Glaucoma na infância

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ISBN 978-85-7006-698-5

9 788570 066985

gl aucoma na infância

www.culturamedica.com.br

Christiane Rolim de Moura Camila Fonseca Netto | Bruno L. B. Esporcatte

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Editores Christiane Rolim de Moura Camil a Fonseca Net to Bruno L. B. Esporcat te

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EDITORES Christiane Rolim de Moura Mestre em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutora em Ciências pela UNIFESP. Pós-Doutorado pela UNIFESP. Professora Afiliada do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP.

Camila Fonseca Netto Post-Doctoral Fellowship New York Eye and Ear Infirmary. Chefe do Núcleo de Glaucoma Infantil do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela UNIFESP.

Bruno L. B. Esporcatte Professor Substituto de Oftalmologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutor em Ciências pela UFRJ. Doutorando em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela UNIFESP.

Rio de Janeiro – RJ – Brasil

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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ G552   Glaucoma na infância / editores Christiane Rolim de Moura, Camila Fonseca Netto, Bruno L. B. Esporcatte. - Rio de Janeiro : Cultura Médica, c2019. p. ; il.

Vários colaboradores. ISBN 978-85-7006-698-5

1. Glaucoma. 2. Pressão intraocular. 3. Oftalmopatias. 4. Saúde infantil. I. Rolim de Moura, Christiane. II. Netto, Camila Fonseca. III. Esporcatte, Bruno L. B.

CDD: 617.741 CDU: 617.7-007.681

© Copyright 2019, by Cultura Médica Esta obra está protegida pela Lei no 9.610 dos Direitos Autorais, de 19 de fevereiro de 1998, sancionada e publicada no Diário Oficial da União em 20 de fevereiro de 1998. Em vigor a Lei 10.693, de 1o de julho de 2003, que altera os Artigos 184 e 186 do Código Penal e acrescenta Parágrafos ao Artigo 525 do Código Penal. Caso ocorram reproduções de textos, figuras, tabelas, quadros, esquemas e fontes de pesquisa, são de inteira responsabilidade do(s) autor(es). Qualquer informação, contatar a Cultura Médica® Impresso no Brasil Printed in Brazil Responsável pelo Layout/Formatação: Cultura Médica Crédito da foto de capa: iStock/utkamandarinka

Cultura Médica® Rua Gonzaga Bastos, 163 20541-000 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil Tel. (55 21) 2567-3888/3173-8834 Site: www.culturamedica.com.br e-mail: cultura@culturamedica.com.br

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Autores Convidados

Alberto Jorge Betinjane

Cristiana Ronconi

Professor-Associado da Universidade de São Paulo (USP).

Mestrado Profissional em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialização em Oftalmopediatria pela UT Southwestern Medical Center, Dallas, EUA. Especialização em Oftalmopediatria pela UNIFESP. Especialização em Vias Lacrimais, Oculoplástica e Órbita pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Alessandra Kusabara Assistente Voluntária do Setor de Glaucoma do Departamento de Oftalmologia da Santa Casa de São Paulo.

Allen Dale Beck Professor, Emory University, Atlanta, Georgia, USA.

André Soares de Camargo Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Responsável pelo setor de Glaucoma Pediátrico do Hospital de Olhos Sadalla Amin Ghanem, Joinville, SC.

Andrea Zin Mestre em Oftalmologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Doutora em Ciências pelo Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/FIOCRUZ), RJ. Pesquisadora Associada da Unidade de Pesquisa Clínica do IFF/ FIOCRUZ.

Annette Giangiacomo Associate Professor, Emory University, Atlanta, Georgia, USA.

Augusto Paranhos Jr Mestre em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutor em Ciências Médicas pela UNIFESP. Livre-Docente pela UNIFESP. Professor Adjunto e Orientador da Pós-Graduação do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP.

Eglailson Dantas Almeida Júnior Médico Oftalmologista do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes/EBSERH. Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Elaine Caetano de Souza Ortoptista da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Tecnóloga Oftálmica da Universidad de Puerto Rico. Mestre em Ciências Visuais pela UNIFESP.

Felício Aristóteles da Silva Doutorado em Medicina e Pós-Doutorado em Glaucoma (Profs. Wolfgang Leydhecker e Günter Krieglstein na Universidade Julius Maximiliam, Würzburg, Alemanha). Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Glaucoma. Oftalmologista Associado do Centro de Oftalmologia Avançada (COA), Belo Horizonte, MG.

Flávio Siqueira Santos Lopes Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialização em Retina e Uveíte pela UNIFESP. Doutorando em Oftalmologia pela UNIFESP.

Carlos Akira Omi Mestre em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutor em Oftalmologia pela UNIFESP. Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Glaucoma (Gestão 20072009).

Célia Regina Nakanami Mestre e Doutora pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Diploma em Community Eye Health pela London School of Hygiene and Tropical Medicine. Chefe do Setor de Baixa Visão e Reabilitação Visual, e do Núcleo de Oftalmopediatria do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP.

Francisco Eduardo Lopes de Lima Doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP). Professor Afiliado da Universidade Federal de Goiás (UFG). Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Glaucoma. Departamento de Glaucoma e Catarata do Centro Brasileiro de Cirurgia de Olhos, Goiânia, Goiás.

Geraldo Vicente de Almeida Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Doutor em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

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Graziela Massa Resende Médica Assistente do setor de Glaucoma da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Doutora em Oftalmologia/Ciências Médicas pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

João Caetano Ávila Geraissate Pós-Graduando (Doutorado) da Universidade Federal de Goiás. Departamento de Glaucoma da Universidade Federal de Goiás. Departamento de Glaucoma do Centro Brasileiro da Visão, Brasília, Distrito Federal

José Paulo Cabral de Vasconcellos Doutor em Ciências Médicas, área de concentração Oftalmologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor MS-3 do Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia, FCM, UNICAMP.

Julia Rossetto Especialista em Oftalmologia Pediátrica e Estrabismo. Especialista em Plástica Ocular. Mestre pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutora pela UNIFESP e Bascom Palmer Eye Institute Miami/FL.

Juliana Maria Ferraz Sallum Título de Especialista em Oftalmologia e em Genética Clínica. Mestrado em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutorado-Sanduíche Johns Hopkins University e UNIFESP. Professora Afiliada do Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. Professora da Pós-Graduação em Oftalmolgia na UNIFESP.

Fellowship em Patologia Ocular pela AFIP – Armed Forces Institute of Pathology Washington EUA, Moorfilelds Eye Hospital Londres, Inglaterra e Hotel Dieu de Paris, França.

Marcio Mendes Doutor em Medicina pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC FMUSP). Médico Assistente do Setor de Glaucoma do HC FMUSP.

Maria Papadopoulos MB BS FRACO. Consultant Ophthalmic Surgeon. Glaucoma Service. Moorfields Eye Hospital, London, UK.

Maurício Della Paolera Professor-Assistente da Santa Casa de São Paulo. Mestre pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutor pela Santa Casa de São Paulo.

Mônica Barbosa de Melo Doutora em Ciências Biológicas, área de concentração Genética e Evolução pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Pesquisadora do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética pela UNICAMP.

Monique Kling Mangeon Médica Assistente do Instituto de Oncologia Pediátrica do GRAACC/UNIFESP, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Niro Kasahara

Luiz Alberto S. Melo Jr.

Professor Adjunto de Oftalmologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Chefe do Setor de Glaucoma do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Nívea Nunes Ferraz

Médico-Chefe do Serviço de Oncologia Ocular do Instituto de Oncologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Doutorado em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Professora Adjunta do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP.

Marcia Reis Guimarães

Norma Allemann

Luiz Fernando Teixeira

Professora Dra. Chefe do Departamento de Neurovisão do Hospital de Olhos de MG. Professora Convidada do Curso Ciências Básicas em Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Módulos Embriologia e Histologia desde 1989. Professora de Pós-Graduação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Professora Adjunta de Oftalmologia da FASEH. Professora Adjunta de Genética Médica da Universidade FUMEC. Residência em Oftalmologia pela Faculdade de Ciências Médicas – Sta. Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, MG. Doutorado em Oftalmologia pela Faculdade de Medicina da UFMG, do Hospital São Geraldo. Mestre em Biologia Ocular pela Universidade de Paris V, França.

Professora Adjunta do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Chefe da Disciplina do Departamento de Oftalmologia e Ciências da UNIFESP. Professora Orientadora da Pós-Graduação do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP. Volunteer Faculty, Department of Ophthalmology & Visual Sciences (University of Illinois at Chicago – UIC).

Paula Reis Guimarães Médica Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa Avançada em Neurovisão da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Médica Residente em Oftalmologia no Hospital Evangélico de Belo Horizonte.

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Professor Sir Peng Tee Khaw

Rubens Andrade Grochowski

PhD FRCS FRCP FRCOphth FRCPath FRSB FCOptom (Hon) DSc FARVO FMedSci. Professor of Glaucoma and Ocular Healing, and Consultant Ophthalmic Surgeon. Director, National Institute for Health Research Biomedical Research Centre for Ophthalmology. Moorfields Eye Hospital and UCL Institute of Ophthalmology, London, UK.

Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Minais Gerais (UFMG). Especialista em Oftalmologia pela Santa Casa de São Paulo. Especialista em Glaucoma pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Oftalmologista do Hospital de Olhos de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.

Ralph Cohen Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Doutor em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Regina Cele da Silveira Médica Voluntária do Setor de Glaucoma da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Sócia Diretora do HCLOE. Mestrado em Administração pela UNIFESP.

Vespasiano Rebouças Especialização em Oftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especialização em Glaucoma Adulto e Infantil pela UNIFESP.

Vital Paulino Costa Professor Associado da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Chefe do Setor de Glaucoma da UNICAMP. Responsável pela Pós-Graduação em Oftalmologia da UNICAMP.

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Agradecimentos

Aos meus pais e minha família, Mateus, Gabriel e Breno, obrigada pelo incondicional apoio, amor, tolerância, aprendizado e união. A meu irmão Cassiano (in memoriam), fonte de inspiração. A meus coeditores, Camila e Bruno, incansáveis, energéticos e amigos. Aos colaboradores, pelo trabalho primoroso na elaboração de seus textos. Aos colegas da Sociedade Brasileira de Glaucoma, em especial, os membros da atual diretoria, Wilma, Marcelo, Roberto, Cristiano e Lisandro. Minhas companheiras de consultório, Luciene e Licia, parceiras em intervenções complementares. E, em especial, a todos os pacientes que direta ou indiretamente colaboraram para o êxito da conclusão desta obra. Muitos deles, ao longo de uma jornada de vida, depositaram em mim a confiança do cuidado de seus olhos. Christiane Rolim de Moura

Ao meu pai Ronaldo, minha primeira inspiração na Medicina. À minha mãe Lucia, pela dedicação incansável e amizade desde sempre. Ao meu irmão Leonardo, pela parceria de sempre. À minha avó Dadá, pela incansável entrega e acolhimento. Ao meu marido Luiz, pela parceria e por ser um exemplo de inteligência e ética. Às minhas professoras Christiane Rolim e Regina Cele, por terem me ensinado tanto de Glaucoma na Infância. Ao meu amigo e parceiro Bruno Esporcatte, por toda competência e dedicação com a Oftalmologia. E, por fim, aos pacientes que me confiaram sua saúde e com os quais construí uma linda relação. Camila Fonseca Netto

Toda grande jornada se inicia com um pequeno passo. Agradeço à minha avó Ceny pelos primeiros incentivos ao estudo e à leitura, sem os quais, provavelmente o caminho teria sido mais tortuoso. Ao meu avô Antonio (in memoriam) pela dedicação e exemplo de força ao superar as adversidades que surgiram em nossas vidas. À minha mãe Ana Gisele, por todo apoio incondicional e suporte nos momentos difíceis. Ao meu pai Roberto, pelo exemplo profissional e por toda orientação na minha carreira até hoje. À minha esposa Louise que me acolhe e apoia a qualquer instante. Juntos somos mais fortes. À Dra. Camila Netto pelo companheirismo e incontáveis ajudas. À Prof. Christiane Rolim de Moura por todo o treinamento teórico e cirúrgico durante o fellow em Glaucoma e pelo honroso convite para participar desta obra. A todo corpo clínico do setor de Glaucoma da Universidade Federal de São Paulo. É uma honra conviver e aprender com vocês. Bruno L. B. Esporcatte

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Apresentação

É amplamente conhecida a gravidade dos glaucomas que acometem a infância. Além da degeneração do nervo óptico relacionada à pressão intraocular elevada – característica comum à doença que acomete o adulto –, o Glaucoma na Infância atinge uma população em franco desenvolvimento neuropsicomotor, extremamente dependente do estímulo visual. O objetivo deste livro é apresentar, aos que se dedicam ao cuidado do glaucoma, um material específico, abordando as formas da doença que atingem a infância. Descrevo brevemente o caminho que levou à minha aproximação do cuidado e estudo desse grupo de doenças. Apesar do interesse na área da Genética Médica, a aprovação no concurso de residência de Oftalmologia na Universidade Federal de São Paulo fez sobressair em mim o interesse pela especialidade. Durante o Curso Básico de Oftalmologia, promovido pelo Centro de Estudos Moacyr Álvaro do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais, liderado pelo Professor Rubens Belfort Junior com ânimo pujante, tive os primeiros ensinamentos na área do Glaucoma. A aula de Técnica Cirúrgica no Glaucoma Congênito ministrada pelo Professor José Carlos Reis (in memoriam), foi cativante, motivando a escolha da subespecialidade O contato com o professor Geraldo Vicente de Almeida, na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, e com os professores Ralph Cohen, Walter Amorim, Carlos Akira Omi, Paulo Augusto de Arruda Mello, João Antônio Prata Júnior e Mauricio Della Paolera, durante o estágio de Glaucoma na UNIFESP, fez-me compreender a importância do manejo do Glaucoma na Infância. Em 1999, durante um clinical fellow no Doheny Eye Institute, CA, USA, sob supervisão do Dr. Rohit Varma, dediquei-me a levantar dados sobre os resultados cirúrgicos em crianças com implantes de drenagem desenvolvidos pelo Dr. Baerveldt, que já por 10 anos usara essa técnica, mostrando taxas promissoras de sucesso. Desde então, sigo dedicando-me aos cuidados do Glaucoma na Infância, atenta à grande quantidade de métodos de exames, técnicas cirúrgicas e possibilidades de habilitação visual, estudados e publicados ao longo desses 20 anos. Em 2011, um grupo de médicos de diferentes partes do mundo, com o interesse comum, iniciou a tarefa de uniformizar a classificação e os critérios diagnósticos, e traçar diretrizes para o tratamento dessas doenças. Esse processo culminou com a elaboração do Consenso sobre Glaucoma na Infância, apoiado pela Associação Mundial de Glaucoma, publicado em forma de livro, em 2013, do qual tive a honra de fazer parte. À minha declarada paixão pela área, somou-se a energia dos coeditores deste livro, a Dra. Camila Netto e o Dr. Bruno Esporcatte, que se aliaram a mim nesta empreitada: desenvolver um material nacional, baseado na nossa experiência, e na de colegas de diferentes instituições brasileiras e internacionais, os quais se dedicam ao manejo do Glaucoma na Infância. A respeito dos colegas brasileiros e internacionais, escolhidos metodicamente de acordo com sua área de interesse, é necessário realçar a enorme disposição em colaborar. Mesmo com tempo exíguo, situação de todos nós, penso que o tema e a amizade foram profícuos para que a obra nascesse, fruto da dedicação conjunta. Assim sendo, espero que o livro traga proveito aos especialistas em glaucoma, que lhes abra horizontes para seguirem na assistência e pesquisa na área, de forma que, em última instância, traga o desenvolvimento pleno das crianças e o bem-estar de seus familiares, objetivo final do trabalho do médico. Christiane Rolim de Moura

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Prefácio

Inicialmente é para nós uma grande distinção poder apresentar esta obra encabeçada pela professora Chistiane Rolim de Moura, profissional de cujo treinamento em oftalmologia e especialmente na introdução à glaucomatologia tivemos a satisfação de participar. A Dra. Christiane reuniu, ao longo dos anos, profundos conhecimentos da especialidade e possui habilidades cirúrgicas ímpares. Dedicou-se ao estudo do glaucoma congênito, acumulando grande experiência na área. É, sem dúvida, o profissional mais indicado para a compilação desta inédita obra. Glaucoma na Infância vem preencher uma lacuna na literatura nacional, por ser uma obra especialmente dedicada aos glaucomas pediátricos e redigida por colegas com inegável experiência sobre os temas expostos, como pode ser facilmente constatado durante a leitura dos capítulos. O livro está dividido em quatro partes. A Parte 1 é direcionada aos princípios anatômicos, embriológicos, genéticos e epidemiológicos envolvidos no estudo do glaucoma da infância. Orienta perfeitamente o oftalmologista de forma sintética, porém, completa sobre os temas propostos. A Parte 2 trata da propedêutica do glaucoma infantil, desde suas particularidades biomicroscópicas até técnicas avançadas de imagem, sempre mantendo a riqueza de detalhes com alto poder de síntese. Destacam-se as ótimas imagens gonioscópicas. A Parte 3 versa sobre as formas clínicas e, novamente, ressalta-se o texto claro e a riqueza de imagens, que, em glaucomas pediátricos, não são de fácil obtenção. Ai estão contempladas todas as formas de glaucoma na infância. A Parte 4 esclarece, pormenorizadamente, cada estratégia cirúrgica disponível, orientando muito bem o leitor quanto às suas indicações e modos de melhorar os resultados de forma sintética e completa. Muito importante é o Capítulo 24, Habilitação e Reabilitação Visual. Muitas vezes, observa-se resultado cirúrgico excelente, mas o resultado funcional não condiz com o anatômico devido à falta de ações simples, como refração e tratamento de estrabismo e ambliopia. Em síntese, trata-se de uma obra de significativa contribuição à literatura oftalmológica, inédita, de leitura agradável e muito proveitosa. Parabenizamos os editores e colaboradores pelo excelente trabalho e o recomendamos a quem deseja aprofundar-se no estudo dos glaucomas na infância. João Antonio Prata Junior Professor Adjunto de Oftalmologia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Livre-Docente de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

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Sumário

PARTE 1  Princípios Básicos

1 Embriologia do Seio Camerular............................................. 3 Marcia Reis Guimarães • Paula Reis Guimarães • Rubens Andrade Grochowski

2 Definição, Classificação e Diagnóstico Diferencial dos

Glaucomas na Infância...................................................... 17 Christiane Rolim de Moura

3 Epidemiologia................................................................ 25 Julia Rossetto • Andrea Zin

4 Genética....................................................................... 29 Seção 4.1  Genética Relacionada ao Glaucoma............................................. 29 José Paulo Cabral de Vasconcellos • Mônica Barbosa de Melo

Seção 4.2  Aconselhamento Genético......................................................... 35 Juliana Maria Ferraz Sallum

PARTE 2  Propedêutica do Glaucoma na Infância

5 Anamnese no Glaucoma na Infância...................................... 41 Alberto Jorge Betinjane

6 Particularidades da Tonometria, Exame Biomicroscópico,

Gonioscopia, Exame do Segmento Posterior e Refração............... 47 Bruno L.B. Esporcatte • Vespasiano Rebouças • Cristiana Ronconi

7 Perimetria..................................................................... 63 Elaine Caetano de Souza • Christiane Rolim de Moura

8 Espessura Central da Córnea............................................... 75 Marcio Mendes

9 Avaliação Ultrassonográfica no Glaucoma Infantil |

Ultrassonografia Modos A e B............................................... 81 Felício Aristóteles da Silva

