Revista PRÉMIO | Edição Outubro 2021

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SUMÁRIO CONTENTS

5 EDITORIAL DESTAQUE | FEATURED 8 O FUTURO EM TRÊS PENADAS THE FUTURE IN A GLANCE David Dinis, Director-adjunto do Expresso | Deputy Editor-in-Chief of Expresso FALA QUEM SABE | SPEAK WHO KNOWS 12 IN AN UNLIKELY PANDEMIC SUCCESS STORY, EUROPEANS OVERTOOK AMERICANS ON THE ROAD TO VACCINATION Raphael Minder, Spain and Portugal correspondent for The New York Times 14 MARCELO, O DISCRETO MARCELO, THE DISCREET Sebastião Bugalho 16 O ESTADO OPOSIÇÃO NÃO PERMITE A TRANSFORMAÇÃO AN OPPOSITIONAL STATE DOES NOT ALLOW FOR TRANSFORMATION Joana Petiz, Diretora do Dinheiro Vivo | Editor-In-Chief of Dinheiro Vivo 19 TEMPO DE INOVAR E REDESENHAR PARA MELHOR CRESCIMENTO TIME TO INNOVATE AND REDESIGN FOR BETTER GROWTH Luís Ferreira Lopes, Consultor | Consultant POLÍTICA NACIONAL | NATIONAL POLITICS 24 ENTREVISTA | INTERVIEW

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Ana Abrunhosa “GOSTO DE ME CONSIDERAR A EMBAIXADORA DO TERRITÓRIO NO CONSELHO DE MINISTROS” “I LIKE TO CONSIDER MY ROLE AS THE AMBASSADOR OF THE TERRITORY TO THE COUNCIL OF MINISTERS” UM NOVO IMPULSO PARA O PAÍS! “A NEW STIMULUS FOR THE COUNTRY” João Paulo Correia, Deputado PS | Socialist MP O PS NÃO FAZ IDEIA THE PS HAS NO IDEA João Cotrim de Figueiredo, deputado da IL | Iniciativa Liberal MP POLÍTICA INTERNACIONAL | INTERNATIONAL POLITICS ENTREVISTA | INTERVIEW CAROLINA CERQUEIRA “PANDEMIA GEROU UMA GRANDE ONDA SOLIDÁRIA DOS PARCEIROS DO ESTADO” “THE PANDEMIC PRODUCED A WAVE OF GREAT SOLIDARITY AMONG THE STATE’S PARTNERS” DIPLOMACIA | DIPLOMACY MARCO Y PERSPECTIVAS DE LA PRÓXIMA CUMBRE BILATERAL FRAMEWORK AND PROSPECTS FOR THE

Morgado, Nélson Soares e Ricardo David Lopes

DIRECTOR António Cunha Vaz DIRECTOR A EXECUTIVA Sofia Arnaud DIRECTOR DE ARTE Miguel Mascarenhas REDACÇÃO André Rito, Ana Valado, Bruno Rosa, Belén Rodrigo, João Barbosa, Miguel

COL ABORAM NESTA EDIÇÃO Álvaro Santos Pereira, António Mateus, Bruno Cardoso, David Azevedo Lopes, David Dinis, Diogo Belford Henriques, Inês Sequeira Mendes, Joana Petiz, João Cotrim de Figueiredo, João Paulo Correia, João Rodrigues Pena, José Theotónio, Luís Ferreira Lopes, Manuel Caldeira Cabral, Maria Manuel Leitão Marques, Marta Betanzos Roig, Nuno Azevedo Neves, Paulo Morgado, Pedro Cativelos, Pedro Reis, Raphael Minder, Raquel Vaz Pinto e Sebastião Bugalho. TRADUÇÃO Carlos Tomé Sousa, Kevin Rose PUBLICIDADE Telf.: 210 120 600

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NEXT BILATERAL SUMMIT Marta Betanzos Roig, Embaixadora de Espanha em Portugal | Ambassador of Spain in Portugal BEIJING E CABUL: ALINHAMENTO DE INTERESSES BEIJING AND KABUL: AN ALIGNMENT OF INTERESTS Raquel Vaz Pinto, Investigadora IPRI-Univ. Nova | Researcher at IPRI-Nova Uni. O QUE NOS INTERESSA O AFEGANISTÃO? WHAT DOES AFGHANISTAN MEAN TO US? Bruno Cardoso, Sub-Director do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE_IUL | Subdirector of the International Studies Centre of ISCTE-IUL ESTRATÉGIA: UM CONCEITO PARA LEVAR A SÉRIO STRATEGY: A CONCEPT TO TAKE SERIOUSLY Maria Manuel Leitão Marques, deputada ao Parlamento Europeu | Member of the European Parliament O “NOVO PETRÓLEO” QUE AJOELHA A ÁFRICA DO SUL THE “NEW OIL” BRINGING SOUTH AFRICA TO ITS KNEES António Mateus, Jornalista | Journalist

IMPRESSÃO Gráfica Lda. Praceta José Sebastião e Silva Lote 20 Parque Ind. Seixal 2840-072 Aldeia de Paio Pires

CRC LISBOA 13538-01

PROPRIETÁRIO E EDITOR Cunha Vaz & Associados – Consultores em Comunicação, SA NIF 506 567 559

DEPÓSITO LEGAL 320943/10

DETENTORES DE 5% OU MAIS DO CAPITAL DA EMPRESA António Cunha Vaz

REGISTO ERC 124 353

PERIODICIDADE Trimestral TIRAGEM 3500 Exemplares

SEDE Av. dos Combatentes, n.º 43, 12.º 1600-042 Lisboa

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64 FOREIGN AFFAIRS THE AGE OF AMERICA FIRST WASHINGTON’S FLAWED NEW FOREIGN POLICY CONSENSUS ECONOMIA | ECONOMICS 72 ENTREVISTA | INTERVIEW ANTÓNIO RAMALHO “O LONGO PRAZO É UMA SUCESSÃO DE CURTOS PRAZOS” “THE LONG TERM IS A SUCCESSION OF SHORT TERMS” 80 ENTREVISTA | INTERVIEW NUNO PINTO DE MAGALHÃES “É O COROAR DE UMA CARREIRA” “IT IS THE CROWNING ACHIEVEMENT OF A CAREER” 90 ENTREVISTA | INTERVIEW PAULA CABAÇO “SENTIMOS A NECESSIDADE DE REPOSICIONAR A MARCA ‘PORTOS DA MADEIRA’” “WE FELT THE NEED TO REPOSITION THE ‘PORTS OF MADEIRA’ BRAND” 96 PINHAL DA TORRE UVAS FELIZES PARA VINHOS FELIZES HAPPY GRAPES FOR HAPPY WINES 104 EMPRESA EM DESTAQUE | FEATURED COMPANY MOTA-ENGIL HÁ 75 ANOS A “CONTRUIR” O SEU FUTURO CONSTRUCTING THE FUTURE FOR THE LAST 75 YEARS 114 PORQUE DECIDI CANDIDATAR-ME A BASTONÁRIO WHY DID I DECIDE TO RUN FOR PRESIDENT OF THE ORDER OF ECONOMISTS Pedro Reis, Candidato a Bastonário da Ordem dos Economistas | Candidate for the leadership of the Order of Economists 116 CONSEGUIMOS COLOCAR PORTUGAL NO MAPA DAS EMPRESAS TECNOLÓGICAS WE MANAGED TO GET PORTUGAL ONTO THE MAP OF TECHNOLOGY COMPANIES Manuel Caldeira Cabral, Administrador na Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de

ESTATUTO EDITORIAL

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Pensões (ASF) | Director of the ASF – the Insurance and Pension Fund Supervisory Authority 118 SAIR DA CRISE EMERGING FROM THE CRISIS Álvaro Santos Pereira, Director na OCDE | OECD Director of the Department of Economics 122 PLATAFORMAS: A CLOUD DA INTELIGÊNCIA PLATFORMS: THE INTELLIGENT CLOUD Paulo Morgado, Cofundador da BridgeWhat | Cofounder of BridgeWhat 126 ASAS DE BORBOLETA BUTTERFLY WINGS David Azevedo Lopes, Gestor e Presidente da Aeon Topvalu | Manager and President of Aeon Topvalu – Japan 128 TURISMO, O MOTOR DA ECONOMIA PORTUGUESA TOURISM, THE MOTOR OF THE PORTUGUESE ECONOMY José Theotónio, CEO Grupo Pestana | Pestana Group CEO 132 E AGORA, QUEM VEM TOMAR CONTA DO NEGÓCIO? WHAT NOW? WHO IS GOING TO TAKE CHARGE OF THE BUSINESS? João Rodrigues Pena, Founder & Managing Partner da ARBORIS 134 THE ECONOMIST NATURAL-GAS SHORTAGES THREATEN GOVERNMENTS’ GREEN GOALS THE ENERGY TRANSITION MUST BE BETTER MANAGED OR ENVIRONMENTALISM WILL BECOME UNPOPULAR DIREITO | LAW 136 ESG: DE PRIORIDADE INADIÁVEL A OPORTUNIDADE IRRECUSÁVEL ESG: FROM UNDELAYABLE PRIORITY TO IRREFUTABLE OPPORTUNITY Inês Sequeira Mendes, Managing Partner Abreu Advogados 138 IT’S THE EFFICIENCY OF THE JUSTICE, STUPID! Nuno Azevedo Neves, DLA Piper ABBC Country Managing Partner

R EV I ST A C O R P O R AT IV A D A CV & A

www.revistapremio.pt/estatuto

CORRESPONDENTES | CORRESPONDENTS ANGOLA | ANGOLA 142 MAIS COESOS MORE COHESIVE Ricardo David Lopes, PRÉMIO BRASIL | BRAZIL 144 NO PÓS-COVID, A AGENDA PRÓ-AMBIENTE IN THE POST-COVID ERA, THE PRO-ENVIRONMENT AGENDA Bruno Rosa, PRÉMIO 146 O TURISMO NA EUROPA DURANTE A PANDEMIA TOURISM IN EUROPE DURING THE PANDEMIC ESPANHA | SPAIN 150 EL RETO DE UN NUEVO MODELO ENERGÉTICO THE CHALLENGE OF A NEW ENERGY MODEL Belén Rodrigo, PRÉMIO MOÇAMBIQUE | MOZAMBIQUE 152 UMA ÚLTIMA BOA NOTÍCIA OU A PRIMEIRA DE MUITAS? THE LAST PIECE OF GOOD NEWS OR THE FIRST OF MANY? Pedro Cativelos, Director Executivo da Media4Development | Executive Director of Media4Development CULTURA E SOCIEDADE | CULTURE & SOCIETY 154 TEREMOS SEMPRE PARIS. 100 ANOS DE PARTICIPAÇÃO PORTUGUESA NOS JOGOS OLÍMPICOS WE’LL ALWAYS HAVE PARIS. 100 YEARS OF PORTUGUESE PARTICIPATION IN THE OLYMPIC GAMES 164 MUSEU DO HOLOCAUSTO UM ESPAÇO FEITO PARA QUE A MEMÓRIA NÃO SE DISSIPE A PLACE MADE SO THAT MEMORIES DO NOT DISSIPATE 168 GIRL MOVE ACADEMY DISTINGUIDA PELA UNESCO GIRL MOVE ACADEMY DISTINGUISHED BY UNESCO 172 SUGESTÕES LEITURA READING SUGGESTIONS


EDITORIAL

ANTÓNIO CUNHA VAZ, PRESIDENTE DA CV&A CHAIRMAN AT CV&A

E D I T O R I A L PA R A OS AMIGOS EDITORIAL FOR OUR FRIENDS

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ermina, com este número de Outubro de 2021, o período que dedicámos à comemoração do décimo oitavo aniversário da CV&A. Em todas as geografias nas quais actuamos temos o nome que construímos. Os colaboradores que cá estão na empresa e outros que, tendo saído para as suas vidas empresariais ou pessoais, somados aos que foram entrando e aos clientes que vamos conquistando e perdendo – o mercado é dinâmico – fazem-nos terminar o ano na liderança do mercado. Os números das empresas que cumprem a lei e depositam as suas contas atempadamente assim o demonstram. Isto só nos traz um desafio acrescido: saber manter essa liderança. Não é fácil, porque alguma concorrência é boa. “Terminamos estes dezoito anos com menos oito muito

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e hereby close, with this October 2021 edition, the period dedicated to the commemorations of the eighteenth anniversary of CV&A. In all the geographies we currently operate in, we have the reputation we have built up. Employees who are with us and others who are not, having left on their business or personal career paths in addition to those who have joined and the clients we have been winning and losing – the market is dynamic – enable us to close the year as market leader. The numbers of those companies complying with the law and submitting their accounts in due time demonstrate this. However, this only brings an additional challenge: how to maintain this leadership. This is not easy as some of the competition is good. We finish these eighteen years with eight fewer very good 5


EDITORIAL

bons amigos: Rosalina Machado, Diogo Vasconcelos, Horácio Roque, Alberto da Ponte, Rui Semedo, João Soares da Silva, João Vasconcelos e já este ano, Jorge Coelho. Foram amigos leais, dos quais recebemos conselhos e ensinamentos diversos, com os quais eu criei uma relação muito para além da profissional e, por essa razão, entendo que neste momento de fim de comemoração lhes devo uma palavra muito grata. Cada um a seu modo, cada um na sua área de intervenção na sociedade e na economia deu muito ao país. A Rosalina, o Rui, o João Soares da Silva e o Jorge Coelho tornaram-se amigos muito chegados. Não posso, por essa razão alongar-me aqui sobre o que deles guardo. Mas não fossem eles e não saberia muito do pouco que hoje sei. O Horácio, que me tinha conhecido menino e que reencontrei profissionalmente, começou por ser o Senhor Comendador e logo passou a ser uma relação especial. O Alberto, que conheci profissionalmente, tornou-se depois um amigo que nos ajudou sempre que lhe foi possível. O Diogo e o João ensinaram-nos, com a sua juventude e competência, a entrar por áreas nunca antes “navegadas”: as virtuais, como as novas tecnologias, pois assim se chamavam ao tempo do Diogo na UMIC e na CISCO, e as “websummits” e o mundo das “startups”, um futuro no presente, como carinhosamente as tratava o João. Ambos estariam felizes, por exemplo, na Expo Dubai que agora decorre. Termino com uma palavra de solidariedade aos Familiares do Senhor General Colin Powell. Um homem que esteve nas conferências da CV&A e que agora nos deixou. Este foi um ano atípico, de novo – acho que passa a típico se se repetir três anos seguidos –, com a pandemia e as limitações por ela impostas. Os negócios não se desenrolaram como normalmente, o teletrabalho não é o forte de uma empresa com uma cultura de proximidade entre colaboradores como a CV&A, mas a obrigação de assim acontecer trouxe-nos novas competências, com todas as dificuldades de adaptar a casa de cada um a escritório, com crianças a deambular e o outro cônjuge também a trabalhar em simultâneo. Entendo, hoje, embora continue a gostar mais de ver e interagir pessoalmente, que saímos desta situação mais ágeis. E é de agradecer o esforço que por quase todos foi feito neste 6

friends. Rosalina Machado, Diogo Vasconcelos, Horácio Roque, Alberto da Ponte, Rui Semedo, João Soares da Silva, João Vasconcelos and then, earlier this year, Jorge Coelho. They were loyal friends from whom we received counsel and diverse teachings and with whom I created a relationship stretching far beyond the professional and, for this reason, I believe that at this time when closing the commemorations I owe them words of great thanks. To each in their own fashion and each, in their own area of intervention in society and economy, giving a great deal to the country. Rosalina, Rui, João Soares da Silva and Jorge became very close friends. I cannot, for this reason, go into detail about what I store of each of them. But were it not for them, I would not know much of the little that I today do know. Horácio, who knew me as a boy and who I reencountered professionally, started out as Commander Sir and soon turned into a very special relationship. Alberto, who I met professionally, became a friend who was always there to help whenever such was possible. Diogo and João taught me with their youth and competences, to enter into hitherto uncharted waters: the virtual, such as the new technologies as they were then called during the time of Diogo at UMIC and CISCO, and all the world of web summits and startups, a future in the present as João would fondly refer to them. Both were happy, for example, at Expo Dubai that is now taking place. I would conclude here by sending my condolences to the family of General Colin Powell: a man who was at CV&A conferences and who has now left us. This was, once again, an atypical year – I think it becomes typical when we repeat the same for three years in a row –, with the pandemic and the limitations this has imposed. Business was not ongoing in the normal way and remote working is not the strength of a company with a culture of proximity as in the case of CV&A. However, the obligation to make that happen has brought us new competences with all the difficulties of having to adapt each of our homes into an office with children wandering through in some and partners also simultaneously working in others. I understand today that, while continuing to prefer seeing and interacting personally, we emerge from this situation as more agile. And I would like to thank you for the efforts made by almost everybody during this period of remote working. There was also the news of our connection to a new branch of


EDITORIAL tempo de teletrabalho. Também aconteceu a nossa ligação a uma nova rede de agências – /amo – com a qual o passado recente e o presente têm revelado um enorme potencial para o futuro. Que assim seja. Quero agradecer aos colegas das agências /amo com as quais temos colaborado, em Portugal, no Brasil e em Angola, pela forma profissional e amiga como fomos acolhidos. E esta ligação comprovou que podemos manter alguma relação com terceiros, desde que não haja conflito de interesses. Por exemplo, no Dubai, a sempre nossa Cristina Ramos (que quase fundou a CV&A comigo) que trabalha noutra agência foi um exemplo claro dessa colaboração externa. Para aqueles que pensam que os textos neste editorial deveriam ser mais filosóficos, económicos ou menos pessoais fica aqui a informação: são assim porque também são para os nossos colaboradores e que, do Minho ao Algarve, nas Regiões Autónomas, em Angola, Moçambique, Cabo Verde ou Guiné-Bissau, no Brasil, em Espanha ou na Colômbia, todos merecem uma palavra que só eles percebem. Se tudo correr bem terminaremos o ano dentro do orçamentado. Em 2022 vamos pagar impostos por nós e por aqueles que não pagam. Se todos cumprissem o seu dever os impostos poderiam ser menores. Mas ninguém parece preocupado em fazer literacia fiscal. Há tanto para mudar no País e na Europa e trabalhamos sempre com a esperança de contribuir para a mudança. Os extremismos devem ser banidos, sejam eles quais sejam, a tolerância deve imperar e devemos saber produzir, isto é, merecer os direitos que temos pelo cumprimento dos deveres, quer os naturais, quer os que nos são impostos. A Paz no mundo, o fim da pobreza, do ódio religioso, étnico, de género, entre outros devem ser objectivos permanentes. Os erros do passado não se apagam, sobretudo com ódio contra, afinal, quem não os praticou. Porque a verdade é que, por exemplo, os homens de hoje não são os mesmos que praticaram crimes horrendos, como Hitler ou Estaline. Nem a história dos povos deve ser apagada. Até para educar as gerações futuras no respeito a quem por eles lutou. O que não pode nem deve é haver dois pesos e duas medidas. Os que sofrem são sempre os mesmos. A educação escolar e a cultura devem ser fortes apostas. Só gente educada e cultivada pode acabar com os extremismos. E no dia em que acabarem (dentro de duas ou três gerações) o mundo será melhor. Só um país de gente educada é um país civilizado. Um obrigado ao Senhor Secretário-Geral das Nações Unidas pelo trabalho que tem feito. Esta Prémio tem as mesmas características da anterior. Procura trazer ao leitor aquilo que as revistas de mercado não trazem. Temos recebido inúmeros comentários sobre a edição ‘online’, que vai sofrer melhorias significativas em Janeiro de 2022, e perguntas sobre se vale ou não a pena a edição em papel – todas elas elogiando a qualidade do mesmo, o design e o facto de ser reciclado. Estamos a ponderar o futuro, podendo garantir que ele existe e será cada vez mais rico em conteúdo. Quanto ao suporte, como diria um líder que muito contribuiu para a minha vida, “Já se Verá!” l

agencies – /amo – with which the recent past and the present has revealed enormous potential for the future. May that be so. I would like to thank our colleagues at the /amo agencies with which we have collaborated, in Portugal, in Brazil and in Angola, for the professional and friendly way they have welcomed us. And this connection demonstrates how we maintain relationships with third parties whenever there are no conflicts of interest. For example, in Dubai, the always ours Cristina Ramos (who practically founded CV&A with me) who works in another agency was another clear example of this external collaboration. For those thinking that the texts in this editorial should be more philosophical, economic or less personal, here is some information: they are this way because they are for our collaborators and who, from the Minho to the Algarve, in the Autonomous Regions, in Angola, Mozambique, Cape Verde, Guinea Bissau, in Brazil, Spain and in Colombia, all deserve a word that only they understand. If everything goes well, we shall finish the year inside the budget. In 2022, we are going to pay taxes for ourselves and for those who do not pay. If everybody complied with their duties, taxes could indeed be lower. However, nobody seems concerned about raising fiscal literacy. There is so much to change in the country and in Europe and we work always with the hope of contributing towards the change. Extremists need to be banned, whatever their respective type, tolerance needs to prevail and we should know how to produce, that is, deserving the rights that we gain for complying with our duties, both the natural duties and those that are imposed upon us. Peace in the world, the ending of poverty, religious, ethnic and gender hate, among others, have to be permanent objectives. The errors of the past do not get erased, especially by hatred against those who, after all, did not commit them. Because the truth remains, for example, that the people of today are not the same as those that practiced horrendous crimes, such as under Hitler or Stalin. Nor should the history of peoples be eliminated: especially to educate future generations to respect those who fought for them. What there cannot and should not be is two standards and two means of measurement. Those who suffer are always the same. School education and culture should be strongly backed. Only educated and cultivated people may bring an end to the extremisms. And, on the day when they end (within two or three generations) the world will be a better place. Only a country of educated people is a civilised country. And our special thanks to the Secretary-General of the United Nations for the work that has been done. This edition of Prémio displays the same characteristics as the previous; seeking to provide the reader with what market magazines don’t. We have received countless commentaries about the online edition, which is to undergo significant improvements in January 2022, and questions about whether or not it is worth printing the paper edition – while still praising its respective quality, design and the fact of being recycled. We are pondering the future, seeking to guarantee that this exist and be ever richer in content. As regards the format, as one leader, who made a great contribution to my life, would say, “The Future shall see!” l 7


D E S TA Q U E

DAVID DINIS, DIRECTOR ADJUNTO DO EXPRESSO DEPUTY EDITOR-IN-CHIEF OF EXPRESSO

O FUTURO EM TRÊS PENADAS A GLANCE INTO THE FUTURE

A N T Ó N I O C O S TA T E N T O U C O N V E N C E R C ATA R I N A M A R T I N S E , S O B R E T U D O , J E R Ó N I M O D E S O U S A , M A S N Ã O T E V E S U C E S S O . O B L O C O V O T O U C O N T R A , O P C P TA M B É M - E A S C I N C O A B S T E N Ç Õ E S A N U N C I A DA S P E L O PA N E D U A S D E P U TA DA S I N D E P E N D E N T E S N Ã O C H E G A R A M P A R A L E VA R O D O C U M E N T O S E Q U E R À D I S C U S S Ã O N A E S P E C I A L I D A D E . A G O R A , D E P O I S D E M A R C E L O T E R O U V I D O O S PA R T I D O S E O C O N S E L H O D E E S TA D O , E I S O Q U E S E S E G U E . A N T Ó N I O C O S TA AT T E M P T E D T O C O N V I N C E C ATA R I N A M A R T I N S A N D , A B O V E A L L , J E R Ó N I M O D E S O U S A , B U T O N LY U N S U C C E S S F U L LY. T H E B L O C O V O T E D A G A I N S T T H E S TAT E B U D G E T A S D I D T H E P C P A N D T H E F I V E A B S T E N T I O N S B Y T H E PA N A N D T H E T W O I N D E P E N D E N T M P S W E R E N O T E N O U G H E V E N T O G E T T H E B I L L T H R O U G H T O T H E P H A S E O F S P E C I A L I S T D I S C U S S I O N . N O W, A F T E R M A R C E L O H A S S O U N D E D O U T T H E PA R T I E S A N D T H E C O U N C I L O F S TAT E , T H I S I S W H AT W I L L F O L L O W. 8


F E AT U R E D Diretas no PSD Quando chegar marcado para a eleição do novo líder, 4 de dezembro, todo o ambiente no PSD será de pré-campanha para as eleições antecipadas - e a escolha dos militantes acabará influenciada por isso. Sabe-se o ponto de partida: Paulo Rangel tem a maioria das estruturas distritais e tenta capitalizar o “élan” de quem apareceu de novo; Rui Rio procura o “voto livre” apresentando-se com perfil de chefe de Governo Os sociais-democratas, pelo meio, tiveram de discutir se aceleravam prazos, desde logo do congresso que estava marcado para janeiro. Mas também terão de acelerar escolhas, nomeadamente se se juntam ou não ao CDS (mais certo), IL (menos) e o que fazem com o Chega — Rio não o excluirá, Rangel disse que sim. O objetivo, em qualquer caso, será o mesmo: tentar capitalizar o efeito Moedas, de mobilização do eleitorado de direita, e procurar atingir uma maioria na Assembleia da República. Em todo o caso, contará a capacidade de unir o partido. Assim como para a vitória (e para os ¬apoios) contará quem tenha maior expectativa de fazer um bom resultado nas eleições. Eleições Antecipadas Sendo, nestas circunstâncias, muito improvável uma maioria absoluta, o país entraria num de quatro cenários: 1) Vitória do PS, fazendo maioria com o PAN. É o cenário ideal de Costa - e Santos Silva admitiu-o logo a seguir ao chumbo. Não é facilmente atingível: implicaria ganhar muitos votos à esquerda, sem perder para a direita (o que vai depende muito, claro, da dinâmica do candidato vencedor nesse partido). Mas garantiria estabilidade, eventualmente até com uma coligação de Governo. 2) Vitória do PS com maioria à esquerda. Seria uma repetição do cenário atual, com mais ou menos representantes entre os três partidos, e era provável que o PS tentasse um acordo escrito, com ou sem coligação de Governo, com um ou mais parceiros. Dado o chumbo do Orçamento, o cenário de partida não é tranquilizador para o PS: Bloco e PCP colocariam a fasquia alta e cedências de Costa em matérias que antes rejeitou seriam difíceis. Em qualquer cenário, o programa de Governo passaria na votação. 2) Vitória do PSD, maioria de direita. Será possível caso o chumbo do OE levasse a uma desmobilização grande do eleitorado de esquerda. Mas, sem maioria e com um CDS menos forte, o líder do PSD teria de passar um teste: no caso da estratégia de Rio, negociar com o Chega, como fez nos Açores (atenção, o Governo regional está já sob ameaça), vendo até onde ceder nas bandeiras radicais erguidas por Ventura; no caso da estratégia

Leadership Elections In The PSD When the date for the election of a new leader arrives, 4th December, the entire ambience of the PSD will be pre-campaign, gearing up for the looming national elections – and the choice of party members will end up being influenced by this. From the outset, we know: Paulo Rangel has the majority of the district structures behind him and will try and capitalise on the “elan” of the newly returned; Rui Rio seeks the “free vote” presenting himself as holding the right profile for head of government. The Social Democrats, in the midst of this, have had to discuss the bringing forward of deadlines; that of the party congress formerly scheduled for January to begin with. However, this also involves accelerating the making of choices, especially over whether to enter an election coalition with the CDS (more likely), IL (less likely) and what to do with Chega — Rio would not exclude the party while Rangel said he would. The objective, in any case, remains the same: attempting to capitalise on the Moedas effect, mobilising the right of centre electorate and seeking to obtain a majority in the next parliament. In every case, this requires the capacity to unite the party. Thus, to obtain any leadership election victory (and for their support), the next leader will emerge out of the strongest expectations of getting a good result in the national elections to follow. Early Elections Given the prevailing circumstances, it is unlikely any party obtains an absolute majority with the country effectively facing one of four feasible scenarios: 1) Victory for the PS, achieving a majority with PAN. This is the ideal scenario for Costa – and Santos Silva accepted this immediately after the budget rejection. However, this is not easily attainable: implying the need to pick up a lot of votes on the left without losing them on the right (which in turn depends greatly on the dynamic generated by the leadership election victor). However, this guarantees stability and eventually leading to a coalition government. 2) Victory for the PS with a left-wing majority. This reflects a repetition of the current scenario with a greater or lesser number of MPs for the respective three parties, and the PS would likely attempt a written agreement, with or without a formal coalition, with one or more partners. Given the budget rejection, the party scenario outlook is not reassuring for the PS: the Bloco and PCP would set the barrier high and giving ground on already rejected issues would be difficult for Costa. In any such scenario, the government program would get voted through by parliament. 3) Victory for the PSD, with a centre-right majority. This might be feasible should the rejection of the state budget lead to a low level of turnout on the left. However, without a majority and with a weakened CDS, the PSD leader would have to pass a test: in the case of the Rio strategy, to negotiate with Chega, as was done in the Azores (even if, please note, the regional government is already under threat), seeing just which of the radical flags planted by 9


D E S TA Q U E de Rangel, esperar que Ventura cedesse à sua estratégia — nada lhe entregar, deixando na sua mão a decisão de chumbar ou validar um Governo de direita onde não participará. 3) PSD vence, mas com maio¬ria de esquerda. Seria a repetição do cenário de Passos em 2015. Costa teria já seis anos de governação sobre os ombros, pelo que a negociação seria mais dura; mas, por outro lado, teria a garantia de uma “obrigação” da esquerda em se sentar para negociar um terceiro Governo PS. Em coligação? Com acordo escrito? Em caso positivo, o novo Governo salta diretamente para outubro de 2022 no calendário. Em caso negativo, passa para o mês seguinte: abril. OE-2022, Take 2 As negociações à esquerda, em qualquer caso, teriam um primeiro teste sério: fazer passar o Orçamento para 2022, chumbado meses antes. Com um acordo de Governo sólido, seria uma primeira etapa de uma legislatura que terá de provar até 2026. Mas num Governo de esquerda sem acordo escrito, seria mais um Dia D para Costa: um novo OE chumbado deixaria Portugal num pântano político, sem solução à vista. Nesse pior cenário, o PS e o Presidente teriam papéis centrais. Os socialistas pode¬riam tentar escolher um novo líder — Pedro Nuno Santos seria o melhor colocado — para tentar o que Costa falhou; já Marcelo teria na mão a decisão mais difícil do seu mandato: dar espaço ao novo líder do PS para um acordo à esquerda ou convocar novas eleições? Todo este cenário teria reverso da medalha, caso seja a direita a governar: consegui¬riam Rangel ou Rio fazer passar um primeiro Orçamento? E se ele dependesse de Ventura? Negociariam com ele? Com que linhas vermelhas? E que garantias haveria de conseguirem novo OE para o ano seguinte? Uma pergunta para a última etapa deste labirinto político. OE-2023, Take 1 Se Costa chegar aqui, conseguindo evitar uma crise política em 2021, não é nada certo que consiga repetir a proeza no ano que se segue, pois os riscos de chumbo do último OE da legislatura é já assumido por quase todos os socialistas. Mas se Costa não a tiver evitado e for reeleito, tudo depende das circunstâncias do momento. A economia terá melhorado? A crise dos combustíveis passou? A direita recuperou? O Governo foi remodelado, ganhou força? E a esquerda espera pelo calendário ou termina o distanciamento que ficou tão visível nesta crise? Se o Governo for à direita, repetem-se muitas das mesmas interrogações: Rangel ou Rio conseguiriam estabilidade? Ou a direita entrava também num pântano? l 10

Ventura might be removable; in the case of the Rangel strategy, waiting to see if Ventura gives way in his approach — handing over nothing and leaving it in his own hands to decide on whether to bring down or approve a right of centre government in which Chega does not participate. 4) PSD wins but with a majority to the left. This would be a repetition of the scenario Passos faced in 2015. Costa would already have notched up six years in government and the negotiations would certainly be harder but, on the other hand, this would guarantee the ‘obligation’ of the left to sit down and negotiate a third PS government. In a coalition? With a written agreement? In a positive outcome, the new government would be able to leap directly through to October 2022 in the calendar. In a negative situation, this would be the following month: April. Budget-2022, Take 2 The negotiations to the left would in any case face a first serious test: getting the 2022 state budget through after its rejection just months before. With the agreement of a solid government, this would be the first stage in a parliament that would have to last until 2026. However, in a left-wing government without any written agreement, it would be another D-Day for Costa: a new state budget rejection would leave Portugal in political quicksand without any foreseeable solution. In this worst case scenario, the PS and the President would play central roles. The socialists might try and change leader — Pedro Nuno Santos would be best placed — to try what Costa failed to do; in turn, Marcelo would have in his hands the most difficult decision of his mandate: provide space for a new PS leader for a left-wing agreement or to call another round of national elections? The reverse side of this coin would turn up should the centre-right take office: could Rangel or Rio get their first budget through parliament? And should this depend on Ventura, would they negotiate with him? With what red lines? And what guarantees would there be for the state budget for the following year? A question for the final leg through this political labyrinth. Budget-2023, Take 1 If Costa can get here, avoiding any political crisis in 2021, it is not at all certain that he would be able to repeat the same feat in the following year as the risks of the last state budget in the parliamentary cycle failing was already assumed by almost all socialists. However, if Costa does not manage to avoid this and gets re-elected, everything would depend on the prevailing circumstances. Has the economy improved? Has the fuel and energy crisis dissipated? Has the right of centre recovered? Was the government reshuffle successful? Did it gain power? And will the left wait for the calendar and/or end with the distancing that became so visible in this crisis? If the centre-right takes office, the same questions nevertheless emerge: would Rangel or Rio be able to achieve stability? Or would a right-wing government get equally bogged down? l


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FALA QUEM SABE

R APHAEL MINDER*, SPAIN AND PORTUGAL CORRESPONDENT FOR THE NEW YORK TIMES

IN AN UNLIKELY PANDEMIC S U C C E S S S T O R Y, E U R O P E A N S OVERTOOK AMERICANS ON THE

ROA D TO VACC I N AT I O N

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ew governments can draw plaudits for their handling of the coronavirus pandemic. Even if such a health crisis forced them to sail uncharted waters, the litany of errors and U-turns that politicians forced upon their citizens seems to be without precedent. As a result, courtrooms are starting to wade through a mountain of litigation, filed in large part against public authorities for mishandling the pandemic. Since early 2020, international organizations also failed to live up to the challenge. The World Health Organization, a United Nations agency that should be offering medical leadership on the global stage, made some woeful calls, starting with its initial advice that people should not wear a face mask unless sick. It also repeatedly showed itself to be little more than the pawn of the powerful and often conflicting political interests that underpin the U.N. The fruitless visit by a W.H.O. delegation to Wuhan in early 2021 was just one example of its shortcomings. As a resident of the European Union, I also found it hard to watch the E.U.’s flawed handling of the

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pandemic, even in areas in which the European Commission should have been able to coordinate a common response, acting as the E.U.’s executive agency. Freedom of movement is one of the cornerstones on which the whole E.U. project was built, yet every member state set its own travel rules, making such movement anything but free flowing. Of course, the pandemic struck in weird and unpredictable ways, affecting some parts of Europe far worse than others. In some cases, countries that managed to remain relatively unscathed in 2020 then later got hit by the worst of Covid-19, particularly once the more infectious Delta variant of the virus surfaced. But none of this can serve as an excuse for not articulating at least some basic and common guidelines for the E.U. For instance, how could it be that a child traveling across the E.U. last summer only had to test for Covid-19 if above the age of 15 to enter Denmark or 11 for France, or 6 for Belgium and Germany but only 2 years of age in order to land in Italy or Portugal? Why could there not be a consensus decision, reached at E.U. level, over the age from which a child should need testing? *Texto escrito na língua de origem do autor


SPEAK WHO KNOWS But amid this wreckage of divergent and often contradictory policies, there is at least one silver lining, namely the vaccination rollout across the E.U. Not every E.U. member state has advanced at the same rate, but the E.U. as a whole reached a milestone in July, when it overtook the United States in terms of the percentage of its population that had received a first jab of vaccination. Since then, the gap has widened significantly in the E.U.’s favor, which should be a source of pride for Europeans. This is a particularly positive development given how bad things had looked for the E.U. at the outset. Remember the situation January 2021. President Joe Biden entered the White House with a promise to carry out 100 million vaccinations in his first 100 days in office. In terms of vaccination, America appeared to be the promised land, a place to which those foreigners who were considered by Washington to present a low infection risk could also travel to get vaccinated for free. The debate was not about whether Americans would get vaccinated en masse, bu whether the U.S. and its efficient pharmaceutical industry would be generous enough to share some of America’s surplus of vaccine doses with other nations less fortunate. At the same time, dark clouds were gathering on the other side of the Atlantic. After launching its vaccination program in late 2020, the European Union appeared to have rapidly sunk into another bureaucratic mess, unable to distribute efficiently across its member states vaccines for which it had also apparently overpaid. The blame game between Brussels and the E.U.’s national governments rapidly intensified. Adding to the confusion and chaotic distribution efforts, the E.U. then got caught in an internal fight over whether it made the wrong choice by selecting AstraZeneca as one of its main suppliers. The rollout of AstraZeneca’s vaccines was briefly put on hold, while health experts determined whether it had been responsible for the blood clots that some people developed after getting vaccinated. While myriad Europeans were left anxiously waiting for their second jab, and the European Commission took AstraZeneca to court, the antivaccination movement grew exponentially. In some parts of Europe, the criticism of the vaccination rollout was also fueled by scandal. In Portugal, for instance, the head of the vaccination task force was forced to resign after failing to act upon reports of queue jumping at a hospital where he was the chief executive. He was swiftly replaced by a Navy officer, Vice-Admiral Henrique Gouveia e Melo. Now let us fast forward 9 months. Portugal has reached one of the highest levels of vaccination in the world and Vice-Admiral Gouveia e Melo is a national celebrity, who has been urged by many to use this popularity to launch into politics.

How did a country like Portugal turn into a poster child for vaccination? In a phone interview during the week that he stepped down from the vaccination task force, Vice-Admiral Gouveia e Melo offered several reasons to explain why he felt his mission had been accomplished so swiftly. When he took charge in early February, Portugal was struggling to get supplies of vaccines, so that only about 30,000 people were getting vaccinated each week. Vice-Admiral Gouveia e Melo set a very different goal: vaccinate 100,000 per day, in a country with a population of just over 10 million residents. To do this, he reorganized the vaccination centers to operate “like a factory,” using staff from the military to lead the way. As he said: “We pushed the people toward vaccination, we were not waiting for the people to go the vaccination centers.” But none of this would have worked without some external factors that played in the Vice-Admiral’s favor. First, Portugal had a long established national vaccination program, dating back to its fight against polio in the 1960s, which meant that it was not a fertile land for the anti-vaccination movement. Second, he took charge just as the E.U. started to overcome the distribution bottlenecks that it had been struggling with, meaning that a trickle of vaccine doses turned instead into “a tsunami of vaccines arriving into the country,” he recalled. Third, he was able to impose his views upon a healthcare system that had just come close to collapse, after a brutal onslaught of the pandemic. In a country that had been forced to call on Germany and its other E.U. partners to provide healthcare reinforcement, the Navy officer used the urgency of the situation to his advantage, as well as the climate of fear generated by the rapid spread of the virus. As Tomás Lamas, a doctor who works in the intensive care units of two hospitals in Lisbon, put it to me, it was a time when everybody realized that “something had be done to change our situation.” Even so, a less decisive leaders would probably not have made the progress that was made in Portugal. As a former submarine squadron leader, ViceAdmiral Gouveia e Melo once spent 31 days in a submarine, a feat that requires not only being able to stay calm under pressure but also an acute ability to plan ahead. “From the submarine world, I learnt that the planning is very important, because you don’t have a second chance to do it right,” he said. But if there is one personal advantage that the admiral wanted to highlight, it was his ability to navigate outside the murky waters of politics. “My advice to the politicians is to stay outside a vaccination campaign,” he said. A rollout “must be run by a professional without any connection with the politics.” As the pandemic continues to shape our lives, it is a lesson that should resonate across the E.U. l 13


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SEBASTIÃO BUGALHO

MARCELO, O DISCRETO MARCELO, THE DISCREET

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título corre riscos de cinismo ou ironia, mas não é disso que se trata. Marcelo Rebelo de Sousa, que é Presidente da República há quase seis anos, é tomado por quem o vê e escuta como a antítese de um chefe de Estado discreto. A sua popularidade, a que prefere chamar ligação ao povo, é a maior responsável por essa sua aparência efervescente. Marcelo na praia, Marcelo no rio, Marcelo a chegar ao local do desastre antes dos bombeiros ou da CMTV, Marcelo nas ‘flash-interviews’ dos jogos da seleção, Marcelo a telefonar ao enfermeiro português que cuidou de Boris Johnson, Marcelo a emitir uma nota de pesar pela morte de George Michael, Marcelo a falar ao país em casa, via ‘webcam’, Marcelo a apresentar a sua recandidatura numa pastelaria, Marcelo a ser, não o que realmente é, mas aquilo em que a sua personalidade presidencial, para os portugueses, se tornou. Tudo isso é Marcelo – e nada disso é Marcelo – porque os paradoxos seriam sempre inevitáveis para um político que atravessou dois regimes, duas Repúblicas 14

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he title runs risks of appearing cynical or ironic but that is not what this is about. Marcelo Rebelo de Sousa, who has now been President of the Republic for almost six years, is perceived by those who see and hear him as the antithesis of a discrete head of state. His popularity, which he prefers to term his connection to the people, is the largest single factor responsible for this apparent effervescence. Marcelo on the beach, Marcelo by the river, Marcelo arriving at the site of a disaster before the firemen or the CMTV cameras, Marcelo giving flashinterviews at Portugal football matches, Marcelo phoning the Portuguese nurse that took care of Boris Johnson, Marcelo sending condolences over the death of George Michael, Marcelo talking to the country from his home via ‘webcam’, Marcelo announcing of his reapplication to the office of president, Marcelo being, not what he really is, but rather what the presidential figure has become for the Portuguese. All of this is Marcelo – and none of this is Marcelo – because the paradoxes would always be inevitable for a politician who has been through two regimes, two Republics and other eras. The purpose of this text is not so much about


SPEAK WHO KNOWS e outras eras. O ponto deste texto não é tanto o que Marcelo é, pois a sua empreitada biográfica foi já consumada, nem o que Marcelo tem sido, na medida em que tal, graças aos órgãos de comunicação social que também ajudou a fundar, nos tem chegado diariamente a casa. O ponto deste texto é, antes, um outro exercício, que certamente ocupará um canto da consciência do próprio: como é que, depois de uma década em Belém, será recordado na História? E isso, olhando para o ciclo político que agora terminou e para o outro que vem surgindo, parece ter muito pouco a ver com a perceção que nós, enquanto país, temos tido do Presidente até aos idos da sua presidência. Marcelo esteve presente, é verdade, mais do que todos os outros que desempenharam a sua função antes dele: em declarações, aparições, concertações governamentais e proximidade (já antiga) ao primeiro-ministro. Meteu-se, foi metido e deixou-se meter em áreas do executivo, apontando caminhos, travando impulsos e impondo limites. Mas essa presença não foi mais do que um reflexo – umas vezes melhor gerido do que outras – da sua única prioridade enquanto Presidente da República: a estabilidade. Para ele, que recebeu um governo composto por uma solução sem precedentes, um país ainda em procedimento por défice excessivo, um sistema partidário erodido e em metamorfose, uma ameaça populista oriunda da sua área política, a maior catástrofe humanitária verificada em democracia, a maior crise sanitária em um século e o maior envelope financeiro desde a adesão europeia (o PRR e o PT2030), o estilo interventivo foi mais uma necessidade do que um gosto. Quando os dez anos de Marcelo terminarem, não sentiremos somente o vazio de uns sapatos difíceis de preencher, mas um enfado por tantos problemas dificilmente tornarem a coincidir no mesmo período de tempo. O país, em 2026, não estará garantidamente melhor do que estava em 2016, mas uma coisa é certa: não estará pior. E Marcelo, que foi popular e popularucho, que deu uma mão ao PS por não ter ninguém a pedir-lhe a outra, sairá do Palácio de Belém como o mais discreto dos presidentes. Sem as tentações de presidencialização do regime de Eanes, com os seus governos de iniciativa presidencial e o seu PRD; sem as malandrices de Soares, que fez a vida num inferno tanto a Cavaco Silva quanto a Guterres; sem a dissolução da Assembleia da República de Sampaio; sem a oposição de Cavaco a Sócrates no segundo mandato ou a sua tentativa de acordo entre o então primeiro-ministro (Passos) e o então líder da oposição (Seguro); e sem nada daquilo que, dentro ou fora dos seus poderes constitucionais, lhe teria permitido ficar na História como algo além de si mesmo. Marcelo será, no fim, só Marcelo. O primeiro Presidente que não quis ser mais do que isso. l

what Marcelo is, indeed, the biographic task has already been undertaken, nor about what Marcelo has been to the extent that, courtesy of the media outlets that he also helped establish, this arrives directly into our homes. The point of this text is rather another exercise, which certainly occupies one corner of his own conscience: how will he go down in history after a decade in Belém? And this, looking at the political cycle that has now ended and to the one now emerging, it would seem to have little to do with the perception that we, as a country, have of the president through to the end of his presidency. Marcelo was present, it is true to say, more than any of the others who performed this role prior to himself, in the declarations, appearances, government agreements and (already past) proximity to the prime minister. He got involved, was summoned to involvement and allowed himself to get involved in areas of the government, setting out paths, checking impulses and imposing boundaries. However, this presence was no more than a reflection – on some occasions better managed than on others – of his ultimate priority as President of the Republic: stability. From his perspective, he who received a government composed of an unprecedented solution, a country still under corrective procedures due to excessive state deficits, an eroded party system undergoing metamorphosis, a populist threat emerging from his political field, the greatest humanitarian catastrophe experienced under democracy and largest health crisis in a century as well as the greatest financial room for manoeuvre since EU membership (the PRR and PT2030), his interventive style was more of a need than a preference. When the ten years of Marcelo are up, we shall only feel the emptiness of some very difficult shoes to step into but also a swirl of so many difficult problems happening to coincide with the same period in time. The country in 2026 shall not certainly be a better place than it was in 2016 but one aspect is for sure: it will not be worse. And Marcelo, who was both popular and had mass popularity, who lent out his hand to the PS due to having nobody asking for the other, shall depart from the Palace of Belém as the most discreet of presidents. Without the temptations of a presidential regime of Eanes, with his government by presidential initiative and his own PRD; without the chicanery of Soares, who made life infernal both for Cavaco Silva and for Guterres; without the dissolution of parliament carried out by Sampaio; without the opposition of Cavaco to Sócrates in his second mandate or the attempted agreement between the then prime minister (Passos) and the leader of the opposition (Seguro); and without any of that which, inside or outside of his constitutional powers, would have enabled him to go down in history as somebody other than he himself. Marcelo shall be, at the end, just Marcelo. The first president who did not want to be anything more than just that. l 15


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JOANA PETIZ, DIRETORA DO DINHEIRO VIVO EDITOR-IN-CHIEF OF DINHEIRO VIVO

O E S TA D O O P O S I Ç Ã O N Ã O P E R M I T E

A TRANSFORMAÇÃO

A N O P P O S I T I O N A L S TAT E D O E S N O T A L L O W F O R T R A N S F O R M AT I O N

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ais de 1300 trabalhadores subtraídos de uma empresa em oito meses, entre rescisões por mútuo acordo, reformas antecipadas, pré-reformas e despedimentos. Os números impressionam e são capazes de dar azo à indignação maior de quem tem abanado a cabeça em desaprovação e choque pelas 400 saídas anunciadas da Galp de Matosinhos. Ou de quem já se esqueceu que o mesmo aconteceu, em janeiro, quando a EDP encerrou a central a carvão de Sines, com efeitos semelhantes em recursos humanos dela direta ou indiretamente dependentes. Uma “vergonha” que merece “uma lição exemplar” pela falta de humanidade, disse sobre a Galp o mesmo responsável político que, enquanto gestor de uma empresa pública, assinou a decisão de dizer adeus a três vezes mais funcionários do que qualquer das energéticas. Nos primeiros oito meses deste ano, a TAP negociou a saída de três vezes mais pessoas do que a Galp ou a EDP. A que se somam outros 1900 subtraídos à força de trabalho da companhia aérea portuguesa desde que o Estado voltou a sentar-se aos comandos. As 3200 16

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ver 1,300 workers subtracted from a company in eight months through a combination of mutually agreed redundancies, early retirement and layoffs. The numbers are impressive and capable of fuelling still further the indignation of those who shook their heads in disapproval and shock at the 400 jobs lost at the Galp Matosinhos refinery. Or those who have already forgotten that the same happened in January when EDP closed its coal power station in Sines with similar impacts on the human resources of those directly and indirectly dependent. A “disgrace” that deserves “to be made an example of” due to the lack of humanity, the comments about Galp issued by the same politician responsible for signing, when managing a public company, the decision to bid farewell to three times more employees than any of the energy companies disposed of. In the first eight months of this year, TAP negotiated the departure of three times more people than Galp or EDP. This comes in addition to the 1,900 positions lost in the labour force of the Portuguese flagship carrier since the state once again sat down behind the (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


SPEAK WHO KNOWS saídas em cerca de um ano fazem parte de uma gestão de emergência da transportadora, um mal terrível mas necessário para garantir a sustentabilidade da companhia em tempos de covid. O que não reduz a dimensão do drama social, mas justifica-se pelas circunstâncias – tal como acontece com as energéticas, apanhadas entre a pandemia e os seus efeitos diretos e a aceleração da nova ordem mundial para a descarbonização da economia, ditada por Bruxelas e acolhida com entusiasmo pelos governos e pelos europeus em geral, conscientes da importância da transição climática para um melhor ambiente. Fatores que contribuíram igualmente para a queda a pique na procura de combustíveis. Impulsionador maior da eletrificação verde da economia, o ministro do Ambiente não teve dúvidas em saudar como boas as notícias do fim da refinação de petróleo em Matosinhos, chegando a aventar a possibilidade de aquela unidade ser transformada para refinação de lítio. E ainda que revelasse preocupação com “o destino dos trabalhadores afetos àquela unidade industrial”, lembrava Matos Fernandes, logo em dezembro, quando foi anunciado o encerramento, o papel que do Fundo Europeu para a Transição Justa podia ter na mitigação desses efeitos sociais, havendo 200 milhões de euros reservados para Portugal no âmbito desse mecanismo, para proteger os impactos nos trabalhadores e financiar novos negócios que potenciem a transição para a descarbonização. Também o primeiro-ministro considerou o encerramento da refinaria da Galp “um contributo muito bem-vindo para o esforço de redução das emissões de CO2”, apontando Matosinhos como “um exemplo na transição climática”, ainda que realçasse o custo de “obrigar centenas de pessoas a mudar de emprego ou a requalificar-se para novas atividades”. Apesar de apressada pelas circunstâncias decorrentes da pandemia, nos últimos meses a Galp tomou iniciativas para minimizar esse impacto – como já o fizera a EDP –, recolocando 160 trabalhadores noutras áreas do grupo e acordando a saída com outros 60, mantendo ainda 100 no processo de desmantelamento de Matosinhos até 2024. Repito, nada disto diminui o drama dos que saem sem rumo ou reconversão. No entanto, tendo em conta que o próprio governo teve de tomar a decisão de prescindir de mais de 3 mil pessoas na TAP no último ano, não é compreensível que António Costa e Matos Fernandes venham agora rasgar as vestes quando o mesmo caminho é seguido por uma empresa privada – onde o Estado mantém uma fatia de 7%, que inclusivamente lhe rendeu dividendos de 23 milhões de euros no ano passado, que deixaram o primeiro-ministro “muito satisfeito” numa altura em que a pandemia já obrigara à suspensão temporária da atividade das refinarias de Sines e de Matosinhos, na sequência das restrições impostas para controlar a covid. Há um ano, o World Economic Forum alertava para a destruição brutal de emprego provocada pela transição

controls. The 3,200 departures in around a year make up part of the emergency management of the airline company, a terrible but necessary evil to guarantee the sustainability of the company through the times of Covid. This does not reduce the scale of the social drama but is justified by the circumstances – as happened with the energy companies, trapped between the pandemic and the direct effects and the acceleration of the new world order towards the decarbonisation of the economy, handed down from Brussels and greeted with enthusiasm by European governments and citizens in general aware of importance of the climate transition to getting a better environment. Factors that also contribute to the sharp drop in the demand for fuels. The greatest driver of the green electrification of the economy, the Minister of the Environment had no doubt about welcoming as good news the end of oil refining in Matosinhos even going on to venture the scope for the unit to be transformed and refine lithium. And, furthermore, he revealed concern over “the fate of workers operating that industrial unit” and, back in December when the closure was announced, Matos Fernandes recalled the role that the European Fund for Fair Transition might play in mitigating the social effects, with 200 million reserved for Portugal under the scope of this mechanism to protect workers from impacts and finance new businesses that enable the transition to decarbonisation. The Prime Minister also deemed the closure of the Galp refinery “a very welcome contribution to this effort to reduce CO2 emissions”, pointing to Matosinhos as “an example of the climate transition” even while highlighting the cost of “forcing hundreds of people to change jobs or requalify for new activities”. Despite the pressures of the circumstances arising from the pandemic, in recent months, Galp has taken initiatives to minimise this impact – as already done by EDP –, relocating 160 workers to other areas in the group and agreeing to the departure of another 60 while still maintaining 100 jobs allocated to the process of dismantling Matosinhos by 2024. I repeat, none of this reduces the drama of those left without direction or opportunity for reconversion. However, taking into account that the government has itself had to decide to dispense with over 3,000 members of staff from TAP in the last year, it is not understandable how António Costa and Matos Fernandes now come along with crocodile tears when the same path is taken by a private company – in which the state retains a 7% stake which paid out dividends totalling 23 million euros last year, which left the prime minister “most satisfied” at a time when the pandemic had already forced the temporary suspension of activities at the Sines and Matosinhos refineries following the movement restrictions imposed in order to stop the spread of Covid. One year ago, the World Economic Forum was warning of the brutal destruction of employment due to the digital transition and the consequent radical 17


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digital e pela consequente disrupção radical dos modelos de negócios e de trabalho – a quarta revolução industrial, como a organização designa a transformação em curso na economia globalizada –, acelerada por uma pandemia que deixou o mundo altamente dependente das ligações virtuais e fortemente empenhado na rapidíssima evolução para modelos ambientalmente sustentáveis. A mesma organização que em 2016 antecipava o desaparecimento de 5 milhões de postos de trabalho, avisando sobre os riscos sociais de não se agir imediatamente na formação, reconversão profissional e transformação da mão-de-obra para as competências do futuro, aponta agora a obliteração potencial de 85 milhões de empregos no mundo, até 2025. A pandemia não só acelerou “a chegada do futuro do trabalho” como precipitou um cenário social marcado por desigualdades brutais, sublinha o WEF, alertando para a urgência de “empresas, governos e trabalhadores unirem esforços para implementar uma nova visão para a força de trabalho global”. É precisamente ao oposto disto que temos assistido, com um Estado gordo, que por princípio penaliza e desconfia dos contribuintes – pessoas ou empresas. Um Estado que prega o que não pratica, que penaliza a iniciativa privada em lugar de a incentivar, que impõe uma suposta igualdade em vez de premiar as boas diferenças, que alimenta a oposição entre empresas e trabalhadores e que mantém preso a subsídios e esmolas grande parte do país. Um Estado que se opõe, com regras, burocracias e impostos, ao Portugal que quer fazer, que quer transformar-se e apanhar de uma vez por todas o comboio europeu. Não fazer já a transição cultural a que obriga a transformação que estamos a viver é votar o país ao fracasso. l 18

disruption to business and working models – the fourth industrial revolution as the organisation designated the transformation ongoing throughout the globalised economy –, accelerated by a pandemic that left the world highly dependent on virtual connections and strongly committed to extremely swift progress towards environmentally sustainable models. In 2016, the same organisation had predicted the disappearance of five million jobs, warning of the social risks of not acting immediately in terms of training, professional requalification and transformation of the labour force with the competences for the future, pointing to the eventual obliteration of 85 million jobs worldwide by 2025. The pandemic did not just accelerate “the arrival of the future in the workplace” but also pre-empted a social scenario characterised by brutal inequalities, highlighted the WEF, warning of the urgency for “companies, government and workers to unite their efforts to implement a new vision for the global workforce”. It is precisely the opposite that we have witnessed, with bloated states, which on principle penalise and mistrust tax payers – individuals or companies. A state that preaches what it does not practice, that penalises private initiative rather than seeking to provide incentives, that imposes a supposed equality rather than rewarding positive differences, that feeds the opposition between companies and workers that are kept trapped by subsidies and handouts across a large part of the country. A state that opposes, through rules, bureaucracies and taxes, the Portugal that it wants to make and, through transformation, to once and for all get on the European train. Not now making the cultural transition that forces the transformation that we are now experiencing is to condemn the country to weakness. l


SPEAK WHO KNOWS

LUÍS FERREIRA LOPES, CO N S U LTO R CO N S U LTA N T

T E M P O D E I N O VA R E R E D E S E N H A R PA R A MELHOR CRESCIMENTO T I M E T O I N N O VAT E A N D R E D E S I G N FOR BETTER GROWTH

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tempo de esperança e de viragem de ciclo, após um duro e longo período de recessão e de uma pandemia em várias vagas que obrigou pessoas e empresas a reinventarem-se, além de ter provocado a morte a perto de cinco milhões de pessoas em todo o mundo e a mais de 18 mil portugueses (dados de meados de outubro). A esperança deste sol de outono de 2021 reside na rápida recuperação económica e social pela qual todos ansiamos, mas vem acompanhada de cautela e de incerteza, em domínios diversos da economia e da saúde. A taxa de vacinação de 85% da população em Portugal para a covid-19 dá-nos hoje maior confiança para este inverno e para o que queremos (re)construir em 2022, se não houver novas variantes, nem comportamentos que voltem a deitar tudo a perder (como se viu no primeiro trimestre deste ano e em junho / julho, quando Portugal até estava a conseguir gerir bem o surto pandémico). Este não é ainda o tempo de baixar a guarda, pois há incertezas quanto ao controlo efetivo da pandemia, quando em África apenas 2% da população foi vacinada, tal como é baixa a vacinação em vários países da Ásia ou da América, por exemplo, o que nos leva à reflexão da (in)equidade da distribuição das vacinas. Por outro lado, em Portugal e vários países europeus, perante novos contágios em população já vacinada de várias idades, é necessário administrar a terceira dose da vacina covid-19 e também da gripe sazonal (para já, aos mais idosos e profissionais de saúde), para que esta retoma da vida das pessoas e das organizações públicas e privadas seja sustentada. Este é o tempo de inovar e redesenhar para conseguirmos taxas de crescimento, competitividade e produtividade bem melhores, perante o risco real da economia portuguesa permanecer nas últimas carruagens do comboio europeu, apesar das previsões otimistas para 2022. Isso pode conseguir-se

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t is time for hope and the turning of a cycle following a hard and long period of recession and a pandemic arriving in various waves that forced people and companies to reinvent themselves in addition to causing the death of almost five million worldwide and over 18,000 Portuguese citizens (data from mid-October). The hope in this sunshine of autumn 2021 resides in the swift economic recovery that we all desire but that comes accompanied by caution and uncertainties across various facets of the economy and public health. The 85% vaccination rate in Portugal against Covid-19 provides us with greater confidence for this winter and for what we wish to (re)build in 2022 should there be neither new variants nor behaviours that once again throw everything away (as seen in the first quarter of this year and in June / July when Portugal was even able to manage the pandemic outbreak well). This is not the time to be lowering any guard as there are uncertainties as regards the effective control of the pandemic when only 2% of the population in Africa has received vaccinations alongside various other countries with low levels in Asia or the Americas for example, which can only lead to reflection on the (in)equality of vaccine distribution. Furthermore, in Portugal and various European countries, given new outbreaks in already vaccinated sections of the population across various age groups, there is the need to administer the third dose of Covid-19 vaccine and alongside that for seasonal flu (for now, only for the more elderly and health professionals), so that this return to the normal life of people and public and private organisations is sustainable. This is thus the time to innovate and redesign to drive significantly better rates of growth, competitiveness and productivity while facing the real risk of the Portuguese economy remaining in one of the latter carriages on the European (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)

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FALA QUEM SABE através de uma aposta clara na Inovação (tecnologia, pessoas, métodos de gestão) aplicada aos projetos desenvolvidos por empresários e empreendedores que apostam em Portugal, seja através da chamada “revolução silenciosa” do ecossistema das start-ups e dos unicórnios de origem lusitana, seja através de maiores estímulos às pequenas e médias empresas, sem esquecer as grandes (à nossa dimensão) com capacidade exportadora e dimensão internacional. Há decerto vida além do orçamento e da “bazuca” europeia – e os investidores estarão atentos, nos próximos anos, ao pacote de verbas que deve ser bem aproveitado para um verdadeiro desenvolvimento do país – mas a esperança não se vende em pacotes de açúcar, nem com truques de ilusionismo, quando os custos de contexto não se desagravam (para usar uma expressão recente, na apresentação do OE 2022) para quem ainda acredita nas oportunidades existentes no mercado português: - energia a valores quase incomportáveis e altamente taxada; - burocracia elevada na administração central e local; - justiça lenta que agrava a imprevisibilidade do investimento; - fiscalidade pouco “amiga” das empresas e da classe média e média alta que continua a suportar a grande parte da despesa do Estado, apesar de algum alívio anunciado recentemente, em nome da justiça social, para os escalões da classe média baixa ou para quem consegue sobreviver com pouco mais de 1000 euros por mês. Arrisco afirmar que os empreendedores e empresários que tentam criar riqueza, investimento e emprego qualificado em Portugal são autênticos heróis perante tantos obstáculos. Apesar de fragilidades várias, o tecido empresarial português tem demonstrado uma notável resiliência, como ficou provado no período pré-pandemia e durante este último ano e meio, sempre “a remar contra a maré”. Isso mesmo ficou provado nas duas últimas décadas – de estagnação, recessões e crescimentos fracos, exceto os registados em 2019 e 2007 –, como temos acompanhado e assinalado, seja enquanto editor de Economia da SIC / SIC Notícias e autor do programa / livros “Sucesso.pt” (2001/16), seja enquanto assessor para Empresas e Inovação do Presidente da República, para todos os setores da economia, nos últimos cinco anos - missão desafiante desempenhada entre as primaveras de 2016/21, com entrega total. Seja qual for o chapéu cívico, a conclusão é a mesma: o país, e não apenas o Estado, deveria premiar mais a meritocracia e quem ousa avançar com projetos inovadores, com estratégia e visão. Este é o tempo de visão sistémica dos setores empresariais e das áreas do saber em geral, se queremos atingir o objetivo de forte crescimento e de transformações em diversas frentes como o digital, a energia ou o trabalho. Como sublinhei no livro “Esperança e Reinvenção” (no final da primavera de 2020, em co-autoria com empresários, gestores e académicos), e usando a imagem da Alegoria da Caverna da “República” de Platão, “este é o tempo para ter a mente aberta para sair da caverna; isto é, para investigar, saber mais, inovar e promover a “ideia do bem”, sendo mais exigentes connosco próprios e com os que nos rodeiam (…). Empiricamente, sabemos que só encontramos soluções e inovamos perante uma necessidade. E a questão, 20

train despite the optimistic forecasts for 2022. This may be achieved through clearly investing in Innovation (technology, people, management methods) applied to projects developed by owners and entrepreneurs who invest in Portugal whether through that termed the “silent revolution” of the ecosystem of start-ups and unicorns of national origin or through greater stimuli for small and medium sized companies without overlooking the large (at least on our dimension) businesses with export capacities and international scales. There is certainly life beyond the budget and the European “bazooka” – and investors shall be attentive in forthcoming years to the funding package that should be leveraged for effective national development – but you don’t sell hope in packs of sugar, not even with the trickery of illusionism, when the context costs are not lowered (to adopt a recent expression from the 2022 state budget presentation) for those who still believe in the opportunities existing in the Portuguese market: - energy at almost intolerable prices and still highly taxed; - high levels of central and local government bureaucracy; - slow program in the justice system that worsens the unpredictability for investment; - fiscal system “unfriendly” to companies and the middle and upper middle classes that continue to incur a major proportion of the state’s expenditure despite some relief recently announced in the name of social justice for the scales in effect for the lower middles classes or whoever can survive on a little over 1,000 euros per month. I would risk affirming that the entrepreneurs and business owners that try and create wealth, investment and qualified employment in Portugal are the true heroes for facing such obstacles. Despite the various weaknesses, the Portuguese business sector has demonstrated, a notable level of resilience was indeed proven in the pre-pandemic period and during this last eighteen months of always “rowing against the tide”. This has been proven over the last two decades – of stagnation, recession and weak growth with the exception of 2019 and 2007 –, as we have accompanied and highlighted whether as editor of the Economia program on the SIC / SIC Notícias television channels or as author of the program / books “Sucesso.pt” (2001/16) and also as the corporate and innovation adviser to the President of the Republic for all sectors of the economy over these last five years – a challenging mission performed between the springs of 2016/21 with total dedication. Whatever the civic role, the conclusion remains the same: the country, and not only the state, should reward meritocracy more; those who dare to advance with innovative projects with strategy and vision. This is a time for a systemic vision of the business sectors and areas of knowledge in general should we wish to obtain the objectives of strong growth and transformation across various fronts, such as the digital, energy or labour. As I highlighted in the book “Esperança e Reinvenção” (published in the late Spring of 2020, co-authored with business owners, managers and academics) and deploying the Allegory of the Cave from Plato’s Republic, “this is the time for having an open mind to leave the cave behind; that is, to investigate, learn more, innovate and promote the “idea of wellbeing”, being more


SPEAK WHO KNOWS quase sempre, é a de saber se essa inovação é incremental, gradual, reformista, ou se é disruptiva e causadora de profundas transformações. Será o momento para redesenhar modelos que temos como certos e pensar e agir de forma diferente?” Neste início da terceira década do século XXI, nós, os que sobrevivemos à pandemia covid-19, bem podemos valorizar mais o dom da Vida e tentarmos entender melhor a chamada economia comportamental – ou o comportamento dos agentes económicos na gestão de crises –, como já alguns tinham percebido na crise financeira de 2008/09 que alastrou até 2014 em Portugal, após o país ter estado à beira da bancarrota em abril de 2011, ter obtido apoio externo da chamada “troika” e ter regressado aos mercados três anos depois do pedido de auxílio do FMI / BCE / Comissão Europeia… um tempo que parece longínquo, mas que convirá ter na memória. Este é o tempo de compreendermos a utilidade e relevância de uma visão sistémica com coragem para inovar, da interligação de ciências e saberes, da interdependência das pessoas e dos países, da solidariedade e da bondade, do espírito humanista que une (e não divide) pessoas de todas as idades, condições sociais e financeiras e todos os credos, como muitos de nós percebemos ao longo da pandemia. Quem entender que esta é (ou foi) apenas uma crise de saúde pública e económica – que criou desemprego, novos pobres e uma fatura financeira elevada para Portugal e vários Estados da Europa e do mundo – terá, provavelmente, uma visão redutora destes estranhos anos de 2020 e 2021. Não sabemos ainda se a crise e a retoma serão em V, U ou W, mas sabemos que os próximos tempos exigem mudança de ‘mindset’ e pensamento estratégico. Várias organizações e pessoas já começaram a pegar no lápis e redesenhar ou reinventar modelos de negócio e de trabalho nas empresas e no Estado, na escola ou no planeamento das cidades. E é tempo de fazer perguntas: - Será que percebemos, com a pandemia, que assegurar reservas de alimentos e água e o bom funcionamento de energia, comunicações, tecnologia é uma questão de segurança e soberania nacionais? - Que lições podemos aprender com os profissionais de saúde, em atitude de abnegado combate na linha da frente, sabendo que os problemas estruturais na saúde já vinham de trás, com sucessivas cativações ou recurso a alguns remédios que apenas aliviam a dor? - Que exemplos de inspiração militar foram replicados por trabalhadores, gestores, empresários de todos os sectores da economia, nas fábricas ou nos campos, nos escritórios ou em teletrabalho, antes mesmo e durante a gestão militar da vacinação pública em 2021? Em síntese, se tentássemos elencar algumas lições da pandemia, apontaria algumas variáveis-chave para a sobrevivência enquanto comunidade nacional e retorno da sociedade à “normalidade” – que parecem óbvias, em teoria, mas não são fáceis de aplicar na prática: - alinhamento da liderança e da equipa; - proatividade com espírito de missão e de serviço; - saber planear e contar sempre com planos de contingência (b, c, d, e, f…);

demanding both of ourselves and of those surrounding us (…). Empirically, we know that we only encounter solutions and innovate when faced by need. And the question is almost always ascertaining whether this innovation is incremental, gradual and reformist or if this is disruptive and causing deep transformations. Is this the time to redesign models that we have hitherto taken as certain and thinking and acting differently?” At the beginning of the third decades of the 21st century, we, those who have survived the Covid-19 pandemic, should be well able to value the gift of Life and attempt to better understand that termed the behavioural economy – or the behaviour of economic actors in managing crises –, as some already perceived in the financial crisis of 2008/09 which dragged on until 2014 in Portugal after the country stood on the verge of bankruptcy in April 2011 and required external support from what as known as the “troika” and have returned to the markets three years after seeking assistance from the IMF, the ECB, and the European Commission… a period that already seems far distant but that deserves retaining in the memory. This is the time for grasping the utility and relevance of a systemic vision with the courage to innovate, the interconnections of sciences and knowhow, the interdependence of people and countries, solidarity and charity, the humanist spirit that unites (and does not divide) people of all ages, social and financial conditions and all beliefs as many of us grasped over the course of the pandemic. Whoever understands this is (or was) only a public health and economic crisis – which generated unemployment, newly impoverished people and a high financial bill for Portugal and various European countries and the world – is probably taking a reductive view of these strange years of 2020 and 2021. We do not yet know whether the recession and recovery will be a V, U or W but we do know that the forthcoming times demand a change in mindset and strategic thinking. Various organisations and persons have already picked up their pencils to redraw and reinvent the business and working models of their companies and states, in schools and in the planning of cities. And this is the time to ask questions: - Will we understand with this pandemic that ensuring stocks of foodstuffs and water and the smooth functioning of energy, telecommunications and technology is a matter of national security and sovereignty? - What lessons will be able to learn from the health professionals and their attitude of selfless combat on the frontline, knowing that the structural problems in healthcare are already longstanding with budget injections and recourse to some remedial measures only serving to relieve some of the pain? - What examples of military inspiration were replicated by employees, managers and entrepreneurs across every sector of the economy, in the factories and the fields, in the offices or in homeworking, both before and during, the military management of the public vaccination campaign in 2021? In summary, should we attempt to elicit some lessons from the pandemic, we would point to some key variables for our survival as a national community and the return of society to “normality” – which seem obvious in theory but are anything but easy to apply in practice: 21


