situações e como esses desfechos “moldarão” o futuro. Particularmente, o Brasil depende ainda das promissoras “maravilhas” do pré-sal, da redução de mazelas sociais e da corrupção, e da perspectiva de que talvez o país venha a ter a sua primeira mulher no comando da presidência. Como só a divina natureza é capaz de proporcionar certos espetáculos, a chuva havia se despedido, cedendo lugar a uma límpida e estrelada noite. Neste momento, lembra-se do que ouvira nos tempos de escola a respeito da curiosa característica cíclica da História, que observa que de tempos em tempos os acontecimentos, de certa forma, se repetem e assemelham ao ontem e ao hoje, o que em algumas vezes causa empolgação e, em outras tantas, apreensão. E, consternado, analisa que crises econômicas, armas nucleares e iminentes apedrejamentos de supostos pecadores realmente remontam tempos passados, validando esta teoria.

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Contradição Juliana Naves - professora Nada mais contraditório Que o próprio dinheiro Seja do mineiro Ou do estrangeiro

Que trabalha noite e dia Para comprar o seu lar, Ser feliz E transmitir alegria

O dinheiro... Tão abençoado Do trabalhador Suado

Contradiz Com a fúria Da ambição Do ódio e da malcriação

Do professor Educador, facilitador Entusiasmado Realista e admirado

Do dinheiro da herança Que destrói a esperança E a harmonia De uma família

Ponto de vista Juliana Naves - professora Tanta mágoa? Sob o seu ponto de vista Muita força Para seguir minha pista Tanta coragem Para enfrentar Os desafios

Não é miragem O encorajar De seus rios De lágrima De vitória De luta e conquista

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Felicidade e sucesso Lucas Amoni Leite Lemos - aluno de Administração Sucesso é a realização de uma meta ou objetivo com êxito. Cada pessoa tem para si um determinado alvo que seria o seu sucesso. Podemos encontrar no dicionário Aurélio a definição de felicidade como sucesso, prefiro corrigir, invertendo as posições. Assim, umas das melhores definições para sucesso seria felicidade. Ao definir felicidade, podemos enxergá-la de duas maneiras: a definida pela qualidade de vida e bem-estar e aquela relacionada às emoções, ou prazer. Melhor enxergar como qualidade de vida e bem-estar, pois é algo mais duradouro do que o prazer, normalmente momentâneo, embora, podemos dizer que um, contribui para alcançar o outro. De acordo com Alexei Lisounenko, felicidade se traduz em aceitação. Ou seja, a pessoa aceitar quem de fato é, assim possibilitando mudanças em sua vida. É um sentimento interno e terno; é um reflexo do auto-conhecimento. Ele frisa que esta aceitação está longe do conformismo, sentimento no qual o ser aceita sua vida de uma forma negativa, sem perspectiva de mudança. Existe uma linha de tempo que separa o indivíduo do seu sucesso, criando uma distância entre o hoje e o amanhã. Para conseguir o êxito, na maioria das vezes, é preciso esforço, paciência e clareza nos objetivos, entre outros pontos. Além, é claro, de enfrentar todas as dificuldades que surgem durante caminho. Assim, o que faz uma pessoa não atingir o seu sucesso são dois fatores muito comuns: acreditar que não merece ou, pior, acreditar que não consegue. Todavia, como trazer o sucesso para perto de si nesta linha do tempo? Será preciso diminuir a meta ou o objetivo para trazê-la mais próxima? O que na verdade se deve fazer é mover-se em direção ao sucesso. Dessa forma, somos nós que devemos nos mover e não nossos objetivos. Por exemplo, se sonha viajar e conhecer um determinado lugar mas acredita que não consegue ou que não merece, para trazer seu objetivo mais próximo, mude o lugar para um em que acredite conseguir ou merecer. Consequentemente, está movendo o seu sonho, e não se movendo para alcançar o que quer na verdade. Para não cair na própria armadilha de acreditar que não merece ou que não consegue, é preciso ser feliz. A felicidade traz forças e aliados para o alcance de qualquer objetivo e sucesso, além de ser fonte de motivação. E, para melhor ilustrar, conto com ajuda de magníficos autores que descreveram a felicidade: “Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.” (Augusto Cury) “As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos.” (Clarice Lispector) “Faça o que for necessário para ser feliz. Mas não se esqueça que a felicidade é um sentimento simples, você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade.” (Mário Quintana) “Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade.” (Carlos Drummond de Andrade) “Eu aprendi que não posso escolher como me sinto, mas posso escolher o que fazer a respeito.” (William Shakespeare) E, aqui completo, para se atingir um objetivo ou obter sucesso naquilo que faz ou que se quer, é preciso, primeiramente, sentir-se ou acreditar-se uma pessoa feliz. Sonhar grande, mas não o trazer diminuindo-o; se mover em direção a ele, crescendo!

