Reforma Trabalhista

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REFORMA

FLEXIBILIZAR

PARA CRESCER A reforma trabalhista pode ser especialmente benéfica para o setor farma por permitir contratações mais adequadas à realidade do segmento

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oucos temas foram alvo de tantos debates nos veículos de comunicação e nas mídias sociais no ano passado quanto o da reforma trabalhista. Aprovada no dia 12 de julho de 2017 e sancionada pelo presidente Michel Temer, a lei entrou em vigor no mês de novembro do mesmo ano e alterou mais de 100 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), tendo sido considerada uma das principais medidas do governo para fortalecer o mercado de trabalho, combater o desemprego e estimular o crescimento econômico.

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FLEXIBILIDADE O texto da lei promoveu uma profunda mudança nas relações contratuais entre patrões e empregados. Na visão de Gustavo Grisa, economista do Instituto Millenium, a lei ajusta a legislação a uma realidade que já é vivida no mundo todo e agora passa a ser contemplada pela Constituição. “A reforma permite a elaboração de contratos de trabalho mais flexíveis em relação a dias e horários específicos da semana, e também contempla a contratação temporária de funcionários.


Por Daniel Sender

IMPACTO POSITIVO PARA OS EMPREGADOS

Essas adaptações no próprio regime de trabalho são uma tendência global”, explica. Grisa observa ainda que, em sua opinião, as mudanças são positivas, pois adaptam as leis do país a um tipo de regime trabalhista que já existia de fato e agora passa a ser reconhecido por direito. “A flexibilidade é o aspecto mais importante da reforma, pois põe um fim à era das letras pétreas. Nos próximos anos poderemos ver uma verdadeira mudança para melhor nas relações entre o setor produtivo e os representantes dos trabalhadores, por meio de uma disseminação das melhores práticas para ambos”, analisa.

SEGURANÇA Na opinião de José Márcio Camargo, doutor em economia pelo Massachussetts Institute of Technology (MIT), professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e especialista em economia

Um dos maiores debates relacionados à reforma trabalhista foi a sua capacidade de promover um impacto positivo para os empregados. Em um estudo realizado em 2015, o economista José Márcio Camargo, da PUC-RJ, mostrou que as mudanças são especialmente benéficas para as classes mais baixas. Segundo ele, por conta das excessivas exigências da antiga CLT, as pessoas de baixa renda dificilmente conseguiam formalizar sua situação contratual, estando sujeitos à informalidade. A pesquisa mostrou ainda que, dos 20% com maior renda no Brasil, 80% trabalhavam em regime CLT; 16% estavam na informalidade; e 3% estavam desempregados. Dos 40% com menor renda, 50% trabalhavam na informalidade e 20% estavam desempregados. Na visão do economista, a reforma facilita a formalização e fortalecimento do emprego por meio da proteção legal daqueles que estavam desamparados pela lei.

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REFORMA

EFEITOS DA REFORMA TRABALHISTA NA JUSTIÇA DO TRABALHO Como foi previsto por diversos especialistas, a reforma resultou na diminuição do número de novas ações trabalhistas protocoladas em todo o país. Segundo um levantamento da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), houve uma queda instantânea de 92% no número de novos processos ajuizados na Justiça do Trabalho do Estado de São Paulo. Em Santa Catarina, a redução nos ajuizamentos chegou ao índice de 93%, o mais alto do país. De acordo com a entidade, a redução é um reflexo da mudança nas regras processuais adotadas pela justiça trabalhista, que tornou-se mais rigorosa em relação a excessos. Antes os beneficiários do programa Justiça Gratuita não pagavam quaisquer honorários, mesmo se perdessem o litígio. Agora, quem entra com um processo está sujeito ao pagamento de custos judiciais, como honorários e perícias. Caso a ação não tenha base legal, o reclamante será obrigado a arcar com os encargos.

do trabalho e microeconomia, a reforma é de grande importância também para os setores produtivos da economia. “A reforma resulta diretamente em uma redução nas incertezas com relação ao custo real do trabalho no Brasil, pois hoje o empresário só tem real certeza do custo de um trabalhador após sua demissão. A nova legislação cria um ambiente de mais segurança para o empresário, que consequentemente pode contratar mais”, explica.

A NOVA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA

DEVERÁ IMPACTAR POSITIVAMENTE TODA O SEGMENTO FARMA, DIMINUINDO OS CUSTOS E

AUMENTANDO AS MARGENS DE LUCRO PARA TODOS OS ELOS

JOSÉ MÁRCIO CAMARGO, PROFESSOR DA PUC-RJ

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até mesmo considerar inválido o que foi assinado em contrato, mesmo que fosse amparado pela lei”, aponta. Ele acrescenta que essa liberdade dinamiza as relações trabalhistas no setor, pois torna possível contratar um funcionário por alguns dias ou horários específicos, de acordo a escala que for mais interessante para a empresa. “Isso é muito importante para o segmento farmacêutico, onde a demanda é particularmente descontinuada. Com certeza a nova legislação impactará positivamente toda a cadeia, diminuindo os custos e aumentando as margens de lucro para todos os elos”, calcula. O professor da PUC-RJ assinala também que o ganho de autonomia para ambas as partes, proporcionado pela lei, pode remediar algumas questões presentes no cotidiano de farmácias e distribuidoras. “Trata-se de algo muito importante para o setor, principalmente para as farmácias e distribuidoras, pois remedia a questão da intermitência do fluxo de clientes e de demandas em alguns horários do dia”, elucida. Grisa destaca que com a nova legislação passa a ser possível fazer jornadas de trabalho intermitente de 12 horas de trabalho com 36 horas de descanso, bem como acordos setoriais específicos e ajustes destinados a fazer as operações funcionarem sem interrupções. “O novo modelo representa uma oportunidade de reorganização com foco na proatividade do segmento farma, resultando em mais empregos e maior competitividade para a indústria, distribuidores e varejo”, sublinha.

SEGMENTO FARMA

ADEQUAÇÃO

Tanto Grisa quanto Camargo acreditam que o segmento farma pode se beneficiar significativamente com a reforma. Grisa observa que o setor possui as condições de ser um dos segmentos líderes na adoção da nova legislação. “A forte regulação e as características específicas do setor farma exigem profissionais certificados, qualificados e habituados à atividade. Com as novas possibilidades de jornadas intermitentes, esses recursos poderão ser mais bem adaptados conforme as reais necessidades da empresa, seja ela uma farmácia, distribuidora ou laboratório”, esclarece. Para Camargo, um dos grandes destaques da nova legislação fica por conta do impedimento da Justiça do Trabalho de interferir indevidamente ao julgar um contrato de emprego. “A partir de agora, vai valer o que está no contrato assinado por empregador e empregado, limitando a ação de juízes que anteriormente podiam

A nova realidade que se apresenta aos empresários torna necessária também uma nova visão estratégica dos recursos humanos na cadeia, com menor litigação e maior foco na organização do trabalho. “Esse momento de retomada econômica e flexibilização do trabalho torna indispensável uma maior versatilidade na gestão, e a criação de novos modelos de negócio tendo em vista as melhores práticas internacionais”, reflete Grisa. O economista do Instituto Millenium ressalta que o segmento farma deve se unir cada vez mais nesse novo panorama. “A reforma trabalhista deve ser vista como é, e não como uma virada de página automática. Ou seja, ela é um processo com padrões setoriais, e deve sofrer mudanças e evoluir nos próximos anos se houver um bom ambiente político-institucional no Brasil. Aí reside a importância do setor estar unido em um só pensamento que contemple todos os envolvidos”, conclui.

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