FALA QUEM SABE - testar e nunca facilitar ou descurar riscos (exemplos: saúde, proteção civil, conflitos sociais ou laborais, em momentos de elevado ‘stress’); - agir rapidamente e comunicar com eficácia e transparência em todas as situações de gestão de crise (o que nem sempre aconteceu); - regressar à linha da frente (mesmo após ter sido ferido em combate) e não deixar ninguém para trás; - ter noção do impacto das decisões (certas ou erradas) e do adiamento ou não-decisão na hora h; - fomentar solidariedade e cooperação a nível social e político-institucional. No texto que escrevi para o livro acima referido, em 2020, coloquei várias questões que, creio, permanecem atuais porque “este é o tempo também para perguntar e imaginar o que poderá mudar”. - Manteremos a tendência do teletrabalho, nas empresas e na administração pública? - Se sim, que implicações haverá no sector imobiliário de uso para escritórios ou na (menor) necessidade de viagens de negócio e nos voos comerciais, mesmo que apreciemos o regresso ao contacto presencial? - Haverá, realmente, maior investimento e melhor gestão dos recursos na saúde e na educação? - Voltaremos ao ‘stress’ das filas de trânsito (já está a acontecer desde setembro…) ou percebemos que temos de melhorar os meios de transporte público, as ciclovias e ecovias? - Aproveitaremos para acelerar, de facto, a transformação digital e transição energética, reduzindo a poluição, cuidando mais da natureza e gerindo melhor os recursos dos oceanos ou ficaremos pelos discursos politicamente corretos da sustentabilidade? - Teremos capacidade para questionar, de forma construtiva e cívica, sem demagogia e populismos fáceis, como construir um país bem melhor e um mundo mais justo, com maior regulação e verdadeira interdependência económica e geopolítica – o que é diferente da globalização do capitalismo selvagem? - Passada a pandemia, continuará o espírito de solidariedade (a que assistimos na primeira vaga em 2020 e depois no início de 2021) e a valorização do que é realmente essencial, quando se trata de sobreviver e de dar, sem esperar receber, independentemente das nossas crenças religiosas ou espirituais? - Voltaremos a práticas egoístas e hedonistas ou teremos maior disponibilidade para ouvir, saber escutar, olhar e ajudar o Outro e valorizar as diferenças, procurando entendimentos e construir pontes de diálogo entre pessoas, culturas e civilizações, como os portugueses têm sabido fazer ao longo de séculos? Os diagnósticos estão feitos e é tempo de concretizar. Sabemos o que precisamos de melhorar: - melhores práticas de Gestão e Liderança; - subida na cadeia de valor dos produtos exportados ‘made in’ Portugal; - mais adequada formação dos quadros técnicos e superiores; 22

- alignment between the leadership and the team; - proactivity with a spirit of mission and service; - knowing how to plan and always counting on contingency plans (b, c, d, e, f…); - testing and never facilitating or overlooking risks (examples: health, civil protection, social or labour conflicts, in periods of high stress); - acting rapidly and communicating efficiently and transparently in all crisis management situations (which has not always happened); - returning to the frontline (even after having been wounded in combat) and not leaving anybody behind; - seeking to ascertain the impacts of decisions (right or wrong) and delaying or not deciding at the key time; - fostering solidarity and cooperation at the social and political-institutional levels. In the text I wrote for the aforementioned book in 2020, I raised various questions that I believe remain actual because “this is also the time to question and imagine what might be changing”. - Will we maintain the recourse to homeworking in companies and public administration structures? - If so, what implications will this have on the property sector for usage as offices and on the (lesser) need for business travel and commercial flights even while appreciating the return of in-person contacts? - Will there really be greater investment and better management of resources in health and education? - Will we head back into the stress of traffic jams (now already happening since September…) or will we understand we have to improve the means of public transport, the cycleways and green roots? - Will we take advantage to truly accelerate the digital transformation and the energy transition, reducing the pollution, taking more care of nature and better managing the resources of our seas and oceans or do we stop at the politically correct discourses on sustainability? - Will we have the capacity to question, in a constructive and civic fashion, with demagogy and easy populisms, how to build a better country in a fairer world, with greater regulation and true economic and geopolitical interdependence – which differs sharply from the globalisation of untamed capitalism? - With the pandemic over, will we continue with the spirit of solidarity (that we witnessed in the first wave of 2020 and later in early 2021) and value that which is really essential when dealing with our survival and giving without the expectation of receiving, irrespective of our religious or spiritual beliefs? - Will we return to egoistic and hedonistic practices or will we gain a greater willingness to listen, to understand, to look and help the Other, cherishing the differences, seeking shared ground and building bridges of dialogue among persons, cultures and civilisations as the Portuguese have known how to do over the course of centuries? The diagnosis is done and it is time to be precise. We know what we need to improve: - better Management and Leadership practices; - raising exports, ‘made in’ Portugal, up the chain of value; - more appropriate training for technical, middle and senior management; - attracting more foreign investment to Portugal; - working better in marketing (and post-sales


SPEAK WHO KNOWS - captar mais investimento estrangeiro para Portugal; - trabalhar melhor o marketing (e serviço pós-venda) e a reputação dos nossos produtos e das marcas, inclusive da marca-País; - desenvolver ou semear mais centros de reflexão (think tanks) e de produção de saber interdisciplinar sobre Inovação aplicada, competitividade e produtividade. Os primeiros anos desta década não devem ser desperdiçados, nem na gestão dos recursos financeiros e humanos, nem nas táticas de curto prazo dos vários poderes. Este é o momento para apontar caminhos de estratégias ambiciosas e exequíveis, de preferência conciliadoras no espectro político e social, sob pena de Portugal ser das economias que mais sofrerá na Europa quando o ciclo económico se inverter ou eclodir alguma nova crise financeira como a de 2008/9 - que rebentou em Portugal em 2011. Após o momento duro e difícil, mas igualmente desafiante, que atravessámos, não precisaríamos de uma crise com a dimensão pandémica para descobrirmos o que é realmente importante na nossa vida enquanto “nobre povo” de uma “Nação valente”, una e europeia, nascida em 1143. Esse é, aliás, um ativo de identidade que devemos valorizar mais e bem poderíamos começar a planear que país queremos ser em 2043, quando Portugal celebrar nove séculos como nação. E volto ao livro: “O país de Eduardo Lourenço, Fernando Pessoa, Eugénio de Andrade ou Amália Rodrigues já enfrentou tanta crise, peste, invasão, perda de soberania, bancarrota, inveja, pobreza, risco da aventura, descoberta de glória vã e sabe (pelo som das ondas do mar ou dos gemidos de uma guitarra) o que é choro, bravura, luto, alegria, resiliência e coragem. Este é, pois, um tempo de Esperança e de Reinvenção”. Este é também o tempo de coragem política para elevar a fasquia e de foco na Política, no sentido nobre da sua raiz: Polis, ao serviço da Comunidade e dos Cidadãos. Há muito que é urgente avançar com reformas em vários domínios do Estado e do funcionamento de diversas entidades públicas. É necessário inovar, com estabilidade política e económica, sem esquecer competitividade fiscal para atrair e reter investidores. Não é tempo para “balde dos caranguejos” que puxam para baixo quem tem sucesso, nem para a inveja e a mesquinhez das capelinhas que só atrasam ou anulam tantos negócios na Lusitânia. Como estamos a assistir desde o verão, com o abrandamento da pandemia, é nestes momentos que se tomam decisões de investimento e fazem bons negócios, em vez de adiar ou esperar para ver. Portugal é, apesar de problemas acima referidos, um mercado atrativo para investir porque, num mundo e numa Europa em mudança, é um País com inúmeras vantagens para viver e trabalhar e para criar negócios. Neste país há vários campeões nacionais, ibéricos, europeus e até mundiais, em vários sectores, segmentos e nichos onde a diferenciação e a subida na cadeia de valor foram e são decisivas na sobrevivência e no crescimento resiliente. Este é o tempo de um novo paradigma (há empresas que já perceberam rapidamente) e doses elevadas de autoestima têm de fazer parte da receita de sucesso internacional dos empresários e dos trabalhadores portugueses, para quem, desde o século XV, não há impossíveis. l

services) and the reputation of our products and brands, including the country-brand; - developing or seeking more centres for reflection (think tanks) and producing interdisciplinary knowledge on applied Innovation, competitiveness and productivity. The early years of this decade should in no way be wasted neither in terms of financial and human resource management nor in the short term tactics of various powers. This is the time for setting out ambitious but feasible paths forwards, preferably conciliating the political and social spectrum on the pain of Portugal becoming one of the economies that most suffered in Europe when this economic cycle inverts or implodes in a new financial crisis such as that of 2008/9 – and which hit Portugal in 2011. Following the hard and difficult, but also challenging, period that we have been through, we did not really need a crisis to discover what is really important in our lives as the “noble people” of a “valiant Nation”, united and European, born in 1143. Indeed, this represents an identity asset that we should value more and we might very well begin planning for the country we wish to be in 2043 when Portugal commemorates nine centuries as a nation. And I return to the book: “The country of Eduardo Lourenço, Fernando Pessoa, Eugénio de Andrade and Amália Rodrigues has already faced so many crises, plagues, invasions, losses of sovereignty, bankruptcies, jealousy, poverty, the risks of adventure, and discoveries of vain glory and wisdom (by the sound of the waves at sea or by the chords of a guitar) of what is lamenting, bravery, struggle, happiness, resilience and courage. This is thus a time for Hope and Reinvention”. This is also the time for political courage to raise the barrier and focus on politics in the noble sense of its origins: Polis, in the service of the community and citizens. There is much that needs advancing with reforms to the various domains of state and functioning of the different public entities. There is a need to innovate, with political and economic stability, without overlooking the fiscal competitiveness to attract and retain investors. This is not the time for “fighting like cats in a bag” and dragging down anybody who attains success nor for the jealousy and petty mindedness of the factions that only delay or annul so many Lusitanian businesses. As we have been witnessing since summer with the downturn in the pandemic, these are the times for taking investment decisions and doing good business instead of delaying and waiting to see. Portugal is, despite the aforementioned problems, an attractive market for investment because, in a world and a Europe undergoing change, this is a country with countless advantages for living and working in and for launching businesses. In this country, there are various national, Iberian, European and even world champions in many different sectors, segments and niches – where differentiation and rising up the value chain were and are decisive to survival and resilient growth. This is the time for a new paradigm (there are companies who have already swiftly perceived this) and high doses of self-esteem have to make up part of the recipe for the international success of Portuguese businesses, their owners and workers for whom, ever since the 15th century, there have been no impossibles. l 23


POLÍTICA NACIONAL

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W ANA ABRUNHOSA, MINISTRA DA COESÃO TERRITORIAL ANA ABRUNHOSA, MINISTER OF TERRITORIAL

FOTOS: FERNANDO PIÇARRA

COHESION

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N AT I O N A L

POLITICS

“GOSTO DE ME CONSIDERAR A EMBAIXADORA DO TERRITÓRIO NO CONSELHO DE MINISTROS” “I LIKE TO CONSIDER MY ROLE AS THE AMBASSADOR OF THE TERRITORY TO THE COUNCIL OF MINISTERS”

RICARDO DAVID LOPES

E M 2 0 1 9 P R O M E T E U S E R , N O G O V E R N O , “ E M B A I X A D O R A” D A C A U S A D A R E D U Ç Ã O D O S P R E Ç O S D A S P O R TA G E N S N O I N T E R I O R . E F O I B E M - S U C E D I D A . “ E S TA F O I A M I N H A M I S S Ã O I M P O S S Í V E L” , D I Z A N A A B R U N H O S A , D E S TA C A N D O A I M P O R TÂ N C I A D A R E D U Ç Ã O D O S CUSTOS DE CONTE XTO NOS TERRITÓRIOS D O INTERIOR. O MINISTÉRIO DA COESÃO T E R R I T O R I A L , D I Z , L E V O U E S TA S R E G I Õ E S PA R A D E N T R O D O C O N S E L H O D E M I N I S T R O S , C R I A N D O S I N E R G I A S E N T R E S E C T O R E S G O V E R N AT I V O S Q U E , D E O U T R O M O D O , N Ã O H AV E R I A , PA R A P R E J U Í Z O D A S P O P U L A Ç Õ E S Q U E , P O R O P Ç Ã O O U N E C E S S I D A D E , V I V E M FORA DOS GRANDES CENTROS URBANOS. I N 2 0 1 9 , S H E P R O M I S E D T O B E T H E “A M B A S S A D O R ” T O T H E G O V E R N M E N T F O R T H E C AU S E O F R E D U C I N G T H E R OA D TO L L S I N I N L A N D R E G I O N S . A N D S H E WA S S U C C E S S F U L . “ T H AT W A S M Y M I S S I O N I M P O S S I B L E ” , A N A A B R U N H O S A D E C L A R E D , H I G H L I G H T I N G T H E I M P O R TA N C E O F R E D U C I N G T H E C O S T S W I T H I N T H O S E R E G I O N S . T H E M I N I S T E R O F TERRITORIAL COHESION TOOK THOSE REGIONS INTO THE INTERIOR OF THE COUNCIL OF M I N I S T E R S , E S TA B L I S H I N G S Y N E R G I E S A M O N G G O V E R N M E N T S E C T O R S T H AT W O U L D N O T O T H E R W I S E H AV E E X I S T E D F O R T H E P O P U L AT I O N S W H O , T H R O U G H O P T I O N O R N E E D , L I V E OUTSIDE THE MAJOR URBAN CENTRES.

Este é um Ministério novo. É difícil lançar uma nova área governativa? É desafiante criar um Ministério que nunca existiu, mas que veio preencher uma necessidade.

This is a new Ministry. Has it been difficult to launch a new area of governance? It’s challenging to set up a Ministry that never before existed but that serves to meet a need.

Qual foi o racional da criação do Ministério da Coesão Territorial? Nos governos, cada Ministério sectorial olha para o território do seu ponto de vista, mas há que fazê-lo de forma integrada. O nosso objectivo é dar esse caracter integrador à intervenção no território e permitir que, nele, os vários níveis de administração também se integrem entre si. Temos câmaras, comunidades intermunicipais, e

What was the rationale behind setting up the Ministry of Territorial Cohesion? In governments, each sectorial Ministry perceives the territory from its own point of view but there is a need to do this in an integrated approach. Our objective is to provide an integrational dimension to interventions in the territory and ensure that the various different levels of administration are mutually integrated. We have councils, inter-municipal 25


POLÍTICA NACIONAL nós [Ministério da Coesão Territorial] tutelamos as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, as CCDR. A Senhora ministra aliás, dirigiu uma, a do Centro… Sim, as CCDR têm competências no ambiente, desenvolvimento regional, planeamento. Já têm, por si, a missão de coordenar a actuação da saúde ou da educação na sua região, e os seus vários actores. A criação deste Ministério acabou por trazer o território para o Conselho de Ministros, onde eu, como ministra, não represento um sector, mas um território. E temos os fundos comunitários ao serviço do Ministério. Deixe-me dar-lhe um exemplo: imagine que queremos resolver um problema de insucesso escolar num dado local… É um problema do Ministério da Educação... Não é só, é um problema da comunidade. Quando queremos actuar sobre o insucesso escolar, temos de intervir nas escolas e na comunidade escolar, envolvendo não apenas o Ministério da Educação, mas os municípios, as comunidades intermunicipais, e nós, através das CCDR, temos os fundos comunitários como “cenoura” e incentivo para que todos trabalhem em conjunto. Conseguimos congregar os vários sectores do Governo na resolução dos problemas, assim como os vários actores da região. Esta orgânica permite maximizar o recurso a fundos comunitários? Sim, e é esse o objectivo: que este Ministério, não sendo sectorial, apoie a educação, o ensino superior, empresas e associações empresariais, etc. Se, quando estivermos a aplicar os fundos a uma região, não tivermos uma visão integrada dos problemas e do caminho que queremos fazer, como poderemos tornar essa região mais competitiva? Apoiando as empresas também… Não basta. Temos de ter trabalhadores qualificados, as instituições de ensino superior têm de trabalhar com as

communities and ourselves [the Ministry of Territorial Cohesion] who oversee the CCDR – the Regional Coordination and Development Commissions. Indeed, the minister was formerly in charge of one commission, for the Centro region… Yes, the CCDRs hold competences for the environment, regional development, planning. In themselves, they already have the mission to coordinate activities ongoing in healthcare and education in their region and all the various actors. Setting up this ministry ended up bringing the territory into the Council of Ministers where I, as a minister, do not represent a sector but rather the territory. And we have the community funds to apply in service of the ministry. Let me give you an example: imagine that we want to resolve a problem involving poor school results in a given place… That is a problem for the Ministry of Education... Not exclusively. This is a community problem. When we want to act against education failures, we have to intervene in schools and the school communities and involving not only the Ministry of Education but also the municipalities, the inter-municipal communities and we, through the CCDRs, have the community funds as a “carrot” and incentive so that everybody works together. We are able to bring together the various sectors of government for the resolution of problems alongside the various actors in the region. Does this organic structure enable the maximisation of community funds? Yes and that is the objective: that this Ministry, not sectorial in approach, supports education, higher education, companies and business associations, etc. If, when we are applying funds to a region, we don’t have an integrated vision of problems and the path that we want to take, how are we going to make this region more competitive?

NOS GOVERNOS, CADA MINISTÉRIO SECTORIAL OLHA PA R A O T E R R I TÓ R I O D O S E U P O N T O D E V I S TA , M A S H Á Q U E FA Z Ê - LO D E F O R M A INTEGRADA. IN G OVERNMENTS, EACH SECTORIAL MINISTRY PERCEIVES THE TERRITORY FROM ITS OWN POINT OF VIEW BUT THERE IS A NEED TO D O T H I S I N A N I N T E G R AT E D APPROACH. 26


N AT I O N A L empresas, temos de envolver os municípios. Quando falamos de estimular a competitividade de um território, falamos de universidades, politécnicos, associações de empresas, micro, pequenas, médias e grandes empresas, municípios, é uma estratégia de eficiência colectiva. Se as verbas fossem geridas pelos ministérios, cada um teria a sua visão do problema e não uma visão sistémica, como tem uma CCDR. Ganha-se eficiência? Sim, este modelo permite atingir objectivos de forma muito mais eficiente, congregando esforços no Governo e localmente. Podemos, assim, tratar diferente o que é diferente. Podemos ter uma política nacional, mas quando a aplicamos territorialmente, temos em conta as características e os actores da região. Trabalhamos em proximidade com o território – gosto de me considerar a embaixadora do território no Conselho de Ministros. O papel das CCDR é central… Sim. Os presidentes e um dos vice-presidentes já foram eleitos, agora é ir integrando nas CCDR a representação que cada ministério tem nas regiões, para que este trabalho de olhar o território como um todo possa ser mais bem conseguido, até chegarmos à regionalização, ainda que não nesta legislatura. Há experiências na UE de ministérios similares? Em Espanha, por exemplo, há o Ministério da Transição Ecológica e do Desafio Demográfico, com quem aliás reunimos e traçámos a primeira estratégia comum de desenvolvimento transfronteiriço. Já há um programa de acção, com projectos concretos, caso da IC-31, na Beira Baixa, a Ponte de Nisa, a Ponte de Alcoutim, que são instrumentais para uma estratégia de desenvolvimento conjunto. Como se define coesão territorial? Temos de garantir que, quando o país cresce, todos os portugueses beneficiam desse crescimento, independentemente do local onde estejam. As dimensões da coesão territorial são aquelas que afectam a qualidade de vida das pessoas – a habitação, por exemplo, é muito importante, quer no interior, quer nas próprias áreas metropolitanas. Também é fundamental a questão da acessibilidade, igualmente olhada de forma diferente em regiões diferentes. Os problemas do interior não são os do litoral, logo, as soluções devem ser diferentes. Outra dimensão importante é que as pessoas tenham trabalho digno e serviços públicos de qualidade. E como se obtém esse trabalho? O trabalho digno implica que os territórios do interior não fiquem abandonados de actividade económica. Tem dados que confirmem uma tendência de abertura ou transferência de empresas para o interior? Sim. Uma das primeiras coisas que fizemos foi, com os fundos comunitários, criar uma medida de apoio ao investimento no interior, quer das empresas que já lá estavam, para expansão de actividade, quer para atrair novas. Em regra, por cada 100 euros, 30 são a fundo perdido, para apoio ao investimento, desde que

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Also supporting companies… That’s not enough. We have to have qualified workers, higher education institutions have to work with companies, we have to involve the municipalities. When we talk about stimulating the competitiveness of a territory, we are referring to universities, polytechnics, business associations, micro, small, medium and large companies, and municipalities in a strategy of collective efficiency. If the financing is managed by the ministries, each will apply its own vision of the problems and not a systemic vision as the CCDR deploys. Are there gains in efficiency? Yes, this model means objectives can be achieved with far greater efficiency, congregating the efforts of government nationally and locally. We may then deal differently with situations that are different. We may have a national policy but when we apply this territorially, we have to take into account the characteristics and actors in the respective region. We work in close proximity with the territory – I like to consider myself the ambassador for the territory to the Council of Ministers. So, the role of the CCDRs is central… Yes, the presidents and vice-presidents have already been elected, now it is about integrating into the CCDRs the representatives that each ministry has in the regions so that they may look towards that territory as a whole and therefore be more successful through to arriving at regionalisation even if not in this parliamentary session. Are there EU experiences with similar ministries? In Spain, for example, there is a Ministry of Ecological Transition and Demographic Challenge, with which we have met and set out the first common strategy for cross-border development. There is now already an action program, with concrete projects as in the case of the IC-31, in Beira Baixa, the Nisa Bridge, the Alcoutim Bridge, which are instrumental to any joint development strategy. There is another example, the cross-border worker… How do you define territorial cohesion? We have to guarantee that when the country grows, all the Portuguese benefit from this progress irrespective of whatever location they are in. The dimensions of territorial cohesion are those that affect that quality of life of people – housing, for example, is extremely important both in inland regions and the metropolitan areas. Issues around access are also fundamental also perceived in different ways in different regions. The problems of inland regions are not the same as those on the coast so the solutions need to be different. Another important dimension is ensuring people have decent jobs and quality public services. And how to get those jobs? Decent work implies inland territories not getting left behind in economic activities. Do you have any statistics confirming any trend towards openness or the actual transfer of companies to inland regions? Yes. One of the first things that we did was to, with community funding, set up a support measure for investment in the interior 27


POLÍTICA NACIONAL

CONSEGUIMOS CONGREGAR O S VÁ R I O S S E C T O R E S D O G OVERNO NA RESOLUÇ ÃO D OS PROBLEMAS, ASSIM COMO OS VÁ R I O S AC T O R E S D A R E G I ÃO . WE ARE ABLE TO BRING T O G E T H E R T H E VA R I O U S SECTORS OF GOVERNMENT FOR THE RESOLUTION OF PROBLEMS A LO N G S I D E T H E VA R I O U S ACTORS IN THE REGION.

seja inovador, e simultaneamente apoiamos as empresas na contratação de pessoas qualificadas. Houve muita adesão? Sim, e também houve apoios para as pessoas que criaram o seu próprio negócio. A quem vivia no litoral e se deslocou para o interior, atribuímos um subsídio à família que poderia ir até 4800 euros, para despesas de mobilidade. Há hoje mais instituições de ensino superior no interior? Em dois a três, anos duplicámos esses números, sobretudo por via dos politécnicos, que abrem polos e criam cursos em parceria com as empresas. O papel das instituições de ensino superior é fulcral, atraem jovens e promovem actividade inovadora em seu redor. Neste caso, trabalhámos com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. No lançamento de medidas de apoio ao investimento, com a Economia, no apoio à contratação de pessoas, com a Segurança Social. Como se mede a coesão? Infelizmente, não temos um indicador consensual na Europa que o faça. Estamos a tentar trabalhar com algumas universidades para elaborar uma proposta de índice de coesão territorial. Temos de ser proactivos e fazer esta proposta a Bruxelas. Gostaria muito que, no final desta legislatura, já tivéssemos este indicador compósito. A pandemia evidenciou problemas de coesão no nosso território? A pandemia veio mostrar aos portugueses o valor do interior, a segurança, a qualidade de vida. Para muitos, foi um refúgio, outros descobriram-no por causa da pandemia, e a procura de casas disparou. Esperemos que isto ajude a conter a perda de população no interior. A pandemia veio também evidenciar terríveis problemas dos centros urbanos na habitação e na falta de espaços públicos. Temos de aproveitar esta janela, em que as pessoas estão disponíveis para mudar de vida, para continuar 28

both for companies that were already there to enable them to expand their activities as well as to attract new companies. As a rule, for each 100 euros, 30 are a non-repayable grant to support investment whenever this is innovative and we are simultaneously providing support for companies recruiting qualified staff. Has there been much take-up? Yes, and there has also been support for people setting up their own businesses. For those living on the coast and relocating to the inland regions, we attributed a family subsidy that may rise to 4,800 euros for mobility related costs. Are there now more higher education institutions in these regions? In two to three years, we have doubled these numbers, primarily through polytechnics that open poles and set up programs in partnership with companies. The role of higher education institutions is crucial as they attract young people and foster innovation activities in their surroundings. In this case, we work with the Ministry of Science, Technology and Higher Education. In launching the investment support measures, with the Economy Ministry and for supporting recruitment with Social Security. How do you measure cohesion? Unfortunately, we do not have a consensual indicator that does this at the European level. We are trying, working with some universities, to draft a proposal for a territorial cohesion index. We have to be proactive and make this proposal to Brussels. I would very like to, by the end of this parliamentary session, to already have this composite indicator implemented. Did the pandemic reveal problems with cohesion in our territory? The pandemic served to show to the Portuguese the value of the interior, the security, the quality of life. For many, these regions were a refuge, others discovered them due to the pandemic and the demand for housing has boomed. We hope that this will help


N AT I O N A L a criar os incentivos. Para certas actividades económicas, estar numa cidade pode ser vantajoso, mas, para muitas outras, não, pelo contrário. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) vai acelerar o processo da coesão? É o termo certo, acelerar transformações. Como? As áreas prioritárias estão definidas – saúde, educação, social. Mais de metade dos projectos já foi contratualizada e temos até 2023 para contratualizar os restantes. A execução será muito descentralizada, ao nível das CCDR, municípios, entidades no território. Temos de ter tudo executado até 2026, mas o PRR não substitui o quadro comunitário de apoio. Há áreas ou medidas que esse quadro não pode apoiar? Por exemplo, temos tido muita dificuldade em apoiar ligações transfronteiriças, rodovias, e são projectos que, à partida, não seriam financiáveis. Na habitação, vamos usar uma parte do PRR, e o que não conseguirmos por via dele, pode ter solução via “Portugal 2030”. O que é o PRR traz para a habitação? Funciona assim: um município traça uma estratégia local de habitação e identifica as habitações que não têm condições de dignidade. Vê também terrenos onde possa ser construída habitação para jovens quadros das empresas que não têm dinheiro suficiente para pagar uma habitação a preço de mercado, mas que conseguem suportar uma renda acessível. Depois o município contratualiza com o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) e beneficia de financiamento para reabilitação, construção de habitação nova. Mas também há apoios para equipamentos sociais, ou para a compra de viaturas novas, eléctricas por exemplo.

POLITICS

contain the loss of population from the interior. The pandemic also served to reveal terrible problems in the housing in urban centres and the lack of public spaces. We have to take advantage of this window when people are willing to change their lives and continue to create incentives. For certain economic activities, being in a city is highly advantageous, but for others, not so much and where not completely on the contrary. Will the PRR – the Recovery and Resilience Plan accelerate the cohesion process? That’s the correct expression; accelerate transformation. How? The priority areas are defined – health, education, social. Over half of the projects have already been contracted and we have until 2023 to procure the remainder. Implementation is going to be extremely decentralised at the level of the CCDRs, municipalities and entities in the terrain. We have to have everything implemented by 2026 but the PRR does not replace the community support framework. Are there areas or measures that this framework cannot support? For example, we have had great difficulties in supporting crossborder connections, highways, and these are projects that, from the outset, are not eligible for financing. In housing, we are going to apply one part of the PRR and what we ae not able to get from this source may find a solution via the “Portugal 2030” program. What does PRR bring to housing? It works like this: a municipality sets out a local housing strategy and identifies those residences that do not have dignified living conditions. This also identifies lands where housing might be built for young workers who do not earn enough money to pay for housing at the market rate but who are able to pay an accessible level of rent. Subsequently, the municipality contracts the IHRU – the Institute of Housing and Urban Rehabilitation and

PODEMOS TER UMA P OLÍTIC A NACIONAL, MAS QUANDO A APLICAMOS TERRITORIALMENTE, TEMOS EM C O N TA A S C A R AC T E R Í S T I C A S E OS ACTORES DA REGIÃO. W E M A Y H AV E A N AT I O N A L P O L I C Y B U T W H E N W E A P P LY T H I S T E R R I T O R I A L LY, W E H AV E T O TA K E I N T O AC C O U N T THE CHAR ACTERISTICS AND ACTORS IN THE RESPECTIVE REGION. 29


POLÍTICA NACIONAL PERFIL | PROFILE O MELHOR DO INTERIOR Ana Maria Pereira Abrunhosa nasceu em Cabinda, Angola, em 1970, mas foi em Mêda, distrito da Guarda, que cresceu, desde os quatro anos. Licenciada, mestre e doutorada em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, onde é docente desde 1995 e foi investigadora do Centro de Estudos Sociais, dirigiu a CCDR Centro, de Maio de 2014 a Outubro 2019, até integrar o Governo, como independente, para criar um novo Ministério que, não representando um sector específico, ajuda a ‘colar’ todos, em busca de soluções ‘à medida’ dos problemas no terreno. Antes, havia sido presidente da Comissão Directiva do Programa Operacional Regional do Centro, desde Maio de 2014, e ainda do Comité de Investimento do Instrumento Financeiro para a Reabilitação e Revitalização Urbanas (IFRRU 2020), desde Junho de 2016, tendo desempenhado funções, igualmente na região Centro, como gestora de topo de programas operacionais. Iniciou a actividade profissional na EY, na área de auditoria, entre Julho de 1994 e Outubro de 1995. ‘Militante’ do interior, onde regressa sempre que pode, e onde mais gosta de estar, assumiu-se como “embaixadora” da causa da redução das portagens nestas regiões, o que veio a verificar-se, e defende que o caminho deve ser a regionalização.

THE BEST OF THE COUNTRYSIDE Ana Maria Pereira Abrunhosa was born in Cabinda, Angola, in 1970 but it was in Mêda, in the district of Guarda where she grew up from the age of four. With undergraduate, master’s and doctoral degrees in economics from the Faculty of Economics of the University of Coimbra, where she lectured from 1995 onwards, Ana Abrunhosa was a researcher at the Centre of Social Studies and ran the CCDR Centro from May 2014 to October 2019 prior to joining the government as an independent to set up a new ministry that, while not representing any specific sector, assists to ‘glue’ all the others to ‘tailor’ solutions to the problems existing in the terrain. Previously, she served as president of the Management Commission for the Centro Region Operational Program from May 2014 as well as the IFRRU 2020– the Financial Investment Tool for Urban Rehabilitation and Revitalisation, from June 2016, having also been the lead manager for the operational programs in the Centro region. She started out in her professional activities at EY in the audit sector between July 1994 and October 1995. A ‘militant’ for inland Portugal, where she always returns whenever possible as her favourite place to be, she accepted the role of “ambassador” for the campaign to reduce road tolls in these regions, which has since happened, and defends that the path forward should involve regionalisation.

O PRR tem verbas distintas para o interior e o litoral? Não, depende sempre dos projectos, mas, no “Portugal 2030”, uma fracção muito importante das verbas será para o interior.

benefits from financing for the rehabilitation, for the construction of new housing. There is also support for social equipment and infrastructures or to purchase new vehicles, electric for example.

O “Portugal 2030” ainda não está fechado… Estamos a trabalhar num acordo de parceria, com um conjunto de princípios e de regras entre o Estado português e a Comissão Europeia para a aplicação dos fundos, e a lógica será a de continuar os bons exemplos do “Portugal 2020”, mas com grande foco nas empresas, a quem se destinam cerca de 40% das verbas do “Portugal 2030”.

Does the PRR have different funding for interior and coastal region? No, this always depends on the projects but in “Portugal 2030”, a very significant proportion of funding will be for the interior.

E no PRR, há oportunidades para empresas? O PRR apoia projectos totalmente diferentes do “Portugal 2030”. São agendas mobilizadoras que são, no fundo, polos, consórcios, entre academia, empresas, municípios. No “Portugal 2030”, apoiamos as empresas individualmente. 30

“Portugal 2030” has yet to be signed off… We are working on a partnership agreement, with a set of principles and rules, between the Portuguese state and the European Commission for the application of funds and the logic will be to continue with the best examples from “Portugal 2020” but with a greater focus on companies that shall receive around 40% of the funding in “Portugal 2030”. And in the PRR, are there opportunities for companies? The PRR supports totally different projects to those of “Portugal 2030”. There is a mobilising agenda that, in sum, sets up poles,


N AT I O N A L

POLITICS

OS PROBLEMAS DO INTERIOR NÃO SÃO OS D O LITOR AL, LO G O, AS S O LU ÇÕ E S D E V E M S E R DIFERENTES. OUTR A DIMENSÃO I M P O RTA N T E É Q U E A S P E S S OA S TENHAM TRABALHO. THE PROBLEMS OF INLAND REGIONS ARE NOT THE SAME AS THOSE ON THE COAST SO THE SOLUTIONS NEED TO BE D I F F E R E N T. A N O T H E R I M P O R T A N T DIMENSION IS ENSURING PEOPLE H AV E D E C E N T J O B S . O quadro anterior, o “Portugal 2020”, também dedicava 40% a empresas? Não difere muito. No âmbito do “Portugal 2020”, temos apoiado mais de 20 mil projectos de investimento de empresas, que perfazem um investimento de 13 mil milhões de euros, sendo que um quarto é no interior. Cerca de 80% dos fundos são para PME e 70% destes projectos são na indústria. Também abrimos uma linha nova, que é para apoio à contratação de doutorados e de mestres por parte das empresas do interior. Já há resultados? Já apoiámos quase 900 doutorados, mestres e licenciados na sua entrada em empresas com actividades inovadoras em territórios do interior. Há ainda o Programa Regressar, para jovens qualificados que tenham saído do país e queiram voltar para o interior. Só de apoio directo, recebem 7600 euros, e durante cinco anos suportam IRS apenas sobre metade do rendimento. Agora vamos fazer o mesmo para colocar em IPSS pessoas da área da saúde. A ideia é financiar as IPSS que contratam essas pessoas que estão fora, e que, em simultâneo, recebem os apoios directos. A pandemia mostrou-nos que muitas IPSS têm trabalhadores que não são qualificados. Qual a medidas, ou as medidas, de que mais orgulha neste Ministério? A redução do preço das portagens no interior. Foi a minha missão impossível! É uma “guerra” antiga, a questão das portagens… É, mas consegui, não sozinha, claro. Mesmo no seio do Governo deve ter havido um debate bastante aceso. Há sempre, mas o interior tem de existir sempre para o Governo e estar muito dentro do Conselho de Ministros. Reduzir as portagens foi muito importante, ajudou a baixar custos de contexto relevantes.

consortia among academia, business and municipalities. Under “Portugal 2030”, we support companies individually. Did the previous framework, “Portugal 2020”, also dedicate 40% to companies? It did not differ greatly. Under the auspices of “Portugal 2020”, we have supported over 20,000 company investment projects that account for the investment of 13 billion euros, with one-quarter going to inland regions. Around 80% of the funds went to SMEs and 70% of these projects are industrially based. We also opened a new line that provides support for the recruitment of Phd and Master’s degree holders by companies located inland. Are there any results yet? We have already supported almost 900 doctoral, master’s and graduate degree holders to enter companies engaged in innovative activities in inland regions. There is also the Return Program, for qualified young people who left the country and want to return to inland areas. Just in direct support, they receive 7,600 euros, and throughout five years incur only half the rate of IRS on their earnings. Now, we are going to allocate health professionals to the IPSS. The idea is to finance the IPSS for contracting these people who are abroad and who, simultaneously, receive direct support. The pandemic did show us that many IPSS have workers who are not properly qualified. What is the measure, or the measures that you are most proud of as a minister? The reduction of tolls on inland roads. That was my mission impossible! And that is a long lasting “battle”, the question of tolls… Yes, but I managed but not on my own of course. Even at the centre of government, that must have been a fairly heated debate... That’s always the case but the interior has always to be there for 31


POLÍTICA NACIONAL No “Portugal 2030”, que oportunidades há para as empresas do interior? Todas!

the government and very much inside the Council of Ministers. Reducing the tolls was very important and helped in lowering relevant contextual costs.

De valores falamos? Não posso avançar ainda, mas uma das prioridades do “Portugal 2030” é a competitividade dos territórios do interior. É através da competitividade que se gera coesão com medidas dedicadas a apoiar o investimento no interior, à contratação de pessoas qualificadas pelas empresas, a tornar a envolvente atractiva para as empresas, continuar a batalhar nos custos de contexto…

In “Portugal 2030”, are there opportunities for companies in inland regions? For all of them!

Que outros, para além das portagens? Por exemplo, um custo de contexto terrível é a falta de mobilidade nos territórios do interior. A falta de acessibilidades – um problema que muitos territórios estão a “atacar” de forma conjunta – é um custo de contexto. Uma das áreas fundamentais do “Portugal 2030” é, para além da competitividade, a ambiental, mas também a digitalização, as desigualdades e a demografia – tudo isto tem a ver com coesão territorial. Para além das portagens, de que falámos, que medidas tem na ‘manga’ de que possa vir a orgulhar-se também? Gostaria de ser recordada como a ministra que conseguiu criar condições para atrair mais empresas e pessoas qualificadas para o interior. Mas, sobretudo, quero que me recordem como alguém com os pés na terra: nós não vamos repovoar o nosso interior, queremos é que não fique abandonado e que, mesmo com menos gente, tenha actividade económica, vida, e que as pessoas que escolheram lá trabalhar tenham qualidade de vida e não se sintam que têm menos oportunidades na cultura, no lazer, na educação, na saúde por viverem ali. Podemos construir um país desta maneira. Acredito que, se o fizermos, estamos a resolver problemas também do litoral. l

How much are we talking about? I cannot advance figures yet but one of the “Portugal 2030” priorities is the competitiveness of interior territories. It is through this competitiveness that cohesion is generated – with measures dedicated to supporting investments in the interior, contracting qualified staff by the companies, making the surroundings attractive to companies, continuing with the campaign to lower contextual costs… What others – apart from the road tolls? For example, one terrible contextual cost is the lack of mobility in interior regions. The lack of accessibilities – a problems that many territories are now “attacking” in a joint approach – is a contextual cost. One of the fundamental areas for “Portugal 2030” is to, beyond competitiveness, the environment, including also digitalisation, inequalities and demography – all of this relates to territorial cohesion. In addition to the tolls mentioned, what other measures do you have up your sleeve that might bring you equal pride? I would like to be remembered as a minister able to establish the conditions to attract more companies and qualified persons to the interior. However, above all, I want to be remembered as somebody with their feet in the terrain: we are not going to repopulate our inland regions, what we want is that they are not abandoned and that, even with fewer people, there are economic activities, life, and that people who choose to work there gain quality of life and do not feel that they have fewer opportunities in terms of culture, leisure, education or health due to living there. We can build the country in this fashion. I believe that if we do so, we will also be resolving problems on the coast. l

EM DOIS A TRÊS, ANOS DUPLICÁMOS O NÚMERO DE INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR EM TERRITÓRIOS DO INTERIOR, SOBRETUDO POR VIA DOS POLITÉCNICOS. IN TWO TO THREE YEARS, W E H AV E D O U B L E D T H E S E N U M B E R S , P R I M A R I LY T H R O U G H P O LY T E C H N I C S .

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POLÍTICA NACIONAL

JOÃO PAULO CORREIA, DEPUTADO PS SOCIALIST MP

UM NOVO IMPULSO PAR A O PAÍS! “A N E W S T I M U L U S F O R T H E C O U N T R Y ”

H

á um ano, ao justificar o voto contra do PSD ao OE21, Rui Rio profetizou um SNS incapaz de responder às exigências da pandemia, um orçamento retificativo, o aumento do desemprego e a quebra do investimento público. Rui Rio falhou. O BE apostou que 2022 seria num ano horrível e, consequentemente, na explosão do descontentamento social. PSD e BE perderam para a realidade dos factos. O controlo da pandemia está conjunturalmente assegurado pelo sucesso da vacinação. Portugal é o primeiro país do mundo a atingir a meta de 85% da população com a vacinação completa, o que tem multiplicado confiança junto dos agentes económicos. A resiliência do SNS, a proteção do emprego e dos rendimentos e apoio às empresas foram e são decisivos na viragem de página. Os dados do PIB do 2º trimestre e os números mais recentes do mercado de trabalho confirmam que a recuperação económica está em curso. As previsões do Governo apontam para um crescimento acumulado do PIB em 2021/22 entre 10/10,5%, o que superioriza a queda de 8,4% em 2020.

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O

ne year ago, to justify the PSD voting against the state budget for 2021, its leader, Rui Rio, prophesised that the NHS would be unable to meet the demands of the pandemic, there would later have to be a corrective budget, unemployment would rise and public investment fall. Rui Rio was wrong. BE betted it would be a horrible year and consequently see an explosion in social discontent. The PSD and BE lost their grip on factual reality. The conjunctural control over the pandemic has been secured by the success of the vaccination campaign. Portugal was the first country worldwide to reach the goal of getting 85% of its population fully vaccinated, which has multiplied the confidence prevailing among economic actors. The resilience of the NHS, employment and income protection and support for companies have been decisive in the turning of this page. The second quarter GDP figures and the most recent employment market figures confirm that the economic recovery is under way. The forecasts of the government point to (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


N AT I O N A L O crescimento de 5,5% previsto para o próximo ano permitirá à nossa economia atingir o nível pré-pandémico no final do 1º semestre. Significa, ainda, que a economia portuguesa crescerá acima da média da zona Euro e da UE. Será, portanto, o regresso ao caminho da convergência com a UE, reiniciado em 2017 e interrompido pelo impacto da crise pandémica. A revisão em alta do PIB e a meta de 3,2% de défice das administrações públicas conferem margem ao Governo para redimensionar e intensificar opções políticas convergentes com as agendas dos habituais parceiros parlamentares. Novo reforço do Serviço Nacional de Saúde, mais investimento, aumento do rendimento disponível das classes médias, das famílias com filhos e dos jovens, combate à pobreza infantil e dos mais idosos e o apoio às micro, pequenas e médias empresas, são as áreas de maior incidência fiscal e orçamental. A capacidade de resposta do SNS na pandemia deve-se ao aumento significativo do número de profissionais. O SNS conta hoje com mais 27.000 profissionais face a 2015. Um trajeto que tem de continua a ser uma prioridade orçamental, a par dos investimentos na infraestruturação e nos meios complementares de diagnóstico e terapêutica. A recuperação económica depende, sobretudo, do crescimento do investimento. Os dados relativos ao ano em curso são encorajadores. O investimento público cresceu 30% no 1º semestre, acima da previsão do OE21. O stock de investimento direto estrangeiro deverá atingir no final do ano o valor recorde de 150.000 milhões de euros, maioritariamente em projetos nas áreas da economia digital, automóvel, renováveis e aeronáutica. O OE22 é um quadro de investimento complementar ao Plano de Recuperação e Resiliência, ao overbooking do PT2020 e ao arranque do PT2030. O esforço dos fundos nacionais da administração central e municipal para o crescimento do investimento público continuará a aumentar. Do lado do apoio às empresas, o ressurgirá o incentivo fiscal ao investimento. As empresas poderão abater à coleta de IRC parte do investimento realizado, desde que não distribuam lucros e não diminuam o volume de postos de trabalho. A dimensão do aumento do rendimento disponível das famílias dar-se-á pela via fiscal, com a diminuição da tributação sobre os rendimentos do trabalho, pelo aumento da massa salarial da administração pública, incluindo promoções e progressões nas carreiras, e pelo aumento das pensões mais baixas. O desdobramento de escalões do IRS e o aumento da dedução fixa a partir do 2º filho representarão um alívio fiscal para mais de 30% dos agregados. O IRS Jovem será alargado de 3 para 5 anos. Menos 30% de IRS nos 2 primeiros anos, 20% nos dois seguintes e 10% no quinto. Um apoio que faz a diferença nos primeiros anos da vida ativa. O abono irá aumentar. Mais um passo no combate

POLITICS

accumulated GDP growth in 2021/22 of between 10/10.5%, which outstrips the 8.4% fall in 2020. The growth rate of 5.5% forecast for next year will enable our economy to reach its pre-pandemic level by the end of the first quarter. This also means that the Portuguese economy advances at a rate above that of both the Eurozone and the EU. This therefore represents a return to the path of convergence with the EU, re-joined in 2017 and broken off due to the impact of the pandemic crisis. The upwards revision to GDP and the 3.2% target for the state spending deficit endow the margin for government to rescale and intensify the political options convergent with the agendas of the usual parliamentary partners. Again strengthening the National Health Service, more investment, boosting the disposable income of the middle classes, families with children and young adults, combatting poverty among children and the elderly and support for micro, small and medium sized companies are among the areas of greatest fiscal and budgetary significance. The response capacity of the NHS to the pandemic stemmed from the significant increase in the number of professionals. The NHS today has over 27,000 professionals more than in 2015. A trajectory that has to remain as a budgetary priority alongside investments in infrastructures and complementary means of diagnosis and treatment. Economic recovery depends above all on the growth in investment. The data for the current year are encouraging. Public investment surged by 30% in the first quarter, above that forecast in the annual state budget. The stock of foreign direct investment is expected to close the year at the record level of 150 billion euros with the majority for projects in digital economy and the automobile, renewables and aeronautics sectors. The 2022 state budget contains a complementary investment framework, the Recovery and Resilience Plan, the overbooking of the PT2020 and the launching of PT2030 programs. The commitment of national funds from the central government and municipalities for further raising public investment shall continue their upwards path. In terms of support for companies, there is the repositioning of the fiscal incentive for investments. Companies may deduct a proportion of the investment made directly against their IRC liabilities whenever not distributing profits or reducing their levels of employment. Boosting available household income takes place through the fiscal system with a decrease in taxes on labour, raising wages in the state sector, including promotions and career progression, and raising the lowest pensions. The subdivision of the IRS scales and the increase in the deductible amount for the second and successive children will lighten the fiscal burden on over 30% of households. The IRS Jovem program is to be expanded from 3 to 5 years providing for 30% less IRS taxation in the first two years, 20% in the following two years before a 10% reduction in the fifth year. Such support makes a difference in the early years of professional life. 35


POLÍTICA NACIONAL

à pobreza infantil, concretamente para as crianças que vivem em agregados referenciados nos escalões de rendimentos mais baixos. O fim do Pagamento Especial por Conta será uma excelente notícia para as MPM empresas. Um alívio para a tesouraria. É uma espécie de retenção na fonte e sempre muito criticado por se tratar de um verdadeiro “rolo compressor” na vida de milhares de empresas. As linhas gerais do OE22 têm lugar dianteiro nas agendas dos habituais parceiros do Governo. São avanços que sustentam a viabilização do OE22 e pulam sobre qualquer leitura mais elaborada ou até perniciosa dos resultados do passado dia 26 de setembro. As eleições autárquicas são disputas locais com algum “voto nacional”. E, inevitavelmente, acabam por influenciar o futuro das lideranças partidárias. E as últimas também deixaram as algumas marcas…na direita tradicional. O PS venceu em todos os critérios de análise. O PSD cresceu timidamente. Mas venceu Lisboa e Coimbra. Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos ganharam um pequeno folego para as disputas internas que se avizinham. Mas não o folego suficiente para afastar o descontentamento interno. Em vez de fortalecidos pelo resultado autárquico, ambos chegam ao processo orçamental amarrados à renovação das respetivas lideranças. Por sua vez, o BE foi um dos perdedores da noite eleitoral. Recuou bastante no número de eleitos. Talvez tenham perdurado resquícios do voto contra no OE21. Já o PCP evitou a hecatombe de 2017. O contexto político, o quadro económico e as linhas gerais da proposta de Governo asseguram a viabilização do OE22. l

Child allowance is to rise in another step forward in combatting child poverty, specifically targeting children who live in households with incomes falling into the lower taxation scales. The end of Advance Account Payments represents excellent news for SMEs: a relief for their treasuries. This is a type of withholding tax and has long been criticised as effectively imposing a “compressive roll” on the prospects for thousands of companies. The general framework of the 2022 state budget provides a leading role to the agendas of the government’s usual partners. There are the advances that sustain the viability of the budget and demand a deeper and even more pernicious understanding of the outcome of the 26 September elections. Local government elections are local disputes with some “national voting”. And, they inevitably end up influencing the future of party leaders. And these latest elections have also left some marks on the traditional centre-right. The PS won according to every criteria of analysis. The PSD grew only timidly even if winning Lisbon and Coimbra. Rui Rio and Francisco Rodrigues dos Santos gained some breathing space in their already looming internal disputes. However, this space will not prove sufficient to dismiss this internal discontent. Rather than being strengthened by the local council results, both arrive at the state budget process with their hands tied by their respective leadership challenges. In turn, the BE was one of the clear losers on election night. It slumped in terms of its number of votes. Perhaps there remains resentment over its vote against the 2021 state budget. In turn, the PCP avoided the catastrophic outcome of 2017. The political context, the economic framework and the general lines proposed by the government ensure the viability of the 2022 state budget. l

O presente artigo foi escrito para a PRÉMIO a 15 de Outubro, como tal deve ser lido tendo em conta os factos conhecidos a esta data.

This article was written for PRÉMIO on 15 October, so it should be read taking into account the facts known at that date.

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N AT I O N A L

POLITICS

JOÃO COTRIM DE FIGUEIREDO, DEPUTADO DA IL INICIATIVA LIBER AL, MP

O PS NÃO FAZ IDEIA THE PS HAS NO IDEA

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Partido Socialista não faz ideia de como pôr o país a crescer. Com este orçamento, ficamos também com a certeza de que não faz ideia de como controlar a despesa pública. Isto deve-nos preocupar a todos, porque se começa a repetir o cenário de dívida pública elevada, crescimento anémico e despesa pública excessiva que conduziu à intervenção financeira da “troika” na década passada. O país está em modo de navegação à vista, vogando entre o eleitoralismo das clientelas socialistas sem deixar de estar refém dos ventos comunistas para aprovar o Orçamento. O Orçamento do Estado para 2022 aponta para um crescimento fraco comparado com outros países europeus da nossa liga económica. Sem o Plano de Recuperação e Resiliência Portugal iria terminar o ano de 2022 cerca de 2% abaixo de 2019, sendo mais uma vez um dos últimos a recuperar a nível europeu. Caímos mais e recuperamos mais devagar, esta é a marca do socialismo em Portugal. Não há uma diminuição significativa da carga fiscal,

T

he PS (Socialist Party) has no idea about how to get the country growing. With this budget, we are also certain that they have no idea about how to control public expenditure. This should worry us all because this is beginning to repeat the scenario of high levels of public debt, anaemic growth and excessive public expenditure that led to the financial intervention of the “troika” in the last decade. The country is navigating blind, pandering to the electoral interests of their socialist clientele while never getting out of the clutches of the communist winds needed to approve the state budget. The 2022 state budget points to weak growth in comparison with the other European countries in our economic league. Without the Recovery and Resilience Plan, Portugal would end the year of 2022 around 2% below 2019, one of the last to recover in European terms. We fell further and recovered more slowly; this is the brand of socialism in Portugal. There is no significant reduction in the fiscal burden but there is, as is the socialist tradition, an increase in expenditure, especially in terms of the state (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)

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POLÍTICA NACIONAL mas há, como é tradição socialista, um aumento da despesa, sobretudo da massa salarial da função pública. Muita despesa pública conjuntural passou a estrutural. Até o ex-ministro agora Governador do banco central, Mário Centeno já avisou para os riscos do peso da despesa pública. Quase todo o decréscimo previsto para o desemprego em 2022 se deve ao aumento de funcionários públicos cujo número ultrapassará em muito o recorde dos tempos de José Sócrates. É, por isso, que conjugando o aumento do número de funcionários, as progressões e as atualizações salariais, a massa salarial pública crescerá mais de 5%. As empresas e a iniciativa privada não contam para este orçamento. Não há uma única reforma estrutural que atraia capital e investimento, apenas alguns incentivos fiscais tímidos, sujeitos a regras complicadas e restrições laborais, próprios de quem não faz ideia como funciona a economia. A única coisa que estas pequenas medidas estimulam são títulos de jornais e nada mais. Não há nada de substancial para as empresas neste orçamento e o que há não funciona e torna-se ainda mais complexo, como o novo Crédito Fiscal Extraordinário (já vai para o terceiro ano…) ao Investimento. Não fazem ideia. Este é também um Orçamento que insiste na cegueira ideológica de ter serviços públicos de prestação praticamente exclusiva por parte do Estado. Na saúde, os dados de várias entidades públicas indicam que os hospitais em parceria público-privada tiveram melhores indicadores e geraram poupanças para o Estado, mas o governo socialista por pressão comunista e bloquista insiste em não apostar neste modelo. Na educação, o Governo continua a preferir atirar dinheiro para cima do problema da falta de condições nas escolas públicas mesmo quando há alternativas privadas ou cooperativas que poderiam prestar esse serviço a um custo que o próprio Ministro da Educação já admitiu terem um custo médio por aluno inferior ao do ensino público. O governo anuncia com pompa e circunstância que este é o orçamento da classe média e dos jovens, mas o que prevê são apenas medidas tímidas e similares às que não funcionaram nos anos anteriores. O melhor exemplo disso é o IRS jovem, cujos resultados ninguém conhece e que vai ser alargado. O resultado esperado é uma poupança de dois meses de salário ao fim de… cinco anos. Portanto, o governo do PS acha que um jovem deixará de emigrar porque poupará em cinco anos o que pode ganhar a mais em poucas semanas noutro país desenvolvido. Não fazem ideia. Ainda no IRS, o governo propõe um desdobramento que resultará na criação de mais dois escalões. Portugal tornar-se-á no país da Europa com mais escalões – nove – a que se somam duas taxas de solidariedade nos escalões superiores. A média europeia são cinco escalões e os países mais liberais por norma têm menos ainda, privilegiando a simplicidade fiscal. Um sistema com tantos escalões acentua o 38

sector wage bill. Much of the conjunctural public expenditure has now becomes structural. Even the ex-minister and now governor of the central bank, Mário Centeno has already warned of the risks of the weight of this public expenditure. Almost all of the decrease forecast for unemployment in 2022 stems from the increase in state employees with a number that shall then far exceed even the record from the times of José Sócrates. Hence, through conjugating the rise in the number of employees, career promotions and wage increases, the public wage bill shall grow by over 5%. Companies and private initiative do not exist for this budget. There is not a single structural reform that attracts capital and investments and just some very timid fiscal incentives subject to highly complicated rules and labour restrictions specified by those who have no idea about how the economy works. The only thing that these minor measures stimulate are the headlines in newspapers and nothing else. There is nothing of substance for companies in this budget and what there is does not work and becomes ever more complex, such as the Extraordinary Fiscal Credit (already now into its third year…) for Investment. They have no idea. This is also a budget that insists on the ideological short sightedness of having public services providing almost exclusively for the state. In health, the data from various public entities demonstrate that public and private partnership hospitals return better indicators and generate savings for the state but the socialist government, out of pressure from the communists and the BE, insists on not investing in this model. In education, the government would prefer to throw money at the problem of the lack of conditions in public schools even when there are private or cooperative alternatives that are able to provide this service at a cost that the Ministry of Education has already admitted would be an average cost per student below that in the public education sector. The government announced with pomp and circumstance that this budget is for the middle classes and the young but what it provides are merely meek measures and similar to those that have not worked in years gone by. The best example of this is the IRS Jovem (Youth) program, with its past results unknown and that is now going to be expanded. The program provides for a saving of two months of salary at the end of… five years. Therefore, the PS government thinks a young person will give up on emigrating because in five years they will save what they might earn in just a few weeks in another developed country. They have no idea. Remaining with the IRS tax system, the government proposed to subdivide and therefore to create two more scales. Portugal will become one of the European countries with the most scales – nine – on top of which there are two solidarity taxes on the higher rates. The European average is five scales and more liberal countries normally


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POLITICS

desincentivo ao trabalho que a progressividade do imposto provoca ao aumentar a facilidade com se passa de escalão. Para voltar a ser possível subir na vida a trabalhar, Portugal não precisa de mais escalões, precisa de menos, não precisa destas elevadas taxas de impostos, precisa de as baixar. O governo sabe isto tão bem que já o aplica, só que não o aplica aos portugueses residentes em Portugal. O programa Regressar, que reduz em 50% o IRS dos emigrantes que voltem ao país, vai ser prolongado. Os estrangeiros residentes em Portugal pagam uma taxa única de IRS de 20%, benefício que vai agora ser alagado aos nómadas digitais. Taxa única para uns e complexidade fiscal para outros. Os portugueses residentes é que não tem maneira de não pagar impostos elevados e complexos. É conhecida a nossa proposta de evoluir gradualmente para uma taxa única de IRS, começando por propor um sistema de duas taxas. Mais simples e mais indutor de crescimento. E, certamente, uma muito melhor utilização de recursos públicos do que os mil milhões que o Governo vai injetar na TAP este ano. Além disso, este alívio fiscal seria depois recuperado através de impostos indiretos e pelo próprio acréscimo do crescimento económico. E sem resolver o problema do crescimento económico, Portugal não resolverá os restantes problemas. Há demasiado Estado nas nossas vidas, nas nossas empresas e na nossa sociedade. Um Estado pesado, incompetente e gerador de dependências e compadrios que impede os portugueses de darem o melhor de si. A visão que a Iniciativa Liberal tem para Portugal é bem diferente. Porque confiamos nos portugueses, queremos libertá-los das limitações excessivas que o Estado lhes impõe. Este orçamento não dá um passo sequer nessa direção porque o PS não faz ideia de como o fazer. l

have still fewer through prioritising fiscal simplicity. A system with so many scales highlights the disincentive to work that the progressive nature of taxation causes in raising the ease of passing up through scales. In order to be able to again rise in life through labour, Portugal does not need more scales, it needs less. There is no need for these high rates of taxation, they need to come down. The government know this so very well that is already applies this but just not for Portuguese resident in Portugal. The Regressar (Return) program, which reduces the IRS paid by emigrants who return to the country by 50%, is to be extended. Non-nationals resident in Portugal pay a single IRS tax rate of 20%, a benefit that is now going to be extended to the digital nomads. A single rate for some and fiscal complexity for others. Resident Portuguese have no means of avoiding having to pay high and complex taxes. Our proposal is in the public domain: evolving gradually towards a single IRS rate beginning with a system of two rates – simpler and more able to induce growth. This would certainly be a better utilisation of public resources than the billion euros that the government is going to inject into TAP this year. Furthermore, this lightening of the fiscal burden would be later recovered through indirect taxes and additional economic growth. And without resolving the economic growth problem, Portugal will not resolve its other problems. There is too much state in our lives, in our companies and in our society. A heavy state, incompetent and generating dependencies and compatriots that prevent the Portuguese from giving the best of themselves. The vision Iniciativa Liberal has for Portugal is very different. Because we trust in the Portuguese, we want to release them from the excessive limitations that the state imposes on them. This budget does not sake a single step in this direction because the PS has no idea about how to do it. l

O presente artigo foi escrito para a PRÉMIO a 15 de Outubro, como tal deve ser lido tendo em conta os factos conhecidos a esta data.

This article was written for PRÉMIO on 15 October, so it should be read taking into account the facts known at that date.

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POLÍTICA INTERNACIONAL

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W CAROLINA CERQUEIRA, MINISTR A DE ESTADO DE ANGOLA PARA A ÁREA SOCIAL

CAROLINA CERQUEIRA, THE ANGOLAN MINISTER OF STATE FOR SOCIAL WELFARE

“ PA N D E M I A G E R O U U M A G R A N D E ONDA SOLIDÁRIA DOS PA R C E I R O S D O E S TA D O ” “ T H E PA N D E M I C P R O D U C E D A WAV E O F G R E AT S O L I DA R I T Y A M O N G T H E S TAT E ’ S PA RT N E R S ”

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I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

RICARDO DAVID LOPES

A P R E S E N T O U E M J U L H O PA S S A D O , A O C O N S E L H O E C O N Ó M I C O E S O C I A L D A O N U , O P R I M E I R O R E L AT Ó R I O V O L U N TÁ R I O D O G O V E R N O A N G O L A N O S O B R E O S O B J E C T I V O S D E D E S E N V O LV I M E N T O S U S T E N TÁV E L , U M A I N I C I AT I VA B E M R E C E B I D A P E L A C O M U N I D A D E I N T E R N A C I O N A L , Q U E E S TÁ AT E N TA A O S E S F O R Ç O S Q U E O PA Í S T E M F E I T O PA R A M E L H O R A R A S C O N D I Ç Õ E S D E V I D A D A P O P U L A Ç Ã O E R E F O R Ç A R O S P I L A R E S D O E S TA D O D E M O C R ÁT I C O D E D I R E I T O . E M E N T R E V I S TA , C A R O L I N A C E R Q U E I R A REVEL A AS PRIORIDADES D O E XECUTIVO LIDER AD O P OR JOÃO LOURENÇO NO D OMÍNIO SOCIAL, COM D E S TA Q U E PA R A A S A Ú D E , E D U C A Ç Ã O , E M P R E G O , P R O T E C Ç Ã O S O C I A L , J U S T I Ç A E C R E S C I M E N T O E C O N Ó M I C O , E N T R E O U T R A S , E D Á C O N TA D O T R A B A L H O Q U E T E M S I D O F E I T O , A S S U M I N D O O M U I T O Q U E H Á P O R FA Z E R , N U M PA Í S O N D E O C O M B AT E À P O B R E Z A E A A P O S TA N A Q U A L I F I C A Ç Ã O D A S P E S S O A S E S TÃ O N A O R D E M D O D I A . H AV I N G P R E S E N T E D L A S T J U L Y T H E F I R S T V O L U N TA R Y R E P O R T F R O M T H E A N G O L A N G O V E R N M E N T O N T H E S U S TA I N A B L E D E V E L O P M E N T G O A L S T O T H E U N I T E D N AT I O N S E C O N O M I C A N D S O C I A L C O U N C I L , T H I S I N I T I AT I V E R E C E I V E D A W A R M W E L C O M E F R O M T H E I N T E R N AT I O N A L C O M M U N I T Y T H AT I S AT T E N T I V E T O T H E E F F O R T S T H E C O U N T R Y H A S B E E N M A K I N G T O I M P R O V E T H E P O P U L A R S TA N D A R D O F L I V I N G A N D S T R E N G T H E N T H E R U L E O F L A W U N D E R A D E M O C R AT I C S TAT E . I N I N T E R V I E W, C A R O L I N A C E R Q U E I R A R E V E A L S T H E P R I O R I T I E S O F T H E G O V E R N M E N T L E D B Y J O Ã O L O U R E N Ç O F O R T H E S O C I A L D O M A I N W I T H A PA R T I C U L A R E M P H A S I S O N H E A LT H , E D U C AT I O N , E M P L O Y M E N T, S O C I A L P R O T E C T I O N , J U S T I C E A N D E C O N O M I C G R O W T H , A M O N G O T H E R S A N D E X P L A I N S T H E W O R K T H AT H A S B E E N D O N E W H I L E A C C E P T I N G T H E R E I S S T I L L M U C H T O D O I N A C O U N T R Y W H E R E C O M B AT I N G P O V E R T Y A N D I N V E S T I N G I N T H E Q U A L I F I C AT I O N O F C I T I Z E N S R A N K V E R Y M U C H A S T H E P R E VA I L I N G P R I O R I T I E S . Apresentou recentemente o primeiro relatório nacional voluntário sobre objectivos de desenvolvimento sustentável (ODS) no Conselho Económico e Social das Nações Unidas (ECOSOC). Quais são os grandes desafios que resultam da análise das suas principais conclusões? Elegemos como áreas prioritárias, no domínio social, o desenvolvimento humano, a assistência e protecção social, a educação, a saúde, o emprego, a igualdade de género, a justiça e direitos humanos, o crescimento económico, a formação profissional e a diversificação da economia, num contexto de reforço do Estado democrático de Direito, desafios que consideramos prioritários para a execução do Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN 2017-2022) e que continuam actuais, tendo como meta o desenvolvimento durável, a justiça e a paz social. As conclusões levam o Executivo a alterar prioridades no que diz respeito às áreas sociais, ou a reforçar algumas? Angola é um dos países com a mais elevada taxa de fertilidade do continente africano, tendo ascendido a 5,6% no último quinquénio, possuindo actualmente uma população que ultrapassa a 32 milhões de habitantes e nascendo cerca de um milhão de crianças por ano. Trata-se de um grande desafio que requer o reforço das políticas públicas, sobretudo a nível da área social. Efectivamente, a crise de saúde mundial causada pela pandemia de Covid-19, aliada à queda do preço do petróleo, obrigou-nos a tomar medidas excepcionais para mitigar os seus efeitos nas

You recently presented the first voluntary national report on the Sustainable Development Goals (SDGs) to the United Nations Economic and Social Council (ECOSOC). What are the main challenges resulting from analysis of the main conclusions? As priority fields in the social domain, we nominated human development, social support and protection, education, healthcare, employment, gender equality, justice and human rights, economic growth, professional training and the diversification of the economy within a context of strengthening the democratic rule of law: challenges we consider priorities for implementing the National Development Plan (NDP 2017-2022) and that remain current against the target of lasting development, justice and social peace. Did the conclusions lead the government to change or to strengthen any of the priorities for social welfare? Angola registers one of the highest birth rates on the African continent, having risen to 5.6% in the last five years and currently has a population of over 32 million inhabitants per year and with around a million children born per year. This is a major challenge that requires the strengthening of public policies, especially in terms of social welfare. In effect, the world health crisis caused by the Covid-19 pandemic, in conjunction with the fall in the oil price, forced us to take exceptional measures to mitigate its effects on communities, families and companies. We furthermore consider that the situation prevailing, with 41


POLÍTICA INTERNACIONAL comunidades, famílias e empresas. Consideramos igualmente que, na situação actual, em que a seca no Sul e Sudeste do País afecta directa e negativamente a estrutura social e a estabilidade de milhões de famílias, o Executivo angolano tem vindo a reforçar algumas das políticas sociais para mitigar o estado de pobreza ainda visível das populações, garantir o emprego, sobretudo aos jovens, o realojamento de populações e a ampliação da rede habitacional em todo o País através dos projectos financiados pelo Estado, as conhecidas centralidades, que permitem o acesso a habitação condigna a milhares de pessoas, sobretudo funcionários públicos e jovens nas principais províncias, como Luanda, Bengo, Benguela, Huíla, Namibe Cuanza Sul, Uíge, Bié Huambo e Lunda Norte. Por outro lado, continuamos a prestar apoio às iniciativas de construção dirigida em algumas províncias, ao mesmo tempo que prossegue o realojamento de famílias afectadas pelas catástrofes naturais nas conhecidas casas sociais, gratuitamente distribuídas pelo Estado, sendo o mais recente o projecto Mayé Mayé, nos arredores de Luanda, para realojamento de 3.000 famílias. Estão também em curso programas de âmbito nacional para o combate à pobreza multidimensional, mitigação dos efeitos da seca e erradicação do analfabetismo através de programas estruturados de inclusão e de integração social das comunidades tradicionais e as mais desprotegidas, nas áreas rurais e zonas de maior risco. Os planos do Governo consideram como alvo principal fazer chegar a saúde a todos os cantos de Angola, o saneamento público, canalização de água potável, construção de habitação social, acções que vão promover a erradicação da fome e pobreza, ao mesmo tempo que continuaremos a priorizar as áreas como a educação, igualdade de género, protecção social, justiça, direitos humanos e meio ambiente. E quais os aspectos que, pela positiva, entende serem mais relevantes no documento? A expectativa de vida em Angola cresceu 19 anos, entre 2000 e 2019, passando de 42 anos, para 61. Por outro lado, o índice de Desenvolvimento Humano subiu de 0,400 para 0,581 pontos, no mesmo período. Os avanços substanciais conseguidos, particularmente nos domínios da saúde e da educação, assim como o aumento dos beneficiários

drought in the south and southeast of the country directly and negatively impacting on the social structure and the stability of millions of families, the Angolan government has been reinforcing some of the social policies that mitigate the state of poverty still visible among the populations, guaranteeing employment, especially to youths, rehousing the populations and expanding the housing stock across the entire company through projects with state financing, the already known centralities that enable thousands of people to gain access to dignified housing, especially state sector employees and young persons in the main provinces such as Luanda, Bengo, Benguela, Huíla, Namibe Cuanza Sul, Uíge, Bié Huambo and Lunda Norte. Furthermore, we continue to provide support for focused constructions in some provinces while simultaneously advancing with rehousing families afflicted by natural disasters in social housing, distributed free-of-charge by the state with the most recent project being Mayé Mayé, on the outskirts of Luanda, for the rehousing of 3,000 families. There is an ongoing national program for combating multidimensional poverty, mitigating the effects of drought and eradicating illiteracy through structured programs of inclusion and social integration of the traditional and most unprotected communities in the rural areas and zones of greatest risk. The government’s plans adopt as their core target the provision of healthcare in every corner of Angola, public sanitation, the supply of drinking water, building social housing, actions to bring about the eradication of hunger and poverty while simultaneously continuing to prioritise areas such as education, gender equality, social protection, justice, human rights and the environment. And which aspects most stand out for the positive and are most relevant in the report? Life expectancy in Angola grew by 19 years between 2000 and 2019, rising from 42 to 61 years of age. And the Human Development Index advanced from 0.400 to 0.581 points over

A PA N D E M I A , A L I A DA À Q U E DA DO PREÇO DO PETRÓLEO, OBRIGOU-NOS A TOMAR M E D I DA S E XC E P C I O N A I S PA R A MITIGAR OS SEUS EFEITOS NAS COMUNIDADES, FAMÍLIAS E EMPRESAS. T H E PA N D E M I C , C O U P L E D W I T H THE FALL IN THE OIL PRICE, F O R C E D U S T O TA K E E X C E P T I O N A L M E A S U R E S T O M I T I G AT E T H E EFFECTS ON COMMUNITIES, FA M I L I E S A N D C O M PA N I E S . 42


I N T E R N AT I O N A L da protecção social e avanços igualmente na representatividade das mulheres em todos os niveis da sociedade e da política, são referências importantes que foram ressaltadas no documento com dados estatísticos elucidativos. Outro sinal importante é a cobertura da protecção social a um número crescente de cidadãos, destacando o peso dos trabalhadores informais. De uma forma geral, o documento mostra como as políticas e programas do Governo de Angola colocam a prioridade nas populações mais pobres, nas mais vulneráveis e nas que estão mais atrás, através de valências suportadas por investimentos realizados nas áreas sociais, por via de programas e políticas assertivas e dotações orçamentais. Que ‘feedback’ teve dos parceiros do ECOSOC? De uma forma geral, foi positiva a apreciação dos membros do ECOSOC e do sistema das Nações Unidas, que saudaram o facto de esta ter sido a primeira vez que Angola apresentou o seu relatório sobre o estado de aplicação dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Recebemos sinais positivos sobre a nossa apresentação pelos dados partilhados, assim como das referências que ilustrámos sobre as perspectivas da actuação no futuro no domínio da aplicação dos ODS. O documento refere uma taxa de pobreza elevada, na ordem dos 54%, agravada pelo contexto de pandemia, mas há o compromisso de redução para metade até 2030. Quais as linhas gerais da estratégia? O Governo quer baixar a pobreza multidimensional para 27%, metade do nível actual, e contrariar as situações de fome e outras vulnerabilidades que o País ainda enfrenta, nomeadamente promovendo as condições básicas de saúde, educação, acesso à energia, água e saneamento básico e reduzindo as desigualdades sociais de género, tendo em conta os efeitos das alterações climáticas e os riscos de desastres naturais de forma sustentada. Para alterar o actual quadro do índice de pobreza, o Governo de Angola está a implementar programas e políticas inclusivas no âmbito do Programa Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza (PIDLCP), que permitiu a integração de mais de 60 mil pessoas em actividades geradoras de renda, do Programas de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição de Importações (PRODESI), que permitiu, até à data, financiar mais de 788 projectos produtivos. Tem grande impacto, no domínio da inclusão social, o Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), que permitiu, por exemplo, a construção de 811 escolas em todo o País, além de expandir a rede hospitalar, redes rodoviárias, canalização de água e electricidade nos 164 municípios, incluindo os das zonas mais recônditas. Tem havido importantes esforços do Executivo, redobrados, entretanto, devido à pandemia, para alargar a protecção social dos angolanos mais vulneráveis, nomeadamente por via de programas de transferências monetárias, como o “Kwenda”. Qual é o ponto da situação deste projecto e quais os próximos passos?