10 Imagens de Segmento Anterior no Glaucoma............................ 93 Norma Allemann

11 Tomografia de Coerência Óptica na Infância.......................... 105 Eglailson Dantas Almeida Júnior • Christiane Rolim de Moura

PARTE 3  Formas Clínicas

12 Glaucoma Congênito Primário........................................... 123 Camila Fonseca Netto • Bruno L. B. Esporcatte • Christiane Rolim de Moura

13 Glaucoma Juvenil.......................................................... 139 Luiz Alberto S. Melo Jr.

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14 Glaucoma Associado a Anomalias Oculares Não Adquiridas......... 143 Augusto Paranhos Jr. • Christiane Rolim de Moura

15 Glaucoma Associado a Anomalias Sistêmicas Não Adquiridas....... 157 Niro Kasahara • Maurício Della Paolera

16 Glaucoma Associado a Condições Adquiridas ......................... 165 Seção 16.1  Uveítes.............................................................................165 Flávio Siqueira Santos Lopes • Christiane Rolim de Moura

Seção 16.2  Tumores............................................................................172 Luiz Fernando Teixeira • Monique Kling Mangeon

Seção 16.3  Retinopatia da Prematuridade.................................................178 Christiane Rolim de Moura

Seção 16.4  Glaucoma Corticogênico........................................................182 André Soares de Camargo

Seção 16.5  Trauma.............................................................................187 Bruno L.B. Esporcatte • Camila F. Netto

17 Glaucoma após Cirurgia de Catarata.................................... 195 Graziela Massa Resende • Vital Paulino Costa

PARTE 4  Tratamento e Habilitação/Reabilitação Visual

18 Tratamento Medicamentoso.............................................. 213 Regina Cele da Silveira

19 Cirurgias Angulares I | Goniotomia...................................... 219 Geraldo Vicente de Almeida • Ralph Cohen • Alessanda Kusabara

20 Cirurgias Angulares II | Trabeculotomia e Trabeculotomia 360°.... 227 Annette Giangiacomo • Allen Dale Beck

21 Cirurgias Fistulizantes I | Trabeculectomia............................ 237 Maria Papadopoulos • Peng Tee Khaw

22 Cirurgias Fistulizantes II | Implantes de Drenagem................... 247 Christiane Rolim de Moura • Carlos Akira Omi

23 Procedimentos Ciclodestrutivos......................................... 259 Francisco Eduardo Lopes de Lima • João Caetano Ávila Geraissate

24 Habilitação e Reabilitação Visual........................................ 275 Célia Regina Nakanami • Nívea Nunes Ferraz

Índice Alfabético........................................................... 287

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Embriologia do Seio Camerular

Marcia Reis Guimarães • Paula Reis Guimarães • Rubens Andrade Grochowski

CAPÍTULO

1

▌▌ INTRODUÇÃO

É possível que não haja outra especialidade médica onde o conhecimento da embriologia seja tão impactante quanto na Oftalmologia. O estudo das neurociências visuais tem demonstrado, cada vez mais, complexas inter-relações entre o cérebro e o olho. Há autores que sugerem que o glaucoma passe a ser abordado como doença sistêmica de prevalência cada vez mais ampla e disseminada. Nesta nova realidade, a disponibilidade de novas técnicas, como imuno-histoquímica, neuroimagem funcional, análise genética e molecular, abre novas perspectivas na abordagem do glaucoma na infância, permitindo no futuro a identificação precoce de riscos e evitando intervenções intempestivas ou tardias. O conhecimento da ontogenia adquire para o oftalmologista uma importância muito além do aspecto acadêmico de sua formação, porque em nenhum outro órgão do corpo humano as anomalias da embriogênese são tão aparentes e identificáveis. No exame de rotina à lâmpada de fenda, à fundoscopia ou gonioscopia, com ou sem apoio de técnicas minimamente invasivas, já é possível obter o diagnóstico diferencial da maior parte das patologias oculares. É com grata satisfação que participamos desta obra, dedicada ao glaucoma na infância, onde houve o cuidado em se incluir, entre os temas relevantes, uma revisão da embriologia ocular com ênfase na formação do ângulo camerular. ▌▌ EMBRIOLOGIA

BÁSICA

Devido ao alto grau de diferenciação e especificidade funcional, o olho humano forma-se através de uma sofisticada sequência de eventos na qual a etapa seguinte se estrutura sobre a anterior. Desvios ou bloqueios na programação genética levam a interferências clínica e anatômica tão impactantes quanto mais precoce forem sua ocorrências. Os efeitos dessas alterações serão compartilhados intraocularmente e podem estender-se ao sistema nervoso central (SNC) com o qual o olho divide a própria origem e as consequências funcionais e orgânicas. Como no cérebro, intervenções invasivas oculares pós-natais são mal toleradas. Malformações congênitas de qualquer natureza com potencial de danos no ângulo camerular e seu complexo de drenagem devem ser precocemente identificadas e tratadas com base em um bom conhecimento das etapas envolvidas na embriologia ocular. O código genético é comum a todas as células e o que as diferencia é a porção do genoma que é expresso, segundo a “interpretação” das circunstâncias que as rodeiam em dado momento da sequência embriológica. Com frequência, e de forma ainda mais efetiva na formação do globo ocular, um mesmo gene participa em diferentes sequências, ativando ou reprimindo a transcrição de uma determinada programação. O desenvolvimento ocular está sob controle do DNA e não depende de estimulação externa ou luminosa.

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Por isto, o nascimento não é um momento crítico como ocorre em outros órgãos, e parte do desenvolvimento ocular se estenderá pela fase pós-natal. O desenvolvimento humano após a fecundação se faz a partir de um agrupamento de células embrionárias primordiais que se multiplicam sob ação de genes específicos e fatores de indução. Essas células têm grande capacidade proliferativa e passam por processos de elongação, adesão e contração. O polo celular se transforma em uma estrutura trilaminar com um eixo central e simetria bilateral: a gástrula. Dessas 3 lâminas se originarão os folhetos germinativos primários comuns a todos os organismos superiores: ectoderma, mesoderma e endoderma. Em sua porção craniana ou rostral, aparecem dilatações separadas por duas constrições dando origem às vesículas cerebrais primárias, denominadas de prosencéfalo, mesencéfalo e rombencéfalo. O ectoderma, folheto primário presente na parte cefálica do embrião, vai se diferenciar em dois tipos, sendo um mais superficial e o segundo denominado neuroectoderma ou tubo neural. Na região de clivagem entre a porção superficial e a tubular, aparece uma massa celular resultante de uma delaminação do ectoderma superficial vizinho das pregas neurais. São as células da crista neural, de localização inicialmente dorsal e desenvolvimento a partir das células neuroepiteliais das extremidades laterais da placa neural. Elas envolverão o olho primitivo participando da formação de várias estruturas oculares. Durante a fase primária inicial, as células mesodérmicas e as células da crista neural não têm diferenças bioquímicas ou citológicas significativas. A distinção principal se faz pela capacidade de migração apresentada apenas pelas células da crista neural, também conhecidas como mesectodérmicas ou mesenquimais. No desenvolvimento pré-natal do olho humano, há três períodos bem delineados a serem considerados separadamente devido à variação na velocidade de crescimento dos diferentes tecidos oculares e sua intrincada interdependência. O olho primitivo, também chamado de sulco óptico, aparece inicialmente como um par de estrias em cada lado da linha média da placa neural antes de seu fechamento tubular, exatamente entre o telencéfalo e o diencéfalo, entre o 22o e 24o dias gestacionais. Esse período inicial, onde há o aparecimento dos esboços oculares rudimentares, é chamado de embriogênese. Na fase de embriogênese, ocorre a individualização dos folhetos embrionários e se estende até o aparecimento do olho primitivo (1a até a 3a semana após a fecundação), havendo também migração das células da crista neural e a formação do tubo neural. Na 4a semana, o olho primitivo sofre uma escavação e torna-se uma vesícula. Devido às diferentes velocidades das divisões celulares nas diversas partes do embrião, os folhetos germinativos são moldados progressivamente em estruturas diferenciadas, formando órgãos; esta é a fase da organogênese, que se prolonga até a 8a semana. A vesícula cresce e sofre uma inversão sincronizada com a invaginação de uma placa de ectoderma superficial, o futuro cristalino, adquirindo aspecto de taça óptica. Ao se dobrar, o neuroectoderma ou taça óptica passa a ter uma dupla camada: originam-se, assim, as camadas interna e externa da futura retina, persistindo entre elas um espaço virtual que se comunica com o 3o ventrículo pelo canal óptico. O desenvolvimento das duas camadas de neuroectoderma (retina sensorial e epitélio pigmentado) é feito independente do cristalino, mas a presença deste é necessária para a indução ao crescimento normal da coroide, esclera e do epitélio pigmentado da retina. A vesícula cristaliniana promove também a diferenciação da córnea e o crescimento vítreo, existindo ainda uma forte conexão organogenética entre a íris e o cristalino, como discutiremos a seguir (Figura 1.1). A invaginação da vesícula afeta o canal ou haste óptica, formando uma fenda, a fissura embrionária, também chamada de coroidiana ou fenda colobômica. A artéria hialóidea, precursora da artéria central da retina, penetra no canal óptico através dessa fissura, que se fechará ao fim da 6a semana, pela fusão inicial das bordas na porção central e, na sequência, anteroposteriormente, até a íris e o nervo óptico, respectivamente. Na 3a e última fase, ocorre a diferenciação das estruturas oculares, com o desenvolvimento do ângulo camerular, vítreo, retina, cristalino e mesênquima periocular. Essa fase se encerra ao nascimento, mas é importante ressaltar que algumas estruturas oculares se mantêm

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Capítulo 1  Embriologia do Seio Camerular  5

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Epitélio pigmentar da retina em desenvolvimento

Camada neural da retina em desenvolvimento Espaço intrarretiniano

Esclera

Córnea Membrana pupilar Câmara anterior

Cristalino Futura câmara anterior Ectoderma superficial

A Artéria hialoidea Corpo vítreo

Câmara posterior

B

Mesoderma

Túnica vasculosa lentis

Corpo ciliar

Epitélio pigmentar da retina Coroide

Câmara anterior

Saco conjuntival C

Região equatorial do cristalino

Seio venoso escleral Íris

Conjuntiva bulbar e palpebral

Córnea Epitélio cristaliniano

Camada neural da retina

Córnea

Pálpebras fundidas

Esclera Plexo vascular da coroide

Pálpebra

D

Ligamentos suspensores do cristalino

Artéria central da retina Canal hialoideo Corpo ciliar

Figura 1.1 Cortes sagitais de um olho esquematizado, mostrando os estágios de desenvolvimento sucessivos do cristalino, da retina, íris e córnea. A. Com 5 semanas. B. Com 6 semanas. C. Com 20 semanas. D. No recém-nascido. Observe a fusão das camadas da taça óptica para formar o epitélio pigmentado da retina e a retina neural, que vão se estender anteriormente como um epitélio duplo do corpo ciliar e da íris. Observe também, nas imagens C e D, os detalhes da câmara anterior e as relações entre as estruturas correspondentes à córnea, íris e corpo ciliar. Fonte: Moore e Persaud, 2018.

em desenvolvimento no pós-natal, como é o caso da retina, que embora apresente grande atividade proliferativa entre o 3o e o 7o mês gestacional, atinge o pleno desenvolvimento macular no 16o mês (final do 1o semestre pós-natal), e o foveolar somente em torno do 45o mês. Em resumo, o ectoderma superficial forma o epitélio da córnea e o cristalino. O neuroectoderma dá origem à retina, aos epitélios da íris, corpo ciliar e músculos esfíncter e dilatador da íris. As células da crista neural, também chamadas de mesênquima ou mesectoderma, contribuem para a formação dos elementos de tecido conjuntivo do olho e anexos. O mesênquima periocular composto pelas células da crista neural e mesoderma para-axial dará origem ao estroma da córnea, íris e corpo ciliar, endotélio, esclera, músculo ciliar e trabeculado, e ainda aos melanócitos da úvea e epitélio pigmentado, meninges do nervo óptico e células de Schwann dos nervos ciliares. Os termos crista neural, mesectoderma ou mesênquima não devem ser confundidos com mesoderma, folheto embrionário intermediário cuja contribuição se limita à formação dos músculos extraoculares e endotélio vascular. ▌▌ ÂNGULO

CAMERULAR

Para a formação da câmara anterior concorrem três migrações de células da crista neural, conforme esquema apresentado na Figura 1.2. Inicialmente se estabelece o posicionamento do futuro endotélio, seguido da migração dos futuros ceratócitos entre o espaço delimitado pelo epitélio do ectoderma superficial e o endotélio. Finalmente, na 3a etapa, a borda anterior da taça óptica se desloca para uma posição anterior e central, servindo de base para a movimentação do mesênquima periocular e formação do estroma da íris e do corpo ciliar.

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6 Glaucoma na Infância I II

Epitélio

III Cristalino

Retina

Figura 1.2 Diagrama representando as três ondas de migração do mesênquima anterior periocular, ou crista neural: (I) endotélio corneano; (II) estroma corneano; (III) estroma da íris. Fonte: Tripathi, 1974.

Caso haja anormalidades na migração ou diferenciação das células da crista neural, ocorrerão anomalias no desenvolvimento da córnea e das estruturas da câmara anterior, conhecidas como disgenesias do segmento anterior. Essas disgenesias podem levar a alterações de impactos mais leves, como é o caso do embriotóxon posterior, com espessamento da linha de Schwalbe a quadros mais sérios envolvendo hipoplasia da íris e iridogoniodisgenesias com riscos de glaucoma entre 50% a 75% dos casos acometidos. Portadores de disgenesias da câmara anterior têm risco mais elevado de desenvolver glaucoma na infância pelo dano ao sistema de drenagem do humor aquoso pelo ângulo da câmara anterior. Existem dois mecanismos fundamentais que atuam na formação do ângulo camerular, sendo o primeiro o crescimento desigual das estruturas do segmento anterior, com a proliferação das células e alterações em sua forma, estrutura e função sob indução direta de um tecido ocular sobre o outro. Sob ação de genes-mestres, como o PAX-6 e vários tipos de moléculas de adesão que se manifestam em momentos específicos da sequência de indução, o desenvolvimento normal ocorre desde a fase gestacional à pós-natal. A córnea se desenvolve mais rapidamente que as demais estruturas e produz o deslocamento do corpo ciliar em direção ao centro do globo e o aparecimento de uma fenda, a futura câmara anterior. O cristalino também contribui na formação do ângulo pela sua influência no desenvolvimento do estroma e endotélio da córnea pela indução sobre as células endoteliais corneanas via moléculas de adesão do tipo N-caderina, de um efeito de antiaderência, evitando a possível fusão dessas células com a íris ou epitélio do cristalino subjacentes. O outro mecanismo é relacionado à expressão de genes específicos ligados à involução ou rarefação, que se manifestam no mesênquima embrionário, células da crista neural e mesoderma craniano. A formação trabecular está vinculada à distribuição irregular das células, ora esponjosas ora mais densas, separadas por espaços de extensão variável. A migração e diferenciação das estruturas do segmento anterior estão subordinadas às variações nos níveis de expressão dos genes da família TGFB (transforming growth factor B) como o B1 e B2, com impactos secundários no desenvolvimento do trabeculado, ângulo e canal de Schlemm. À medida que as pontes intercelulares e suas interligações vão se rompendo, lacunas confluentes sem atrofia, mas com reorganização secundária das células mesenquimatosas, são formadas. O ângulo camerular se evidencia na 8a semana, como um espaço entre o endotélio corneano (1a onda de migração de células mesenquimais ou crista neural) e o estroma da íris (3a onda). Nesse momento, ainda não existem indícios de canal de Schlemm, mas apenas uma fenda, que se aprofunda progressivamente a partir de interações entre o ectoderma superficial e o mesênquima periocular, como mostrado nas Figuras 1.3 e 1.4. O ângulo se desenvolve pela diferenciação do mesênquima periocular em linhagens celulares específicos associadas a várias mudanças nas estruturas circunjacentes e coincidentes com o desenvolvimento do corpo ciliar. A embriologia clássica considera a origem das células trabe-

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Capítulo 1  Embriologia do Seio Camerular  7

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Figura 1.3 Embrião humano com 7 semanas. O mesênquima periocular anterior preenche a depressão entre a borda anterior da taça óptica e o ectoderma superficial. Ep: epitélio corneano; En: endotélio corneano; M: mesectoderma ou crista neural. Fonte: Mann, 1964.

Figura 1.4 Embrião humano com 3 meses. Crescimento da borda anterior da taça óptica. Observam-se duas interdigitações meridionais no epitélio pigmentado (2 setas pretas contíguas). A região fotografada mostra detalhes do neuroectoderma anterior, entre as interdigitações e a borda anterior, futuro epitélio iriano. O seio marginal está se desenvolvendo na extremidade anterior. C: córnea; CA: câmara anterior; MP: membrana pupilar; TVLL: túnica vasculosa lentis lateral. Fonte: Ozanics e Jakobiec, 1982.