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LÁ VEM O CENSO DE NOVO!!! Lúcio A. Silva Até nisso o uberabense é diferente. Enquanto a maioria da população do país aguarda com certa ansiedade o resultado do CENSO para aferir o desenvolvimento de suas cidades, aqui a angustia é crescente em face da possibilidade de se repetir o vexame de ver exposta, nacionalmente, a fragilidade econômica e a anemia populacional do município. Desta vez, pelo menos, tem-se um lenitivo: espera-se que a cidade tenha conseguido superar os tradicionais gargalos do subdesenvolvimento. Já será muito se isso for confirmado. Esse sentimento cresce à medida que se observa a expansão urbana ocorrida nos últimos anos. O que deve estar atormentando a cabeça do uberabense não será tanto o crescimento em si, posto ser patente e inegável a sua ocorrência, mas a desconfiança de que o Brasil, como um todo, também cresce acima da média histórica. Se esse fenômeno for confirmado, impõe-se que antes de qualquer comemoração se quantifique o nível de progresso obtido pelas demais cidades da região, comparando-os. Se Uberaba ficar na média ou superá-la em relação as suas principais concorrentes, ótimo. Sinal de ter valido a pena tanto esforço. Caso contrário, se os uberabenses tiverem de engolir a seco, outra vez, o resultado do CENSO, a única coisa a fazer é despir-se do resto de bairrismo acaso sobrevivente e sair de mansinho pela BR-050, seguindo-a rumo norte uns cento e poucos quilômetros. Crescendo ou não, o que fica patente é a resistência deste povo em aceitar o desenvolvimento. A julgar pelo comportamento de alguns, o perigo de as forças reacionárias vencerem novamente é maior do que se imagina. Como exemplo, pode-se mencionar a polêmica criada em torno da localização do Hospital Regional, que poderá, dependendo do resultado dessa peleja, ser construído em Uberaba. Contrariando todos os indicativos técnicos, alguns indivíduos que jamais precisaram e que nunca precisarão de atendimento em hospital público resolveram recorrer a um sofisma para barrar mais essa obra na cidade. Alegam a inconveniência de se erguer um estabelecimento dessa natureza tão próximo de um cemitério. Argumentos? Nenhum! Somente opiniões e interesses pessoais do tipo: os doentes poderiam piorar ao verem o futuro tão de perto. Impressiona a postura daqueles opositores pelo simples fato de estarem preocupados, justamente, com a hipótese de alguém do povo vir, futuramente, a receber assistência naquele hospital, enquanto ignoram, o caos reinante na saúde, cujas centenas de pessoas pobres morrem a mingua na porta dos hospitais por falta de atendimento. Não conseguiram, também, disfarçar a fragilidade de seus argumentos em face das autorizações para que pessoas construam suas casas e vivam ali, convivendo, diariamente, anos a fio com aquele cenário e com seu simbolismo macabro sem, no entanto, qualquer prejuízo emocional. Não seria razoável imaginar que justamente aqueles poucos e privilegiados internos ficassem fragilizados com a vizinhança oculta do outro lado do muro e da vida. É preciso, sim, temer a hipocrisia de alguns articulistas que exercem influência e não assumem responsabilidades pelos estragos que possam causar à vida alheia. Ao menos parte dos fantasmas que povoam aquele cemitério foram vítimas de opiniões estapafúrdias como essas. O medo de todos é o de que o Hospital Regional, a exemplo do que já foi feito com o desenvolvimento da cidade e o com orgulho do povo, seja, igualmente, sepultado para sempre naquele cemitério. A pior localização para o Hospital Regional seria em lugar nenhum, ou Uberlândia, ou Araxá, para onde centenas de uberabenses vão, diariamente, em busca do atendimento inexistente aqui. Prova inconteste da irresponsabilidade dos inimigos de Uberaba pode ser ilustrada pela iniciativa de uma emissora de rádio local ao promover uma pesquisa de opinião em busca de subsídios metafísicos que laçassem luz sobre a polêmica. Para tanto, questionaram, no ar, as principais lideranças religiosas sobre as possíveis implicações divinas do caso. Pelo tom reverencial, pareciam mesmo acreditar na possibilidade de obterem, diretamente, do próprio Deus, uma resposta definitiva na voz “insuspeita” de seus representantes. Ridículo. Enquanto outras cidades constroem suas obras pouco se importando com a opinião alheia, os uberabenses recorrem a crendices dessa natureza como último esforço para dificultar o desenvolvimento. Imaginem o reforço extraordinário que receberiam aqueles reacionários se o Arcebispo Metropolitano de Uberaba, por exemplo, emitisse opinião contrária àquela obra conforme desejavam. Já que lançaram moda, bem que poderiam aproveitar as ondas sonoras daquela emissora para enviar aos céus um pedido de clemência: “Senhor, se não deres conta de ajudar Uberaba a crescer, o que seria compreensível, tenha ao menos piedade deste povo. Livrai-os de seus malfeitores orquestrados. Eliminai esse bando de capetas foragidos, trancafiai-os, de novo, nos porões do “nono círculo do inferno”, de forma que jamais possam sair. Evitai que passem a eternidade nesse ócio improdutivo, exercitando crueldades contra pessoas indefesas. Não deixais que atrapalhem mais o desenvolvimento da cidade. Fazei com que os legítimos e ingênuos anseios dessa gente sejam respeitados.” Amém!!!!