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the same period. The substantial progress made, especially in the fields of health and education as well as raising the number of beneficiaries of social protection alongside advances made in the representation of women across every level of society and politics are important references that the report highlighted with elucidative statistical data. Another important sign is the coverage of social protection and the rising number of citizens, emphasising the weighting of informal sector workers. In general terms, the document shows how the politics and programs of the Angolan government place their priority on the poorest populations, the most vulnerable and those who have been left furthest behind through the results produced by the investments made in the social areas through means of the assertive programs and policies attributed budgetary funding. What feedback did you get from your ECOSOC partners? In general terms, there was positive appreciation among both ECOSOC members and the United Nations system that praised the fact of this having been the first time that Angola had presented its report on the state of application of the Sustainable Development Goals (SDGs). We received positive feedback about our presentation over the sharing of data as well as the references we illustrated about the current and future perspectives on implementing the SDGs. The document refers to a high rate of poverty, standing in the region of 54%, aggravated by the pandemic context, but with the commitment to reduce this by half through to 2030. What are the general lines of this strategy? The government aims to lower multidimensional poverty to 27%, half of the current level and prevent situations of hunger and other vulnerabilities that the country still faces, especially in terms of the key conditions for health, education, access to energy, water and basic sanitation and reducing gender social inequalities while taking into account the effects of climate change and the risks of natural disasters in a sustainable approach. In order to change the current poverty index, the government of Angola is implementing inclusive programs and policies under the auspices of the PIDLCP – the Integrated Program for Local Development and Combating Poverty, which has already enabled the integration of over 60,000 persons in income generating activities, the Production Support Programs, and PRODESI – the Export Diversification and Substitution Program, which has thus far provided financing to 788 production projects. There is a major impact on the domain of social inclusion through the Integrated Plan for Municipal Intervention that has, for example, undertaken the construction of 811 schools across the country, in addition to expanding the hospital network, transport infrastructures, water and electricity supplies in 164 municipalities, including in the most distant zones. The government has made significant efforts, redoubled in the meanwhile due to the pandemic, to expand social protection to the most vulnerable Angolans, especially through means of money transfer programs such as “Kwenda”. What is the current situation of this project and what are the next steps? 43


POLÍTICA INTERNACIONAL TEMOS VINDO A R E F O R Ç A R A LG U M AS P O L Í T I C A S S O C I A I S PA R A M I T I G A R O E S TA D O D E POBREZA AINDA VISÍVEL DAS P OPUL AÇÕES, GAR ANTIR O EMPREG O, SOBRETUD O AOS J OV E N S , O R E A LO JA M E N TO D E P OPUL AÇÕES E A AMPLIAÇ ÃO DA R E D E H A B I TAC I O N A L .

W E H AV E B E E N STRENGTHENING SOME S O C I A L P O L I C I E S T H AT M I T I G AT E T H E S T AT E O F P OVERT Y STILL VISIBLE IN THE P O P U L AT I O N S , G U A R A N T E E I N G E M P L O Y M E N T, E S P E C I A L LY FOR YOUTHS, REHOUSING THE P O P U L AT I O N A N D E X P A N D I N G THE HOUSING NETWORK.

O “Kwenda” tem como objectivo principal reforçar a capacidade do sector de protecção social para implementar medidas de mitigação da pobreza de curto e médio prazos, de forma a aumentar a capacidade aquisitiva e financeira das famílias através de um apoio em renda para os mais pobres e, por outro lado, ajudar a estabelecer um sistema nacional de protecção social robusto e eficaz. O “Kwenda”, financiado pelo Banco Mundial, em parceria com o Governo angolano, tem um período de execução de 2019 a 2023, prevendo-se apoiar um total de 1.608.000 agregados familiares em situação de pobreza e vulnerabilidade. Até ao momento, foi cadastrado um total de 414.285 agregados familiares, em 26 municípios das 18 províncias, distribuídos em 101 comunas e 3.681 aldeias e bairros. Os próximos passos prevêem a colocação de 1.183 agentes de desenvolvimento comunitários e sanitários em todo o País e a formação de cerca de 200 técnicos locais, mas há mais desafios…

The “Kwenda” objective was to strengthen the capacity of the social protection sector to implement measures mitigating poverty over the short and medium term in order to boost the purchasing and financial capacities of families through support for paying rent among the poorest and, furthermore, helping to established a robust and efficient national system of social protection. “Kwenda”, financed by the World Bank in partnership with the Angolan government, is under implementation over the 2019 to 2023 period and planning to support a total of 1,608,000 family households facing poverty and vulnerabilities. At this moment, a total of 414,285 family households have been registered in 26 municipalities across 18 provinces, distributed across 101 communes and 3,681 villages and neighbourhoods. The next steps foresee the deployment of 1,183 community and sanitation development agents across the country and the training of around 200 local technicians but there remain challenges…

Pode exemplificar? Por exemplo, o reforço da inclusão produtiva das famílias visadas através do financiamento e acções económicas e produtivas para a sua inserção em actividades geradoras de rendimentos, a municipalização da acção social materializada pelos Centros da Acção Social Integrada, que está em curso, para aproximar e a ampliar os serviços da acção social ao nível local, ou o reforço do cadastro social único, nos próximos anos. Convém ressaltar que, através dos pagamentos via Multicaixa, e com acesso às novas tecnologias, a modernização tem vindo a ser uma realidade nas áreas rurais, além de se garantir transparência e eficácia, assim como a confiança das populações ao programa, que tem vindo a contribuir substancialmente para a melhoria da qualidade de vida das famílias contempladas.

Could you give an example? For example, strengthening the productive inclusion of the families targeted through financing and economic and productive actions for their insertion into income generating activities, the municipal level of social action implemented through the Integrated Social Action Centres, which is ongoing, to approximate and expand social welfare services at the local level and strengthen the single social record in the years to come. This should highlight how through payment via the Multicaixa system, applying the new technologies, modernisation has become a reality in rural areas and all the while guaranteeing transparency and efficiency as well as gaining the trust of the populations in the program, which has contributed substantially to improving the quality of life of the families included.

A Saúde é uma das áreas onde o Executivo mais tem vindo a apostar, mesmo antes da pandemia. Quais as grandes conquistas já obtidas, no seu entender? No âmbito das medidas adoptadas pelo Executivo nos últimos anos, destacam-se o aumento do financiamento para o reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS), avanços na construção e reabilitação de infra-estruturas sociais, com benefícios consideráveis para o sector da saúde, dotadas de meios técnicos e tecnológicos modernos, o que permitiu a expansão da rede sanitária municipal, com criação de novos serviços especializados

Health is one of the areas the government has prioritised, and even before the pandemic. What are the major achievements thus far in your opinion? Within the scope of the measures adopted by the government in recent years, they highlight the increase in financing for the National Health Service (NHS), driving progress in the construction and rehabilitation of social infrastructures with considerable benefits for the health sector, endowed with the technical means and modern technologies, which brought about an expansion in the municipal sanitation networks, the launching of new, benchmark

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I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

de referência e investimento no capital humano. O sector da saúde mereceu uma atenção especial, através do aumento do investimento, que passou, em 2018, de Kz 388 465 188 031, para Kz 841 566 888 377, em 2021. Houve, efectivamente, um aumento do financiamento para a Função Saúde, tendo passado, em termos percentuais, de 4,01%, em 2018, para 5,69, em 2021, visando as mudanças estruturais que ajudam no reforço do SNS na base e de forma a poder responder às necessidades da população. Outro grande investimento que o Estado está a realizar é o financiamento na totalidade das 12 vacinas do Calendário Vacinal Angolano desde 2017, anteriormente co-financiado pela GAVI, que permitirá reduzir substancialmente a taxa de mortalidade infantil.

specialist services and investment in human capital. The healthcare sector received special attention through the increase in investment which rose from Kz 388 465 188 031 in 2018 to Kz 841 566 888 377 in 2021. There was an effective rise in financing for health and rising in percentage terms from 4.01% in 2018 to 5.69% in 2021 taking into consideration the structural changes helping to strengthen the NHS from the foundations upwards in order to be better able to meet the needs of the population. Another major state investment is for financing the total of 12 vaccines on the Angola Vaccine Calendar since 2017, formerly cofinanced with GAVI, which shall enable a substantial reduction in the infant mortality rate.

Há ainda um esforço relevante em infra-estruturas de Saúde… Para aumentar o acesso aos serviços de saúde foram construídas, entre 2018 e 2021, 68 novas unidades sanitárias nos três níveis de atenção, levando a um aumento do número de camas do SNS, de 24.382, em 2019, para 29.912, em 2021, particularmente no nível primário de atenção, para estarmos mais próximos das populações, respondendo às suas necessidades, reduzindo a demanda aos hospitais gerais e centrais e melhorando a prestação de serviços também a esse nível. Importa destacar que, em 2020, foram adquiridas 5.000 camas, das quais, 1.000 para os cuidados intensivos em toda a rede do SNS. As camas hospitalares e as de cuidados intensivos foram aumentadas em cinco vezes relativamente às existentes no período anterior à pandemia. A rede sanitária do País conta com 3.164 unidades sanitárias, sendo 13 hospitais do nível nacional, 32 especializados, 18 provinciais, 166 municipais, 10 privados não lucrativos (Hospitais Missionários), 105 centros Materno-infantis, 640 centros de saúde e 2.180 postos de saúde. No Programa Integrado de Intervenção Municipal (PIIM), este sector está a proceder ao acompanhamento de 311 projectos de construção, reabilitação, ampliação e apetrechamento de unidades hospitalares, bem como a aquisição de ambulâncias e, no seguimento da implementação do Programa de Investimento Público (PIP) e do PIIM ao nível das províncias, foram concluídos 23 projectos no sector da saúde. Para reduzir o número de doentes evacuados para o exterior e os custos, foi intensificada a melhoria da prestação de serviços hospitalares, com abertura de serviços

There are also significant efforts being put into health sector infrastructures… In order to increase access to health services, between 2018 and 2021, a total of 68 new health units have been built for three levels of care, leading to a rise in the number of NHS beds from 24,382 in 2019 to 29,912 in 2021. This has also particularly focused on the primary level of care, to be closer to the populations and responding to their needs, reducing the demands on general and central hospitals and also improving their service provision as well. This should highlight how a total of 5,000 beds were acquired in 2020, of which 1,000 were for intensive care units across the NHS network. Hospital beds and intensive care units were expanded by five times on those existing in the period prior to the pandemic. The national health network now counts on 3,164 health clinics, with 13 national hospitals, 32 specialist units, in 18 provinces, 166 municipalities, 10 non-profit private establishments (Missionary Hospitals), 105 maternal-infant centres, 640 health centres and 2,180 healthcare posts. In the PIIM – the Integrated Municipal Intervention Program, this sector is overseeing 311 projects for the construction, rehabilitation, expansion and re-equipping of hospital units as well as the acquisition of ambulances and, following the implementation of PIP – the Public Investment Program and the PIIM at the provincial level, 23 health sector projects have been concluded. In order to cut the number of patients sent abroad and all the costs incurred, there has been an intensification of efforts to

OS PLANOS DO GOVERNO C O N S I D E R A M C O M O A LV O P R I N C I PA L FA Z E R C H E G A R A SAÚDE A TODOS OS CANTOS DE ANGOLA, O SANEAMENTO PÚBLICO, C ANALIZAÇ ÃO DE ÁGUA P O T ÁV E L , C O N S T R U Ç Ã O D E H A B I TAÇ ÃO S O C I A L .

A S T H E I R C O R E TA R G E T S , THE GOVERNMENT PLANS CONSIDER GETTING H E A LT H C A R E T O E V E R Y CORNER OF ANGOLA, PUBLIC S A N I T AT I O N , T H E S U P P LY O F D R I N K I N G W AT E R A N D T H E CONSTRUCTION OF SOCIAL HOUSING. 45


POLÍTICA INTERNACIONAL

P E R F I L | D O J O R N A L I S M O PA R A A P O L Í T I C A Licenciada em Direito pela Universidade Agostinho Neto, Carolina Cerqueira, natural do Cuanza Norte, assumiu em Junho de 2019 o desafio do Presidente João Lourenço de abandonar a pasta da Cultura para tomar posse como ministra de Estado para a Acção Social. A experiência governativa, contudo, já vinha desde 2010, quando foi ministra da Comunicação, uma área que já então conhecia bem, em boa parte devido à sua origem como jornalista, uma profissão que a levou a trabalhar e assumir cargos de responsabilidade em órgãos públicos. Foi deputada do círculo nacional, presidente da Comissão dos Direitos Humanos e vicepresidente do Grupo Parlamentar do MPLA, destacando-se pelas suas posições e esforços a favor da promoção da democracia, dos direitos da mulher e da promoção da paz. Actualmente é também vice-presidente da Comissão Interministral de Combate à Covid-19 e integra ainda a FemWise, plataforma de destacadas mulheres no continente.

P R O F I L E | FROM JOURNALISM INTO POLITICS Having graduated in law from the Agostinho Neto University, Carolina Cerqueira, born in Cuanza Norte, in June 2019, took up the challenge from President João Lourenço to abandon the Ministry of Culture and take office as the State Minister for Social Welfare Action. However, her government experience already dates back to 2010 when she was sworn in as Minister of the Media, an area that she already knew well in keeping with her background as a journalist, a profession that led her to work and accept positions of responsibility in public bodies. She was a member of parliament, Chairwoman of the Human Rights Commission and vice-president of the Parliamentary Group of MPLA party and she stood out for her role and efforts towards promotion of democracy, women rights and promotion of peace. She is also currently vice-president of the Interministerial Commission to Fight Covid-19 e she is also a member of FemWise, a platform joining high profile women in the African continent.

especializados com equipamento de alta tecnologia. Quer avançar com exemplos? Sim, foram abertos seis novos serviços de hemodiálise com áreas para doentes com Covid-19, hepatites B e C e com VIH/ Sida, sendo três em Luanda - incluindo um no Hospital Pediátrico David Bernardino -, Cabinda, Huíla e Moxico, tendo aumentado a capacidade de atendimento para mais 3.772 doentes por semana. No âmbito da Covid-19 foram construídos seis centros de tratamento, estando em construção três em Luanda, um no Cunene, um em Cabinda, um na Lunda Norte e um no Soyo, estando em fase de conclusão mais um de Benguela, um na Huíla e no Uíge, e foram adaptadas e apetrechadas unidades de tratamento em todas as províncias, com meios e equipamentos de alta tecnologia, ao mesmo tempo que a capacidade laboratorial de confirmação de casos foi reforçada com a montagem de três laboratórios de Biologia Molecular e Serologia (ELISA) nas províncias da Lunda Norte, Huambo e Uíge, investimento directo do Estado angolano. E, em parceria com a indústria petrolífera, a instalação de outros três laboratórios em Cabinda, Soyo e Benguela, aumentando a testagem até 15.000 testes. Esta capacidade instalada melhorou em grande medida o atendimento de todas as doenças de forma transversal do SNS. 46

improve hospital services and open up specialist facilities with high-tech equipment. Would you provide some examples? Yes, six new haemodialysis units were opened for patients with Covid-19, hepatitis B and C and HIV/Aids, with three in Luanda – including a unit at the David Bernardino Pediatric Hospital -, Cabinda, Huíla and Moxico, while raising the patient service capacity by another 3,772 patients per week. Within the scope of Covid-19, there were six treatment centres built, with three in construction in Luanda, one in Cunene, one in Cabinda, one in Lunda Norte and another in Soyo, while another is in the conclusion phase in Benguela, and in Huíla and Uíge, there was the conversion and re-equipping of treatment units and with every province receiving the high technology means and equipment alongside the laboratory capacity to confirm cases being strengthened with the setting up of ELISA - three Molecular Biology and Serology laboratories in the provinces of Lunda Norte, Huambo and Uíge following direct investment from the Angolan state. Furthermore, in partnership with the oil industry, there was the installation of three laboratories in Cabinda, Soyo and Benguela, boosting the testing capacity to 15,000 tests. This functioning capacity greatly improved the care provided for all diseases transversally across the NHS.


I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

Houve também reforço de pessoal nesta área? O Governo realizou um enorme investimento no aumento da força de trabalho do sector, com o incremento de 25.465 (26%) de novos profissionais resultantes da realização dos maiores concursos de admissão em 2018 e 2019, tendo permitido um crescimento de 65.294, para 87.161 profissionais. O aumento significativo foi notório em todas as carreiras, nomeadamente a médica (2.399), a de enfermagem (14.179), de diagnóstico e terapêutica (7.138), carreira de técnicos de apoio hospitalar (797) e carreira do regime geral (962). Outro marco para a saúde em Angola foi o aumento da cobertura de testes de VIH em mulheres grávidas, de 465, para 625, em 2020. No mesmo ano, o acesso ao tratamento retroviral cresceu de 36%, em 2018, para 71% no ano passado.

Was there also any increase in staffing for this area? The government has carried out enormous investment in boosting the labour force in this sector, with an increase of 25,465 (26%) new professionals resulting from the largest recruitment campaigns in 2018 and 2019 and ensuring an increase from 65,294 to 87,161 professionals. Significant rises took place across all areas, especially doctors (2,399), nurses (14,179), diagnosis and therapeutics (7,138), hospital support technicians (797) and the general career regime (962). Another landmark for health in Angola came with the expansion in the coverage for HIV testing to pregnant women, up from 465 to 625 units, in 2020. In the same year, access to retroviral treatments rose from 36% in 2018 to 71% last year.

E no que diz respeito aos medicamentos? Em relação à política de medicamentos e equipamentos, o Executivo introduziu a isenção de taxas aduaneiras aos medicamentos e equipamentos e dispositivos médicos, estando actualmente em curso novas aquisições de medicamentos, suplementos nutricionais, material de biossegurança e equipamentos para o reforço do SNS. A participação comunitária, através da formação de agentes para o desenvolvimento comunitário e sanitário, as iniciativas no domínio da ética e humanização da saúde, assim como a melhoria da assistência materno-infantil, nutrição e da prestação de cuidados aliados ao combate às grandes endemias são os grandes desafios futuros para melhorar o sistema de saúde a nível nacional.

What about the case of medication? In relation to the medication and equipment policy, the government introduced exemption from customs duties for medication and medical equipment and devices, with new procurement policies ongoing for medication, nutritional supplements, biosecurity materials and equipment to strengthen the NHS. Community participation, through the training of community development and sanitation agents, initiatives in the field of ethics and humanising health as well as improving maternal-infant assistance and the provision of care allied with combatting the great endemics are the major future challenges for the healthcare system at the national level.

Como podem ser superados os desafios? A saúde e bem-estar social são prioridades do Governo de Angola, estando previsto o aumento gradual do investimento público neste sector para a expansão do acesso aos serviços, formação profissional de jovens e modernização dos equipamentos e reforço do fornecimento gratuito dos medicamentos para as enfermidades mais comuns da população, assim como a maior utilização das novas tecnologias para o acesso das populações à ao sistema.

How can these challenges be overcome? Health and social wellbeing are priorities for the government of Angola that is correspondingly planning for gradual increases in public investment in this sector to expand access to services, professional youth training and the modernisation of equipment and the free supply of medication for the most common ailments afflicting the population as well as greater utilisation of new technologies for the populations to access the system.

A Educação, nomeadamente ao nível do primário e médio, tem sido claramente outra preocupação do Executivo. A merenda escolar, a construção de escolas e a melhoria das condições das muitas já existentes, a informatização, ou a formação dos próprios docentes são alguns dos temas do sector. A sociedade civil, nomeadamente a classe empresarial, tem sido um parceiro do Governo nesta área? Em que medida? No âmbito da responsabilidade social, várias instituições, públicas e privadas, em particular igrejas e associações da sociedade civil, nomeadamente a classe empresarial e bancos, têm vindo a colaborar com o Executivo no âmbito de parcerias de cooperação, tanto na construção de escolas completamente equipadas, como no financiamento de programas de inserção escolar para que, de forma gradual, tenhamos todas as crianças a estudar, tanto no meio urbano, como nas áreas rurais. Gostaria de referir o apoio do Banco Mundial, no valor de USD 250 milhões, para financiamento da inclusão escolar, em particular das raparigas.

Education, especially at the primary and middle levels has clearly been another government concern. School meals, the building of new schools and the refurbishment of those already existing, digitalisation and the training of teachers are some themes in this sector. Has civil society, especially the business class, been a partner of government in this field? In what ways? In terms of social responsibility, various institutions, both public and private, particularly churches and civil society associations, especially the business class and banks, have collaborated with the authorities under the auspices of cooperation partnerships both for the construction of completely equipped schools and for financing school attendance programs so that, in a gradual fashion, we may get all children studying both in the urban and the rural contexts. I would like to mention the World Bank support, with a total value of USD 250 million, for financial school inclusion, in particular for girls. In terms of school meals, this academic year saw the emergence 47


POLÍTICA INTERNACIONAL No domínio das merendas escolares, neste ano lectivo surgiram várias iniciativas beneméritas de algumas empresas e instituições, para garantir as mesmas a um número cada vez maior de crianças nas escolas de todo o País, apoio que se junta a muitas iniciativas voluntárias que estão a contribuir para a inclusão e justiça social, a diminuição das assimetrias regionais e a igualdade de oportunidades para todas as crianças, sobretudo as mais desfavorecidas, através de uma solidariedade mais justa. Gostaria também de ressaltar o apoio na formação de raparigas em situação de vulnerabilidade para a frequência de cursos nas áreas da ciência e tecnologia a nível do ensino secundário, que se inicia em Outubro e se estende a Julho de 2023. Um total de 610 bolsas com financiamento do Banco Africano de Desenvolvimento e do Governo vai beneficiar raparigas vulneráveis com vista a minimizar o abandono escolar e contribuir para o empoderamento das mulheres.

of various well-intended initiatives by some companies and institutions in order to guarantee them to increasing numbers of children attending schools across the country, support that comes alongside the many voluntary initiatives that are contributing to inclusion and social justice, reducing regional asymmetries and boosting equality of opportunity for all children, especially the most disadvantaged through a fairer provision of solidarity. I would like to highlight the support for the training provided for young females facing vulnerable situations through attending science and technology programs equivalent to secondary school teaching that began in October and continue to July 2023. A total of 610 grants are financed by the African Development Bank and the government to benefit vulnerable girls with the objective of minimising school dropouts and contributing to the empowerment of women.

Os empresários e a sociedade civil angolana estão mais solidários para as causas sociais hoje em dia do que antes da pandemia? Com o início da pandemia de Covid-19 e o empobrecimento das famílias e agravamento da situação social em geral, gerou-se uma grande onda de solidariedade por parte dos parceiros do Estado, sobretudo nos domínios da assistência social, saúde e educação, o que permitiu que se tivessem associado as iniciativas do Governo no atendimento a mais de cinco milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade e pobreza extrema em todo o País.

Are Angolan business leaders and civil society showing more solidarity towards social causes now than they were before the pandemic? With the outbreak of the Covid-19 pandemic and the impoverishment of households and the general worsening of the social situation, there was a great wave of solidarity from among the state’s partners, especially in the social welfare, health and education sectors, which led them to associate with the government’s initiatives in providing for over five million people facing situations of vulnerability and extreme poverty across the entire country.

Um tema ao qual o Executivo – e a Senhora Ministra em especial – tem também dedicado atenção e que já aqui referiu várias vezes é a promoção da igualdade de género. Se o caminho da igualdade de género tivesse 100 Km, em que ponto do percurso diria que o País está? Diria que estamos a alta velocidade, numa montanha com obstáculos que estão a ser ultrapassados através de políticas assertivas do Executivo, leis que protegem e provêm os direitos das mulheres e a determinação das mesmas. Actualmente as mulheres estão representadas em 29,6% no Parlamento. No Governo central, a presença feminina em cargos de liderança é de 39%, sendo 12% secretárias de Estado, 22% dirigem os governos provinciais, 19,5% são vice-governadoras, 25,6% dirigem administrações municipais e 27,4% ocupam altos cargos diplomáticos. No sector judicial, mais de um terço dos cargos na magistratura do

A theme to which the government – and yourself as minister in particular – has also focused attention on and that you have already mentioned several times is the promoting of gender equality. If the path towards gender equality stretched 100 Km, at what point on the route would you say Angola is at? I would say we are going at high speed, up a mountain with obstacles that are only overcome through assertive state policies, laws that protect and provide rights to women and their selfdetermination. Currently, women account for 29.6% of the seats in parliament. In central government, the female presence in leadership roles stands at 39%, with 12% of Secretaries of State, 22% heading provincial governments, 19.5% of vice-governors, 25.6% of municipal council leaders and with females holding 27.4% of senior diplomatic posts. In the legal system, over a third of public prosecution magistrates are females who make up 38% of employees in the

A E X P E C TAT I VA D E V I D A EM ANGOLA CRESCEU 19 ANOS, ENTRE 2000 E 2 0 1 9 , PA S S A N D O D E 4 2 A N O S , PA R A 61 . E O Í N D I C E D E D E S E N V O LV I M E N T O HUMANO SUBIU DE 0,400 PA R A 0 , 5 8 1 P O N TO S , N O MESMO PERÍODO. 48

L I F E E X P E C TA N C Y I N ANGOLA GREW BY 19 YEARS BETWEEN 2000 AND 2019, RISING FROM 42 TO 61 YEARS OF AGE. AND THE H U M A N D E V E LO P M E N T I N D E X A DVA N C E D F R O M 0.400 TO 0.581 P OINTS OVER THE SAME PERIOD.


I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

Ministério Público são ocupados por mulheres, representando 38% dos funcionários do sector e 31% dos advogados. Ainda existem preconceitos culturais e dificuldades de vária ordem que devem ser supridos através da educação permanente e oportunidades iguais em todos os domínios, para garantir, efectivamente, mais voz e vez às mulheres, para uma maior representação nas estruturas de tomada de decisão e formulação de políticas. Auguro que, no futuro, as mais jovens e as meninas de hoje assumam, com garra e mérito, a continuação da defesa intransigente dos direitos das mulheres.

sector and 31% of lawyers. There are still cultural prejudices and difficulties of various magnitudes that need overcoming through constant education and equal opportunities in every domain in order to effectively guarantee a louder voice on more occasions for women and better representation in the decision and policy making structures. I would predict in the future, young people and the girls of today assume, with determination and merit, the continuation of the intransigent defence of the rights of women.

As áreas sociais na governação são abrangentes e muito interdisciplinares. Esta articulação de esforços entre os diversos ministérios tem vindo a ser reforçada ao longo deste ano e meio de pandemia? A articulação de esforços e o alinhamento de iniciativas têm vindo a ser muito salutares, e temos a incumbência de, por delegação de poderes, orientar as sessões da Comissão Social do Conselho de Ministros, órgão consultivo do Titular do Poder Executivo, o Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço, e, através de outras Comissões interministeriais criadas, promover a consulta permanente e alinhamento dos diversos departamentos ministeriais da área social, para tratar, em conjunto, as matérias do dominio social e outras de interesse nacional que são submetidas, posteriormente, para apreciação e aprovação do Conselho de Ministros.

The social areas of governance are wide reaching and highly interdisciplinary. Has this articulation of efforts among different ministries been strengthened over the course of the last eighteen months of the pandemic? The articulation of efforts and the alignment of initiatives have been very praiseworthy and we have taken on, through the delegation of powers, the orientation of the Social Commission sessions of the Council of Ministers, the consultative body to the executive power of the President of the Republic, João Manuel Gonçalves Lourenço, and through other inter-ministerial commissions set up to promote and constantly consult and align the different departments and ministries in the social area in order to jointly deal with the matters making up the social domain and other issues in the national interest that are subsequently submitted for the appreciation and approval of the Council of Ministers.

Foi Ministra da Cultura antes de assumir este novo desafio no Executivo. O combate à pandemia retira capacidade ao Governo para apoiar este sector? Os artistas e fazedores de arte foram uma das muitas classes afectadas pela pandemia, devido às medidas de prevenção e de combate à Covid-19, tendo sido muito reduzida a sua intervenção pública e actuação ao vivo, embora tivessem surgido iniciativas louváveis através do acesso ao mercado digital e às novas tecnologias, o que lhes permitiu adaptar-se com espírito de resiliência e inovação as exigências do mercado nacional e responder aos desafios impostos pela crise sanitária, criando espaços lúdicos através de diversas manifestações culturais, através da televisão e outros media.

You served as Minister of Culture before accepting this new challenge in the government. Does combatting the pandemic undermine the government’s capacity to support this sector? The artists and creatives were one of the many classes deeply impacted by the pandemic due to the prevention measures for countering Covid-19, with very sharp reductions in their public interventions and live performances even while there have emerged impressive initiative through access to the digital market and to new technologies, which enabled them to adapt with a spirit of resilience and innovation to the demands of the national market and respond to the challenges imposed by the health crisis, creating leisurely spaces through diverse cultural expressions conveyed by television and the other media.

A atracção de investimento estrangeiro é uma necessidade de todos os países, e Angola tem vindo a implementar medidas para captar projectos estruturantes em várias áreas. Tem sentido, por parte dos investidores internacionais, preocupações também com a inclusão e outros aspectos sociais? Notamos com satisfação o aumento do interesse de investidores estrangeiros em áreas cruciais como a educação, a saúde, a formação profissional e técnica, particularmente nos domínios da inovação e investigação científica, assim como no turismo, ambiente e cultura.

Attracting foreign direct investment is another need for every country and Angola has been implementing measures to bring in structural projects in various areas. Does it make sense for international investors to share these concerns over inclusion and other social aspects? We would note with satisfaction the increase in interest from foreign investors in such crucial fields as education, healthcare, professional and technical training, especially in the field of innovation and scientific research as well as in tourism, environment and culture.

Qual o seu maior sonho para Angola? Uma paz duradoura, a consolidação da democracia e um futuro próspero e seguro, para que todos os angolanos, em particular as jovens gerações, possam atingir o seu pleno potencial. l

What is your biggest dream for Angola? A long lasting peace, the consolidation of democracy and a prosperous and safe future for all Angolans, particularly so that the young generations can achieve their full potential. l 49


POLÍTICA INTERNACIONAL

MARTA BETANZOS ROIG*, EMBAIXADORA DE ESPANHA EM PORTUGAL AMBASSADOR OF SPAIN IN PORTUGAL

MARCO Y PERSPECTIVAS DE L A P R ÓX I M A CUMBRE BIL ATERAL FRAMEWORK AND PROSPECTS FOR THE NEXT B I L AT E R A L S U M M I T

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l 28 de octubre, Trujillo, ciudad Patrimonio de la Humanidad, acogerá la Cumbre Bilateral entre España y Portugal, presidida por los respectivos jefes de gobierno y que, siguiendo la tradición, se desarrollará en formato totalmente presencial. La Cumbre, de la que ya se han celebrado más de 30 ediciones, muestra la extraordinaria intensidad y alcance de nuestras relaciones bilaterales y la gran ambición que las preside, particularmente desde nuestra simultánea adhesión a la UE que, además de hacernos más europeos, también nos hizo más ibéricos. Este año, en el que también celebramos el 35º aniversario de la entrada conjunta de ambos países en la Unión Europea, la XXXII Cumbre abrirá una nueva etapa en nuestra estratégica relación de amistad y colaboración mutua. Tres objetivos importantes van a presidir esta Cumbre. 1. La reflexión sobre los grandes debates del momento desde una perspectiva ibérica europea: el impacto de la pandemia y las grandes macro-tendencias. 2. La primera evaluación y puesta en común de la Estrategia 50

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n October 28, Trujillo, a World Heritage city, shall host the Bilateral Summit between Spain and Portugal, chaired by the respective heads of government and which, according to tradition, is to take place in an entirely face-to-face format. The Summit, of which more than 30 editions have already been held, is a proof of the extraordinary intensity and scope of our bilateral relations and the great ambition that presides over them, particularly since we both joined the EU which, in addition to making us more European, also made us more Iberian. We will be celebrating also this year the 35th anniversary of the joint entry of both countries into the European Union and on this particular occasion the 32nd Summit thus opens up a new stage in our strategic relationship of friendship and mutual collaboration. This Summit focus on three major objectives. 1. Reflection on the current debates ongoing from a European Iberian perspective: the impact of the pandemic and the big macro-trends. *Texto escrito na língua de origem do autor


I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

TRUJILLO

de Desarrollo Transfronterizo, adoptada hace un año en la Cumbre de Guarda. Gracias a ella se ha institucionalizado una ambiciosa dinámica de diálogo y cooperación en pos de la integración de La Raya en todos los procesos de transformación económica y social de nuestros estados, poniendo freno a la despoblación y facilitando la comunicación y la interconexión entre poblaciones, habitantes y trabajadores a ambos lados de la frontera, de modo que esta se consolide como polo de desarrollo y progreso común. 3. Cumplimiento con el compromiso medioambiental y las transiciones que lleva aparejadas, como las energías verdes, la transformación digital y tecnológica. Se espera alcanzar su concreción en torno a proyectos que promuevan interconexiones y una movilidad limpia e inteligente que constituyan, en sí mismos, un motor de crecimiento y transformación. El vehículo eléctrico o las energías renovables son solo dos ejemplos de lo que puede suponer la apuesta común de proyectos que promuevan el cumplimiento de los objetivos de la Agenda 2030 y la mejora de la competitividad de nuestros sectores productivos, puesto que no hay crecimiento sostenible que no repose en la competitividad pero también en la cohesión social. Todos estos proyectos, con el apoyo financiero de los fondos UE Next Generation, estimularán las sinergias necesarias para acometer la transformación verde y digital de la Península Ibérica. En cualquier caso, la Cumbre Bilateral aborda también el trabajo conjunto en el terreno de la producción cultural, la cooperación científica o el turismo, abriendo un horizonte de proyectos a desarrollar y que quedarán enmarcadas en el renovado Tratado de Amistad y Cooperación. Tras casi 45 años de vigencia, este nuevo Tratado vendrá a poner al día la profundidad de nuestras relaciones y proyectar todo su potencial adaptado al contexto y a los desafíos del siglo XXI. En definitiva, Trujillo acogerá la primera Cumbre “postpandemia” y, con seguridad, este momento marcará un nuevo impulso a nuestras relaciones que nos hará recuperar el ritmo y la normalidad previa a la pandemia, pero también afrontar el futuro en mejores condiciones y juntos hacer frente a los diversos desafíos comunes a los que nos enfrentaremos en los próximos tiempos. l

2. The first assessment and sharing of the Cross-Border Development Strategy, adopted a year ago at the Guarda Summit. Thanks to this Summit, an ambitious dynamic of dialogue and cooperation has been institutionalized in pursuit of the integration of the bordering regions, aka La Raya, in all the processes of economic and social transformation of our states, in order to stop depopulation and rendering communication and interconnection easier between populations, inhabitants and workers on both sides of the border, thus consolidating this regions as common development and growth centres. 3. Compliance with the environmental commitment and transitions that it entails, such as green energy, digital and technological transformation. We expect to deliver this with projects promoting interconnections and clean and smart mobility, thus becoming a rightful engine of growth and transformation. Electric cars or renewable energies are just two examples of this common commitment as regards projects that promote compliance with the goals of the 2030 Agenda and improvement of the competitiveness of our productive sectors, in light of the fact that sustainable growth has to include both competitiveness and social cohesion. All these projects, with the financial support of EU Next Generation funds, will stimulate the necessary synergies to undertake the green and digital transformation of the Iberian Peninsula. This Bilateral Summit further addresses the joint work in the field of cultural production, scientific cooperation or tourism, opening up the possibility of developing projects within the scope of the renewed Friendship and Cooperation Treaty. After almost 45 years in force, this new Treaty is a clear sign of the depth of our relations and delivers on its full potential in light of the challenges of the 21st century. In short, Trujillo will be hosting the first “post-pandemic” Summit and this moment means undoubtedly a new impulse in our relations which should help us recover the pace and normality that was there prior to the pandemic, but also face the future in better conditions and together to address the various common challenges that we will encounter in the coming times. l 51


POLÍTICA INTERNACIONAL

R AQUEL VAZ PINTO, I N V E S T I G A D O R A I P R I - U N I V. N O VA RESEARCHER AT IPRI-NOVA UNI.

BEIJING E CABUL: ALINHAMENTO DE INTERESSES BEIJING AND KABUL: AN ALIGNMENT OF INTERESTS

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os últimos meses, o Afeganistão tem estado no centro das atenções mediáticas internacionais. Uma vez mais pelo que parece ser a triste sina deste povo. Na verdade, quando pensamos nas décadas mais recentes a atenção mediática e das grandes potências parece ser a de uma montanha-russa (sem ironia). Nos anos oitenta, a invasão de Moscovo (na verdade no final do ano de 1979) levou os EUA a apoiar todos os opositores; nos anos noventa todos se esqueceram deste território até que, em 2001, o Afeganistão voltou a ser notícia e foi objecto de uma intervenção internacional que terminou … duas décadas depois. Em matéria de combate os afegãos têm de facto uma história invejável. Entre outros, podemos destacar os romanos, os persas, Babur e o início do Império Mogol, a sua independência em 1747 e, de forma mais marcante, a resistência a duas invasões e ocupações do Império Britânico no século XIX que fazem justiça ao seu cognome internacional: “cemitério de impérios”. Voltando a 2021 observámos uma vez uma retirada que só pode ser caracterizada como incompetente e trágica (para ser suave). Por entre as muitas histórias pessoais, os dilemas daqueles que acreditaram numa vida melhor e que sabem perfeitamente o que significa o regresso dos Talibãs, qual é o Império que se segue? Já não é de agora o interesse da República Popular da China no território afegão. Se analisarmos com atenção percebemos que há capacidade e vontade de desempenhar um papel importante neste país. No entanto, o alinhamento de interesses entre Beijing e Cabul parece, à partida, estranho, senão mesmo impossível: de um lado, temos um governo de cariz religioso zelota e, do outro lado,

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n recent months, Afghanistan has very much been the focus of international media attention. Once again due to what seems to be the sad fate of this people. In fact, when we consider recent decades, media attention seems to have the great powers playing Russian roulette (no irony intended). In the 1970s, the Soviet invasion (in fact, right at the end of 1979) led the United States to support all of the opposition forces; in the 1990s, everybody forgot about these lands until, in 2001, Afghanistan once again jumped onto the front pages and was subject to international intervention that ended… two decades later. In terms of military combat, the Afghans have an unenviable history. Among others, they have seen off the Romans, the Persians and the beginning of the Mongol Empire through to their own formal independence in 1747 and, in a still more dramatic fashion, their resistance to two invasions and occupations by the British Empire in the 19th century that all lend due resonance to its international nickname: “cemetery of empires”. Returning to 2021, we may again observe a withdrawal that can only be characterised as incompetent and tragic (to keep it polite). Among the many personal stories, the dilemmas for those who believed in a better life and know perfectly well what the return of the Taliban actually means, what empire is going to come along next? The interests of the People’s Republic of China in the Afghan territory are certainly nothing new. If we analyse carefully, we may perceive how there is the capacity and desire to play an important role in this country. However, the alignment of interests between Beijing and Kabul would from the outset seem rather strange where not even impossible: on the one hand,


I N T E R N AT I O N A L

um país que se assume de forma militante como ateu e que tem campos de concentração de uigures muçulmanos na região chinesa de Xinjiang. Esta divergência parece afastar à partida estes dois pólos. No entanto, há uma convergência de interesses internos e externos que ajuda a compreender a fase muito positiva das relações entre a China e Afeganistão. Em primeiro lugar, a saída internacional e, em particular, dos EUA é algo que une Cabul e Beijing para além da fronteira comum. Em segundo lugar, há necessidade de investimento e de recursos financeiros que a China pode providenciar e o Afeganistão agradece e que pagará com os seus recursos. Para Beijing é mais uma peça importante no enquadramento e na envolvência da estratégia da Nova Rota da Seda. Em terceiro lugar, o contexto regional é importante, mas por razões diferentes. Ao tentar ser influente em território afegão a China desfere mais um golpe na vizinhança da Índia, ou seja, é mais um país no qual a China parece ter mais preponderância. A rivalidade entre a China e a Índia, bem patente por exemplo nos conflitos na sua fronteira e que resultaram em baixas para os dois lados em 2020, é uma das dimensões mais importantes em toda a região. Para os Talibãs o retraimento da Índia a favor do Paquistão é um resultado bem acolhido. E, por último, estamos a falar de dois países que são ditaduras e que não têm qualquer dilema em matéria de direitos humanos. Mais ainda, no caso da China estamos a falar de uma ditadura com direito de veto no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas. No entanto, como a História bem nos ensina é preciso prudência e cautela face ao que se considera influência ou poder externos no Afeganistão. Essa é uma lição bem custosa que muitos tiveram que digerir. Em suma, é bom não descartar a capacidade afegã de resistir e de ludibriar aqueles que pensam que finalmente domaram o “cemitério de impérios”. l

POLITICS

a government with a zealous religious outlook and, on the other hand, a country that takes a militant atheist stance and capped by the Uyghur Muslim concentration camps in the Chinese region of Xinjiang. Such divergence would seem to maintain these poles at a clear distance. Nevertheless, there is a convergence of internal and external interests that help in understanding the very positive phase in relations between China and Afghanistan. Firstly, the international exit, in particular by the United States, is something that unites Kabul and Beijing beyond their shared border. Secondly, there is a need for investment and financial resources that China might provide and Afghanistan would be grateful to receive and paying back through its natural resources. For Beijing, this is another important piece in the framework and strategic context for the New Silk Road. Thirdly, the regional context is important but for different reasons. In striving for influence in Afghanistan, China lands yet another blow on its neighbour India by thus registering another country where China seems to hold the greatest preponderance. The rivalry between China and India, clearly reflected in the clashes on the border that led to loss of life on both sides in 2020, is one of the key dimensions throughout the region. From the Taliban viewpoint, the undermining of India, thereby favouring Pakistan, is a very welcome outcome. Lastly, we are also talking about two dictatorships that show zero restraint as regards human rights. Furthermore, in the case of China, we refer to a dictatorship with a right of veto on the United Nations Security Council. However, as History so very well teaches us, it is necessary to express prudence and caution as regards external influences or power over Afghanistan. Doing otherwise is a very costly lesson many have had to digest. In summary, it is better not to overlook the Afghan capacity to resist and deceive those who think they have finally tamed the “cemetery of empires”. l 53


POLÍTICA INTERNACIONAL

BRUNO CARDOSO REIS SUB-DIRECTOR DO CENTRO DE ESTUDOS INTERNACIONAIS DO ISCTE-IUL SUBDIRECTOR OF THE INTERNATIONAL STUDIES CENTRE OF ISCTE-IUL

O QUE NOS INTERESSA O

AFEGANISTÃO? W H AT D O E S A F G H A N I S TA N M E A N T O U S ?

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parentemente pouco. Está longe: A distância de Lisboa a Cabul é c.7000 km. Porém, Nova Iorque e Washington D.C. estão ainda mais distantes do Afeganistão. Isso não impediu que tivessem sido alvo de um ataque, a 11 de setembro de 2001, que vitimou mais de 2900 pessoas, planeado e coordenado pela al-Qaida a partir do santuário que os talibãs lhe ofereciam no território afegão. O recrudescimento do terrorismo é um dos riscos a que devemos estar atentos com o regresso dos talibãs ao poder. É bem possível que eles não possam ou não queiram evitar que o país seja novamente transformado num santuário terrorista. Um território seguro permite aos terroristas crescer e organizar ataques mais perigosos, como vimos com o Daesh depois da retirada dos EUA do Iraque. Há ainda o risco do uso propagandístico da retirada precipitada dos EUA e aliados para alimentar o recrutamento de grupos semelhantes do Sahel até Moçambique. E sabemos que os ocidentais são alvos preferenciais do jihadismo transnacional. É verdade que não houve ataques terroristas recentes no território português. Mas a complacência é perigosa a este respeito. E tal não quer dizer que não tenham já feito vítimas portuguesas. Por exemplo, nos ataques do 11 de setembro de 2001, houve 9 mortos portugueses ou luso-descendentes. Ou seja, o Afeganistão – historicamente um tampão e tabuleiro no choque de grandes potências na Ásia – pode dar-nos pistas importantes sobre a evolução da geopolítica global. Desde logo, a retirada dos EUA do Afeganistão confirma e reforça uma tendência de retraimento estratégico norte-americano. Apesar das diferenças entre sucessivos presidentes, esta tendência vem de Obama, e reforçou-se com Trump e com Biden. Os EUA poderiam ter mantido, com custo limitado, algumas tropas para sustentar um governo afegão amigável.

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pparently little. It’s a long way away: the distance from Lisbon to Kabul is c.7,000 km. However, New York and Washington D.C. are further away than Afghanistan. This did not stop the launch of an attack, on 11 September 2001, that killed over 2,900 people, planned and coordinated by al-Qaida from the sanctuary that the Taliban provided them on Afghan territory. The re-emergence of terrorism is one of the risks that we should be attentive to with the Taliban back in power. It is quite possible that they cannot or do not want to avoid the country once again becoming a terrorist sanctuary. A safe haven for terrorists to plot and plan more dangerous attacks, as we saw with Daesh following the withdrawal of the United States from Iraq. There is also the risk of the propaganda benefits of the sudden retreat by the US and its allies for driving recruitment by similar groups from the Sahel to Mozambique. And we know that the West provides the preferred targets for transnational jihadism. While there have been no recent terrorist attacks on Portuguese territory, complacency is dangerous in such matters. And this does not mean that there have not been Portuguese victims. For example, in the 11 September 2001 attacks, nine Portuguese or Portuguese descendants lost their lives. Thus, Afghanistan – historically a buffer and war zone for the great powers of Asia – may provide us with important clues on the trend in global geopolitics. From the outset, the withdrawal of the United States from Afghanistan confirms and strengthens the trend in the American strategic retrenchment. Despite the differences between the successive presidents, this trend reaches back to Obama, and deepened under first Trump and now Biden. The United States might have maintained, with limited costs, enough troops to prop up a friendly Afghan government. They might have held on a little longer to facilitate a more orderly (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


I N T E R N AT I O N A L Poderiam ter ficado um pouco mais de tempo para facilitar uma transição mais ordeira e uma evacuação mais fácil. Não o quiseram fazer. Isto corresponde a uma postura externa mais nacionalista e protecionista, de menor investimento no exterior. É verdade que o retraimento dos EUA em várias regiões do Mundo é justificado com o chamado ‘pivot’ ou reequilíbrio no sentido do reforço de uma presença norte-americana no chamado Indo-Pacífico. (Um resultado concreto, em Portugal, desta mudança de postura dos EUA tem sido o desinvestimento na Base das Lages – embora a este respeito haja também outros fatores.) É certo que, nas palavras de Biden e dos seus conselheiros, deixando de estar “presos” ao Afeganistão, os EUA terão mais meios para serem usados noutras paragens mais prioritárias. Mas isso também significa que abdicaram de contar com uma presença militar forte no coração da Ásia Central e num país que faz fronteira com a China. Admito que a presença no Afeganistão fosse pouco interessante – pela força militar dos talibãs e pelas claras fragilidades do governo afegão. Mas do meu ponto de visto é um erro os EUA pensarem que a contenção da ascensão global da China pode ser feita apenas no Mar do Sul da China ou no Extremo Oriente. O novo líder chinês Xi Jinping não deixa dúvidas quanto às ambições globais da China, aliás, naturais, tendo em conta a história e a dimensão deste velho império disfarçado de Estado-nação. O investimento em portos e outras infraestruturas, conhecido como “Belt and Road” é uma manifestação concreta e bilionária disso mesmo. Outra é o enorme crescimento da marinha chinesa, que já alcançou a norte-americana, pelo menos em quantidade. Um dos países prioritários nesta estratégia global chinesa tem sido o Paquistão. O que permitiu a este último país desafiar os EUA, seu tradicional protetor durante a Guerra Fria, nomeadamente no apoio aos talibãs afegãos. O território paquistanês permite, efetivamente, ligar o Extremo Ocidente chinês ao Oceano Índico. Isso permitirá à China, aos seus meios navais – comerciais e militares –, ter uma presença mais forte no Índico, sem precisar de passar pelo estreio de Malaca, que pode ser facilmente bloqueado. Claro, desde que o novo Afeganistão não desestabilize a região. Os EUA têm enfrentado sérias crises económicas e políticas, mais difíceis de gerir por virtude de uma hiperpolarização política identitária. Estas distrações internas tendem a limitar os compromissos externos de qualquer potência. Será bom que, apesar disso, os EUA se lembrem que precisam da Europa mais do que nunca. Nunca os EUA enfrentaram uma potência hostil que representasse mais do que 60% do seu PIB – esse era o valor somado do PIB da Alemanha Nazi e do Japão, em 1941, ou da URSS. Já a China está perto de atingir paridade económica com os EUA e tem a escala para os ultrapassar. Os EUA precisam mais do que nunca da Europa para reequilibrar a balança global, e não encontrarão aliados mais semelhantes em nível de desenvolvimento, riqueza, valores ou interesses. O que é claro é que, todos nós, devemos preparar-nos para um período mais conflituoso e mais incerto da vida internacional. Diz-nos a história que a ascensão de uma nova grande potência raramente é pacífica. l

POLITICS

transition and an easier evacuation process. They did not want to do so. This corresponds to a more nationalist and protectionist external stance with less investment in the wider world. It is true that the retraction of the US in various regions around the world is justified by that referred to as the ‘pivot’ or rebalancing within the scope of strengthening the American presence in the Indo-Pacific region (with one concrete result of this change in the American posture for Portugal being the disinvestment in the Lages Military Base – even though there are other factors at play). Certainly, in the words of Biden and his advisers, no longer “imprisoned” in Afghanistan, the US gains more means for deployment in other, higher priority destinations. However, this also means giving up on a strong military presence in the heart of Central Asia and in a country adjoining China. I accept that the presence in Afghanistan was of little interest – due to the military strength of the Taliban and the clear weaknesses in the Afghan government. However, in my point of view, it is an error for the United States to think that containing the global advance of China may be limited to the South China Sea or the Far East. The Chinese leader Xi Jinping holds no doubts about the global ambitions of China, indeed, understandably when taking into consideration the history and scale of this old empire disguised as a nation-state. The investment in ports and other infrastructures, known as the “Belt and Road” project, is a concrete and multi-billion expression of this. Another is the enormous growth in the Chinese navy and that has already matched the American fleet at least in quantitative terms. One of the priority countries in this global Chinese strategy has been Pakistan. This has enabled the latter to challenge the United States, its traditional protector during the Cold War, especially in the support for the Afghan Taliban. Pakistan effectively allows its territory to connect the Chinese Far East to the Indian Ocean. This enables China, and its naval means – both commercial and military –, to display a stronger presence in the Indian Ocean without needing to go through the Straits of Malacca, which may be easily blocked off. Of course, at least if this new Afghanistan does not destabilise the region. The United States has faced serious economic and political crises rendered more difficult to manage due to the hyperpolarisation of its identity politics. These internal distractions tend to limit the external commitments of any power. Despite all of this, it would be useful for the United States to remember that it needs Europe more now than ever. Never did the country face a hostile power that represents over 60% of its GDP – with this the accumulated total of Nazi Germany and Japan GDP in 1941, or the USSR. In turn, China is already close to obtaining economic parity with the United States and has the scale to overtake. The US needs Europe more than ever to rebalance globally and will not be able to encounter similar allies elsewhere in the world in terms of development, wealth, values and interests. What is clear is that we all should be preparing for a period of greater conflict and uncertainty in international life. History clearly states that the rise of another great power rarely takes place peacefully. l 55


POLÍTICA INTERNACIONAL

MARIA MANUEL LEITÃO MARQUES, DEPUTADA AO PARL AMENTO EUROPEU MEMBER OF THE EUROPEAN PARLIAMENT

E ST R AT É G I A : UM CO NCEITO

PA R A L E VA R A S É R I O

S T R AT E G Y: A C O N C E P T T O TA K E S E R I O U S LY

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stratégia é uma palavra grega, que significava a arte de fazer a guerra. Hoje designa os planos e ações necessários para alcançar um determinado objetivo ou resultado em qualquer atividade (política, empresarial, etc.). Em Portugal, sempre precisámos de estratégia para várias políticas públicas, mas quando olhamos para a nossa história, foram mais as vezes em que a ela esteve ausente do que aquelas em que contámos com a sua companhia. A palavra é frequentemente abusada no discurso político e a seguir olvidada nas ações. Mesmo quando uma estratégia existe desenhada no papel, parece que a vontade de a ter se esgota nesse momento. No caminho, são frequentes os esquecimentos suscitados pela força das circunstâncias, pela velocidade com que é preciso executar fundos europeus, pelas mudanças de governo e tudo mais o que poderia aqui exemplificar, se não fosse evidente para tantos. Contudo, não estamos condenados. Houve casos bem-sucedidos; um deles foi sem dúvida o da ciência e, mais recentemente, o das vacinas. Será que podemos

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trategy emerges from the Greek word meaning the art of making war. Today, the concept designates the plans and actions necessary to achieve a specific objective or result from whatever activity (politics, business, etc.). In Portugal, we have always needed strategies for various public policies but, when looking to our history, there are more occasions on which strategy was absent than when we were able to count on its company. The word frequently gets abused in political discourses and ignored in the following actions. Even when there is a strategy set out on paper, it seems the desire to implement it ends at that same moment. On the way, there is frequent forgetfulness driven by the force of circumstances, the speed needed to apply European funding, by changes in government and all the other examples that might be given were they not so clear to so many. However, we are not condemned to this fate. There were successful cases; one was undoubtedly the field of science and, more recently, the vaccination (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


I N T E R N AT I O N A L esperar o mesmo dos fundos recuperação e resiliência, a que se soma o novo quadro de fundos europeus? 1. A estratégia nacional da ciência teve início com uma boa escolha do seu protagonista, que se repetiu uma e duas vezes, provando que as pessoas é que são mesmo insubstituíveis. José Mariano Gago desenhou a sua estratégia para a política científica ainda como presidente da JNICT (agora Fundação para Ciência e Tecnologia) e executou-a como ministro de vários governos socialistas, com curtas interrupções. Eu era investigadora na altura e testemunhei como passámos de fazer ciência por acaso para uma comunidade científica organizada e devidamente avaliada. Apesar da partida inesperada do principal protagonista, condições políticas favoráveis fizeram com que a estratégia prosseguisse, como mostram os resultados obtidos nos últimos 5 anos. A balança de pagamentos tecnológica é positiva e cresce sistematicamente. A taxa de graduados com ensino superior na população atingiu este ano 45,5%, para o que muito contribuiu a valorização do ensino politécnico. O número de investigadores na população ativa cresce para um máximo também histórico de cerca de 10,2 investigadores por mil ativos em 2020, 41% dos quais nas empresas. A despesa total em I&D atingiu um novo máximo em 2020, crescendo mais de 43% desde 2015. E há outros programas em curso que complementam e reforçam a estratégia da ciência, como o do espaço e o das competências digitais, apenas para dar dois bons exemplos. Visto de Bruxelas, esta é sem dúvida aquela área onde tudo bate certo com os melhores objetivos traçados na União. A “guerra” não está ganha, mas foram muitas as batalhas já vencidas. 2. O segundo caso, muito mediático, mas bastante mais simples, foi o das vacinas. Uma vez mais com objetivos claros, organização, comando e controlo, e interiorização do que havia a fazer por todos que tinham de executar o plano de vacinação, Portugal conseguiu situar-se entre os melhores no conjunto dos países europeus na execução desta estratégia e nos resultados obtidos. 3. Temos agora um novo desafio estratégico para que a execução do PRR e do novo quadro de fundos europeus não seja uma manta de retalhos, incapaz de nos proteger de crises no futuro e de nos preparar para enfrentar as transições digital e climática, as quais vão exigir muitas mudanças na economia, na administração pública, na mobilidade, nas profissões e sobretudo na vida quotidiana de todos nós. Para que isso aconteça, uma vez mais, não bastará ter uma boa estratégia escrita por uma mente iluminada. É preciso que ela seja coordenada centralmente, percebida e apropriada por muitos decisores, de modo a que o caminho seja percorrido sem desvios, exceto os ajustes necessários a um mundo que está a mudar a velocidade estonteante.

POLITICS

campaign. Might we then expect the same for the PRR – the Recovery and Resilience Plan, which comes in addition to the new European funding framework? 1. The national science strategy started out with a good choice of leader, which was repeated once or twice and thus demonstrating that people truly are irreplaceable. José Mariano Gago designed his strategy for a science policy while still the President of JNICT (now the Foundation for Science and Technology) and implemented it as minister in various Socialist governments with only brief interruptions. I was a researcher at the time and a witness to how we went from doing science by chance to become an organised and duly evaluated scientific community. Despite the unexpected departure of its lead architect, favourable political conditions ensured that the strategy advanced as indeed demonstrated by the results obtained in the last five years. The technological balance of payments is positive and growing systematically. The rate of higher education graduates in the population this year reached 45.5% to which the value paid to polytechnic education greatly contributed. The number of active researchers in the population grew and hit a historical peak of around 10.2 researchers per thousand active persons in 2020, with 41% employed by the private sector. Total expenditure on R&D reached a new maximum in 2020, up over 43% since 2015. And there are other ongoing programs that complement and reinforce the science strategy with the space and digital competences programs providing two good examples. Seem from Brussels, this is undoubtedly an area where everything strikes the right chord with the best of the objectives handed down by the Union. The ‘war’ is not won but many battles have been successfully fought. 2. The second case, more mediatic but far simpler, emerges out of the vaccination campaign. Once again, there were clear objectives, organisation, command and control and the internalisation of what needed to be done by those implementing the vaccination plan. Portugal managed to rank among the best of European countries in executing this strategy and the results thereby obtained. 3. We now have a new strategic challenge to ensure the implementation of the PRR and the new framework of European funding does not prove a patchwork blanket, incapable of protecting us from future crises or prepare us to deal with the digital and climate transitions, which will require many changes to the economy, the state administrative structure and mobility, both in professional terms and above all in the daily lives of us all. For this to happen, once again, it is not enough to have a good written strategy for an enlightened mind. It is necessary that this is centrally coordinated, perceived and appropriated by the many decisionmakers to ensure the path is followed without deviations other than the adjustments necessary to a world that is changing at an astonishing pace. 57


POLÍTICA INTERNACIONAL

Vejo que isso mesmo é o que está a ser organizado, mas, conhecendo o terreno onde a ação vai decorrer, confesso-me ainda receosa. Temo que o desafio das competências e a aposta no conhecimento, que devem ser prioritários, não sejam levados a sério só porque os seus resultados não são visíveis a curto prazo. Temo que sejamos desviados pela tentação do betão, que mostra obra e tem sido a principal zona de conforto na execução de fundos europeus. Haverá investimentos deste tipo que são indispensáveis, incluindo na habitação, mas outros seguramente não, em especial quando abandonam a recuperação do edificado a favor da obra nova. Tenho medo do “gato por lebre” na tecnologia para a transição digital, em especial no setor público. É fácil cair na tentação de encomendar mais um portal para substituir o anterior sem que ele traga grande valor acrescentado. Fazer diferente, inovar, mexe muito com as pessoas e as organizações, que em geral resistem a qualquer mudança, e exige lideranças competentes, persistentes e pacientes. Temo a falta de continuidade na condução desta estratégia. Se ela não for assumida por quem toma as decisões, se não houver um comando corajoso e deixarmos cada um a tratar da sua quinta, do seu concelho, da sua área de governo, vai ser uma oportunidade apenas parcialmente aproveitada. Para além do normal entusiasmo com os recursos tão dificilmente conquistados, precisamos de mais inquietação e desassossego. É a eles que temos de ir buscar a energia para executar esta estratégia e assim ganhar a luta pela nossa relevância como país na família europeia e global. l 58

I perceive this as at the core of being organised but, knowing the terrain where the actions are taking place, I confess to feeling fearful. I fear the challenge of the competences and the investment in knowledge, which have to be priorities, are not taken seriously because the results do not become visible over the short term. I fear that we will be distracted by the temptation of concrete, which demonstrates work-done and has been the key zone of comfort for the expenditure of European funding. There are investments of this type that are essential, including in housing, but others most certainly are not particularly when abandoning rehabilitation in favour of new constructions. I am afraid of getting “a pig in a poke” in the technology for the digital transition, especially in the public sector. It is easy to succumb to the temptation of commissioning another website to replace the former without gaining any significant added value. Making a difference and innovating interferes greatly with the routines of people and organisations that generally throw up resistance to any change and correspondingly requires competent, persistent and patient leadership. We have a lack of continuity in delivering this strategy. If this does not get assumed by those taking decisions, if there is no courageous command and we leave each one to sort out their own backyard in their particular area of government, this shall only ever be only a partially leveraged opportunity. Beyond the normal enthusiasm at resources otherwise so difficult to attain, we need greater concern and relentless inquiry. This is what we need to search for the energy to implement this strategy and thereby stake out a place of relevance in the European and global family of nations. l


I N T E R N AT I O N A L

POLITICS

ANTÓNIO MATEUS, JORNALISTA JOURNALIST

O “NOVO PETRÓLEO” QUE AJOELHA

A ÁFRICA DO SUL

T H E “ N E W O I L” B R I N G I N G S O U T H A F R I C A TO ITS KNEES

O

roubo de cobre é uma prática quase tão antiga como a noção do valor daquele que foi o primeiro metal minerado e trabalhado pelo homem, mas nunca à actual escala, particularmente na África do Sul, ao ponto de estar a comprometer a economia mais industrializada e com melhores infraestruturas de todo o continente africano. Só os “gigantes” sul-africanos de electricidade, Eskom, de telecomunicações, Telkom, e a ferroviária, Transnet, registaram perdas anuais de centenas de milhões de euros por roubos maciços de cablagens de cobre, o metal com maior eficácia na condução eléctrica (só batido nessa propriedade pela prata). Não menos grave é o impacto mutilador desses furtos sobre a capacidade operacional de empresas pilares da economia e da mobilidade de pessoas e bens, não só no país, mas em toda a África Austral. Durante a sua apresentação do “Estado da Nação”, perante o Parlamento reunido na Cidade do Cabo, o presidente Cyril Ramaphosa vincou que o roubo de cablagens, perturbações de locais de construção e ocupações de terras prejudicam a actividade económica e desencorajam o investimento no país quando este atravessa um quadro recessivo e é forçado a desviar recursos públicos para reposição das infraestruturas vandalizadas em prejuízo da criação de condições de apoio aos mais desfavorecidos. Ramaphosa reiterou a instrução às autoridades policiais e judiciais sul-africanas de intensificarem o combate a todas as actividades ilícitas danosas à economia sul-africana, uma medida que já fora traduzida na gravidade de penas

T

he theft of copper is a practice almost as ancient as the notion of value attributed to what was the first metal to get mined and worked by man but never on quite the current scale, especially in South Africa to the point of beginning to compromise the most industrialised economy and with the best infrastructures on the entire African continent. The South African “giants” in electricity, Eskom, telecommunications, Telkom, and the railway company, Transnet, register annual losses of hundreds of millions of euros for mass theft of copper cabling, the metal with the greatest efficiency for conducting electricity (beaten only by silver in this property). No less harmful is the mutilating impact of these thefts on the operational capacity of these pillar companies to the economy, ensuring the mobility of people and goods not only nationally but throughout all of Southern Africa. During his “State of the Nation” speech before a parliamentary meeting in Cape Town, President Cyril Ramaphosa stated that the theft of cabling, local disturbances on construction sites and land occupations were harmful to economic activity and discouraged investment when the country is already going through a recessionary period and is forced to divert public resources to the replacement of vandalised infrastructures to the cost of creating the conditions to support the most disadvantaged. Ramaphosa reiterated the instructions to the South African police and judicial authorities to intensify the combat of all the illicit activities damaging the national 59


POLÍTICA INTERNACIONAL atribuídas em julgamentos concluídos este ano, de casos de furto de cabos de cobre; só num deles, o Tribunal Regional de Kroonstad atribuiu penas cumulativas de 224 anos de prisão a três acusados de roubo de cabos de cobre, em infraestruturas da Eskom, num processo onde as investigações foram conduzidas por uma empresa privada contratada para o efeito pela fornecedora eléctrica sul-africana. Três meses antes, o Tribunal Supremo da Cidade do Cabo atribuiu penas cumulativas de 1.250 anos a réus dados como culpados em 50 casos de roubo, cometidos nas regiões de Namaqualand e do Cabo Ocidental, em infraestruturas da Eskom e da Telkom, uma sentença recebida na altura com esperança pela chefe de segurança da Eskom, Karen Pillay. “Esperemos que esta sentenças pesadas transmitam uma mensagem forte a todos os potenciais ladrões de se absterem de escolher como as cablagens suspensas e subterrâneas da Eskom. Trabalharemos sem hesitações e incansavelmente com todas as partes interessadas e organismos judiciais e policiais para assegurar que todos os ladrões envolvidos em crimes sobre infraestruturas essenciais enfrentam toda a força da lei!”, augurou a responsável da empresa que só em 2019 já gastara mais de dois mil milhões de grandes (cerca de 118,5 milhões de euros) a repor cablagens de cobre roubadas. Mas do outro lado da mesa fala mais alto, para muitos, a escalada da procura do cobre nos mercados internacionais (decorrente da opção da energia eléctrica em prejuízo da fóssil) que já ultrapassa a capacidade de mineração e produção deste metal, tornando particularmente rentável o recurso a fontes recicladas, sejam elas legais ou de origem criminosa. E se dúvidas houvesse sobre a factura desta última, no relatório anual de 2020 da cidade índica de Durban, um dos dois principais eixos de escoamento ferro-portuário do país e da sub-região - só ultrapassado pela Cidade do Cabo – alerta-se que “a África do Sul enfrenta um grande problema com o roubo de cobre” e que este tem “impacto negativo sobre todos os cidadãos”. Adianta

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economy in keeping with the introduction of more severe penalties for trials concluding this year in cases of copper theft. One instance alone, the Regional Court of Kroonstad attributed a cumulative sentence of 224 years in prison for three persons accused of copper cable theft from an Eskom infrastructure in a process where the investigation was carried out by a private firm purpose contracted for this purpose by the South African energy supplier. Three months earlier, the Supreme Court of Cape Town handed down a cumulative sentence of 1,250 years to defendants found guilty of 50 cases of theft committed throughout the regions of Namaqualand and Western Cape at infrastructures belonging to Eskom and Telkom, a verdict that was received at the time with a certain hope by the Eskom head of security, Karen Pillay. “We hope these heavy sentences convey a strong message deterring all potential thieves from targeting the Eskom suspension and underground cables. We shall work without hesitation and tirelessly with all interested parties and judicial and police entities to ensure that all thieves involved in crimes against core infrastructures face the full strength of the law!”, promised the security head at a company that in 2019 alone had spent over two billion rand (around 118.5 million euros) in replacing stolen cabling. However, the siren call of the other side sounds louder and the hike in demand for copper on international markets (stemming from the option for electricity in favour of fossil fuels) has already exceeded the current mining production capacity for this metal, making recourse to recycled sources particularly profitable whether of legal or illegal origins. And if there were any doubts as regards the latter, the annual 2020 report of the Indian Ocean city of Durban, one of the main rail and port transport hubs for the country and the sub-region – behind only Cape Town – warns that “South Africa faces a major problem with the theft of copper” and this has a “negative impact on every citizen”. The report


I N T E R N AT I O N A L ainda que “o negócio da venda de sucata tornou-se muito lucrativo, com negociantes sem escrúpulos a comprarem cobre sem levantar questões” e que o cobre roubado é depois exportado para países como a China e a Índia. Bank of America alerta que o “cobre pode esgotar” A tendência de escalada do preço do cobre nos mercados internacionais é tal que foi mesmo descrito como “o novo petróleo” por David Neuhauser, fundador e director do fundo de investimento norte-americano Livermore Partners, em declarações à cadeia televisão CNBC. Perante o disparo da procura e o dreno das reservas disponíveis, o Bank Of America alerta que “o cobre pode esgotar” e duplicar de custo, até 2025, ultrapassando a marca doa 20 mil dólares por tonelada métrica. E no país de Nelson Mandela, a maior rede infaestrutural do continente africano, financiada no último século pelas receitas fiscais dos sectores mineiro, industrial e agrícola está a revelar-se um “El Dorado” para os traficantes internacionais e quem os abastece. O Instituto de Estudos de Segurança, de Pretória, identifica evidências de os compradores estrangeiros – entre os quais tríades chinesas e outros grupos asiáticos – estarem agora a contornar os sucateiros sul-africanos em reação ao reforço do escrutínio destes pelas autoridades. “Um sindicato paquistanês, com endereço em Hillbrow (bairro “complicado” de Joanesburgo) tem usado contentores em áreas desertificadas como pontos de despejo de cobre roubado”, identifica o “paper” do ISS. ”Estes contentores são depois conduzidos para Durban e dali embarcados para o exterior com documentação aduaneira forjada”. “O preço consistentemente elevado do cobre torna-o um bem valioso para o negócio ilícito. Os ladrões são analistas de mercado sofisticados que decidem quando o preço do cobre atingiu um tal valor que o roubo deste produto em particular é mais compensador (na relação risco/preço) do que qualquer outro. O cobre está acessível um pouco por todo o lado, desprotegido e como tal fácil de roubar dada a extensão das redes da Transnet, da Eskom e da Telkom”. Os investigadores do ISS avançam que um quarto grupo potencialmente beneficiário do roubo de cobre poderá ser a indústria de segurança privada, por ter mais interesse na manutenção do problema do que na resolução do mesmo. “Algumas receberam, grandes contractos para combater o roubo de cobre e proteger infraestruturas do Estado, mas até aqui há poucos sinais da sua eficácia”, sublinha. “É útil (neste domínio) comparar as estatísticas de perdas da Transnet e da Telkom, que contrataram empresas privadas de segurança, com as da Eskom, que mudou recentemente para um ataque ao problema com meios próprios”. Uma sucessão de reportagens sobre este tema do reconhecidamente credível media sul-africano “Daily Maverik”, deixaram a nú a forma como se processou (e ainda decorre) a vaga de pilhagens e vandalismo que atingiu a rede ferroviária sul-africana e o grau de devastação por ela provocado, com especial incidência durante os períodos de confinamento devido à pandemia do novo coronavírus. A acrescer ao roubo de centenas de quilómetros