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culares e canaliculares como sendo exclusivamente parenquimatosa ou mesenquimal, porém estudos mais recentes com marcadores imuno-histoquímicos (reação positiva aos anticorpos antienolase específicos para neurônios e células neuroectodérmicas) identificaram que tais células têm uma dupla origem embriológica. As células do canal de Schlemm, as veias aquosas e canais coletores são de origem mesodérmica, enquanto a maior parte das células do trabeculado tem origem neuroectodérmica, da crista neural. No desenvolvimento das estruturas da câmara anterior, o 3o mês é um período muito importante, onde todos os tecidos oculares apresentam rápido desenvolvimento, a começar pelo neuroectoderma (retina, nervo e disco óptico, borda anterior da taça óptica e vítreo secundário), passando pelo mesênquima periocular ou crista neural (vasculatura uveal e esclera) e segmento anterior (córnea e ângulo anterior), cristalino, pálpebras e fusão do saco conjuntival. Para se descrever a formação do ângulo camerular, é necessário discutir também o desenvolvimento do corpo ciliar, uma vez que as modificações estruturais deste impactam na configuração do ângulo. Vale esclarecer que, embora os componentes do corpo ciliar já estejam anatomicamente desenvolvidos no 6o mês (incluindo esporão escleral, fibras longitudinais do músculo ciliar, processos ciliares, íris bem distendida e músculo esfíncter bem evidente em sua margem distal), a modelagem da câmara anterior se faz com o aprofundamento progressivo do ângulo e se prolonga até a fase pós-natal. ▌▌ CORPO

CILIAR

O corpo ciliar tem uma dupla origem embrionária, com velocidades de crescimento distintas se alternando durante a diferenciação morfológica. A camada externa, neuroectodérmica, irá formar o músculo ciliar e a interna, de natureza fibrovascular, originará a rede vascular dos processos ciliares. Durante o 4o mês, os processos ciliares estão anteriores ao ápice do ângulo e ao músculo ciliar, o que indica que o neuroectoderma anterior cresceu relativamente mais rápido que o mesênquima periocular (músculo ciliar e esclera). Ainda no 4o mês, a borda anterior da taça óptica estende-se centralmente, trazendo consigo as dobras ciliares. Posteriormente ao deslocamento das dobras ciliares, aparece uma área mais lisa e regular, precursora da pars plana. Acima das pregas ciliares surgem as fibras longitudinais do músculo ciliar, que irão aderir-se a uma massa de fibras orientadas circularmente, o esporão escleral. Embriologicamente, embora a formação do corpo ciliar já esteja quase definitiva no 6o mês, há duas exceções: a pars plana ainda não está pronta e a superfície dos processos ciliares está lisa, sem as pregas, tal como se observa em recém-nascidos. ▌▌ ÍRIS

O desenvolvimento da íris se inicia durante a 7a semana, com a terceira onda de migração das células de crista neural, no espaço entre o endotélio corneano e o cristalino, para constituir o estroma da íris, cuja pigmentação só estará bem evidenciada no período pós-natal. A região do neuroectoderma anterior, entre a parte distal e as dobras ciliares, continua a se alongar e forma o epitélio da íris. Ainda no 3o mês, as células do epitélio pigmentado anterior do seio marginal desenvolvem dobras basais, adquire fibrilas no citoplasma basal e diferenciam-se em células do músculo esfíncter da pupila, que terá seu desenvolvimento completo ao 9o mês. Concomitantemente à redução da melanogênese nas células do epitélio pigmentado durante a miodiferenciação, as células não pigmentadas da camada posterior do seio marginal iniciam um processo inverso, e apresentam aumento na pigmentação, que vai se estendo desde a periferia até o limite com a região trabecular. O músculo dilatador, originário do mesmo neuroectoderma anterior, se formará a partir do 6o mês e será concluído após o nascimento. De acordo com os dados embriológicos do desenvolvimento humano, as reações pupilares à luz já estão consistentemente positivas a partir da 32a semana gestacional. Em 1989, Isenberg, Dang e Jotterand realizaram estudos com uma fonte de luz de 600 candelas para avaliar as reações pupilares à luz em prematuros para verificar a consistência das respostas e sua correlação com a idade gestacional, tendo confirmado esses dados. Esses autores tiveram o cuidado de medir recém-nascidos acordados para evitar a miose observada durante o sono e sua inter-

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Capítulo 1  Embriologia do Seio Camerular  9

ferência na medida do diâmetro pupilar obtido. O diâmetro pupilar médio quando no escuro (< 10 candelas) foi de 3,6 ± 0,9mm, e em alguns casos foi encontrada uma anisocoria de 0,5 a 1,0mm. As conclusões foram de que um diâmetro pupilar menor que 1,8mm e maior que 5,4mm em ambiente escuro deve ser considerado patológico e o paciente submetido à devida propedêutica. No 5o mês, as ramificações do círculo arterial maior da íris alcançam aquelas dos vasos no corpo ciliar e estroma da íris. Os vasos irianos avançam em meio ao mesênquima, formando arcadas e constituindo a membrana pupilar. Com o advento da membrana pupilar, a lâmina iridopupilar ou túnica vasculosa lentis anterior desaparece e seus componentes são incorporados na borda anterior da íris. As células da lâmina iridopupilar se arranjam de forma dispersa sobre a superfície anterior da íris, sem membrana basal ou junções entre elas, deixando grandes espaços. As células mais posteriores se ligam frouxamente ao epitélio da íris. A borda anterior da íris não apresenta nenhum tipo de organização como arranjos organizados de células endoteliais, e as criptas da face anterior se devem à organização irregular das células mesenquimais da íris, que assumem formato estrelado ou fusiforme. A membrana pupilar, rede vascular primitiva arteriovenosa que recobre toda a íris e forma seu sistema vascular superficial e profundo, estende-se ao longo do estroma e penetra no esfíncter da pupila. Esses vasos irianos não têm fenestrações e contêm células endoteliais ligadas entre si por tight junctions frouxas e imaturas. No final do 6o mês, os vasos da membrana pupilar começam um processo de atrofia dos capilares e extinção do fluxo sanguíneo que se inicia pelas arcadas centrais. Essa atrofia se amplia até a 3a arcada, que permanece e forma uma estrutura anular de anastomoses arteriovenosas, chamada de colarete ou círculo menor, na região terminal do músculo esfíncter. Ao final do 9o mês, o círculo arterial menor está bem formado, assim como o colágeno presente no estroma anterior da íris. ▌▌ MÚSCULO

CILIAR

O músculo ciliar se origina da crista neural e mesoderma craniano para-axial. Sua formação inicial ocorre com uma condensação do mesoderma periocular, cuja estrutura de base é voltada para a câmara anterior, e o ápice para a câmara posterior. Essa estrutura se estende da taça óptica até a superfície interna da condensação escleral. Essa condensação se espessa e dá origem ao músculo ciliar. No 3o e 4o meses, as células musculares se arranjam regularmente em formações longitudinais e vão se ancorar no esporão escleral (Figura 1.5). Essas fibras longitudi-

Figura 1.5 Vias de escoamento trabecular do humor aquoso: (1) processos irianos; (2) trabeculado uveal; (3) trabeculado corneoescleral; (4) trabeculado justacanalicular; (5) canal de Schlemm; (6) veias aquosas; (7) veias episclerais; (8) músculo ciliar; (9) esporão escleral; (10) linha de Schwalbe. Fonte: Shields, 1987.

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nais do músculo ciliar se organizarão progressivamente em três planos: as mais externas permanecem ligadas ao esporão escleral; as intermediárias, à esclera anterior e ao canal de Schlemm; as mais profundas se fixarão à frente da membrana de Descemet, com sua parte tendinosa compondo a parede interna do sistema trabecular. As porções radiadas e circular do músculo ciliar só completarão seu desenvolvimento em torno do 6o mês pós-natal. ▌▌ PROCESSOS

CILIARES

Os processos ciliares têm origem neuroectodérmica e se formam por um pregueamento que ocorre posteriormente ao rebordo da cúpula óptica a partir do 3o mês, evoluindo progressivamente até alcançar a face posterior do cristalino. Apresentam uma dupla camada epitelial, cuja origem embriológica é a mesma da retina e do epitélio pigmentado da íris. No momento da invaginação da cúpula óptica durante a vida embrionária, as células se dispõem ápice contra ápice, mantendo do lado externo as lâminas basais do complexo. Essa característica morfológica lhes confere grande originalidade funcional. A camada externa se tornará o epitélio pigmentado e a interna, o epitélio não pigmentado. O neuroectoderma anterior se desenvolve somente depois de a borda anterior entrar em contato com o cristalino, havendo então a proliferação das camadas externa e interna, inicialmente mantendo um espaço virtual entre elas. Porém, como o crescimento da borda interna é mais acentuado, ocorrerá uma eversão de tal modo que a camada pigmentar externa não alcança a margem anterior. Mais tarde, as camadas em desenvolvimento voltarão a se fundir, exceto na porção bem anterior onde um remanescente da cavidade da vesícula óptica persiste, formando o seio marginal ou seio de vonSzily. No feto humano, a maturação morfológica das tight junctions do epitélio ciliar se faz precocemente, já na 10a semana de vida intrauterina, criando uma barreira hematoaquosa operacional eficiente muito antes do início da função secretora dos processos ciliares, que só ocorre próximo ao 6o mês. As tight junctions ou zonulae occludens na parte apical das membranas laterais das células epiteliais não pigmentadas restringem a passagem de macromoléculas de origem sanguínea para o humor aquoso. Mesmo depois, com a protrusão dos processos ciliares e redução relativa no número de junções, a barreira hematoaquosa mantém sua efetividade. Do 4o ao 6o mês, o crescimento e a expansão dos processos ciliares levará ao aparecimento dos canais ciliares entre as células do epitélio pigmentar relacionadas à formação do humor aquoso. No 6o mês, a pars plana e a ora serrata, assim como os processos ciliares, estão bem diferenciados. Nessa fase existem aproximadamente 80 processos ciliares com um comprimento aproximado de 700 a 800µm e os processos intermediários entre eles e a pars plana, com cerca de 200µm já presentes. ▌▌ DESENVOLVIMENTO

DAS ESTRUTURAS TRABECULARES

O desenvolvimento do mesênquima periocular é acompanhado pelo neuroectoderma anterior. As superfícies apicais das células das duas camadas da borda óptica estão conectadas por gap junctions, desmossomos e fascia adherens. Ainda no 5o mês, evidencia-se um sulco interno escleral na região de origem do trabeculado próximo ao limbo, com células cuboides corneanas presentes apenas na porção mais anterior, enquanto, na restante, evidencia-se uma rede composta pelos delicados processos citoplasmáticos das células endoteliais trabeculares e rica matriz extracelular de aspecto fibrilar. A matriz extracelular é composta de fibras de colágeno, laminina, elastina, vitronectina e fibronectina. Entre as fibrilas existem espaços intertrabeculares que permitem a passagem do humor aquoso até o canal de Schlemm, atravessando estruturas de drenagem conhecidas como vacúolos gigantes (Figura 1.6). As estruturas trabeculares se dispõem em três planos. A parte interna, de tecido mais frouxo, se estende do anel de Schwalbe até a raiz da íris, formando o trabeculado uveal primitivo. O trabeculado uveal é mais numeroso e tem espaços mais amplos e os processos ciliares se localizam anteriormente ao ápice do ângulo, que por sua vez está no nível da futura linha de Schwalbe. A parte intermediária, de tecido denso, é constituída de células alongadas e paralelas, comprimidas umas contra as outras, não aderentes às células de íris, dispostas em avental do anel de Schwalbe ao esporão escleral, e formam o trabeculado corneoescleral.

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Figura 1.6 Filtro trabecular: (1) porção uveal; (2) porção corneoescleral; (3) porção justacanalicular; (4) canal de Schlemm; (5) esporão escleral. Fonte: Shields, 1987.

Já a parte mais externa, em relação à parede interna do canal de Schlemm, consiste em dois ou três camadas de células endoteliais alongadas irregularmente imersas em material extracelular, e corresponde ao trabeculado justacanalicular ou cribriforme. O trabeculado justacanalicular é constituído por células de origem neuroectodérmica derivadas da crista neural. Por serem multipotentes, as células derivadas da crista neural sintetizam glicosaminas na forma de precursores que se polimerizam e se combinam com proteínas para formar o material extracelular, os proteoglicanos. A sua importância clínica se deve às diversas funções que elas desempenham na fisiopatologia da câmara anterior, em especial na regulação do fluxo do humor aquoso. Além disso, o citoesqueleto das células trabeculares contém microfilamentos de actina, microfilamentos intermediários de vimentina e desmina dotados de contratilidade própria. Observam-se ainda microtúbulos resultantes da polimerização de moléculas de tubulina. Esses microtúbulos contribuem para a adesão da malha trabecular, para a motilidade dos receptores de membrana, e podem ser afetados em seu equilíbrio funcional pela ação de neurotransmissores e vários fármacos usados na clínica oftalmológica. As vesículas ou vacúolos gigantes de pinocitose observadas na superfície das células trabeculares são responsáveis pelos fenômenos de retenção e de transporte do humor aquoso até o canal de Schlemm. Nesse local, observa-se também uma atividade fagocitária que concorre para neutralizar os debris contidos nas vesículas, permitindo ao filtro trabecular a autolimpeza do humor aquoso frente a moléculas de proteínas, hemácias ou bactérias. Os espaços intercelulares entre as células endoteliais trabeculares que revestem o ângulo permitem a comunicação da câmara anterior com os espaços intertrabeculares. ▌▌ CANAL

DE SCHLEMM

O canal de Schlemm, de forma anular evidencia-se a partir do 3o mês, sendo resultado da remodelagem da vasculatura na zona de transição corneoescleral sob ação dos fatores de transcrição. As paredes do canal são limitadas pelas células mesodérmicas de tipo vascular, ou seja, endoteliais, sendo originárias dos capilares de origem venosa e dependentes de vasos ciliares anteriores, assim como as veias aquosas e canais excretores que se derivam da sua parede externa. A partir do 5o mês, as células da parede interna do canal de Schlemm apresentam uma degeneração vacuolar que leva ao aparecimento de uma passagem transcelular, enquanto, as células endoteliais permanecem unidas por tight junctions. Esses vacúolos, bem visíveis à microscopia eletrônica, são indícios de que o humor aquoso penetra pelos espaços trabeculares garantindo sua distensão. Essas células endoteliais têm características únicas e são específicas

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do trabeculado e canal de Schlemm. Apresentam remodelagem por apoptose, vacuolização e adelgaçamento do lúmen do canal a partir do 6o mês, coincidindo com uma maior velocidade de diferenciação, agora atingindo o mesoderma periocular, cuja plenitude se dá no terceiro trimestre gestacional. Os espaços entre as células endoteliais trabeculares, que revestem o ângulo, permitem a comunicação da câmara anterior com os espaços intertrabeculares. A luz do canal de Schlemm se conecta com o sistema venoso através dos canais coletores. O desenvolvimento anormal das estruturas iridocorneanas e do ângulo pode levar a uma elevação da pressão intraocular e glaucoma. No 8o mês observa-se uma ampla exposição da cavidade da câmara anterior, com o ápice do ângulo deslocando-se cada vez mais posteriormente até que, no 9o mês, sua posição definitiva e posterior ao canal de Schlemm é atingida.35 ▌▌ ESPORÃO

ESCLERAL

O esporão escleral é uma protrusão fibrosa triangular e orientada circunferencialmente, que aparece inicialmente em torno do 4o mês, quando há o recuo do músculo ciliar. Ao 5o mês, já se mostra bem desenvolvido, mas a inserção das fibras longitudinais não se completa antes do 7o mês de gestação. ▌▌ LINHA

OU ANEL DE SCHWALBE

A linha de Schwalbe se forma a partir do 5o mês, marca o término da membrana de Descemet, sendo o limite anterior da rede trabecular. Essa estrutura, que se mostra proeminente em 10% a 20% dos olhos humanos, seria causada por um excesso ou por um reliquat não absorvido do material extracelular produzido pelas células endoteliais. ▌▌ CONSIDERAÇÕES

FINAIS

Ao nascimento, a íris está plana, como mostra a Figura 1.7. O ângulo da câmara anterior está aberto, porém ainda ocorrerão alterações em sua configuração e na do corpo ciliar durante os primeiros anos pós-natais. Na medida em que a pars plana do corpo ciliar se alonga e a ora serrata retrocede, o ápice do ângulo se desloca para trás e o recesso angular torna-se aparente. Ao nascimento, o comprimento da pars plana é de 0,5 a 1,5mm, mudando para 2,5 a 3,0mm durante o 1o ano; para 3,0 a 3,5mm do 1o ao 4o ano; e de 3,5 a 4,0mm dos 4 aos 7 anos. Durante todo esse tempo, o comprimento da corona ciliaris permanece o mesmo, 2,0mm. O crescimento pronunciado da pars plana mostra que o principal crescimento do olho durante os primeiros 7 anos ocorre justamente na região de inserção dos músculos extraoculares. O aumento da pars plana é limitado posteriormente pela ora serrata, que está coberta pela prega de Lange. A prega, por sua vez, sofre uma regressão gradativa durante os primeiros 4 anos pós-natais. Recém-nascidos e bebês até 3 anos apresentam trabéculas uveais mais espessadas, dispostas em arranjos meridionais que se estendem da linha de Schwalbe até a base da íris, no ângulo da câmara anterior. Essas trabéculas mais espessas apoiam-se sobre as trabéculas lamelares típicas das camadas corneoesclerais. As células trabeculares endoteliais que cobrem o trabeculado uveal retêm parcialmente as extensões citoplasmáticas laterais evidentes em olhos fetais. Com 1 ano, as trabéculas uveais estão mais visíveis e têm aspecto menos espessado, e com isto as trabéculas corneoesclerais internas tornam-se mais evidentes. A embriogênese interna ou uveal do trabeculado parece prosseguir com remodelagens durante os primeiros anos pós-natais, e as extensões laterais em lençol que cobrem as lacunas do trabeculado uveal vão se tornando mais delgadas. Segundo estudos envolvendo inclusive microscopia eletrônica, as variações na morfogênese observada no ângulo camerular durante os primeiros anos seriam fruto de uma variação na velocidade de maturação entre as estruturas que o compõem. Esse fenômeno se repetiria nas demais regiões do sistema de drenagem do aquoso. Essa interpretação contesta a teoria que envolve a membrana de Barkan e atribui a ocorrência de glaucoma congênito a um atraso na maturação das estruturas do ângulo. A embriologia do ângulo da câmara anterior se desenvolve a partir da contribuição de células mesenquimais neuroectodérmicas (as células da crista neural) e do mesênquima periocular.

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Capítulo 1  Embriologia do Seio Camerular  13

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Figura 1.7 Ângulo da câmara anterior ao nascimento. O ápice do ângulo mostra-se nivelado com a porção terminal do canal de Schlemm (SC). Não se observa ainda o recesso angular. Os processos ciliares (CP) estão localizados posteriormente ao ápice do ângulo. S: esclera; C: córnea; SS: esporão escleral; L: fibras longitudinais do músculo ciliar; Ci: músculo ciliar circular; Ir: íris. (Aumento 200×).