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O DILEMA DA ESCOLHA Marcelo Henrique Pereira, aluno de Administração Um dos maiores desafios dos jovens que estão terminando o ensino médio é a difícil escolha do curso superior e em qual faculdade ingressar. A escola, professores, familiares e amigos fazem parte de infinitos caminhos, que somente os próprios alunos vão trilhar na formação da carreira. A pressão oprime e confunde ainda mais a cabeça dos jovens. Em uma situação parecida, estão os acadêmicos do curso de Administração que, prestes a se formar, vivem um grande dilema: “Tenho um diploma, e em qual área devo construir minha carreira?”. Uma pesquisa realizada pela Harvard Business School mostra que aproximadamente 65% dos recém formados em Administração ainda não decidiram em qual área da profissão atuar e como entrar em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo e exigente com os profissionais, cobrando experiências e currículos recheados de especializações. Essa grande indecisão toma conta dos universitários de Administração no final de seus cursos, visto que, por característica principal da Administração, o profissional possui uma abrangente rede de áreas nas quais ele pode atuar, como setores de gestão, administrativos, financeiros, contábeis, recursos humanos, entre outros. É fato que essa característica proporciona um leque volumoso de oportunidades infinitas para atuar no mercado, mas, em contrapartida, faz, para aquele que ainda não se identificou em uma área particular, que se perca no mar de oportunidades. Outro grande medo que aterroriza os administradores é a realidade observada em um grande número de empresas, onde profissionais de outras áreas ocupam o cargo do administrador, embora não tenham a formação específica para tal seja um médico ou um engenheiro fazendo a administração das empresas faz com que o mercado se torne ainda mais competitivo para aqueles que pretendem administrar suas carreiras. O que revela a pesquisa - O Administrador e o Mercado de Trabalho - Alternativas para a Valorização do Profissional - encomendada pelo Conselho Federal de Administração (CFA) à Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP) é que, no Brasil, o desemprego está aumentando: em 1994, 9% dos administradores estavam fora do mercado de trabalho, contra 10% em 1998 e 12% em 2003. Segundo o administrador João Moraes Sobrinho, “muitos graduados em Administração e que atuam no mercado ainda não fizeram o registro profissional no conselho da categoria. Este fato, além de contribuir para a desvalorização do profissional, constitui uma infração ao código de ética do Administrador”. Uma das alternativas para a solução desses problemas é fazer com que a faculdade de Administração passe a oferecer subsídios a fim de que o aluno possa desenvolver melhor as suas áreas de mais aptidão. Uma sugestão seria fornecer, além das matérias integrantes do currículo, um apoio à aplicação do conhecimento, na busca de identificar o melhor caminho profissional a seguir. Isso resultaria em um feito parecido ao do teste vocacional aplicado aos alunos do terceiro ano do ensino médio a escolha de qual profissão seguir. Ademais, o aluno é a própria ferramenta de transformação dessa realidade. Ele deve se empenhar na descoberta do que realmente gosta de trabalhar e buscar enriquecer seus estudos. Focando nesse objetivo, uma escolha mal analisada nesse estágio final pode prejudicar e atrasar ainda mais o desenvolvimento profissional. A verdade é que ter um diploma não significa estar empregado, pois mesmo aquele profissional que já se decidiu e atua no mercado de trabalho não tem a garantia de uma carreira sólida, o que confirma a premissa de que estar graduado já não é uma vantagem tão competitiva assim. Para se destacar, o profissional deve manter-se constantemente atualizado com informações globais e específicas da sua carreira, cursos de línguas, informática e outros treinamentos que o qualifiquem e deixem-no em posição favorável e à frente de muitos concorrentes na busca do sucesso na profissão.