POLITICS

then adds that “the scrap-metal business has become very lucrative with scrupulous traders buying up copper without asking any questions” and that this stolen copper then gets exported to countries such as China and India. Bank of America warns that “copper may run out” The upward hikes in the price of copper on the international markets have even driven comments describing it as “the new oil” by David Neuhauser, founder and director of the American investment fund Livermore Partners, in declarations to the CNBC television station. Given the soaring demand and the drain on the reserves available, the Bank Of America warns that “copper may run out” and double in cost through to 2025 exceeding the limit of 20,000 dollars per metric ton. And the country of Nelson Mandela, with the largest infrastructural networks on the African continent financed in the last century by fiscal revenues from the mining, industrial and agricultural sector, has turned into an El Dorado for international traffickers and those who supply them. The Pretoria Institute of Security Studies (ISS) has identified evidence of foreign buyers – including Chinese triads and other similar Asian groups – are now skirting around the South African scrap metal dealers in reaction to the heightened scrutiny by the authorities. “One Pakistani syndicate, with an address in Hillbrow (a “complicated” neighbourhood in Johannesburg) has deployed containers in deserted areas as points to deposit the stolen copper”, identifies the ISS paper. “These containers are then driven to Durban and there loaded onto export vessels under forged customs documentation”. “The consistently high price of copper turns it into a valuable good for illegal trading. The thieves are sophisticated market analysts who decide just when the price of copper reaches a particular level then the theft of this product in particular provides the best returns (in the risk/price relationship) than any other. Copper is available, to a greater or lesser extent, everywhere, unprotected, and as such easy to steal given the extent of the Transnet, Eskom and Telkom networks”. The ISS researchers advance how one of the four groups of potential beneficiaries from the theft of copper might be the private security industry with a greater interest in maintaining the problem rather than contributing to its resolution. “Some receive very large contracts to combat the theft of copper and protect state infrastructures but there have thus far been few signs of their effectiveness”, the report highlights. “It is useful (in this framework) to compare the statistics for losses from Transnet and Telkom, which hire private security agencies, with those of Eskom, which recently switched to dealing with the problem through its own means”. A series of reports on this theme by the recognisably credible South African media outlet “Daily Maverik” starkly portray the way in which this has advanced (and is still ongoing) in dealing with the wave of looting and vandalism that struck the South Africa railway networks and the level of devastation thereby caused, with a 61


POLÍTICA INTERNACIONAL

de cabos de cobre (e até de segmentos de carris) ao longo da rede ferroviária e, em particular, nas estações, a escala do vandalismo nestas evidente, reduziu-as a um cenário de ruína e devastação. No Cabo Ocidental, pilhagens e vandalismo levaram à redução desde 2019 de 444 para 151 dos serviços ferroviários diários, num quadro de complexidade agravada na província pela ocupação das estações de Langa e Phillipi por migrantes despejados de localidades próximas por falta de pagamento de rendas durante o confinamento devido à pandemia. Estações onde roubaram todo o tipo de bens transacionáveis, incluindo cablagens e equipamentos electrónicos de sinalização, provocando o corte temporário de todas as ligações ferroviárias entre o centro da Cidade do Cabo e as localidades satélites de Khayelitsha e Mitchels Plain. Estações de comboios transformadas em cenários de explosão Já em Gauteng, envolvente de Joanesburgo e Pretória e que constitui o coração financeiro do país, as pilhagens deixaram operacionais apenas três das 17 linhas ferroviárias da província. Equipas do Daily Maverik destacadas em reportagem para 20 estações de comboios e rotas ferroviárias de ligação entre Joanesburgo e as localidades periféricas, testemunharam pilhagens contínuas, dia e noite, incluindo em locais onde aquele meio de transporte público, consideravelmente mais barato do que o rodoviário, é crucial para o acesso das franjas mais pobres da população aos respectivos locais de trabalho no centro urbano. Em resposta a interpelações parlamentares, a transportadora ferroviária sul-africana reportou a ocorrência de 1.833 incidentes de vandalismo em estações de Gauteng durante os últimos três anos e que a reposição de património essencial roubado ronde os dois mil milhões de grandes. Isto sem quantificar os estragos causados pelos ladrões em pavimentos e paredes durante a escavação de cabos subterrâneos, o arrancamento e roubo de bancos para os utentes, iluminação, equipamentos sanitários, coberturas, janelas, portas e respectivas ombreiras. Anteriormente fervilhantes de movimento, Germiston, Old Ben Rose, George Goch, Kliptown e Chiawelo parecem ter sido 62

particular incidence on the periods under confinement lockdown due to the new coronavirus pandemic. In addition to the theft of hundreds of kilometre of copper cable (and even sections of railway track) along the extent of the railway network and, in particular, in stations, the scale of the vandalism in the latter left them in a scenario of ruin and devastation. In Western Cape, looting and vandalism since 2019 led to the reduction from 444 to 151 daily railway services in a complex situation worsened in this province by the occupation of the stations of Langa and Phillipi by migrants evicted from nearby location due to the lack of rent payments during the pandemic. These stations saw the theft of every possible tradeable item, including cabling and electronic signalling equipment, bringing about the temporary halt of all the railway connections between Cape Town centre and the surrounding satellite locations of Khayelitsha and Mitchels Plain. Train stations transformed into bomb scenarios Meanwhile, in Gauteng, surrounding Johannesburg and Pretoria, which constitutes the financial heartland of the country, the looting has left operational only three of the 17 railway lines serving the province. Reporting teams from the Daily Maverik visited 20 railway stations and routes between Johannesburg and peripheral locations to witness how looting continued day and night even including locations where that means of public transport, considerably cheaper than the road based alternatives, is crucial for those in the poorest outskirts to get to their respective places of work in the urban centre. In response to parliamentary inquiries, the South African transport company reported the occurrence of 1,833 incidents of vandalism in Gauteng stations over the last three years and with the repair of the damage and replacement of stolen material costing around two billion rand. This does not quantify the damage caused by thieves to the flooring and walls while excavating the underground cables and ripping out and stealing passenger benches, lighting, sanitation facilities, roofing, windows, doors and their respective frames. Previously bustling with movement, Germiston,


I N T E R N AT I O N A L atingidas por uma explosão após serem assoladas por sucessivas vagas de pilhagens e actos de vandalismo. Para se ter uma ideia da dimensão da rede em causa, só a malha ferroviária de Gauteng envolve um total de 1.380 quilómetros de carris, ligando 218 estações e apeadeiros. De um lado, três mil guardas contratados para a respectiva vigilância. Do outro, sindicatos de crime motivados pela escalada da procura e do preço do cobre à escala mundial, a ineficácia das medidas adoptadas de combate ao roubo e contrabando e uma corrupção cada vez mais sistémica. E se a tendência de subida dos preços do cobre já era considerável, pelos motivos atrás referidos, a crise energética em agravamento à escala mundial veio reforçar essa trajectória, com os metais industriais - do zinco ao alumínio - a cavalgarem receios do impacto daquela sobre a produção. Igualmente “acessível”, e como tal interceptada pelos sindicatos de crime organizado, é a canalização por estrada de cobre minerado no interior de África. Durante o trânsito para os diversos portos da África Austral, só entre Janeiro e Maio deste ano, foram roubados à mão armada 66 camiões, a esmagadora maioria em estradas sul-africanas. Sendo que cada camião transporta entre 32 e 34 toneladas de cátodo de cobre (minerado na Zâmbia e no Congo) o valor da carga roubada representa aos preços actuais algo próximo de 21 milhões de dólares. Tal como procedem no caso do cobre roubado à Eskom, Telkom e Transnet, o metal é derretido para suprimir os números de série e outras marcas de propriedade, transformado em lingotes ou grânulos e colocado nos circuitos comerciais, com efeitos também penalizadores dos sucateiros cumpridores da lei, muitos dos quais estão a ser forçados a fechar portas por falência. Evert Swanepoel, presidente da Copper Development Association Africa (CDAA), representativa dos produtores que utilizam cobre reciclado, alerta que o número de associados da organização foi reduzido a quase metade nos últimos quatro anos, com perdas de milhares de postos de trabalho; “se não se fizer nada em breve a indústria está condenada”, avisou. E se o desnível em agravamento entre a procura e a oferta de cobre, traduzido na escalada do respectivo valor à escala mundial, está a ser uma boa notícia, em termos de receitas de exportação, para o Chile e o Perú, principais produtores mundiais deste metal, a factura deixada em países como a África do Sul, principais alvos dos sindicatos de crime organizado, para roubo deste metal, não só compromete o relançamento pós-covil 19, como ameaça fazer ajoelhar as respectivas economias e as delas interdependentes. Actualmente há cerca de 250 minas de cobre operacionais em quatro dezenas de países, com uma produção global estimada (pela US Geological Survey) de 20 milhões de toneladas, ou seja, 30 por cento mais do que há 10 anos. A Agência Internacional de Energia (AIE) estima que ao actual ritmo de electrificação, empurrado pelas aplicações de “energia limpa”, a procura mundial de cobre duplique nos próximos vinte anos, o que representaria o esgotar das reservas mundiais (estimadas em cerca 870 milhões de toneladas, um quarto das quais no Chile) num horizonte de pouco mais de 20 anos. l

POLITICS

Old Ben Rose, George Goch, Kliptown and Chiawelo would seem to have been hit by bomb blasts after being swept by successive waves of looting and acts of vandalism. To gain an idea of the scale of the network in question, the railway network of Gauteng alone runs over a total of 1,380 kilometres of track, interconnecting 218 stations and stopping points. On the one hand, three thousand guards contracted for the respective surveillance operation. On the other hand, crime syndicates motivated by the soaring prices and demand for copper at the global scale, the lack of effectiveness of the measures adopted to deter crime and the ever greater extent of smuggling and corruption. And while the rising trend in the price of copper was already considerable for the motives set out above, the energy crisis worsening on a global scale has only deepened this trajectory with industrial metals – from zinc to aluminium – now suffering from fears over the energy price impact on their production. Equally “accessible”, and as such already intercepted by the organised crime syndicates, is the transport by road of copper mined in the interior of Africa. During transit to the diverse ports of Southern Africa, in the first five months of this year alone, there was the armed hijacking of 66 lorries with the overwhelming majority taking place on South African highways. With each lorry carrying between 32 and 34 tons of copper cathode (mined in Zambia and the Congo), the value of the stolen cargo at current prices stands at around 21 million dollars. As happens with the case of the copper stolen from Eskom, Telkom and Transnet, the metal is melted down to get rid of series numbers and other ownership marks, transformed into ingots or granules and entered into commercial circuits with very harsh effects on scrap dealers that comply with the law and with many having gone to the wall as a result. Evert Swanepoel, President of the Copper Development Association Africa (CDAA), representing the producers that use recycled copper warns that the number of association members had been cut by almost a half over the last four years with the loss of thousands of jobs; “if something is not done in the short term, the industry is condemned”, he warned. And while the worsening imbalance between supply and demand for copper, reflected in the respective hikes in prices around the world, there is good news for exporters, for Chile and Peru, the world’s leading producers of this metal, the bill left behind for countries such as South Africa, the key targets for organised crime syndicates not only jeopardises the post-Covid-19 recovery but also threatens to bring the respective economies and those interdependent on them down to their knees. There are currently around 250 copper mines in around four dozen states with an estimated (by the US Geological Survey) global output of 20 million tons, thus 30% more than a decade ago. In turn the International Energy Agency estimates that the current rate of electrification driven by “clean energy” applications, the world demand for copper will double over the next twenty years which will lead to the exhaustion of the world’s reserves (estimated at around 870 million tons, with one quarter in Chile) over a timeframe of shortly over two decades. l 63


FOREIGN AFFAIRS

THE AGE OF AMERICA FIRST

© CHIP SOMODEVILLA/GETTY IMAGES/TNS)

WA S H I N G TO N ’ S F L AW E D N E W F O R E I G N P O L I C Y CO N S E N S U S

RICHARD HAASS, FOREIGN AFFAIRS, NOVEMBER/DECEMBER 2021

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FOREIGN AFFAIRS

D

onald Trump was supposed to be an aberration a U.S. president whose foreign policy marked a sharp but temporary break from an internationalism that had defined seven decades of U.S. interactions with the world. He saw little value in alliances and spurned multilateral institutions. He eagerly withdrew from existing international agreements, such as the Paris climate accord and the 2015 Iran nuclear deal, and backed away from new ones, such as the Trans-Pacific Partnership (TPP). He coddled autocrats and trained his ire on the United States’ democratic partners. At first glance, the foreign policy of U.S. President Joe Biden could hardly be more different. He professes to value the United States’ traditional allies in Europe and Asia, celebrates multilateralism, and hails his administration’s commitment to a “rules-based international order.” He treats climate change as a serious threat and arms control as an essential tool. He sees the fight of our time as one between democracy and autocracy, pledging to convene what he is calling the Summit for Democracy to reestablish U.S. leadership in the democratic cause. “America is back”, he proclaimed shortly after taking office. But the differences, meaningful as they are, obscure a deeper truth: there is far more continuity between the foreign policy of the current president and that of the former president than is typically recognized. Critical elements of this continuity arose even before Trump’s presidency, during the administration of Barack Obama, suggesting a longer-term development–a paradigm shift in the United States’ approach to the world. Beneath the apparent volatility, the outlines of a post–post–Cold War U.S. foreign policy are emerging. The old foreign policy paradigm grew out of World War II and the Cold War, founded on the recognition that U.S. national security depended on more than just looking out for the country’s own narrowly defined concerns. Protecting and advancing U.S. interests, both domestic and international, required helping shepherd into existence and then sustaining an international system that, however imperfect, would buttress U.S. security and prosperity over the long term. Despite missteps (above all, the misguided attempt to reunify the Korean Peninsula by force and the war in Vietnam), the results largely validated these assumptions. The United States avoided a great-power war with the Soviet Union but still ended the Cold War on immensely favorable terms; U.S. GDP has increased eightfold in real terms and more than 90-fold in nominal terms since the end of World War II. The new paradigm dismisses the core tenet of that approach: that the United States has a vital stake in a broader global

system, one that at times demands undertaking difficult military interventions or putting aside immediate national preferences in favor of principles and arrangements that bring long-term benefits. The new consensus reflects not an across-the-board isolationism–after all, a hawkish approach to China is hardly isolationist–but rather the rejection of that internationalism. Today, notwithstanding Biden’s pledge “to help lead the world toward a more peaceful, prosperous future for all people”, the reality is that Americans want the benefits of international order without doing the hard work of building and maintaining it. The hold of this emerging nationalist approach to the world is clear, accounting for the continuity across administrations as different as those of Obama, Trump, and Biden. Whether it can produce a foreign policy that advances American security, prosperity, and values is another matter entirely. THE SQUANDERING As with any paradigm shift, the one taking place now is possible only because of the failures–both real and perceived–of much of what came in the years before. The Cold War ended 30 years ago, and the United States emerged from that four-decade struggle with a degree of primacy that had few, if any, historical precedents. U.S. power was immense in both absolute and relative terms. It may have been an exaggeration to hail a “unipolar moment”, but not by much. Historians who look back on these three decades will be rightly critical of a lot that the United States did, and did not do, with its position. There were some important accomplishments: the reunification of Germany within NATO, the disciplined handling of the 1990–91 Gulf War, the U.S.-led military and diplomatic effort to help end the war and slaughter in the former Yugoslavia, the fashioning of new trade agreements, the millions of lives saved thanks to the President’s Emergency Plan for AIDS Relief, known as PEPFAR. But these achievements must be weighed against American failures, both of commission and omission. Washington managed little in the way of relationship and institution building, lacking the creativity and ambition that characterized U.S. foreign policy in the wake of World War II. It wasn’t considered much of a stretch when Dean Acheson, who was secretary of state during the Truman administration, titled his memoir Present at the Creation; no recent secretary of state could credibly include the word “creation” in his or her memoir. Despite its unmatched power, the United States did little to address the widening gap between global challenges and the institutions meant to contend with them. The list of missteps is long. Washington largely failed to 65


FOREIGN AFFAIRS adapt to China’s rise. Its decision to enlarge NATO, in violation of Churchill’s dictum “In victory, magnanimity”, fanned Russian hostility without sufficiently modernizing or strengthening the alliance. Africa and Latin America received only intermittent, and even then limited, attention. Above all, the post-9/11 wars in Afghanistan and Iraq were failures of both design and execution, resulting in costly overreach, part of a broader U.S. focus on the greater Middle East that defied strategic logic. The George W. Bush and Obama administrations dedicated a high percentage of their foreign policy focus to a region home to only about five percent of the world’s population, no great powers, and economies dependent on the wasting asset of fossil fuels. The word that comes to mind in assessing U.S. foreign policy after the Cold War is “squander”. The United States missed its best chance to update the system that had successfully waged the Cold War for a new era defined by new challenges and new rivalries. Meanwhile, thanks to the wars in Afghanistan and Iraq, the American public largely soured on what was widely seen as a costly, failed foreign policy. Americans came to blame trade for the disappearance of millions of manufacturing jobs (despite new technologies being the main culprit), and growing inequality, exacerbated by both the 2008 financial crisis and the pandemic, fueled populist suspicion of elites. In the face of looming domestic problems, including decaying infrastructure and faltering public education, foreign involvement came to be viewed as a costly distraction. The stage for a new foreign policy paradigm was set. EXTREME COMPETITION The first and most prominent element of continuity between Trump and Biden is the centrality of great-power rivalry–above all, with China. Indeed, U.S. policy toward China has hardly changed since Biden became president: as Matthew Pottinger, a senior official on the National Security Council during the Trump administration who was the lead architect of that administration’s approach to China, rightly noted in these pages, “The Biden administration has largely maintained its predecessor’s policy.” Biden himself has spoken of “extreme competition” with China, and his coordinator for Indo-Pacific affairs has proclaimed that “the period that was broadly described as engagement has come to an end”. This new posture reflects the pervasive disillusionment in the American foreign policy establishment with the results of efforts to integrate China into the world economy and the broader international system, along with heightened concern about how Beijing is using its growing strength abroad and engaging in repression at home. The continuity between the two administrations can be seen in their approaches to Taiwan, the most likely flash point between the United States and China. Far from rescinding a policy introduced in the final weeks of the Trump administration that removed restrictions on official U.S. interactions with Taiwanese officials, the Biden administration has actively implemented it, publicizing high-level meetings between U.S. officials and their Taiwanese counterparts. 66

Just as the Trump administration worked to improve U.S.Taiwanese ties, the Biden administration has repeatedly stressed its “rock solid” support for Taiwan and has inserted language emphasizing the importance of cross-strait stability into joint statements not just with Asian allies, such as Australia, Japan, and South Korea, but also with global bodies, such as the G-7. The continuity goes beyond Taiwan. The Biden administration has kept in place Trump-era tariffs and export controls and is reportedly looking into launching an investigation into China’s large-scale industrial subsidies. It has doubled down on criticism of China’s refusal to allow an independent investigation into the origins of COVID-19 and given credence to the possibility that the new coronavirus leaked from a laboratory in Wuhan, China. Like its predecessor, it has called Beijing’s repression of the Uyghur Muslims in Xinjiang a “genocide” and denounced its violation of the “one country, two systems” principle in Hong Kong. It has strengthened efforts to upgrade the Quad, a dialogue meant to enhance cooperation among Australia, India, Japan, and the United States, and launched a complementary strategic initiative with Australia and the United Kingdom. It has also continued to use the term “Indo-Pacific,” first brought into common official usage by the Trump administration. To be sure, there are differences in the Biden administration’s approach in some important areas, including a focus on finding ways to cooperate on climate change, the decision to refrain from echoing the call by Trump’s secretary of state Mike Pompeo for regime change in Beijing, and an effort to build a common stance with allies. Yet the view that China is the United States’ chief competitor and even adversary has become widespread and ingrained, and the similarities in the two administrations’ approaches far outweigh any differences. Much the same can be said of the administrations’ policies toward the United States’ other great-power competitor. Since Biden took over, U.S. policy toward Russia has changed little in substance. Gone is Trump’s inexplicable admiration for Russian President Vladimir Putin. But whatever Trump’s personal regard for Putin, the Trump administration’s posture toward Russia was in fact fairly tough. It introduced new sanctions, closed Russian consulates in the United States, and enhanced and expanded U.S. military support to Ukraine–all of which has continued under Biden. The common view between the two administrations seems to be that U.S. policy toward Russia should mostly consist of damage limitation– preventing tensions, whether in Europe or in cyberspace, from deteriorating into a crisis. Even Biden’s willingness to extend U.S.-Russian arms control pacts and start “strategic stability” talks is mostly about preventing additional erosion, not making further progress. The days of seeking a “reset” with Moscow are long gone. AMERICAN NATIONALISM Accompanying this focus on great powers is a shared embrace of American nationalism. The Trump administration eagerly adopted the slogan and idea of “America first,” despite the label’s origins in a strand of


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TH ERE I S FAR M OR E CONT INUIT Y B ET WEEN THE F OR EIG N P OL ICY O F JO E BI DEN AND T HAT OF D ONA L D TRU MP TH AN I S T Y PIC A L LY R ECO G NI ZE D. isolationism tinged with sympathy for Nazi Germany. The Biden administration is less overt in its nationalism, but its mantra of “a foreign policy for the middle class” reflects some similar inclinations. “America first” tendencies also characterized the Biden administration’s initial response to COVID-19. U.S. exports of vaccines were limited and delayed even as domestic supply far exceeded demand, and there has been only a modest effort to expand manufacturing capacity to allow for greater exports. This domestic focus was shortsighted, as highly contagious variants were able to emerge in other parts of the world before coming to do immense damage in the United States. It also forfeited an opportunity to cultivate goodwill internationally by demonstrating the superiority of American technology and generosity in the face of Chinese and Russian vaccine diplomacy. U.S. trade policy has been shaped by similar forces, demonstrating further continuity between Trump and Biden. The latter has avoided the hyperbole of the former, who savaged all trade pacts except for the ones his own administration had negotiated. (No matter that the Trump administration’s agreements were mostly updated versions of existing pacts: the U.S.-Mexico-Canada Agreement, for example, largely followed the much-denounced North American Free Trade Agreement and, in modernizing certain elements, made generous use of the text of the equally denounced TPP.) But the Biden administration has shown little, if any, interest in strengthening the World Trade Organization, negotiating new trade accords, or joining existing ones, including the successor agreement to the TPP, the Comprehensive and Progressive Agreement for Trans-Pacific Partnership, or CPTPP, despite the overwhelming economic and strategic reasons for doing so. Staying outside the agreement leaves the United States on the sidelines of the Indo-Pacific economic order and also means missing opportunities in other areas, such as advancing global climate goals through cross-border carbon taxes or using the deal to provide an economic counterweight to China. WITHDRAWAL AT ANY COST Central to the new foreign policy is the desire to pull back from the greater Middle East, the venue of the so-called forever wars that did so much to fuel this paradigm shift in U.S. foreign policy. Afghanistan is the most striking example of this shared impetus. In February 2020, the Trump administration signed an accord with the Taliban

that set a May 1, 2021, deadline for the withdrawal of U.S. troops from the country. The negotiations cut out and undercut the government of Afghanistan, and the agreement itself failed to call for the Taliban to lay down their arms or even to commit to a cease-fire. It was not so much a peace agreement as a pact to facilitate American military withdrawal. By the time Biden assumed the presidency, the overreach that had once characterized U.S. strategy in Afghanistan was a thing of the past. U.S. troop levels, which had hit 100,000 during the Obama administration, were down to under 3,000, with their role largely limited to training, advising, and supporting Afghan forces. U.S. combat fatalities had plummeted with the end of combat operations in 2014 (years before the U.S.-Taliban accord). The modest U.S. presence provided an anchor for some 7,000 troops from allied countries (and an even larger number of contractors) and a psychological and military backstop for the Afghan government–a sufficient presence, that is, to avert Kabul’s collapse, but not enough to achieve victory or peace. After 20 years, the United States seemed to have found a level of commitment in Afghanistan commensurate with the stakes. Yet the Biden administration rejected the options of renegotiating or scrapping the accord. Instead, it honored Trump’s agreement in every way but one: the deadline for a full U.S. military withdrawal was extended by some 100 days, to September 11, 2021 (and then the withdrawal was completed ahead of schedule). Biden rejected tying the removal of U.S. troops to conditions on the ground or to additional Taliban actions. Like Trump before him, he considered the war in Afghanistan a “forever war,” one he was determined to get out of at any cost. And Biden didn’t just implement the Trump policy he had inherited; his administration did so in a Trumpian way, consulting minimally with others and leaving NATO allies to scramble. (Other decisions, including supplanting French sales of submarines to Australia or being slow to lift COVID-related restrictions against European visitors to the United States, have likewise set back transatlantic ties.) Multilateralism and an alliance-first foreign policy in principle gave way to America-first unilateralism in practice. In the rest of the greater Middle East, the Biden administration has similarly continued the Trump approach of reducing the U.S. footprint. It has resisted any temptation to get more involved in Syria, much less Libya or Yemen; announced it will maintain only a small, noncombat 67


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military presence in Iraq; embraced the Abraham Accords while participating only reluctantly in diplomatic efforts to end the fighting between Israel and Hamas; and eschewed launching any new attempt to reach an Israeli-Palestinian peace deal. At first glance, Iran may seem like a glaring exception to the broader similarity. Trump was a fierce critic of the 2015 nuclear agreement with Iran (negotiated when Biden was vice president) and unilaterally exited the accord in 2018; by contrast, the Biden administration (which is staffed at the senior level by several officials who had a large hand in negotiating the pact) has made clear its desire to return to the agreement. But restoring the deal has proved easier said than done, as the two governments have been unable to agree on either specific obligations or sequencing. In addition, a new hard-line Iranian government has shown no interest in signing on to the sort of “longer and stronger” pact the Biden administration seeks. As a result, the Biden administration may well face the same choices its predecessor did, with Iran advancing its nuclear and missile capabilities and its influence throughout the region. Even if Iran once again accepts time-limited constraints on its nuclear activities, the United States will still have to decide how to respond to other Iranian provocations.

© S A R A H B E T H M A N E Y/A B AC A ( T N S )

QUESTIONS OF VALUE Even on those issues on which Biden’s rhetoric starkly differs from Trump’s, the policy shifts have been more modest than might have been expected. Consider the two presidents’ views on the role of values in foreign policy. Trump was a transactional leader who often seemed to consider democracy a hindrance and tried to establish close personal relationships with many of the world’s dictators. He lavished praise on Putin and exchanged “love letters” with North Korea’s Kim Jong Un. He spoke highly of

China’s Xi Jinping, Turkey’s Recep Tayyip Erdogan, and Hungary’s Viktor Orban, while denigrating the leaders of democratic allies, including German Chancellor Angela Merkel, French President Emmanuel Macron, and Canadian Prime Minister Justin Trudeau. He even levied tariffs on Canada and the European Union. Biden, by contrast, has declared that the United States is in “a contest with autocrats,” announced plans to hold his Summit for Democracy, and pledged to prioritize relations with countries that share American values. Yet such commitments, however sincere, have hardly made human rights and democracy promotion a more prominent part of U.S. foreign policy. Well-warranted expressions of outrage have not led to significant changes in behavior by others; the targets of such outrage are generally willing and able to absorb U.S. criticism and increasingly even U.S. sanctions, thanks to the growth of alternative sources of support. Myanmar in the wake of a military coup is a textbook example: the United States sanctioned members of the regime, but Chinese largess and diplomatic support have helped the military weather the sanctions. Washington has offered only a minimal response to incidents such as the Cuban government’s brutal reaction to protests last summer or the assassination of Haiti’s president. Whatever concerns Washington may have about Saudi human rights violations, it’s unlikely that those concerns would prevent cooperation with Riyadh on Iran, Yemen, or Israel if, for example, Saudi Arabia’s leaders showed an interest in joining the Abraham Accords. Of course, U.S. presidents have always allowed professed commitments to human rights and democracy to be set aside when other interests or priorities have come to the fore. The “free world” of the Cold War was often anything but free. But the broader shift in U.S. foreign policy today, with its stress on both great-power competition and short-

BIDEN AND INDIAN PRIME MINISTER N A R E N D R A M O D I AT A Q U A D M E E T I N G I N WA S H I N G TO N , D . C . , S E P T E M B E R 2 0 2 1

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THE E ME RGIN G A M E R I C A N A P P ROACH TO T H E WO R L D I S W O E F UL LY IN A D EQ UAT E A N D R IFE W IT H S E L F - DEF E AT I N G CON TR A DIC T I O N S . term domestic priorities, has made those tradeoffs more frequent and acute. In China’s neighborhood, for example, the Biden administration set aside concerns about human rights violations by Philippine President Rodrigo Duterte in order to make it easier for the U.S. military to operate in his country, and it has worked to bolster ties with Vietnam, another autocracy ruled by a communist party. With Russia, it signed an arms control accord while overlooking the imprisonment of the opposition leader Alexei Navalny. It has largely ignored the rise of Hindu nationalism in India in favor of stronger ties with the country to balance China. With its poorly executed withdrawal from Afghanistan, and the abandonment of many Afghans most vulnerable to Taliban reprisals, Washington further forfeited the high ground: the United States walked away from a project that, for all its flaws and failings, had done much to improve the lives of millions of Afghans, above all women and girls. And of course, the sad reality of the fragile state of democracy in the United States–particularly in the wake of the January 6 insurrection–has further undercut Washington’s ability to promote democratic values abroad. None of this is to say that there are not important areas of difference between the Trump administration and the Biden administration on foreign policy–consider climate change, for example: climate denial has given way to new investments in green technology and infrastructure, the regulation of fossil fuel production and use, and participation in the Paris process. But these areas of difference have rarely taken priority when other issues, many of which reflect more continuity, are at stake. Washington has been unwilling to use trade to advance climate goals, sanction Brazil for its destruction of the Amazon, or make meaningful contributions to help poorer countries shift to green energy. THE PROBLEM WITH CONTINUITY In theory, more continuity in U.S. foreign policy should be a good thing. After all, a great power is unlikely to be effective if its foreign policy lurches from administration to administration in a way that unnerves allies, provides openings to adversaries, confuses voters, and makes impossible any long-term commitment to building global norms and institutions. The problem with the emerging American approach to the world is not an absence of

domestic political consensus; to the contrary, there is considerable bipartisanship when it comes to foreign policy. The problem is that the consensus is woefully inadequate, above all in its failure to appreciate just how much developments thousands of miles away affect what happens at home. It is also rife with self-defeating contradictions, especially when it comes to China. Deterring China will require sustained increases in military spending and a greater willingness to use force (since successful deterrence always requires not just the ability but also the perceived will to act). Many Republicans but few Democrats back the former; few in either party seem ready to sign up for the latter. Both parties favor symbolically upgrading U.S.-Taiwanese relations, even though going too far in that direction has the potential to trigger a costly conflict between the United States and China. As much as the United States sees China as an adversary, Washington still needs Beijing’s support if it is to tackle a host of regional and global challenges, from North Korea and Afghanistan to global health. And while the Biden administration has talked much about its support for alliances, U.S. allies are in many cases unprepared to do what the administration believes is necessary to counter China. Indeed, when it comes to both China and Russia, most U.S. allies resist U.S. calls to limit trade and investment ties in sensitive sectors for geopolitical reasons. A posture does not a policy make. Competing with China is essential, but it cannot provide the organizing principle for American foreign policy in an era increasingly defined by global challenges, including climate change, pandemic disease, terrorism, proliferation, and online disruption, all of which carry enormous human and economic costs. Imagine that the United States successfully deters China from using aggression against its neighbors, from Taiwan to India and Japan, and in the South China Sea. Better yet, imagine that China even stops stealing U.S. intellectual property and addresses U.S. concerns about its trade practices. Beijing could still frustrate U.S. efforts to tackle global challenges by supporting Iranian and North Korean nuclear ambitions, conducting aggressive cyberattacks, building more coal-fired power plants, and resisting reforms to the World Health Organization and the World Trade Organization. The contradictions go on. The war in Afghanistan revealed limits to Americans’ support for nation building, but 69


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W A I T I N G T O E VA C U A T E F R O M H A M I D K A R Z A I I N T E R N AT I O N A L A I R P O R T I N K A B U L , A F G H A N I S TA N , A U G U S T 2 0 2 1

building up the capacity of friends is essential in much of Africa, Latin America, and the Middle East if the governments in those regions are to become better able to meet local security challenges, a prerequisite for their becoming more democratic and for the United States’ shouldering less of the burden. Participation in trade blocs is desirable not just for economic reasons but also to help rein in China’s unfair trade practices and mitigate climate change. Economic nationalism (especially “Buy America” provisions) sets a precedent that, if others follow, will reduce global trade and work against collaborative approaches to developing and fielding new technologies that could make it easier to compete with China. And in the Middle East, for all the focus on limiting U.S. involvement, it is not clear how pulling back squares with U.S. commitments to counter an Iran intent on developing its nuclear and missile capabilities and on expanding its regional influence, both directly and through proxies. Even a successful effort to revive the 2015 nuclear deal would not change this reality, given what the agreement does not address and given the sunset provisions for its nuclear restrictions. AMERICA ALONE Whatever the failings of this new paradigm, there is no going back; history does not offer do-overs. Nor should Washington return to a foreign policy that, for much of three decades, largely failed both in what it did and in what it did not do. The starting point for a new internationalism should be a clear recognition that although foreign policy begins at home, it cannot end there. The United States, regardless of its diminished influence and deep domestic divisions, faces a world with both traditional geopolitical threats and new challenges tied to globalization. An American 70

president must seek to fix what ails the United States without neglecting what happens abroad. Greater disarray in the world will make the task to “build back better”–or whatever slogan is chosen for domestic renewal–much more difficult, if not impossible. Biden has acknowledged the “fundamental truth of the 21st century... that our own success is bound up with others succeeding as well”; the question is whether he can craft and carry out a foreign policy that reflects it. The United States also cannot succeed alone. It must work with others, through both formal and informal means, to set international norms and standards and marshal collective action. Such an approach will require the involvement of traditional allies in Europe and Asia, new partners, countries that may need U.S. or international help at home, and nondemocracies. It will require the use of all the instruments of power available to the United States–diplomacy, but also trade, aid, intelligence, and the military. Nor can the United States risk letting unpredictability give it a reputation as unreliable; other states will determine their own actions, especially when it comes to balancing or accommodating China, based in no small part on how dependable and active they believe the United States will be as a partner. In the absence of a new American internationalism, the likely outcome will be a world that is less free, more violent, and less willing or able to tackle common challenges. It is equal parts ironic and dangerous that at a time when the United States is more affected by global developments than ever before, it is less willing to carry out a foreign policy that attempts to shape them. l © 2021 Council on Foreign Relations, publisher of Foreign Affairs. All rights reserved. Distributed by Tribune Content Agency.


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ECONOMIA

“O LONGO PRAZO É UMA SUCESSÃO DE CURTOS PRAZOS” “THE LONG TERM IS A SUCCESSION OF SHORT TERMS”

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W ANTÓNIO RAMALHO, CEO NOVO BANCO ANTÓNIO RAMALHO,

FOTOS: FERNANDO PIÇARRA

CEO NOVO BANCO

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ECONOMICS

ANDRÉ RITO

À FRENTE D OS DESTINOS D O NOVO BANCO, ANTÓNIO R AMALHO TEVE NAS MÃOS A VENDA DA INSTITUIÇÃO A P Ó S VÁ R I A S T E N TAT I VA S FA L H A D A S . D O C O L A P S O D O B E S À S U A C H E G A D A PA S S A R A M D O I S A N O S . E M 2 0 2 1 A P R E S E N T O U P E L A P R I M E I R A V E Z R E S U LTA D O S P O S I T I V O S : 1 3 7 M I L H Õ E S D E E U R O S N O P R I M E I R O SEMESTRE. LEADING THE DESTINIES OF NOVO BANCO, ANTÓNIO RAMALHO HAD THE SALE OF THE INSTITUTION IN H I S H A N D S A F T E R VA R I O U S F A I L E D E F F O R T S . B E T W E E N T H E C O L L A P S E O F B E S A N D H I S A R R I VA L , S O M E T W O Y E A R S W E N T B Y. I N 2 0 2 1 , H E P R E S E N T E D T H E F I R S T P O S I T I V E R E S U LT S : A 1 3 7 M I L L I O N E U R O P R O F I T FOR THE FIRST QUARTER.

Houve um projecto interno do banco nos últimos meses chamado 31 de Março. De que se tratava? Era um projecto no qual tentámos alcançar os objectivos do primeiro trimestre deste ano e, simultaneamente, o encerramento do escrutínio que as diferentes entidades estavam a fazer sobre o Novo Banco. Tínhamos como data acordada com a Comissão Europeia (CE) o fim da reestruturação em 31 de Dezembro de 2020 e isso reflectia-se no escrutínio dos três meses seguintes, feito pelos auditores independentes do banco, do Ministério das Finanças, entidades internacionais e pela Comissão Parlamentar de Inquérito. Era, portanto, um projecto de recolha de informação que queríamos que terminasse nessa altura, a 31 de Março.

There was an internal bank project in recent months entitled 31 March. What did this deal with? This was a project designed to achieve the objectives of the first quarter for this year and, simultaneously, the closure of the scrutiny made by different entities ongoing at Novo Banco. We had agreed the date with the European Commission (EC) for the end of restructuring on 31 December 2020 and this reflects the scrutiny taking place in the following three months made by auditors independent of the bank, the Ministry of Finance, international entities and the Parliamentary Commission of Inquiry. This was, therefore, a project to gather the information that we were targeting that would end at that time, 31 March.

Acabou por não acontecer. Foi um pouco mais tarde, embora para nós tenha sido encarado como o fecho de um ciclo.

Which ended up by not happening. This all took place a little later even while from our perspective this was perceived as the closure of a cycle.

Como foi gerido esse processo internamente? Implicou uma grande mobilização das suas equipas? Sim, foi um processo de grande mobilização, que primeiro estranha-se, depois entranha-se, e por fim beneficia-se. Estranha-se porque as instituições financeiras têm grandes mecanismos de controlo, de forma tradicional, em auditoria, mas são também controladas pelo regulador e supervisor. Neste caso, um supervisor internacional, o Banco Central Europeu. Entranha-se pelas novas auditorias requisitadas depois pelo Tribunal de Contas. Conseguimos mobilizar as equipas para fornecer a informação. Por fim beneficia-se, porque,

How was this process managed internally? Did this imply a major mobilisation of your teams? Yes, this was a process with great mobilisation that was first a novelty and then became an ingrained routine that served mutual benefits. A novelty because financial institutions have major control mechanisms in a traditional format, through auditing, but they are also controlled by the regulator and supervisor. In this case, an international supervisor, the European Central Bank. A routine through the new audit procedures required by the Court of Audit. We were able to mobilise the teams to provide this information. Finally, mutual benefits 73


ECONOMIA a certa altura, a única forma de explicar um processo tão complexo de reestruturação só era possível através de um escrutínio muito poderoso - e fomos capazes de, internamente, explicar que esse esforço valeria a pena. Foi isso que nos mobilizou.

because, at a certain time, the only way of explaining such a complex restructuring process was through very powerful scrutiny – and we were capable of, internally, explaining that these efforts would be worthwhile. This was what mobilised us.

Este ano o banco conseguiu resultados positivos de 137 milhões, no primeiro semestre, tendo reduzido as chamadas ao fundo de resolução. Estamos também perante o fim da Comissão Parlamentar de Inquérito. O fim deste processo é um virar de página da vida do banco? Está na altura de começarmos a fazer um balanço, não por inteiro, mas de o começar e assumir, de forma clara, a pergunta que temos de responder: valeu a pena? Esta é a pergunta essencial dos nossos clientes, nossos colaboradores e de todos os ‘stakholders’. A instituição teve três ciclos: o primeiro, de resistência. Foi a primeira instituição cuja resolução foi feita num enquadramento que ainda nem estava em vigor na europa, um processo difícil que normalmente dura 24 horas, mas que no nosso durou mais de três anos, com várias negociações com a Comissão europeia. Durante este período, foi necessário preservar a moral das pessoas, a confiança dos clientes e a liquidez da instituição. Durante a reestruturação, procurámos dar resposta às várias dificuldades do banco: um legado poderosíssimo de créditos de má qualidade, um legado muito relevante de imóveis sobreavaliados ou de má qualidade – terrenos, antigas fábricas industriais – e ainda um passivo longo e elevado. Tudo isto tornava a gestão do banco muito difícil. Foi preciso apoio do Estado, de um accionista privado que investiu mil milhões, e o apoio dos obrigacionistas aceitando reduzir as suas dívidas. Os activos de má qualidade representavam um terço do nosso balanço. Um número que só existia na Grécia.

This year, the bank turned in a positive 137 million result in the first quarter, having reduced the demands on the resolution fund. We are also towards the end of the Parliamentary Commission of Inquiry. Does the ending of this process represent a turning of the page in the bank? We are at the point in time of providing an overview, not complete but that is beginning to take clearer shape. The question that we have to answer: was it worth it? This is the key question from our clients, our staff and all of our stakeholders. The institution has been through three cycles: the first, of resistance. This was the first institution that underwent resolution within a framework that was not even yet in effect in Europe, a difficult process that normally lasts 24 hours but that in our case took over three years with various rounds of negotiations with the European Commission. During this period, it was necessary to keep up staff morale, the trust of clients and the liquidity of the institution. Throughout restructuring, we sought to provide solutions to various of the bank’s difficulties: the extremely heavy legacy of poor quality loans, a very significant legacy of over-evaluated or poor quality properties – plots, former industrial facilities – and as well as long term and high levels of debt. This all made managing the bank extremely difficult. There was a need for state support, from a private shareholder that invested a billion euros as well as support from shareholders agreeing reductions in the debts owed. Our toxic assets then accounted for a third of our balance sheet. Such a level only otherwise existed in Greece.

O que representou esse fecho do ciclo? O renascimento. Trazer o banco novamente à sua função, apoiar clientes, a economia nacional, linhas de crédito necessárias, tudo que se espera do banco. Com resultados positivos no primeiro semestre deste ano, iniciamos uma nova fase. Temos de ser bem sucedidos no renascimento. Escreveu, recentemente, um artigo no Diário de Notícias que “valeu a pena”. Ao mesmo tempo sente-se alguma ironia nas suas palavras? Esperava outro reconhecimento? O artigo teve o seu tempo e utilidade quando foi escrito, no início de Agosto. É um agradecimento às palavras do Dr. Fernando Negrão, presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito. Após oito horas e meia de comissão, cansados, sem nenhuma pergunta por esclarecer, ele pediu-me para agradecer aos colaboradores do Novo Banco, de uma forma singela e real. Referia-se a um enorme grupo de pessoas que merecem o reconhecimento de terem preservado a instituição. Achei que devia agradecer 74

What does this closure of the cycle represent? The rebirth. Giving the bank its functions back again, supporting clients, the national economy, the necessary lines of credit, everything that is expected of a bank. With positive results in the first quarter of this year, we embarked on a new phase. We have to be successful in this rebirth. You recently wrote an article in the Diário de Notícias newspaper saying “it was worthwhile”. Do you simultaneously feel a certain irony in your words? Were you expecting a different type of recognition? The article was of its time and purpose when written at the beginning of August. It is in thanks to the words of Dr. Fernando Negrão, President of the Parliamentary Commission of Inquiry. After eight and a half hours of the commission sitting, tired, without any further questions for clarification, he asked me to thank the


ECONOMICS

A RECUPER AÇ ÃO NÃO É UMA CIÊNCIA TÉCNICA, É QUASE UMA ARTE, P ORQUE QUANDO SE FOR MUITO TÉCNICA TENDE A S E R I N J U S TA E I N E F I C A Z . RECOVERY IS NOT A TECHNICAL S C I E N C E A N D I S P R A C T I C A L LY AN ART FORM BECAUSE WHEN IT BECOMES VERY TECHNICAL, THEN THIS TENDS TO BE BOTH U N F A I R A N D I N E F F I C I E N T.

essas palavras em nome dos nossos colaboradores. Só isso valeu a pena. Mas esperava um juízo político diferente daquele que paira na opinião pública? Não acho que ao gestor cabe algum tipo de ansiedade sobre os juízos políticos feitos sobre as suas empresas. Nós devemos ser avaliados pelas nossas entregas: tínhamos um compromisso assumido entre o Governo Português e a CE, e eu tinha de fazer a entrega desse compromisso: eram 33 as exigências que me foram solicitadas. E isso é o maior reconhecimento que alguém pode ter. Quase toda a gente achava que era impossível. Mesmo assim, o banco interpôs mais de 90 mil ações judiciais para recuperar crédito mal parado. A recuperação não é uma ciência técnica, é quase uma arte, porque quando se for muito técnica tende a ser injusta e ineficaz. Se o meu modelo de recuperação fosse colocar acções judiciais, estaria a entregar a minha função aos tribunais. Antes de mais obriga a uma avaliação da melhor forma de recuperar, ter coragem de defender estratégias, noção da dificuldade destes casos, e numa enorme tensão que existe entre o cliente e o banco durante este período. 90 mil acções parecem muito, mas devemos pensar que processamos mais de 500 mil cheques por dia, fazemos muito mais transações do ponto de vista dos cartões bancários. Esta patologia da relação com o cliente representa apenas uma pequena parcela da nossa actividade bancária. Houve empresários que fizeram esforços incríveis para voltar ao mercado, reduzir o seu endividamento, e a maior parte destes clientes conseguiram. Esta parte patológica dá muitos ‘headlines’ nos jornais, mas não é a parte mais emocionante da banca.

Novo Banco members of staff in a particular and real way. This referred to the enormous group of people who deserve recognition for having preserved the institution. I thought I should thank him for these words on behalf of our employees. This alone was worthwhile. However, did you not expect a different political opinion than that which predominates in public opinion? I do not think managers need to hold any type of anxiety as regards the political judgements made of their companies. We should be evaluated by our deliveries: we had an agreement reached with the Portuguese government and the EC and I had to deliver on that commitment: there were 33 demands that were being made. And that is the greatest recognition that somebody might gain. Almost everybody thought this was impossible. Nevertheless, the bank issued over 90,000 legal actions over the recovery of bad debt. Recovery is not a technical science and is practically an art form because when it becomes very technical, then this tends to be both unfair and inefficient. If my model of recovery was to launch judicial actions, I would be handing over my function to the courts. First and foremost, this requires an evaluation of the best way to recover, the courage for strategic defence, a notion of the difficulties of these cases and within the enormous tension existing between clients and banks during this period. 90,000 cases may seem a lot but we should recall that we handle over 500,000 cheques per day, we do many more from the point of view of bank card transactions. This relational pathology with the client represents only a small proportion of our banking activities. There were business owners who made incredible efforts to get back 75


ECONOMIA Qual é então? É saber que, no dia de hoje, 99% dos clientes hoje cumpriram as suas responsabilidades e continuam a merecer a ajuda do banco. São estes clientes que fazem um banco. Os outros são um fenómeno com que temos de contar, alguns merecem todo o nosso apoio, outros tiveram comportamentos mais criticáveis. Mas não estamos cá para criticar, estamos para recuperar. Como foi gerir os problemas de um banco durante a pandemia, com os ‘layoff ’ e moratórias, que agora estão a terminar? É uma questão de estabelecer e gerir prioridades. Na pandemia o banco teve o seu grande teste de utilidade para a sociedade portuguesa. Por duas razões: em 2020 éramos um banco em reestruturação, e tivemos de

into the market, reducing their debt levels and the majority of these clients achieved this. This pathological part provides a lot of headlines for the newspapers but is not the most emotional part of banking. Which is? That is knowing that, today, 99% of clients comply with their responsibilities and continue to deserve the support of the bank. These are the clients that make a bank. The others are an issue we have to deal with. Some do still deserve our support, others have shown more critical behaviours. But we are not here to criticise, we are here to recover. How was managing the problems of the bank due the pandemic, with the layoff and credit moratoriums that are now coming to a close?

É U M A Q U E S TÃO D E E S TA B E L E C E R E G E R I R P R I O R I DA D E S . N A PA N D E M I A O BANCO TEVE O SEU GRANDE T E S T E D E U T I L I DA D E PA R A A SOCIEDADE P ORTUGUESA. THIS IS A QUESTION OF E S TA B L I S H I N G A N D M A N AG I N G P R I O R I T I E S . I N T H E PA N D E M I C , THE BANK ENCOUNTERED A G R E AT T E S T O F I T S U T I L I T Y T O P O R T U G U E S E S O C I E T Y. fazer das tripas coração para dar resposta à pandemia e continuar a recuperação. Estávamos nas três linhas de actuação fundamentais: linha de concessão de crédito - via linhas garantidas pelo Estado -, fomos o primeiro banco a esgotar a primeira linha de 400 milhões, e fomos também um banco muito activo na concessão de linhas de crédito garantidas. Fomos dos grandes bancos das moratórias sobre as empresas: apenas dois bancos asseguram acima dos 4 mil milhões de moratórias sobre empresas, nós somos um deles, o que significa que assumimos a nossa função enquanto banco português. O banco é também o agente do pagamento de ‘lay off ’ e era o único responsável no processamento dos ‘layoff ’ em casos que era essencial garantir e preservar o emprego. Qual foi o seu papel durante este período mais difícil da pandemia? 76

This is a question of establishing and managing priorities. In the pandemic, the bank encountered a great test of its utility to Portuguese society. For two reasons: in 2020, we were a bank under restructuring and we had to display the courage to provide a response to the pandemic and continue with our recovery. We focused on three fundamental lines of action: credit concession lines - via the state guaranteed lines -, we were the first bank to apply the initial 400 million line, and we were also a very active bank in granting the guaranteed lines of credit. We were among the major banks for company moratoriums: only two banks reached over 4 billion in company moratoriums and we are one of them that demonstrates how we assume our role as a Portuguese bank. The bank is also the actor for lay off payments and was the only entity responsible for processing these layoffs in cases where it was essential to guarantee and maintain employment.


ECONOMICS A pandemia implicou um grande esforço das minhas equipas. Tivemos gente a trabalhar continuamente. Nunca deixei de vir ao banco todos os dias, não porque precisasse, mas porque era impossível não vir quando toda a minha área comercial estava a responder às necessidades dos clientes. No que respeita à saúde, tivemos zero de letalidade, embora com uma percentagem de pessoas com covid. O banco não parou e desenvolvemos projectos para este período tão complicado, fora da nossa atividade. Criámos um ‘market place’ de refeições em várias pequenas cidades, onde os clientes do banco podiam encomendar refeições, pagas por débito em conta. Isto para servir os nossos clientes, não é uma função bancária, mas teve grande utilidade para as pessoas. Toda a banca portuguesa portou-se muitíssimo bem, muito pela sua experiência em crises e sempre inspirada nos seus improvisos.

What was your role during the most difficult period of the pandemic? The pandemic implied a great deal of effort from my teams. We had people working continuously. I never stopped coming to the bank every day not out of need but because it was impossible not to come when my entire commercial department was responding to client needs. As regards health, we had zero fatalities even while a percentage of staff had Covid. The bank did not stop and developed projects in keeping with such a complicated period beyond our normal activities. We launched a meal ‘market place’ in various small cities where the bank’s clients could order meals paid for by account debits. This served our clients and, even if not a banking function, with a great deal of utility to the people. The Portuguese banking system carried itself extremely well very greatly due to the experience of crises and always inspired on our capacity for improvisation.

Ainda assim atravessamos uma crise cujo impacto não se consegue medir com rigor. Quais perspectivas é que tem para o futuro da economia portuguesa? Temos que separar o curto do médio prazo. O primeiro momento é o fim das moratórias, e para isso temos boas notícias: os clientes conseguiram adaptarse, estamos num contexto de taxas de juro baixas, e dois anos na vida de um crédito habitação, por exemplo, é irrelevante. Poucos créditos terão de ser reestruturados. Quanto a isso, não esperamos nenhum efeito na sociedade. Haverá sectores e pessoas mais afectadas, mas estamos positivos no que respeita aos particulares. Nas empresas, há uma consequência de uma crise global com efeitos assimétricos o que nos obriga a ter alguma cautela na reestruturação destas empresas. As nossas empresas demonstram uma resiliência significativa, e grande capacidade de adaptação. Diria que podemos estar razoavelmente optimistas quanto à saída da crise. Vamos ter revisões em alta. Quanto ao médio prazo, temos de ser mais cautelosos, porque há efeitos cujas conclusões não conseguimos retirar: as alterações dos hábitos e padrões de consumo dos clientes, o tipo de trabalho, a mobilidade. O que existia antes da crise pode não se repetir. Não sei se vai haver menos gravatas e mais ténis, menos espaços comerciais. Por outro lado, houve uma alteração na cadeia de valor dos fornecedores, pelo aumento do custo das matérias-primas. Estou optimista a curto prazo, cauteloso a médio prazo.

Nevertheless, we are still going through a crisis with impacts that we are not yet able to accurately measure. What perspectives do you hold for the future of the Portuguese economy? We have to separate the short and medium terms. The first stage is the end of the moratoriums and for this we have good news: clients are able to adapt and we are in a context of low interest rates and two years in the life of a mortgage loan, for example, is broadly irrelevant. Few credits will have to be restructured. As regards this, we are not expecting any effects on society. Some sectors and people will be more affected but we are positive as regards private clients. For companies, there is the consequence of a global crisis with asymmetric effects that require us to display some caution in the restructuring of these businesses. Our companies have demonstrated significant resilience and a great capacity for adaptation. I would say we may be reasonably optimistic as regards getting out the crisis. We will have the forecasts upgraded. As regards the medium term, we have to be more careful as there are effects with conclusions we are unable to reach: the changes in consumption habits and patterns, the type of work, mobility. What existed before the crisis may not be returning. I don’t know whether there shall be fewer ties and more sneakers, fewer shopping centres. Furthermore, there was an alteration in the supply chain of value due to the rise in raw material costs. I am optimistic for the short term and cautious over the medium term.

Mudando de assunto, decidiu tirar Direito na Católica, é jurista mas nunca exerceu advocacia. Porquê esse curso, o que pensava na altura? Sou filho de um financeiro e de uma matemática, o que contradiz ainda mais o meu curso [risos]. Mas também sou filho da abertura marcelista e do 25 de abril, o que significa que sou filho de todos os anseios e perspectivas. Quando somos muito bem preparados

Changing the subject; you studied Law at Católica University, a jurist but never a practicing lawyer. Why that degree? What were you thinking at the time? I am the son of a financier and a mathematician that only contradicts still further my choice of degree [laughter]. But I’m also the child of the Marcelist spring and the 25 April revolution, which means I’m a child of all those anxieties 77


ECONOMIA

PERFIL ANTÓNIO RAMALHO Natural de Lisboa, filho de um financeiro e de uma matemática, António Ramalho formouse em Direito, pela Universidade Católica Portuguesa, em 1977. Num tempo em que Portugal começava a abrir-se à Europa, fez um mestrado em Ciências Jurídico-Comerciais, rumou a Oxford e começou a trabalhar nos mercados de capitais. De regresso a Portugal, ocupou vários cargos de destaque, tendo sido diretor financeiro do Banco Pinto e Sotto Mayor e da Rede Ferroviária de Alta Velocidade (RAV). Jurista e formador, especialista em mercados de capitais, assistiu e participou nas grandes transformações da banca, num período em que os bancos passaram do domínio estatal para o privado. Durante a crise de 2011, negociou com a “Troika” em diferentes posições: primeiro do lado da banca, depois em nome de diferentes empresas do Estado. António Ramalho é presidente do Novo Banco desde 2016, altura em que a instituição atravessava um período conturbado, após a queda do BES e da primeira tentativa de venda falhada. Sucedeu a Eduardo Stock da Cunha, seu amigo e ex-colega de faculdade, com o compromisso de “levar o barco a navegar em águas mais calmas”. Em 2021, pela primeira vez após vários anos de prejuízo, o banco chegou ao fim do primeiro semestre com um lucro de 137 milhões de euros. Na fase de renascimento, como costuma dizer, pretende renovar a imagem e mudar a sede do Novo Banco para o Tagus Park, em Oeiras.

PROFILE ANTÓNIO RAMALHO Born in Lisbon, the son of a financier and mathematician, António Ramalho graduated in Law from the Catholic University of Portugal in 1977. At a time when Portugal was beginning to open up to Europe, he took a Master’s Degree in the JuridicalCommercial Sciences, set off for Oxford and started work in the capital markets. On his return to Portugal, he occupied various managerial positions having served a financial director at Banco Pinto e Sotto Mayor and RAV – the High Speed Railway Network company. A jurist and trainer, a specialist in capital markets, he witnessed and participated in the major transformations of the banking sector in a period when banks were passing from state to private ownership. During the 2011 crisis, he negotiated with the “Troika” in different positions: firstly, on behalf of banks, afterwards on behalf of different state sector companies. António Ramalho has been president of Novo Banco since 2016, a time when the institution was going through troubled times following the collapse of BES and the first failed attempt at sale. Taking over from Eduardo Stock da Cunha, his friend and former faculty colleague, he committed to “taking the boat and sailing to calmer waters”. In 2021, for the first time after various years of losses, the bank returned to profitability through making 137 million euros in the first quarter. In this rebirth phase, as he likes to term it, he aims to renew the image and move the Novo Banco headquarters to Tagus Park in Oeiras.

financeiramente e matematicamente - e queremos mudar o mundo -, julgo que o Direito é a abstração matemática mais próxima de alterar o mundo de forma normativa. Foi assim que o Direito surgiu na minha vida. Depois de tirar o curso, acabei por fazer um mestrado em ciências jurídico-comerciais internacionais, e depois fui para Oxford. Toda a minha vida que se seguiu foi ligada à finança pública. Fui director financeiro do Banco Pinto e Sotto Mayor. Geria tecnicamente do ponto de vista financeiro. Era formador, especialista em mercados de capitais.

and perspectives. When we are very well financially and mathematically prepared – and we want to change the world -, I believe that law provides the mathematical abstraction closest to changing the world through a normative approach. That was how studying law appeared in my life. After graduating, I ended up doing a Master’s Degree in the International Juridical-Commercial Sciences and then I went to Oxford. All of my life has been connected to public finance. I was the financial director of Banco Pinto e Sotto Mayor: managing technically from the financial point of view. I was a trainer, a specialist in the capital markets.

Notou uma evolução muito grande da finança e banca? Já sou um dinossauro, não haja dúvida. Sim, notei. Na altura todos os bancos eram públicos, saídos de um período difícil, assisti à primeira vaga das privatizações

Did you note any major change in financing and banking? I’m already a dinosaur, there’s no doubt there. Yes, I have. At the time, all banks were state owned, emerging

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ECONOMICS

O RENASCIMENTO TEM PRAZO E D AT A . P R E T E N D E M O S C R I A R E CONSTRUIR UM BANCO FORTE, AT É 2 0 2 4 .

THE REBIRTH HAS A DEADLINE A N D A D AT E . W E A I M T O C R E AT E A N D B U I L D A S T R O N G BANK BY 2024.

e à consolidação do sistema financeiro que se seguiu à privatização. E isto tem imensos paralelismos com a actualidade. Estava no Banco Pinto e Sotto Mayor quando assisti ao falhanço da primeira privatização, tendo sido bem sucedido mais tarde, numa segunda privatização. Acabei por vir para o Novo Banco, a primeira venda não foi bem sucedida, precisámos de suporte do Estado, e a segunda venda foi bem sucedida. Sentimos que somos capazes de servir a economia nacional. Como é que viu a queda do BES? E como foi decidir nesse contexto aceitar o cargo de CEO do Novo Banco? Quando o Sr. Governador do Banco de Portugal entendeu que a minha experiência podia ser usada, achei que podia ser útil e criar uma equipa que desenvolvesse uma solução para o Novo Banco, que todos os dias atravessava difíceis momentos de motivação. Lembro-me da primeira reunião. Disse apenas: “eu venho para ficar”. O meu compromisso era levar o barco a navegar em águas mais calmas. Dá a sensação de que está num fim de ciclo. Qual pensa ser o seu futuro? O renascimento tem prazo e data. Pretendemos criar e construir um banco forte, até 2024, baseado numa nova forma de trabalho que representa também uma nova sede, no Tagus Park, com uma nova imagem, rejuvenescida. Temos um novo plano estratégico para entregar resultados, solidez e resposta aos nossos valores fundamentais: a portugalidade, o nosso profissionalismo, a proximidade com os clientes. Naturalmente esse é o meu futuro mais próximo. Sou daqueles que acham que o longo prazo é uma sucessão de curtos prazos. l

from a difficult period, and I witnessed the first wave of privatisations and the consolidation of the financial system that followed its privatisation. And there are immense parallelisms with contemporary times. I was in Banco Pinto e Sotto Mayor when I witnessed the failure of the first privatisation, having been successful at a later date in a second privatisation process. I ended up coming to Novo Banco, with the first sale also not going successfully, we needed the support of the state and the second sale was a success. We feel we are able to serve the national economy. How did you perceive the fall of BES? And in this context how did you decide to accept the role of Novo Banco CEO? When the Governor of the Bank of Portugal understood that my experience might be useful, I thought it might be worthwhile to set up a team to develop a solution for Novo Banco, which was daily going through difficult periods for motivation. I recall in my first meeting, I only said “I have come to stay”. My commitment was to take over the helm and steer through to calmer waters. You give the sensation of being at the end of a cycle. What do you see in your future? The rebirth has a deadline and a date. We aim to create and build a strong bank by 2024, based on a new way of working that is already represented in our new headquarters in Tagus Park and with a new and rejuvenated image. We have a new strategic plan to deliver results, solidity and meeting our fundamental values: our Portuguese identity, our professionalism, proximity to clients. Naturally, this is my next future. I’m one of those who perceive the long term as a succession of short terms. l 79


ECONOMIA

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W NUNO PINTO DE MAGALHÃES, FOTOS: FERNANDO PIÇARRA

CHAIRMAN SCC NUNO PINTO DE MAGALHÃES, CHAIRMAN SCC

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ECONOMICS

ANA VAL ADO

“É O COROAR DE UMA CARREIRA” “IT IS THE CROWNING ACHIEVEMENT OF A CAREER” NA SOCIEDADE CENTR AL DE CERVE JAS HÁ 47 ANOS, 20 D OS QUAIS ENQUANTO DIRECTOR DE COMUNICAÇÃO E REL AÇÕES INSTITUCIONAIS, NUNO PINTO DE MAGALHÃES FOI RECENTEMENTE E L E I T O C H A I R M A N D A C O M PA N H I A PA R A O N D E E N T R O U C O M O E S TA G I Á R I O A O S 1 8 A N O S , C O M O UMA SOLUÇÃO DE RECURSO, APÓS TER TERMINADO O 7º ANO (12º ANO) E TER QUE ESPERAR U M A N O ( S E R V I Ç O C Í V I C O ) PA R A P O D E R E N G R E S S A R N A FA C U L D A D E D E D I R E I T O . S A B E R O U V I R , FA Z E R A S C O I S A S C O M PA I X Ã O , U S A R O B O M S E N S O E N U N C A R E C U S A R U M A B O A C O N V E R S A F O R A M A L G U N S D O S S E G R E D O S Q U E O L E VA R A M A O T O P O . AT T H E B R E W E R S S O C I E D A D E C E N T R A L D E C E R V E J A S ( S C C ) F O R T H E L A S T 4 7 Y E A R S , 2 0 O F W H I C H S P E N T A S D I R E C T O R O F C O M M U N I C AT I O N S A N D I N S T I T U T I O N A L R E L AT I O N S , N U N O P I N T O D E M A G A L H Ã E S W A S R E C E N T L Y E L E C T E D C H A I R M A N O F T H E C O M PA N Y T H AT H E E N T E R E D A S A N A P P R E N T I C E A G E D 1 8 A S A S T O P - G A P S O L U T I O N H AV I N G F I N I S H E D T H E T H E N 7 T H G R A D E ( N O W T H E 1 2 T H G R A D E ) A N D H AV I N G T O W A I T F O R A Y E A R ( C I V I C S E R V I C E ) B E F O R E B E I N G A B L E T O E N T E R T H E F A C U LT Y O F L A W. K N O W I N G H O W T O L I S T E N , E N G A G E I N TA S K S W I T H PA S S I O N , A P P L Y G O O D S E N S E A N D N E V E R R E F U S E A G O O D C O N V E R S AT I O N A R E S O M E O F T H E S E C R E T S T H AT G O T H I M T O T H E T O P.

Está há 47 anos na SCC, onde percorreu praticamente todas as áreas da companhia. Pode contar-nos como tudo começou? Hoje estamos aqui num local simbólico, a Cervejaria Portugália da Almirante Reis, edifício contíguo à antiga sede da Central de Cervejas, que estava sediada no nº 115. Foi nesse edifício que comecei a trabalhar e muitas vezes vinha à Portugália beber uma imperial, comer um prego à inglesa ou encomendar croquetes quando tinha que fazer horas extraordinárias. Na altura era a única Portugália que existia, era um local emblemático na época. Tenho muito boas recordações e óptimas memórias dos cerca de 20 anos que aqui passei na Almirante Reis. Comecei a trabalhar em Outubro de 1974 e saí daqui em 1995, data em que em foi anunciado que a sede da Almirante Reis iria encerrar e iriamos passar todos para Vialonga, para a fábrica, onde ainda hoje é a sede da Central de Cervejas. Eu fui dos primeiros a mudar. Entrei para a companhia como estagiário em Outubro de 1974, com 18 anos, na altura para “fugir” ao ano de serviço

You have been at SCC for 47 years during which you have been involved in practically every area of the company. Can you tell us how it all began? Today, we are here in a symbolic place, Cervejaria Portugália on Almirante Reis, a building adjoining the former headquarters of Central de Cervejas, which had its headquarters at no. 115. It was in this building where I began to work and I would very often come to Portugália to drink an imperial, eat a prego steak sandwich or order some croquettes when I had to do overtime. At the time, this was the only Portugália in existence and was an emblematic landmark of the time. I have some very good recollections and wonderful memories of the around 20 years that I spent on Almirante Reis. I began working in October 1974 and left here in 1995, the date when it was announced the Almirante Reis headquarters would be closing and we would all be moved to Vialonga, to the factory where the Central de Cervejas headquarters is still located. I was one of the first to move. I joined the company as an apprentice in October 1974, aged 81


ECONOMIA

“UM HOMEM DO MUNDO” PERFIL | PROFILE

Proveniente de uma família de diplomatas, Nuno Pinto de Magalhães estava talhado para seguir também esse caminho. Mas o seu percurso foi outro, enveredando pela via empresarial, mas não deixando de ser como muitos o consideram um “diplomata nato”, na forma como sempre se posicionou e geriu a sua carreira. Para além do seu trabalho, a arte e as antiguidades são outras das suas paixões. Como o próprio refere, mais que um coleccionador, é um amontoador de peças que considera bonitas e que lhe proporcionem aprofundar os seus conhecimentos. O seu desporto favorito é o rugby, que considera uma escola de carácter. Um legado familiar. O seu filho era o capitão da selecção até há pouco tempo e o seu pai fundou o CDUL. Gosta de ler, de viajar, de restaurantes, de cinema, de conviver, de rir e de estar atento ao que se passa no mundo. “Gosto de ser um homem do Mundo”.