A morfogênese é coordenada por indução molecular, na qual determinados fatores de transcrição podem “ligar” ou “desligar” genes, ativando ou reprimindo a expressão gênica. As células da crista neural que se originam do ectoderma embrionário são sensíveis a essa indução e apresentam capacidade migratória, podendo deslocar-se para locais precisos no embrião, incluindo o olho. Essas células precursoras têm características epiteliais como a polaridade apicobasal, junções e lâmina basal. Essas células têm uma propriedade única multipotencial, que é a da transição para uma célula mesenquimal, e para tal perdem a inibição de contato célula com célula que é mediada por junções intercelulares. Nesse processo, seu citoesqueleto se reorganiza e adquire a capacidade de induzir um fenótipo compatível com motilidade pela expressão do filamento vimentina, facilitando sua difusão pelo interstício até o local exato onde novamente haverá a nova diferenciação para um determinado tecido ou estrutura. Com relação à fisiopatogenia do glaucoma e suas relações com a embriogênese, vale ressaltar que a origem do olho humano se faz a partir do diencéfalo, compartilhada com o tálamo, hipotálamo e epitálamo e conectada ao 3o ventrículo, portanto submetida às influências da pressão intracraniana e ação das estruturas do SNC. O tálamo, considerado a porta de conexão dos estímulos ascendentes e descendentes do SNC e vias de processamento da imagem, é também o mediador de mecanismos não visuais de grande importância funcional e clínica, como a regulação do ciclo circadiano, cujo marcapasso fica no núcleo supraquiasmático do hipotálamo, e ainda a regulação dos reflexos pupilares. O glaucoma está relacionado à perda progressiva das células ganglionares retinianas, e entre elas está uma classe especial, as fotorreceptoras intrínsecas, cuja opsina, a melanopsina, se relaciona à detecção das variações de luminância e controle dos níveis de secreção de melatonina. A melatonina, por sua vez, modula o sono e o ciclo circadiano. As respostas geradas pelos estímulos fóticos das ganglionares intrínsecas atingem o núcleo supraquiasmático via trato retino-hipotalâmico, de onde atingem o gânglio cervical superior e a glândula pineal (epitálamo), secretora da melatonina e indutora dos ciclos de sono e vigília. A relação entre a qualidade de sono e o glaucoma foi inclusive abordada em 2015 por Gracitelli e Paranhos em excelente editorial dos Arquivos Brasileiros de Oftalmologia. Outro fator de interesse são os possíveis controles via hipotálamo na pressão intraocular. As variações circadianas impactariam na pressão intraocular principalmente pela manhã, e seus efeitos no gradiente de pressão translaminar teriam, pelo menos em parte, uma regulação central via hipotálamo por neurônios dorsomediais e perifornicais. As flutuações na pressão intraocular são um reconhecido fator de risco na progressão do glaucoma. A anatomia do nervo óptico é única quando comparada aos demais nervos cra-

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nianos. Por ser parte do SNC, o nervo óptico é envolvido pelas 3 camadas meníngeas e o fluido cerebroespinhal. A vesícula óptica e sua comunicação com o 3o ventrículo pelo canal óptico (por onde passarão as futuras fibras ganglionares do nervo óptico) estão limitadas pela lâmina scleralis, que se transformará na lâmina crivosa ainda no 4o mês gestacional. A lâmina crivosa na cabeça do disco óptico cria uma barreira anatômica entre o espaço intraocular de maior pressão e o espaço retrobulbar de pressão inferior. O gradiente de pressão criado entre a pressão intraocular e a pressão cerebroespinhal existente no espaço retrobulbar e tecido nervoso ocular é chamado de pressão translaminar. A resistência da barreira cribriforme formada por células gliomeningeoesclerais é determinada por fatores embrionários e epigenéticos. A lâmina cribriforme ou cribrosa atua também na regulação das variações pressóricas translaminares, e essa interação está sendo intensamente estudada. Estudos experimentais têm mostrado que variações acentuadas nesse gradiente podem levar a lesões onde uma baixa pressão arterial, mesmo que fisiológica, associada a uma redução na pressão cerebroespinhal podem levar a quadros de neuropatia óptica mesmo em pacientes com pressão intraocular aparentemente normal. A prematuridade, cada vez mais presente na clínica pediátrica, traz novos desafios ao oftalmologista. Entre eles estão a retinopatia da prematuridade (ROP) e danos pela interrupção dos ciclos de sincronização sono-vigília fetais intrauterinos. A dessincronização tem grande importância na indução do crescimento axonal a partir das células ganglionares retinianas e seu direcionamento até o SNC. Essas interrupções causam a desorganização dos feixes retinotalâmicos e corticais, alteram a diferenciação retiniana, o desenvolvimento visual pós-natal e a criação das colunas de dominância no córtex visual e, finalmente, a integração neurossensorial e cognitiva subsequente e requerem reabilitações cujo sucesso tende a ser relativo. Diante das colocações aqui apresentadas, é compreensível que as perspectivas atuais se voltem para os aspectos funcionais e clínicos e para as possíveis conexões transdisciplinares. No estudo da embriogênese ocular, ficaram claramente evidenciadas as interações do olho e do SNC, e assim justifica-se a tendência por abordagens propedêuticas cada vez mais amplas na condução dos casos de glaucoma pelo possível envolvimento de fatores neurológicos e sistêmicos concomitantes. ▌▌ BIBLIOGRAFIA Agorastos A, Huber CG. The role of melatonin in glaucoma: implications concerning pathophysiological relevance and therapeutic potential. J Pineal Res. 2011; 50(1):1-7. Alkatan H. Update on Anterior Segment Development with Emphasis on Genetics and Correlation with Pathogenesis of Developmental & Primary Open Angle Glaucoma. Advances in Ophthalmology & Visual System. 2017; 6(1):00164. Anderson DR. The development of the trabecular meshwork and its abnormality in primary and infantile glaucoma. Trans Am Ophthal Soc. 1981; 79:458-85. Asrani S, Zeimer R, Wilensky J, Gieser D, Vitale S, Lindenmuth K. Large diurnal fluctuations in IOP are an independent risk factor in patients with glaucoma. J Glaucoma. 2000; 9:134-42. Barishak YR. The development of the anterior chamber angle in vertebrate eyes. Dot Ophthalmol. 1978; 45:329-60. Beebe DC, Coats JM. The lens organizes the anterior segment: Specification of neural crest cell differentiation in the avian eye. Dev Biol. 2000; 220(2): 424-31. Bonomo PP. Pars plana and ora serrata: anatomotopographic study of fetal eyes. Acta Ophthal. 1989; (67):145-50. Carreon T, Merwe EV, Fellman RL, Johnstone M, Bhattacharya SK. Aqueous outflow - a continuum from trabecular meshwork to episcleral veins. Progress in Retinal and Eye Research. 2017; 57:108-33. Churchill A, Booth A. Genetics of aniridia and anterior segment dysgenesis. Br J Ophthalmol. 1996; 80(7): 669-73. Cveckl A, Tamm ER. Anterior eye development and ocular mesenchyme: new insights from mouse models and human disease. Bio Essays. 2004; 26(4):374-86. Dublin I. Comparative embryologic studies of the early development of the cornea and the pupillary membrane in reptiles, birds and mammals. Acta Anat (Basel). 1970; 76(3):381-408.

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Capítulo 1  Embriologia do Seio Camerular  15

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Definição, Classificação e Diagnóstico Diferencial dos Glaucomas na Infância Christiane Rolim de Moura

▌▌ DEFINIÇÃO

CAPÍTULO

2

E CLASSIFICAÇÃO

A ideia de unificar a classificação das doenças é muito usual na Medicina e, no caso dos glaucomas na infância, vem sendo discutida há muitos anos, tendo em vista a raridade e diversidade de apresentações. Hoskins et al., em 1984, introduziram uma classificação dos glaucomas na infância, citando que uma padronização permitiria estudos colaborativos, e o termo glaucoma do desenvolvimento foi utilizado.1 Mais tarde, em 1996, Dickens & Hoskins, em um capítulo da segunda edição do livro The Glaucomas, de Ritch, Shields & Krupin, referem que o glaucoma congênito é um dos muitos tipos de glaucomas do desenvolvimento, terminologia a qual os autores consideraram algo inconsistente e ocasionalmente confusa.2 Na obra citada anteriormente, os glaucomas foram classificados de duas formas: a primeira baseada nos eventos iniciais que levaram ao surgimento da doença e uma segunda baseada nos mecanismos de obstrução do escoamento. Na primeira classificação, os autores determinam um grupo de doenças chamadas de glaucomas do desenvolvimento, que englobariam os seguintes diagnósticos: •• Glaucoma congênito (infantil). •• Glaucoma juvenil. •• Síndrome de Axenfeld-Rieger. •• Anomalia de Peters. •• Aniridia. •• Outras anomalias do desenvolvimento. Na segunda classificação, que evidencia os mecanismos de obstrução, foi utilizado o termo anomalias do desenvolvimento do ângulo da câmara anterior, e assim subdividido em: •• Inserção alta da íris anterior: Glaucoma congênito (infantil). Glaucoma juvenil. Glaucomas associados a outras anomalias do desenvolvimento. •• Desenvolvimento incompleto da malha trabecular e do canal de Schlemm: Síndrome de Axenfeld-Rieger. Anomalia de Peters. Glaucomas associados a outras anomalias do desenvolvimento. •• Adesões iridocorneanas: Traves irianas largas (síndrome de Axenfeld-Rieger). Traves irianas finas contráteis que fecham o ângulo (aniridia).

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Yeung & Walton, em 2010, propuseram mais uma classificação, ainda usando o termo glaucoma do desenvolvimento, e descrevem detalhadamente as múltiplas etiologias, classificando-as como primárias ou do desenvolvimento e secundárias ou adquiridas.3 Em 2011, a falta de homogeneidade nas classificações e terminologias descritas motivou especialistas de vários países do mundo a criar um grupo de pesquisa, chamado Childhood Glaucoma Research Network (CGRN), que iniciou a elaboração de critérios diagnósticos para os glaucomas na infância e um sistema de classificação, o qual fosse pouco complexo e aplicável, e com isso houvesse uma unificação da terminologia e a nomenclatura fosse usada globalmente. Esse grupo foi convidado a participar da elaboração do 9o Consenso da World Glaucoma Association, cujo tema foi Glaucoma na Infância. A classificação e os critérios diagnósticos foram publicados em forma de livro, em 2013.4 A classificação proposta foi validada, durante a elaboração desse consenso, em alguns casos clínicos, de forma que fosse aprovada pelo grupo participante. O objetivo desse trabalho foi a criação de uma classificação simples, lógica e abrangente. A classificação foi baseada em achados clínicos, momento de surgimento de sintomas e contextos nos quais o diagnóstico se baseou. O resultado desse trabalho culminou nos critérios diagnósticos para a definição de glaucoma e suspeito de glaucoma na infância, elaborado pelo CGRN, exposto a seguir: •• Definição de glaucoma – presença de dois ou mais dos seguintes critérios: Pressão intraocular (PIO) acima de 21mmHg (os dados obtidos no exame sob narcose e a sua interpretação ficam a critério do examinador). Escavação do disco óptico: cc Aumento progressivo da relação escavação/disco. cc Assimetria da relação escavação/disco superior ou igual a 0,2, quando os discos têm tamanhos simétricos. cc Afinamentos focais da rima neural. Achados corneanos: cc Estrias de Haab. cc Diâmetro da córnea maior que 11mm nos recém-nascidos, maior que 12mm na criança menor que 1 ano de idade e maior que 13mm em qualquer idade. Miopia progressiva, ou progressão miópica associada ao aumento das dimensões oculares, além do crescimento normal do globo ocular. Defeito de campo visual reprodutível, consistente com neuropatia óptica glaucomatosa e sem outras causas que poderiam levar a déficit de campo visual. •• Definição do suspeito de glaucoma – presença de um dos critérios listados a seguir: PIO maior que 21mmHg em uma ou mais ocasiões. Disco óptico com aspecto glaucomatoso. Campo visual com alterações suspeitas de glaucoma. Aumento do diâmetro da córnea ou do diâmetro axial na vigência de PIO normal. E, quanto à classificação, os autores do CGRN sugerem que os clínicos utilizem um guia de categorização, para tornar mais fácil o diagnóstico, de forma que a classificação dos glaucomas primários seja de exclusão, após a investigação das outras possibilidades diagnósticas. A Figura 2.1 mostra o esquema de classificação para o conhecimento desses leitores, o qual tem sido utilizado em estudos de prevalência de glaucoma em diferentes populações.5 E, a partir desse fluxograma, chegamos aos seguintes grupos, nos quais é possível categorizar os pacientes com glaucoma na infância:

•• Glaucomas primários:

Glaucoma congênito primário. Glaucoma de ângulo aberto juvenil. •• Glaucomas secundários: Glaucoma associado a anomalias oculares não adquiridas. Glaucoma associado a síndromes ou doenças sistêmicas não adquiridas. Glaucoma associado a condições adquiridas. Glaucoma após cirurgia de catarata.

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Capítulo 2  Definição, Classificação e Diagnóstico Diferencial dos Glaucomas na Infância  19

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PIO > 21mmHg Disco óptico suspeito > E/D Assimetria Afinamento localizado > diâmetro corneano ou estrias de Haab > diâmetro axial; miopia Alteração de campo visual (2 ou mais critérios) Não Suspeita de glaucoma: (1 critério) Confirmar PIO > 22mmHg em duas explorações

Diagnóstico de glaucoma realizado após cirurgia de catarata

Sim

Glaucoma após a cirurgia de catarata > 50% glaucoma de ângulo aberto < 50% glaucoma de ângulo fechado

Não Anomalia congênita ocultar ou síndrome sistêmica

Sim

Envolvimento sistêmico

Não

Sim Glaucoma associado a síndromes ou doenças sistêmicas não adquiridas

Não Glaucoma associado a anomalias oculares não adquiridas

Antecedente de traumatismo, uveítes, tumores etc Não

Sim Glaucoma associado a condições adquiridas

Buftalmo Não Glaucoma juvenil

Sim Glaucoma congênito primário

Figura 2.1 Fluxograma da classificação do glaucoma na infância. Deve-se seguir o fluxo da esquerda para a direita, com início na presença de sinais diagnósticos até a classificação nos diferentes grupos.

Glaucomas primários e secundários na infância Os glaucomas primários na infância podem ser subdivididos em: •• Glaucoma congênito primário: De manifestação neonatal (≤1 mês de vida). De manifestação infantil (de 1 a 24 meses). De manifestação tardia (>2 anos). •• Glaucoma de ângulo aberto juvenil. Os glaucomas secundários na infância podem ser subdivididos em:

•• Glaucoma associado a anomalias oculares não adquiridas (incluem-se as anomalias predo-

minantemente oculares presentes ao nascimento, associadas ou não a manifestações sistêmicas): Anomalia de Axenfeld-Rieger (síndrome, se incluir associações sistêmicas). Anomalias de Peters. Ectrópio uveal congênito. Hipoplasia congênita de íris. Aniridia. Persistência da vascularização fetal. Melanocitose oculodérmica (nevos de Ota). Distrofia polimorfa posterior. Microftalmo ou microcórnea. Ectopia lentis.

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É interessante ressaltar que algumas dessas anomalias, tais como a anomalia de Peters, aniridia, microcórnea, têm sido classificadas de uma maneira mais abrangente, desde que muitas vezes são espectros diferentes de erros genéticos semelhantes. São consideradas disgenesias cerato-irido-lenticulares.6 •• Glaucoma associado a síndromes ou doenças sistêmicas não adquiridas (incluem doenças de predomínio sistêmico presentes ao nascimento e que podem estar associadas a sinais oculares): Alterações cromossômicas. Doenças do tecido conjuntivo: cc Síndrome de Marfan. cc Síndrome de Weil-Marchesani. cc Síndrome de Stickler. Doenças metabólicas: cc Homocistinúria. cc Síndrome de Lowe. cc Mucopolissacaridoses. Facomatoses: cc Neurofibromatoses. cc Síndrome de Sturge-Weber. cc Síndrome de Klippel-Trenaunay-Weber. Doença de Rubinstein-Taybi. Rubéola congênita. •• Glaucoma associado a condições adquiridas (que se desenvolvem após o diagnóstico de uma doença não hereditária e ausente ao nascimento): Uveítes. Trauma (hifema, recessão angular, ectopia lentis). Glaucoma associado ao uso de corticosteroide. Tumores (benignos ou malignos, oculares ou orbitários). Retinopatia da prematuridade. Pós-cirurgia (exceto secundário a cirurgia de catarata congênita). •• Glaucoma após a cirurgia de catarata (diagnóstico de glaucoma realizado após a cirurgia de catarata): Catarata congênita idiopática. Catarata congênita associada a alterações oculares ou doenças sistêmicas. Catarata adquirida.7 Esta classificação será utilizada ao longo desta obra, para separar didaticamente cada grupo de doença, de maneira que seja mais claro discorrer sobre cada um no respectivo capítulo. ▌▌ DIAGNÓSTICO

DIFERENCIAL

Há que se conhecer também os diagnósticos diferenciais, pois uma criança só deve ser submetida a tratamento cirúrgico, clínico ou mesmo ao seguimento com exames sob narcose seriados, caso haja razoável certeza diagnóstica. A Tabela 2.1 apresenta os principais diagnósticos diferenciais, e, em seguida, eles serão abordados no texto. Em algumas situações, os olhos podem parecer grandes, porém a determinação do aumento do diâmetro corneano deve ser feita por medida objetiva, com métodos estabelecidos. Discorreremos sobre isto no Capítulo 6, Particularidades na Tonometria, Exame Biomicroscópico, Gonioscopia, Exame do Segmento Posterior e Refração. Quando se observa clinicamente um olho considerado grande, ou quando há assimetria entre o tamanho dos globos oculares de uma criança e a medida do diâmetro corneano encontra-se normal, é importante lembrar da possibilidade de assimetrias palpebrais congênitas ou adquiridas (ptose, miastenia gravis), retrações (doença de Graves) ou, ainda, de massas compressivas retrobulbares que podem deslocar o globo anteriormente.8

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Capítulo 2  Definição, Classificação e Diagnóstico Diferencial dos Glaucomas na Infância  21

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Tabela 2.1 Diagnósticos diferenciais dos glaucomas na infância.

■■ Aumento do diâmetro corneano: •• Megalocórnea ligada ao X •• Alta miopia congênita •• Doenças do tecido conjuntivo (síndrome de Marfan, osteogênese imperfeita) •• Mutações no LTBP2 ■■ Opacidades corneanas: •• Trauma obstétrico •• Distrofias corneanas (CHED, distrofia polimorfa posterior) •• Distúrbios metabólicos (mucopolissacaridoses, mucolipidoses e cistinose) •• Infecções congênitas (rubéola, varicela e outras sem elevação da PIO e outros sinais de glaucoma) •• Anomalia de Peters, esclerocórnea e microcórnea (sem elevação de PIO e outros sinais de glaucoma) ■■ Outras causas de epífora: •• Obstrução congênita da via lacrimal •• Conjuntivite •• Abrasões corneanas ou ceratites ■■ Aumento da relação escavação/disco do nervo óptico: •• Escavação grande fisiológica •• Hipoplasia do nervo óptico com leucomalacia periventricular •• Coloboma do nervo óptico •• Fosseta congênita do disco óptico •• Outras anomalias do disco óptico

Já nos casos em que o diâmetro corneano encontra-se de fato aumentado, suspeita-se da megalocórnea ligada ao X, que é uma doença rara e se apresenta de maneira bilateral em meninos. A córnea tem diâmetro horizontal superior a 13mm, a câmara anterior é profunda, porém não se observa aumento da cavidade vítrea, e o globo ocular pode ter a medida biométrica no limite superior da normalidade ou acima dela, às custas das dimensões do segmento anterior. Não há roturas de Descemet nem opacidades, porém é possível que se observe degeneração corneana em mosaico (Shagreen). A íris é abaulada posteriormente, e à gonioscopia se observa a banda do corpo ciliar, mesmo em crianças pequenas.8-10 Nesses casos, a PIO e o disco óptico apresentam aspectos normais, porém é interessante que se mantenha a criança em seguimento até que o diagnóstico de glaucoma seja excluído. A alta miopia congênita (maior que 6D) pode se assemelhar muito ao buftalmo, pois tanto o segmento anterior quanto o posterior podem estar acima do limite superior da normalidade. No entanto, nesses casos, não há elevação da PIO, nem estrias de Haab, nem opacidades corneanas. Por outro lado, no mapeamento da retina, é possível observar os achados associados à alta miopia, tais como disco óptico tiltado, crescente peripapilar e moteado da coroide, ou seja, achados característicos do fundo miópico.8-11 As doenças do tecido conjuntivo, como Marfan e a osteogênese imperfeita, podem também estar associadas à presença de córneas com diâmetro horizontal no limite superior, porém, nesses casos, também a PIO e o aspecto do disco óptico não apresentam alterações glaucomatosas. A mutação no gene LTBP2 pode condicionar aumento do diâmetro corneano, frouxidão zonular e esferofacia. Em regra, o glaucoma não está associado, a menos que se observe fechamento angular facotópico. Em geral, o diâmetro corneano excede os 13mm na horizontal, porém a PIO encontra-se dentro dos limites da normalidade.8,9 Em relação às outras afecções corneanas que podem mimetizar glaucoma, podemos citar a presença de lesões traumáticas que geram roturas de Descemet. As estrias de Haab caracterizam-se por serem concêntricas em relação ao limbo ou horizontais. Quando observamos na lâmpada de fenda, o final da estria de Haab tem ângulo agudo, consequência da distensão da inelástica Descemet pela força da PIO. As roturas provocadas por trauma, em geral tocotrauma, pelo uso de fórceps são reconhecidas na literatura há muito tempo.12 Na maioria das vezes são unilaterais (lado esquerdo), e o edema de córnea é transitório, pois usualmente há melhora espontânea. Além disso, costumam ser verticais e suas bordas são quadrangulares; podem levar à presença de astigmatismo grave e há casos descritos de descompensação da córnea na idade adulta.13 Em geral, na anamnese colhemos a informação do uso de fórceps no

