Do barro, criou-se a beleza

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cultura osmundo teixeira

por davi carneiro FOTOS SOLANGE ROSSINI

DO BARRO

criou-se a beleza Considerado um dos maiores santeiros vivos do Brasil, o ceramista baiano Osmundo Teixeira tem obras em diversas coleções ao redor do mundo, inclusive no museu do Vaticano

Quando Veranice Gornik, renomada galerista de Salvador, recebeu a ilustre visita do então arcebispo primaz do Brasil, Dom Geraldo Majella, não poderia imaginar o surpreendente fato que iria testemunhar. Convidou-o para conhecer algumas obras e o religioso compareceu à galeria Prova do Artista, no bairro do Rio Vermelho, acompanhado de um senhor bastante interessado em arte sacra. Dentre todas as obras apresentadas, as que mais chamaram a atenção dos convidados foram os santos e orixás modelados em barro. Porém, ao passar em frente a um Santo Antônio, o acompanhante estagnou com ar de reprovação: “Essa obra está linda, mas o artista errou a mão e cometeu um deslize. Colocou o menino Jesus do lado errado do Santo Antônio”. “Eu não conheço a iconografia tão a fundo”, respondeu Verenice. “Mas o senhor poderá tirar a dúvida com o próprio artista”. Osmundo, criador de santos, acabara de chegar. A crítica foi o suficiente para que travassem um intenso debate. No outro dia pela manhã, Verenice se surpreendeu com o arcebispo de volta à galeria. “Você se lembra do meu acompanhante de ontem? Ele é um dos Dragões do Vaticano”, disse, referindo-se a um dos cargos do alto escalão papal. “Mandou seus assessores pesquisarem a

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tradição Antonina e foi confirmada a visão de Osmundo. Agora, o Dragão quer levar o santo de presente para João Paulo II”. Esse caso, narrado com vigor por Veranice, demonstra a importância da obra do ceramista baiano, com mais de duas mil obras entre esculturas, santos, orixás e oratórias, Osmundo Teixeira já foi elogiado por artistas como Jorge Amado (“seus santos possuem uma graça, uma ternura, uma condição brasileira, que lhes dão singularidade própria, que as diferenciam de todas as demais”) e expõe em várias galerias no Brasil e exterior.

Início precoce - Natural de Itabuna, onde mora até hoje, desde cedo o santeiro começou a moldar formas e dar vida às suas criações. “Tudo começou como uma brincadeira de criança, com massa de modelar e fui para a cerâmica. Minha primeira exposição foi com 10 anos de idade”, revela. “Sempre tive a vontade de modificar os santos, pois os achava muito duros, sérios e tristes. Foi aí que comecei a estudar as várias linhas do Barroco no Brasil e me fixei exatamente no Barroco baiano e na iconografia medieval, que é mais rica do que a renascentista”, ressalta o santeiro. “Quando trabalhei com Carybé sempre escutava: ‘Osmundo, não faça nada apenas com uma foto. Pegue o nome do santo e pesquise.’ Aprendi muito na época em que trabalhei com ele e com o ceramista Udo Knoff ”, afirma.


ARRO Faço santos mais humanos, desmitificados. Meus orixás, por exemplo, são homens e mulheres vestidos de orixás e não entidades ou figuras míticas” osmundo teixeira, ceramista

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Jornada em busca de si mesmo Osmundo é formado em artes plásticas pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e tem no currículo vários outros cursos, como o de xilografia, escultura barroca baiana e artes do fogo em Portugal. Sua técnica, chamada de casa de abelha, tem tradição secular romana e dispensa o uso de formas. Em Portugal, onde morou por oito anos, aprimorou o trabalho, considerado singular pela anatomia perfeita e expressão diferenciada das imagens. As obras do artista se destacam pela perfeição de formas e movimentos e surpreendem pela delicadeza, graça e elegância dos contornos e silhuetas. “Tento imprimir em minhas mais de duas mil obras uma beleza cênica e uma condição brasileira, além de uma identidade singular. Cada peça é única”, afirma o santeiro. “Faço santos mais humanos, desmitificados. Meus orixás, por exemplo, fazem tanto sucesso porque são homens e mulheres vestidos de orixás e não figuras míticas”, acrescenta. Quando perguntado sobre a satisfação de trabalhar com a arte, Osmundo é enfático ao afirmar: “Sou apaixonado pela minha profissão. Poucas formas de expressão artística são tão simbólicas como a cerâmica. Modelar a argila com as mãos e acompanhar a queima nos fornos torna a produção de cada peça uma jornada em busca de si mesmo”, revela. “Não quero ser reconhecido por um trabalho de ponta ou como o melhor artista de barro do Brasil. O que mais desejo é mostrar às pessoas que com um material tão simples, tirado da terra, podemos fazer uma coisa tão bela. Quero incentivar novos artistas e demonstrar que a cerâmica pode receber um verdadeiro toque de Midas”, complementa com um largo sorriso.

Onde comprar: Atelier de Osmundo Teixeira, Rua de Contas, 46, Góes Calmon, Itabuna, (73) 3211.9805 / 9131.9097 W W W. L E T S G O BA H I A .CO M . B R

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