“A M A N O F T H E W O R L D ” Raised by a family of diplomats, Nuno Pinto de Magalhães was carved out to follow in this same path. However, his route took another turn and headed down a corporate path even while never leaving behind how many do consider him a “born diplomat” in the way he has always positioned and managed his career. In addition to his work, art and antiques feature among his passions. As he himself refers, more than just a collector, he gathers the pieces that he considers attractive and that enable him to deepen his knowledge. His favourite sport is rugby, perceived as a school of character. A family legacy. His son was the national team captain until a short while ago and his father founded the CDUL rugby club. He likes reading, travelling, restaurants, cinema, socialisation, laughing and paying attention to what is happening in the world. “I like to be a man of the world”.

cívico obrigatório, institucionalizado após a Revolução de Abril para os alunos que tivessem terminado o 7º ano (agora 12ºano) e quisessem ingressar na faculdade. A este ano de serviço cívico era dispensado quem estivesse a trabalhar e foi neste sentido que me candidatei à Central de Cervejas. Integrei o serviço de património, da área da contabilidade, onde tinha que fazer o inventário do mobiliário das instalações. Para a altura ganhava um ordenado fantástico e tínhamos imensas regalias. Em Janeiro de 1975, na sequência do processo revolucionário, a empresa foi ocupada pelos trabalhadores, com saneamento dos administradores e reivindicações por parte da comissão de trabalhadores e órgãos sindicais no sentido de todos trabalhadores com contratos a prazo, onde eu estava incluído enquanto estagiário, passassem a efectivos. Decorrente desse movimento, eu e mais de 400 trabalhadores, passámos aos quadros. Portanto, eu costumo dizer que sou praticamente o “Filho da Revolução”. Este é o início da minha carreira, por mera circunstância, por mera casualidade, a ideia era fazer um período curto antes de entrar na faculdade de Direito, para seguir a minha carreira como Diplomata. Fui integrado nos quadros da empresa e nunca mais saí. Foi aí que se apercebeu que estava na SCC para ficar? Não, nunca percebi que estava na Central para ficar. Eu fui ficando, porque sempre me dei bem na Central de Cervejas, tive momentos bons e menos bons como em tudo na vida, mas aprendi muito e nunca me cansei, talvez devido ao facto de ter passado por muitas funções. Sempre que entrava numa área nova era como se começasse numa nova empresa. Tenho um lema 82

18, at the time to “dodge” the year of obligatory civic service, institutionalised following the April revolution for all students that were finishing their 7th year (now the 12th) and wanted to go to university. This year of civic service was dispensed for those working and it was for this reason I applied to Central de Cervejas. I joined the asset service, in the area of accountancy where I had to make an inventory of all the furniture in the installations. For the time, I earned a fantastic salary and we had a lot of fringe benefits. In January 1975, within the framework of the ongoing revolutionary process, the company was taken over by the workers, with the ousting of the directors and complaints from the workers commission and the trade unions on behalf of all workers on fixed-term contracts, in which I was included as an apprentice, we all then received open-ended contracts. As a result of this movement, I and over 400 other members of staff became full time employees. Therefore, I often say that I am practically a “Child of the Revolution”. This was the beginning of my career and by mere circumstance, random chance, the idea was to spend a short period there before joining the Law Faculty and then advancing with a career as a diplomat. I became a staff member at the company and I never again left. Was that when you realised that you were at SCC for the long haul? No, I never understood that I was at Central to stay. I just kept on staying because I’ve always got on well with Central de


ECONOMICS que é gostar de fazer tudo o que faço e vejo sempre o “copo meio cheio”. É o colaborador mais antigo da SCC? Sou um dos mais antigos. A esse propósito trago aqui hoje, de uma forma simbólica e pela primeira vez para uma entrevista, a “Carica de Ouro” atribuída aos colaboradores com 40 anos. Todos os anos há uma cerimónia em que os trabalhadores com 25 anos e 40 anos são prestigiados com a carica de cerveja Sagres em ouro. Hoje trago aqui como registo e também para homenagear todos os meus colegas que fizeram 40 anos, eu já tenho 47, é apenas simbólico. Qual o segredo da longevidade na companhia? O segredo da longevidade na companhia é a capacidade de adaptação, o saber mudar, a resiliência, a flexibilidade, sem nunca abdicar dos meus princípios, daquilo que considero que é vector estruturante da minha personalidade. As empresas vivem em permanente mudança e há que apanhar essa mudança e saber enquadrá-la. E depois é saber ouvir, capacidade de escuta ativa, a capacidade de ter abertura para poder partilhar, integrar equipas, ter ‘soft skills’ adequados. Para mim estes são os sinais da longevidade porque esta empresa mudou muitíssimo e vai continuar a mudar. Quais as principais diferenças da Sociedade Central de Cervejas e Bebidas (SCC) onde iniciou a sua carreira para a que hoje conhecemos? As diferenças são enormes ao nível da dimensão do mercado, da concorrência. Lembro-me que nos anos 74 e seguintes o grande concorrente da cerveja era o vinho. Hoje o concorrente da cerveja também é o vinho, mas não é só, há muito mais concorrentes, pois o mercado das bebidas é muito mais alargado. A dimensão da empresa, os estabelecimentos, a forma de distribuir, o mercado, com o aparecimento dos supermercados

Cervejas. There have been good moments and also less good times as with everything in life but I’ve learned a great deal and I never got fed up perhaps due to having been through so many different positions. Whenever I joined a new department, it was always like starting at a new company. I have a motto that is to like doing everything that I do and I always see the “glass as half-full”. Are you the longest serving employee of SCC? I am one of the longest. As regards this, I brought you here today, in a symbolic sense and for the first time in an interview, a “Gold Bottle Top” attributed to employees with 40 years of service. Every year, there is a ceremony in which workers with 25 years and 40 years of career are honoured with a gold Sagres bottle top. Today, I bring it as a register and also in honour of all my colleagues that made it to 40 years. I’ve already done 47 and it’s just symbolic. What is the secret of your longevity in the company? The secret my to longevity in the company is the capacity for adaptation, knowing how to change, resilience, flexibility without ever giving up on my principles, which I consider are the structural backbone to my personality. Companies live in permanent change and there is a need to grasp that change and know how to frame it. And, after that, it is knowing how to hear, the capacity for active listening, to be open to sharing power, integrating into teams, having the right soft skills. For me, these are the signals for longevity because this company has changed massively and will continue to change. What are the main differences between Sociedade Central de Cervejas e Bebidas (SCC) where you began your career and that which we know today? The differences are enormous even at the level of market size, the competition. I remember how in the 1970s and later, the major competitor for beer was wine. Today, wine is still a competitor for beer but not on its own as there is a lot more competition and the

O S E G R E D O DA LO N G E V I DA D E N A C O M PA N H I A É A C A PAC I DA D E D E A DA P TAÇ ÃO , O SABER MUDAR, A RESILIÊNCIA, A FLEXIBILIDADE, SEM NUNCA ABDICAR DOS MEUS PRINCÍPIOS. T H E S E C R E T M Y TO LO N G E V I T Y I N T H E C O M PA N Y I S T H E C A P A C I T Y F O R A D A P T AT I O N , KNOWING HOW TO CHANGE, RESILIENCE, FLEXIBILITY WITHOUT EVER GIVING UP ON MY PRINCIPLES.

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ECONOMIA e hipermercados, o canal Horeca, a ligação ao futebol e à música, na década de 90, tudo isto se sofisticou. Hoje em dia os empresários de restauração são completamente diferentes do que eram há 40 anos atrás. Os portugueses mudaram completamente os seus hábitos de almoçar e jantar fora, a própria cerveja começou a ser bebida e entendida de outra forma, tudo mudou. Aliás basta olhar para a publicidade ao longo dos tempos. É preciso saber acompanhar as tendências e estar atento aquilo que é a evolução do consumidor e adaptar-se. Foi o que as nossas marcas fizeram, alargando o seu portefólio, cervejas sem álcool, mais fortes, menos fortes, com sabores, cervejas mais especializadas, etc. No fundo é uma adaptação constante através de escuta activa do que são as expectativas dos consumidores. Conviveu com 18 CEO e seis accionistas na SCC. Pode partilhar algo que tenha aprendido com algum(s) deles? O primeiro período de accionistas privados é muito curto, de Outubro de 74 a Janeiro de 75. Depois temos o período de empresa pública, um período um pouco turbulento porque tivemos muitas administrações. Embora tivéssemos tido administradores de referência durante esse período, como o Dr. Marques de Carvalho, que foi ministro do Trabalho do Governo Mota Pinto, foi nosso presidente e director de recursos humanos e que marcou indiscutivelmente esse período. Seguidamente tivemos o período da privatização, com o Grupo colombiano Santo Domingo, que geriu a empresa durante 10 anos (1990-2000) à distância. Sendo um grande grupo cervejeiro, tinham ‘know how’ e foi nesta altura que foi feito o acordo com a Selecção Nacional de Futebol, porque os colombianos perceberam essa ligação. Mais tarde voltou a Parfil, um grupo de empresários portugueses constituído pela Portugália, BES, Fundação Bissaya Barreto, Olinveste e Fundação Oriente. Em 2002 e até 2008, estivemos sob a alçada do Grupo escocês Scottish&Newcastle e por fim entrou a Heineken. Mas de todos, o accionista mais global, que mais sinergias traz

beverage market is now far broader. The scale of the company, the establishments, the means of distribution, the market, with the appearance of supermarkets and hypermarkets, the hospitality sector, the connection to football, music in the 1990s, this all got a lot more sophisticated. Nowadays, restaurant owners are completely different to how they were 40 years ago. The Portuguese entirely changed their habits of having lunch and dinner outside the home, beer itself began to be drunk and perceived in a different fashion. Everything changed. Indeed, we only need to take a look at the advertising over this period of time. This needs the knowledge to accompany the trends and be aware of how the consumer is evolving and then adapt accordingly. That is what our brands have done, expanding their portfolio, alcohol free beers, stronger and weaker beers, with different flavours, more specialist beers, etcetera. In summary, this is a constant adaptation through actively listening to the expectations of consumers. You worked under 18 CEOs and six shareholders at SCC. Can you share some of what you learned from some of them? The first period of private ownership was very short, from October ‘74 to January ‘75. After spending a period of time under public ownership, rather turbulent because we had many different administrations. However, we also had landmark directors during that period, such as Dr. Marques de Carvalho, who was the Minister of Labour in the Mota Pinto Government, who was our president and director of human resources and undoubtedly made his mark on this period. Afterwards, we had a period of privatisations under the Colombian group Santo Domingo, which managed the company at a distance for a decade (1990-2000). As a great brewer, they had knowhow and it was at this time that we made an agreement with the National Football Team because the Colombians understood this connection. Then, it returned to Parfil, a group of Portuguese companies made up of Portugália, BES, Fundação Bissaya Barreto, Olinveste and

O AC C I O N I S TA M A I S G LO B A L , QUE MAIS SINERGIAS TR AZ AO N Í V E L D E I N O VAÇ ÃO , T É C N I C O , D E G E S TÃO D E TA L E N T O S E C A R R E I R A S , D E VA LO R AC R E S C E N TA D O PA R A A C E N T R A L DE CERVE JAS, É O GRUP O HEINEKEN. T H E B E S T G LO B A L S H A R E H O L D E R , W I T H T H E G R E AT E S T S Y N E R G I E S I N T E R M S O F I N N O V AT I O N , T E C H N I C A L M E A N S A N D TA L E N T A N D C A R E E R M A N A G E M E N T, P R O V I D I N G A D D E D VA LU E T O CENTRAL DE CERVE JAS, HAS BEEN T H E H E I N E K E N G R O U P. 84


ECONOMICS ao nível de inovação, técnico, de gestão de talentos e carreiras, de valor acrescentado para a Central de Cervejas, é o Grupo Heineken. Todos eles sempre respeitaram as marcas portuguesas e a sua reputação, nomeadamente a Sagres e a Luso? Todos eles respeitaram as marcas nacionais. Para além de terem percebido que, quer a Sagres, quer a Luso, são marcas icónicas da portugalidade e a sua ligação aos consumidores, também tiveram noção do peso destas marcas na nossa estrutura de actividade. Como qualificaria pessoal e profissionalmente as experiências internacionais que teve, nomeadamente na Colômbia e nos Estados Unidos da América? No tempo dos colombianos tive dois estágios. Um estágio nos Estados Unidos, em Los Angeles, no distribuidor de uma marca que nós representávamos- Budweiser- e outro numa empresa de distribuição pertencente à filha do Frank Sinatra, a Nancy Sinatra. Em LA estive uns tempos com um colega porto ricanho a percorrer todos os bares e restaurantes, a verificar o ‘freshness’ da Budweiser, para que o consumidor pudesse consumir a cerveja mais fresca possível. Foi uma experiência riquíssima. Mais tarde tive outra experiência, no Grupo Bavaria, em Medellín, na Colômbia a fazer pré-venda, para aprender como se fazia e depois implementar em Portugal. Foi uma grande aprendizagem e uma oportunidade que o Grupo me proporcionou. O Nuno é um diplomata nato, o que tem sido reconhecido pelos diversos convites para presidir várias associações das quais faz parte. Qual o relevo que isso tem na sua carreira? A questão de ser um diplomata nato tem muito a ver com a minha forma de ser. Eu sou uma pessoa muito mais de pontos do que rupturas, gosto de consensualizar posições, o que não quer dizer que toda a gente tenha de estar de acordo. E isto tem a ver ainda com a questão que me colocou à pouco sobre a longevidade na Companhia. Esta questão de encontrar soluções em conjunto, pontos de aproximação, procurar consensualizar, é também aquilo que justifica e leva a minha carreira, mas também é a razão por que muitas associações me procuram para fazer parte delas, para apoiar e ajudar nesse sentido. Há algum cargo que lhe tenha dado especial gozo? Eu gostei de todos. Acho muito gratificante ser o primeiro português a ser Presidente da Câmara de Comércio Portugal-Holanda. A Câmara sempre foi presidida por holandeses, tem um ‘bord’ misto entre portugueses e holandeses, mas fui o primeiro português a ser eleito para presidente. Gosto muito de ser presidente da autorregulação publicitária, que representa os anunciantes. É um órgão que permite dizer ao legislador que a autorregulação pode ir muito para além daquilo que a legislação prevê e muito melhor. Fazer parte conselho da Prevenção Rodoviária Portuguesa também é muito engraçado. Depois de 20 anos como Diretor de Comunicação e Relações Institucionais da Sociedade Central de Cervejas, foi nomeado

Fundação Oriente. In 2002 and through to 2008, we were under the British group Scottish&Newcastle before finally Heineken arrived. Out of them all, the best global shareholder, with the greatest synergies in terms of innovation, technical means and talent and career management, providing added value to Central de Cervejas, has been the Heineken group. Did they always respect the Portuguese brands and their reputations, especially Sagres and Luso? They all respected the national brands. In addition to having perceived that both Sagres and Luso are iconic brands for the Portuguese identity and their connection to consumers, they also had a grasp of the weighting of these brands in the structure of our activities. How would you qualify personally and professionally the international experiences that you had in Colombia and the United States? Under the Colombian owners, I went on two internships. One was in the United States, in Los Angeles, at the distributor of a brand that we represented - Budweiser- and another at a distribution company belonging to the daughter of Frank Sinatra, Nancy Sinatra. In LA, I spent some time with a Puerto Rican colleague touring all the bars and restaurants to verify the ‘freshness’ of Budweiser to ensure that the consumer was able to consume the coldest possible beer. This was such a rich experience. Later, I had another such experience, at the Bavaria Group in Medellín, Colombia doing pre-sales in order to learn how this gets done before then implementing the system in Portugal. This was a great learning curve and a opportunity the Group provided for me. Nuno is a natural diplomat, which gets reflected by the different invitations that you have had to chair various of the associations you belong to. What role has this played in your career? The question of being a natural diplomat very much relates to my way of being. I am a person who, far more than points of rupture, likes to achieve consensual positions, which does not mean that everybody has necessarily to be in agreement. And this also derives from the question you just asked me about my longevity at the company. This issue of jointly finding solutions, points of approximation, seeking consensus is also something that justifies and advances my career but is also the reason that many associations seek me out to be a member, to support and help in this way. Is there any position that has brought you particular pleasure? I liked all of them. I was extremely gratified to be the first Portuguese to serve as President of the Portugal-Netherlands Chamber of Commerce. The Chamber had always been chaired by the Dutch, with a mixed board of Portuguese and Dutch but I was the first of the former to be elected president. I very much enjoyed being president of the advertising self-regulator, which represents the advertisers. This body enabled us to tell the legislator that self-regulation can reach far beyond that stipulated in the legislation and do far better. 85


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ECONOMIA em Julho Presidente do Conselho de Administração da SCC. Como vê esse reconhecimento por parte da companhia? Depois de 47 anos de companhia com diversas funções fui desafiado para ser o Chairman (Presidente do Conselho de Administração) da companhia Sociedade Central de Cervejas. Primeiro acho que é muito prestigiante, estou muito reconhecido e agradecido. Acho que foram muito simpáticos e generosos na minha apreciação, espero ser útil nesta função, que é uma função disponível para o que o conselho de administração entender que eu faça. No fundo é o coroar de uma carreira e o reconhecimento do papel que tive na Companhia. As pessoas hoje em dia não pensam muito em carreiras, pensam em experiências, mas é um bom testemunho de como uma pessoa que entrou com 18 anos para uma empresa para uma função completamente indiferenciada pode chegar ao topo dessa mesma empresa. O Nuno é visto como uma inspiração para outras empresas e, sobretudo, para os mais jovens que estão hoje a iniciar a sua carreira. Que conselho dá a alguém que acaba de entrar no mundo do trabalho? Fiz muitos acolhimentos na Central de Cervejas. Com toda a humildade, os conselhos que sempre dava a quem acabava de entrar era escutar antes de emitir uma opinião. A escuta activa é uma forma de aprenderem, de se envolverem, é uma forma de ganhar empatia. O primeiro ‘approach’ é muito importante. “Ouçam, perguntem, questionem, mas não emitam opinião de imediato, guardem para o momento próprio. Formem a opinião depois de ouvir, não venham com opiniões formatadas”. Não menos importante é não excluir ninguém. Eu aprendi com Alberto da Ponte, que foi nosso presidente executivo entre 2004 e 2012, uma coisa que nunca mais me esqueci: “Nunca recuses uma conversa”. Eu nunca recusei uma conversa, estou sempre disponível, aprende-se sempre qualquer coisa com uma conversa. Depois há outra coisa, essa não se aprende na escola, que tem

Being a member of the Portuguese Road Safety Council has also been extremely stimulating. After 20 years as Director of Communications and Institutional Relations at Sociedade Central de Cervejas, in July you were nominated Chairman of the SCC Board of Directors. How do you see this recognition by the company? After 47 years at the company across many different positions, I was challenged to take up the position of Chairman of the Sociedade Central de Cervejas Board of Directors. Firstly, I feel this is most prestigious, I feel most recognised and thankful. I think they were very nice and generous in their appreciation of me and I hope to be useful in this role, which is a position open for as long as the Board of Directors understands that I should do it. In summary, this is the crowning moment of my career and recognition of the role that I had in the company. People nowadays don’t think a great deal about careers. They think about experiences but it is a good example of how a person who joined a company at the age of 18 for a completely run-of-the-mill role may still reach the top of that same company. Nuno is perceived as an inspiration to other companies and, above all, to young people today starting out in their careers. What advice would you give somebody starting out in the world of work? I have welcomed many into Central de Cervejas. With all humility, the advice that I’ve always given to those just arriving is to listen before advancing with an opinion. Active listening is a means of learning, of getting involved and a way of earning empathy. The first approach is the most important. “Listen, ask, question but do not issue any immediate opinion. Form that opinion after listening and don’t come in with already formatted opinions”. It is no less important to avoid ever excluding anybody. I learned from Alberto da Ponte, who was our executive president between 2004 and 2012, something that I have never since forgotten:

ACHO QUE F OR AM MUITO S I M P ÁT I C O S E G E N E R O S O S N A MINHA APRECIAÇ ÃO, ESPERO S E R Ú T I L N E S TA F U N Ç ÃO , Q U E É UMA FUNÇ ÃO DISP ONÍVEL PA R A O Q U E O C O N S E L H O D E ADMINISTR AÇ ÃO ENTENDER QUE EU FAÇ A. I THINK THEY WERE VERY NICE AND GENEROUS IN THEIR A P P R E C I AT I O N O F M E A N D I H O P E TO BE USEFUL IN THIS ROLE, WHICH IS A POSITION OPEN F O R AS LO N G AS T H E B OA R D O F D I R E C T O R S U N D E R S T A N D S T H AT I S H O U L D D O I T. 88


ECONOMICS

D E V I A H AV E R U M A C A D E I R A D E BOM SENSO NA FACULDADE. O BOM SENSO É DETERMINANTE PA R A A F E L I C I DA D E DA S P E S S OA S , PA R A O D I A A D I A .

THERE SHOULD BE A SUBJECT I N F A C U LT I E S F O R L E A R N I N G GOOD SENSE. COMMON SENSE IS DETERMINANT TO THE HAPPINESS OF PEOPLE, TO T H E I R D A I LY L I V E S .

muito a ver com ‘soft skills’, o bom senso é importantíssimo. Devia haver uma cadeira de bom senso na faculdade. O bom senso é determinante para a felicidade das pessoas, para o dia a dia. E, por fim, assumir tudo com paixão, com fervor, com dedicação, com profissionalismo, assumir tudo como sendo aquilo que é a sua bandeira. E foi o que eu fiz sempre na Companhia. Quais as suas principais missões para o novo cargo e qual o maior desafio? Não é um cargo executivo. Conforme lhe referi, as minhas funções vão ser aquelas que o meu conselho de administração entender, mas essencialmente vai ser de representação nas associações, no fundo aquilo que mais valorizaram na minha carreira nestes anos todos. Já há substituto para o seu anterior cargo? Não, estamos em processo de recrutamento. O processo está a ser feito de forma externa, quando a revista sair pode ser que já se saiba. Qual o futuro do sector das bebidas em Portugal? Com desafios permanentes e com muitos produtos novos. Lançámos recentemente a Pure Piraña, uma água gaseificada, com saber a frutas e com teor alcoólico igual à cerveja, uma tendência em grande crescimento. Todos os anos são lançados produtos novos. Temos o desafio permanente da concorrência, cada vez maior. A pandemia penalizou a categoria Cerveja, por aquilo que é o seu ADN, a convivialidade. Mas há que ser resiliente e prevejo um futuro risonho, de lançamentos, de novas experiências e sempre com foco naquilo que os consumidores querem. Mas o futuro é muito incerto. Hoje em dia, o futuro é hoje à tarde. l

“Never turn down a conversation”. I’ve never refused a conversation, I’m always available as you always learn something through a conversation. Afterwards, there is another thing that you do not learn in school that has a lot to do with soft skills, having good common sense is extremely important. There should be a subject in faculties for learning good sense. Common sense is determinant to the happiness of people, to their daily lives. And, finally, take on everything with passion, with enthusiasm, with dedication, with professionalism, accepting everything as if that is your own personal flag. And that was what I’ve always done in the company. What are the key missions and the greatest challenges in your new role? It is not an executive position. As I mentioned, my functions are going to be what the Board of Directors best understands but essentially this involves representation at associations, basically, that which they most value in my career over all of these years. Do you already have a replacement for your former role? No, we are undertaking the recruitment process. This is being done externally and may already be known by the time the magazine comes out. What is the future of the beverage sector in Portugal? With constant challenges and a lot of new products. We recently launched Pure Piraña, a sparkling mineral water with the flavour of fruit and the same alcohol content as beer, a segment experiencing great growth. There are new products coming out every year. We have the constant challenge of ever rising levels of competition. The pandemic hit the beer segment hard, which is at the core of our DNA, due to the lack of socialisation. But we have to be resilient and foresee a happy future with the launch of new experiences and always focused on that which the consumers want. However, the future is very uncertain. Nowadays, the future is this afternoon. l 89


ECONOMIA

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W PAULA CABAÇO, PRESIDENTE DA APRAM – ADMINISTRAÇÃO DOS PORTOS DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA PAULA CABAÇO, ADMINISTR ATION OF THE PORTS OF THE AUTONOMOUS REGION OF MADEIRA

“SENTIMOS A NECESSIDADE DE REPOSICIONAR A MARCA ‘P ORTOS DA MADEIR A’” “ W E F E LT T H E N E E D T O R E P O S I T I O N T H E ‘ P O R T S O F M A D E I R A’ B R A N D ”

E M E N T R E V I S TA À P R É M I O , PA U L A C A B A Ç O FA L A D O R E P O S I C I O N A M E N T O DA M A R C A “ P O R T O S DA M A D E I R A”, M AT E R I A L I Z A D O N A A S S I N AT U R A “ Y O U R S A F E P O R T ” E N A P R O D U Ç ÃO D E N O V O M AT E R I A L P R O M O C I O N A L . D E C O R R E N T E D E U M C O N J U N T O D E M E D I DA S S A N I TÁ R I A S I M P L E M E N TA DA S N O Â M B I T O DA PA N D E M I A , E S TA M E N S A G E M V E M R E F O R Ç A R A I D E I A D E Q U E O S P O R T O S S ÃO P O R TA S D E E N T R A DA S E G U R A S N A R E G I ÃO . A P R E S I D E N T E DA A P R A M A D I A N TA A I N DA Q U E A N O VA E S T R AT É G I A PA S S A P O R R E F O R Ç A R A P R O X I M I DA D E C O M A S C O M PA N H I A S E PA R T I C I PA R N O S G R A N D E S E N C O N T R O S M U N D I A I S D O S E C T O R . A D I G I TA L I Z A Ç ÃO E A S U S T E N TA B I L I DA D E A M B I E N TA L S Ã O O U T R O S D E S A F I O S Q U E T E M P E L A F R E N T E . I N I N T E R V I E W S W I T H P R É M I O , PA U L A C A B A Ç O S P E A K S A B O U T T H E R E P O S I T I O N I N G O F T H E “ P O R T S O F M A D E I R A” B R A N D , R E F L E C T E D I N T H E S L O G A N “ Y O U R S A F E P O R T ” A N D T H E P R O D U C T I O N O F N E W P R O M O T I O N A L M AT E R I A L S . S T E M M I N G F R O M T H E S E R I E S O F S A N I TAT I O N M E A S U R E S I M P L E M E N T E D W I T H I N T H E S C O P E O F T H E PA N D E M I C , T H I S M E S S A G E S E R V E S T O S T R E N G T H E N T H E I D E A T H AT T H E S E P O R T S A R E S A F E W AY S O F E N T E R I N G T H E R E G I O N . T H E A P R A M P R E S I D E N T A L S O A D D S H O W T H E N E W S T R AT E G Y I N V O L V E S S T R E N G T H E N I N G T H E P R O X I M I T Y T O C O M PA N I E S A N D PA R T I C I PAT I N G I N T H E M A J O R W O R L D E V E N T S F O R T H E S E C T O R . D I G I TA L I S AT I O N A N D E N V I R O N M E N TA L S U S TA I N A B I L I T Y A R E A M O N G T H E O T H E R L O O M I N G C H A L L E N G E S . 90

FOTOS GENTILMENTE CEDIDAS PEL A APR AM

PRESIDENT OF APRAM –


ECONOMICS

ANA VAL ADO

Depois de mais de um ano parados, os Portos da Madeira retomaram a sua actividade, curiosamente do dia 10 de Junho, Dia de Portugal, com o navio World Voyager da portuguesa MysticInvest Holding. Desde esse dia como tem sido a retoma da actividade turística de cruzeiros? Quantos navios e turistas de cruzeiros passaram pela Madeira nestes quatro meses? Posteriormente a esta escala foram realizadas mais duas e a quarta escala que estava prevista só não se realizou porque coincidiu com a decisão do governo alemão de colocar Portugal no “corredor vermelho”. Esta operação mobilizou cerca de 400 passageiros, tendo sido para a APRAM extremamente importante, na medida em que correspondeu à criação, no actual contexto Covid, de um novo produto, com um itinerário que integra exclusivamente as Ilhas da Madeira e dos Açores. O armador já confirmou que pretende dar continuidade a este roteiro, em 2022 e 2023. Em Setembro tivemos uma escala técnica do “Norwegian Breakaway”. Este mês de Outubro marca a retoma dos navios de cruzeiros aos portos da Região Autónoma da Madeira (RAM), com uma previsão de 29 escalas, cinco das quais no Porto do Porto Santo. Se tudo correr bem, no final de Dezembro poderemos ter somado cerca de 100 escalas de navios de cruzeiros nos nossos portos, do Funchal e do Porto Santo. Antes da pandemia, a Alemanha e a Inglaterra eram os mercados prioritários da APRAM. Estes mercados continuam a liderar ou existem novas tendências? No turismo tradicional madeirense, os mercados alemão e inglês são de facto muito significativos. Também no turismo de cruzeiros, sobretudo nos cruzeiros de origem europeia, há uma prevalência de alemães e ingleses, mas depois há muitos italianos, americanos e uma série de outras nacionalidades. Pensamos que a pandemia não mudou essa realidade! Apesar da paragem de actividade e com os portos de praticamente todo o mundo fechados, os portos da Madeira aproveitaram para melhorar as suas infra-estruturas e preparar-se para receber os seus visitantes com a máxima segurança e comodidade. Em que consistiu este investimento e qual o seu valor? O Governo Regional, através de vários contratos programa com a APRAM, tem vindo a realizar grandes investimentos na manutenção das infra-estruturas portuárias. Algumas obras já decorriam antes de Março de 2020 e o que fizemos durante a pandemia foi acelerar o processo, aproveitando o facto de não haver navios. Foi o caso do Porto do Funchal, onde nomeadamente foi reforçado o manto de protecção do molhe da Pontinha e substituídos todos os cabeços de amarração. Um investimento de mais de meio milhões de euros que assegura

After being halted for over a year, the Ports of Madeira have resumed their activities, specifically on 10 June, Portugal Day with the arrival of the vessel World Voyager belonging to the Portuguese MysticInvest Holding. Has there been a resumption in cruise tourism activities since that day? How many ships and cruise liners have dropped anchor in Madeira over these last four months? Subsequent to this stopover, there were another two and the fourth was planned but did not happen because it coincided with the decision by the German government to place Portugal in its “red corridor”. This operation involved around 400 passengers with APRAM playing an extremely important role to the extent that this corresponded to setting up, within the current Covid context, of a new product with a route that exclusively integrates the islands of Madeira and the Azores. The operator has already confirmed the intention of continuing with this route in 2022 and 2023. In September, we also had a technical visit from “Norwegian Breakaway”. This month of October sees the resumption of cruise liners visiting the ports of RAM – the Autonomous Region of Madeira with a forecast of 29 stopovers, five of which will be in the Port of Porto Santo. Should everything go according to plan, by the end of December, we will have received around 100 visits from cruise liners to our ports of Funchal and Porto Santo. Prior to the pandemic, Germany and the United Kingdom represented the priority markets for APRAM. Do these markets still top the list or are there new trends? In the traditional Madeira tourism sector, the German and British markets are in fact very significant. In cruise tourism, especially of European origin, there is a prevalence of Germans and British but there are also many Italians, Americans and a whole series of other nationalities. We believe that the pandemic has not changed this reality! Despite the halt in activities and with practically all ports closed worldwide, the port of Madeira took advantage to improve their infrastructures and prepared to receive visitors with the maximum of safety and ease. What did those investments involve and what was their total value? The Regional Government, through various program contracts with APRAM, has been undertaking some major maintenance investment in the port infrastructures. Some works were already ongoing prior to March 2020 and what we did during the pandemic was to accelerate this process taking advantage of the fact that there were no vessels to work around. This was the case of the Port of Funchal, where there was the reinforcement of the protective breakwater of Pontinha and 91


ECONOMIA a realização da operação portuária, em boas condições de segurança. Em breve, vão iniciar-se obras no Porto e Marina do Porto Santo cujo investimento irá ultrapassar um milhão e meio de euros. São obras de manutenção e reabilitação daquelas infra-estruturas que contemplam a reabilitação de 700 metros do cais, com betão betuminoso. Na Marina tem a ver, essencialmente, com o arranjo do que foi destruído por temporais recentes. Isto numa altura em que aquela marina é muito procurada por veleiros de passagem para as Américas, sobretudo em Setembro e em Outubro. Além disso temos investido fortemente na melhoria dos designados pequenos cais que têm um papel muito importante, em termos económicos e sociais, nos diferentes concelhos da RAM. Trata-se de manter e melhorar as condições de abrigo de pequenas embarcações de pesca, mas também de estimular o desenvolvimento das actividades marítimo-turísticas, criando novas atractividades descentralizadas. Não posso deixar de referir o trabalho desenvolvido pela APRAM, que foi pioneiro a nível nacional, na criação de documentos estratégicos, como o Plano de Gestão para o Porto no âmbito da Covid, assim como na aquisição de equipamentos, de modo a dotarmos as nossas instalações portuárias de todas as condições, em termos de segurança sanitária, tendo em vista proteger quem nos visita, mas também a nossa comunidade local, num tempo que é ainda de pandemia. Todo este trabalho no domínio do combate e prevenção da Covid-19 e também na vertente da oferta de condições à retoma do mercado de cruzeiros, foi distinguido, primeiro, pela certificação da SGS pelas “Boas Práticas contra os Riscos Biológicos” e, mais recentemente, com o certificado do Turismo de Portugal “Clean and Safe 2021”, na tipologia de terminais de cruzeiros. Este investimento foi totalmente suportado pelo Governo Regional. Apesar das várias reivindicações do Presidente da RAM, Miguel Albuquerque, os Portos e Marinas da região não foram contemplados no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a Madeira. Sendo as obras de renovação do Porto do Funchal um “projecto estruturante” para a região, como não foi tido no PRR?

the replacement of all the mooring bollards. This investment of over half a million euros ensures the undertaking of port operations in the best safety conditions. Work shall shortly begin on the Port and Marina of Porto Santo with investment in excess of 1.5 million euros. The project involves the maintenance and rehabilitation of those infrastructures and including the restoration of 700 metres of wharf in asphalt concrete. In the Marina, this essentially involves repairing what got destroyed in the recent storms. This takes place at a time when that marina is in great demand for passenger yachts heading to the Americas, especially in September and October. Furthermore, we have invested strongly in improving that known as the small docks that play a very important role in both economic and social terms in the different RAM councils. This is about maintaining and improving the docking conditions for small fishing vessels while also stimulating the development of maritime-tourism activities and creating new decentralised attractions. I cannot avoid mentioning the work undertaken by APRAM, which was a pioneer at the national level, in producing strategic documents, such as the Port Management Plan for Covid, as well as in the procurement of equipment to ensure our port installations were the best possible in terms of sanitation safety conditions taking into consideration protecting both those who visit us but also our local community in a period which is still one of pandemic. All of this work in the field of combating and preventing Covid-19 and also in the provision of the conditions for the return of the cruise market was distinguished firstly by SGS certification for “Best Practices against Biological Risks” and more recently with the Turismo de Portugal “Clean and Safe 2021” certificate for the cruise terminal typology. This investment was totally funded by the Regional Government. Despite various demands from the RAM President, Miguel Albuquerque, the Ports and Marinas in the region do not fall under the auspices of the PRR – the Recovery and Resilience Plan for Madeira. As the renovation work on the Port of Funchal is a “structural project” for the

PORTO DO PORTO SANTO

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ECONOMICS

PORTO DO FUNCHAL

Isso é algo que nós não compreendemos. Os portos são infra-estruturas críticas para a acessibilidade marítima, sobretudo, numa região insular como a nossa que depende da mesma para o seu abastecimento, assim como porta de entrada de turistas. Por outro lado, há desafios futuros que têm de ser preparados com vista ao reforço da nossa competitividade. Por exemplo, a ampliação do Porto do Funchal, em 400 metros, visa satisfazer duas necessidades: a primeira, tem a ver com a criação de mais espaço de acostagem, sobretudo para navios de maior dimensão, pois antes da pandemia foram alguns os dias que tivemos de recusar navios, porque o porto estava lotado. A segunda, tem a ver com o reforço da segurança da baixa do Funchal, evitando galgamentos e viabilizando a utilização do cais 8. Além disso, são muitos os desafios futuros que se colocam ao sector portuário, como a crescente digitalização e inovação, contribuindo para uma maior eficiência do processo logístico, e a própria sustentabilidade ambiental, que hoje está no centro de todas as atenções. A entrada de navios de maior dimensão pede um ajustamento ou adaptação das infra-estruturas. No nosso caso só pode ser mesmo através da ampliação, sob pena de se retirar competitividade a um porto que tem estado nas linhas da frente do sector de cruzeiros a nível nacional. Quais as expectativas da APRAM para o fim de ano, sendo uma das épocas do ano que mais turistas procuram a Madeira? São boas, temos 10 reservas de cais ou fundeadouro. Uma boa notícia para nós APRAM, mas também para todos os funchalenses, que se habituaram na passagem de cada ano a ter a baía com muitos navios de cruzeiro. Só para ter uma ideia, o dia 31 de Dezembro é o dia que regista mais acessos ao nosso site, exactamente para ver quantos, quais e as horas de chegada dos navios que vão estar a assistir ao espectáculo de passagem de ano. Quais as principais companhias de cruzeiros que visitam a Madeira? Todas nos visitam, embora as que têm mais expressão são a AIDAcruises, P&O, Thomson, TUI e MSC.

region, why was this not in the PRR? This is something that we do not understand. The ports are critical infrastructures for maritime access especially in an island region like our own that depends on them both for supplies and as a port of entry for tourists. Furthermore, there are future challenges that require preparation in terms of bolstering our competitiveness. For example, the expansion of the Port of Funchal by 400 metros seeks to meet two needs: the first relates to establishing more anchoring space, especially for smaller vessels as, prior to the pandemic, there were some days when we had to refuse entry to vessels because the port was full. The second stems from reinforcing the safety conditions in lower Funchal, avoiding flooding and enabling the operation of wharf 8. Furthermore, there are many future challenges facing the port sector, such as the growing level of digitalisation and innovation contributing towards greater efficiency in logistics processes and to the environmental sustainability that is today at the centre of every attention. The arrival of larger scale ships requires adjustments or adaptations to infrastructures. In our case, this can only take place through expansion on pains of losing competitiveness at a port that has been on the frontline of the cruise sector at the national level. What are the APRAM expectations for the end of the year; one of the periods of the year with greatest tourism demand for Madeira? They are good. We have ten reservations for wharf or anchorage slots. That is good news for we at APRAM but also for all Funchal residents who had become used to the New Year’s Eve having a lot of cruise ships in the bay. Just to give you an idea of that, 31 December is the day when our website gets most traffic precisely to see just how many, which and when do the cruise liners arrive to attend the end of year spectacle. What are the main cruise liner companies visiting Madeira? They all visit us although the companies with most visits are AIDAcruises, P&O, Thomson, TUI and MSC. 93


ECONOMIA

MIRADOURO DOS MOÍNHOS - PORTO SANTO

O que é que a Madeira tem para oferecer aos turistas de cruzeiros, que a diferenciam de outros destinos? Desde logo a chegada a uma baía que continua a encantar quem nos visita. Há inúmeros testemunhos, na literatura ou em crónicas de jornais, que falam da magia da chegada à Madeira. Além disso, temos um clima agradável, uma natureza imponente, uma oferta de serviços bastante diversificada e um destino seguro, todo um pacote que torna a escala na Madeira uma experiência inesquecível.

What does Madeira have to offer cruise tourists that differs from other destinations? From the beginning, the bay continues to charm everyone who visits. There are countless witness accounts in literature, newspapers and magazines referring to the magic of arriving in Madeira. Furthermore, we have a pleasant climate, imposing nature, a range of fairly diversified services and are a safe destination. As a package, this all turns a stopover in Madeira into an unforgettable experience.

Como a APRAM está a apostar na promoção do destino junto das principais companhias de cruzeiros e como vai potenciar a competitividade no mercado internacional de Cruzeiros? Somos um porto com uma longa história e tradição no corredor do Atlântico, que sempre foi muito procurado devido à sua posição estratégica. A proximidade com as companhias sempre foi uma das nossas características. Nos anos 90, criámos uma parceria com as Autoridades Portuárias de Canárias e nasceu a marca “Cruise in the Atlantic Islands”, que uniu os atractivos e sinergias destes dois arquipélagos atlânticos. De tal forma que esta rota CanáriasMadeira-Canárias transformou as nossas ilhas, antes da pandemia, na terceira zona mundial de Inverno, com cerca de 30 mil escalas e mais de dois milhões de turistas, anualmente. É uma parceria que nos ajuda a competir com os melhores do mundo, mas claro que temos estado abertos a outras possibilidades de negócio, incluindo os projectos que juntam os portos portugueses. Durante a pandemia e perante a decisão do Governo espanhol que impediu que os navios da rota de Canárias viessem à Madeira, uma medida justificada no contexto da prevenção da Covid-19, desafiámos os nossos colegas açoreanos para a criação de um novo produto, um itinerário pelas ilhas portuguesas que correu bem. A nossa estratégia em termos comerciais pretende reforçar a proximidade com as companhias, para além da participação nos grandes encontros mundiais do sector e nas associações de portos, onde delineamos procedimentos comuns. Com efeito, pretendemos efectuar acções directas de relações públicas com as

How is APRAM undertaking the promotion of the destination among the main cruise liner operators and how can you enable your competitiveness in the international cruise tourism market? We are a port with a long history and tradition in the Atlantic corridor, which has always been in great demand due to its strategic location. Proximity with companies has always been one of our main characteristics. In the 1990s, we set up a partnership with the Port Authorities of the Canaries and founded the brand “Cruise in the Atlantic Islands”, which united the attractions and synergies of these two Atlantic archipelagos. Indeed, this route Canaries-MadeiraCanaries transformed our island, prior to the pandemic, to become the third zone in the world for the winter season with around 30,000 stopovers and over two million tourists per year. This is a partnership that enables us to compete with the best in the world but we are of course still open to other business opportunities, including projects that bring together Portuguese ports. During the pandemic and given the decision by the Spanish government to block vessels on the Canaries route from visiting Madeira, a measure justified by the context of preventing the spread of Covid-19, we challenged our Azorean colleagues to come up with a new product, an itinerary through the Portuguese islands, which went well. Our strategy in commercial terms seeks to strengthen proximity with the companies, beyond participating in the major world gatherings for this sector and port associations, where we define common procedures. In

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ECONOMICS companhias. Apesar de toda a tecnologia que cada vez mais nos envolve, os contactos pessoais continuam a ser uma mais-valia importante. Sabemos que estão a fazer um ‘rebranding’ à marca APRAM, com a nova assinatura “Your Safe Port”. Em que consiste esta alteração e qual o novo conceito por trás da marca? Neste novo contexto Covid, sentimos a necessidade de reposicionar a marca “Portos da Madeira”, de forma a transmitirmos os novos valores associados à segurança do destino e dos nossos portos. A nova assinatura “Your Safe Port” pretende salientar que, decorrente de um conjunto de medidas sanitárias que foram implementadas, os portos são portas de entrada seguras na Região. Para o relançamento da actividade, após um ano e meio praticamente paralisada, esta mensagem é fundamental para recuperar a confiança de quem nos visita. Este ‘rebranding’ da marca vai ser materializado, através da nova assinatura, mas também através da produção de novo material de comunicação e promocional, nomeadamente, a de um vídeo, brochura e material de merchandising. Pretendemos também que o conceito “Safe Port”, se interprete em termos afectivos como porto de acolhimento, sinónimo de “bem receber”, atributo que tão bem caracteriza o nosso destino turístico e a nossa população. Para além da vertente turística, existe também a vertente de abastecimento e exportação, fundamental numa ilha, sendo a principal porta de entrada e de saída de mercadorias. Quer fazer-nos um balanço desta vertente nos últimos meses? A Região Autónoma da Madeira importa 95% do seu consumo e dessa importação 99% chega por via marítima. Por isso, o Porto do Caniçal é a grande porta de abastecimento da região. Este porto esteve sempre a funcionar, mesmo em pleno confinamento. E analisando as variações de cada mês, no total, não houve grandes diferenças na importação como na exportação durante este tempo de pandemia. As diretrizes do Governo Regional “definem portos mais competitivos e mais eficientes, potenciadores do desenvolvimento económico e social da nossa região”. Como esta missão está a ser materializada pela APRAM? Nas ilhas, os portos são estruturantes do desenvolvimento económico e social. Portos competitivos e eficientes significa que trabalhamos no sentido de prestar melhores serviços aos nossos clientes, através de uma adequada utilização dos recursos humanos e financeiros. A aposta na formação e valorização dos quadros da APRAM, a permanente manutenção das nossas embarcações e equipamentos em terra, assim como das diferentes infra-estruturas e áreas dominiais têm sido investimentos fundamentais. Contudo, para o reforço da competitividade dos portos da RAM é prioritário abraçar, no curto prazo, novos projetos na área da digitalização e da sustentabilidade ambiental. Temos muito desafios pela frente. Não tenho dúvidas de que este é um caminho onde ainda temos de trabalhar muito! l

effect, we seek to carry out direct public relations actions with the companies. Despite all of the technology that increasingly surrounds us, personal contacts shall remain an important added-value. We know that you are undertaking a rebranding of APRAM, under the new slogan “Your Safe Port”. What do these changes consist of and what is the new concept behind the brand? In this new Covid context, we felt the need to reposition the “Ports of Madeira” brand in order to convey the new values associated with the safety and security of the destination and our ports. The new slogan “Your Safe Port” seeks to highlight that, following a series of sanitation measures that were duly implemented, the ports are safe entranceways into the Region. In order to relaunch activities, following a year and a half all but paralysed, this message is fundamental to restoring the confidence of those who visit us. This rebranding is going to take place through the new slogan but also through the production of new communications and promotional materials, especially a video, brochure and merchandising materials. We also seek to ensure the “Safe Port” concept is interpreted in affective terms as a safe haven, a synonym of “welcoming warmly”, an attribute that so well characterises our tourism destination and our population. In addition to the tourism market, there is also the supply and export markets, fundamental on an island as the main point of entrance and exit for all goods. Could you provide us a balance of this sector in recent months? The Autonomous Region of Madeira imports 95% of what it consumes and of these imports 99% arrive via maritime routes. Hence, the Port of Caniçal is the main point for supplying this region. This port always remained operational even in the midst of confinement. And analysing the variations in each month, in total, there were no major differences in the imports and exports ongoing during this pandemic period. The Regional Government objectives include “more competitive and more efficient ports, drivers of the economic and social development of our region”. How is APRAM achieving this mission? On islands, ports are structural to economic and social development. Competitive and efficient ports means working in order to provide the best services to our clients, through appropriately applying human and financial resources. Investing in training and valuing the APRAM staff, the constant maintenance of our vessels and onshore equipment, as well as the different infrastructures and support facilities, have been core investments. However, to strengthen the competitiveness of the RAM ports, it is priority to embrace, in the short term, new projects for digitalisation and environmental sustainability. We have many challenges ahead. I have no doubt that this is the right path but we still have a great deal of work to do! l 95


ECONOMIA

UVAS FELIZES PAR A VINHOS FELIZES HAPPY GRAPES FOR HAPPY WINES

JOÃO BARBOSA

OS MERCAD OS E XTERNOS RECEBEM CERCA DE 90% D OS VINHOS D O PINHAL DA TORRE. AS P R O P R I E D A D E S O N D E E S TÃ O A S V I N H A S S I T U A M - S E E M A L P I A R Ç A , N A R E G I Ã O V I N H AT E I R A D O T E J O . N O PA S S A D O A A C T I V I D A D E D A F I R M A V I S AVA A Q U A N T I D A D E . D E S D E H Á Q U A S E 3 0 ANOS QUE O OBJECTIVO É DIFERENTE. I N T E R N AT I O N A L M A R K E T S A C C O U N T F O R A R O U N D 9 0 % O F P I N H A L D A T O R R E W I N E S A L E S . T H E P R O P E R T I E S H O S T I N G T H E V I N E S A R E L O C AT E D I N A L P I A R Ç A , I N T H E T E J O W I N E G R O W I N G R E G I O N . I N T H E PA S T, T H E F I R M S T R O V E T O P R O D U C E T H E M A X I M U M Q U A N T I T Y. H O W E V E R , T H E O B J E C T I V E F O R T H E L A S T T H R E E D E C A D E S H A S B E E N R AT H E R D I F F E R E N T.

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ECONOMICS

N

ão será loucura, mas é ousadia. Lançar vinhos com idade, num mercado que prefere colheitas recentes, tem riscos. A empresa Pinhal da Torre, em Alpiarça, fá-lo. É uma opção consciente e ponderada, refere Paulo Saturnino Cunha, o vitivinicultor. Paulo Saturnino Cunha esclarece que não é comum o consumidor fazer a guarda em casa. Por isso esta empresa assume a tarefa. Assume riscos que poucas firmas portuguesas correm. Possivelmente, apenas os vinhos fortificados – como os Madeira e Porto – são comercializados com vários anos depois do ano da colheita, indica. O produtor informa que o Pinhal da Torre produz, em média, 220 toneladas de uvas. Essa quantidade resulta em cerca de 150.000 litros, o que dá perto de 200.000 garrafas. Porém, os vinhos de gama mais baixa são colocados à venda com poucos anos após a colheita. Estes representam cerca de 60% do total. Os preços (venda ao público recomendado) começam nos seis euros. É significativamente acima do valor que a grande maioria dos vinhos é vendida em Portugal (80% abaixo dos três euros). Os de base debutam com três ou quatro anos, já o ‘super premium’ e os ‘luxury’ saem com entre cinco e oito anos de guarda. “Não é possível ter todos os vinhos absolutamente fantásticos. Tentamos fazer um ‘mix’ com os vinhos de entrada, que geram os recursos e caixa suficiente para manter a empresa. Mas a grande mais-valia é fazer vinhos únicos e altamente diferenciados e com personalidade”. Outras actividades da empresa podem também ajudar, criando recursos para investir na produção dos topos de gama. Um factor importante, refere Paulo Saturnino Cunha, é o programa da prática agrícola, onde tudo começa e é determinante para o resultado final. “Temos um programa para uvas felizes – o ‘Happy Grapes Program, que está registado. Quando temos uvas

I

t was less an act of madness but rather of daring. Launching aged wines in a market that prefers more recent vintages does run risks. The Pinhal da Torre company in Alpiarça did just that. This was an aware and considered option, explained wine-maker Paulo Saturnino Cunha. Paulo Saturnino Cunha clarified how it is not common for consumers to store wines at home. Hence, the company takes on this task and assuming risks that few other Portuguese companies are willing to run. Perhaps only in the case of the fortified wines – such as Madeira and Port – are they sold to retail various years after the year of harvest, he added. The producer went on to put the average level of Pinhal da Torre grape production at 220 tons – a quantity enough for around 150,000 litres of wine, in turn, filling close to 200,000 bottles. However, the wines in the lower quality range are placed for sale just a few years after harvest: representing around 60% of the total. The prices (recommended retail price) start out at six euros and already significantly higher than the vast majority of wines sold in Portugal (80% are below three euros). The basic range debuts after three or four years while the ‘super premium’ and ‘luxury’ take between five and eight years of maturing. “It is just not possible to make every wine absolutely fantastic. We attempt to make a mix with the entrance level wines generating enough resources and cashflow to keep the company running. However, the major gains are made from making unique wines, highly differentiated and with their own personalities”. Other company activities may also help in establishing the resources to invest in top of the range production. One important factor, stated Paulo Saturnino Cunha, is the agricultural program of practice that not only begins everything but is also determinant to the final result. “We have a program for happy grapes – the Happy Grapes Program, which is patented. When we have happy grapes, we have great

A P I N H A L D A T O R R E D E T É M 4 3 H E C TA R E S D E V I N H A S D I S T R I B U Í D A S P O R Q U A T R O P R O P R I E D A D E S D I S T I N TA S P I N H A L D A T O R R E O W N S 4 3 H E C TA R E S O F V I N E Y A R D S SPREAD OVER FOUR DIFFERENT PROPERTIES

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ECONOMIA felizes, temos grandes chances de ter vinhos felizes. Nós ficamos felizes e fazemos com que os nossos consumidores fiquem felizes”.

prospects for producing happy wines. We end up happy and we make sure that our consumers get the same happiness”.

Guardar e esperar O mundo mudou, a vida como que acelerou, e hoje não é habitual comprar vinho e esperar por que chegue o momento em que está no apogeu para se beber. Compra-se para ser bebido prontamente, o que em alguns casos é um «infanticídio», salienta o produtor. Ciente da capacidade de envelhecimento, Paulo Saturnino Cunha assume o encargo do armazenamento até que esteja no momento certo para ser mostrado ao público. Presentemente, estão mais de 120.000 garrafas em ‘stock’. O vitivinicultor opta por não pasteurizar o vinho, porque o néctar “é um ser vivo”. Assim, evoluirá em garrafa, em que cada uma terá, com o tempo, algumas características diferenciadoras. “A pasteurização mata tudo”. “Começa por ser uma criança e depois uma fase adulta. Temos tendência para vender os nossos vinhos numa idade adulta e plena, onde demonstra toda a sua potencialidade e maior prazer. Evidentemente há muitos consumidores que não valorizam isso, que gostam de vinhos novos, que têm características diferentes. O que gostamos é impressionar e surpreender o enófilo”. Uma outra característica do Pinhal da Torre é a guarda de vinhos para uso próprio – a colheita mais antiga é a de 1990 e não está para venda. Dependente da gama de vinho e do ano, a quantidade de garrafas que fica em cave, para memória futura, situa-se entre as 500 e 1000, informa Paulo Saturnino Cunha. Isso permite a avaliação da longevidade e evolução das características – ou seja, é um investimento. No estrangeiro é comum, mas muito raro em Portugal, nomeadamente devido a pressões dos responsáveis pelas vendas e necessidades relevantes decorrentes das tesourarias das empresas. Obviamente, preservar os vinhos por vários anos, antes de serem postos no mercado, e a guarda de garrafas para memória têm custos. Se o negócio o permite é porque a aposta comercial da empresa tem resultados positivos.

Storing and waiting The world has changed, life accelerating with it and it is not common today to buy wine and wait for that moment when it is best for drinking. Purchases are made to be drunk shortly thereafter and in some cases this practically amounts to ‘infanticide’, the producer highlighted. Aware of this capacity for ageing, Paulo Saturnino Cunha takes on the costs of storage through to the right moment for its release to the public. He currently has over 120,000 bottles in stock. The vintner opts not to pasteurise his wines as they “are a living being”. Thus, they evolve in the bottle in which each then, over the course of time, develops certain differentiating characteristics. “Pasteurisation kills everything”. “It starts out as a child and then enters an adult phase. We have the tendency to sell our wines at an adult and mature age when they demonstrate all their potential and generate the greatest pleasures. Clearly, there are many consumers that do not value this, who like young wines that have different characteristics. What we like is to impress and surprise the oenophile”. Another Pinhal da Torre characteristic is to store wines for their ow usage – the oldest vintage comes from 1990 and is not for sale. This depends on the range of wine, the year and the quantity of bottles there is in the cellar. For the future memory, this stands at between 500 and 1000, informed Paulo Saturnino Cunha. “This enables the evaluation of their longevity and the evolution in their characteristics – thus, this is an investment. Elsewhere, this is common but it is very rare in Portugal, especially due to pressure from those responsible for sales and the pressures on the treasury needs of these companies”. Obviously, storing wines for various years before putting them on the market and storing bottles for their memory comes with costs. Should the business provide for them, that is only because the commercial strategy has returned good results.

Adega com quase 75 anos A empresa irá investir “vários milhões”, nos próximos anos, com a data desejada em 2023. O dinheiro será aplicado na melhoria da adega, compra dalguns novos equipamentos, estabelecimento de enoturismo e na agricultura. A adega será melhorada, mas vão manter-se as sete cubas em cimento, instaladas a quando da construção da infraestrutura. Este equipamento tem vantagens, nomeadamente um bom controlo de temperatura. O empresário refere que o enoturismo é um investimento importante e espera bons resultados decorrentes da localização de Alpiarça: ligação à autoestrada A1 e via para o Algarve. A vila está próxima de Fátima e a 40 minutos de Lisboa e do seu aeroporto – explica. Paulo Saturnino Cunha sublinha que, conforme o nível de qualidade dos vinhos, o esmagamento da fruta faz-se diferentemente. Pode ser em lagares de pedra, com pisa a pé, em prensas e em cubas de inox. O Pinhal da Torre tem barricas – somadas dão cerca de 30.000 litros – de diferentes tanoarias, especialmente de carvalho

A winery with almost 75 years of age The company is to invest “various millions” in forthcoming years with the target date of 2023. The funding is going to improving the wine cellar, procuring new equipment and building wine tourism and agriculture facilities. The winery will be improved but is to retain the seven cement cubes installed at the time of construction of this infrastructure. These facilities have their own advantages, especially good control over temperature. The company owner referred to how wine tourism reflected a very important investment with the expectation of good results due to the location of Alpiarça: connected by the A1 motorway and other thoroughfares to the Algarve. The town is close to Fátima and 40 minutes from Lisbon and its airport– he explained. Paulo Saturnino Cunha highlighted how, in accordance with the quality of the wines, the crushing of the grapes requires different approaches. This may be done by foot in stone tanks or by presses in stainless steel cubes. Pinhal da Torre has its own set of barrels – in sum, with the capacity for around 30,000 litres – with different properties,

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ECONOMICS PINHAL DA TORRE COMBINES TR ADITIONAL METHODS AND NEW T E C H N O L O G I E S W I T H T H E E X P E R I E N C E A C C U M U L AT E D O V E R G E N E R AT I O N S

A PINHAL DA TORRE COMBINA MÉTOD OS TR ADICIONAIS E N O VA S T E C N O L O G I A S C O M A E X P E R I Ê N C I A ACUMUL ADA AO LONGO DE GER AÇÕES

francês, da floresta de Allier. O tempo de estágio não é igual para todos os vinhos. Por exemplo, o IPO, o topo de gama, que conta apenas com duas edições (2008 e 2013), passou cinco anos em madeira, seguido de um em cuba de inox e dois em garrafa antes de ser posto à venda. Porém, o portefólio é composto por 16 referências, incluindo tintos, brancos e referências especiais. Este último grupo conta com um colheita tardia, mas sem a designada podridão nobre (fungo botrytis cinerea), que dá fama aos Sauternes (França) e Tokaji (Eslováquia e Hungria). Em preparação está um fortificado (estilo comum em Portugal – fermentação parada com a adição de aguardente) – ainda sem data para ser posto nas prateleiras. A designação da proveniência conta Apesar da feliz mudança de designação, em 2009, de Ribatejo para Tejo, esta região ainda não tem, por cá, reputação para alcançar patamares de valor mais elevados. Os portugueses escolhem por denominação de origem, mas o quase desconhecimento de Portugal, no estrangeiro, acaba por fazer contornar as reticências acerca deste território vizinho da capital. Portugal não conhecido internacionalmente como um produtor de grande prestígio. Vinho da Madeira e o Vinho do Porto são as excepções, mas nem sempre o consumidor os identifica como sendo do nosso país. Por outro lado as reticências dos portugueses, quanto à denominação de origem, não se registam nas escolhas dos estrangeiros. “A pouco e pouco, os críticos têm vindo a dar valor a Portugal. O problema é a percepção de preço” – explica Paulo Saturnino Cunha. Desta forma, o Pinhal da Torre sofre o preconceito face a Portugal, em que a percepção de valor é baixa, mas contorna as desconfianças nacionais. Paulo Saturnino Cunha adianta que o consumidor internacional, onde se situa o negócio, é exigente. O designado mercado da saudade, formado pela comunidade emigrante, não é vocacionado para os vinhos do Pinhal da Torre. A família de Paulo Saturnino Cunha – os vários ramos que lhe estão para trás no tempo – está na região há muitas gerações. Do lado materno e paterno, a memória genealógica chega, num dos casos, a um bisavô de bisavô. Certamente, salienta, terá parentes mais recuados. “Dos meus quatro bisavós só um não era daqui”. Os territórios familiares foram maiores e hoje representam

especially in French oak from the Allier Forest. The maturing lengths are not the same for all wines. For example, a top of the range IPO, which has only been produced in two years (2008 and 2013), spends five years in wood, followed by another in a stainless steel cube and another two in the bottle before going out for sale. Nevertheless, the portfolio is made up of 16 references, including reds and whites and some stand out specials. The latter group includes a late harvest but before the onset of that known as noble rot (the fungus botrytis cinerea), which provides the renown to the Sauternes (France) and Tokaji (Slovakia and Hungary). Under preparation is a fortified tipple (a common style in Portugal – fermentation halted through adding brandy) – although still without any date for putting on the shelves. The designation of origin matters Despite the positive change from Ribatejo to Tejo in 2009, this region has not yet in Portugal gained a reputation to achieve the highest levels of value. Portuguese consumers choose according to the designation of origin but the almost complete lack of awareness of Portugal internationally ends up avoiding this reticence about wines from the lands adjoining the capital. Portugal is not internationally known as a producer of great prestige. The Madeira and Port fortified wines are the exceptions even if their consumers do not always identify them as the products of Portugal. Furthermore, the reluctance of Portuguese wine drinkers as regards denomination of origin do not reflect in the choices made abroad. “Bit by bit, wine critics have been giving value to Portugal. The problem is the price perception” – explained Paulo Saturnino Cunha. Hence, Pinhal da Torre suffers from the prejudice towards Portugal in which the perception of value is low but gets around the national lack of trust. Paulo Saturnino Cunha added that the international consumer, the target of his business, is highly demanding. That termed the saudade market, the emigrant community yearning for a taste of home, is not appropriate for the Pinhal da Torre wines. The family of Paulo Saturnino Cunha – the various branches that are behind him in terms of time – have been in the region for generations. On both his maternal and paternal sides, the genealogical roots reach back, in one of the cases to a great-grandfather of a great-grandfather. Certainly, he highlighted, he would have still more distant relatives: “Of my four great-grandparents only one was not from here”. 99


ECONOMIA 43 hectares, embora os arredondamentos façam parecer mais. Em tempos, a produção de morangos – um dos maiores no país – era a principal actividade. De negócio antigo para diferente paradigma O vinho é um cultivo antigo nas propriedades que formam o Pinhal da Torre. Outrora visava grandes quantidades, vendido a granel. Os vinhedos alcançavam 200 hectares, sendo a Fernão Pires – casta emblemática da região – a mais significativa. Em 1993 foi decidida uma inversão da filosofia e apostou-se no vinho de qualidade, com produtividade muitíssimo mais reduzida. Arrancaram-se cepas de terras de maior proveito quantitativo para colocar outras e em chãos menos férteis, em que o resultado é melhor. Actualmente, 85% do solo é de areia. Foram introduzidas novas cultivares, algumas desiludiram, por várias razões, mas brilhou a Touriga Nacional. A vindima dos brancos começa em Agosto. As uvas tintas são colhidas entre Setembro e Outubro. Deixar as uvas na videira até ao décimo mês tem riscos, nomeadamente devido à chuva. Desde a podridão ou redução do nível de álcool, decorrente de maior quantidade de água nos bagos. A agricultura no Pinhal da Torre é em produção integrada, mas preferencialmente em modo biológico. “Nem todos os anos fazemos biológico, dependendo das características. Há anos em que se não se intervém não se apanha uma uva. Há quem diga que faz, mas não somos mentirosos”. Portanto a lavoura não é certificada. Paralelamente, alguns vinhos estão classificados como vegan. A empresa tem três quintas e duas parcelas. A Quinta do Alqueve, de solo calcário, tem seis hectares. Com chão arenoso, a Quinta de São João forma-se também por meia dúzia de hectares. Águas Vivas possui 30 arenosos e de pedra rolada. Os restantes terrenos são três hectares de aluvião. O produtor aposta sobretudo em castas nacionais, mais de 90%, elementos diferenciadores nos mercados internacionais. “Ninguém vem a Portugal comprar Chardonnay”. Ainda assim, por gosto de Paulo Saturnino Cunha e bom desempenho no terroir (características naturais) fazem com que estejam plantadas cultivares estrangeiras. A Quinta de Alqueve tem plantadas Touriga Franca e Grenache. Na Quinta de São João estão Tinta Roriz (tinta) e Syrah (tinta). Em Águas Vivas há Alicante Bouschet – tinta e de tão cultivada é talvez mais portuguesa do que de qualquer outro país –, Alvarinho (branca), Arinto (branca), Baga (tinta), Fernão Pires (Branca), Fernão Pires Rosado (tinta rosada), Merlot (tinta), Ramisco (tinto), Sousão (tinta), Syrah, Tinta Francisca (tinta), Tinta Roriz, Tinto Cão (tinta), Touriga Franca (tinta), Touriga Nacional (tinta), Verdelho (branca) e Viosinho (branca). Em Courela Grande (parcelas) cultiva-se Alicante Bouschet. Para breve serão plantados mais 11 hectares. Para esse espaço estão escolhidas Alicante Bouschet, Arinto, Sousão, Touriga Franca e, «em princípio, Tinta da Barca (tinta), que será a única a entrar. Vai sair a Tinta Roriz, cujos resultados não são uniformes de ano para ano. “Não se pode ter uma casta que faz um vinho sensacional de dez em dez anos”. A escolha das castas não é, obviamente, um capricho guiado apenas pela preferência de Paulo Saturnino Cunha, como 100

The family’s lands were once large, today covering 43 hectares although the rounding off makes them seem larger. In times past, strawberry production – one of the largest in the country – was the main activity. From the historical business to different paradigms Vines have long been cultivated on the properties making up the Pinhal da Torre estate. Formerly, large quantities were the target and sold in bulk. The vineyards stretched to 200 hectares, with Fernão Pires – an emblematic cast of this region – predominating. In 1993, a reversal in the philosophy was decided on and opting for quality wines with a far lower level of productivity. They took out the vines from the lands of higher quantitative yields and placed others in less fertile soils but resulting in better grapes. Currently, 85% of the soils are sandy. New casts were introduced. Some disappointed for various reasons but the Touriga Nacional cast, for example, has flourished. The harvesting of the whites begins in August. The red grapes are gathered between September and October. Leaving the grapes on the vine through to the tenth month brings risks, especially rain related due to rot or the reduction in the level of alcohol with higher water levels in the grapes. Agriculture on Pinhal da Torre forms an integrated production system, preferably organic but not always in practice. “Not every year do we try organic. It depends on the characteristics prevailing. There are years in which if you do not intervene, you’ll not be picking a single grape. There are those who say that they do this but we are not liars”. Therefore, the working practices are not certified but, in parallel, some of the wines do get classed as vegan. The company runs three estates and two plots of land. Quinta do Alqueve, with limestone soils, spans six hectares. With its sandy soils, Quinta de São João is also made up of a half-dozen hectares. Águas Vivas runs over 30 hectares of sandy soils and rocky outcrops. The remaining terrain features three hectares of alluvium. The producer invests above all in national grapes casts, over 90%, a differentiating factor in international markets. “Nobody comes to Portugal to buy a Chardonnay”. Nevertheless, out of the preference of Paulo Saturnino Cunha and their good performance in the terroir (natural characteristics) ensure that some foreign cultivars are raised. Quinta de Alqueve has planted Touriga Franca and Grenache. On Quinta de São João, there are Tinta Roriz (red) and Syrah (red). On Águas Vivas, there is Alicante Bouschet – red and so widely cultivated here, it is perhaps more Portuguese than any other country –, Alvarinho (white), Arinto (white), Baga (red), Fernão Pires (white), Fernão Pires Rosado (rose red), Merlot (red), Ramisco (red), Sousão (red), Syrah, Tinta Francisca (red), Tinta Roriz, Tinto Cão (red), Touriga Franca (red), Touriga Nacional (red), Verdelho (white) and Viosinho (white). In Courela Grande (plots), Alicante Bouschet is under cultivation. Another 11 hectares are shortly due for plantation. The choice for these lands has gone to Alicante Bouschet, Arinto, Sousão, Touriga Franca and, “in principle, Tinta da Barca (red), which will be the only one to enter. On the way out is Tinta Roriz, whose results have not been uniform from year to year. You cannot have a cast that makes a sensational wine every ten years”.


ECONOMICS a Merlot. Algumas das cultivares são conhecidas pelas características que ajudam para a longevidade dos vinhos, nomeadamente a acidez. Arinto, Baga, Sousão e Ramisco – a grande casta de Colares, donde saem néctares vivos com décadas – têm grande potencial de guarda. Apesar da selecção das castas, uma apareceu sem ser convidada. «A Grenache veio por engano. Tínhamos pedido, ao viveirista, Tempranillo (Tinta Roriz) de Toro (Castela-Leão) para meio hectare. Só passando algum tempo é que percebemos que era Grenache. Costumávamos usar em lotes, mas hoje dá coisas muito interessantes. Em 2017 decidimos, com relevo, fazêla pura. Mas já tínhamos dado um destaque maior em 2013, num blend com Syrah» – informa Paulo Saturnino Cunha. O trabalho em adega tem também uma opção que poucos produtores assumem. Todas as leveduras são indígenas. O que confere personalidade e diferenciação, refere o produtor. “É um risco quando a qualidade das uvas não é absolutamente saudável. Quando as uvas vêm sãs é uma expressão, a 100%, das características da casta e do terroir. Tem funcionado sempre. Por vezes usamos algumas leveduras selecionadas, que representam no máximo 5%”. Um investimento importante é a substituição de plantas, em 3,5 hectares. Habitualmente, a cepa vem do viveiro já com o portaenxerto. Agora a enxertia será realizada no campo, uma tarefa que poucas pessoas sabem fazer, que é substancialmente cara e que implica um ano sem fruta, informa o produtor. Todavia «resulta num maior enraizamento, puxa menos pela planta, o que tem benefícios», e gerando uma maior qualidade final. A equipa é pequena, diz Paulo Saturnino Cunha. O núcleo fundamental é formado por Mário Andrade (enólogo) e por Nuno de Jesus (adegueiro). Mas a adega é apenas um dos espaços de trabalho. O vitivinicultor afiança que a qualidade começa na vinha, o mais importante do processo.

The choice of grape type is obviously not down to the personal whims and preferences of Paulo Saturnino Cunha, such as the Merlot. Some casts are here for their characteristics that aid the longevity of the wines they produce, especially through their acidity. Arinto, Baga, Sousão and Ramisco – the great cast of Colares that produces living nectars after decades maturing – have great potential for storage. Despite the careful selection of casts, one turned up without being invited. “The Grenache came by mistake. We had requested the vine grower for Tempranillo (Tinta Roriz) from Toro (Castile-León) for half a hectare. Only after some time did we realise that it was Grenache. We usually use it in blends but today provides some very interesting outcomes. In 2017, we decided, as a test, to make it pure. But we have already given it a greater highlight in 2013 in a blend with Syrah” – recounted Paulo Saturnino Cunha. The winery work is also another option that few producers take on. All of the yeasts are indigenous to confer personality and differentiation the producer explained. “It is a risk when the quality of the grapes is not absolutely healthy. When the grapes are healthy, this is an expression, 100%, of the characteristics of the cast and the terroir. This has always worked. Sometimes, we use just a few selected yeasts but that never represent more than 5%”. Another important investment comes with the replacement of the vines across 3.5 hectares. Usually, the vine comes from the grower already with rootstocks. Now, the grafting is to take place in the field in a task that few can do and is substantially expensive and implies a year without any fruit, identified the producer. However, “the results are deeper roots, pulling less on the plant, which has its own benefits “, and generating a higher level of final quality. The teams is small, added Paulo Saturnino Cunha. The fundamental core is made up of Mário Andrade (oenologist) and Nuno de Jesus (winery manager). However, the winery is but one place of work. The vintner testified that the quality begins on the vine, the most important stage in the process.

À CONVERSA COM

IN CONVERSATION

PAULO SATURNINO CUNHA,

WITH PAULO SATURNINO CUNHA,

ADMINISTRADOR DA PINHAL

DIRECTOR OF PINHAL

DA TORRE

DA TORRE

Como vê a evolução do sector em Portugal? O sector em Portugal, de há uns anos para cá, muito dinâmico. A prova disso é que surgem muitos novos produtores. Neste momento tem havido também alguma concentração, com alguns ‘players’ a crescer. São boas indicações. Algumas empresas que surgiram há poucos anos estão a crescer, a virarem multi-regionais. O que significa que todas as regiões têm potencial. Em todas as regiões há quem faça bem e quem faça mal. Há produtores a fazer com qualidade em todas as regiões.

How do you perceive the trends in the sector in Portugal? For some years now, the sector in Portugal has been highly dynamic. Proof of this comes with the appearance of new producers. Just recently, we have had some consolidation with some other players growing. These are good indicators. Some of the companies that emerged a few years ago are growing, turning into multi-regionals. Which also means that all regions have potential. In every region, there are those doing well and those doing badly. There are certainly quality producers in every region. 101


ECONOMIA

Essa diversidade é um benefício para os consumidores. Há regiões competem pelo preço e outras são mais moda.

This diversity is a benefit to the consumers. There are regions competing on price while others are more fashionable.

O Tejo é mais moda ou preço? O Tejo nunca foi moda, não sei se será alguma vez. Tem um potencial enorme. Um potencial enorme para fazer óptimos vinhos brancos e para grandes tintos. A região tem uma grande influência oceânica. A nossa localização é idêntica a Bordéus, estamos à mesma distância do oceano Atlântico. O que dá um caracter de frescura aos nossos vinhos, muito frescos e elegantes. Mas estarmos também um bocado dentro do país, conseguimos níveis interessantes de maturação.

Is the Tejo more fashion or price? The Tejo has never been fashionable and I don’t know if it ever will be. There is enormous potential. Enormous potential to make wonderful white wines and for great reds. The region has a major ocean influence. Our location is identical to the Bordeaux region; we are the same distance from the Atlantic Ocean. This gives a character of freshness to our wines, very fresh and elegant. However, we are also somewhat inland and are therefore able to get interesting levels of maturity.