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parto, e isso colabora em muito para o diagnóstico. Em raras ocasiões, faz-se necessário o uso de tomografia de coerência óptica do segmento anterior para avaliar a lesão da Descemet.14 As distrofias primárias da córnea, apesar de raras, podem ser referidas como glaucoma na infância, pois cursam com opacidade corneana. A distrofia polimorfa posterior (PPMD) é manifesta em geral em jovens, porém há casos descritos de opacidade observada nas primeiras semanas de vida.15 Tem caráter autossômico dominante e é assintomática em geral, podendo eventualmente cursar com fotofobia em casos graves. No exame da lâmpada de fenda, há opacidades próximo à Descemet, com formatos variados (em vesículas ou em bandas) e irregulares. O exame dos familiares pode ajudar no diagnóstico. A distrofia congênita hereditária endotelial (CHED) manifesta-se de maneira mais simétrica, pode ter herança autossômica recessiva ou dominante, e apresenta-se clinicamente com espessamento difuso estromal e edema, em geral ao nascimento ou nos primeiros anos de vida. Apesar de existirem na literatura alguns relatos de casos nos quais glaucoma e CHED coexistem,16 acredita-se que possa acontecer um equívoco diagnóstico, desde que a PIO pode estar falsamente elevada por alterações biomecânicas da córnea.17,18 Nesses casos, não se observa aumento do diâmetro corneano, nem axial, e o disco óptico, quando visível, não mostra sinais de dano glaucomatoso. Além disso, a tensão digital pode colaborar com a percepção da leitura equivocada da PIO. Existe a possibilidade da confirmação diagnóstica por meio de testes genéticos. As doenças metabólicas, tais como a mucopolissacaridose, a esfingolipidose e a cistinose, podem mimetizar glaucoma, pois observa-se um quadro de opacidade corneana, muitas vezes significativo. Geralmente não se manifestam ao nascimento, mas sim ao longo da infância, e são quadros simétricos. A alteração da rigidez corneana pode levar a equívocos na aferição da PIO, com medidas hiperestimadas. No entanto, deve-se ter muita atenção, conferindo a tonometria com a tensão digital e avaliando-se minuciosamente o disco óptico, pois a deposição de glicosaminoglicanos no seio camerular pode levar a dificuldade no escoamento e a glaucoma secundário.19 As características dismórficas clássicas de tais doenças também colaboram com o diagnóstico e, no caso da cistinose, há depósitos cristalinos no estroma da córnea. As infecções congênitas, tais como rubéola congênita e varicela-zóster,20 podem cursar com ceratites neonatais que mimetizam glaucoma, mas nesses casos não são observados outros sinais, como elevação da PIO, aumento do diâmetro corneano e axial do globo, bem como não são evidenciados sinais de neuropatia. Vale lembrar que infecções gestacionais com os vírus da rubéola, citomegalovírus e, mais recentemente, com o Zika vírus podem estar associadas ao desenvolvimento de glaucoma, como em alguns casos reportados.21-24 Vale citar que a neuropatia causada em alguns casos de infecção congênita por Zika vírus pode mimetizar a neuropatia glaucomatosa com aumento da relação escavação/disco vertical, porém sem sinais de aumento da PIO.25 As disgenesias ceratoiridolenticulares, tais como a síndrome de Peters, a esclerocórnea e outras opacidades congênitas da córnea, são frequentemente referidas como glaucoma congênito, mas em aproximadamente metade dos casos o glaucoma não está presente, entretanto os casos devem ser minuciosamente examinados para excluir a concomitância das doenças. A biomicroscopia ultrassônica, atualmente, é exame de grande relevância no diagnóstico dessas anomalias.6 Os glaucomas na infância que surgem antes dos 3 anos, portanto com distensão do globo e sintomas de lacrimejamento e fotossensibilidade, podem ser erroneamente tratados como doenças da superfície ocular, tais como ceratites e conjuntivites. Nesses casos, obviamente não há aumento do diâmetro da córnea, nem do globo; a PIO encontra-se nos limites da normalidade e não há alterações do disco óptico. Já nos casos de obstrução congênita do ducto nasolacrimal, a epífora não se acompanha de blefarospasmo, e a simples observação da criança na luz evidencia a ausência da fotofobia. É bastante frequente, na prática clínica, a referência de crianças com a relação escavação/ disco maior que a média populacional (> 0,5) para avaliação da presença de glaucoma. Tendo em vista a grande diversidade anatômica dos discos ópticos, um primeiro ponto a considerar é a relação do tamanho do disco com o tamanho da escavação. A megalopapila (disco com diâmetro maior que 2,1mm ou área maior que 2,5mm2), sem outras anormalidades do disco seria um

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Capítulo 2  Definição, Classificação e Diagnóstico Diferencial dos Glaucomas na Infância  23

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extremo desse espectro.26 A análise da camada de fibras nervosas da retina nos casos de megalopapila pode mostrar-se equivocada, tendo em vista a dimensão do nervo óptico. Sendo assim, outros parâmetros, tais como espessura do complexo de células ganglionares da região macular ou espessura da rima neural, podem ser parâmetros mais confiáveis nas análises tomográficas desses casos.27,28 Muitas vezes, as escavações fisiológicas maiores e os discos ópticos maiores podem ter uma apresentação familiar, e o exame dos pais pode ser bastante elucidativo. A leucomalacia periventricular, resultado de lesão hipóxico-isquêmica intrauterina, observada comumente na criança prematura, está associada a disfunção visual cognitiva, constrição de campo visual inferior e diplegia espástica.29 Nesses casos, observa-se um aumento da relação escavação/disco, que se evidencia nos primeiros anos de vida e não se relaciona com perda glaucomatosa, mas sim com atrofia óptica associada à degeneração transináptica retrógrada, consequência da lesão hipóxica primária das radiações ópticas.30 A fosseta congênita do disco óptico e os colobomas de disco são malformações raras do disco óptico, que podem ser diagnosticadas como lesões glaucomatosas deste. Vale lembrar que a fosseta congênita se localiza, em regra, na região temporal inferior, é usualmente unilateral e pode estar relacionada com descolamento seroso da mácula. Na tomografia de coerência óptica, é possível a observação de um defeito na lâmina crivosa. Já os colobomas de disco são usualmente bilaterais, e a escavação do disco parece se localizar mais inferiormente.31 Neuromielite óptica, doença de Devic e neuropatia óptica hereditária de Leber também são afecções do nervo óptico que podem manifestar-se com aumento da relação escavação/disco. São também manifestações de degeneração transináptica retrógrada e não estão associadas ao aumento da PIO. Outros achados clínicos e de neuroimagem comprovam o diagnóstico dessas doenças.32 É interessante observar que tanto a relação escavação/disco como a lesão da camada de fibras nervosas da retina, avaliada na tomografia de coerência óptica, podem progredir caso haja evolução da doença de base.33 ▌▌ REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS

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Epidemiologia

Julia Rossetto • Andrea Zin

CAPÍTULO

3

▌▌ INTRODUÇÃO

O glaucoma infantil é uma doença com diferentes etiologias e com prognóstico visual devastador quando não diagnosticado e tratado adequadamente. Dessa forma, seu reconhecimento é primordial a fim de evitar a baixa visual ou a cegueira irreversíveis. Entre os obstáculos ao seu diagnóstico estão a falta de dados epidemiológicos consistentes. Neste capítulo será abordada a epidemiologia do glaucoma infantil e da deficiência visual a ele associada. A incidência de glaucoma congênito primário (GCP) tem grande variação dentre as diferentes etnias e áreas geográficas, muitas vezes devido a diferenças na definição escolhida por cada estudo (alguns definem como GCP aquele de aparecimento no primeiro ano de vida, enquanto outros, nos primeiros 4 anos de vida) ou por viés de referência (nos estudos não populacionais). Em decorrência de sua característica hereditária, a incidência do GCP tende a ser maior em populações com maior ocorrência de consanguinidade. O GCP é tipicamente bilateral, assimétrico e, normalmente, manifesta-se no primeiro ano de vida, podendo, porém, apresentar-se em qualquer outra idade. Na Europa e nos EUA, ocorre mais frequentemente em meninos, numa proporção de 2 a 2,5 para cada menina, apesar de se desconhecer padrão de herança ligado ao sexo. Casos familiares, como os descritos no Oriente Médio e nos ciganos eslovacos, tendem a ter a mesma distribuição entre os sexos.1 ▌▌ ESTUDOS

POPULACIONAIS

Um estudo populacional norte-americano realizado em Minnesota com base em dados de 40 anos reportou uma incidência de glaucoma de 2,29/100.000 entre residentes menores de 20 anos de idade (IC 95%: 1,47 a 3,12); a média da idade ao diagnóstico foi de 10,4 anos de idade; a maior prevalência foi reportada entre os brancos (60%), 50% com glaucoma bilateral e 20% com história familiar positiva para glaucoma.2 O GCP foi descrito anteriormente como o glaucoma mais frequente na infância, com uma incidência de 1 para cada 10 a 20.000 nascidos vivos.1 Porém, Aponte et al.2 relataram uma incidência de GCP de 0,07 (IC 95%: 0,08 a 0,82) por 100.000 pacientes com idade inferior a 20 anos e uma prevalência de 1,46 (IC 95%: 0,03 a 8,16) por 100.000 nascidos vivos. Essa prevalência é inferior a todas previamente reportadas de: 1:1.250 (80:100.000) nos ciganos eslovacos; 1:2.500 (40:100.000) na Arábia Saudita; 5,41:100.000 na Inglaterra; e de 3,31:100.000 na Irlanda.2 O glaucoma secundário (associado a síndromes ou outras condições, como Axenfeld-Rieger e aniridia) apresentou incidência de 0,45 (IC 95%: 0,08 a 0,82) por 100.000 pacientes com idade inferior a 20 anos.2 E o glaucoma adquirido (secundário a processos de aparecimento após o nascimento, como trauma ou cirurgia) foi a entidade mais prevalente, apresentando incidência de 1,46 (IC 95%: 0,80 a 2,12) por 100.000 pacientes

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com idade inferior a 20 anos e maior frequência entre os homens, geralmente mais expostos ao trauma.2 Outro estudo recente norte-americano usou a classificação unificada de glaucoma da infância proposta pela Childhood Glaucoma Research Network (CGRN) para, retrospectivamente, reportar a prevalência de cada entidade no seu serviço terciário.3 Hoguet et al. detectaram 205 pacientes e reportaram envolvimento bilateral em 60% dos pacientes, maior proporção do sexo masculino (72%) naqueles com GCP; nos demais tipos de glaucoma não houve diferença de apresentação entre os sexos. Excluindo-se os pacientes com suspeita de glaucoma, os tipos de glaucoma apresentaram a seguinte distribuição: GCP (32%), glaucoma associado a condições adquiridas (23%), glaucoma pós-cirurgia de catarata (18%), glaucoma associado a doenças sistêmicas não adquiridas ou síndromes (11,5%), glaucoma associado a anomalias oculares não adquiridas (8,2%) e glaucoma juvenil de ângulo aberto (7,4%). A perda visual é uma das consequências do glaucoma infantil com grande impacto socioeconômico. Entre os fatores de risco para um prognóstico visual desfavorável, estão a afacia e as síndromes como Sturge-Weber, anomalia de Peters e aniridia, além das anomalias oculares como retinopatia da prematuridade e persistência da vasculatura fetal.4 A etiologia associada ao melhor prognóstico visual é o GCP.4 O prognóstico visual varia dentre os estudos, inclusive pelo uso de diferentes critérios de corte para classificação de acuidade visual (AV). Em estudo observacional realizado em 126 crianças (204 olhos) com glaucoma durante um período de 30 anos (tempo médio de seguimento de 11,6 anos), a AV foi avaliada a intervalos de 6 anos e estratificada entre boa (20/20 a 20/40), razoável (20/50 a 20/100) e ruim (≤ 20/200). O estudo reportou estabilidade da AV durante o período estudado, e a porcentagem de olhos com glaucoma com boa AV variou de 22% a 29%; com AV razoável, de 21% a 31%; e com AV ruim, de 40,5% a 50%.4 Entre os 60 olhos com boa AV, 40% apresentavam o diagnóstico de GCP. O critério escolhido representa os níveis de visão com os quais a criança pode realizar atividades escolares desassistidas e ter uma boa qualidade de vida (AV boa), precisa de alguma assistência durante suas atividades (AV razoável), ou, ainda, é considerada legalmente cega (AV ruim). Dessa forma, ilustra-se o prognóstico devastador do glaucoma infantil, com cerca de metade dos pacientes apresentando cegueira legal no decorrer do seu acompanhamento. Os dados epidemiológicos brasileiros acerca do glaucoma infantil provêm, em grande medida, de estudos institucionais no tratamento da baixa visual. Em estudo retrospectivo de revisão de prontuários de 229 pacientes com idades entre 0 e 7 anos, a idade média na primeira consulta foi de 39,4 meses de vida, 64% apresentavam causas evitáveis de baixa visual e as três principais etiologias da deficiência visual foram catarata (14%), toxoplasmose (14%) e glaucoma congênito (13%).5 Entre as causas responsáveis pela alta prevalência de baixa visual por causas tratáveis, estão o acesso restrito aos centros de saúde com consequente diagnóstico tardio dessas patologias. Estudos prévios, em crianças com baixa de visão no Brasil, reportaram prevalência de glaucoma entre 8,8% e 30,6% em suas amostras.5-10 Uma revisão sistemática acerca das causas globais de cegueira infantil reportou que, nos países em desenvolvimento, de 7% a 31% das causas de cegueira e baixa visual são evitáveis; 10% a 58% são tratáveis; e 3% a 28%, preveníveis. A principal causa são opacidades corneanas. Nos países desenvolvidos, as principais causas da baixa visual são cegueira cortical, doenças retinianas (incluindo retinopatia da prematuridade) e doenças do nervo óptico (incluindo hipoplasia de nervo óptico).11 A prevalência de glaucoma variou de 0,04 nos Países Baixos a 41,3 na Índia,11 e há estimativa da Organização Mundial da Saúde de que, entre o 1,4 milhão de crianças cegas, 6% sejam em decorrência de glaucoma.12 Fatores socioeconômicos e culturais contribuem para a enorme variação na prevalência do glaucoma infantil, assim como da cegueira e baixa visual reversíveis entre os países desenvolvidos e aqueles em desenvolvimento. Ainda há a necessidade do diagnóstico precoce e melhora do acesso aos centros de saúde para tratamento e acompanhamento adequados. Desde o início dos anos 2000, diversos Estados e municípios brasileiros aprovaram leis que regulam a realização do teste do reflexo vermelho, um exame de triagem realizado pelo pediatra antes da alta da maternidade e ao longo dos primeiros anos de vida, como recomendam

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Genética

CAPÍTULO

José Paulo Cabral de Vasconcellos • Mônica Barbosa de Melo • Juliana Maria Ferraz Sallum

4

SEÇÃO 4.1 • GENÉTICA RELACIONADA AO GLAUCOMA José Paulo Cabral de Vasconcellos • Mônica Barbosa de Melo ▌▌ INTRODUÇÃO

O melhor entendimento das bases genéticas do glaucoma na infância, além de auxiliar na compreensão dos mecanismos envolvidos nessas condições, poderá ajudar no seguimento e no aconselhamento genético de pacientes com maior risco para desenvolvimento dessas afecções.1 Para isto é fundamental a elaboração das hipóteses diagnósticas por meio da classificação do glaucoma na infância em primário ou secundário, além da determinação de quais são as estruturas oculares acometidas e da presença ou não de alterações sistêmicas pertinentes. Esse cuidado deve-se ao fato de que, apesar da heterogeneidade de muitas dessas condições, o diagnóstico e o detalhamento das características clínicas do exame ocular e sistêmico da criança (fenótipo) direcionam a avaliação de qual ou quais genes estariam mais frequentemente associados à doença em questão. Além disso, de forma geral, deve-se considerar uma maior chance da participação de componentes genéticos em crianças que apresentem glaucoma bilateral, história familiar positiva ou pais consanguíneos.2 ▌▌ GLAUCOMA

CONGÊNITO PRIMÁRIO

O glaucoma congênito primário (GCP) é a forma mais comum de glaucoma pediátrico.3 Até o momento, a maior parte dos casos de GCP tem característica esporádica, enquanto os de origem familiar perfazem um total de até 40%, seguindo preferencialmente o padrão autossômico recessivo de herança com penetrância variável.4 Entretanto, essas estimativas de frequência entre casos esporádicos e familiares podem ser imprecisas em razão de as bases genéticas dessa forma de glaucoma ainda não estarem totalmente determinadas e variarem de acordo com a população estudada. No sentido de classificar e organizar a nomenclatura genética dos glaucomas, a Organização do Genoma Humano definiu como “GLC” a sigla para glaucoma, os números “1, 2 e 3” para determinar o tipo de glaucoma primário (ângulo aberto, ângulo fechado e congênito, respectivamente) e, finalmente, as letras, seguindo a ordem alfabética, indicando a sequência cronológica das regiões do genoma (loci) mapeadas. Por exemplo, o primeiro locus associado ao GCP denomina-se GLC3A, “GLC” para glaucoma, “3” representando o GCP e a letra “A” como a primeira região do genoma identificada associada a esse tipo de glaucoma. Os dados da litera-