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DEIXA EU TE CONTAR Sidney Alvim Pimenta - prof. FCETM Deixa eu te beijar. Beijo lânguido e sedutor, Que te convida p’ro pecado Do egoísmo e da razão!!! Deixa eu te contar... Que nas delícias dos teus beijos Tornei-me príncipe, De aprendiz a professor!!! Deixa eu te contar... Que nos sabores dos beijos teus, Conheci a gastronomia do mundo E passei de faquir a glutão!!! Deixa eu te contar... Que hoje acordei com frio E que debaixo das cobertas, Sorvi seus beijos p’ra me aquecer!!! Não te conto nada... Mas, só sei que sei Que passam de milhão, Os beijos que te roubei!!! Vem me contar... Do seu sonho de menina, De colar tua boca na minha E assim ficar, até a luz do mundo se apagar!!! Hoje é tão diferente... Tem horas que você se arrepende. Dá vontade de largar tudo, correr... Pegar sua boca e guardar na minha!!!

DOMINGO OUTRA VEZ Hoje é quarta e ainda sinto Aquele sabor de morango... Beijo longo, demorado... Abraço gostoso, abraço apertado!!!!!

Sidney Alvim Pimenta - prof. FCETM

Ainda sinto o corpo trêmulo Vagueando por entre coqueiros E lindas roseiras... Teu perfume está impregnado em mim!!!..

Serve-me mais uma taça?! A lassidão me invade E meu corpo tomba inerte Ao lado do seu...

Perfume gostoso, Cheirinho de suor, Travesseiro molhado E copo vazio....

Mãos macias afagam meu peito... Teus olhos doces invadem os meus sonhos... Teus sonhos, tão diferentes dos meus.... Tomara chegar domingo outra vez!!!!