Estão a surgir novos países produtores e com qualidade e quantidade. Como Portugal se enquadra no mundo? Portugal é dos países com maior potencial e com maior riqueza de diversidade de castas. De há 20 anos para cá melhorou substancialmente em termos de enologia. Os nossos enólogos podem rivalizar com os melhores do mundo. Estamos muito atrasados em termos de viticultura e de conhecimento das nossas castas. Isso é um factor extremamente importante, porque os vinhos fazem-se, essencialmente, na vinha. Ainda somos sofríveis na viticultura.

New producing countries are emerging with quality and quantity. What is Portugal’s position in the world? Portugal is one of the countries with the greatest potential and the greatest wealth of diversity in the casts. Over the last two decades, there have been substantial improvements in terms of the oenology. Our oenologists can rival the very best in the world. We are very backwards in terms of viticulture and knowledge about our casts. This is an extremely important factor because wines are essentially made on the vines. We are still extremely average in viticulture.

E é valorizado no estrangeiro? Retirando os vinhos fortificados, Portugal também é conhecido por uma excelente relação preço e qualidade nos vinhos de entrada. A maioria dos vinhos tem preço muito baixo. Há também fortificados a serem vendidos até a quatro ou seis euros. Temos uma deficiência, muito grande, de marca, apesar dos críticos mundiais reconhecerem, cada vez mais, a qualidade. A verdade é que continuamos com muito pouca exposição nos grandes restaurantes ou nas grandes lojas de vinho, até residual. Isso penaliza os vinhos de maior qualidade e maior valor-acrescentado. Hoje, em provas cegas, os melhores vinhos competem com os melhores estrangeiros. Mas são vendidos, entre 20% e 40%, ao preço desses vinhos. Há vinhos que são vendidos a preços tão baixos que é impossível perceber como é possível ganhar dinheiro. l 102

And is the sector valued abroad? Ignoring the fortified wines, Portugal is also known for having an excellent price to quality relationship for entrance wines. The majority of the wines have a very low price. There are also fortified wines selling for below four or six euros. We have a very grave shortcoming, brands. Despite critics worldwide increasingly recognising the quality, the truth is we still have only a low level of exposure in the great restaurants and great wine stores, practically only a residual presence. This penalises the higher quality wines and those with greater added value. Today, in blind testings, the best wines compete with the best wines from anywhere. But they are sold for between 20% and 40% of the price of these wines. There are wines sold for such low prices that it is impossible to understand just how they can make any money. l


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E M P R E S A E M D E S TA Q U E

HÁ 75 ANOS A “CONTRUIR”

O SEU FUTURO

“CONSTRUCTING” THE FUTURE FOR THE LAST 75 YEARS

M A N U E L A N T Ó N I O D A M O TA , F U N D A D O R D A M O TA - E N G I L

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M A N U E L A N T Ó N I O D A M O TA , F O U N D E R O F M O T A - E N G I L


F E AT U R E D C O M P A N Y

ANA VAL ADO

C O M U M P O S I C I O N A M E N TO D E M E R C A D O A L I N H A D O C O M A S M E L H O R E S P R ÁT I C A S E U M A C O N D U TA E M P R E S A R I A L A S S E N T E E M P R I N C Í P I O S É T I C O S E S U P O R TA D O S N U M A V I S ÃO E S T R AT É G I C A Ú N I C A E I N T E G R A DA PA R A O F U T U R O , A M O TA E N G I L A M B I C I O N A T O R N A R - S E U M G R U P O M A I S I N T E R N A C I O N A L , I N O VA D O R E C O M P E T I T I V O À E S C A L A G L O B A L . ESTE ANO O GRUPO CELEBRA 75 ANOS DE ACTIVIDADE, MAS A AMBIÇÃO É A MESMA DESDE AS SUAS ORIGENS: CONTINUAR A TRILHAR NOVOS CAMINHOS NO SEU DESENVOLVIMENTO. WITH A MARKET POSITIONING ALIGNED WITH THE BEST PRACTICES AND BUSINESS CONDUCT B A S E D O N E T H I C A L P R I N C I P L E S A N D B A C K E D U P B Y A S T R AT E G I C A N D I N T E G R AT E D V I S I O N O N T H E F U T U R E , M O TA E N G I L S T R I V E S T O B E C O M E T H E M O S T I N T E R N AT I O N A L , I N N O VAT I V E A N D G L O B A L L Y C O M P E T I T I V E G R O U P. T H I S Y E A R , T H E G R O U P C E L E B R AT E S I T S 7 5 T H Y E A R I N B U S I N E S S B U T T H E A M B I T I O N R E M A I N S T H E S A M E A S I N I T S O R I G I N S : C O N T I N U E T O H E A D D O W N N E W PAT H S F O R I T S O W N D E V E L O P M E N T.

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undado em 1946, o Grupo Mota Engil é hoje uma multinacional com actividade centrada na construção e gestão de infra-estruturas segmentada pelas áreas de Engenharia e Construção, Ambiente e Serviços, Concessões de Transportes, Energia e Mineração. Líder em Portugal e com uma posição consolidada no ‘ranking’ dos 25 maiores grupos europeus de construção, a Mota Engil marca presença em 3 continentes e 25 países, repartidos por 3 áreas geográficas – Europa, África e América Latina. Isto é a Mota Engil hoje, com 75 anos de actividade. Mas para percebermos como chegou ao lugar de destaque que actualmente ocupa, a nível nacional e internacional, é importante conhecermos um pouco da sua história. A empresa teve a sua origem em Cabinda, quando o empresário português Manuel António da Mota, com apenas 33 anos,

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ounded in 1946, the Mota Engil Group is today a multinational with its activities focused on construction and infrastructure management segmented across the areas of Engineering and Construction, Environment and Services, Transport Concessions, Energy and Mining. The leader in Portugal and with a consolidated position in the ranking of the 25 largest European construction groups, Mota Engil is present on 3 continents and in 25 countries divided into three geographic fields – Europe, Africa and Latin America. That is Mota Engil today after 75 years in business. However, to perceive how the Group got into this leading position, at the national and international level, we need to know a little about its history. The company traces its origins to Cabinda, when the Portuguese 105


E M P R E S A E M D E S TA Q U E

PRESENÇA NA BOLSA

A Mota Engil SGPS é uma sociedade cotada na Euronext Lisbon, fazendo parte do principal índice da bolsa portuguesa (PSI 20), desde 1987. Com uma longa tradição de presença nos mercados de capitais, a Mota Engil detém a sua própria história de constituição associada a operações de bolsa que resultaram num processo de fusão entre a Mota & Companhia e a Engil, que originou a Mota Engil. O Grupo Mota Engil foi constituído pela família Mota em 1946, sendo ainda hoje o seu maior accionista através da FM-Sociedade de Controlo e com um compromisso de longo prazo com a empresa. Em 2021, a CCCC, grupo de origem chinês e uma das maiores construtoras mundiais, integrou a estrutura acionista com uma posição de 32,4%, contribuindo para o reforço de capacidade do Grupo para actuar à escala global.

partiu para Angola. Lançando-se inicialmente no negócio da comercialização de madeiras, com a construção da Mota & Companhia em 1946, logo percebeu que a oportunidade estava no sector da Construção e das Obras Públicas, lançando-se em 1948 nesta área. A Mota & Companhia teve um percurso nos seus primeiros trintas anos de actividade apenas em Angola. A “Mota”, como é conhecida neste país, afirmou-se neste mercado com a construção do aeroporto internacional de Luanda. Foi com esta ambição e ligação forte que criou a este país que Manuel António da Mota afirmou a marca da Mota e Companhia em Angola, sendo a única empresa portuguesa de relevância que se manteve ininterruptamente até hoje em Angola, e como sempre refere o actual Presidente e filho, António Mota, “estaremos sempre em Angola para os bons e maus momentos”. A primeira experiência de internacionalização da empresa foi curiosamente para Portugal, onde estabeleceu atividade a partir de 1976, com a sua primeira obra em território português, a pequena barragem do Lucefecit, no Alentejo. O ano de 1977 foi um ano determinante na história e no que viria a ser o futuro da empresa em Portugal, quando decidiu concorrer a uma das maiores obras públicas do século XX em Portugal, a regularização do Baixo Mondego, saindo desse concurso a proposta da Mota & Companhia vencedora com uma solução técnica surpreendente e diferenciadora. A partir daí, e num projecto determinante que durou até 1983, a empresa afirmou-se de forma crescente em Portugal, mantendo sempre a sua posição em Angola. Foi nesta altura que António Mota, actual Presidente do Conselho de Administração, iniciou a sua carreira profissional na Obra do Mondego a par de uma geração de jovens engenheiros que viriam a ser pilares muito importantes no desenvolvimento da empresa nas décadas seguintes. 106

PRESENCE ON THE STOCK MARKET

Mota Engil SGPS is a company listed on Euronext Lisbon and a member of the leading Portuguese stock market index (PSI 20) since 1987. With a long tradition in the capital markets, Mota Engil traces its own history associated with the stock market operations that led to the merger between Mota & Companhia and Engil, that led to Mota Engil. The Mota Engil Group was founded by the Mota family in 1946 and still remains its largest shareholder through FM-Sociedade de Controlo and with a long term commitment to the company. In 2021, CCCC, a group of Chinese origin and one of the largest construction companies worldwide, joined its shareholding structure by taking up a 32.4% stake, thus contributing to the Group’s capacity to operate on a truly global scale.

businessman Manuel António da Mota, aged only 33, set off for Angola. Initially seeking opportunities in the wood trade business, with the founding of Mota & Companhia in 1946, he immediately grasped that he had a future in the Construction and Public Works sector and embarking in this area in 1948. Mota & Companhia spent the first three decades of its activities focused only on Angola. “Mota”, as it is known in this country, established its position in this market with the construction of Luanda international airport. It was with this ambition and the strong connection established and nurtured with this country that Manuel António da Mota affirmed the Mota e Companhia brand in Angola and the only Portuguese company of relevance that has maintained an unbroken presence in Angola through to current times and, as the current president and son, António Mota, states “we will always be in Angola for both the good and the bad times”. The first experience of company internationalisation was in Portugal, where activities began as from 1976 with its first project on Portuguese territory being the small Lucefecit dam in the Alentejo. The year of 1977 was determinant to the future history of the company in Portugal when deciding to tender for one of the largest public construction works of the 20th century in Portugal, regularising the lower stretch of the Mondego river, with the Mota & Companhia tender proposal emerging victorious with a technically surprising and differentiated solution. Henceforth, and through a determinant project that was ongoing until 1983, the company increasingly raised its profile in Portugal while always maintaining its position in Angola. It was at this time that António Mota, current President of the Board of Directors began his professional career on the


F E AT U R E D C O M P A N Y A fusão que criou um líder Com o alargamento da Europa a leste depois da queda do muro de Berlim, e com a chegada dos fundos comunitários para os estados-membros da então CEE, o mercado português conheceu uma dinâmica crescente com a afirmação da empresa em Portugal e com os primeiros exemplos de consolidação da expansão internacional, depois das primeiras incursões por África nos finais dos anos setenta e oitenta, culminando nesta fase, na década de noventa, sob a decisão de Manuel António da Mota e com António Mota e o apoio das suas irmãs Manuela, Teresa e Paula Mota já em cargos de gestão de topo na empresa, a iniciar a actividade na Europa Central, em países como a Polónia, Hungria e República Checa, depois de no início da década ter iniciado actividade em mercados africanos relevantes, como Moçambique e Malawi. Nessa altura por Portugal vivia-se a euforia da preparação dos trabalhos da Expo´98, onde a Mota & Companhia e a Engil tiveram um papel importantíssimo em obras que são ‘ex-libris’ do país, como são os casos do Oceanário de Lisboa, por diversas vezes considerado o melhor do mundo, e a Ponte Vasco da Gama, àquela data a maior ponte da Europa (hoje é a segunda) e o primeiro projecto em parceria público-privada executado em Portugal. No mesmo ano da exposição internacional, e com António Mota ao comando da empresa, foi adquirida no Peru uma empresa local, a Translei, em conjunto com a também portuguesa Engil, uma experiência que resultaria na afirmação com sucesso neste mercado da América Latina e que seria o prenúncio de uma aquisição maior que António Mota concretizaria mais tarde.

Mondego project in conjunction with a generation of young engineers who would turn out to be very important pillars to the company’s development over the following decades. The merger that created a leader With the expansion of Europe eastwards following the fall of the Berlin Wall and with the arrival of community funds for the member states of the then EEC, the Portuguese market experienced growing dynamism with the affirmation of the company in Portugal taking place with the first steps in consolidating its international expansion following its first incursions into Africa in the late 70s and throughout the 80s, culminating in the following decade with the decision of Manuel António da Mota and António Mota and with the support of his siblings Manuela, Teresa and Paula Mota, already holding senior management positions in the company, to launch activities in Central Europe, in countries such as Poland, Hungary and the Czech Republic after having already launched activities in key African markets, such as Mozambique and Malawi, earlier in that decade. At this time, Portugal was going through the euphoria pf preparing for the construction of Expo´98 in which Mota & Companhia and Engil played an extremely important role in what became national landmarks, as are the cases of the Lisbon Oceanarium, on various occasions ranked the best in the world, and the Vasco da Gama Bridge, the longest then in Europe (today the second longest) and the first public and private partnership carried out in Portugal. In the same year as the international exposition, and with António Mota now at the helm of the company, a local

AEROP ORTO DE LUANDA LUANDA AIRP ORT

C E N T R O C U LT U R A L D E B E L É M

B E L É M C U LT U R A L C E N T E R

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E M P R E S A E M D E S TA Q U E O perfil da Mota & Companhia e a Engil era muito complementar e as empresas tinham um histórico de colaboração em diversos consórcios em Portugal para além da aquisição no Peru, pelo que a decisão de António Mota revelar-se-ia totalmente acertada, conseguindo entre 1999 e 2000 concretizar a aquisição da Engil, criando mais tarde a Mota-Engil em resultado da fusão, um processo que ainda hoje é reconhecido como um dos casos de integração empresarial de maior sucesso alguma vez realizados em Portugal, criando um novo líder no mercado da construção em Portugal. A afirmação internacional Após uma década de afirmação da Mota-Engil, o Grupo iniciou um novo ciclo, criando uma Comissão Executiva em 2008, liderada então por Jorge Coelho, e sob um Plano Estratégico apresentado ao mercado com a designação “Ambição 2013”. António Mota manteve-se como Presidente do Conselho de Administração, criando uma equipa de gestão executiva que o ajudou a desenvolver um novo ciclo de ambição para o Grupo potenciando a diversificação de negócios no portefólio do Grupo e um crescimento mais vigoroso na área internacional. Apesar da crise financeira que surgiu meses depois da apresentação do Plano Estratégico e com epicentro nos Estados Unidos, a Mota-Engil cumpriu os desígnios estratégicos que haviam sido definidos sob a liderança de António Mota e Jorge Coelho, criando os alicerces que permitiriam em poucos anos ao Grupo atingir o Top 30 europeu onde permanece hoje e com a afirmação das suas operações em regiões como a Europa, Africa e América Latina. Os mercados internacionais passaram a representar mais de 75% no final deste ciclo, quando em 2007, último ano antes da alteração da equipa executiva, representava apenas 34% do volume de negócios do Grupo. Para a sua concretização foi determinante a alteração do modelo de gestão do Grupo com a criação das unidades regionais que permitiu a aceleração do desenvolvimento comercial e a afirmação local em cada mercado, assim como a entrada em novos mercados a partir de negócios fora da construção, como o ambiente ou as concessões, sendo o México o exemplo mais relevante e que hoje é o país 108

company was taken over in Peru, Translei, in conjunction with the Portuguese firm Engil, an experience that would underpin the success in expanding in the Latin America market and would be the forerunner of the largest acquisition that António Mota would later come to make. The Mota & Companhia and Engil profiles were highly complementary and the companies had a history of collaborating in various consortia in Portugal as well as the acquisition in Peru and hence the decision taken by António Mota would later prove totally certain, managing between 1999 and 2000 to complete the acquisition of Engil to later establish MotaEngil as a result of the merger, in a process that still today gains recognition as one of the most successful cases of business integration ever undertaken in Portugal and establishing a new leader in the construction market of Portugal.


F E AT U R E D C O M P A N Y com o maior portefólio de concessões do Grupo. Para este rápido crescimento, mas sustentável, António Mota repetidamente afirma que na empresa “somos portugueses em Portugal, africanos em África e latino americanos na América Latina, mas Mota-Engil em todo o mundo”, numa mensagem de coesão e de uma cultura única e diferenciada que sempre faz questão de preservar. Face à crise que culminou com a intervenção externa da “Troika” em mercados europeus, como Portugal, pode ler-se na mensagem de António Mota, Chairman do Grupo, no Relatório e Contas de 2011, a seguinte mensagem: “A nossa exposição internacional com novos clientes e novos mercados reforçam a minha convicção de que estamos no caminho certo para sairmos reforçados no final da crise”. No mesmo documento, Jorge Coelho, então CEO do Grupo, referiu que: “Regista-

International affirmation Following a decade establishing the position of Mota-Engil, the Group embarked on a new cycle, setting up an Executive Commission in 2008, then led by Jorge Coelho, and with the Strategic Plan presented to the market under the title of “Ambition 2013”. António Mota remained as President of the Board of Directors, setting up an executive management team that helped him draft a new cycle of ambition for the Group, enabling and diversifying the Group portfolios and striving for more robust growth in international markets. Despite the financial crisis, which took place just months after the presentation of the Strategic Plan and with its epicentre in the United States, Mota-Engil complied with the strategic framework defined under the leadership of António Mota and Jorge Coelho, establishing the synergies that would enable the company to become one of the Top 30 European construction firms in just a few years and where it has since remained as well as the affirmation of its operations in regions across Europe, Africa and Latin America. International markets ended up accounting for over 75% by the end of this cycle when, in 2007, the final year prior to the changes made by the executive team, they represented only 34% of the Group’s turnover. Crucial to its implementation were the alterations made to the Group management model with the establishing of regional units that enabled the acceleration of the commercial development and the local affirmation in each market as well as embarking on new markets beyond the scope of construction, such as the environment and concessions, with Mexico the leading example and the country that today accounts for the largest Group concession portfolio. To achieve this rapid but sustainable growth, António Mota repeatedly states that in the company “we are Portuguese in Portugal, Africans in Africa and Latin Americans in Latin America but Mota-Engil throughout the world”, in a message of cohesion and a unique and differentiated culture that he has always made a point of preserving. Following the crisis and recession that culminated with the external intervention of the “Troika” in European markets including Portugal, there came the message from António Mota, Group Chairman, in the Annual Business Report in 2011: “Our international exposure, with new clients and new 109


E M P R E S A E M D E S TA Q U E

OCEANÁRIO OCEANÁRIO

F U N DAÇ ÃO C H A M PA L I M AU D C H A M PA L I M A U D F O U N DAT I O N

se acima de tudo o aprofundamento do cenário de contração económica sentido nos últimos anos em Portugal, mas também na Europa”, mas quantificou o crescimento internacional num aumento de 43% em termos absolutos desde a implementação do seu Plano Estratégico, facto que nos permite confirmar da bondade da estratégia em vigor que continuará a ser a de promover o reforço desta actuação para os próximos anos”. A elevação do patamar em termos de dimensão posicionou a Mota-Engil entre as principais construtoras europeias e entre as dez maiores na América Latina (7.ª em 2020), sendo ainda uma das três maiores construtoras europeias em África, líder na África Subsariana e em mercados como Angola, Moçambique, Malawi. Nesse mesmo período, foi constituída a Fundação Manuel António da Mota, uma ambição da família de homenagear o fundador do Grupo e desenvolver a sua política de responsabilidade social nos países onde a Mota-Engil marca presença, sendo hoje, dez anos após a sua constituição um dos melhores exemplos de projectos em Portugal na intervenção do desenvolvimento social e apoio à educação e à cultura, tendo trabalho desenvolvido em diferentes países, criando um cunho da presença da Mota-Engil junto das comunidades locais. Nos últimos anos, e já com Gonçalo Moura Martins como CEO do Grupo, a Mota-Engil manteve a sua trajectória de crescimento, alargando a cadeia de valor ao segmento do Oil & Gas no Brasil, onde iniciou serviços de manutenção de plataformas, e reforçando na mineração, área onde o Grupo tem experiência desde o final da década de 90 (quando iniciou a operação no Peru) e onde tem vindo a crescer de forma significativa com contratos de elevada dimensão, terminando em 2020 com cerca de mil milhões de euros de carteira de encomendas apenas neste segmento, entre seis mil milhões do total. Em conjunto com Gonçalo Moura Martins, o CEO que passou 110

markets strengthen my conviction that we are on the right path to come out of this stronger at the end of the crisis”. In the same document, Jorge Coelho, then Group CEO, mentioned that: “This above all registers the deepening of the scenario for the economic contraction experienced in Portugal in recent years as well as in Europe” but before then quantifying international growth “as a rise of 43% in absolute terms since the implementation of the Strategic Plan, a fact underpins our ability to confirm the strategic will in effect and that shall continue to strengthen these actions for the forthcoming years”. Raising the barrier in terms of scale positioned Mota-Engil among the leading European constructors and in the ten largest in Latin America (7th in 2020) as well as being one of the three largest European constructors in Africa, leader in Sub-Saharan Africa and markets including Angola, Mozambique and Malawi. This same period saw the launching of the Manuel António da Mota Foundation, a family ambition to honour the Group’s founder and develop its corporate social responsibility policies in the countries where Mota-Engil maintains a presence and, today, ten years on from its founding, one of the best examples of projects in Portugal for intervening in social development and support for education and culture, have carried out works in different countries, establishing the Mota-Engil presence alongside the local communities. In recent years, and with Gonçalo Moura Martins already the Group CEO, Mota-Engil remains on its growth trajectory, broadening its chain of value into the Oil & Gas segment in Brazil, where it has begun platform maintenance services and deepening its capacities in mining, an area the Group has been building since the 1990s (when beginning operations in Peru) and where there has been significant growth in large scale contracts and closing 2020 with around one billion euros of commissioned


F E AT U R E D C O M P A N Y por todas as áreas de negócio do Grupo, da construção, ao ambiente passando pelas concessões, a equipa de gestão da holding conta hoje com Carlos Mota Santos e Manuel Mota, representantes da terceira geração da família Mota e que são um exemplo de continuidade do compromisso do accionista fundador para com o futuro do Grupo. Em 2021, ano que marca os 75 anos da Mota-Engil, foram concretizados vários marcos na história do Grupo, começando pela assinatura, em Janeiro, do maior contrato da sua história na Nigéria, com o projecto ferroviário Kano-Maradi, alcançando em Junho o recorde de carteira de encomendas no valor de 7,4 mil milhões de euros e concretizando na plenitude o Acordo de Parceria Estratégica e de Investimento com uma das maiores construtoras mundiais, a China Communications Construction Company (CCCC), um parceiro com dimensão global e que se perspectiva que venha a contribuir para a participação da Mota-Engil em projectos de (ainda) maior dimensão. Num momento que concretiza a efeméride de comemoração de uma data tão marcante, a Mota-Engil continua a construir o seu futuro muito para além dos horizontes do seu país de origem, e tal como Manuel António da Mota partiu de Codeçoso para conquistar novos mundos, também a Mota-Engil continua a trilhar novos caminhos no seu desenvolvimento.

projects in its portfolio out of its six billion euro total. In keeping with Gonçalo Moura Martins, the CEO who has been through every business area in the Group, from construction to environment via the concessions, the holding group management draws upon Carlos Mota Santos and Manuel Mota, representative of the third generation of the Mota family and that are an example of the continuity of the commitment of the founding shareholders to the future of the Group. In 2021, the year Mota-Engil turned 75, there were a series of landmarks in the history of the Group beginning with the signing in January of the largest contract in its history in Nigeria for the Kano-Maradi railway project, achieving in June its portfolio order book record of 7.4 billion euros and now fully implementing the Strategic Partnership and Investment Agreement with one of the world’s largest constructors, China Communications Construction Company (CCCC), a globally scaled partnership that opens up prospects for Mota-Engil to contribute in the future to projects of a (still) greater dimension. At the moment when commemorating such an important date, Mota-Engil continues to build its future far beyond the horizons of its country of origins and, just as Manuel António da Mota set off from Codeçoso to win new worlds, Mota-Engil shall also continue to tread new paths for its own development.

J O R G E C O E L H O , A N T Ó N I O M O TA E GONÇALO MOURA MARTINS

JORGE COELHO, UM HOMEM QUE VALEU A PENA

JORGE COELHO, A MAN OF WORTH

Era um homem que se distinguia da maioria. Conheci-o superficialmente, ao de leve, pela rama. Mas quando nos víamos abraçava-me como se fossemos amigos – perguntava pelas minhas coisas, queria saber pormenores, comentava sobre algum texto, algum livro ou algum tema político ou empresarial. Ainda me faz impressão pensar que partiu daquela maneira. Sem deixar aviso, exatamente como o pai 60 anos antes, de morte súbita, um enfarte agudo ou qualquer coisa do género. Partiu apressadamente, mas dele ficaram três coisas. Cada uma

This was a man who stood out from the majority. I knew him superficially, lightly, mostly just in passing. But when we did meet, he would embrace me as if friends – he would ask about my things, wanting to know the details, commenting on some text, some book or political or business theme that interrelated. I’m still somewhat shocked that he left in such a manner. Without any warning, exactly like his father sixty years earlier, a sudden stroke, heart attack or something of that type.

POR LUÍS OSÓRIO

BY LUÍS OSÓRIO

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E M P R E S A E M D E S TA Q U E delas com a força suficiente para sobreviver à sua morte. Em primeiro lugar, o despojamento e a coragem. Na queda da ponte de Entre-os-Rios, a 4 de março de 2001, Jorge Coelho era ministro com a tutela das obras públicas. E foi ele, horas depois da tragédia ter acontecido, a demitir-se de ministro porque “a culpa não podia morrer solteira”. Assumiu a responsabilidade política e administrativa pelo acidente e pela morte daquelas 59 pessoas. Foi um dos poucos políticos a fazê-lo da forma como o fez. António Guterres tentou demovê-lo. António Costa tentou demovê-lo. Era natural que o fizessem – eu próprio se estivesse nos seus lugares o tentaria fazer. Ele era o ministro que tutelava as obras públicas, mas não fazia sentido assumir as responsabilidades sob pena de para sempre ficar injustamente marcado. Mas ele fê-lo e assumiu a responsabilidade. Um dia perguntei-lhe, lembro-me. E Jorge disse-me que não conseguiria dormir se não o fizesse. Poucos seriam capazes de o fazer. Ele fê-lo. Em segundo lugar, por nunca ter atraiçoado as suas raízes. Subiu na vida, chegou ao topo na política, nos negócios ou na influência que exercia com a sua intuitiva inteligência e desarmante sentido de humor, mas nunca virou as costas ao lugar onde nasceu. Era beirão e amava Mangualde. E nos últimos anos voltou à terra para montar um negócio de queijos. Queria fazer um bocadinho o que o comendador Nabeiro fez por Campo Maior, retribuir aos seus o que a terra lhe tinha dado. Num tempo em que tantos renegam as suas origens, Jorge não o fez. Não o fez quando chegou a Lisboa para frequentar o ISEG. Não o fez quando ganhou experiência em Macau. Não o fez quando foi deputado. Não o fez quando foi ministro. Não o fez quando se passou a sentar às mesas dos poderosos. Não o fez quando passou a ser empresário e a ganhar dinheiro. Poucos não teriam esquecido o lugar onde nasceram. Ele não o fez. Em terceiro lugar, a sua simpatia. Jorge Coelho era um homem simpático para todas as pessoas com quem estava. Vi-o a ser simpático para uma senhora que limpava o gabinete – a quem perguntou pela escola do filho. Vi-o a ser simpático para os senhores do restaurante, para adversários políticos, para quem o abordava na rua. Vi-o a ser simpático para mim quando eu tinha 18 anos e o abordei para uma entrevista num jornal no liceu. “Como é que se chama?” “Luís”. “E o meu caro amigo o que manda?” E eu disse-lhe o que mandava. E ele perguntou-me se poderia ser na semana seguinte, no parlamento. Fui ter com ele na semana seguinte. E tratou-me como se eu fosse importante. Poucos o teriam feito, mas ele fê-lo. Jorge Coelho morreu, Mas foi um homem que viveu com os outros. Foi um homem que valeu a pena. l

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He left in a rush but three things remain behind: each with sufficient strength to live on after his death. Firstly, the detachment and the courage. At the time of the collapse of the Entre-os-Rios bridge, on 4 March 2001, Jorge Coelho was the minister responsible for public works. And it was he, just hours after the tragedy had happened, resigned as minister because the “guilt could not be left to die alone”. He took on the political and government responsibility for the accident and the death of those 59 persons. He was one of few politicians to do so and especially in the way he acted. António Guterres attempted to demote him. It was only natural that he would do so – I myself would have attempted to do this if I were in his position. He was the minister responsible for public works but it would not have made sense to assume the responsibility on account of being unfairly marked long into the future. But he did so and took that responsibility. One day, I recalled asking him about it. And Jorge told me that he would not be able to sleep had he not done so. Few would have been capable of doing so. He did it. Secondly, for never having betrayed his roots and origins. He rose in life, reached the top in politics, in business and in the influence he exercised with his intuitive intelligence and disarming sense of humour but while never turning his back on the place of his birth. He was from Beira Alta and loved Mangualde. And, in recent years, he returned to the land to set up a cheese business. He wanted to do a little of what Commander Nabeiro has done for Campo Maior, retributing to his own what the land had given him. In a time when so many reject their own origins, Jorge did not do so. He did not do so when he arrived in Lisbon to attend university at ISEG. He did not do so when gaining experience in Macau. He did not do so when he was an MP nor when he was minister. He did not do so when he began sitting at the tables of the powerful. He did not do so when he went into business and made money. Few would not have forgotten the place of their birth. He did not do so. Thirdly, his niceness. Jorge Coelho was a nice man to whoever he was with. I saw him being nice to the lady that cleaned his office – who he asked about how her son was doing in school. I saw him being nice to waiters in restaurants, to political adversaries that he encountered in the street. I saw him being nice to me when I was 18 and approached him for an interview for the school newspaper. “What’s your name?” “Luís”. “And my dear friend, what brings you here?” And I told him what had brought me there. And he asked me if it might be the following week in parliament. I went to meet him the following week. And he dealt with me as if somebody important. Few would have done so but he did. Jorge Coelho has died, But he was a man who lived with the others. And he was a man of worth. l


Quando é que as mulheres vão ganhar mais do que os homens? Difícil dizer. Pelo gap salarial na Europa entre homens e mulheres é como se de 1 de Novembro a 31 de Dezembro elas estivessem a trabalhar de graça.* *Fonte: European Institute for Gender Equality

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ECONOMIA

PEDRO REIS, CANDIDATOS A BASTONÁRIO DA ORDEM DOS ECONOMISTAS CANDIDATE FOR THE LEADERSHIP OF THE ORDER OF ECONOMISTS

PORQUE DECIDI CANDIDATAR-ME

A BASTONÁRIO

WHY DID I DECIDE TO RUN FOR PRESIDENT OF THE ORDER OF ECONOMISTS

D

ecidi candidatar-me a Bastonário da Ordem dos Economistas por sentido de missão e por acreditar que é importante ajudarmos, todos e sempre que possível, a valorizar o papel da profissão e a reforçar a dinâmica da Ordem numa fase tão desafiante para a economia portuguesa como a que atravessamos e que continuaremos a viver nos próximos anos. Decidi candidatar-me porque acredito que temos o dever de servir o nosso País nos tempos mais exigentes e nos ciclos mais desafiantes, porque acredito que a Ordem tem um papel crucial na defesa e na promoção de políticas económicas e sociais sustentáveis, equilibradas, estruturantes e ambiciosas. Decidi candidatar-me porque acredito que a Ordem pode, e deve, zelar pelo prestígio da sua Classe e pelo reconhecimento dos seus Membros, porque acredito na importância de dinamizar um ciclo novo que se quer construtivo, válido e intenso quanto ao seu espírito, ao 114

I

decided to run for the presidency of the Order of Economists on feeling the mission and believing it is important that we help and, whenever possible, to value the role of the profession and strengthen the dynamics of the Order in such a challenging phase for the Portuguese economy such as that we are going through and shall continue to experience in forthcoming years. I decided to stand because I believe we have the duty to serve our country in the most demanding times and the most challenging cycles, because I believe the Order holds a crucial role in defending and promoting sustainable economic and social policies, balanced, structural and ambitious. I decided to stand because I believe that the Order can and should strive for the prestige of its professional class and for the recognition of its members because I also believe in the importance of dynamically driving a new cycle that needs to be constructive, valid and intense as regards its spirit, contribution and work respectively.


ECONOMICS

“ D E C I D I C A N D I D AT A R - M E PA R A A J U DA R A P R O M OV E R O D E S E N V O LV I M E N T O DAS QUALIFIC AÇÕES E DA LITER ACIA FINANCEIR A D OS P O R T U G U E S E S E PA R A AT R A I R M A I S E C O N O M I S TA S PA R A A O R D E M .”

seu contributo e ao seu trabalho respetivamente. Decidi candidatar-me para fazer do 25º aniversário da Ordem que se aproxima um momento de balanço e de prospetiva para o que queremos construir nos próximos 25 anos, promovendo uma ampla discussão sobre os desafios do País e da classe dos economistas para assim reforçar a presença, a dinâmica e a visibilidade da Ordem na sociedade, incrementando o reconhecimento e o prestígio social da Instituição. Decidi candidatar-me para contribuir para a reflexão, definição e dinamização dos eixos promotores de desenvolvimento, inovação, competitividade e capacidade de criação de emprego digno na economia portuguesa. Decidi candidatar-me para colocar a sustentabilidade e a ética no topo das prioridades da Ordem e da sociedade portuguesa, contribuindo para uma economia portuguesa neutra em carbono e alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Decidi candidatar-me para ajudar a promover o desenvolvimento das qualificações e da literacia financeira dos portugueses e para atrair mais economistas para a Ordem, nomeadamente os jovens economistas para renovarem as estruturas e órgãos da Ordem e para refrescarem o seu pensamento e a sua ação. Decidi candidatar-me para reforçar a reflexão e o debate na sociedade portuguesa sobre Políticas Públicas, sobre a agenda social integradora e humanizadora, sobre a coesão territorial e o equilíbrio da diversidade regional. Decidi candidatar-me para fazer da Ordem um pólo avançado da igualdade de género e da afirmação do mérito em toda a sua plenitude. Desde que decidi candidatar-me tenho tido a alegria de contar com a honra e o privilégio de receber centenas de apoios dos mais diversos quadrantes, sensibilidades, gerações, regiões e especialidades que são um sinal de esperança num projeto renovador, agregador e mobilizador. Vamos assim, todos juntos, rumo ao futuro com ambição e através de uma renovação serena: porque a Ordem precisa e porque o nosso País merece! l

I decided to stand to make the forthcoming 25th anniversary of the Order an opportunity to provide a balance in the present and prospects for what we want to build over the next 25 years, fostering a broad discussion over the challenges for the country and the economist class so as to strengthen its presence, the dynamics and visibility of the Order in society, boosting the recognition and social prestige of the institution. I decided to stand as candidate in order to contribute to the reflection, definition and dynamic implementation of the axes promoting development, innovation and the capacity to create employment worthy of the Portuguese economy. I decided to stand to place sustainability and ethics at the top of the priorities of the Order and of Portuguese society, contributing to a carbon neutral Portuguese economy and aligned with the UN’s Sustainable Development Goals. I decided to stand to help in promoting the development of the qualifications and financial literacy of the Portuguese and attract more economists into the Order, especially young economists to renew the structures and management bodies of the Order and rejuvenate both its thoughts and actions. I decided to stand as candidate to deepen the reflection and debate in Portuguese society about public policies, about the integrating and humanising social agenda, about territorial cohesion and the balance in regional diversity. I decided to stand as candidate to make the Order an advanced pole of gender equality and the affirmation of merit in its fullest sense. Ever since I decided to stand as candidate, I have had the pleasures of counting on the honour and privilege of receiving hundreds of messages of support from the most diverse fields, sensitivities, generations, regions and specialist fields, which are a signal of hope for a project of renovation, aggregation and mobilisation. We therefore head, all together, into the future with ambition and a smooth renovation process: because the Order needs this and our country deserves this! l

“ I D E C I D E D T O S TA N D T O HELP IN PROMOTING THE D E V E LO P M E N T O F T H E Q U A L I F I C AT I O N S A N D FINANCIAL LITER ACY OF THE P O R T U G U E S E A N D AT T R AC T MORE ECONOMISTS INTO T H E O R D E R .” 115


ECONOMIA

MANUEL CALDEIRA CABRAL, ADMINISTRADOR NA AUTORIDADE DE SUPERVISÃO DE SEGUROS E FUNDOS DE PENSÕES (ASF) DIRECTOR OF THE INSURANCE AND PENSION FUND SUPERVISORY AUTHORITY (ASF)

CONSEGUIMOS COLOCAR P O RT U G A L N O M A PA DA S EMPRESAS TECNOLÓGICAS WE MANAGED TO GET PORTUGAL O N TO T H E M A P O F T E C H N O L O G Y C O M PA N I E S

O

forte crescimento das empresas tecnológicas em Portugal, que aconteceu nos últimos seis anos, foi uma mudança estrutural determinante, que alterou o quadro das maiores empresas portuguesas, criou mais de 40 mil novos empregos e vai contribuir para acelerar o crescimento do país no pós-pandemia. No meu livro, "Construir a Alternativa", mostro que esta reforma estrutural resultou do mérito dos empreendedores portugueses e do talento que existia no país, mas também da implementação de um conjunto de políticas públicas coerentes, que incluíram: apoios ao empreendedorismo, como o Startup Voucher; incentivos fiscais (Semente, KEEP); medidas de dinamização do ecossistema, como a criação da rede nacional de incubadoras; um forte aumento do financiamento público do capital de risco, colocando mais de mil milhões de euros em fundos de coinvestimento; apoios à internacionalização a mais de 400 ‘startups’; vistos para atrair empreendedores (Startup Visa); um programa para valorizar a participação de ‘startups’ portuguesas na Websummit (Road to Websummit) e uma mobilização da AICEP e do Compete para a atração de centros de desenvolvimento tecnológico para Portugal. Quando, em março 2016, eu e o João Vasconcelos, lançámos o programa Startup Portugal, apresentámos estas medidas e afirmámos que queríamos colocar Portugal como um dos países europeus com melhores condições

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T

he strong growth of technology companies in Portugal, which has been the case for the last six years, was a structurally determinant change that altered the framework for the largest Portuguese firms, created 40,000 new jobs and shall contribute to accelerating national growth in the post-pandemic period. In my book, ‘Construir a Alternativa’, I set out how this structural reform resulted from the merits of Portuguese entrepreneurs and the talent existing in the country as well as from the implementation of a set of coherent public policies that include: support for entrepreneurship, such as the Startup Voucher; fiscal incentives (Semente, KEEP); measures to boost the dynamism of the ecosystem, such as launching a national network of incubators; a sharp increase in public financing of risk capital, attributing over a billion euros to co-investment funds; support for the internationalisation of over 400 startups; visas to attract entrepreneurs (Startup Visa); a program to enhance the participation of Portuguese startups in the Websummit (Road to Websummit) and the mobilisation of AICEP and Compete to attract centres of technological development to Portugal. When João Vasconcelos and I launched the Startup Portugal program in March 2016, we presented these measures and affirmed we wished to turn Portugal into one of the European countries with the best conditions for startups to grow and expand globally. (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


ECONOMICS para as ‘startups’ crescerem e se afirmarem globalmente. Na altura, o programa foi recebido com algum ceticismo. Estas empresas eram demasiado pequenas para poderem ter um impacto no crescimento e no emprego. Portugal não ia passar, de um dia para o outro, a ser visto com um destino para áreas de alta tecnologia. De facto, em 2015, não havia nenhum unicórnio português e o valor das empresas tecnológicas portuguesas não chegava a 1% do PIB. Portugal não estava no mapa dos investidores internacionais. Em seis anos, o quadro mudou completamente. Multiplicaramse exemplos de investidores internacionais a fazer entradas de capital de 5, 10 ou mesmo 50 milhões de euros em ‘startups’ portuguesas. Dezenas de centros de desenvolvimento tecnológico vieram para Portugal, criando dezenas de milhar de empregos qualificados por todo o país. Lisboa surge hoje como a 6ª melhor cidade para fundar uma ‘startup’ na Europa e o Porto como a 18ª (Startup Heatmap Europe). O valor das empresas tecnológicas portuguesas já ultrapassou os 15% do PIB. Portugal tem hoje cinco unicórnios. Se estivessem na bolsa nacional, três destas empresas, estariam entre as cinco com maior valor. Estas empresas são muito diferentes das tradicionais grandes empresas portuguesas: Estão em crescimento rápido, enquanto a maioria das grandes empresas tradicionais apresenta um crescimento lento, e atuam no mercado global, ao contrário das tradicionais que estão centradas no mercado nacional. Estes dois aspetos, significam que estas empresas deverão continuar a dar um contributo importante para reforçar e alterar o padrão de crescimento. Esta foi uma reforma estrutural importante, que resultou de um conjunto integrado e coerente de medidas de política e do esforço de mobilização do ecossistema português e de atração de investidores internacionais, que responderam de uma forma fantástica. Descrevo estas medidas e os resultados conseguidos no meu livro, em que abordo muitas outras áreas de política económica em que atuei, que incluíram políticas de reforço da digitalização e da inovação, com os programas Indústria 4.0 e Interface, de apoio à capitalização e incentivo ao investimento (Programa Capitalizar), de suporte à internacionalização (Programa Internacionalizar), e a atuação que desenvolvi nas áreas do Turismo e da Energia. O livro apresenta as reformas feitas por estas políticas e os seus resultados e discute a ações que são necessárias para reforçar o seu efeito no crescimento de Portugal no período pós-pandemia. l

At the time, the program went down with a certain scepticism. These companies were simply too small to be able to have an impact on growth and employment. Portugal would not, from one day to another, become seen as a destination for fields of high technology. In fact, in 2015, there was not a single Portuguese unicorn and the total value of Portuguese technology companies did not amount to 1% of GDP. Portugal was not on the map of international investors. In six years, the context has entirely changed. The examples of international investors stepping in with capital of 5, 10 or even 50 million euros for Portuguese startups. Dozens of technological development centres have come to Portugal and creating many tens of thousands of qualified jobs around the country. Lisbon today ranks as the 6th best city to launch a startup in Europe and with Oporto in 18th place (Startup Heatmap Europe). The value of Portuguese technology companies already exceeds 15% of GDP. Portugal today has five unicorns. If they were listed on the national market, three of these companies would appear among the five with the greatest value. These companies are highly different to the large, traditional Portuguese businesses: They are experiencing rapid growth while the majority of longstanding businesses register only slow rates of growth and the former act in global markets to the contrary of their traditional counterparts more focused on the national market. These two aspects mean these companies should continue to make major contributions to strengthening and deepening the pattern of growth. This was an important structural reform, which resulted in an integrated set of coherent policy measures and efforts to mobilise the Portuguese ecosystem and attract international investors who responded fantastically. I describe these measures and the results achieved in my book in which I approach many of the other fields of economic policy in which I engaged, including policies to boost digitalisation and innovation, with the Industry 4.0 and Interface programs, support for capitalisation and incentives for investment (Capitalise Program), providing means for internationalisation (Internationalise Program) and as well as the actions developed in the fields of Tourism and Energy. The book sets out the reforms made by these policies and their results while also discussing the actions necessary to strengthening their effects on national growth in the post-pandemic period. l 117


ECONOMIA

ÁLVARO SANTOS PEREIR A, DIRECTOR NO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA OCDE OECD DIRECTOR OF THE DEPARTMENT OF ECONOMICS

SAIR DA CRISE EMERGING FROM THE CRISIS

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gora que finalmente começamos a ver a luz ao fundo do túnel em relação a esta malfadada pandemia, interessa perceber como é que vamos sair da crise e como é que poderemos sustentar a recuperar das diferentes economias e da economia mundial. Como sempre, a escolha das políticas públicas tem um papel fundamental a desempenhar para a recuperação e para a sustentabilidade do crescimento e do emprego. Por isso, interessa perguntar: quais são as políticas públicas e económicas necessárias para alcançarmos uma recuperação sustentada? Em primeiro lugar, o fundamental é vacinar, vacinar, vacinar. A vacinação continua a ser a mais importante política pública (e económica) para todos os países do mundo. Enquanto não tivermos uma larga percentagem vacinada das populações de todos os países não poderemos afirmar com convicção que os riscos associados à pandemia acabaram. Infelizmente, ainda estamos muito longe desse ponto. E se é verdade que vários países (principalmente na América do Norte e na Europa, mas também em países como o Chile, Israel e Singapura) que já têm a grande maioria das suas populações vacinadas, há inúmeros países onde o processo de vacinação quase ainda não arrancou. Ou seja, as desigualdades no processo de vacinação são gritantes. Ora, estas enormes desigualdades vão ter um impacto muito grande no ritmo da retoma dos diferentes países. Mais concretamente, em média, os países com uma maior percentagem de vacinados tenderão a crescer 118

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ow that we are finally beginning to see light at the end of the tunnel of this accursed pandemic, what matters is understanding just how we are going to get out of the crisis and sustain the recovery both of the different economies and the world economy. As always, the choice of public policies plays a fundamental role in the performance of this recovery and the sustainability of growth and employment. Hence, we should inquire into just which public and economic policies are necessary to obtain a sustainable recovery? Firstly, it is crucial to vaccinate, vaccinate and vaccinate. The vaccination program remains the most important public (and economic) policy for every country. While we do not have a large percentage of vaccinated people all around the world, we cannot affirm with any conviction that the risks associated with the pandemic are over. Unfortunately, we remain very far from this point. And, while various countries (primarily in North America and Europe but also elsewhere, for example Chile, Israel and Singapore) already have the bulk of their populations vaccinated, there are many more countries where the vaccination process has yet to get beyond its starting phase. Therefore, the inequalities in the vaccination process are stark and clear. Indeed, these enormous inequalities are going to have a very sharp impact on the pace of recovery in the different countries. More specifically, on average, the countries with the greatest percentage of vaccination shall tend


ECONOMICS e a recuperar mais rapidamente do que os países com uma baixa percentagem de vacinação, pois terão geralmente menos restrições à actividade económica. Neste sentido, e como é sabido, é fundamental acelerar a vacinação em todos os países do mundo, pois há um risco real de surgirem novas variantes onde as vacinas possam ser menos eficazes nos países onde a vacinação é baixa. Por isso, é fundamental que os países mais ricos auxiliem o mais possível os países menos desenvolvidos no importante esforço de vacinação. A vacinação é um bem comum global e todos devemos contribuir para que seja feita o mais rapidamente possível. Em segundo lugar, as políticas económicas e sociais utilizadas para combater os nefastos efeitos económicos e sociais da pandemia continuam em vigor, embora estejam a começar a mudar. Nos primeiros meses da pandemia, os governos e os bancos centrais utilizaram medidas sem precedentes para tentar estancar um aumento desmesurado do desemprego e para atenuar as quedas da economia provocadas pelas restrições sanitárias. Assim, os bancos centrais rapidamente reduziram taxas de juros, compraram uma quantidade enorme de activos e injectaram quantidades sem precedentes de liquidez nas economias para que a crise económica não se transformasse também numa crise de crédito (o que teria consequências ainda mais nefastas para os sistemas financeiros e bancários). Os governos utilizaram ainda medidas anteriormente pouco utilizadas, como sejam subsídios aos salários, subsídios directos às empresas, bem como moratórias e garantias de Estado para a concessão de empréstimos às empresas e apoiar às famílias. O resultado de todos estes estímulos foi certamente termos uma crise económica bem menor do que teríamos se as políticas públicas não tivessem sido tão significativas e pro-activas. Porém, uma das consequências destes estímulos foi igualmente uma subida generalizada das dívidas públicas, bem como um aumento das dívidas das empresas e de muitos particulares. Ora, agora que estamos a começar a sair da crise graças ao levantamento das restrições sanitárias possibilitadas pelas campanhas de vacinação, a economia começa a recuperar e os estímulos económicos tornam-se menos importantes. Por outro lado, começam agora a surgir sinais bastante claros que a pandemia causou toda uma série de restrições nas cadeias de valor globais, que levaram à escassez de alguns produtos essenciais (tais como os semicondutores). O aumento dos preços tem ainda sido fomentado pela recuperação das economias mundiais, bem como ao aumento da procura de serviços (como a cabotagem e do transporte de mercadorias), de matérias primas, e até de mão-de-obra (principalmente nos países onde a imigração é importante). O resultado de todos estes factores tem sido uma inexorável subida da inflação, agravada em muitos países pela depreciação da moeda e pela subida dos preços da energia. Por isso, a subida da inflação tem levado a que muitos bancos centrais tenham começado a subir as taxas de juro para tentar controlar os preços. Esta subida da inflação não se resume aos países

to grow and recover more swiftly than countries with low levels of vaccination as they will generally impose fewer restrictions on their economic activity. Therefore, and as generally accepted, there is a fundamental need to accelerate vaccinations in every country as there is a real risk of new variants emerging that may be less susceptible to the effects of vaccination. Correspondingly, countries with greater wealth simply have to assist, to the greatest possible extent, their lesser developed peers in this core task of vaccination. Vaccination is a common and global good and we should all contribute to making sure this happens as swiftly as possible. Secondly, the economic and social policies deployed to combat the harmful economic and social effects of the pandemic remain in effect even while having begun to change. In the early months of the pandemic, governments and central banks applied unprecedented measures in efforts to stem the rise in unemployment and offset the economic losses caused by virus control restrictions. Thus, central banks were swift to reduce interest rates, purchase an enormous amount of assets and injected unheralded quantities of liquidity into the economy so that this economic crisis did not get transformed into a credit crisis (which would have still more devastating effects on financial and banking systems). Governments also made recourse to previously rarely used measures, including wage subsidies, subsidies paid directly to companies as well as moratoriums and state guarantees for loans to companies and support for households. The results of all these stimuli are certainly reflected in having a far shorter economic recession than would have otherwise been the case without such significant and pro-active public policies. Nevertheless, one of the consequences of these stimulus packages was also a general and significant rise in public debt as well as in the debt held by many companies as well as lots of private citizens. Indeed, now that we are beginning to leave the crisis behind following the lifting of restrictions enabled by vaccination campaigns, with the economy picking up, these economic stimuli are becoming less important. Furthermore, there are now appearing fairly clear signs that the pandemic triggered a series of impacts on global chains of value that have led to shortages in some essential products (such as semiconductors). The rise in prices has also been brought about by the recovery in the world’s economies coupled with the hike in demand for services (such as cabotage and the transport of goods), raw materials and even labour (particularly in countries where immigration is important). The result of all these factors has been an inexorable rise in inflation, worsened in many countries by currency depreciations and the spike in energy prices. Furthermore, the rise in inflation has led many central banks to begin raising their interest rates in order to keep a control over prices. This surge in inflation is not limited to developing countries but has equally been felt in advanced countries, 119


ECONOMIA emergentes, mas tem-se sentido igualmente nos países mais avançados, principalmente nos Estados Unidos, graças não só à recuperação da economia, mas também aos estímulos monetários e fiscais sem precedentes. E se é verdade que o cenário central das previsões macroeconómicas sugerem que a inflação é essencialmente temporária, a verdade é que é bem possível que a subida dos preços esteja aí para durar. E se assim for, certamente que vamos assistir a uma maior e mais rápida subida das taxas de juros, o que terá efeitos importantes para os rendimentos disponíveis das famílias, para as empresas e para os próprios Estados, que têm de se financiar a juros mais elevados. Por outras palavras, estamos provavelmente num ponto de inflexão no ciclo económico. Nos próximos meses, os governos e os bancos centrais vão começar a retirar os enormes estímulos económicos que foram lançados com a pandemia, os juros vão subir e uma maior atenção começará a ser dada às dívidas públicas e privadas nos diversos países. E o que é que resta aos países para garantir uma retoma mais sustentada? Estimular o investimento (privado e público) e, principalmente, voltar as atenções para as reformas estruturais. Sabendo que nos próximos tempos iremos ter de lidar com os desafios do envelhecimento da população, das alterações climáticas, da produtividade e da digitalização, é fundamental que os governos lancem ambiciosos programas de reformas para lidar com estes mesmos desafios. Só com uma nova onde de reformas que promova a competitividade e a produtividade nacionais é que os governos conseguirão estimular as suas economias e irão conseguir ultrapassar os enormes desafios do futuro. Está assim nas nossas mãos garantir que esta crise fique para trás o mais rápida e sustentadamente possível. Para tal, é essencial voltar a reformar para que os nossos países crescem de forma mais sustentada e mais sustentavelmente. l

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especially the United States, due not only to economic recovery but also the unprecedented monetary and fiscal stimuli. Indeed, while true that the central scenarios for macroeconomic forecasts point to this surge in inflation as being essentially temporary, the fact remains that this rise in prices may have set in for the long term. Should such be the case, we shall certainly be dealing with a larger and faster rise in interest rates, which will have important effects on the available income of families and households, companies as well as the states themselves now only able to finance deficits at higher rates of interest. In other words, we are most probably at a turning point in the economic cycle. In forthcoming months, the governments and central banks shall begin withdrawing the huge economic stimuli provided during the pandemic period, interest rates are going to rise and greater attention will be paid to the levels of public and private debt in various countries. And what remains for countries seeking to guarantee more sustainable recoveries? Stimulating investment (private and public) and, especially, turning attention back to structural reforms. Knowing that in the times to come, when we shall have to deal with the challenges of an ageing population, climate change, productivity and digitalisation, it is fundamental for governments to embark on ambitious reform programs that deal with these same challenges. Only with another wave of reforms that foster competitiveness and national productivity will governments be able to stimulate their economies and prove able to overcome the enormous challenges faced in the future. Thus, it is in our hands to guarantee that this crisis gets left behind as quickly and as sustainably as possible. To this end, it is essential to get back to reforms so that our countries may experience more sustained and more sustainable growth. l


As tendências do mundo da gestão

Tiragem 17.000 exemplares  2,7 Milhões de pageviews médias mensais

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ECONOMIA

PAULO MORGADO, COFUNDADOR DA BRIDGEWHAT COFOUNDER OF BRIDGEWHAT

PL ATAFORMAS: A CLOUD DA

INTELIGÊNCIA P L AT F O R M S : T H E I N T E L L I G E N T C L O U D

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mundo digital trouxe ao mundo dos negócios desafios que muitos gestores ainda não assimilaram. Um desses desafios é compreender o valor das plataformas Business-to-Business (B2B). As plataformas são ecossistemas digitais que facilitam e aceleram o acesso a uma economia de partilha e colaboração. O B2B reflecte os negócios feitos entre várias companhias. A internet é a plataforma das plataformas, sendo suportada por uma outra plataforma que permite uma navegação fácil e acessível a todos: a World Wide Web (www). A plataforma das plataformas permitiu o acesso à chamada Cloud. A Cloud disponibiliza, em modo colaborativo através da internet, ‘software’, plataformas de desenvolvimento de ‘software’ e infra-estruturas (“máquinas”), às quais acedemos regularmente a partir de ‘laptops’, ‘desktops’, servidores, telefones ou tablets (e às quais as “coisas” também acedem através da internet das coisas – IoT). 122

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he digital world has brought the business world challenges that many managers are still attempting to assimilate. One such challenge stems from grasping the value of Business-to-Business (B2B) platforms. Platforms are ecosystems that facilitate and accelerate access to a sharing and collaborative economy. B2B reflects the deals done between various companies. The Internet is the platform of platforms and itself supported by another platform that enables easy navigation accessible to all: the World Wide Web (www). The platform of platforms enables access to that which has become known as the Cloud. Through collaborative, Internet based means, the Cloud makes available both software and software and infrastructure development platforms (“machines”), which we commonly access via our laptops, desktops, servers, smartphones or tablets (and through which the “things” also gain access on the Internet of Things– IoT). We therefore encounter a collaborative world enabled by various platforms that have become unavoidable as regards everything under the auspices of the information and communication technologies.


ECONOMICS Temos portanto um mundo colaborativo, possibilitado pelas várias plataformas, que se tornou incontornável para tudo o que respeita às Tecnologias de Informação e Comunicação. No entanto, esta inevitabilidade dos modelos de colaboração ainda não passou para a gestão. Razões para isso há muitas, sempre a juntar à escassez de estudo e à convicção de que o mesmo não é necessário. Entre essas razões há duas bastante comuns: o excessivo foco dos quadros das grandes empresas em assuntos internos a essas empresas; e o culto do secretismo em empresas onde propriedade e gestão estão fusionadas e onde a vida empresarial do dono se confunde com a sua vida privada. Tanto no primeiro caso como no segundo, os gestores padecem do mesmo problema: “Thinking inside de box”! Mas voltemos à colaboração. O Waze afirmou-se como uma das melhores plataformas de navegação porque, para além dos automatismos que permitem leituras automáticas da realidade (a tal internet das coisas que permite que vários telemóveis, sinais de trânsito e outros emissores/receptores comuniquem entre si), soube criar uma comunidade que colabora para atingir níveis de informação não acessíveis para gente “desconectada”. Quem tem Waze saberá evitar um engarrafamento rodoviário, porque a comunidade prestou informações, de modo colaborativo, sobre o mesmo, adicionando informação à já proporcionada pelos tais dispositivos interligados. Humanos que colaboram entre si e com máquinas (que por sua vez comunicam entre si) para optimizar decisões (tais como evitar um engarrafamento). No caso das plataformas que ligam várias empresas vendedoras e compradoras de bens e serviços a um mercado, este tipo de colaboração vai ainda mais longe. Aos dados recolhidos e comunicados (informação), podem-se juntar a análise e recomendações (inteligência) e a experiência e método/ferramentas de execução (transformação). Um exemplo básico dos benefícios da colaboração dentro de plataformas de prestação de serviços são as avaliações sob a forma de estrelas dadas por utilizadores desses mesmos serviços (exemplo: Uber), o mesmo se aplicando, naturalmente à venda de produtos (exemplo: Amazon). Poderíamos dar mais exemplos, mas, em resumo, se tivéssemos que lembrar o que perdem os gestores que pensam “inside-the-box”, não utilizando plataformas B2B, diríamos: conhecimento e digitalização. O conhecimento traduz-se, nomeadamente, em ‘insights’ sobre: i) quem são as melhores e as piores empresas (curadoria), ii) o que estão a fazer as melhores empresas (inovação), iii) oportunidades de negócios (marketplace), e iv) os melhores especialistas de um determinado sector ou domínio de conhecimento (assessoria). A digitalização traduz-se na capacidade de centralizar em um ‘software’ um conjunto de actividades que gozam dos atributos típicos do mundo digital: instantaneidade, perfeição e gratuitidade: • Instantaneidade: capacidade de comunicar “online” com todos os participantes... • Perfeição: ... seguindo os melhores ‘standards’

However, the inevitability of these collaborative models has yet to be incorporated into management. There are many reasons for this but always coming along in association with the lack of study and the underlying conviction that they are not really necessary. Among the other reasons, two others are fairly general: the excessive focus of managers in large corporations on matter internal to their companies; and the cult of secrecy in companies in which ownership and management entirely overlap and with the business lives of their owners confused with their private lives. Both in the former and the latter cases, managers would seem to be afflicted by the same problem: “Thinking inside the box”! However, let us return to collaboration. Waze stands out as one of the best navigation platforms as, in addition to the automated processes that return automatic readings of reality (via that Internet of Things that enables various smartphones, traffic lights and other emitters / receptors to mutually communicate), this platform has proven able to establish a community that collaborates to obtain levels of information not otherwise accessible to those remaining “disconnected”. Whoever has Waze knows how to avoid traffic jams because the community provided the information in a collaborative fashion about such incidents, adding further information to that already provided by the interconnected devices. Humans that mutually collaborate among themselves and among machines (which also communicate among themselves) to optimise decisions (such as how to avoid traffic jams). In the case of platforms that interconnect various different companies buying and selling goods and services in a market, this type of collaboration extends still further. The data collected and communicated (information), may then be combined with analysis and recommendations (intelligence) and experience and methods/implementation tools (transformation). A basic example of the benefits of collaboration within service provision platforms are the starred rankings provided by users of these same services (for example: Uber), with the same correspondingly applying to the sale of products (for example: Amazon). We might easily provide further examples but, in summary, we would simply recall what managers may be losing when thinking overly “inside-the-box” and not making recourse to B2B platforms: knowledge and digitalisation. Knowledge reflects especially on the insights into: i) which are the best and worst companies (curatorship), ii) what the best companies are doing (innovation), iii) what are the prevailing business opportunities (marketplace), and iv) the best specialists in a specific sector or field of knowledge (consultancy). Digitalisation conveys the capacity to centralise through software a set of activities that display the facets typical of the digital world: instantaneity, perfection and free of any charge: • Instantaneity: the capacity to communicate 123


ECONOMIA

de mercado e conhecimento ... • Gratuitidade: ... “all-you-can-eat” para um certo pacote de subscrição ou preço. Os gestores que pensam “inside-the-box” não conseguem visualizar qualquer problema no mundo pré-Uber: um táxi que queima tempo e combustível enquanto procura um cliente... e um “cliente” que queima tempo à espera que um táxi passe. Do mesmo modo, estes gestores mais clássicos na sua forma de estar e de pensar não fazem as contas à... • Falta de instantaneidade: mails, mensagens, viagens, sempre com muita azáfama, para ir recebendo informação de uma série de pessoas e para comunicar informação a uma série de pessoas. É certo que quando existe a necessidade de comprar algo se recorre às velhinhas plataformas de contratação. Mas antes da contratação há um conjunto de informações cruciais para a vida da empresa que podem (e devem) ser igualmente trocadas via plataformas. • Falta de perfeição: novamente, excepto para os templates das plataformas de compras, raramente se seguem guiões de melhores práticas para, por exemplo, partilhar com potenciais clientes dados sobre a reputação de uma empresa (normalmente veiculada através de apresentações desactualizadas durante reuniões) ou sobre os benefícios concretos de certas ofertas (deixados ao livre arbítrio dos comerciais). • alta de gratuitidade: os gestores clássicos acabam por ter custos de captação de informação muito mais altos, já que dependem de muitas interacções para obter e partilhar um certo volume de informação. “Thinking inside de box”? Pode ser... Mas é mais lento, mais caro e não oferece garantias de que sejam seguidas as melhores práticas de mercado. l 124

online with all participants... • Perfection: keeping up with the best standards and knowledge in the market... • Free of charge: “all-you-can-eat” through a subscription package or for a particular price. Managers that think “inside-the-box” are unable to visualise any problem in the pre-Uber world: a taxi that burns time and fuel while seeking a client... and the “client” who burns time waiting for a taxi to go past. In a similar fashion, managers retaining a more classical stance in their way of being and thinking are also not taking into consideration... • The lack of instantaneity: mails, messages, travelling, always in a great rush, to gather information from a series of persons while also communicating information to a series of persons. Certainly, whenever there is a need to purchase something, there is recourse to the old-school procurement platforms. However, prior to contracting, there is a set of key information to the livelihoods of companies that can (and should) also be exchanged via platforms. • The lack of perfection: once again, except for the procurement platform templates, the guides to best practice rarely get followed, for example, sharing data about a company’s reputation with potential clients (normally conveyed through outdated presentations during meetings) or about the specific benefits of certain suppliers (left to free commercial arbitration). • The lack of free of charge: classical managers end up incurring far higher information costs given they still depend on many interactions in order to gain and share a particular volume of information. “Thinking inside the box”? It can be done... But it is far slower, more expensive and does not provide the guarantees of keeping up with the best practices ongoing in a market. l


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ECONOMIA

DAVID LOPES, GESTOR E PRESIDENTE DA AEON TOP VALU – JAPÃO MANAGER AND PRESIDENT OF AEON TOP VALU – JAPAN

ASAS DE BORBOLETA B U T T E R F LY W I N G S

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metáfora foi recriada pelo meteorologista Edward Lorenz, professor do Instituto de Tecnologia Meteorológica de Massachusetts, para explicar que é impossível prever fenómenos atmosféricos com muitos dias de antecedência, quando evocou, uma expressão da nossa cultura popular que diz que o bater de asas de uma borboleta, num ponto do mundo, pode criar um tufão do outro lado do mundo. Vivemos hoje, e de certa forma viveremos para sempre, dependentes dos voos dessas borboletas que silenciosamente alteram profundamente o curso da nossa história. As alterações climáticas, as catástrofes naturais (ligadas ou não a intervenção do homem no meio ambiente), as pandemias, são crises com as quais teremos que aprender a viver para sempre. Também por isso, mais do que nunca, o investimento na ciência surge como incontornável para nos ajudar a reduzir o impacto negativo dessas crises na nossa vida e no planeta. No passado mês de Outubro, a Academia Sueca de Ciências concedeu o Prémio Nobel da Economia a três economistas (David Card – Canada, Joshua Angrist – USA e a Guido Imbens – Holanda ). David Card foi reconhecido pela sua contribuição empírica no campo da Economia do trabalho (sobretudo na análise profunda sobre a temática dos salários mínimos) e Angrist e Imbens surpreenderam o mundo académico das ciências sociais com os modelos que desenvolveram de análise metodológica de relações causais. Como pode a educação de uma pessoa influenciar o seu salário no futuro? Como pode a imigração afectar os níveis salariais e de emprego? Que efeito terá na sociedade o apoio financeiro na educação de jovens pobres e carenciados? Angrist e Imbens provam que muitas das questões da nossa sociedade podem ser mais bem entendidas e respondidas analisando e avaliando o que resulta para determinados indivíduos e grupos sociais da aplicação

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he metaphor was recently recreated by the meteorologist Edward Lorenz, professor at the Massachusetts Institute of Meteorological Technology, to explain how it is impossible to predict atmospheric conditions with many days of advance and, to convey this, evoking an expression from popular culture that states when a butterfly flaps its wings in one part of the world, it may create a typhoon on the other side of the planet. We live today, and to a greater or lesser extent as we shall always have to live, dependent on the flights of these butterflies that silently bring about profound changes to the path of our history. Climate changes, natural catastrophes (whether or not connected with man’s intervention in the environment), the pandemics are all crises with which we shall have to learn to live with now and into the future. For this reason, and clearly more than ever, investment in science emerges as essential to helping us reduce the negative impacts of these crises on our lives and on the planet. Last October, the Swedish Academy of Science awarded the Nobel Prize for Economics to three academics (David Card – Canada, Joshua Angrist – USA and Guido Imbens – Netherlands). David Card was recognised for his empirical contribution to the field of labour economics (especially for the depth of his analysis on the effects of minimum wages) and Angrist and Imbens innovated the academic world of the social sciences with their models that advanced methodological analysis of causal relationships. How might the education of individuals influence their future earnings? How might immigration impact on wage and employment levels? What effect on society would financial support for poor and needy young persons have? Angrist and Imbens demonstrate how many of the questions of our current society may be better understood and dealt with through analysing and evaluating what works for specific individuals and


ECONOMICS de políticas ou medidas públicas específicas. Confrontados com um verdadeiro “lago de dados” é fácil imaginar alguém a interpretar e a manipular dados, permitindo-se a conclusões que assimilados por decisores políticos e líderes empresariais e quando comunicados sem filtro pelos media, tornam-se a base de decisões que nos conduzem, demasiadas vezes, a olhar para o lado errado da solução. Muito ao jeito de “se torturarmos os números o suficiente, eles acabarão por confessar”. Angrist e Imbens representam assim o que muitos chamam uma “revolução de credibilidade”, usando os chamados ‘natural experiments’ e trazendo para área da avaliação científica as medidas políticas e sociais. Quando penso nisso, lembro-me sempre de uma das maiores lacunas que Portugal comete, na sua mais do que prolixa, área legislativa ao não avaliar sistematicamente as medidas e as leis que o Estado implementa. Esta avaliação, aliás prevista e exigida pela própria lei, é olimpicamente ignorada, de forma generalizada pelo vários níveis e entidades que representam o Estado Português. Se na vida de cada um de nós e da maioria das empresas bem geridas não sobrevivemos sem a avaliação e reflexão das medidas que tomamos, como é possível imaginar que os nossos recursos comuns (por definição escassos), os impostos, o investimento público, as reformas sociais, não sejam escrutinadas profundamente , permitindo-nos assim discutir factos e resultados, servindo o bem comum e o nosso futuro , sem matizes ideológicas e preconceitos. Entretanto o vento que soprou, vindo das borboletas que iniciaram o seu voo no Oriente, aliado ao acentuar das consequências das alterações climáticas continuam a trazer-nos dados que nos devem manter muito despertos, para não dizer acordados durante a noite. Não é estranho que de forma generalizada em todo o mundo os preços dos produtos essenciais estejam a subir. Os preços dos fretes marítimos e a falta de contentores, fez disparar os custos logísticos. Os produtos com menos valor acrescentados, serão de forma garantida, os mais afectados, tornando a vida dos mais carenciados, ainda mais difícil, pois são nestas categorias de produtos e matérias-primas onde se concentram os bens essenciais. Um cenário de inflação moderada está já a ser vivido, podendo contribuir para um abrandamento na criação de emprego, o que teria implicações nos valores da retoma e do crescimento. Todos os anos muitas colheitas de matérias-primas são afectadas por questões climáticas (secas extrema ou pluviosidade excessiva ou fora de época). Também neste final de ano, produtos como o trigo, o milho, a soja e outras oleaginosas, apresentam preços significativamente mais altos do que há um ano atrás. Mas este efeito também se sente de forma muita aguda na área não alimentar, onde a escassez dos semicondutores, o aumento dos preços dos plásticos, dos alumínios e do cartão, não deixam qualquer dúvida que continuaremos a assistir a uma subida generalizada de preços que tenderá a ser atenuada por algum esmagamento de margens (por produtores, grossistas e retalhistas), mas que perdurando no tempo pode conduzir a um aumento “permanente” de muitos produtos essenciais, agravada pela crise/ escassez de mão de obra especializada e não especializada. Usando a terminologia meteorológica, ficaremos por uma tempestade ou evoluiremos para um furacão? l

social groups in terms of applying specific public policy measures. Confronted with a veritable “sea of data”, it is easy to imagine somebody interpreting and manipulating the data, enabling the conclusions to be then assimilated by political decision-makers and business leaders and, when communicated without any filter by the media, they become realities underpinning the decisions guided, all too frequently, by a perspective on the wrong side of the solution. This very much aligns with “if we torture the numbers sufficiently, they’ll end up confessing”. Angrist and Imbens therefore represent what many have termed a “revolution in credibility”, through deploying what are termed ‘natural experiments’ and submitting these to scientific analysis along with their respective political and social policy measures. When I think of this, I always recall how one of the biggest shortcomings Portugal commits in its more than abundant legislative scope is not systematically evaluating the measures and laws that the state implements. This evaluation, indeed provided for and demanded by the law itself, gets ignored on an Olympian scale and generalised across the various levels and entities that represent the Portuguese state. If in the life of each one of and the overwhelming majority of well-managed businesses, we are unable to survive without evaluating and reflecting on the measures that we take, how might we imagine our common resources (scarce by definition), taxes, public investment, social reforms not being subject to profound inspection and scrutiny to thereby enable a discussion of the facts and results, serving the common good and our own future beyond the scope of ideological alignments and preconceived ideas. Meanwhile, the winds are picking up, arriving from the butterflies starting out on their flights in the Far East, allied with the heightened consequences of climate change that continue to return data that should hold our attention where not keep us awake at night. It is hardly surprising that the prices of essential goods are rising in a generalised fashion across the world. Maritime freight rates are rising coupled with a lack of containers driving higher logistics costs. Products with less added value will more certainly be the most affected and thus rendering the lives of the most needy still more difficult as these categories of products and raw materials concentrate the essential goods. A scenario of moderate inflation is already being experienced, potentially contributing to a slowdown in job creation that will bear implications for the rates of recovery and growth. Every year many harvests of raw materials are afflicted by climatic issues (extreme drought and excessive or unseasonal rains). As this year draws to a close, products such as wheat, maize, soya and other beans are obtaining significantly higher prices than twelve months ago. But these effects are emerging far more sharply in the non-foodstuffs where the shortage of semiconductors , the rise in the price for plastics and cardboard leave no doubt that we are continuing to witness a generalised rise in prices that shall be partially offset by some tightening of margins (by producers, wholesalers and retailers) but, if persisting over time, may lead to a “permanent” increase in essential products, worsened by the crisis/shortage in both specialist and unskilled labour. To remain with the meteorological terminology, are we facing the onset of a storm or shall this evolve into a hurricane? l 127