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tura apontam que o GCP apresenta uma heterogeneidade genética com vários loci identificados para essa condição (GLC3A – GLC3D), assim como uma variação da expressividade clínica entre as diferentes populações, ou seja, variantes deletérias de um mesmo gene levando a diferentes fenótipos.5 O gene CYP1B1 (cytochrome p450, subfamily i, polypeptide 1) foi o primeiro gene identificado em famílias portadoras de GCP associados (ligadas) ao locus GLC3A com padrão autossômico recessivo de herança.6 Esse gene codifica uma enzima da família do citocromo P450. Ao contrário de outras enzimas dessa família, a expressão do gene CYP1B1 é maior em tecidos não hepáticos, incluindo o globo ocular, particularmente no corpo ciliar e na malha trabecular, estruturas responsáveis pela regulação da pressão intraocular (PIO).7 O mecanismo segundo o qual variantes deletérias (mutações) no gene CYP1B1 causa o GCP não está ainda esclarecido. Sugere-se que a enzima codificada pelo gene CYP1B1 participa das vias metabólicas necessárias para o desenvolvimento da câmara anterior, particularmente na formação da malha trabecular por meio da degradação de alguns metabólitos, assim como na remoção de espécies reativas ao oxigênio. Portanto, mutações no gene CYP1B1 poderiam comprometer o desenvolvimento e a diferenciação desse tecido, o que levaria ao aumento da PIO e à consequente lesão do nervo óptico, caracterizando o GCP.8,9 Mais de 150 variantes deletérias foram descritas no gene CYP1B1, e a sua prevalência varia de acordo com a população investigada: de 90% a 100% na Arábia Saudita e entre os ciganos da Eslováquia; de 14% a 30% nas populações norte-americana e europeia; e de 15% a 20% entre chineses e japoneses.10 O aspecto populacional também interfere no tipo de variante deletéria identificada, como, por exemplo, a E387K, mais prevalente na Eslováquia; a G61E, na Arábia Saudita; e a R390H entre chineses, iranianos, indianos e paquistaneses.11 Recentemente, um estudo envolvendo as populações da Índia e do Brasil observou uma frequência aproximada de 44% de variantes deletérias no gene CYP1B1 nos pacientes com GCP em ambas as populações. Apesar da frequência similar, o tipo e número de variantes, sua apresentação em homozigose, heterozigose ou heterozigose composta variou entre as duas populações. As variantes deletérias em homozigose foram mais prevalentes na população indiana (24,25%) comparada à população brasileira (16,66%), enquanto as variantes em heterozigose composta foram mais frequentes na população brasileira – 12,66% versus 5,98%. Tal fato, provavelmente, deve-se à maior taxa de casamentos consanguíneos entre os indianos. Apesar de algumas variantes deletérias estarem presentes em ambas as populações, a sua maioria mostrou-se população-específica, com 33 variantes observadas na população indiana e ausentes na brasileira e 11 variantes brasileiras não observadas entre os indianos, incluindo a variante deletéria mais comum no Brasil: a 4340delG. Esse mesmo estudo não demonstrou uma relação fenótipo (apresentação clinica do GCP)/genótipo (tipo de variante). Entretanto, esse é um tema ainda controverso na literatura.12 Em um estudo envolvendo 30 pacientes com GCP na população brasileira, houve necessidade de um número maior de cirurgias para controle do glaucoma entre os pacientes portadores de variantes deletérias no gene CYP1B1.13 Uma possível justificativa foi sugerida por um estudo que observou alterações mais pronunciadas na malha trabecular em pacientes com GCP e variantes no gene CYP1B1. Outro estudo que avaliou o GCP em uma amostra miscigenada da população brasileira constatou que marcadores de ancestralidade africanos estavam associados com um pior prognóstico cirúrgico.14 Finalizando, alterações estruturais no gene CYP1B1 também já foram descritas em uma frequência muito menor em outros fenótipos, como a aniridia, a anomalia de Peters, a síndrome de Axenfeld-Rieger (SAR) e o glaucoma primário de ângulo aberto juvenil.11 Em 2009, identificaram-se variantes deletérias no gene LTBP2 (latent transforming growth factor-beta-binding protein 2) ligado ao locus GLC3D em famílias do Paquistão e do Irã com GCP e padrão autossômico recessivo.15 Entretanto, até o momento, alterações nesse gene não foram identificadas em outras populações, incluindo a do norte da Índia, dos EUA, da Inglaterra e da China. Os genes associados aos loci GLC3B e GLC3C ainda não foram identificados.11 Recentemente, a partir de um modelo animal knock-out para o gene TEK (tyrosine kinase, endothelial)

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PARTE

Propedêutica do Glaucoma na Infância

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Anamnese no Glaucoma na Infância

Alberto Jorge Betinjane

CAPÍTULO

5

▌▌ INTRODUÇÃO

O glaucoma na infância é uma doença rara, muito grave, e constitui-se em uma das maiores causas de cegueira da infância. As características do glaucoma que acometem as crianças são totalmente diferentes das características do glaucoma do adulto, considerando a fisiopatologia da doença, a evolução e o tratamento. O aumento da pressão intraocular (PIO) é consequência de anomalias de desenvolvimento do segmento anterior do globo ocular, mais propriamente da região do trabeculado corneoescleral, anomalias essas que dificultam o escoamento do humor aquoso da câmara anterior e, consequentemente, causam aumento da PIO. O diagnóstico do glaucoma na infância às vezes se constitui em verdadeiro desafio até mesmo para o médico especialista, considerando que nem sempre boa parte dos sinais clínicos se mostram presentes logo no início da doença. As manifestações clínicas podem já estar presentes ao nascimento da criança, mas, na maioria das vezes, manifestam-se no decorrer do primeiro ano de vida. Além disso, a dificuldade em examinar a criança, devido à falta de colaboração adequada própria da idade, geralmente contribui para a ocorrência de dúvidas quanto ao diagnóstico no primeiro exame da criança. Esse fato pode retardar o início do tratamento e, como consequência, agravar o prognóstico visual do paciente. O glaucoma congênito primário (GCP) é o mais comum entre os glaucomas na infância. Outros tipos de glaucoma da criança podem estar associados a outras anomalias de desenvolvimento tanto oculares como sistêmicas, ou ainda podem estar associados a causas de outras naturezas como trauma, inflamação ocular, cirurgias oculares e iatrogenias; neste último caso, geralmente é devido ao uso inadequado de colírio com cortisona. Na primeira abordagem do paciente com suspeita de glaucoma na infância, a anamnese constitui uma parte muito importante do exame, considerando que as informações obtidas através de perguntas bem elaboradas, feitas pelo médico aos pais ou responsáveis, podem conduzir a uma precisa suspeita diagnóstica, que será confirmada geralmente através de um exame físico complementar. A esse respeito, um exame dos olhos da criança, mesmo que incompleto, deve ser realizado durante a primeira abordagem da criança, logo após o término da anamnese, podendo fornecer algumas informações clínicas adicionais no sentido de conduzir a uma suspeita diagnóstica mais precisa. Ao final do primeiro exame da criança que se apresenta ao consultório com suspeita de glaucoma, os dados obtidos pela anamnese, somados aos do exame físico complementar, geralmente nos permitem admitir a possibilidade maior ou menor da ocorrência da doença, como também, em caso positivo, caracterizar qual o tipo de glaucoma em questão (primário, associado a anomalias sistêmicas; ou secundário). Isso irá nos permitir transmitir aos pais, já de antemão, informações sobre a provável doença, o prognóstico e o tratamento. No entanto, na maioria das vezes, um exame sob sedação anestésica (anestesia geral) se faz necessário para a certeza diagnóstica.

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Durante a anamnese, a maneira como devem ser formuladas as questões é de grande importância, visando obter as informações relevantes que nos induzam a um diagnóstico ou, ao menos, a uma suspeita diagnóstica correta no menor tempo possível. ▌▌ COMO

CONDUZIR A ANAMNESE

Temos que considerar que a primeira consulta de um paciente com suspeita de glaucoma na infância é de extrema importância, pois poderá constituir-se no início de uma longa fase de relacionamento com os pais ou responsáveis, e com a criança, durante o longo período evolutivo de acompanhamento da doença. Portanto, constitui-se na fase inicial da relação médico-paciente, com o objetivo principal de determinar o diagnóstico de uma doença. A anamnese é parte essencial da primeira consulta. Em casos de crianças com suspeita de glaucoma, a anamnese consiste em uma entrevista ou interrogatório feito aos pais ou responsáveis, que deve ser realizada segundo técnicas corretas a serem observadas. Ao obedecer às técnicas, pode-se aproveitar ao máximo o tempo disponível para o atendimento, visando um diagnóstico rápido e seguro e a melhor indicação para o tratamento. Uma anamnese completa e adequada deve constar de: •• Identificação do paciente: nome, idade, data do nascimento, raça, sexo etc. •• Queixa principal: descrição sucinta da razão da consulta. •• História da doença atual: época do início da doença, principais sinais e sintomas, tempo de duração, forma de evolução, tratamentos realizados. •• História familiar: doenças pregressas na família, informações sobre irmãos e indagação sobre eventual existência de consanguinidade entre os pais. •• História e antecedentes pessoais: informações sobre gestação, doenças intercorrentes da mãe durante a gestação, condições do parto e do nascimento etc.

Queixa principal Após a identificação do paciente, a queixa principal se constitui praticamente na parte inicial da anamnese. Através da resposta a essa questão formulada, já poderemos ter um juízo inicial da provável suspeita diagnóstica. Assim sendo, as questões formuladas em seguida devem direcionar-se no sentido de obter informações que nos induzam a confirmar ou a desconsiderar a suspeita diagnóstica inicial. Por outro lado, durante a nossa arguição, as perguntas formuladas devem também levar em conta outras possibilidades de patologias que entram no diagnóstico diferencial da suspeita principal, e que serão mencionadas ao final deste capítulo. Nessa parte inicial da anamnese, os pais ou responsáveis são questionados sobre os primeiros sinais observados, que chamaram a atenção e que os fizeram suspeitar de alguma anormalidade nos olhos da criança. Embora os sinais iniciais clássicos do GCP sejam epífora, blefarospasmo e lacrimejamento, na maioria das vezes o que mais chama a atenção dos pais é o aumento do tamanho do olho da criança e/ou a mudança da cor dos olhos (mais propriamente da córnea). Algumas vezes, os pais referem ter notado ocorrência de alteração brusca da cor da córnea seguida de melhora parcial alguns dias após o fato ter ocorrido. As alterações observadas na córnea, no glaucoma na infância, relacionam-se com a PIO elevada. Em caso de glaucoma unilateral, esses sinais mostram-se mais fáceis de serem notados pelos pais, devido à assimetria existente entre os dois olhos.

História da doença atual Em relação à história da doença atual, procuramos obter informação sobre a ocasião em que foram observados os primeiros sinais. Através dessa questão, procuramos ter conhecimento sobre as condições da criança ao nascer e, também, sobre o tempo decorrido desde os primeiros sinais até o exame que está sendo realizado. Isto tem a ver com o fato de que, quando os olhos apresentam alterações muito importantes já ao nascimento da criança, o prognóstico da doença é bem mais reservado em relação ao controle da PIO e, consequentemente, em relação ao prognóstico visual. Além disso, o tempo decorrido desde os primeiros sinais observados até

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Particularidades da Tonometria, Exame Biomicroscópico, Gonioscopia, Exame do Segmento Posterior e Refração Bruno L.B. Esporcatte • Vespasiano Rebouças • Cristiana Ronconi

CAPÍTULO

6

▌▌ INTRODUÇÃO

O exame oftalmológico na criança apresenta diversas peculiaridades em relação à avaliação nos adultos. O principal fator de limitação é a cooperação do menor. Até 1 ano de idade, grande parte do exame pode ser feita no ambulatório. Medidas como manter a criança tranquila no colo da mãe e examinar após a amamentação podem auxiliar a avaliação do segmento anterior, a aquisição da pressão intraocular (PIO), a fundoscopia e até mesmo a refração. O examinador deve ser paciente e não forçar a criança caso não esteja colaborativa. Estratégias de distração podem facilitar o exame, que não demanda ser realizado em uma ordem sistemática. As informações podem ser adquiridas de acordo com a permissão da criança, deixando os exames mais difíceis para o final da avaliação. Na impossibilidade de adquirir os dados clínicos para o diagnóstico ou acompanhamento de crianças com glaucoma, o exame deve ser realizado sob sedação, em ambiente cirúrgico com adequado suporte anestésico. Neste capítulo serão discutidas as particularidades da tonometria, avaliação do segmento anterior, gonioscopia, fundoscopia e refração no exame de pacientes com glaucoma na infância. ▌▌ TONOMETRIA

A aferição da PIO é parte fundamental do exame oftalmológico na criança com suspeita de glaucoma. Trata-se de um dado importante tanto para o diagnóstico quanto para o acompanhamento do paciente com glaucoma na infância. A base do tratamento do glaucoma consiste exclusivamente no controle da PIO, sendo imprescindível a sua aferição precisa. Por vezes, a tonometria na criança é desafiadora devido à pouca colaboração de alguns pacientes na realização do exame. É desaconselhável tentar medir a PIO durante o choro, visto que as medidas adquiridas podem estar hiperestimadas. Assim como em adultos, a medida da PIO em crianças sofre influência da espessura central da córnea. Não existem algoritmos que possam corrigir com precisão a PIO para cada valor de espessura da córnea. Todavia, quanto maior esse valor, maior é a tendência da leitura do tonômetro estar hiperestimada.1,2 Poucos são os estudos que avaliam a medida da histerese da córnea em crianças. As evidências são de que indivíduos menores de 18 anos tenham histerese maior que de adultos.3,4 Entretanto, a forma como essa medida varia ao longo da infância ainda é desconhecida. Além disso, a medida da PIO sofre influência do tipo de tonômetro utilizado e de fatores relacionados ao procedimento anestésico quando aferida sob narcose.

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Principais tipos na prática clínica atual Tonometria de aplanação de Goldmann® O tonômetro de aplanação de Goldmann® (TAG; Haag Streit, Koeniz, Suíça – Figura 6.1A) é o padrão-ouro na aferição da PIO em adultos e crianças. A tonometria de aplanação baseia-se no princípio de Imbert-Fick, no qual a pressão interna em uma esfera ideal, seca e de paredes finas é igual à força necessária para aplanar sua superfície, dividida pela área de aplanação. Logo, quanto mais elevada a PIO, maior é a força que o tonômetro precisa fazer para aplanar uma área circular conhecida. A medida da PIO com esse aparelho tem dois grandes fatores limitantes: em primeiro lugar, para realizar o exame é necessário instilar colírio anestésico e fluoresceína, o que pode causar algum desconforto na criança; e, além disso, como o TAG fica acoplado à lâmpada de fenda, é necessário que o paciente permaneça parado, com a cabeça apoiada e olhos abertos para que o prisma do tonômetro toque e aplane a córnea, o que nem sempre é viável realizar na população infantil.

Tonometria de aplanação de Perkins® O tonômetro de Perkins® (Haag Streit, Koeniz, Suíça – Figura 6.1B) baseia-se no mesmo princípio do TAG para a aquisição da medida da PIO, porém com a vantagem de ser um tonômetro portátil e poder ser utilizado em pacientes na posição supina. Sendo assim, é extremamente útil durante o exame sob narcose. Tanto em adultos quanto em crianças, apresenta excelente concordância com os valores de PIO obtidos pelo TAG.5,6

C

A

D

B

E

Figura 6.1 Exemplos de tonômetros que podem ser utilizados em crianças. O tonômetro de Goldmann® (A) e o tonômetro de Perkins® (B) realizam a aplanação da córnea com um mesmo prisma (C). No mercado existem dois modelos de TonoPen® disponíveis: Avia (D – superior) e o XL (D – inferior). O Icare® (E) é um tonômetro de impacto que projeta uma pequena sonda metálica com ponta de plástico (E – em detalhe) contra a córnea do paciente.

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Perimetria

CAPÍTULO

Elaine Caetano de Souza • Christiane Rolim de Moura

7

▌▌ INTRODUÇÃO

O exame de campo visual ou perimetria é um exame sensorial e subjetivo, que determina os limites e a sensibilidade da ilha de visão, expressando uma função visual relacionada ao funcionamento dos fotorreceptores retinianos, via óptica e córtex visual. Este envolve um processo psicofísico, que depende da integridade funcional do sistema visual, habilidade motora e de fatores cognitivos como compreensão da situação de exame, atenção e motivação. A perimetria fornece informações sobre a funcionalidade do sistema visual do indivíduo e consequente compreensão do desempenho das atividades visuais diárias e escolares. Assim como é utilizada no manejo do glaucoma do adulto, a perimetria é uma ferramenta fundamental para o diagnóstico, prognóstico e acompanhamento das crianças glaucomatosas.1,2 Neste capítulo serão enfocados aspectos importantes para a execução do exame de campo visual em crianças, o desenvolvimento normal do campo visual em humanos e as alterações perimétricas encontradas em crianças portadoras de glaucoma. ▌▌ REALIZAÇÃO

DO EXAME DE CAMPO VISUAL NAS CRIANÇAS

A realização do exame perimétrico em crianças ainda é um procedimento desafiador. Os equipamentos para realização do campo visual foram desenvolvidos para avaliar adultos, dificultando a execução e interpretação dos resultados em crianças. Em relação aos limites etários para a realização do exame de campo visual nas crianças, há estudos que mencionam a impossibilidade de conseguir dados confiáveis em menores de 5 anos, tendo em vista a pouca atenção e a dificuldade para manter a fixação durante o exame. Porém, outros descrevem sucesso em executar a perimetria em crianças normais e glaucomatosas a partir de 4 anos de idade.1-30

Técnicas utilizadas para avaliação da perimetria A maioria dos estudos de perimetria em crianças, realizados principalmente na segunda metade do século XX, utilizam a técnica cinética (perímetro de arco-duplo, Goldmann e Octopus®). A técnica estática (perímetros Humphrey® e Octopus®) e, mais recentemente, a técnica semicinética (perímetro Octopus®) foram estudadas nas últimas décadas. Outros equipamentos e programas computadorizados, que utilizam os movimentos oculares sacádicos e jogos eletrônicos, foram desenvolvidos para melhor adequação a essas faixas etárias.6,7 A escolha da técnica perimétrica (estática ou cinética) dependerá das características de cada paciente (idade, quadro clínico e colaboração) e das regiões do campo visual a serem analisadas (central e/ou periférica).

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A perimetria manual e cinética de Goldmann fornece uma análise do campo visual central e periférico. Nessa estratégia, o examinador pode ajustar o exame às características pessoais da criança, escolhendo os estímulos adequados (tamanho e intensidade), acompanhando a velocidade de resposta do paciente, desprezando as respostas inconsistentes, repetindo os estímulos com respostas duvidosas e pesquisando as regiões de maior interesse. Por outro lado, o examinador deve ser imparcial e não influenciar a resposta da criança. É a técnica mais confiável e indicada para crianças menores de 9 anos e para aquelas que perderam região central do campo visual.8-10 É recomendado que o mesmo examinador realize todas as etapas da perimetria cinética de Goldmann e também faça os futuros exames perimétricos de seguimento da doença. Essa conduta visa minimizar as diferenças entre examinadores e garantir uma melhor comparação dos dados obtidos. A perimetria estática computadorizada realizada em crianças requer que o paciente se adapte às condições estabelecidas pela estratégia e programa escolhidos, tendo uma influência menor do examinador sobre o ritmo do exame. As crianças mais novas têm mais dificuldade em manter a atenção e isto pode ocasionar a perda de alguns estímulos. Sendo assim, nesse grupo pode-se realizar a perimetria estática com programas mais curtos, como, por exemplo, os programas de limiar Swedish Interactive Thresholding Algorithm (SITA – Fast), disponíveis nos perímetros Humphrey®. É importante que os exames subsequentes para acompanhamento da criança glaucomatosa sejam realizados no mesmo tipo de equipamento e por meio da mesma estratégia, visto que a interpretação de resultados obtidos em perímetros diferentes é limitada.11 Patel et al., em 2017, compararam a eficiência dos perímetros de Humphrey® e Octopus® para detectar alterações perimétricas em crianças. Os autores mencionam que a perimetria estática de Humphrey® é mais eficiente em detectar alterações campimétricas moderadas principalmente em crianças mais novas. A perimetria cinética automatizada do perímetro Octopus® (2000R) é menos sensível para detectar alterações campimétricas moderadas, mas é eficiente em detectar ilhas de visão periféricas residuais em glaucomas graves. Existiu uma boa concordância entre os dados obtidos nas duas perimetrias estáticas analisadas para sensibilidades médias (mean deviation, MD) superiores a −6 dB.11 A perimetria semicinética (Octopus®) permite uma velocidade constante na apresentação do estímulo na avaliação do campo visual cinético. Esse tipo de perimetria cinética tem sido realizado com maior frequência, face ao difícil acesso ao perímetro de Goldmann.12 É possível combinar as perimetrias estática e cinética obtendo informações detalhadas do campo visual central e periférico, principalmente em crianças maiores de 10 anos.11 Muitas vezes, nos pacientes menores, só é possível a realização da perimetria cinética de Goldmann, mas, à medida que a criança cresce e a atenção e colaboração se desenvolvem, é possível mudar de estratégia, migrando para a perimetria estática. Nesses casos, apesar de ser possível a obtenção de resultados semelhantes, eles não são comparáveis, e a criança necessita de um novo treinamento e estabelecimento de um exame de base para comparação com exames futuros. Ainda assim, a criança que migra da técnica cinética manual para a estática automatizada necessita de um menor número de exames para estabelecer um exame de base confiável, pois a perimetria cinética já permite a compreensão e o treinamento do exame do campo visual.