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“ESCUTATÓRIA”... A ARTE DE SABER OUVIR PARA GERIR Tallita Machado de Oliveira - aluna de Administração Engraçado como normalmente as pessoas se atentam sobre seus aspectos comunicativos quando estão prestes a realizar uma entrevista de emprego ou acadêmica para os tão sonhados cursos de aprimoramento (Pós, Mestrado, Doutorado, mais uma pós)... Assim como quando é preciso realizar uma apresentação de seminário, uma palestra em um anfiteatro cheio de pessoas, realizar uma prova oral como fazíamos lá na terceira e quarta séries do ensino fundamental. Enfim, situações que, em suma e pesadamente, podem ser consideradas assim, a comunicação será avaliada. Para alguns mortais, acreditar que falar em público ou simplesmente falar é mais importante do que ouvir. Com esta crença estão redondamente enganados. Ouvir, ou mais que isso, literalmente saber ouvir, absorver a mensagem que nos é passada, é muito mais importante do que falar. Diz o ditado popular que “Deus nos deu uma boca e dois ouvidos”, e isso realmente faz sentido, porque devemos ouvir bem mais do que falar. Nos dicionários encontramos várias definições para oratória, como, por exemplo, “a arte de ser expressivo”. Mas procurando e procurando até na mais alta biblioteca que conhecemos por internet, não encontrei nenhum assunto relacionado à palavra “escutatória”, muito menos uma definição. No mundo, vemos diversos cursos de oratória, ensinando pessoas a se comunicarem em público de forma clara e concisa, mas raramente ou nunca vemos cursos de “escutatória”. Ouvir com comprometimento, interesse e entusiasmo é muito mais importante que falar. Verdadeiramente, aprendemos a falar primeiro, porque ouvimos nossos pais ou qualquer outra pessoa que, enquanto na condição de bebês, se comunicaram conosco. Antecipando, não podemos ser melhores se não prestamos atenção na verbalização. Ouvir com atenção é ser capaz de modificar hábitos, condutas e fazer história. Você acha que um líder ouve mal? Acho que não. Se assim fosse, ele não seria líder. Temos incluído, explícita ou implicitamente, em nosso modelo de liderança que ouvir bem é pré-requisito para gerir. É comprovado dizer que quando se ouve mal, entende de maneira não satisfatória a mensagem que é exposta aos ouvidos, culturalmente irá transmitir mensagens incompletas e, muitas vezes, erradas, capazes de gerar transtornos, dissabores, prejuízos para empresas/organizações e intrigas entre colaboradores. Liderar quando as mensagens são incompletas, provenientes daqueles que por alguma dificuldade não sabem se expressar, porque também não souberam ouvir, não é uma tarefa fácil. A partir do pressuposto que toda tarefa, assim como toda comunicação, envolve seres humanos e suas diversificações. Por isso dizemos que liderar é uma arte e que depende muito do caráter para se obter sucesso. Escolher fazer o bem, ouvir bem, transmitir bem e escolher ser bom e fazer com que os outros sejam bons. Bons líderes, bons mensageiros como na época do Rei Arthur e a Távola Redonda, quando ainda não existia comunicação fácil, rápida, dinâmica e versátil. Naquela época sim as pessoas se correspondiam de forma lisonjeira, clara e precisa. Leia livros de literatura pelos quais tenha afinidade, específicos de matérias que tenham a ver com o seu dia-a-dia para crescer em conhecimento e comunicabilidade. Apenas leia, para aprender como, quando, onde, o quê, por que e para quem se expressar. Saber usar o tom, as palavras certas na medida certa e com cordialidade, são garantias de sucesso na receptividade da mensagem. Portanto, os acontecimentos em nossas vidas abarcam questões interessantes que nos fazem refletir. E, aqueles que argumentam a qualquer um desses questionamentos, sem esbravejar e sem consultar todo o resto, são visionários sem condições de controlar os assuntos do mundo, porque manter a mente aberta para as dificuldades que nos cercam, facilitam o entender, o parecer e a possível solução. Diante do que foi tratado, chegamos à seguinte conclusão: essa preocupação constante e improdutiva com todas as coisas que temos de fazer enquanto gestores, líderes proativos, pessoas comuns, cientes e comunicadores sabedores do ouvir, é o que fazemos sem comprometimento e dedicação são os maiores consumidores de tempo e energia. Segundo James Hunter, um verdadeiro líder ensina aos outros o dom de liderar. E, consequentemente, saber ouvir é um capricho exagerado que temos que usar enquanto milionários do saber, mágicos aprendizes e conquistadores multifuncionais.

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