ECONOMIA

JOSÉ THEOTÓNIO, CEO GRUPO PESTANA PESTANA GROUP CEO

TURISMO, O MOTOR DA

ECONOMIA PORTUGUESA TOURISM, THE MOTOR OF THE PORTUGUESE ECONOMY

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setor do Turismo foi indiscutivelmente o motor da economia que permitiu a Portugal recuperar da crise económico e financeira de 2008 a 2012. Com a recente pandemia todo o setor parou. Foram 18 meses praticamente sem qualquer atividade. Houve apenas uma janela que permitiu alguma atividade entre meados de julho e outubro de 2020. A recuperação iniciou-se em junho deste ano. No entretanto levantaram-se centenas de vozes (umas mais famosas que outras e algumas outras melhor fundamentadas do que o simples linguarejar) de que temos turismo a mais, não podemos viver com uma economia de “monoproduto”, e importa é desenvolver e apostar em outros setores, designadamente industriais. Que fique claro, não temos nada contra o desenvolvimento de outros setores de atividade. Antes pelo contrário. Mas o que temos não é uma indústria turística forte de mais, o nosso mal é não haver outros setores ou fileiras com o mesmo nível de desenvolvimento e a mesma competitividade internacional. Sejamos claros, o Turismo em Portugal desenvolveu-se porque temos vantagens competitivas naturais para esta 128

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he tourism sector was undoubtedly the economic driver that enabled Portugal to recover from the economic and financial recession of 2008 to 2012. The recent pandemic brought the entire sector to a halt. There were 18 months practically without any ongoing activity. There was only a window enabling some activities between July and October 2020 with the recovery beginning to emerge in June of last year. Meanwhile, hundreds of voices have been raised (some more famous than others and others with better justification than simple vocal complaining) to say there is too much tourism and that we cannot live with a “mono-product” economy and what matters is developing and investing in other sectors, specifically industry. Let it be clear: we have nothing against the development of other sectors of activity. Quite the contrary. However, what we do currently have is not an overly strong tourism industry, our shortcoming is not having other sectors or subsectors with the same level of development and even international competitiveness. Let us be equally clear, tourism in Portugal advanced because we have natural competitive advantages for this activity. We have a population that grasps the importance of this sector and hence have specialised and gone professional without becoming “servile” in the provision of hotel services (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


ECONOMICS atividade, temos uma população que percebe a importância do setor e por isso se especializou e é profissional, sem ser “servil”, na prestação dos serviços hoteleiros (o famoso “sabemos receber bem”) e temos empresas que sabem da indústria, são resilientes, compreendem o setor e são internacionalmente competitivas. Por isso desprezar o Turismo, como aconteceu no “famoso” PRR- Plano de Recuperação e Resiliência, é um erro. É inegável que os programas de apoio ao emprego, desde o ‘lay-off’ simplificado até ao apoio extraordinário à retoma, e as moratórias, foram medidas muito importantes para quem a elas conseguiu aceder para, por um lado, manter o emprego, e por outro, preservar a liquidez mínima necessária à sobrevivência das empresas. No entanto, o sistema de acesso e a libertação de fundos, apesar do esforço quer do lado empresarial quer dos funcionários do estado responsáveis pelo processo burocrático, foi lento ou impediu mesmo o acesso a esses apoios. Assim, muitas das empresas, em especial, as de menor dimensão e com menor estrutura administrativa e contabilística não conseguiram aceder aos apoios existentes ou só os obtiveram em parte e muito depois das reais necessidades. Outro aspeto importante seria comparar os apoios disponibilizados em Portugal em cotejo com o que outras economias mais fortes disponibilizaram. Países houve onde se financiou custos fixos para todas as empresas e sem limite do programa Apoiar, se financiaram margens perdidas, e se baixaram de forma muito significativa impostos e taxas equivalentes aos nossos IVA, IMI ou TSU. Agora que vamos sair da crise, voltaremos todos a competir uns com os outros, designadamente nos setores mais globalizados, mas há empresas de alguns países, dentro do mercado comum, que estarão em muito melhor situação do que as portuguesas, e desta vez não é por falta de capacidade de gestão (como os empresários portugueses muitas vezes são acusados), mas por terem tido medidas para ultrapassar a crise pandémica melhores do que as suas concorrentes portuguesas. A recuperação do setor não tem sido homogénea entre os diferentes destinos, nem nos diferentes segmentos. O lazer recupera a uma velocidade muito superior ao corporativo, e o lazer de sol e praia e o do interior ou em espaço rural tem tido também maior incremento que o lazer urbano. A recuperação assentou sobretudo no mercado interno e nos mercados de proximidade. O turista que começou a viajar de avião é dos segmentos mais jovens e de países de origem diferentes dos que habitualmente nos visitavam (o turismo alemão, por exemplo, praticamente ainda não recomeçou), o que não é necessariamente mau, dado que podemos ter a oportunidade de diversificar mercados. A incógnita é saber se esta recuperação é sustentada ou se assistiremos a uma regressão, como em outubro do ano passado, que vá provocar uma redução da atividade para além da que é natural pela sazonalidade. Por enquanto, os sinais são animadores, setembro e outubro perspetivam-se com desempenhos positivos

(the famous “we know how to welcome well”) and we have companies that know their industry, are resilient, grasp the sector and are internationally competitive. Hence, to downplay tourism, as has happened in the “famous” PRR – the Recovery and Resilience Plan, constitutes an error. It is undeniable that the employment support programs, from the simplified lay-off scheme through to the extraordinary support for recovery and the moratorium in effect, were highly important to those who were able to access them on the one hand to maintain employment and to preserve the minimum level of liquidity necessary to company survival on the other hand. However, the fund access and distribution system, despite the efforts made both by the business community and by the state employees responsible for the bureaucratic process, was slow when not even blocking access to these supports. Therefore, many companies, especially smaller scale firms with smaller administrative and accountancy structures, were unable to access the supports existing or only obtained partial funding and far below their real needs. Another important aspect is to compare the support made available in Portugal with that made available in other stronger economies. In such countries, there was financing for the fixed costs of all companies without any limit on the support program as well as financing lost margins and with very significant reductions in taxation and levies equivalent to our VAT, IMI property tax and TSU social security charges. Now that we are emerging from the crisis, we shall all again be competing with each other, especially in the most globalised sectors. However, there are companies in some countries, inside the single market, that shall be in a much better situation than their Portuguese counterparts and not this time due to their lack of management capacity (as some Portuguese managers are so frequently accused) but rather because they were subject to better measures to overcome the pandemic than those applied to their Portuguese competitors. The recovery of the sector has not been homogeneous across the different destinations nor for the different segments. Leisure is recovering at a far faster speed than the business sector and the sun and beach and the interior or rural leisure sectors have also experienced faster rises than their urban peers. This recovery has been driven above all by the domestic market and other close markets. The tourists that have again begun travelling by air are from the younger segments and from countries with different origins to those that normally visit us (German tourism, for example, has practically not started), which is not necessarily negative given we have gained the opportunity to diversify our source markets. The unknown aspect is whether this recovery is sustainable or if we are witnessing a regression, similar to October of last year, which is going to trigger a reduction in turnover beyond that which normally happens due to the seasonal factor. For the meantime, the signs are looking good with September and October expected to turn in positive performances in 129


ECONOMIA

“O LAZER RECUPERA A UMA V E LO C I DA D E M U I TO S U P E R I O R AO C O R P O R AT I V O , E O LAZER DE SOL E PRAIA E O D O I N T E R I O R O U E M E S PAÇ O R U R A L T E M T I D O TA M B É M MAIOR INCREMENTO QUE O L A Z E R U R B A N O .” nos destinos que recuperaram primeiro e o ritmo de reservas tem aumentado nos que estavam mais atrasados. Quando falamos em resultados positivos, não falamos nos resultados dos anos dourados do triénio 2017 a 2019, mas quando conseguimos atingir pelo menos metade desses anos e vimos de 18 meses de uma paragem, praticamente total, da atividade, a nossa atitude tem de ser positiva: “olhar para a parte do copo que está meio cheia”. O início da recuperação vai, no entanto, depender de múltiplas questões, fora a da evolução da pandemia, cuja qualidade da resposta que formos capazes de dar pode permitir a sustentação do desenvolvimento do setor turístico nos diferentes destinos. Para além dos dois “velhos” grandes constrangimentos que o Turismo tinha pré-pandemia: congestionamento do aeroporto de Lisboa (no atual estado do processo não teremos novo aeroporto nos próximos 5 anos e há quem diga se a opção vier a cair sobre Alcochete que serão 10 anos) e falta de pessoal qualificado para trabalhar no setor do turismo (há unidades que ainda não abriram por falta de pessoal), há que juntar as alterações que o modelo de negócio irá sofrer pelos problemas que alguns dos grandes ‘players’ do setor estão a sofrer, designadamente no transporte aéreo, em que a nossa TAP é um exemplo, e nos operadores turísticos. Esperam-nos assim tempos desafiantes e que necessitam de empresas com capacidade de investimento e atração de talento para a transformação orgânica que têm necessariamente de fazer. Esta transformação deverá ocorrer a três níveis: 1 – transformações no modelo de negócio na comercialização e distribuição, para que não fiquem totalmente dependentes de outros operadores do setor; 2 – transformação digital para poderem ser mais eficientes em todos processos internos e 3 – transformação para operações sustentáveis, porque o tema da sustentabilidade veio para ficar e será um dos principais ‘drivers’ económicos e, em particular, do setor turístico. Desafios enormes para as empresas turísticas, que apesar de virem de uma situação económica delicada, não podem perder a batalha da competitividade. l

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those destinations that recovered early and the pace of reservations has risen among those that were lagging. When we talk about positive results, we are not referring to those of the golden years during the 2017 to 2019 triennial but rather when we able to achieve at least half of these years and when, after having seen in the last 18 months a practically total halt in activities, our attitude has to be positive: “looking at the glass as though half-full”. The beginning of any recovery, however, depends on multiple issues beyond the evolution of the pandemic with the quality of the response that we are able to provide enabling the sustainability of the tourism sector development across the different destinations. In addition to the two “longstanding” major restrictions that this sector experienced prior to the pandemic: congestion at Lisbon airport (with the current state of affairs, there will be no new airport within the next five years and there are those who say should the option turn out to be Alcochete, this period expands to 10 years) and the lack of qualified staff to work in the tourism sector (some units have not opened due to the lack of staff), there is the need to add on the changes that the business model is going through due to the problems that some of the main ‘players’ in the sector are experiencing, especially in air transport, with the Portuguese flag carrier TAP one example, and in tourism operators. Hence, we may expect challenging times that need companies with the capacity for investment and the attraction of talent for the organic transformation that must necessarily take place. This transformation needs to span three levels: 1 – transformation in the business models for retail and distribution so that they are not left totally dependent on other operators in the sector; 2 – the digital transformation so that we may become more efficient in all internal processes, and 3 – transformation into sustainable operations because the theme of sustainability has come to stay and shall be one of the key economic drivers and especially in the tourism sector. Enormous challenges await tourism companies which, despite emerging out of a delicate economic situation, cannot lose this ongoing battle for competitiveness. l

“ L E I S U R E I S R E C O V E R I N G AT A FAR FASTER SPEED THAN THE BUSINESS SECTOR AND THE SUN AND BEACH AND THE INTERIOR OR RURAL L E I S U R E S E C T O R S H AV E A L S O EXPERIENCED FASTER RISES T H A N T H E I R U R B A N P E E R S .”


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JORNALISMO LIVRE E INDEPENDENTE

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ECONOMIA

JOÃO RODRIGUES PENA, FOUNDER & MANAGING PARTNER DA ARBORIS FOUNDER & MANAGING PARTNER AT ARBORIS

E AGORA, QUEM VEM TOMAR

CONTA DO NEGÓCIO? W H AT N O W ? W H O I S G O I N G T O TA K E C H A R G E O F T H E B U S I N E S S ?

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oy Logan construiu um império bilionário em telecomunicações e media. Está na casa dos setenta e acha que chegou a altura de se reformar. Tem quatro filhos, todos na casa dos quarenta anos e todos com a ambição de lhe suceder. Ambição que ele alimenta de forma sórdida prometendo a cada um, em diferentes momentos, que é ele (ou ela, a filha) o escolhido. Abre-se uma guerra entre todos, agravada por Roy nunca deixar de se manter à frente da gestão executiva do seu Grupo e tomar todas as decisões sozinho. Em contraste com uma vida de grande opulência, a segunda geração da Família Logan acaba por se resumir a um conjunto de personalidades frustradas, perdidas e altamente disfuncionais, sem as condições mínimas para assumir o lugar do Pai. Roy parece retirar um tremendo gozo colocando os filhos uns contra os outros, mas entende-se que no fundo ele sabe que falhou em garantir a preservação do seu império – simplesmente porque foi incapaz de escolher e preparar um sucessor à altura. Roy e a sua família são os protagonistas da série da HBO “Succession”. Não obstante o enredo assentar em larga medida num ‘script’ notável e na riqueza da disfuncionalidade de cada personagem e não obstante estarmos a falar de uma série de ficção, o autor escolheu um tema que acaba por colocar a nu o maior de todos os riscos de qualquer grupo de raiz familiar: uma Sucessão falhada. Ao longo de décadas de estudo da dinâmica de grupos de raiz familiar e de assessorar, ao mais alto nível, vários grupos familiares de dimensão, fomos testemunhando, através de vários sucessos, mas também um número invulgar de fracassos, alguns bem conhecidos, a importância da gestão do processo de Sucessão do líder. Ainda hoje, na maioria dos casos, não há ideias claras, mas antes falsas certezas, angústia e sobretudo muitas perguntas sem resposta – quem tenho com potencial na geração seguinte e como devo prepará-lo ou prepará-los? Quando e de que forma os devo entusiasmar e preparar para serem candidatos motivados quando a altura de agarrar o leme

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oy Logan built up a multi-billion empire in telecommunications and the media. He’s in his seventies and thought it was about time to retire. He has four children; all in their forties and all with the ambition to take over from him. Such ambitions that he has nurtured in a somewhat perverse fashion with promises made to each child at different times that he (or she in the daughter’s case) would be the chosen one. The conflict ongoing among them all is only worsened by Roy not quitting and remaining as the head of the group executive management team and taking all the decisions alone. In contrast with a life of great opulence, the second generation of the Logan family instead boils down to a set of frustrated individuals, lost and highly dysfunctional, without the minimal conditions to take over from their father. Roy seems to gain enormous pleasures from pitting his children against each other but also understands that, in sum, he has also failed in guaranteeing the preservation of his empire – simply because he was unable to choose and prepare a successor at the right time. Roy and his family are the stars in the HBO series “Succession”. Irrespective of the plot being largely based on a well-written script and the depth of dysfunctionality of each character and in addition to referring to a fictional television series, this picks up on a theme that conveys the naked reality that the greatest risk to any family based group is a failed succession. Throughout decades of study of the dynamics of family owned groups and consultancy at the highest level to various large-scale family groups, we have witnessed various successful successions but also an unusual number of failures, some well-known and demonstrating the importance of managing the leadership succession process. Still today, in the majority of cases there are no clear ideas but rather false certainties, worries and above all more questions than there are answers – who do I have with potential in the following generation and how should I prepare him/her or them? When and how should I show enthusiasm and prepare candidates motivated for the time when it becomes necessary to take over at the helm? And how should I manage the transition? And how to involve my family shareholder colleagues (when the case) to keep them on my side throughout this (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


ECONOMICS chegar? E como devo gerir a transição? E como envolver os meus colegas acionistas da Família (se for o caso) para os ter ao meu lado neste processo? Devo abrir a oportunidade a membros da Família ‘non-bloodline’ – um enteado, uma cunhada ...? E se não tenho ninguém com potencial na Família ou eu quero deixar o lugar de CEO e ainda são muito novos, em que condições posso fazer passar o Grupo com sucesso por uma fase de transição com um CEO profissional? E que perfil e características deve ter esse CEO, tenho alguém com condições já no Grupo ou tenho de o ir buscar fora? A realidade é dura – em Portugal como noutros países, há demasiados processos de sucessão que não são bem preparados nem bem geridos. E o falhanço pode ter resultados graves – todos recordamos casos de grupos nacionais em que o líder escolhe como sucessor um filho que não está à altura para depois, já com o negócio a sofrer, afastar esse filho e passar o leme a um outro filho, um sobrinho ou um neto. Isto não é fácil para nenhum líder. Muito menos quando se trata do seu filho ... Em larga medida estas situações são evitáveis, mas exigem dedicação, disciplina e perseverança - o líder e a Família têm de passar a encarar a Sucessão como um tema vital para o Grupo, têm de definir soluções potenciais com bastante antecedência (pelo menos 10 anos) e têm de colocar em marcha e gerir ao detalhe ao longo de todo esse tempo os processos de comunicação, de preparação e, já no final, de transição da liderança. São processos difíceis e delicados, mas facilitados pela assessoria de personalidades externas de confiança dos Acionistas e com experiência nesta matéria. Este apoio de fora reforça o ‘momentum’ e a segurança do processo e aporta uma visão externa profissional e independente que pode ser crucial em vários momentos - no ‘assessment‘ de potenciais candidatos internos, no aconselhamento de programas de preparação de carreira para os candidatos ou simplesmente em garantir que a discussão no seio da Família permanece objetiva, o que é por si só um desafio tremendo quando estamos a colocar lado a lado filhos ou filhas com pais acionistas. Na prática, um bom processo de Sucessão para candidatos internos parte de um programa bem definido no tempo e consensualizado no seio da base acionista familiar, da identificação e ‘assessment’ de potenciais candidatos, de estágios no Grupo com bons mentores, de uma educação universitária ao mais alto nível possível e de um plano de carreira construído fora do Grupo em empresas de referência mundial em domínios relevantes para o Grupo. Segue-se uma etapa de carreira no Grupo já em posições executivas e, caso as provas dadas ao longo da carreira sejam convincentes, iniciar o ‘coaching’ prévio à fase de transição – que pode naturalmente demorar anos. É um fato assumido que, em Portugal como na generalidade do mundo ocidental, os grupos de raiz familiar com dimensão são o principal pilar da Economia. Se o êxito de qualquer empresa passa pela qualidade da sua liderança (visão, gestão de risco, capacidade de mobilização ...), a Sucessão passa a ser um fator determinante para o crescimento económico do País e tudo deve ser feito para que este assunto seja levado muito a sério assegurando programas atempados, rigorosos, detalhados e perseguidos com tenacidade até ao momento de transição. Por egocentrismo e até narcisismo, Roy Logan nunca se preocupou com o dia em que já não estivesse em condições de gerir o seu negócio. A série ainda não acabou (a 3ª temporada estreia em breve) mas não é difícil adivinhar que nem a Família nem o Negócio vão acabar bem. l

process? Should I open the door to ‘non-bloodline’ members of the family – a son-in-law, a sister-in-law...? And should I not have anybody with potential in the family or members who I want to make the next CEO but who are still very young, in what conditions may I successfully hand over the group for a transition phase under a professional CEO? And just what profile and characteristics should this CEO have? Do I have anybody with such characteristics already in the group or do I have to search externally? The reality is harsh – in Portugal and in other countries, there are too many succession processes that are neither well-prepared nor wellmanaged. Furthermore, any failure may have serious results – we may all recall national groups in which the leader chose a son as a successor who was not up to the challenge to then act, with the business already suffering, to remove that son and appoint another son, nephew or grandchild. This is no easy task for any leader and far less so when dealing with their own children... To a large extent, these situations are avoidable but they demand dedication, discipline and perseverance – the family head has to perceive succession as a vital issue for the group, defining potential solutions with plenty of foresight (at least ten years) and having to set in motion and manage in detail all of the communications and preparation processes throughout these many years before, right at the end, carrying out the leadership transition. These are difficult and delicate processes better facilitated by consulting from specialists external to the trust of the shareholders and with experience in this field. This external support strengthens the ‘momentum’ and the security of the process and applies an external, professional and independent vision that may prove crucial at various stages – when evaluating the potential internal candidates, advising on career preparation programs for the candidates or simply guaranteeing that the discussion ongoing within the family remains objective, which is, in itself, a tremendous challenge when we are placing sons and daughters side by side with shareholder parents. In practice, a good succession process for internal candidates departs from a program defined in due time and attaining consensual agreement across the core of family shareholders, with the identification and evaluation of potential candidates, group internships under good mentors, university education at the highest possible level and a career plan built up outside the group at leading global benchmark companies in areas of relevance to the group. This is followed by a career stage in the group in an executive position and, should the evidence given over the course of this process prove convincing, beginning the coaching prior to the actual transition phase – which may naturally last years. It is a fact that in Portugal and throughout much of the western world, large scale family owned groups make up the backbone of the economy. While the success of any company depends on the quality of its leadership (vision, risk management, capacity for motivation...), succession may be a determinant factor for national economic growth and everything possible should be done to ensure this subject acquires a higher profile reflected in timely, thorough and detailed programs persistently followed through to the moment of transition. Out of egocentrism and even narcissism, Roy Logan never bothered about the day when he would not be in a position to manage his business. The series has not yet ended (the third season is due to premiere soon) but it is hardly difficult to foresee that neither the family nor the business are going to have a happy ending. l 133


THE ECONOMIST

NATURAL-GAS SHORTAGES THREATEN GOVERNMENTS’ GREEN GOALS T H E E N E R G Y T R A N S I T I O N M U S T B E B E T T E R M A N A G E D O R E N V I R O N M E N TA L I S M WILL BECOME UNPOPULAR.

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THE ECONOMIST

© T H E E C O N O M I S T N E W S PA P E R L I M I T E D, LO N D O N , 2 5 T H A P R I L 2 0 2 1

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et another crucial global market has gone from glut to shortage at breakneck speed. Last September in Europe it cost €119 ($139) to buy enough gas to heat the average home for a year and the continent’s gasstorage facilities were brimming. Today it costs €738 and stocks are scarce. Even America, which has an abundance of shale gas, has seen prices more than double–albeit from a much lower level– and could see further increases if its winter is a cold one. The shortage has many causes. A cold European spring and a hot Asian summer boosted energy demand. Rebounding industrial production has lifted the global appetite for liquefied natural gas (lng). Russia has been piping less gas into European stockpiles. Hawks suspect it of trying to spook the market and ensure its new Nord Stream 2 pipeline is approved. But it has also faced disruptions, including a fire at a processing plant in Siberia. Gas has been plugging gaps in power production from other sources. The wind did not blow much in Europe this summer, while droughts interfered with hydropower output. The rising price of the permits needed to emit carbon in the eu has made coal expensive. So there is little alternative to burning gas for electricity as well as for heating homes. Whereas the world economy’s other bottlenecks– for container ships and microchips–have unleashed a capital-expenditure boom, investment in fossil fuels is in long-term decline. American shale can help only so much, because gas markets are imperfectly linked via lng. High prices, when they strike, will serve mainly to ration limited supply. But it takes big price movements to curb demand. If the coming months are chilly, Europe’s energy may have to become extremely expensive to persuade firms and households to use less.

Sorting this out requires accurately diagnosing what has gone wrong. Governments have not made enough allowance for the intermittency of renewable energy. The world has too little nuclear power–a low-carbon energy source that is always on. Interventions and subsidies for gas will only make things worse. Expensive energy angers voters and hurts the poor. But subsidising energy in a squeeze, as Italy is doing, or capping prices, as Britain does, will exacerbate shortages and make politicians’ commitment to greenery look empty. Governments should use the welfare system to support household incomes if they must, while helping energy markets work efficiently. The long-term challenge is to smooth out volatility as the switch to renewables continues. Eventually cheap battery storage might solve the intermittency problem; right now, more gas storage would help too. In the meantime tweaks to the market could improve things. In Britain many small energy suppliers which offer, say, one-year fixed-priced contracts to consumers, but buy energy at floating rates will soon fail. Getting firms selling at fixed rates to hedge against wholesale price increases should encourage more physical storage of gas. Another idea is to invest more in connecting grids (a link between those of Britain and France recently failed) and in lng infrastructure, so that arbitrage trades can even out disparities in the global supply of energy. Dirty sources of energy should be expensive. But without reliable alternatives, price increases boost inflation, lower living standards and make environmentalism unpopular. If governments do not manage the energy transition more carefully, then today’s crisis will be the first of many that threaten the vital move to a stable climate. l © The Economist Newspaper Limited, London, 25th September 2021 135


DIREITO

INÊS SEQUEIRA MENDES, MANAGING PARTNER DA ABREU ADVOGADOS MANAGING PARTNER OF ABREU ADVOGADOS

E S G : D E P R I O R I DA D E I N A D I ÁV E L A O P O RT U N I DA D E I R R E C U SÁV E L E S G : F R O M U N D E L AYA B L E P R I O R I T Y T O I R R E F U TA B L E O P P O R T U N I T Y

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ntre 2016 e 2020, de acordo com a “Global Sustainable Investment Alliance”, o volume total de investimento das empresas na integração de critérios ESG (ambientais, sociais e de governação) nas respetivas análises financeiras aumentou 143% a nível mundial. Recentemente, a Comissão Europeia realizou a primeira emissão de ‘green bonds’, tendo angariado 12 mil milhões de euros que serão utilizados exclusivamente para investimentos verdes e sustentáveis em toda a UE. Estes dados são impressionantes e ilustram a importância que o ESG adquiriu ao longo da última década e que, previsivelmente, continuará a crescer nos próximos anos. Já não estamos perante uma tendência de futuro, mas na presença de uma realidade que é cada vez mais inevitável. Um dos principais desafios atuais reside na adoção destes critérios pelas empresas sem que que vulnerem a criatividade e a competitividade e possam mesmo potenciá-las. A prioridade conferida à transição climática pelo Mecanismo Europeu de Recuperação e Resiliência, e incluída no PRR nacional, assim como o Relatório do painel intergovernamental das Nações Unidas sobre alterações climáticas são sinais claros do caminho que terá de ser seguido pelo tecido produtivo, assente

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etween 2016 and 2020, according to the “Global Sustainable Investment Alliance”, the total volume of investment in companies integrating the ESG (environment, social and governance) criteria into their respective financial analysis surged by 143% worldwide. Recently, the European Commission carried out the first emission of green bonds and thereby raising 12 billion euros to be applied exclusively to green and sustainable investment projects throughout the EU. These figures are both impressive and illustrate the importance acquired by ESG over the last decade and shall foreseeably continue to grow over the years to come. We are thus not dealing with a future trend but rather in the presence of a reality which is increasingly inevitable. One of the main current challenges stems from how these companies adopt these criteria without undermining their creativity and competitiveness that enables their potential. The priority attributed to the climate transition by the European Mechanism for Recovery and Resilience, and correspondingly including the national plan, as well as the United Nations report from the inter-governmental panel on climate change are clear signs of the path that will have be taken by (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


LAW na promoção de modelos empresariais, de operações e de cadeias de abastecimento mais sustentáveis e de uma outra interação com as partes interessadas na sua atividade (trabalhadores, consumidores e sociedade civil) que não se limite ao universo dos detentores de participações sociais. Este é o momento para as organizações que ainda o não fizeram compreenderem que a mudança está em curso e dificilmente conhecerá inversões de rumo. Novas estratégias de desenvolvimento, como a que é corporizada a nível europeu pelo “Green Deal”, implicam novos desafios e as organizações terão de ser capazes de se adaptar e de encetar as transformações estruturais necessárias para que possam enfrentá-los com sucesso. Qualquer empresa que pretenda continuar a ser inovadora e concorrencial num mercado cada vez mais global terá de fazer esta reflexão e passar dela aos atos com brevidade. Apesar da preocupação crescente das gerações mais novas com as alterações climáticas, existe risco de se ficar a meio da ponte neste processo de transformação assente na descarbonização das economias; oscilando entre exigências irrealistas do poder político e a tentação do “branqueamento ecológico” por parte das empresas, por um lado, e acentuando clivagens geracionais e geográficas, por outro. A ser assim, ninguém sairá vencedor deste esforço coletivo e as maiores perdas tenderão a recair sobre os que sejam social, etária e climaticamente mais vulneráveis. A resposta à pergunta “para onde vamos?” em matéria de ESG pode parecer um exercício complexo de futurologia, mas depende sobretudo das circunstâncias e capacidade de adaptação de cada economia: as fragilidades e a rigidez da portuguesa são conhecidas. Apesar da abertura e do interesse crescentes do tecido empresarial nacional por esta temática e pela adoção dos seus critérios nas respetivas estratégias de curto e médio prazo - para cujo sucesso concorre a transformação digital também paralelamente em curso e que acelerou devido à pandemia – será necessário um esforço de adaptação sério e que não será indolor. Com a responsabilidade de ser a primeira sociedade de advogados em Portugal a publicar um Relatório de Sustentabilidade de acordo com as diretivas da “Global Reporting Initiative”, a divulgar as suas contas e a medir a sua pegada de carbono, a Abreu Advogados está empenhada num conjunto de iniciativas nacionais e internacionais voluntárias destinadas a criar um universo empresarial mais equilibrado, incluindo a “Global Compact” da Organização das Nações Unidas, o Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (BCSD), dispondo da certificação internacional “B Corporation”. Procuramos contribuir pelo exemplo para que o inadiável ESG, mais do que uma inevitabilidade, se constitua em verdadeira oportunidade para todos aqueles com quem trabalhamos. l

the productive sector based on promoting more sustainable business models, operations and chains of supply and another level of interaction with the stakeholders interested in their activities (employees, consumers and civil society), which extends beyond the universe of company shareholders. This is the moment for organisations that have not yet done so to grasp that change is taking place and it is hard to conceive of any U-turn in such a direction. New development strategies, such as those embodied at the European level by the “Green Deal”, imply new challenges and organisations will have to be capable of adapting and completing the necessary structural transformations to deal with them successfully. Any company that seeks to continue being innovative and competitive in increasingly global markets will have to undertake this reflection and move onto actions in the short term. Despite the rising concerns of younger generations over climate change, there is the risk of being left halfway in a transformation process based on the decarbonisation of economies; oscillating between the unreal demands of political power and the attempt to engage in “greenwashing” by companies, on the one hand, and the growing generational and geographic cleavages on the other hand. Hence, should such prevail, nobody will emerge as a winner from this collective effort and the greatest losses shall fall on those who are most vulnerable whether in social, age or climate terms. The answer to the question “where are we going?” on the subject of ESG may appear a complex exercise in futurology but this depends above all on the circumstances and adaptive capacities of each economy: the weaknesses and rigidities in the Portuguese case are well-known. Despite the growing openness and interest of the national business class in this theme and the adoption of the respective short and medium term strategies – for which success competes alongside the digital transformation ongoing in parallel and that has accelerated due to the pandemic – this requires a serious effort to adapt that shall not be without pain. With all the responsibility of being the first Portuguese legal firm to publish a Sustainability Report in keeping with the “Global Reporting Initiative” directives, publishing accounts and measuring the carbon footprint, Abreu Advogados is committed to a set of voluntary national and international initiatives designed to bring about a more balanced business universe, including the United Nations Global Compact, the BCSD – the Business Council for Sustainable Development, and holding the international B Corporation certificate. We also seek to contribute by setting the example that the undelayable ESG, more than just inevitable, constitutes a true opportunity for all of those who we work with. l 137


DIREITO

NUNO AZEVEDO NEVES, DLA PIPER ABBC COUNTRY MANAGING PARTNER

IT’S THE EFFICIENCY OF THE

JUSTICE, STUPID!

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uito se fala em Portugal de “justiça”, ou antes da sua falta ou das suas “incongruências”. Mas muito pouco se fala da “eficiência da justiça”, do que representa a falta de eficiência, e do papel essencial da eficiência da justiça no crescimento económico, e como barómetro essencial na avaliação do nível de maturidade do sistema democrático. A justiça é um dos pilares de qualquer democracia. Mas continua a ser vista pelos políticos e pelos operadores da justiça como uma conquista abstrata, como um local de deleite na eterna discussão da esterilidade dos conceitos. Ou como diria o outro, na certeira jocosidade mais mundana … “falam, falam, falam, mas não os vejo a fazer nada”. Portugal tem sido muito tímido na promoção (e menos ainda na concretização) das necessárias grandes reformas estruturais das instituições, que são absolutamente essenciais para incrementar a nossa produtividade, para promover o nosso crescimento, e para aumentar a nossa convergência com os 138

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here is much talk in Portugal about “justice” or rather its lack or its “incongruences”. However, there is very little talk about the “efficiency of justice”, what the lack of efficiency means and the essential role of justice to economic growth and as a core barometer for evaluating the level of our maturity as a democratic system. Justice is one of the pillars of any democracy. However, this continues to be perceived by politicians and the operators of the justice system as an abstract conquest as if a place of leisure in the eternal discussion on the sterility of concepts. Or as the other might say, in the most mundane of jocularity… “they talk, talk, talk, but I don’t see them doing anything”. Portugal has been extremely timid in promoting (and still more so in implementing) the necessary major structural reforms to the institutions that are absolutely essential to boost our productivity, to foster our growth and to achieve greater convergence with the most developed countries in the European Union. In any mature democratic system, the judicial (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)


LAW países mais desenvolvidos da União Europeia. Em qualquer sistema democrático maduro o sistema judicial é um pilar essencial do crescimento económico. E uma das áreas onde temos sido particularmente tímidos nas necessárias reformas estruturais tem sido na do sistema judicial. Nada acontece por acaso na vida, e não podemos ficar eternamente à espera que milagres resolvam o que exclusivamente de nós depende. Seja no futebol, na economia ou na justiça. Se não tivermos um rumo, um caminho definido, uma visão clara para o sistema de justiça, se não forem estabelecidos objetivos, se não elaborarmos e executarmos uma estratégia objetiva e detalhada, com objetivos quantificáveis, e com uma subsequente análise séria e objetiva de resultados, vamos continuar a aguardar pelo milagre, e a lamuriarnos pela não verificação do milagre salvador. Existem muitos estudos que demonstram o impacto direto da eficiência da justiça em diversos elementos-chave da economia, como seja o investimento direto externo, a dimensão das empresas, a concessão de crédito, a inovação. Surgem agora também alguns estudos que evidenciam que a eficiência do sistema judicial tem um papel essencial no crescimento económico. Ou posto de uma forma mais adequada à nossa realidade, que as ineficiências do sistema judicial constituem uma inequívoca limitação ao nosso crescimento económico. Um sistema judicial pouco eficiente limita a necessária confiança na proteção da propriedade privada, limita a necessária proteção dos investidores e de quem financia a economia e a permite crescer, limita a necessária condenação de quem não cumpre a lei nem os contratos que assinou, limita o necessário suporte ao crescimento das empresas e ao cumprimento por estas das suas obrigações, limita o acesso ao direito e a confiança das pessoas na justiça, limita o estabelecimento de relações económicas essenciais para o desenvolvimento da concorrência e para um ambiente de inovação. Não tenhamos dúvidas de que um sistema judicial pouco eficiente é um obstáculo e um limite ao crescimento económico. A eficiência do sistema de justiça pode ser medida ou avaliada por diversos indicadores, de que se destacam: a morosidade judicial, que mede o tempo necessário para se resolver um processo judicial; o número de novos casos judiciais, que mede a litigância média por determinado número de habitantes; o número de processos pendentes em tribunal, por determinado número de habitantes; a percentagem de processos que o sistema judicial tem capacidade para decidir numa determinada janela temporal. Analisando qualquer dos referidos indicadores em Portugal, e comparando-os com os de outros países da União Europeia, identificamos marcantes e incompreensíveis ineficiências no nosso sistema judicial. Nos últimos 20 anos Portugal tem implementado um

system constitutes an essential pillar for economic growth. And one of the areas where we have most shied away from the necessary structural reforms has been that of the judicial system. Nothing happens by chance in life and we cannot be eternally awaiting miracles to resolve what exclusively depends upon ourselves. Whether in football, in the economy or in justice. If we don’t have a path, a defined route, a clear vision for the justice system, if we do not establish objectives, if we do not draft and implement objectives and detailed strategies, with quantifiable targets and with subsequent serious and objective analysis of the results, we shall remain awaiting that miracle and weeping in sorrow at our own lack of any miraculous saviour. There are many studies demonstrating the direct impact of the efficiency of justice on various core factors of the economy, including foreign direct investment, company size, the concession of credit and innovation. There are now studies emerging that put forward evidence that the efficiency of the judicial system plays an essential role in economic growth. Or, tailored more appropriately to our own reality, the inefficiencies of the judicial system constitute an unequivocal restraint on our economic growth. A poorly efficient judicial system limits the necessary trust in the protection of private property, limits the necessary protection for investors and those who finance the economic and who enable growth, limits the necessary sentencing of those who comply neither with the law nor the contracts that they signed, limits the necessary support for growth of companies and compliance with their obligations, limits access to law and the trust of people in the justice system and also limits the establishing of the economic relationships essential to developing competition and innovative environments. We have no doubts that a poorly efficient judicial system is an obstacle and a limitation on economic growth. The efficiency of the justice system may be measured and evaluated by various different indicators, prominent among which are: the time taken for judicial decisionmaking, which measures the time necessary to resolve judicial cases; the number of judicial cases, which measures the average level of litigation per number of inhabitants; the number of pending cases in courts according to the number of inhabitants; the percentage of processes that the judicial system is able to decide upon within a particular timeframe. In analysing any of the aforementioned indicators for Portugal, and in comparison with other European Union member states, we identify stark and incomprehensible inefficiencies in our judicial system. In the last two decades, Portugal has implemented a substantial number of intended changes to the judicial system. Looking at their effects, we find that such were random changes, marked by the ephemeral nature of such initiatives. And not one has had any impact on the continued Portuguese 139


DIREITO

número material de pretensas mudanças no sistema judicial. Olhando para os efeitos das mesmas verificamos que foram mudanças avulsas, marcadas pela efemeridade das iniciativas. E nenhum impacto tiveram na nossa continuada colocação na cauda da União Europeia no que concerne a eficiência do sistema judicial. À semelhança do que sucede com outras “instituições” do nosso País, só uma revolução da “instituição” da justiça permitirá colocar-nos no caminho da eficiência da justiça. Uma mudança da visão para a justiça, uma mudança do propósito que a justiça tem de servir, uma mudança sobre quem deve o sistema de justiça servir, uma mudança na definição de uma estratégia e de objetivos claros e a longo prazo. Mas uma estratégia que se foque na eficiência, que assuma com coragem objetivos quantificáveis dos indicadores que uma justiça eficiente requer. E é essencial assegurar a execução dessa estratégia de longo prazo, e assegurar a análise objetiva dos resultados. Temos tido algumas oportunidades para promover essa necessária revolução, incluindo no período da Troika, e agora também com o Plano de Restruturação e Resiliência. Com pena reconheço que pouco tem mudado, com a certeza de que não é injetando dinheiro num sistema ineficiente que ele vai passar a ser eficiente. E se continuarmos à espera do milagre, vamos continuar a esperar. O que é lamentável porque o milagre apenas depende de nós. Não me digam que o foco na eficiência é uma visão economicista da nossa justiça, que deve obedecer a princípios mais elevados. Isso mais não é do que “tapar o sol com a peneira” porque um sistema ineficiente protege quem não deveria ser protegido, e apenas revela a falta de maturidade da nossa democracia. Já todos viram que o “rei vai nú”. É tempo de dizer “it’s the efficiency of the justice, stupid!”. l 140

ranking at the bottom of the European Union list as regards the efficiency of judicial systems. Similar to the case for other “institutions” in our country, only an “institutional” revolution in justice will enable us to get on the path to judicial efficiency. A change in the vision on justice, a change in the purpose that justice has to serve, a change as regards just who the justice system should serve, a change in the definition of the strategy and with clear and long term objectives. Furthermore, a strategy that focuses on efficiency and accepts with courage the quantifiable objectives that the indicators of an efficient justice system returns. It is essential to ensure the implementation of this strategy over the long term and bring about the objective analysis of the results. We have had some opportunities to bring about this much needed revolution, including in the period under the Troika and now, once again, under the Restructuring and Resilience Plan. With pity do I recognise that little has changed and with the certainty that it is not injecting money into an inefficient system that is going to make it efficient. And should we continue to await a miracle, we are going to continue waiting. Which is particularly regrettable as the miracle depends only upon ourselves. Do not tell me that the focus on efficiency is an economic view of our justice system that should answer to higher principles. This represents nothing more than “papering over the cracks” because an inefficient system protects those who should not be protected and only reveals the lack of maturity prevailing in our democracy. We have all already seen that “the king is without clothes”. And it is time to state “it’s the efficiency of justice, stupid!”. l


para quem gere pessoas

Tiragem 15.000 exemplares 1,2 Milhões de pageviews médias mensais 187.524 seguidores no LinkedIn 141


CORRESPONDENTES

ANGOLA

RICARDO DAVID LOPES, PRÉMIO

MAIS COESOS MORE COHESIVE

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relação de um Estado com os cidadãos em geral, e os investidores em especial, deve, acima de tudo, ser simples, transparente e previsível. A burocracia em excesso torna mais complexa esta interacção, dificultando a vida aos cidadãos e tendendo a afastar potenciais investidores. A burocracia excessiva, os processos complexos, criam também, com frequência, oportunidades para o surgimento de actos de corrupção. Cientes disso, muitos governos no mundo têm vindo, em momentos e a ritmos diferentes, a pôr em marcha programas para desburocratizar a relação entre as pessoas e as empresas, por um lado, e os Estados, por outro. Angola não é excepção, e tem vindo a implementar medidas e procedimentos que visam reduzir a burocracia, quer aquela que afecta directamente a vida dos cidadãos, quer a que se associa às empresas e aos seus investimentos. Um bom exemplo recente é o SIMPLIFICA 1.0, um programa apresentado em Junho pelo Executivo angolano que pretende simplificar e desburocratizar os serviços públicos, funcionando também, como explicou então o ministro Adão de Almeida, como “um instrumento ao serviço do combate à corrupção” na Administração Pública. A digitalização dos serviços públicos é uma das vertentes do processo de desburocratização preconizado pelo SIMPLIFICA 1.0, também no sentido de reduzir a corrupção e tornar os processos mais ágeis e céleres, e menos onerosos. “O nosso objectivo estratégico de diversificar a economia e incentivar o investimento privado nacional e estrangeiro, ficará seriamente comprometido se não formos capazes de melhorar a nossa capacidade de prestar serviços públicos”, assumiu o ministro de Estado e chefe da 142

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he relationship of the state with citizens in general, and with investors in particular, should above all be simple, transparent and predictable. Excessive bureaucracy makes such interactions more complex, hindering the lives of citizens and tending to discourage potential investors. Excessive bureaucracy and complex processes also frequently lead to opportunities for the occurrence of acts of corruption. Aware of this, many governments around the world are, at different stages and speeds, putting into practice programs to streamline bureaucratic procedures in relation to people and companies on the one hand and the states themselves on the other. Angola is no exception and has advanced with the implementation of many measures and processes to cut bureaucracy, whether impacting directly on the lives of citizens or interlinked with companies and their investments. A good recent example is SIMPLIFICA 1.0, a program presented in June by the Angolan government designed to simplify and streamline public services while also functioning, as Minister Adão de Almeida explained at the time, as “an instrument in the service of combating corruption” in the public administration. The digitalisation of public services is one of the facets of removing bureaucracy planned for by SIMPLIFICA 1.0, also within the scope of reducing corruption and making processes faster, more reliable and less burdensome. “Our collective strategic objective involves diversifying the economy and encouraging private national and international investment but which shall be seriously compromised if we are not able to provide public


ANGOLA Casa Civil do Presidente da República angolano. E tem razão. O SIMPLIFICA 1.0 faz hoje mais sentido do que nunca. Os angolanos merecem um Estado que lhes facilite a vida e que crie as melhores condições para atrair e manter investimento para criar o emprego de que o País tanto precisa. O programa foi desenhado dando ouvidos à sociedade civil, que é, afinal, a sua principal destinatária, por via de um inquérito de campo que indicou que o bilhete de identidade e a licença de construção pública são os “documentos mais difíceis de serem tratados” e os serviços de saúde e educação como “os que mais devem melhorar”. E já há notícias. Desde que foi apresentado, o SIMPLIFICA 1.0, que prevê a simplificação de mais de 30 actos administrativos, já resultou na implementação de medidas há muito esperadas. Uma das mais relevantes será, sem dúvida, a possibilidade de passar a ser emitido bilhete de identidade à nascença e sem a necessidade de apresentação do assento de nascimento. Num País onde a taxa de natalidade é das mais altas do continente africano e onde existem ainda insuficiências acentuadas em termos de acessibilidades aos serviços públicos, esta é uma das medidas mais bem-vindas e mais estruturantes deste programa. Em Angola, por razões várias, no ano passado, havia ainda cerca de 12 milhões de pessoas sem bilhete de identidade, o que as priva, na prática, do exercício pleno da sua cidadania. Um país coeso, como lembra em entrevista a esta edição da PRÉMIO a ministra portuguesa da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, implica que a cidadania seja exercida em pleno - que todos possamos ter acesso aos serviços públicos essenciais, independentemente de vivermos numa grande cidade, ou numa aldeia do interior. Angola, com estas medidas, caminha nesse sentido, sendo que nada do que é importante se consegue fazer num instante. Na mesma direcção vai o trabalho da ministra de Estado para a Acção Social de Angola, Carolina Cerqueira, a primeira angolana a apresentar, ao Conselho Económico e Social da ONU, o primeiro relatório voluntário do Governo angolano sobre os objectivos de desenvolvimento sustentável. À Prémio, a ministra dá conta da forma como Angola está a trabalhar para melhorar as áreas da saúde, educação, emprego, protecção social, justiça e crescimento económico, entre outras. Trata-se, tudo isto, de promover a coesão do território, uma tarefa bem mais complexa do que possa parecer à primeira vista, por ser tão interdisciplinar e multifacetada, por envolver tantos actores e dimensões. É importante, por isso, ter o território no Conselho de Ministros, como diz Ana Abrunhosa. Em Angola, de uma forma ou de outras, este é um processo que já está em marcha. Só pode dar bons resultados. l

CORRESPONDENTS

services,” assumed the Minister of State and head of the Civil Household of the Angolan President of the Republic. And with every reason. SIMPLIFICA 1.0 today makes more sense than ever before. Angolans deserve a state that facilitates their lives and creates better conditions for attracting and maintaining investment to create the employment that the country needs so much. The program was designed after sounding out civil society which is, after all, its main target through means of a field survey that reported that identity cards and construction licences represent “the most difficult documents to apply for” and health and education services as those “which most need improving”. And there already is news of progress. Since its presentation, SIMPLIFICA 1.0, which aims to simplify over 30 administrative procedures, has already resulted in the implementation of long expected measures. One of the most relevant is undoubtedly the scope to issue identity cards at birth and without the need to present the birth certificate. In a country with one of the highest birth rates on the African continent and where there remain serious shortcomings in terms of access to public services, this is one of the most welcome and structuring measures in this program. Last year in Angola, for various reasons, there were around 12 million people without an identity card which then, in effect, deprives them of the full rights of citizenship. A cohesive country, as the Portuguese Minister for Territorial Cohesion, Ana Abrunhosa, told this edition of PRÉMIO requires the full exercise of citizenship – that everybody may have access to the essential public service irrespective of whether living in a major city or a distant rural village. Angola, with these measures, is heading in this direction even while nothing that is important may be done in an instant. Heading in the same direction is the work of the Angolan Minister of State for Social Action, Carolina Cerqueira, the first Angolan to present a voluntary government report on the progress towards the sustainable development goals to the United Nations Economic and Social Council. To Prémio, the minister explained just how Angola is working to improve the fields of health, education, employment, social protection, justice and economic growth, among other aspects. This all reflects around promoting territorial cohesion, a task far more complex than it might at first sight appear due not only to being interdisciplinary and multifaceted but also involving so many different actors and dimensions. Thus, it is important to ensure the territory has a seat in the Council of Ministers, as Ana Abrunhosa said. In Angola, in one way or another, this process is already underway: it can only bring about good results. l 143


CORRESPONDENTES

BRASIL

B R U N O R O S A*, PRÉMIO

NO PÓS-COVID, A AGENDA

PRÓ-AMBIENTE

I N T H E P O S T- C O V I D E R A , THE PRO-ENVIRONMENT AGENDA

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hora de preparar a empresa para o mundo pós-pandemia. Essa é a frase que mais tenho escutado nas últimas quatro semanas. Com o fim de 2021 se aproximando muitas companhias começam a atualizar seu plano de negócios para estruturar os pilares que vão sustentar o crescimento para os próximos anos após os estragos financeiros causados pela Covid-19. Mas que mundo novo é esse que as corporações estão mirando? Após os debates em torno da necessidade de uma maior digitalização e conectividade nos negócios, chegou o momento de acelerar os projetos em energia sustentável a partir do sol, dos ventos, da biomassa e do embrionário hidrogênio. Essa maior consciência ambiental das corporações é um movimento global e acentuada em países em desenvolvimento como o Brasil. Com o excesso da liquidez financeira no mundo, investidores estão exigindo que bancos e fundos de ‘private equity’ busquem cada vez mais projetos sustentáveis em seus portfólios. Com mais recursos, começam a surgir inovações como a combinação de energia solar e eólica em um mesmo parque, o uso de baterias de lítio para armazenar a eletricidade gerada pela manhã com o sol ou à noite com o vento. Vale tudo para reduzir o consumo de combustíveis fósseis como petróleo e gás natural. No fim de setembro, por exemplo, a anglo-holandesa Shell lançou no Brasil sua marca voltada para o segmento sustentável, a Shell Energy. Uma das maiores produtoras

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t is time to prepare the company for the post-pandemic world. This is the sentence I have most heard over the last four weeks. With the end of 2021 approaching, many companies have embarked on updating their business plans and structure the pillars that are to sustain their growth over the forthcoming years following the financial damaged caused by Covid-19. However, what new world is this that the corporations are foreseeing? Following the debates around the need for greater digitalisation and the connectivity of businesses, we have arrived at the time to accelerate sustainable energy projects based on the sun, the winds, biomass and the embryonic prospects for hydrogen. This greater environmental awareness of corporations is a global movement and advancing particularly in developing countries such as Brazil. With the excess in financial liquidity worldwide, investors are demanding banks and private equity funds increasingly incorporate sustainable projects into their portfolios. With greater resources, there begin to appear innovations such as the combination of solar and wind energy in the same park with the usage of lithium batteries to store the electricity generated to the following day topped up at night by wind power. Everything makes sense to reduce the consumption of fossil fuels such as oil and natural gas. At the end of September, for example, the Anglo-Dutch energy multinational launched Shell Energy, its sustainable energy focused brand, in Brazil. One of the world’s largest oil producers is investing half a billion dollars in renewable projects just in Latin America’s largest country through to *Texto escrito na língua de origem do autor


BRAZIL

“HÁ AINDA NESSE MUNDO P Ó S - PA N D E M I A U M A MAIOR CONSCIÊNCIA DAS EMPRESAS COM A S O C I E D A D E .” de petróleo do mundo vai investir somente no maior país da América Latina meio bilhão de dólares em projetos renováveis até 2025. Parte desses recursos será destinada a uma ‘joint venture’ com a Gerdau, uma das maiores fabricantes de aço do mundo, para a construção de uma planta solar. Em ‘call’ com jornalistas, a petroleira disse ainda que quer trazer para o Brasil plantas eólicas em alto-mar, uma opção já popular na Europa. A BRF, uma das maiores empresas de alimentos do mundo e dona da marca Sadia, começa a construir no início de 2022 uma planta de energia solar no Brasil com o objetivo de reduzir seus custos com a energia elétrica. A meta é chegar ao final da década gerando 88% da energia que consome a partir de fontes limpas, disse Lorival Luz, CEO da BRF. A espanhola Telefônica, dona no Brasil da marca Vivo, a maior empresa de telecomunicações do Brasil, atrelou metas de redução da emissão de gases causadores do efeito estufa aos bônus dos seus executivos. Aliás, as empresas europeias lideram as apostas renováveis no Brasil. A italiana Enel, através da subsidiária Green Power, iniciou recentemente a operação de um de seus maiores projetos no país, com um parque eólico que consumiu investimentos de quase meio bilhão de euros. A EDP Renováveis, por sua vez, quer quadruplicar sua capacidade no Brasil, tornando o país o terceiro maior mercado do mundo para a empresa, atrás apenas dos Estados Unidos e Espanha. Além da agenda ambiental e das metas estabelecidas pelo Acordo de Paris, os projetos ambientais também ganham tração por conta da maior crise hídrica dos últimos 91 anos no Brasil. Sem chuvas, um reflexo do aquecimento global, a energia elétrica fica mais cara - ajudando a pressionar a inflação para perto dos 10%, no maior patamar em 21 anos, segundo o IBGE, responsável em mensurar os dados no país. Há ainda nesse mundo pós-pandemia uma maior consciência das empresas com a sociedade. Estudo feito pela consultoria “amo”, do Grupo Havas, apontou que um dos valores mais buscados pelas empresas diz respeito às pessoas e à comunidade. E, para isso, nada melhor do que proteger o meio ambiente seja para amenizar os custos com o aumento dos preços ou reduzir a emissão de gases poluentes. O pós-Covid é pró-Ambiente. l

CORRESPONDENTS

2025. Part of these resources are going into a joint venture with Gerdau, one of the world’s largest steel producers, for the construction of a solar plant. On a call with journalists, the oil company also added that it was seeking to bring deep sea wind turbines to Brazil, an option already popular in Europe. BRF, one of the largest foodstuff producers and owner of the brand Sadia, begins construction on a solar energy plant in early 2022 with the stated objective of reducing the costs incurred with electricity. The target is to reach the end of the decade generating 88% of the energy consumed from clean sources, said Lorival Luz, CEO of BRF. Spanish Telefônica, owner in Brazil of the Vivo brand, the largest telecommunications company in the country, has tied targets for reductions in greenhouse gas emissions to the bonuses payable to its executives. Indeed, European countries lead the investments going into renewables in Brazil. The Italian Enel, through its subsidiary Green Power, recently launched operations of one of the largest national projects, a wind park that accounted for investment totalling some half a billion euros. EDP Renováveis, in turn, is seeking to quadruple its capacity in Brazil, making it the third largest market in the world for this company, behind only the United States and Spain. In addition to the environmental agenda and the targets established by the Paris Agreement, these environmental projects also gain traction due to the largest hydric crisis in Brazil for the last 91 years. A lack of rainfall, a consequence of global warming, means the cost of electricity rises – helping to push inflation up close to 10%, the highest level in 21 years, according to IBGE, the entity responsible for producing national statistics. There is also in this post-pandemic world a greater awareness about society among corporations. A study carried out by the consultancy “amo”, part of the Havas Group, pointed to one of the values most sought after by companies relates to people and the community. Indeed, for this reason, there is nothing better than protecting the environment whether to offset the costs from rising prices or to reduce the emission of polluting gases. The post-Covid era is pro-environment. l

“THERE IS ALSO IN THIS P O S T- P A N D E M I C W O R L D A G R E AT E R AWA R E N E S S ABOUT SOCIETY AMONG C O R P O R A T I O N S .”

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CORRESPONDENTES

BRASIL

O TURISMO NA EUROPA DURANTE A PANDEMIA TOURISM IN EUROPE DURING THE PANDEMIC

O V E R Ã O D E 2 0 2 1 T R O U X E A L G U M Â N I M O A O S E C T O R D O T U R I S M O . A VA C I N A Ç Ã O E M M A S S A F O I E S S E N C I A L PA R A I M P U L S I O N A R O “ S E N T I M E N T O ” V I A G E M , C O M M U I T O S T U R I S TA S E U R O P E U S A Q U E R E R E M V O LTA R A V I A J A R D E P O I S D E T E R E M S I D O VA C I N A D O S C O N T R A A C O V I D -1 9 . N O E N TA N T O , A S TA X A S D E VA C I N A Ç Ã O D E S I G U A I S L E VA R A M A U M A R E C U P E R A Ç Ã O D E S E Q U I L I B R A D A E M T O D A E U R O PA . T H E S U M M E R O F 2 0 2 1 B R O U G H T S O M E C H E E R B A C K T O T H E T O U R I S M S E C T O R . M A S S VA C C I N AT I O N WA S E S S E N T I A L T O D R I V I N G T H E T R AV E L L I N G “ F E E L I N G ” , W I T H M A N Y E U R O P E A N T O U R I S T S O N LY WA N T T O G O B A C K T R AV E L L I N G A F T E R H AV I N G B E E N VA C C I N AT E D A G A I N S T C O V I D -1 9 . H O W E V E R , U N E Q U A L VA C C I N AT I O N R AT E S L E D T O A N U N B A L A N C E D R E C O V E R Y A C R O S S E U R O P E A S A W H O L E . 146


BRAZIL

CORRESPONDENTS

LARISSA GÖLDNER

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erão é sinónimo de férias em família, festivais, praias de areia branca, noites quentes, banhos de mar, surf e sol. No segundo ano da pandemia, chega a esperança do início de uma retoma e do levantamento de algumas das restrições impostas pelo surto pandémico Covid-19, ainda que com cautela. A procura de viagens na Europa permaneceu fraca no início de 2021, uma vez que as chegadas dos turistas internacionais caíram 83% no primeiro trimestre do ano, em comparação com o mesmo período de 2020 [1]. A redução gradual das restrições, o aumento da vacinação na Europa e a reabertura da União Europeia (UE) para viajantes totalmente vacinados de países terceiros proporcionaram algum impulso antes dos meses de pico do Verão. A vacinação em massa foi essencial para impulsionar o “sentimento” viagem, com 54% dos europeus inquiridos e quererem reservar uma viagem depois de terem sido vacinados contra a Covid-19 [2]. Este “sentimento” está de acordo com uma pesquisa recente da UE, que mostra que 75% dos entrevistados acreditam que as vacinas Covid-19 são a única maneira de acabar com a pandemia e 49% concordam que a administração da vacina é muito importante para permitir o regresso às viagens [3]. No entanto, as taxas de vacinação desiguais levaram a uma recuperação desequilibrada em toda Europa. Uma situação diferente do Verão de 2020, quando poucos ousavam viajar para fora das suas fronteiras. Hoje com o mandatário certificado de vacinação digital - 14 dias após a dose final da vacina, uma recuperação de Covid ou um teste negativo feito em 72 horas – os turistas voltam a viajar para os seus destinos europeus preferidos, fazendo com que o turismo volte a crescer. Turistas da Austrália, Canadá, Nova Zelândia e Singapura, entre outros, puderam viajar para vários países europeus. Por vários meses, os cidadãos norte-americanos puderam viajar para a Europa, mas muitos países impuseram regras de entrada rígidas em Setembro. Enquanto isso, as autoridades dos EUA anunciaram que visitantes totalmente vacinados da UE e do Reino Unido terão permissão para voltar ao país a partir de Novembro. Em toda a Europa, muitos países suspenderam o confinamento e

ummer is synonymous with family holidays, festivals, beaches of white sands, warm nights, swimming in the sea, surf and sun. In the second year of the pandemic, there came hope of the beginnings of a recovery and the lifting of some of the restrictions imposed due to the outbreak of the Covid-19 pandemic, even if only cautiously. The demand for travel in Europe remained weak in early 2021 in keeping with how international tourist arrivals dropped an annualised 83% in the first quarter of this year [1]. The gradual reduction in the restrictions, the rise in vaccination rates across Europe and the reopening of the European Union (EU) to fully vaccinated visitors from third party countries providing some boost prior to the peak months of summer. Mass vaccination was essential to drive the travel “feeling”, with 54% of the Europeans surveyed wishing to make a trip after having been vaccinated against Covid-19 [2]. This “feeling” aligns with recent research findings from the EU that reported how 75% of those interviewed believe that Covid-19 vaccines are the only means of ending with the pandemic and that 49% agree that vaccine administration is highly important to enabling any return to travelling [3]. However, unequal vaccination rates have led to an imbalanced recovery across Europe. This situation differs from summer 2020 when few dared to travel beyond their own borders. Today with the digital vaccination certificate mandatory - 14 days after the final vaccination dose, recovery from Covid or a negative test taken in the last 72 hours – tourists are again travelling to their favourite European destinations and bringing some life back to the tourism sector. Tourists from Australia, Canada, New Zealand and Singapore, among others, became able to travel to various European countries. For various months, North American citizens have been able to fly to Europe even if many countries imposed rigid rules on entrance in September. In the meanwhile, the United States authorities announced that fully vaccinated visitors from the EU and the United Kingdom will be able to return to the country as from November. Throughout Europe, many countries have suspended confinement and cut the entrance and travel requirements. However, while in some countries the measures are being

[ 1 ] W O R L D T O U R I S M O R G A N I S AT I O N , T H E U N I T E D N AT I O N S ( U N W T O ) [2] “MONITORING FEELINGS FOR DOMESTIC AND INTR A-EUROPEAN T R AV E L - W AV E 7 ” [ 3 ] E U R O B A R O M E T E R F L A S H 4 9 4 - AT T I T U D E S T O W A R D S VA C C I N A T I O N AGAINST COVID-19

[ 1 ] W O R L D T O U R I S M O R G A N I S AT I O N , T H E U N I T E D N A T I O N S ( U N W T O ) [2] “MONITORING FEELINGS FOR DOMESTIC AND INTR A-EUROPEAN T R AV E L - W AV E 7 ” [ 3 ] E U R O B A R O M E T E R F L A S H 4 9 4 - A T T I T U D E S T O W A R D S VA C C I N A T I O N AGAINST COVID-19

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CORRESPONDENTES

BRASIL

diminuíram os requisitos de viagem e entrada. Contudo, enquanto em uns países as medidas estão a ser aliviadas, noutros as regras de entrada estão a ficar mais rígidas novamente devido ao aumento da variante Delta e ao consequente aumento do número de casos. Definida por mudanças rápidas e profundas (e talvez permanentes) nos hábitos de consumo, acompanhadas de novas regulamentações e medidas locais, a situação em cada país mudou no decorrer do Verão, o que significou que turistas, operadores de turismo, hotéis e restaurantes tivessem que permanecer altamente flexíveis. Desde as belas costas como a Caldera na Grécia, Amalfi em Itália, Ibiza e Maiorca em Espanha, ou destinos culturais e clássicos como o Museu do Louvre em França ou o Portão de Brandemburgo na Alemanha, a Europa é um destino muito diversificado que não pode deixar de ser visitado. Na Grécia, o país abriu as fronteiras em meados de Abril para as pessoas vacinadas, com o objectivo de iniciar a temporada turística antes de concorrentes como Espanha ou França. O Verão de 2020 viu uma queda de 78% no turismo de um recorde de 34 milhões de chegadas de turistas em 2019 - um desastre para a economia já em dificuldades no país, na qual o turismo é responsável por 20%. Milhões de trabalhadores dependem dos rendimentos do Verão para sobreviver ao Inverno. Mykonos é a ilha cosmopolita mais famosa da Grécia, localizada no coração das Cíclades, e é intitulada como a “ilha dos ventos”, devido aos ventos fortes que costumam soprar na ilha durante todo o ano. Um paraíso para os amantes da natureza ou da vida noturna. Turistas de todo o mundo vêm a Mykonos pela sua incrível atmosfera, pelas suas lendárias casas noturnas, mas também pelo clima, praias, atividades aquáticas e ainda pela famosa culinária mediterrânea, mariscos e cultura gastronómica mezze. O país foi aplaudido pela sua recuperação turística, depois de receber mais de seis milhões de turistas durante o Verão. De acordo com o Ministro do Turismo grego, Haris Theocaris, a Grécia tem sido um destino de eleição até mesmo para os franceses, com 450.000 chegadas, que geralmente passam férias no próprio país. Espanha foi um dos países europeus gravemente afectados e, desde o início da pandemia, o país registrou um grande número de casos e mortes. Depois de ter um dos confinamento mais rigorosos na Primavera de 2020, Espanha reabriu para o Verão no mesmo ano. Ainda assim, em Novembro passado entrou em estado de emergência mais uma vez, ficando o país em confinamento até 9 de Maio de 2021. Espanha recebeu cerca de cinco milhões de passageiros internacionais em Agosto de 2021, registrando um aumento de 172% em relação ao mesmo mês do ano passado. Um dos destinos favoritos dos turistas é Ibiza, uma ilha do arquipélago e comunidade autónoma das Ilhas Baleares, localizada a leste de Espanha e com a sua maior cidade com o mesmo nome da Ilha. De acordo com o Instituto Espanhol de Estatística (INE), o número de viajantes franceses representou 19,9% de todas as chegadas, seguido pelos alemães (64,5%), com 707.331 visitas até Julho e viajantes britânicos, que registraram 46,5% de aumento em relação ao ano passado. l 148

loosened, in others, the entrance rules are once again getting tightened due to the advance of the Delta variant and the consequent rise in the number of cases. Defined by swift and deep reaching (and perhaps permanent) changes in consumption habits, accompanied by new regulations and local measures, the situation in each country change with the arrival of summer, which also meant that tourists, tourism operators, hotels and restaurants had to constantly remain highly flexible. From the beautiful coastlines of Caldera in Greece, Amalfi in Italy, Ibiza and Majorca in Spain, or cultural and classical destinations such as the Louvre Museum in France or the Brandenburg Gate in Germany, Europe is a highly diversified destiny that is on every visit list. In Greece, the country opened its borders in mid-April to vaccinated persons with the objective of launching its tourism season prior to competitors such as Spain or France. Summer 2020 saw a fall of 78% from a record number of 34 million tourist arrivals in 2019 - a disaster for an economy already in difficulties in a country where tourism accounts for 20% of GDP. Millions of workers depend on their summer earnings in order to survive the winter. Mykonos is one of the most famous and cosmopolitan of Greek islands, located in the heart of the Cyclades, and known as the “island of winds” due to the strong winds that blow there throughout the year. A paradise whether for lovers of nature or the nightlife. Tourists from all over the world go to Mykonos for its incredible atmosphere, its legendary nightlife but also for its climate, beaches, aquatic activities as well as the famous Mediterranean cuisine, shellfish and mezze gastronomic culture. The country received applause for its tourism recovery after having welcomed over six million tourists during the summer. According to the Greek Minister of Tourism, Haris Theocaris, Greece has been the destination of choice even for the French, with 450,000 arrivals, who generally spend their holidays in their own country. Spain was one of the European countries most serious impacted and since the outset of the pandemic, the country has registered a large number of both cases and fatalities. After entering into strict lockdown in spring 2020, Spain reopened for summer of the same year. Nevertheless, in November of last year, the country went into a state of emergency with the country then ending up under confinement through to 9 May 2021. Spain welcomed around five million international passengers in August 2021, registering a year-on-year increase of 172%. One of the favourite destinations for tourists is Ibiza, an island in the archipelago and autonomous community of the Balearic Islands, located to the east of Spain and with the largest city bearing the same name as the island. According to the INE – the Spanish Institute of Statistics, the number of French arrivals represented 19.9% of the total of arrivals, followed by the Germans (64.5%), with 707,331 visits through to July and British arrivals that registered a 46.5% increase on the same period of the preceding year. l


JORNALISMO LIVRE E INDEPENDENTE

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CORRESPONDENTES

ESPANHA

BELÉN RODRIGO*, PRÉMIO

EL RETO DE UN NUEVO

MODELO ENERGÉTICO THE CHALLENGE OF A NEW ENERGY MODEL

E

spaña, al igual que el resto de Europa, está inmersa en un cambio de modelo energético que le permita alcanzar la neutralidad climática en 2050. Se trata de un gran reto, pero a su vez de una gran oportunidad para un país sin combustibles fósiles que ha tenido que importarlos. Sin embargo, en los recursos renovables que se están revelando como los ganadores en la competitividad para las próximas décadas, España está mejor situada que muchos de sus socios. No tiene recursos fósiles, pero sí mucho sol y viento. El rumbo de este cambio de modelo está marcado por los dos horizontes que se establecieron a nivel europeo: el 2030 y el 2050. En el ámbito de la descarbonización del sistema eléctrico, el objetivo es ambicioso. Se pretende que el 74% de la electricidad sea renovable en 2030, las 3/4 partes, a base de energía fotovoltaica y eólica, dos tecnologías y recursos donde España es muy competitiva. No obstante, implica dificultades técnicas porque necesita sistemas de almacenamiento de ciclo diario como las baterías y sistemas de almacenamiento de ciclo más largo como los sistemas hidroeléctricos regulables o aumentar las interconexiones para compensar la variabilidad de la producción renovable en unas zonas de Europa respecto de otras. Las tecnologías van a hacer que el coste medio del parque de generación eléctrica español sea más bajo que el coste medio de sus competidores europeos. Pero para conseguir los objetivos trazados hacen falta también inversiones en eficiencia energética. Una de las tareas pendientes 150

S

pain, and the rest of Europe are undergoing profound changes in its energy model and are on the right path achieve climate neutrality by 2050. This is both a major challenge and opportunity for a country without fossil fuels which had to import them. However as regards renewable resources that are crucial to beat the competition in the coming decades, Spain has been in a better position than most of its partners. The country does not have fossil resources but a great deal of sun and wind. The path in this paradigm change is marked by the objectives that have been set at European level: 2030 and 2050. As regards de-carbonisation of the electric system, the objective is an ambitious one. The aim is to reach 74% renewable electricity in 2030, e.g. 3/4, based on photovoltaic and wind energy, two technologies and resources where Spain is highly competitive. However, this brings technical difficulties with it given the need to have daily cycle storage systems in place like batteries and longer cycle storage systems such as adjustable hydroelectric systems or to increase the interconnections in order to offset changes in the production of renewable energy in some regions of Europe. Such technologies should enable a reduction in the average cost of Spanish electric generation when compared to the average cost of its European competitors. But, in order to achieve this the country needs to invest also in energy efficiency. One of the pending tasks is to *Texto escrito na língua de origem do autor


SPAIN es aumentar la electrificación de los consumos energéticos. No es posible avanzar en la descarbonización total si la electricidad sigue representando el 25% de su consumo de energía. Por eso debe ganar peso en el transporte, en la actividad industrial y en los sistemas de calor y frío en los edificios. De lo contrario, será difícil descarbonizar estos sectores en los que los combustibles fósiles están fuertemente instalados. Además, se une el problema de la ya referida mala interconexión. La Península Ibérica sigue siendo una isla eléctrica y su grado de interconexión con el sistema europeo es muy inferior al del resto de países de la Unión Europea, lo que le impide acceder en igualdad de condiciones a los beneficios de las interconexiones eléctricas. Los fondos Next Generation EU se plantean como pieza clave en la transición energética ya que el plan de recuperación trazado por el Gobierno español dedica el 40% de los fondos a la transición energética, rehabilitación de viviendas, red de recargas de vehículos y autoconsumo, entre otros campos. Se espera que estos fondos aceleren la adopción de tecnologías de transición energética que no han alcanzado aún su nivel de plena competitividad y que con estas ayudas pueden ya ser rentables y comenzar a implantarse. Por ejemplo, el hidrógeno verde o el almacenamiento con baterías. Unos fondos que ayudarán a llevar las tecnologías verdes a los clientes y atraer la inversión privada hacia esta transición. En el camino, España se ha encontrado con una inesperada subida del precio de la luz en el mercado mayorista que en varios días ha superado los 200 euros MWh. Si bien es un aumento coyuntural, causado sobre todo por los derechos de emisión de CO2 y el elevado precio del gas, invita a reducir nuestra dependencia a ambos factores. “Faltan años en los que el gas seguirá jugando un papel fundamental en el sector eléctrico. Si queremos reducir su impacto en los precios debemos optar por otro modelo de mercado. Hace falta una reforma estructural del sector eléctrico porque vemos lo vulnerables que somos a la subida del precio del gas”, indica Natalia Fabra, catedrática en el departamento de Economía de la Universidad Carlos III. Mientras el Gobierno español ha tomado sus propias medidas para minimizar el efecto de esta subida en los consumidores (tiene una de las facturas más elevadas por la fuerte carga fiscal), ha pedido también a Bruselas que tome cartas sobre el asunto con la construcción de reservas estratégicas. “La autonomía estratégica de Europa es incompatible con el nivel de exposición actual a las fluctuaciones de los mercados internacionales de energía. Ya lo hemos hecho con bastante éxito para obtener vacunas y deberíamos reproducir este modelo en otros campos estratégicos como este” indica el documento remitido a Bruselas. No podemos olvidar que el sistema eléctrico tiene una gran inercia, con muchas inversiones en activos existentes que marcan la forma de producir y de consumir la energía para las próximas décadas. De ahí que los expertos pidan que se trabaje con mucha anticipación para renovar la forma de producir energía e ir cambiando nuestra forma de consumir. l

CORRESPONDENTS

increase the electrification of energy consumption. Spain cannot pursue with full de-carbonisation if electricity keeps accounting only for 25% of energy consumption. It should therefore increase its weight of this type of energy in the fields of transportation, industrial activity and heat and cold systems of buildings. Otherwise it will prove difficult to de-carbonise those sectors where fossil fuels are deeply rooted. Furthermore, there is also the problem of the aforementioned bad interconnection. The Iberian Peninsula is still an electric island and its level of interconnection with the European system is much lower than in the rest of the EU countries, thus preventing equal conditions as regards taking advantage of electric interconnections. Next GenerationEU funds are a key element in the energy transition, after the recovery plan devised by the Spanish Government allocated 40% of these funds to energy transition, housing renovation, vehicle charging network and self-consumption, among others. These funds are expected to speed up the adoption of energy transition technologies that have not yet reached their level of full competitiveness and which, with these grants, can now become profitable and start being implemented. See, for example, green hydrogen or battery storage. Funds that should help bring green technologies to customers and attract private investment towards this transition. Along the way, Spain has witnessed an unexpected rise in the price of electricity in the wholesale market, which at some point exceeded EUR 200 / MWh. Despite being a temporary increase, caused mainly by CO2 emission rights and the high price of gas, this invites us nonetheless to reduce our dependency on both factors. “Gas should keep playing a fundamental role in the electricity sector for some more years to more. If we want to reduce its impact on prices, we must choose another market model. We need to perform a structural reform of the electricity sector given our vulnerability to gas price increases,” says Natalia Fabra, professor in the Department of Economics at the Carlos III University. While the Spanish Government has taken its own measures to minimize the effect of this increase on consumers (it has one of the highest bills due to the heavy tax burden), it also asked Brussels to take action on this matter and to establish strategic reserves. “Europe’s strategic autonomy is incompatible with the current level of exposure to fluctuations in international energy markets. We have already done this successfully with vaccines and we should replicate this model in other strategic fields like this one in particular” reads a document sent to Brussels. We cannot forget that the electrical system has a great inertia, particular as regards many investments in existing assets that shape the way we produce and consume energy in the next decades. Hence, experts call for work to be done in anticipation in order to change the way we produce and consume energy. l 151


CORRESPONDENTES

MOÇAMBIQUE

PEDRO CATIVELOS, DIRECTOR EXECUTIVO DA MEDIA4DEVELOPMENT EXECUTIVE DIRECTOR OF MEDIA4DEVELOPMENT

U M A Ú LT I M A B OA N OT Í C I A O U

A PRIMEIRA DE MUITAS? THE LAST PIECE OF GOOD NEWS OR THE FIRST OF MANY?