Aspectos importantes para a execução da perimetria A realização do exame de campo visual nas crianças apresenta peculiaridades se comparada àquela praticada nos adultos e, portanto, requer uma abordagem adequada do paciente e da família. É indicado que o examinador reserve um período de tempo para a execução da perimetria que permita que as etapas e observações descritas a seguir sejam consideradas. Para a execução do exame de campo visual em crianças, é fundamental que o examinador seja experiente. Nos exames com perímetros automatizados, ele deve estar presente durante a execução da avaliação para acompanhar e supervisionar o procedimento.

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Espessura Central da Córnea

Marcio Mendes

CAPÍTULO

8

▌▌ INTRODUÇÃO

A córnea e a esclera são estruturas constituídas basicamente por fibras colágenas, água e matriz proteinoglicano. Na córnea, ao redor de 90% dessas fibras se depositam na membrana de Bowman e no estroma posterior. Elas se dispõem em lamelas de número variável conforme a região da córnea, com aproximadamente 300 fibrilas na região central e 500 na periferia. As diferenças de número e disposição espacial das fibrilas são responsáveis pela variação de espessura central da córnea (ECC) encontrada no ser humano (espessamento progressivo do centro para a periferia da córnea). Outros fatores contribuem para as características da ECC, como, por exemplo, a hidratação tecidual, a qual provém do contato com o filme lacrimal, externamente, e o humor aquoso, internamente. A hidratação é mantida constante através de bombas de sódio e potássio presentes principalmente no endotélio. Alterações de hidratação levam a alterações de espessura, transparência e resiliência da córnea.1-4 A idade é outro fator que exerce influência nas características paquimétricas e biomecânicas da córnea, exibindo associação positiva com o aumento do depósito de fibras colágenas e ligações cruzadas induzidas por glicação, reduzindo assim a viscoelasticidade da córnea. Essas alterações estariam relacionadas às alterações de histerese da córnea. ▌▌ EVIDÊNCIAS

CIENTÍFICAS

A ECC, na maioria da população adulta, varia entre 500 e 570µm, em distribuição normal, mas atingindo valores menores de 500µm e acima de 600µm.5-7 A literatura sobre ECC em crianças e suas aplicações na prática diária não é vasta como a relacionada a pacientes adultos. Alguns estudos, realizados em número restrito de crianças, demonstraram que a córnea dos neonatos prematuros é mais espessa nos primeiros meses de vida, alcançando a espessura esperada nas crianças de 2 a 4 anos após o terceiro mês de nascimento.8-10 Hussein et al. estudaram 108 olhos e concluíram que a espessura da córnea aumenta até os 5 anos de vida. Nesse estudo, as crianças de 5 a 9 anos apresentaram valores da ECC maiores que as crianças do grupo abaixo de 4 anos.11,12 Dai e Gunderson analisaram 106 crianças de grupos étnicos diferentes, não encontrando relação entre idade e ECC.13 Deve-se salientar que a amostragem é reduzida nesse estudo. Em outro estudo com amostragem mais expressiva, realizado por Zheng et al., 926 crianças entre 8 e 16 anos de idade foram incluídas e não foi observada associação entre ECC e idade. No entanto, uma diferença estatisticamente significativa da ECC entre crianças e adultos foi observada (550µm nas crianças e 537µm nos adultos).14 Porém, Bradfield et al.,12 em estudo multicêntrico multirracial posterior aos descritos, envolvendo 2.079 pacientes entre o nascimento e os 17 anos de vida, demonstraram que a ECC aumenta progressivamente entre 1 e 11 anos de vida nos diferentes grupos étnicos estudados. No grupo de pacientes afro-americanos,

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a paquimetria inicial, aos 4 anos de idade, apresentou mediana de 541µm no percentil 50, ao passo que aos 17 anos a mediana foi 551µm, sendo observada a desaceleração do ritmo de aumento da espessura da córnea a partir dessa idade.12 O mesmo foi observado no grupo constituído por hispânicos e brancos, o qual apresentou a ECC mediana no percentil 50 de 553µm no primeiro ano de vida, 561µm aos 4 anos de vida, evoluindo para 573µm aos 17 anos. O mesmo padrão de desaceleração do ritmo de aumento da ECC foi observado nesse grupo. Em todos os grupos houve redução do espessamento da córnea após os 11 anos de idade. Os autores concluíram também que as crianças e adolescentes negros apresentavam córneas em média 20µm mais finas (p <0,001) quando comparadas com brancos e hispânicos. Nestes dois últimos grupos étnicos não foi observada diferença estatisticamente significativa quanto à ECC e, por isso, foram unificados em um grupo único de estudo. Os asiáticos apresentaram mediana paquimétrica 10µm menor que o grupo de brancos e hispânicos (p = 0,03), e 14µm maior que os afro-americanos (p = 0,001).12 Na literatura há informações que sugerem haver correlação positiva entre ECC e o erro na tonometria, havendo necessidade de avaliação da ECC para a correta interpretação dos valores obtidos.15-17 No entanto, a utilização de fórmulas corretivas não consegue exibir real efetividade, pois estas consideram correções lineares, ao passo que o comportamento do erro da pressão intraocular (PIO) induzido pela ECC é muito mais complexo. Liu e Roberts concluíram, através de modelos matemáticos, que a PIO pode ser influenciada acima de 17mmHg pelas variações biomecânicas da córnea. Desse valor total de influência, 2,87mmHg foram relacionados à ECC e 1,76 mmHg à curvatura corneal.18 A histerese da córnea, portanto, tem estado cada vez mais em evidência nas pesquisas relacionadas ao glaucoma e à PIO. No entanto, há ainda mais detalhes da relação entre a histerese e os métodos tonométricos a serem explorados, uma vez que não se pode isolar totalmente o efeito da biomecânica da córnea nas variações pressóricas intraoculares, ou seja, a histerese influencia a medida da PIO, mas também sofre influência desta. Essa interdependência traz viés às avaliações quando se tenta aplicar o seu conceito isoladamente para as variações de erro de medida da PIO.19,20 Portanto, a ECC ainda é o fator de influência na PIO mais amplamente estudado e sedimentado para o raciocínio clínico rotineiro. Não há grandes controvérsias em relação à influência da ECC na mensuração da PIO nos pacientes adultos. A grande maioria dos autores demonstrou haver correlação positiva, mesmo que fraca, entre esses dois parâmetros, tanto em modelos experimentais como em estudos manométricos. Em estudos envolvendo adultos no pré e pós-operatórios de cirurgia refrativa (LASIK), os autores evidenciaram queda de 3mmHg no valor da tonometria após ablação de 90µm; e, em outro estudo similar, essa diferença foi de 5,4mmHg após ablação de 78µm,21,22 corroborando a influência da ECC na tonometria em adultos. Em um estudo realizado em neonatos e prematuros sem alterações oculares, foi observado que há influência da ECC na tonometria, evidenciando correlação positiva entre elas.23 Bradfield et al. observaram correlação entre a tonometria obtida com Tono-Pen® (Reichert, Nova Iorque, EUA) e a ECC em crianças e adolescentes sem alterações oculares que pudessem induzir a erro tonométrico. A PIO foi 1,5mmHg maior a cada 100µm de aumento da espessura corneal.12 Como a resiliência da córnea aumenta com a idade, parte desse resultado pode ter sido influenciada pela faixa etária, pois as córneas mais espessas da amostra foram encontradas nas crianças de idade mais avançada, com colágeno já menos distensível e com provável diminuição da elasticidade tecidual, o que supostamente poderia levar a mudanças na obtenção da leitura tonométrica. A hipertensão ocular nos recém-nascidos e crianças leva frequentemente a modificações do aspecto biomicroscópico do bulbo ocular. A hipertensão ocular desencadeia distensão exagerada dos tecidos do bulbo ocular, pois o colágeno nos primeiros anos de vida é mais distensível.24 A distensão da córnea por vezes resulta em estiramento excessivo da membrana de Descemet até sua consequente rotura (estrias de Haab). Essas estrias, por sua vez, frequentemente levam a edema e ceratopatia bolhosa, além de deixar cicatrizes permanentes, que modificam a histologia local e a espessura da córnea.25-28 Em uma expressiva parcela dos pacientes portadores de glaucoma na infância, não é possível estabelecer relação entre os níveis de PIO e a gravidade ou evolução da doença, devido aos

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Avaliação Ultrassonográfica no Glaucoma Infantil | Ultrassonografia Modos A e B Felício Aristóteles da Silva

CAPÍTULO

9

▌▌ INTRODUÇÃO

A ultrassonografia é de grande valia no diagnóstico e no acompanhamento do glaucoma na infância: em algumas circunstâncias, por possibilitar informações biométricas precisas (modo A); em outras, por propiciar imagens bidimensionais do olho e de estruturas orbitárias, fundamentais para melhor identificar e compreender a patogenia da doença, ou sua resposta à terapêutica instituída (modo B). Classicamente, o diagnóstico do glaucoma na infância é baseado no quadro clínico, na medida da pressão intraocular (PIO) pela tonometria de aplanação de Goldmann e no exame do disco óptico. Em verdade, como nos glaucomas secundários, todas as manifestações do glaucoma na infância são decorrentes da elevação da PIO. Contudo, nada mais impreciso do que a tonometria de aplanação nesses olhos, não apenas pelas dificuldades técnicas, mas também pela eventual influência do anestésico usado, pois o exame ideal deve ser feito sob narcose. Além disto, o tonômetro de Goldmann não foi calibrado para tais olhos infantis, cujas túnicas têm uma rigidez bem mais baixa do que a de um olho adulto, mormente no que concerne à histerese da córnea, o que é agravado pelo edema e pelas estrias de Haab frequentemente presentes. A isto se agrega a impossibilidade de estudar o perfil pressórico desses olhos e, consequentemente, as questões concernentes à flutuação da PIO. A verdade é que, por razões óbvias, são muito precários os conhecimentos sobre a PIO no olho infantil, mesmo normal. Como já era sabido que a buftalmia, conhecida desde o século XVI e selo diagnóstico do glaucoma na infância, decorre da distensão do olho infantil face a uma PIO elevada, tão logo surgiu a possibilidade da obtenção de medidas oculares precisas in vivo, através da ecografia A, na década de 1960 e início da década de 1970, esse método começou a ser empregado no estudo das características biométricas, não apenas de olhos de recém-nascidos1,2 prematuros ou normais,3 inclusive para caracterizar a curva de crescimento ocular com relação à idade (Figura 9.1 e Tabela 9.1),4-11 mas também de olhos com glaucoma infantil.4,6-8,12-16 Deve ser ressaltado que, já naquela época, o método preconizado era o da imersão. Olhos com glaucoma congênito primário,17 ou quaisquer outros glaucomas infantis secundários nesse período em que o olho ainda é distensível,18 apresentam, consistentemente, um diâmetro axial acima do normal para a faixa etária. Esse achado anatômico é da maior relevância, porque sua medida é muito mais precisa do que a tonometria de Goldmann. Por isso, a medida do diâmetro axial ocular é, até mesmo, considerada como o parâmetro mais importante para o diagnóstico do glaucoma infantil, seguida pela medida da PIO e dos outros achados clínicos.19

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22

Diâmetro axial (mm)

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82  Glaucoma na Infância

20 18 16

Grignolo x Rivara (1968) Gernet x Hollwich (1969) Larsen (1971) Sampaolesi (1981)

14 12 -3

0

6

12

18

24

30

36

Idade (meses)

Figura 9.1 Correlação entre diâmetro axial ocular e idade, em crianças normais.11

Tabela 9.1 Correlação entre diâmetro axial ocular e idade, em 36 olhos normais, com intervalo de confiança para o percentil de 95%.19

Idade (meses)

Diâmetro axial (mm)

Intervalo de confiança 95%

Intervalo de previsão

1

18,7

18,2 a 19,1

17,3 a 20,1

2

19,4

19,0 a 19,7

18,0 a 20,7

3

19,8

19,4 a 20,1

18,4 a 21,1

4

20,0

19,8 a 20,3

18,7 a 21,4

5

20,3

20,0 a 20,5

19,9 a 21,6

6

20,4

20,2 a 20,7

19,1 a 21,8

7

20,6

20,3 a 20,8

19,3 a 21,9

8

20,7

20,5 a 20,9

19,4 a 22,0

9

20,8

20,6 a 21,1

19,5 a 22,2

10

20,9

20,7 a 21,2

19,6 a 22,3

11

21,0

20,8 a 21,3

19,7 a 22,4

12

21,1

20,9 a 21,3

19,8 a 22,4

18

21,5

21,3 a 21,8

20,2 a 22,8

24

21,8

21,5 a 22,1

20,5 a 23,1

30

22,0

21,7 a 22,3

20,7 a 23,3

36

22,2

21,9 a 22,5

20,8 a 23,5

42

22,3

22,0 a 22,7

21,0 a 23,7

48

22,5

22,1 a 22,8

21,1 a 23,8

54

22,6

22,2 a 22,9

21,2 a 23,9

60

22,7

22,3 a 23,1

21,3 a 24,0

66

22,8

22,4 a 23,2

21,4 a 24,1

72

22,9

22,5 a 23,3

21,5 a 24,2

78

22,9

22,5 a 23,3

21,6 a 24,3

84

23,0

22,6 a 23,4

21,6 a 24,4

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Imagens de Segmento Anterior no Glaucoma

Norma Allemann

CAPÍTULO

10

▌▌ INTRODUÇÃO

A complementação do exame oftalmológico com imagens do segmento anterior do olho é importante para o diagnóstico, estabelecendo a conduta, e também é útil para o acompanhamento clínico e cirúrgico de portadores de glaucoma na infância. ▌▌ TÉCNICAS

DE IMAGEM DO SEGMENTO ANTERIOR

A avaliação de olhos portadores de glaucoma na infância pode exigir o emprego de algumas técnicas de imagem do segmento anterior para documentação, auxílio diagnóstico ou acompanhamento.

Fotografia do segmento anterior do olho (biomicroscopia e gonioscopia) A fotografia do segmento anterior pode ser obtida por uma câmera digital ou analógica acoplada ao biomicroscópio óptico (lâmpada de fenda) ou ao microscópio cirúrgico (no exame sob narcose utilizado para diagnóstico ou no pré-operatório imediato de uma cirurgia oftalmológica), por uma câmera para retina (retinógrafo ou Retcam®), ou ainda por um celular equipado com uma lente de aumento. Para a fotografia gonioscópica, há necessidade de utilizar lentes de gonioscopia.

Tomografia de coerência óptica do segmento anterior A tomografia de coerência óptica (OCT) do segmento anterior pode ser realizada por equipamentos de domínio temporal (TD-OCT: OCT Visante®, SL-OCT®), de domínio espectral (SD-OCT: OCT RTVue®, OCT iVue®, OCT Cirrus®, OCT Heidelberg® com lentes de adaptação para o segmento anterior, OCT Casia SS-1000®), ou ainda por OCT de domínio espectral e fonte de varredura (SS-SD OCT: OCT Avanti®, OCT Triton®, OCT Cirrus 5000®, OCT Heidelberg® módulo catarata e refrativa, OCT Casia 2®). Esse método não exige contato com o olho, porém há necessidade de fixação do olhar durante a aquisição. A varredura tomográfica do segmento anterior inclui cortes axiais, radiais e imagens de alta resolução da córnea. Se o paciente colaborar olhando para a mira de fixação e obedecendo à solicitação de posicionar os olhos, os tomógrafos permitem a construção de um mapa paquimétrico, que mostra a espessura da córnea numa área de aproximadamente 9mm. O posicionamento do olho para realizar cortes nas diferentes posições diagnósticas aumenta a acurácia do método, porém só é possível na infância quando há cooperação.

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94  Glaucoma na Infância

Com exceção do OCT Visante®, do SL-OCT® e do OCT Casia®, os tomógrafos permitem a avaliação da retina, da camada de fibras nervosas da retina, da coroide e camada de células ganglionares. A OCT portátil tem sido usada para acompanhar exames sob narcose em serviços equipados com aparelhos, e permite diagnóstico de pequenas lesões em associação à avaliação fundoscópica. A OCT intraoperatória está se tornando rotina no manejo do paciente cirúrgico, desde seu uso em tempo real, como adjuvante a uma cirurgia de catarata, como numa cirurgia da retina. Uma nova tecnologia incorporada à OCT permite a identificação de vasos sanguíneos a partir da detecção das células sanguíneas em movimento e permite a avaliação da vasculatura da retina e do segmento anterior: conjuntiva, esclera e íris. Esse método exige mais cooperação e maior tempo de fixação para aquisição, mas avanços tecnológicos permitirão que a velocidade de aquisição não seja um limitante.

Biomicroscopia ultrassônica A biomicroscopia ultrassônica (UBM) é uma técnica que utiliza transdutores de alta frequência de ultrassom (35, 40, 50 ou 60MHz) para realizar cortes ultrassonográficos das estruturas do segmento anterior do olho com alta resolução.

Técnicas de exame de UBM. Imersão (colocação de um copo de imersão entre as pálpebras e preenchimento com soro fisiológico, após instilação de anestesia tópica – Figura 10.1A e B), ou pseudoimersão. A pseudoimersão é realizada utilizando-se um dispositivo descartável (Clearscan® – Figura 10.1C a F) constituído por um filme plástico que envolve o transdutor e por um anel que fixa o filme ao transdutor, segurando, nesse espaço delimitado pelo plástico, uma coluna de líquido – no caso de água destilada) que forma uma câmara artificial para que o transdutor se mova e possa propagar as ondas sonoras até o olho – o filme plástico que envolve o transdutor toca o olho utilizando-se uma fina camada de gel oftálmico (Figura 10.1G e H). A pseudoimersão pode ser feita ainda, a depender do equipamento, com uma câmara de imersão rígida com os olhos abertos ou utilizando-se o Clearscan através das pálpebras fechadas (técnica transpalpebral), o que causa atenuação sonora, mas permite a identificação das estruturas principais do segmento anterior. A varredura ultrassonográfica deve incluir cortes axiais e radiais, com complementação de alguns cortes transversais, quando necessário. A movimentação do olho para as posições diagnósticas aumenta a acurácia, porém só é possível na infância quando há cooperação.

Biometria ultrassônica A biometria ultrassônica pode ser realizada com a técnica de modo A (sob imersão, considerada mais precisa, ou de contato) ou com a técnica guiada pelo modo B (sob imersão ou transpalpebral). O exame de biometria permite a aferição quantitativa da profundidade da câmara anterior (PCA), da espessura do cristalino (L), da profundidade da cavidade vítrea (CV) e do comprimento axial do olho (AL). A correta inserção de dados complementares informando o instrumento se o olho tem cristalino (fácico), ou uma lente intraocular (pseudofácico), o correto alinhamento do transdutor ultrassônico com a córnea e perpendicularidade com a retina permitem o cálculo da média das medidas obtidas. O comprimento axial médio obtido (em “mm”) deve ser comparado com o outro olho do mesmo indivíduo (simetria ou assimetria) e a uma curva do padrão de normalidade estabelecida para cada mês de vida na infância. Um desvio da normalidade pode ser valorizado e, em alguns casos, pode ser anulado durante o crescimento. O tamanho do olho acima da normalidade, sua taxa de crescimento exagerada acima dos percentis normais e uma desproporção entre a profundidade da câmara anterior e do cristalino podem auxiliar no diagnóstico de um escape de tratamento antiglaucomatoso em portadores de glaucoma na infância.