Q

uando, em meados de Setembro, o Ministro da Economia e Finanças de Moçambique, Adriano Maleiane anunciou em Abidjan, na Costa do Marfim, esperar que as obras da TotalEnergies em Cabo Delgado recomecem antes do prazo de um ano que a empresa estimou, inicialmente, como necessário para o Governo resolver a questão da insegurança na região os ‘leads’ jornalísticos iluminaram-se. “Penso que o prazo esperado de atraso das obras talvez seja reduzido porque apontámos um ano como o tempo necessário para permitir o recomeço do projecto mas, olhando para a situação actual, penso que não vai ser esse o caso, estamos a fazer o nosso melhor”, disse o governante, mostrando-se optimista na redução do prazo. “A perspectiva é boa porque a paz está a manter-se, as pessoas deslocadas estão a voltar às suas casas e estamos agora no processo de criar condições para voluntariamente regressarem”, acrescentou o ministro. Recordemos que, quando a petrolífera francesa TotalEnergies, líder do consórcio da Área 1 na Bacia do Rovuma, suspendeu os trabalhos em Afungi, a 24 de 152

W

hen, in mid-September, the Mozambique Minister of the Economy and Finance, Adriano Maleiane, announced in Abidjan, in the Ivory Coast, that he was expecting the work of TotalEnergies in Cabo Delgado to restart prior to the one-year period that the company had initially estimated as necessary for the government to resolve the security issues prevailing in the region, the journalist ‘leads’ lit up. “I think that the expected period of delay in the works may perhaps be reduced because we would point to a year as the time necessary for the project to restart but, looking to the current situation, I believe that this is not going to be the case. We are doing our best”, the minister explained and displaying optimism over reducing the timeframe. “The prospects are good because the peace is holding, the displaced people are returning to their homes and we are now in a process of providing the conditions for them to voluntarily return”, the minister added. We would recall that when the French oil major TotalEnergies, leader of the consortium in Area 1 in the Rovuma Basin, suspended the work in Afungi on


MOZAMBIQUE Março de 2021, no dia em que a cidade foi atacada por terroristas, para um mês depois anunciar a suspensão de todo o projecto por tempo indeterminado o cenário era bastante mais do que preocupante e as previsões de atraso da exploração de gás não eram amigáveis para quem depositava esperança, investimento ou só boa fé na questão. No mínimo, tudo iria parar por um período entre ano e meio e três anos. Mas no horizonte, e alimentada pelos ventos da transição energética e pelos raios solares da sustentabilidade que tomou a agenda dos grandes fundos de investimento globais, pairou a possibilidade de, porventura, o ‘shift’ energético aliado ao ‘timing’ da paragem vir a impossibilitar que, alguma vez, os projectos das Áreas 1 e 4 (este adiado desde logo pela norte-americana Exxon Mobile e sem perspectiva de retoma) viessem a tomar forma. Ficaremos, aparentemente, e se se mantiver o tom triunfante da intervenção militar que decorre de há meses a esta parte por uma força conjunta de Moçambique e do Ruanda, pela medida pequena, cerca de 18 meses, entre a paragem total por motivos de força maior, e a retoma gradual dos trabalhos de construção de um megaprojecto avaliado entre 20 e 25 mil milhões de euros, e o maior investimento privado em curso em África, suportado por diversas instituições financeiras internacionais e que prevê a construção de unidades industriais e uma nova cidade entre Palma e a península de Afungi. Assim, esta é a primeira boa notícia em termos macroeconómicos para Moçambique nos últimos anos, interrompendo um ciclo negativo que se estende pelo passado recente, através dos ecos do caso das dívidas ocultas que agora se arrasta em julgamento, dos efeitos nefastos dos ciclones Idai e Kenneth, das recorrentes notícias que durante quase três anos nos traziam relatos de ataques de insurgentes em Cabo Delgado e, por fim, da chegada da pandemia ao país, e de como as suas múltiplas vagas iam tomando de assalto o dia a dia e pondo em causa o rendimento, a poupança, os pequenos, médios e grandes negócios e, acima de tudo, a saúde de milhões de moçambicanos. Há, de novo, um horizonte, pelo menos económico, em que a chance de crescimento se alia à possibilidade de desenvolvimento efectivo, com o início de um projecto de tal magnitude, numa economia que, ao nível do PIB per capita (abaixo dos 500 dólares por ano), ainda está na cauda da lista de todas as economias mundiais. O reinício dos trabalhos de contrução da unidade de extracção e liquefação de gás (que apenas estará a ser extraído em 2026) a que se junta o início de produção da outra unidade, flutuante e mais pequena, operada pela italiana ENI, que na mesma Bacia do Rovuma, começa a produzir já em meados de 2022, serão as boas notícias que colocam fim a um ciclo que parecia não o ter e que abrem, simultaneamente, um novo capítulo da História de um país que merece ser feliz. O país e a sua gente. l

CORRESPONDENTS

24 March 2021, on the day the city fell under terrorist attack, before a month later announcing the suspension of the entire project for an unspecified period of time, the scenario was well beyond a matter of concern and the forecasts for the delay in natural gas extraction were not friendly to anybody who had placed hope, investment or good faith in the situation. At the minimum, everything would be shut for a period of between a year and a half and three years. However, on the horizon, and driven by the winds pushing the energy transition and the solar rays of sustainability that have risen up the agenda of the major global investment funds, there loomed the possibility that the energy shift allied with the timing of this halt in the project might mean the implementation of the projects for Areas 1 and 4 (this delayed from the outset by the North American Exxon Mobile and without any prospects of resumption) never actually advances. We are apparently then left with, should there be the continuation of the triumphal tone of the military intervention ongoing for the last few months in the region by a joint force from Mozambique and Rwanda, a shortened period of around 18 months between the total shutdown for reasons of force majeure and the gradual restarting of construction work on this mega-project evaluated between 20 and 25 billion euros, and the single largest private investment project under way in Africa, backed by various different international financial institutions and that foresees the construction of industrial units and a new city between Palma and the Afungi peninsula. Thus, this is the first good news in macroeconomic terms for Mozambique in recent years and breaking with a negative cycle that extends back through the recent past, echoing through the hidden debts case, now dragging its way through the courts, the devastating effects of cyclones Idai and Kenneth, the recurrent reports over the last three years of attacks by insurgents in Cabo Delgado and, finally, the arrival of the pandemic in the country and how the subsequent multiple waves have daily assaulted earnings, savings, small, medium and large businesses and, above all, the health of millions of Mozambicans. There is, once again, on the horizon, at least economically, the chance of growth allied with the prospect of effective development with the beginning of a project of such sheer magnitude in an economy in which the GDP per capita (below 500 dollars per year) is still towards the bottom of the world’s economies. The restarting of construction work on the gas extraction and liquification plant (which will only begin operation in 2026) combining with the beginning of production by another unit, floating and smaller in scale, operated by the Italian ENI, located in the same Rovuma Basin, in mid-2022, would indeed be good news and bring to an end a cycle that had hitherto seemed endless while simultaneously opening up a new chapter in the history of a country that deserves to be happy. Both the country and its people. l 153


C U LT U R A E S O C I E D A D E

E N T R E V I S TA | I N T E R V I E W JOSÉ MANUEL CONSTANTINO, PRESIDENTE DO COP JOSÉ MANUEL CONSTANTINO, PRESIDENT OF THE PORTUGUESE O LY M P I C CO M M I T T E E

T E R E M O S S E M P R E PA R I S . 1 0 0 A N O S D E PA RT I C I PAÇ ÃO P O RT U G U E S A NOS JOGOS OLÍMPICOS W E ’ L L A LWAY S H AV E PA R I S . 1 0 0 Y E A R S O F P O RT U G U E S E PA RT I C I PAT I O N I N THE OLYMPIC GAMES

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C U LT U R E & S O C I E T Y

MIGUEL MORGADO

PA R I S 2 0 2 4 M A R C A 1 0 0 A N O S DA P R I M E I R A M E DA L H A O L Í M P I C A P O R T U G U E S A . A C O N TA B I L I DA D E D O M E DA L H E I R O P O R T U G U Ê S C O M E Ç O U E M T O N S D E B R O N Z E N O H I P I S M O C O M Q U AT R O C AVA L E I R O S , D O I S C I V I S E D O I S M I L I TA R E S E S A I D E T Ó Q U I O C O M O R E C O R D E D E Q U AT R O M E TA I S P R E C I O S O S A O P E I T O , D U A S N O AT L E T I S M O , U M A D E L A S D E O U R O , N O J U D O E N A C A N O A G E M . N O T O TA L , P O R T U G A L C O N TA B I L I Z A 2 8 M E DA L H A S , S E N D O 5 D E O U R O , 9 D E P R ATA E 1 4 D E B R O N Z E . O AT L E T I S M O É R E I N A S 9 M O DA L I DA D E S G A L A R D O A DA S E TEM O EXCLUSIVO DOURADO. DEPOIS DE DOIS DIPLOMAS NA ESTREIA D O S U R F E S K AT E N A L I S TA O L Í M P I C A , O ‘ B R E A K DA N C E ’ P O R T U G U Ê S P O D E I R DA N Ç A R A PA R I S .

PA R I S 2 0 2 4 O V E R L A P S W I T H T H E 1 0 0 T H A N N I V E R S A RY O F T H E F I R S T P O RT U G U E S E O LY M P I C M E DA L . T H E P O RT U G U E S E M E DA L R E C O R D S TA R T E D O U T W I T H A B R O N Z E I N R I D I N G W I T H F O U R R I D E R S , T W O C I V I L I A N S A N D T W O M I L I TA R Y A N D C O M P L E T E D T O K Y O W I T H A R E C O R D F O U R M E DA L S H AV I N G G O N E A R O U N D P O R T U G U E S E N E C K S I N T H I S G A M E S , T W O I N AT H L E T I C S , O N E O F T H E M G O L D , I N J U D O A N D I N C A N O E I N G . I N T O TA L , P O R T U G A L H A S P I C K E D U P 2 8 M E DA L S , W I T H 5 G O L D S , 9 S I LV E R S A N D 1 4 B R O N Z E M E DA L S . AT H L E T I C S L E A D S T H E WAY W I T H M E DA L W I N N E R S I N 9 E V E N T S A N D T H E O N LY S O U R C E O F G O L D MEDALS. FOLLOWING T WO SUCCESSES IN THE PREMIERE OF SURFING A N D S K AT I N G AT T H E O LY M P I C G A M E S , P O R T U G U E S E ‘ B R E A K DA N C E ’ M AY B E TA K I N G T O T H E S TA G E I N PA R I S .

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níbal Borges de Almeida, Luís Cardoso de Menezes, Hélder de Sousa Martins e José Mouzinho de Albuquerque. Foram estes os heróis da equipa portuguesa de hipismo, medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Paris de 1924, competição à qual Portugal levou 28 atletas, todos masculinos, 8 modalidades, com destaque para a Esgrima e Tiro mas sem futebol por causa de desentendimentos tidos entre José Ponte, presidente do Comité Olímpico de Portugal e Cândido de Oliveira, que viria a ser seleccionador nacional na estreia da equipa de futebol de Portugal nos Jogos Olímpicos de Amesterdão em 1928. Dois civis, Borges de Almeida, então com 18 anos e o mais novo de sempre a terminar de medalha ao peito e Cardoso de Menezes e dois militares, Sousa Martins e Mouzinho de Albuquerque, foram os responsáveis

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níbal Borges de Almeida, Luís Cardoso de Menezes, Hélder de Sousa Martins and José Mouzinho de Albuquerque were the stars in the Portuguese riding team that secured a bronze medal at the Paris Olympic Games in 1924, an occasion for which Portugal sent 28 athletes, all male, competing in eight events, with an emphasis on Fencing and Shooting but without any football due to a misunderstanding between José Ponte, President of the Olympic Committee of Portugal and Cândido de Oliveira, who would be the national manager premiering the Portuguese football at the Amsterdam Olympic Games in 1928. Two civilians, Borges de Almeida, then aged 18 and one of the youngest ever medal winners and Cardoso de Menezes and two military officers, Sousa Martins and Mouzinho de Albuquerque, were responsible for 155


C U LT U R A E S O C I E D A D E

ABERTURA DOS JOGOS OLÍMPICOS TÓQUIO 2020

pela primeira insígnia olímpica de Portugal conquistada no hipódromo de Colombes, Paris. Um feito alcançado 12 anos após a estreia (Estocolmo 2012) de uma comitiva portuguesa nos Jogos. Num gigante salto no tempo, uma pandemia e um ano depois do calendário, a Missão portuguesa em Tóquio 2020, Jogos da XXXII Olimpíada da Era Moderna, evento realizado em 2021, foi constituída por 92 atletas (a 3ª maior comitiva, igualando o número dos JO Rio 2016, mas em número inferior em relação aos Jogos de Barcelona 1992, 101 atletas e Atlanta 1966, com 107), dos quais 36 atletas femininas (recorde), oriundos de 17 modalidades a competir em 67 eventos de medalha, mais sete que no Rio 2016. A Equipa Portugal regressou do Japão com quatro medalhas. Uma de ouro (triplo salto de Pedro Pablo Pichardo, atleta luso-cubano), uma de prata, de Patrícia Mamona (Atletismo, triplo salto), e duas de bronze, de Jorge Fonseca (Judo, -100 kg) e Fernando Pimenta (Canoagem, K1 1000). As quatro medalhas olímpicas conquistadas no Japão, o dobro das negociadas no contrato-programa de 18,55 milhões de euros, fizeram de Tóquio 2020 a melhor representação olímpica nacional de sempre. Foram batidos os números de Los Angeles 1984 (ouro de Lopes e prata de Rosa Mota e António Leitão) e de Atenas 2004 (prata para o ciclista Sérgio Paulino e o velocista Francis Obikwelu e bronze de Rui Silva, nos 1500 metros). Em medalhas, mas não só. Também em diplomas ganhos, incluindo as posições de pódio, num total de 15, mais dois do que foi conseguido em Atenas 2004, o anterior máximo.

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bringing the first Olympic success to Portugal, won in the Colombes hippodrome, Paris. This achievement came twelve years after the first appearance (Stockholm 1912) of a Portuguese team at the Games. Taking a giant leap through time, a pandemic and a year after schedule, the Portuguese Mission in Tokyo 2020, the 32nd Olympic Games in the Modern Era, an event held in 2021, was made up of 92 athletes (its 3rd largest ever and equalling the number at Rio 2016 but still down on the numbers attending the Olympic Games in Barcelona 1992, 101 athletes and Atlanta 1966, with 107), with 36 female athletes (a record), covering 17 different sports and competing in 67 medal events, seven more than in Rio 2016. The Portuguese team returned from Japan with four medals. One gold (Pedro Pablo Pichardo, a Luso-Cuban athlete, in the triple jump), one silver, (Patrícia Mamona, in the triple jump), and two bronzes (Jorge Fonseca in -100 kg judo) and (Fernando Pimenta, canoeing, K1 1000). The four Olympic medals brought back from Japan, double the target set out in the 18.55 million euro contract-program, turned Tokyo 2020 into the best Olympic Games ever for the Portuguese team. This beat the numbers set in Los Angeles 1984 (gold to Lopes and silvers to Rosa Mota and António Leitão) and Athens 2004 (silvers to the cyclist Sérgio Paulino and the sprinter Francis Obikwelu and bronze to Rui Silva in the 1500 metres). In medals but not only. Also in terms of the diplomas won that, including the podium positions, reached a total of 15, two more than those achieved in Athens 2004, the previous maximum.


C U LT U R E & S O C I E T Y

O PODER DOS ESTADOS ATRAVÉS DOS METAIS PRECIOSOS Tóquio 2020 concedeu 339 títulos. 93 países levaram para casa pelo menos uma medalha. Botswana, Burkina Faso (Hugues Zango, no Triplo Salto masculino, prova que coroou Pedro Pablo Pichardo), Costa do Marfim, Gana, Granada, Kuwait, República da Moldava e Síria, todos de bronze, ocuparam o fim da tabela. Entre os medalhados, Portugal ficou, a par da Etiópia, em 56º lugar, o 47º do ‘ranking’ global da soma de ouro (1), prata (1) e bronze (2). O top-3 do ‘ranking’ foi ocupado por dois dos suspeitos do costume e um elemento novo. As 39 medalhas de ouro, 41 de prata e 33 de bronze, 113 medalhas no total, colocaram os Estados Unidos da América como o país mais medalhado dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. O topo do medalheiro é um lugar que o país da bandeira das 50 estrelas, sete riscas horizontais encarnadas e 6 brancas conhece bem. Em 29 edições de Jogos Olímpicos, foram líderes desta contabilidade por 18 vezes. De Sydney 2000 ao Rio de Janeiro 2016 somente em Pequim 2008 não atingiu o cume medalhístico, tendo sido substituído pela China, país organizador. O hino “The Star-Spangled Banner” escutou-se por 39 vezes, mais uma que a República Popular da China. O Império do Meio somou 38 medalhas de ouro, 32 de prata e 18 de bronze, totalizando 88 fitas penduradas no pescoço dos atletas. “A nossa equipa, quando vai para qualquer competição no estrangeiro, quer mostrar a força da China”, relembrou Wang Zhouyu, vencedora (87 kg) no halterofilismo deixando escapar a afirmação de soberania da China de Xi Jinping através do Desporto. Os 27 ouros, 14 medalhas de prata e 15 de bronze conquistados por atletas nipónicos, 58 no total, colocaram o país do Sol Nascente a fechar o pódio, embora tenham sido 5º na contabilidade geral. Mas mais importante. Os números alcançados pelo Japão nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 constituem um recorde para a nação, ultrapassando Atenas 2004 (16 medalhas de ouro, 37 na soma das três).

THE POWER OF STATES THROUGH PRECIOUS METALS Tokyo 2020 awarded 339 titles. 93 countries took home at least one medal. Botswana, Burkina Faso (Hugues Zango in the men’s Triple Jump won by Pedro Pablo Pichardo), Ivory Coast, Ghana, Granada, Kuwait, Republic of Moldova and Syria, all with bronzes, prop up the bottom of the medals table. Among those further up, Portugal ended up alongside Ethiopia in 56th place, 47th in the global ranking from summing up the gold (1), silver (1) and bronze (2). The top-3 rankings were taken by two of the usual and a new member on the block. The 39 gold medals, 41 silver and 33 bronze, 113 medals in total, placed the United States of America as the top medal winner at the Tokyo 2020 Olympic Games. Topping the medals table is a place that the country with a flag of 50 stars, seven red and six white horizontal stripes knows so very well. At 29 Olympic Games, they have led the way on 18 occasions. From Sydney 2000 to Rio de Janeiro 2016, only in Beijing 2008 did they not sit at the pinnacle of the medals table and knocked off by the host country, the People’s Republic of China. “The Star-Spangled Banner” was heard 39 times but only one more than China’s national anthem. The Asian state picked up 38 gold, 32 silver and 18 bronze, totalling 88 medals around the necks of its athletes. “Our team, when it goes to any international competition, wishes to show the strength of China”, pointed out Wang Zhouyu, weightlifting winner (87 kg) reflecting the affirmation regarding the boosting of the sovereignty of China through sport made by Xi Jinping. The 27 gold, 14 silver and 15 bronze won by Japanese athletes, 58 in total, placed the hosts on the third step on the podium even while coming in 5th according to the other medal accountancy approach. However, more importantly, the numbers obtained by Japan at the Tokyo 2020 Olympic Games set their national record and exceeding Athens 2004 (with 16 golds and a total of 37 medals).

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J O R G E F O N S E C A E P AT R Í C I A M A M O N A

5 medalhas de ouro em 100 anos de participações. De Paris a Paris Os Jogos Olímpicos regressam a Paris em 2024. 100 anos depois onde tudo começou para Portugal. No palmarés olímpico dos metais preciosos, 28 no total, Portugal contabiliza 5 de ouro, 9 de prata e 14 de bronze espalhadas por 9 modalidades. O atletismo, é Rei no medalheiro: 12 medalhas. E é também aqui que mora a mão cheia de ouro. Pedro Pichardo (2020) e Nélson Évora (2008), no triplo salto, Fernanda Ribeiro (1996), nos 10 mil metros e Rosa Mota (1988) e Carlos Lopes (1984), na maratona, são os únicos atletas, todos do atletismo, a conquistaram o ouro por Portugal. Aos 37 anos Lopes, em Los Angeles, EUA, foi o primeiro ouro português com o tempo de 2h09m21s, recorde olímpico. O feito mereceu honras de recepção por dois presidentes. Primeiro, num churrasco nos Jardins de São Bento, cumprindo uma promessa feita por Mário Soares, em Agosto, e depois, em Outubro, num encontro marcado com o presidente norte-americano, Ronald Reagan. Viria ainda a ser o primeiro desportista não americano a aparecer na série “Os Simpsons”. Os homens e mulheres que correm, saltam, atiram discos e pesos, têm a companhia da vela (4), equestre e judo (3). Como curiosidade, registe-se que o último título na vela data de 1996, em Atlanta, (Hugo Rocha e Nuno Barreto na classe 470), o equestre é do tempo da “outra senhora”, nas vésperas da segunda metade do século XX (Londres 1948) e o judo integrou a lista, pela primeira vez, um ano antes da viragem do século (bronze de Nuno Delgado em Sydney 2000).

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5 gold medals in 100 years of participation. From Paris to Paris The Olympic Games return to Paris in 2024; one century on from when it all began for Portugal. In terms of the Olympic performance in terms of precious metals, with 28 in total, Portugal accounts for 5 gold, 9 silver and 14 bronze spread across 9 events. Athletics leads the way in the medal count: 12 in total. It’s also the field that returns the gold: Pedro Pichardo (2020) and Nélson Évora (2008) in the triple jump, Fernanda Ribeiro (1996), in the 10,000 metres and Rosa Mota (1988) and Carlos Lopes (1984) in the marathon stand out as the only athletes, all competing in athletics events, who have won gold for Portugal. Aged 37, Lopes, in Los Angeles, USA, was the first Portuguese gold winner with the time of 2h09m21s, an Olympic record. The feat gained him the honour of receptions from two presidents. Firstly, to a barbecue held in Lisbon’s São Bento Gardens and resulting from a promise made by President Mário Soares in August and later, in October, at a meeting with the United States President Ronald Reagan. Lopes would also become the first non-American sportsman to appear in “The Simpsons”. The men and women who ran, jumped, threw discs and weights are joined by their peers from sailing (4), equestrianism and judo (3). As a point of interest, the last medal in sailing now dates back to Atlanta 1996 (Hugo Rocha and Nuno Barreto in the class 470), equestrianism belongs to times long gone, on the eve of the second half of the last century (London 1948) and with judo joining the list for the first time at the beginning of this century (bronze by Nuno Delgado in Sydney 2000).


C U LT U R E & S O C I E T Y PARALÍMPICOS À BEIRA DAS 100 MEDALHAS Depois da estreia em Heidelberg 1972, Suécia, com uma equipa de basquetebol em cadeira de rodas, e da ausência em dois ciclos, Toronto 1976 e Arnhem 1980, Nova Iorque 1984 assinalou a segunda participação paralímpica e marcou o início das conquistas de Portugal nos Jogos Paralímpicos. A primeira subida ao pódio repetiu-se 14 vezes. Desde então, a comitiva portuguesa paralímpica, em 10 participações consecutivas, aterra em Lisboa sempre acompanhada de medalhas. As subidas ao pódio nos EUA repetiram-se em Seul 1988 (Coreia do Sul) e Atlanta 1966 (EUA) e foi menos uma do que Sydney 2000, Austrália, Paralímpicos de boa memória para as cores nacionais: 20 medalhas conquistadas pela maior representação portuguesa, composta por 52 atletas. Em Tóquio 2020, Portugal elevou o palmarés para 94 medalhas. 25 de ouro, 30 de prata e 39 de bronze. Atletismo, 54 metais preciosos, boccia, 26, e natação, nove, são as modalidades que mais contribuem para o “medalheiro” nacional. Cabe ainda espaço no pódio para ciclismo (2 medalhas), futebol (1) e ténis de mesa (1). Miguel Monteiro, lançamento do peso F40 (atletismo) e Nuno Mourão, em canoagem (200m VL2), modalidade em estreia, foram os últimos atletas a acrescentar à contabilidade. Paris 2024 será o palco dos XVII Jogos para atletas com necessidades especiais. A realizar entre 28 de Agosto e 8 de Setembro, o programa incluirá 22 desportos. Portugal está a 6 medalhas de dobrar a marca das 100.

PARALYMPICS ON THE VERGE OF 100 MEDALS After its debut in Heidelberg 1972, Sweden with wheelchair basketball teams, and before an absence at the two subsequent Games, Toronto 1976 and Arnhem 1980, New York 1984 signalled the second Paralympic participation and the beginning of Portuguese victories at the Paralympic Games. The first podium was repeated 14 times on that occasion. Henceforth, the Portuguese Paralympic Committee, at the ten consecutive Games, has always touched down back in Lisbon accompanied by medals. Podium positions in the United States were repeated in Seoul 1988 (South Korea) and Atlanta 1996 (USA) when there was one less medal than in Sydney 2000 (Australia), a Paralympics with good memories for those in Portuguese colours: 20 medals won by the largest ever Portuguese team containing 52 athletes. In Tokyo 2020, Portugal received the plaudits for 94 medals. 25 gold, 30 silver and 39 bronze. Athletics, with 54 medals, boccia, 26, and swimming with nine medals are the events that most contributed to the national medal haul. There was also space on the podium for the cycling (2 medals), football (1) and table tennis (1). Miguel Monteiro, shotput F40 (Athletics) and Nuno Mourão, in the canoeing (200m VL2), events making their premiere, are the final athletes to contribute to the total. Paris 2024 will be the stage for the 17th Games for those with special needs. Taking place between 28 August and 8 September, the program features 22 sports. Portugal requires six extra medals to reach the 100 landmark. Tokyo 2020 Olympic Games set their national record and exceeding Athens 2004 (with 16 golds and a total of 37 medals).

Neste somatório entram duas na canoagem (Fernando Pimenta e Emanuel Silva, Londres 2012 e Fernando Pimenta, Tóquio 2020), ciclismo (Atenas 2004, Sérgio Paulinho), tiro (Armando Marques, Montreal 1976), triatlo (Vanessa Fernandes, Pequim 2008) e esgrima (Amesterdão 1928, equipa).

Into this record come two from canoeing (Fernando Pimenta and Emanuel Silva, London 2012 and Fernando Pimenta, Tokyo 2020), cycling (Sérgio Paulinho, Athens 2004), shooting (Armando Marques, Montreal 1976), triathlon (Vanessa Fernandes, Beijing 2008) and fencing (team medal Amsterdam 1928).

Breaking, surf, skate e escalada Em ano de estreia de quatro modalidades em Tóquio, Gustavo Ribeiro (Skateboarding, street), oitavo lugar e Yolanda Hopkins (Surf, shortboard), 5ª, obtiveram diploma olímpico na estreia

Breaking, surfing, skateboarding and climbing In the year of four events premiering in Tokyo, Gustavo Ribeiro (Skateboarding, street), eighth place and Yolanda Hopkins (Surf, shortboard), fifth, obtained Olympic diplomas in their own first

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P A B L O P I C H A R D O E F E R N A N D O P I M E N TA

também eles, aos 20 e 23 anos respetivamente, nas lides olímpicas. “Falhámos a oportunidade de apurar no karaté e na escalada”, recorda José Manuel Constantino, presidente do COP. Para Paris 2024, 26 de Julho até 11 de Agosto, seguem viagem os dois desportos de prancha, em terra (skate) e no mar (surf), mantem-se a escala, sai o karaté entra uma nova modalidade dirigida à Geração Z. O breaking, estilo de dança ligado ao hiphop, nascido nos anos 70 do século passado em Nova Iorque. “Confesso que é uma área que não domino com a suficiente segurança, mas pelo que me é transmitido pelos responsáveis modalidade e da federação de dança desportiva é que há qualidade e resultados internacionais. Vamos aguardar”, diz José Manuel Constantino. A propósito da renovação de modalidades levada a cabo pelo Comité Olímpico Internacional (COI), o responsável da estrutura olímpica portuguesa opina. “Deve haver uma razão desportiva que explique a inclusão de modalidades e não uma razão que resulte da pressão comercial que os ‘sponsors’ dessas modalidades exercem no mercado desportivo”. “Tudo o que seja modalidade para conquistar novos públicos é positivo. O skate e surf são espetaculares”, acrescenta. “É bom para o programa olímpico e para as modalidades. Dá-lhes uma montra...temos de estar atentos e ajudar. Os Jogos Olímpicos dão um ‘input’ enorme”, garante. José Manuel Constantino considera ainda que “se em tese, novas disciplinas fazem sentido, outras, antigas, tem de ser reduzidas”. Cita exemplos. A “esgrima e a natação” devem “manter-se como modalidade olímpica, mas podem reduzir as disciplinas até porque teremos de reduzir umas para entrar outras”. Por outro lado, “há desporto combate, localizadas geograficamente, sem escala global, mas têm lóbis fortes e mantêm-se”, conclui. A três anos de Paris, desde Los Angeles que Portugal só por uma vez ficou em branco. Foi em 1992 (Barcelona). Desde então, a Missão olímpica regressou sempre com medalhas em cinco olimpíadas seguidas. 100 anos depois da primeira medalha, têm a palavra os atletas portugueses. “Citius, Altius, Fortius”. 160

Games at the respective ages of 20 and 23. “We missed out on opportunities to qualify in karate and climbing”, recalled José Manuel Constantino, President of the Portuguese Olympic Committee. For Paris 2024, between 26 July through to 11 August, there are two more board sports debuting on land (skateboarding) and on sea (surfing), while retaining climbing, karate is out in place of a new sport reaching out to Generation Z. Breaking, a dance style connected with hip-hop, that emerged in New York in the 1970s. “I confess that this is an area that I do not dominate with sufficient security but from that conveyed by those responsible for the sport and the federation of sports dancing is that there is both quality and international level results. We shall wait and see”, explained José Manuel Constantino. As regards the renewal of the sports undertaken by the International Olympic Committee, the head of the Portuguese Olympic structure stated: “There should be a sporting reason to explain the inclusion of different sports and with the reason not resulting from commercial pressures that the ‘sponsors’ of these sports wield in the sporting market”. “Everything that is a sport designed to win over new publics is positive. Skateboarding and surfing are spectacular”, he added. “It is good for the Olympic program and for the respective sports. It provides them with a showcase... we have to be aware and help out. The Olympic Games provide an enormous input”, he guaranteed. José Manuel Constantino also considers that “if we accept the thesis that new sports make sense, others, older, have to be reduced”. He quoted the examples of “fencing and swimming” that should “remain as Olympic sports but should have their number of events reduced especially because we have to reduce some in order to allow others to enter”. Furthermore, “there are combat sports, geographically localised, without any global scales but that have strong lobbies and have kept their place”, he concluded. Three years off Paris, ever since Los Angeles, Portugal has only ever come back empty-handed once; in 1992 (Barcelona). Ever since the Olympic Mission has always returned with medals from each of the five subsequent Games. 100 years on from the first medal, it is the Portuguese athletes who bear the motto: “Citius, Altius, Fortius”.


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P E R F I L

10 PERGUNTAS A JOSÉ MANUEL CONSTANTINO

PRESIDENTE DO COMITÉ OLÍMPICO DE PORTUGAL

10 QUESTIONS TO JOSÉ MANUEL CONSTANTINO P R E S I D E N T O F T H E P O R T U G U E S E O LY M P I C C O M M I T T E E

Esperava a ligação do país durante as madrugadas a Tóquio? Havendo bons resultados, há boa imprensa. Havendo boa imprensa, há boa opinião pública. Uma coisa puxou a outra. Quatro medalhas em Tóquio, o dobro do contratualizado com governo e IPDJ. Que balanço faz? Positivo. Os objectivos estabelecidos foram alcançados. As percentagens de sucesso foram significativas. Apesar de tudo, tenho de reconhecer, que as expectativas em relação às posições de pódio eram superiores. Uma percentagem da nossa Missão, 1/3, ficou aquém. Tirando isso, a grande maioria, e nalguns casos, ultrapassou. Olhemos para o “Medalheiro”. No espaço europeu quando é que Portugal pode começar a pensar em subir degraus? No espaço europeu participaram 50 países. 40 conseguiram posições de pódio. Estamos, a nível europeu, no início da segunda metade. Em termos de UE estamos no final da primeira metade. Só conseguiremos melhorar se tivermos uma atitude de aproveitamento ao limite das potencialidades que o país e os atletas têm e, nesse sentido, é indispensável que tudo esteja alinhado: haja talento, vontade dos atletas de aproveitarem esse talento e exprimi-lo ao mais alto nível, haja recursos humanos qualificados para ajudar os atletas e que o ambiente geral, modalidade, federativo e político seja favorável. Se estabelecermos esta complementaridade entre estes diferentes actores, o sucesso é mais fácil. Se não, podemos ficar perto, mas não chegamos lá. E isso ajuda a explicar os 4º e 5º lugares e não termos as posições de pódio. O que diferencia são detalhes. Hoje temos mais talento? No judo, andebol, futebol, atletismo, canoagem ou desportos aquáticos temos resultados que não tínhamos há 10 anos. A expressão competitiva de Portugal no contexto internacional nas duas últimas décadas é

Were you expecting the country’s connection to Tokyo during the early hours? There were good results, there was good coverage. With good press coverage, there is good public opinion. One thing drives the other. Four medals in Tokyo, double that contracted with the government and the institute of sport and youth. What is your overview? Positive. The objectives established were achieved. The percentages of success were significant. Despite everything, I have to recognise that the expectation in relation to positions on the podium were higher. A percentage for our Mission, 1/3, fell short. Other than that, the great majority, and in some specific cases, exceeded this. When we look at the “Medals Table”, when might Portugal begin thinking about rising a few places within the European context? Within the European context, there were 50 countries participating. 40 managed positions on the podium. At the European level, we are at the top of the lower half. In terms of the EU, we are at the bottom of the top half. We shall only be able to do better if we have an attitude of maximising the potentials that the country and its athletes have and, to this end, it is essential that everything aligns: that there is talent, the desire of athletes to make use of their talents and to express themselves at the highest level, that there are human resources qualified to help these athletes and that the general environment, the sport, federation and policies are favourable. If we establish this complementarity between these different actors, success becomes much easier. If not, we may get close but we won’t get there. And this helps explain the 4th and 5th places and not getting into podium positions. What makes the difference are the details. Do we have more talent nowadays? In judo, handball, football, athleticism, canoeing and aquatic sports, we’re getting results we didn’t a decade ago. The competitive profile of Portugal within the international context in the last two decades is incomparably greater than the past in a European context which is distinctive. One thing is having Europe and the USSR. Another is having 161


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HÁ UM DEFICIT DE QUALIFIC AÇ ÃO TÉCNIC A A QUEM TRABALHA COM A ÁREA INFANTO JUVENIL O N D E É I N D I S P E N S ÁV E L QUALIFICAR. OU SE FAZ BOM TR ABALHO, OU NÃO HÁ R E S U LT A D O S . incomparavelmente superior a um passado num contexto europeu que é distinto. Uma coisa é termos na Europa com URSS. Outra é termos a Rússia e mais 15 países que nascem a partir do desmembramento. Nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, boicote da URSS, com três medalhas, ficámos em 23º. Hoje ficaríamos em 80º. Temos infraestruturas, investimento público e privado e a componente técnica. É este o segredo das modalidades? Não sou tão afirmativo. Há um deficit de qualificação técnica a quem trabalha com a área infanto juvenil onde é indispensável qualificar. Ou se faz bom trabalho, ou não há resultados. Recupero o exemplo do futebol. O trabalho feito com as camadas jovens, Carlos Queirós e Nelo Vingada, a federação e a relação com as universidades, o ISEF. Hoje exportamos talento, jogadores, treinadores e dirigentes. Noutras modalidades passa por forte aposta no desporto infanto juvenil, em particular na qualificação de Recursos Humanos. No Alto Rendimento é necessário uma equipa multidisciplinar. Não pode estar resumido à presença do treinador. Somos deficitários quantitativos e qualitativos no Alto Rendimento. Necessita de gente qualificada na área da fisiologia, fisioterapia, psicologia ou anatomia. E há tempo para esperar? Como no futebol não há tempo. Não há tempo. Ou há sucesso e este permite algumas reformas ou ninguém está preparado, poder político, opinião pública e os media para uma participação ter um objectivo: as 162

THERE IS A DEFICIT IN THE TECHNICAL Q U A L I F I C AT I O N S A M O N G THOSE WORKING IN THE YOUTH AREA WHERE WE MUST R A I S E Q U A L I F I C AT I O N S . E I T H E R YOU DO A GOOD JOB THERE OR Y O U D O N ’ T G E T T H E R E S U LT S . Russia and 15 other countries that emerged since its breakup. At the Los Angeles Olympic Games, with the USSR boycotting, with three medals, Portugal came in 23rd. This time, Portugal ranked 80th. We have infrastructures, public and private investment and the technical component. Is that the secret of the respective sports? I’m not quite so positive. There is a deficit in the technical qualifications among those working in the youth area where we must raise qualifications. Either you do a good job there or you don’t get the results. I would point to the example of football. The work done with the younger age groups, by Carlos Queirós and Nelo Vingada, the federation and the relationship with the universities, ISEF. Today, we export talent, players, trainers and managers. In other sports, there has been strong investment in child-youth sports, particularly in the qualifications of the human resources involved. For high performance, multidisciplinary teams are needed. This does not boil down to having a trainer. We have both a quantitative and qualitative deficit in the high performance sector. We need people qualified across the areas of physiology, physiotherapy, psychology and anatomy. And is there time to wait? Just like in football, there is no time. Really, no time at all. Either there is success and this enables some reforms or nobody is willing, not the political powers, public opinion and the media for participation with objectives: our podium positions


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nossas posições de pódio são para daqui a 8 anos. Ninguém nos dá esse tempo. Temos de ter perspectiva para médio e longo prazo sem perder soluções para o presente. Temos que ter resultados no presente. E para tal, temos de saber que já houve etapas ultrapassadas na formação. Agora é retirar o máximo rendimento e juntar as parcelas que falei.

are those in eight years time. Nobody gives us that amount of time. We have to have medium and long term perspectives without missing out on solutions in the present. We have to get results in the present. And to do that, we have to know that there were already stages passed through during training. Now, it is about extracting the maximum returns and adding the pieces that I mentioned.

Como olha para as naturalizações dos atletas? Com a mesma naturalidade como olhei para o Obikwelu quando foi medalha de prata (Atenas 2004). É um processo inevitável, a mobilidade de atletas que procuram melhores condições para a sua vida desportiva e pessoal. E dada a natureza das representações desportivas, que são representações dos Estados, devem ser reguladas. Para a procura suster aquilo que é a atractividade dos países ricos sobre países pobres, e, por outro, que empreste alguma dignidade ao ato de representação nacional. Para o processo ser regulado do ponto vista civil, do Estado e das organizações desportivas, de modo a impor regras mais apertadas face às que existem actualmente para evitar situações de quem tenha representado outros países, migre. Numa visão mais abrangente, interrogo-me sempre porque esta questão é colocada relativamente ao desporto e não se coloca a atividades culturais. Quantos nascidos em Portugal existem no corpo bailado da Gulbenkian ou Orquestra Sinfónica? O desporto vive sempre este drama de representação nacional, em sê-lo genuinamente nacional, quando falamos de qualidade dos intérpretes. O desporto viveu sempre em regime de ‘apartheid’ em relação a outras atividades sociais. Necessita de muitos mecanismos de identidade e passa muito pelo reconhecimento, pela ligação de quem representa um país tenha uma ligação sanguínea ou de nascimento com o próprio país.

How do you perceive the naturalisation of athletes? With the same naturalness that I perceived Obikwelu when he won silver (Athens 2004). This is an inevitable process, the mobility of athletes seeking better conditions in their sporting and personal lives. And given the nature of sporting representation, given they represent the states, they should be regulated. So that the demand is curbed on the attractiveness of rich countries over poor countries and, on the other hand, to ensure some dignity to the act of national representation. For the process to be regulated from the civil point of view, by the state and sporting organisations so as to place tighter rules than those currently existing to avoid situations when those who have already represented other countries then migrate. From a broader viewpoint, I always question why this issue is raised in relation to sport and not as regards other cultural activities. How many Portuguese born performers are there in the Gulbenkian ballet or symphony orchestra? Sport always lives out this drama of national representation in being genuinely national when talking about the quality of the performers. Sport has always faced an apartheid type regime in relationship to other social activities. This needs many identity mechanisms and greatly involves recognition due to the connections of those who represent a country having a blood or birth connection with that same country.

A mobilidade hoje é uma realidade inultrapassável... A mobilidade será maior do que no passado. São dezenas as federações procuradas por agentes de atletas disponíveis para serem naturalizados. Não temos a noção do que se passa por aí, mas passa-se, e há gente organizada. Portanto, antes que seja uma selvajaria, é necessário regular para ter bom senso e equilíbrio.

Mobility is therefore an unavoidable reality today... Mobility is higher than in the past. The federations receive dozens of inquiries by the agents of athletes seeking to be naturalised. We do not have much notion about what is going on but it is happening and there are organised people involved. Therefore, before this becomes a jungle, there is a need regulate to ensure good sense and a proper balance.

Qual os primeiros Jogos Olímpicos que viu? Sou velho de idade, mas não idoso no exercício do visionamento de JO. Não me lembro. Talvez Munique 72, creio que é desde que há transmissão televisiva. l

What were the first Olympic Games that you saw? I’m already old but not so elderly in terms of watching the Games. I don’t remember: perhaps Munich 72 I think, ever since there was television coverage. l 163


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U M E S PAÇO F E I TO PA R A Q U E A MEMÓRIA NÃO SE DISSIPE A P L AC E M A D E S O T H AT M E M O R I E S D O N OT D I S S I PAT E

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NELSON SOARES

O PRIMEIRO MUSEU IBÉRICO DEDICAD O AO TEMA DA “SHOAH” JÁ RECEBEU MAIS DE 30 M I L V I S I T A N T E S , D E S D E A A B E R T U R A E M A B R I L D E S T E A N O . H U G O VA Z , C U R A D O R D O M U S E U D O H O L O C AU S T O D O P O R T O , E X P L I C A O C O N C E I T O D E S T E E S PA Ç O D E M E M Ó R I A S E A I M P O R T Â N C I A D E “ N Ã O S E R E P E T I R U M D O S M A I S S O M B R I O S E P I S Ó D I O S D A H I S T Ó R I A”. PA R A J Á , O O B J E C T I V O D E S E A F I R M A R C O M O E S PA Ç O A V I S I TA R E S TÁ C O N S E G U I D O . T H E F I R S T I B E R I A N M U S E U M D E D I C AT E D T O T H E T H E M E O F T H E S H O A H H A S A L R E A D Y W E L C O M E D O V E R 3 0 , 0 0 0 V I S I T O R S S I N C E I T S O P E N I N G I N A P R I L O F T H I S Y E A R . H U G O VA Z , C U R AT O R O F T H E O P O R T O M U S E U M O F T H E H O L O C A U S T, E X P L A I N E D H O W T H E C O N C E P T O F T H I S S PA C E O F M E M O R I E S A N D T H E I M P O R TA N C E O F “ N E V E R R E P E AT I N G O N E O F T H E D A R K E S T E P I S O D E S I N H I S T O R Y ”. I N T H E M E A N W H I L E , T H E O B J E C T I V E O F A F F I R M I N G I T S P O S I T I O N A S A D E S T I N AT I O N T O V I S I T H A S B E E N A C H I E V E D .

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m museu portuense sobre o período do holocausto – o genocídio judeu executado pelo regime nazi – parecia, à partida, uma ideia remota, dada a escassa ligação da cidade àquele período histórico. No entanto, os cerca de 500 membros activos da Comunidade Judaica do Porto, a maior parte dos quais descendentes de refugiados da II Guerra Mundial, viram uma oportunidade no legado dos seus antepassados de “ir ao encontro do repto lançado pelo projecto governamental ‘Nunca Esquecer’” e manter viva a memória daqueles acontecimentos no nosso país. A isso, acrescenta Hugo Vaz, somou-se a participação de Portugal na Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, nascendo, assim, o primeiro museu ibérico sobre esta temática e onde, assinala o curador, são partilhados “os documentos e objectos deixados pelos refugiados na Sinagoga do Porto”, como os Sifrei Torá (rolos da Torá). Inaugurado em Abril de 2021, o Museu do Holocausto divide-se em três fases da comunidade judaica na Europa: o antes, o durante e o depois da II Guerra Mundial. Simbolicamente, os espaços variam a sua decoração entre áreas verdes e negras, consoante a gravidade dos momentos. A fase mais negra corresponde, naturalmente, ao período da perseguição nazi, dos campos de concentração e das execuções. É aqui, recorda o responsável, que estão os

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n Oporto museum on the holocaust – the genocide of Jews and others carried out by the Nazi regime – would seem a remote idea at the outset given the scarcity of any link between this city and that historical period. However, the around 500 active members of the Jewish Community of Oporto, the majority of whom are descendants of World War II refugees, perceived an opportunity for the legacy of their ancestors in “reaching out to the challenge launched by the government ‘Never Forget” project and maintain alive the memory of those events in Portugal. In addition, Hugo Vaz added, there was also the participation of Portugal in the International Alliance for the Memory of the Holocaust and thereby resulting in the first Iberian museum on this theme and which, the curator highlighted, shares “the documents and objects left behind by refugees in the Oporto Synagogue”, such as Sifrei Torá (roles of the Torah). Inaugurated in April 2021, the Museum of the Holocaust divides into three stages of the Jewish community in Europe: before, during and after World War II. Symbolically, the areas vary in their decoration, ranging between greens and blacks in accordance with the gravity of the contents. The darkest phase understandably corresponds to the period of Nazi persecution and the concentration camps and executions. It is here, the museum director pointed out, there are the

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A REPRODUÇÃO DA ENTR ADA E D E U M A D A S C A S A M ATA S D E AUSCHWITZ-BIRKENAU É UM D O S P R I N C I P A I S AT R A C T I V O S D O MUSEU DO HOLOCAUSTO THE REPRODUCTION OF THE ENTRANCE AND ONE OF THE GAS CHAMBERS IN AUSCHWITZBIRKENAU ARE KEY EXHIBITS IN THE MUSEUM OF THE HOLOCAUST

principais conteúdos do Museu: “a reprodução da entrada e de uma das casamatas de Auschwitz-Birkenau”, o maior campo de concentração nazi; “as fichas individuais dos refugiados que passaram pelo Porto e a sala de nomes, muitos deles de famílias da Comunidade Judaica do Porto”.

key Museum contents: “the reproduction of the entrance to one of the gas chambers in Auschwitz-Birkenau”, the largest Nazi concentration camp; “the individual files of refugees that passed through Oporto and the room of names, many of them family members of the Jewish Community of Oporto”.

30 mil já visitaram O percurso que os visitantes realizam no Museu obedece a uma sequência narrativa, contextualizando as vivências, as tradições e a cultura da população judaica. É um trajecto que, de acordo com Hugo Vaz, visa “promover a educação e a memória sobre o Holocausto”, travando a erosão do tempo sobre os acontecimentos e “sensibilizando os visitantes para que este, que é um dos mais sombrios episódios da nossa História, não se volte a repetir”. “A memória tende a dissipar-se e o tema tende a ser rejeitado, como tem acontecido um pouco por todo o mundo”, sublinha o curador da instituição. Além dos materiais que estão em exposição permanente, o Museu do Holocausto promove outras iniciativas, que decorrem, segundo Hugo Vaz, de “parcerias com embaixadas como a dos EUA e da Rússia”. Exposições temporárias ou cursos de formação, como o que foi promovido em Setembro passado para professores e que tinha por objectivo oferecer ferramentas para o ensino da história e cultura judaica, são frequentes na instituição. Desde a abertura, o espaço foi já visitado por mais de 30 mil pessoas. Hugo Vaz acredita que “é um dos museus mais visitados de Portugal”, assumindo “sem dúvida alguma” um lugar de destaque no mapa cultural da cidade do Porto e da região. O Museu do Holocausto é uma iniciativa Comunidade Judaica do Porto, inspirada no equipamento com o mesmo nome, situado em Washington DC. Está aberto todos os dias úteis, entre as 14h30 e as 17h30, não abrindo aos fins de semana e nos feriados judaicos. l

30,000 have already visited The route that visitors take through the Museum follows a narrative sequence, contextualising the livelihoods, traditions and cultures of the Jewish people. This runs from a trajectory that, according to Hugo Vaz, seeks to “promote education and memory about the Holocaust”, halting time’s erosion of these events and raising the “awareness of visitors so that they, which is one of the darkest episodes in our history, never let this be repeated”. “Memories tend to dissipate and the theme begins to get rejected as has happened to a certain extent worldwide”, emphasised the curator. In addition to the materials that are on permanent exhibition, the Museum of the Holocaust hosts other initiatives that are taking place that Hugo Vaz said stemmed from “partnerships with embassies such as those of the United States and Russia”. Temporary exhibitions or training programs as was the case last September for teachers with the specific objective of providing tools for the teaching of Jewish history and culture, are also frequently hosted by the institution. Since its outset, the museum has already been visited by over 30,000 people. Hugo Vaz believes that “this makes it one of the most visited museums in Portugal”, assuming “without the shadow of a doubt” a leading role on the cultural map of Oporto and its surrounding region. The Museum of the Holocaust is an initiative from the Jewish Community of Oporto, inspired on the museum with the same name located in Washington DC. The museum is open weekdays between 2.30pm and 5.30pm and closed both on weekends and Jewish holidays. l

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GIRL MOVE ACADEMY DISTINGUIDA PELA UNESCO GIRL MOVE ACADEMY DISTINGUISHED BY UNESCO

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U M P R É M I O P E L O T R A B A L H O E M E T O D O L O G I A D E S E N V O LV I D O S N A E D U C A Ç ÃO D E R A PA R I G A S E M U L H E R E S M O Ç A M B I C A N A S . U M M O V I M E N T O T R A N S F O R M A D O R Q U E J U N TA J O V E N S M U L H E R E S D E D I F E R E N T E S I DA D E S E E M D I S T I N TA S FA S E S D E D E S E N V O LV I M E N T O PA R A S E INSPIRAREM, APOIAREM E TRANSFORMAREM MUTUAMENTE. A N AWA R D F O R B O T H T H E W O R K A N D M E T H O D O L O G Y D E V E L O P E D F O R T H E E D U C AT I O N O F M O Z A M B I C A N G I R L S A N D W O M E N . A T R A N S F O R M AT I V E M O V E M E N T T H AT B R I N G S T O G E T H E R Y O U N G W O M E N O F D I F F E R E N T A G E S A N D D I S T I N C T P H A S E S O F D E V E L O P M E N T T O G A I N M U T U A L I N S P I R AT I O N , S U P P O R T A N D T R A N S F O R M AT I O N .

ANA VAL ADO

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mplificar o talento feminino, promovendo uma nova geração de jovens mulheres líderes e agentes de mudança a gerar transformação sustentável. Esta é a missão da Girl MOVE, a primeira organização portuguesa a ser distinguida com o Prémio da UNESCO - para a Educação de Raparigas e Mulheres 2021, reconhecendo o valor e o trabalho desenvolvido em Moçambique. O objectivo desta Academia de Liderança é alterar o contexto social existente com a criação de novos modelos de referência e desta forma contribuir para uma sociedade mais equitativa e com mais oportunidades para as mulheres, amplificando o seu talento, promovendo a igualdade de género e gerando transformação sustentável. Em termos globais, em diversos sectores, são cada vez mais os exemplos de mulheres de referência a assumir cargos de liderança. Mas é preciso ir mais além, falar mais sobre o tema, passar da teoria à prática e implementar medidas que mudem o panorama da representatividade e equidade. É aqui a o Girl MOVE tem um papel preponderante, através dos seus vários programas e promovendo o empreendedorismo, a liderança e a mentoria entre as mulheres, empoderando jovens mulheres para que se tornem a nova geração de ‘changemakers’, através de um modelo de mentoria que vê cada jovem mulher como uma “mana” para mudar o mundo. O prémio UNESCO reconhece internacionalmente a metodologia da Girl MOVE como inovadora e eficaz, que através de círculos de mentoria intergeracionais potenciam o talento e liderança feminina. Um movimento transformador que junta jovens mulheres de diferentes idades e em distintas fases de desenvolvimento para se inspirarem, apoiarem e transformarem mutuamente. “A atribuição do Prémio da UNESCO é o reconhecimento

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mplifying female talent, fostering a new generation of young women leaders and agents of change for sustainable transformation: this is the mission of Girl MOVE, the first Portuguese organisation to be distinguished with the UNESCO Award – for the Education of Girls and Women 2021 in recognition of the value of the work carried out in Mozambique. The objective of this Leadership Academy encapsulates changing the existing social context through setting out new models of reference and in this way contributing to a more equal society and with more opportunities for women, amplifying their talents, nurturing their gender equality and generating sustainable transformation. In global terms, across diverse sectors, there are ever more examples of female references taking up positions of leadership. But there remains the need to go still further, to talk more about this theme, to move from theory to practice and implement measures that change the panorama for representation and equity. This is where Girl MOVE plays a preponderant role through its various programs and fostering the entrepreneurship, leadership and mentoring of women, empowering young women in order to produce a new generation of ‘changemakers’ through a mentoring model that perceives each woman as a “sister” for changing the world. The UNESCO award internationally recognises the Girl MOVE methodology as innovative and efficient which, through the circles of intergenerational mentoring, enables female talent and leadership. A transformative movement that brings together women from all different age groups and in distinctive phases of development to seek mutual inspiration, support and transformation. “The awarding of the UNESCO Prize is the recognition that we are working on the right approach, creating impact 169


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“ TER CONSCIÊNCIA, LIBERDADE, FÉ, AMOR PRÓPRIO, CONFIANÇA, VOZ PRÓPRIA, JUNTAR AS MÃOS E SER A MUDANÇA. É ASSIM QUE RESUMO A MINHA EXPERIÊNCIA NA GIRL MOVE ACADEMY. É MAIS DO QUE UMA EXPERIÊNCIA DE VIDA. É UMA MANEIR A DE VIVER. AGOR A EU SEI QUE NÓS, AS MULHERES, PODEMOS FAZER O QUE QUISERMOS, SE NUNCA PAR ARMOS DE ACREDITAR E LIDER AR O NOSSO PRÓPRIO CAMINHO COM ESPER ANÇA, AMOR, ALEGRIA E MUITO TR ABALHO DURO!” OCÉLIA FERRO | TURMA DE 2018 COORDENADOR A AMBIENTAL NA CDM (CERVEJAS DE MOÇAMBIQUE) “HAVING A CONSCIENCE, FREEDOM, FAITH, SELF -ESTEEM, CONFIDENCE, YOUR OWN VOICE, JOINING HANDS AND BEING THE CHANGE. THAT IS HOW I WOULD SUMMARISE MY EXPERIENCE IN THE GIRL MOVE ACADEMY. THIS IS MORE THAN JUST AN EXPERIENCE OF LIFE. THIS IS A WAY OF LIVING. NOW, I KNOW THAT WE WOMEN ARE ABLE TO DO WHATEVER WE WANT IF WE NEVER STOP BELIEVING AND TAKING OUR OWN PATHS WITH HOPE, LOVE, HAPPINESS AND A LOT OF HARD WORK!” OCÉLIA FERRO | CL ASS OF 2018 ENVIRONMENTAL COORDINATOR OF CDM (CERVEJAS DE MOÇAMBIQUE)

que estamos a trabalhar no caminho certo, criando impacto e transformação real na sociedade. Activar o talento e a liderança desta nova geração, torna-nos parte de uma missão maior de transformar Moçambique, África e a humanidade num lugar melhor e mais sustentável”, refere Alexandra Machado, CEO e co-fundadora da Girl MOVE. Em Moçambique cerca de 45% das raparigas casam ou engravidam antes dos 18 anos, 31% transitam para o ensino secundário e apenas 2% completam a universidade. Com a sua intervenção, desde 2014, a Girl MOVE tem vindo a inverter esta realidade e já contribuiu para transformar a vida de milhares raparigas e jovens mulheres em Moçambique. Depois da frequência na Academia, cerca de 100% das jovens licenciadas, que passaram pelo programa em menos de 3 meses, conseguiram ingressar numa carreira de impacto, e 90% das raparigas adolescentes transitaram para a escola secundária (vs 30% de acordo com dados nacionais). A trabalhar em estreita colaboração com várias empresas portuguesas, esta academia já formou milhares de raparigas e mulheres moçambicanas, que hoje estão prontas para mudar a sua realidade e qualidade de vida e assumir uma posição de destaque no mundo onde estão inseridas. l 170

and real transformation in society. Activating talent and leadership in this new generation make us part of a larger mission to transform Mozambique, Africa and humanity into a better and more sustainable place”, declared Alexandra Machado, CEO and co-founder of Girl MOVE. In Mozambique, around 45% of females marry or get pregnant prior to the age of 18, 31% carry on into secondary schools and only 2% complete university. With this intervention, ongoing since 2014, Girl MOVE has been inverting this reality and has already contributed towards transforming the lives of thousands of girls and young women throughout Mozambique. After having attended the Academy, practically 100% of the young female graduates attending the program are able to get into an impact career within the following three months and 90% of adolescent girls continue into secondary school (vs 30% according to national data). Working in close collaboration with various Portuguese companies, this academy has already trained thousands of Mozambican girls and women who are today ready to change their reality and quality of life and assume positions in their surrounding contexts. l


24ª EDIÇÃO

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SUGESTÕES LEITURA

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FICHEIROS SECRETOS Luís Osório O mais recente trabalho de Luís Osório é um manual de (in)confidências de quem conviveu de perto com alguns dos mais eminentes protagonistas da vida pública portuguesa. Ao longo de 30 anos, o jornalista e escritor – que dirigiu A Capital e o Rádio Clube Português, entre outros meios de informação – foi registando estórias e episódios, que se encontravam até hoje no domínio do secretismo. É esse registo que agora torna público, aproveitando o distanciamento temporal dos acontecimentos, numa obra que ajuda a perceber o país à luz das personalidades que mais o marcaram nas últimas décadas. Através deste livro, podemos compreender a relação anterior ao 25 de Abril que unia Cunhal e Soares. Ou a proverbial frieza de Cavaco. Mas também situações meramente picarescas, como a galinha oferecida a Sampaio ou a penhora de Catroga à casa de banho de um clube. Por outro lado, há revelações de ordem psicanalítica, como a morte prematura do único irmão de Saramago. Fragmentos de história, no regresso de Luís Osório à não ficção.

FICHEIROS SECRETOS Luís Osório The most recent work by Luís Osório is a manual of (in)confidences from a person who has lived close to some of the most eminent figures in Portuguese public life. Over the course of three decades, the journalist and writer – who edited A Capital and Rádio Clube Português, among other media outlets – went about recording stories and episodes that have hitherto remained under the veil of secrecy. These records are now becoming public, taking advantage of the temporal distancing of the events in a work that helps us to understand the country through the personalities of those who had greatest impact in recent decades. Through this book, we may better grasp the relationship prior to the 25 April revolution that united Cunhal and Soares. The proverbial coldness of Cavaco. But also the merely picaresque scenarios such as the hen given to Sampaio or Catroga ordering the seizure of a club’s bathroom. Furthermore, there are revelations of a psychoanalytic nature, such as the premature demise of Saramago’s only brother. Fragments of history in the return of Luís Osório to non-fiction.

DA MUTAMBA AO ROSSIO Luís Fernando Fiet Prestigiado jornalista e escritor angolano, Luís Fernando Fieti integrou, desde muito jovem, algumas das principais redacções do seu país, como o Jornal de Angola ou O PAÍS, tendo dirigido ambos os títulos. Tendo passado por diversos órgãos de informação, o salto para a escrita não jornalística acabou por ser um passo natural. O seu primeiro livro data de 1999 (Noventa Palavras), mas já assinou diversas obras ao longo de mais de duas décadas de actividade literária, sendo Da Matumba ao Rossio o mais recente trabalho publicado. A obra faz referência à ligação entre Angola e Portugal, apresentandose como um conjunto de “crónicas para os de cá e os de lá”. Tal como refere Alice Donat Trindade no prefácio do livro, o trabalho de Luís Fernando valoriza “o que era somente longínquo, exótico ou mesmos considerado periférico”. De Angola, surgem relatos vívidos das experiências, relações e paisagens que se encontram facilmente no país. Já no Rossio, de Lisboa, a imagem de um bucolismo cosmopolita, em que a cidade pára para ver as mesmas coisas.

DA MUTAMBA AO ROSSIO Luís Fernando Fiet A renowned Angolan journalist and writer, Luís Fernando Fieti has been, since a very young age, on some of the leading news desks of his country, such as Jornal de Angola or O PAÍS newspapers, having edited both titles. Having experience of diverse media outlets, the step into non-journalism emerged naturally. His first book dates from 1999 (Noventa Palavras) and he has signed off on a range of different works over the course of over two decades of literary activities with Da Matumba ao Rossio his most recently published book. This work takes the connection between Angola and Portugal as its references and presents itself as a set of “chronicles for those from here and for those from there”. As Alice Donat Trindade states in the preface, the writing of Luís Fernando values “what was only far distant, exotic or even considered peripheral”. From Angola, there come accounts of experiences lives, relationships and landscapes so easy to encounter in the country. In turn, in Rossio, Lisbon, the image emerges of a bucolic cosmopolitanism in which all the city stops to see the same thing.


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SUGESTÕES LEITURA LITERATURA E CULTURA EM TEMPOS DE PANDEMIA UCCLA Apresentado pela União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) no início deste ano, “Literatura e Cultura em Tempos de Pandemia” é o contributo desta organização intermunicipal para reflectir sobre o impacto que a Covid-19 representou na cultura da comunidade lusófona, especialmente ao nível da criação literária. Desafiados pela UCCLA a participar nesta compilação, nomes consagrados das letras, como Manuel Alegre, Mia Couto, José Luís Mendonça ou Germano de Almeida convivem com outros autores em ascensão, num conjunto de ensaios, contos e poesias que exprimem a diversidade da cultura lusófona e as diferentes perspectivas com que cada território – incluindo Galiza, Olivença, Macau e Goa – encarou o drama da pandemia. Além dos trabalhos literários, a obra conta ainda com uma apresentação do Secretário-geral da UCCLA, Vítor Ramalho, e um texto de investigação e contexto histórico sobre as pandemias no Mundo, do historiador Rui Lourido. O livro está disponível nas livrarias, com distribuição da Guerra e Paz.

SUSTAINABLE SUCCESS - THE FUTURE OF TECHNOLOGY, LEADERSHIP AND CULTURE VdA – Paula Gomes Freire Paula Gomes Freire, group executive partner e futura managing partner da VdA, sociedade de advogados, é a autora do livro “Sustainable success - The future of technology, leadership and culture”. Uma abordagem multidisciplinar às questões relacionadas com a sustentabilidade das organizações, a respetiva liderança e os desafios que o futuro lhes coloca. A autora agrega contributos de diferentes áreas como o direito, a tecnologia, as ciências da vida ou a banca, para uma reflexão alargada sobre as transformações que estão a ocorrer ao nível das empresas e demais organizações, com uma transição tecnológica cada vez mais acelerada e disruptiva, que altera radicalmente o paradigma da gestão. Personalidades como Carlos Moedas (Comissão Europeia / CM Lisboa) Manuela Veloso (J.P. Morgan), Annette Kroeber-Riel (Google Europa), John Collins (Banco Santander RU) alimentam a discussão e as ideias fundamentais presentes no livro, que está acessível para ‘download’ gratuito através do site da VdA (www.vda.pt).

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LITERATURA E CULTURA EM TEMPOS DE PANDEMIA UCCLA Published by the UCCLA – the Union of Portuguese Language Capital Cities at the beginning of this year, “Literatura e Cultura em Tempos de Pandemia” is the contribute of this intermunicipal organisation to reflect on the impact that Covid-19 represented on the culture of the Portuguese language community, especially in terms of literary creativity. Challenged by the UCCLA to participate in this compilation are renowned figures from the arts and letters, including Manuel Alegre, Mia Couto, José Luís Mendonça and Germano de Almeida alongside other rising authors in a set of essays, short stories and poetry expressing the diversity of the Lusophone culture and the different perspectives of each territory – including Galiza, Olivença, Macau and Goa – staging the drama of the pandemic. In addition to the literary works, the work also includes a presentation by the UCCLA Secretary-General, Vítor Ramalho, and a research text and the historical context of pandemics worldwide by the historian Rui Lourido. The compilation is available in bookstores, distributed by Guerra e Paz.

SUSTAINABLE SUCCESS - THE FUTURE OF TECHNOLOGY, LEADERSHIP AND CULTURE VdA – Paula Gomes Freire Paula Gomes Freire, group executive partner and a future managing partner at VdA, a law firm, is the author of “Sustainable success - The future of technology, leadership and culture”. A multidisciplinary approach to questions surrounding the sustainability of organisations, their respective leaderships and the challenges that the future holds for them. The author brings together contributions from different areas such as law, technology, the life sciences and financing for a broad reaching reflection on the transformations taking place in companies and other organisations with the increasingly accelerated and disruptive technological transition that radically alters the management paradigm. Figures such as Carlos Moedas (European Commission / Lisbon Council President) Manuela Veloso (J.P. Morgan), Annette Kroeber-Riel (Google Europe), John Collins (Banco Santander UK) feed this discussion and the fundamental ideas presented in this book which is available free of any charge to download from the VdA website (www.vda.pt).


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