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Tomografia de Coerência Óptica na Infância

Eglailson Dantas Almeida Júnior • Christiane Rolim de Moura

CAPÍTULO

11

▌▌ INTRODUÇÃO

A tomografia de coerência óptica (OCT) é um método de imagem não invasivo, de não contato, que nos dá uma imagem seccional da retina e estruturas em tempo real e in vivo.1 O diagnóstico e o acompanhamento de doenças oculares na infância são usualmente atos médicos mais complexos que aqueles realizados em pacientes adultos. Isto porque a aquisição de informações clínicas confiáveis e reprodutíveis pode ser prejudicada, já que dependem da cooperação da criança durante o exame oftalmológico. O exame oftalmológico objetivo do paciente pediátrico, incluindo a avaliação do fundo de olho, pode ser realizado com a criança sedada. A OCT é um método diagnóstico tratado neste capítulo. Com o desenvolvimento e a otimização da OCT portátil (Envisu C2300 OCT System®, Leica Microsystem e o IVue®, OptoVue, Fremont, CA), a aquisição de imagens em crianças em decúbito dorsal, sedadas ou não, tem se mostrado um método viável, apresentando também boa reprodutibilidade intra e interobservador.2-5 A maior parte da informação científica disponível a respeito do exame de OCT da retina e do nervo óptico em crianças foi realizada em crianças cooperativas, a partir dos 3 anos. A aquisição das imagens por meio de diferentes tomógrafos é muito rápida, e essa função foi ainda mais aperfeiçoada nos aparelhos que contam com a tecnologia de domínio espectral. Por esse motivo, passou a fazer parte do arsenal diagnóstico e do acompanhamento das doenças de retina, tais como a pars planite, as distrofias retinianas, os tumores intraoculares, as doenças do nervo óptico (como o papiledema, a atrofia óptica gerada por gliomas ou as doenças genéticas) e o glaucoma. O desenvolvimento da retina normal em crianças nascidas a termo e em prematuras vem sendo estudado.6-9 Nos casos de doença retiniana, a comparação de exames ao longo do tempo de um mesmo indivíduo colabora significativamente para avaliação de progressão da doença e para a avaliação da resposta terapêutica. Em uma coorte longitudinal prospectiva, foi demonstrado que a OCT portátil produz imagens reprodutíveis das medidas da espessura da camada de células ganglionares e plexiforme interna em pacientes com gliomas de vias ópticas.4 Já quando se deseja determinar o diagnóstico da redução da camada de fibras nervosas da retina no glaucoma, faz-se necessário que os dados obtidos de cada indivíduo sejam comparados com banco de dados normativos dos aparelhos. O grande inconveniente da interpretação dos dados obtidos em crianças é que os bancos de dados dos aparelhos de OCT incluem, em geral, indivíduos maiores de 18 anos. Discorreremos, mais adiante, sobre dados normativos da camada de fibras nervosas da retina, em crianças, disponíveis na atualidade.

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106  Glaucoma na Infância ▌▌ DIFICULDADES

E DESAFIOS NA AQUISIÇÃO DAS IMAGENS DE OCT EM CRIANÇAS

É importante lembrar que as propriedades biométricas do olho infantil com ou sem glaucoma são bem diferentes das dos olhos dos adultos, para os quais os tomógrafos foram concebidos. Por esse motivo, há estudos que sugerem a necessidade da realização de ajustes de foco no momento da aquisição da imagem, em especial para os modelos portáteis, de forma que a qualidade da imagem seja a mais adequada possível.3 As imagens obtidas com OCT portátil podem também conter artefatos provocados pelos movimentos da criança ou da mão do examinador.5-10 Deve-se citar, ainda, que a aquisição da imagem na OCT portátil está limitada pela impossibilidade de realizar o registro seriado de imagens. Sendo assim, pode ser prudente, em crianças suficientemente cooperativas, considerar a realização do exame com os modelos de OCT convencionais de mesa. É importante lembrar que um ambiente mais amigável para a criança ajuda sobremaneira na realização de qualquer exame oftalmológico. As crianças ficam bem mais confortáveis em ambientes espaçosos, com controle de luz e som e com decoração voltadas para elas.11 ▌▌ CONSIDERAÇÕES

NA INTERPRETAÇÃO DA IMAGEM DE OCT DO NERVO ÓPTICO EM CRIANÇAS

A OCT pode potencialmente servir como um instrumento não invasivo no diagnóstico de lesão glaucomatosa e monitoramento da progressão do glaucoma na infância, já que as medidas da espessura da camada de fibras nervosas e macular retinianas diminuem com o avançar da doença.12 No glaucoma congênito primário e no glaucoma juvenil, a OCT tem sido usada para investigar a espessura da camada de fibras nervosas e as características da escavação papilar. As alterações do disco óptico em resposta à intervenção cirúrgica têm sido caracterizadas nas imagens tomográficas, e esses dados têm fornecido nova compreensão da história natural do glaucoma na infância. Embora a reversão da escavação seja, de forma geral, um marcador de controle da pressão e, portanto, do sucesso no tratamento, Ely et al. sugerem que o dano na camada de fibras nervosas se perpetua, mesmo na vigência da regressão da dimensão da escavação do disco óptico.13 Há que se levar em consideração a idade da criança ao se analisar as imagens do disco óptico obtidas pela OCT. Têm sido observadas diferenças significativas no disco óptico e na camada de fibras nervosas em crianças pré-termo quando comparadas com crianças a termo, incluindo afinamento peripapilar superior, nasal e inferior, aumento do diâmetro vertical do disco e aumento da relação escavação/disco vertical.14-16 Existem inúmeros estudos na literatura que objetivam estabelecer limites de normalidade da espessura da camada de fibras nervosas da retina, adquiridas no modo de captura do nervo óptico, para que se possam estabelecer critérios de diagnóstico para a neuropatia óptica da infância. Os primeiros trabalhos com OCT a partir de 2000 foram realizados com a tomografia de domínio temporal. Hess et al. mostraram que foi observada uma diferença estatisticamente significativa entre medidas da espessura da camada de fibras da retina, em pontos específicos, de crianças normais e de crianças com glaucoma. Essas medidas foram obtidas com OCT-3 (Carl Zeiss Meditec, Dublin, California) e, mais tarde, em 2009, ainda por meio dessa tecnologia, esse mesmo grupo publicou um estudo determinando a espessura média da camada de fibras da retina e espessura macular de crianças sadias com idades variando entre 3 e 17 anos. A espessura média da camada de fibras nervosas da retina obtida em crianças normais nessa faixa etária foi de 108µ (variando de 92 a 125µ entre os percentis 5% e 95%). Quando os autores estratificaram por faixa etária, as crianças menores (entre 3 e 6 anos) apresentaram espessura média de 109µ (variando de 94 a 126µ); as crianças entre 7 e 10 anos apresentaram espessura média de 107µ (variando de 90 a 123µ); e as mais velhas, entre 11 e 17 anos, apresentaram espessura média de 109µ (variando de 93 a 124µ). Já a espessura da camada de fibras do quadrante

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PARTE

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Formas Clínicas

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Glaucoma Congênito Primário

Camila Fonseca Netto • Bruno L. B. Esporcatte • Christiane Rolim de Moura

CAPÍTULO

12

▌▌ INTRODUÇÃO

O glaucoma congênito primário (GCP) é uma condição ocular específica que cursa com elevação da pressão intraocular (PIO) secundária à anomalia do desenvolvimento da malha trabecular. A tríade clássica de sua apresentação é a presença de lacrimejamento, fotofobia e blefarospasmo. Quanto mais grave a malformação da via de drenagem do humor aquoso, mais precoce é a apresentação do quadro e pior é o prognóstico visual da criança. O grau de dano ocular depende da duração do período entre o aparecimento dos primeiros sintomas e a adoção da terapia adequada. O atraso no diagnóstico e na instituição do tratamento podem levar a comprometimento irreversível do campo visual, estágios avançados de neuropatia óptica glaucomatosa e importantes alterações anatômicas do globo ocular. ▌▌ GENÉTICA

Conforme apresentado no Capítulo 4, Genética, existem muitos estudos relacionados à genética do GCP. É importante relembrar que a maior parte dos casos são esporádicos e não hereditários. Pacientes com um padrão familiar normalmente mostram uma herança recessiva com penetrância incompleta ou variável. A doença é familiar entre 10% e 40% dos casos com penetrância variável (40% a 100%).1,2 Os dois principais genes identificados como causadores de GCP foram CYP1B1 e o LTBP2 (complexo latente de ligação à proteína do fator de transformação de crescimento beta 2). O papel das proteínas codificadas por esses genes na etiologia da doença ainda não está totalmente esclarecido. Mutações nesse gene em pacientes com GCP foram identificadas em frequência variável (entre 20% e 100%), com alta taxa de prevalência em populações etnicamente homogêneas.3 ▌▌ EPIDEMIOLOGIA

Os dados epidemiológicos sobre o GCP variam de acordo com a população estudada. Por se tratar de uma patologia autossômica recessiva, a prevalência dessa doença é maior em populações em que o casamento consanguíneo é frequente. Em coortes com ciganos na Eslováquia, a incidência relatada chega a 1 para cada 1.125 nascidos vivos.4 Na Grã-Bretanha, foram diagnosticados 35 novos casos de GCP entre 646.887 nascimentos ocorridos em 2002 (1/18.500).5 Já estudos populacionais norte-americanos estimam que ocorra 1 caso de GCP para cada 10.000 nascidos vivos.6 No Brasil, o glaucoma na infância está entre as três principais causas de cegueira em crianças, totalizando 13% dos pacientes avaliados em uma coorte com 229 pacientes com baixa visão,7 porém nesse trabalho não há estimativas específicas sobre a prevalência de GCP.

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124  Glaucoma na Infância

Em serviços terciários de atendimento, o GCP é a causa mais frequente de glaucoma na infância, perfazendo entre 30% e 55% dos casos.8 A maioria desses casos são bilaterais (65% e 80%) e manifestam-se no primeiro ano de vida (75%), dos quais 25% já estão presentes ao nascimento. A doença tem prevalência maior em pacientes do sexo masculino (65%).9 Em torno de 40% dos pacientes, não há desenvolvimento da acuidade visual para valores maiores que 20/200, mesmo com o tratamento adequado.10 O GCP tem elevado impacto socioeconômico. Em estudo nos EUA sobre custos diretos e indiretos da doença, estima-se que, no primeiro ano de vida, os gastos com um paciente com GCP seja em torno de 43 mil dólares, valores que são 800% maiores que os custos anuais de crianças sem nenhuma comorbidade. Os maiores gastos são as intervenções cirúrgicas (69%) e os exames sob narcose (23,2%).11 A maior necessidade de dedicação aos menores e a expectativa do sucesso do tratamento geram significativo impacto psicológico nos familiares de crianças com GCP. Responsáveis de portadores de GCP têm elevada incidência de depressão moderada a grave.12 ▌▌ PATOGÊNESE

O processo de formação da câmara anterior é muito investigado, porém há questionamentos a respeito desses estudos, pois os tecidos fetais analisados sofrem grande influência das técnicas histológicas e da manipulação, fatos que podem comprometer a interpretação apropriada dos resultados. Por volta da vigésima semana de gestação, a superfície anterior da íris está em contato com o final da córnea, e ambas as estruturas estão recobertas por uma camada endotelial única. Na junção corneoescleral, encontra-se a malha trabecular em desenvolvimento. Nessa fase, o esporão escleral não está totalmente formado e as fibras do músculo ciliar são separadas da malha trabecular por uma camada de tecido mesenquimal frouxo (Figura 12.1).13 Nos 3 meses finais da gestação, o revestimento endotelial da íris e do ângulo desaparecem. Além disso, ocorre a reabsorção e clivagem do tecido mesenquimal que recobre a malha trabecular. Concomitantemente, as lamelas e espaços intertrabeculares se formam à frente do canal de Schlemm. Devido à diferença entre a velocidade de crescimento das estruturas que compõem a câmara anterior e o trato uveal, o músculo ciliar e os processos ciliares sofrem um deslizamento na direção posterior. Durante esse processo, o esporão escleral gradualmente se insinua para a câmara anterior, substituindo o tecido mesenquimal como local de inserção das fibras do músculo ciliar. Todo esse processo expõe a malha trabecular ao humor aquoso e irá se completar ao final do primeiro ano de vida da criança (Figura 12.2).13,14 Estudos iniciais sobre a patogenia do GCP descrevem a presença de uma membrana, gerada pela reabsorção incompleta de células de origem mesodérmica, recobrindo o ângulo da câmara anterior. Esse tecido, chamado membrana de Barkan, impediria a drenagem do humor aquoso

Figura 12.1 Corte histológico do ângulo da câmara anterior de um feto humano de 20 semanas de gestação. Nesse período, a córnea (C) e a íris (IR) são recobertas por uma fina camada endotelial única. A malha trabecular (TM) é separada das fibras longitudinais da musculatura ciliar (CM) por um tecido conjuntivo frouxo (LCT). Durante o processo de maturação, o esporão escleral (SS) irá se insinuar em direção à IR, substituindo o tecido conjuntivo como local de inserção das fibras da musculatura ciliar. Além disso, ocorrerá a posteriorização dos processos ciliares (CP). Fonte: Anderson, 1981.13

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Índice Alfabético

A Aconselhamento genético, 35 aspectos psicológicos, 36 riscos para doenças mendelianas, 36 testes, 35 Acuidade visual avaliação da, 58 Afasia, 99 Ambliopia, 58 Anel de Schwalbe, 12 Aniridia, 31, 150 caráter genético, 150 definição, 150 forma, 150 tratamento, 151 Anomalia de Peters, 32, 147 aspectos genéticos, 148 tratamento, 149 Anomalias sistêmicas não adquiridas glaucoma associado a, 157 doenças do tecido conjuntivo, 157 doenças metabólicas, 158

B Biometria óptica, 96 Biometria ultrassônica, 94 Biomicroscopia ultrassônica, 94, 95f técnicas de exame de, 94

C Campo visual em crianças com glaucoma, 71 Catarata congênita, 195 cirurgia da complicações da, 196 Ciclocrioterapia, 259 indicações, 259

resultados, 261 técnica cirúrgica, 260 Ciclofotocoagulação endoscópica, 264 indicações, 265 resultados, 267 técnica cirúrgica, 266 Ciclofotocoagulação transescleral, 261 com laser de diodo micropulsado, 268 indicações, 268 resultados, 269 técnica cirúrgica, 269 indicações, 261 resultados, 263 técnica cirúrgica, 262 Cirurgias angulares goniotomia, 219 Cirurgias antiglaucomatosas complicações após, 89 Código genético, 3 Cirurgias fistulizantes, 237, 247 Córnea espessura central da, 75 diferentes tonômetros e as mensurações em crianças, 77 evidências científicas, 75 transplante de córnea, 100 Corpo ciliar, 8 Crista neural células da, 5

D Doenças do tecido conjuntivo, 158 Doppler colorido, 96 Drenagem dispositivos de, 87 implantes de, 134, 247

E Ectrópio uveal

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288  Glaucoma na Infância congênito, 152 Erros refrativos, 59 Escavação pupilar avaliação da, 85 Esporão escleral, 8, 12 Esteroide(s) inalatórios, 184 sistêmicos, 184 tópico, 184 Exame biomicroscópio, 47, 51 Exame do segmento posterior, 57

F Facomatoses, 158

G Glaucoma após cirurgia de catarata, 196 associado a anomalias oculares não adquiridas, 143 associado a condições adquiridas, 165 congênito primário, 123 achados clínicos, 125 classificação, 125 diagnóstico, 130 diferencial, 130 epidemiologia, 123 exame oftalmológico, 128 exames subsidiários, 129 genética, 123 patogênese, 124 tratamento, 130 corticogênico, 182 classificação, 182 conduta, 184 patogenia, 182 potência dos esteroides tópicos quadro clínico, 183 juvenil, 139 diagnóstico diferencial, 140 epidemiologia, 139 genética, 139 patogenia, 139 quadro clínico, 140 tratamento e prognóstico, 140 na infância anamnese do, 41 como conduzir a, 42 exame físico simples, 43 avaliação ultrassonográfica no, 81 definição, classificação e diagnóstico

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diferencial dos, 17, 20 primários e secundários, 19 epidemiologia do, 25 estudos populacionais, 25 tratamento, 213 genética relacionada ao, 29 desenvolvimento, 31 segmento anterior no, 93 imagens do, 93 síndromes raras relacionadas ao, 32 Goldmann tonometria de aplanação de, 48 Goniotomia, 131, 219 complicações, 225 histórico, 219 indicação, 220 material, 220 patogenia, 220 resultados, 224 técnica cirúrgica, 221 Goniótomos com extremidade cortante, 222 Gonioscopia, 47, 53

H Hipermetropia, 60

I Implantes de drenagem, 134, 247 antiglaucomatoso, 98 Infância glaucoma na, 41 tomografia de coerência óptica na, 105 Íris, 8

L Lâmpada de fenda portátil, 52f

M Marfan síndrome de, 157 Meduloepitelioma, 175 Melanocitoma, 175 Melanoma, 177 Microesferofacia, 158 Microftalmia, 97 Miopia, 60 Músculo ciliar, 9

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N Nanoftalmo, 97 Narcose avaliação da PIO durante exame sob, 50 Neurofibromatoses, 158 Nevus de Ota, 152

O Ontogenia conhecimento da, 3

P Perkins tonometria de aplanação de, 48 Perimetria, 63 desenvolvimento do campo visual, 71 realização do exame de campo visual nas crianças, 63 técnicas, 63 Peters anomalia de, 32 Procedimentos ciclodestrutivos, 259 Processos ciliares, 10 origem dos, 10

R Reabilitação visual habilitação e, 275 bebês e crianças até 3 anos, 276 crianças pré-escolares e escolares, 281 Refração, 47, 58 Retinoblastoma, 175 Retinopatia da prematuridade, 178 definição, 178 patogenia, 179 quadro clínico, 180 tratamento, 181 Rubéola congênita síndrome de, 162

S Scheimpflug aplicação, indicação, 97 Segmento anterior fotografia do, 93 no glaucoma imagens do, 93 técnicas, 93 tomografia de coerência óptica do, 93 Segmento posterior

exame do, 47, 57 Seio camerular embriologia do, 3 ângulo, 5 básica, 3 canal de Schlemm, 11 corpo ciliar, 8 desenvolvimento das estruturas trabeculares, 10 esporão escleral, 12 íris, 8 linha ou anel de Schwalbe, 12 músculo ciliar, 9 processos ciliares, 10 Síndrome da rubéola congênita, 162 de Axenfeld-Rieger, 143 quadro clínico, 144 tratamento, 146 de Marfan, 157 de Rubinstein-Taybi, 161 alterações oculares, 162 definição, 161 de Sturge-Weber, 83

T Tomografia de coerência óptica na infância, 105 dificuldades e desafios, 106 considerações na interpretação da imagem, 106 Tonometria de aplanação de Goldmann, 48 particularidades da, 47 tipos principais, 48 Trabeculado corneoescleral, 10 Trabeculectomia, 133, 237 complicações cirúrgicas manejo e prevenção, 242 contraindicações, 238 fatores de risco, 238 indicações, 237 preparação para a cirurgia, 239 resultados, 243 técnica cirúrgica, 239 vantagens e desvantagens, 238 Trabeculotomia, 131, 227 e trabeculotomia 360°, 227 considerações pré-operatórias, 229 eficácia, 228

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ISBN 978-85-7006-698-5

9 788570 066985

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