caderno.suporte
a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos
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dramaturgo bom é dramaturgo morto? - cássio pires
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dramaturgo bom é dramaturgo morto? - márcio castro
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abril de 2009
suporte É preciso revelar que os dedos coçam para colocar aquela típica definição da palavra acima, roubada de um dicionário robusto e, a partir do conceito elucidado, acreditar que tudo terá mais sentido. caderno.suporte, tão claro quanto pode ser qualquer palavra que acreditamos saber o sentido. E dentre tantas possibilidades de se criar/acessar um texto, um artigo, um pensamento, uma opinião; com tantas pessoas escrevendo em sites, revistas, blogs, publicações acadêmicas, jornais, livros, etc, cada vez mais de coisas cada vez menores, técnicas específicas, opiniões distribuídas com aparente invólucro de verdades quase incontestáveis, às vezes gratuitamente, às vezes cobrando os dólares do bolso – porque os olhos da cara já estão em baixa. Então, com todas essas possibilidades, para que mais uma? Talvez o mais sensato fosse colocar a tal definição do tal robusto dicionário. Existe um livro do filósofo francês Paul Ricœur, cujo título: “A memória, a História e o Esquecimento”, parece-nos justificar a existência do que está em suas mãos agora. Não é o livro que justifica, apenas seu título! São as nossas memórias e daqueles que por aqui passaram e suas histórias junto com nossas histórias (e houve um tempo que estória e história não eram a mesma coisa), tudo junto dentro da centrífuga força do esquecimento. A leitura é tão livre quanto pode ser um texto em uma página. As discussões/digressões são parte daquilo que vivemos durante mais de um ano em que desenvolvemos o projeto II d.pedro II – Virtualizadores da História. Não foram escolhidas a dedo. Não são regras pretensiosamente estáveis. Não representam todas as nossas opiniões. E, para o bem do próprio caderno.suporte, não devem ser levadas a sério. Mesmo contrários a idéia de solicitar ao leitor que aja assim ou assado, que fique atento a isso ou aquilo, que duvide disso ou daquilo, solicitamos que leia como quem está participando de uma conversa, como aquelas entre amigos num café de esquina ou numa padoca perdida no meio do bairro. É possível que se fale muita merda, mas é o encontro que justifica. Isso, claro, se é que alguém ainda suporte a idéia de qualquer justificativa.
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entrevista gravada
divagações.com.café Bom, começamos então... Reunidos no ano da graça do nosso senhor Jesus Cristo... De 2009... Gente, é lua cheia hoje, tá bonita. Agora ta gravando... A gente vai poder editar algumas coisas depois? Ah, por exemplo: as bobagens a gente deixa. Quero começar assim, estava pensando no encontro e tal: como que a gente ficou assim? Divagar um pouco o porquê a gente chegou aqui. Nossas formações são muito distintas. E de épocas distintas também. Gostei de você ter falado isso porque, é louco, eu não sei o que a gente é. Acho que o fato de termos formações diferentes, faz com que seja, talvez, uma possibilidade... De criação... Algo nos une que é muito mais forte do que as vertentes de formações que temos. Então, talvez o elo da “não-representação” seja o mais possível, porque ela faz você abdicar de algumas formalidades, de algumas formações. Você se colocar como pessoa na obra... Pra mim, está aí. Colocar-se como artista perante as coisas. Pra mim isso é anterior a questão da “não-representação”. Eu concordo. A gente não concorda com tudo também. A gente discorda de certas coisas. Acho que antes de negar as circunstâncias com as quais a gente não concorda, artísticas mesmo... Estamos falando de princípios, de princípios de como fazer. Um deles pode ser a “não-representação”, mas isso é mais uma conseqüência destes princípios, de negar uma série de coisas. Desde o teatro dramático que representa o indivíduo até não acreditar mais num teatro dialético, político que possa ser transformador... Pelo percurso de quem foi ficando, tem também questão de como é a nossa atitude pessoal. Na verdade não fomos se encaixando dentro do status quo. E perseveramos porque olhamos para as opções em volta e não vemos nenhum atrativo nelas. Por sermos bastante impositivos nas nossas questões pessoais. Também diz um pouco, tanto que as pessoas às vezes não suportam trabalhar com a gente. A maneira como nos impomos é também o resultado de estarmos juntos. Agora, se isso automaticamente revela a nossa estética, não sei. Parte do que faço é muito porque o que está aí não me agrada. E também o que vi e gosto e quero reproduzir. Eu vi Pina Bausch e isso realmente afetou minha vida, muito. Não vi o La Fura dels Baus ao vivo, mas só o pensamento me influencia muito.
04 .Falei da Gabi que assistiu e uma das coisas...
Qual das duas? A médica. Ela disse “uma das coisas que mais me intriga dentro do espetáculo de vocês é de onde vocês tiraram aquelas idéias.” Como diria o bom e velho Lynch: “se eu soubesse... Eu vivia retirando de lá”. É lógico que a origem da idéia, ela pura, nem deve existir, mas como a gente colocou a coisa ali, quando e como a gente chegou à conclusão que aquela idéia poderia virar cena. Idéia todo mundo tem, aos quilos. E é todo mundo, não é só a gente não. Acho que a nossa gênese é muito mais no “Chalaça a peça” do que qualquer outra coisa. Talvez a minha divirja um pouco porque não participei da criação do Chalaça. Para mim foi uma revolta em relação àquilo que eu não conseguia colocar em prática: o meu ponto de vista na criação. Você ser cerceado pela voz de alguém: “eu quero desta maneira”, coisa que nunca me dei bem mesmo. Acho que está mais ligado às primeiras coisas que fiz, o meu primeiro mestre de arte, o Vacarini, que disse: “pinta aí.” Você não vai ensinar? “Olhe o que estou fazendo e faz o seu”.
que a gente lida no dia a dia. E é a filosofia da escola: que cada um ali se coloque, tenha voz, e isso é estimulado. Tive um processo assim durante todo o tempo lá, todo mundo teve, eram todos criadores, não tive esta experiência de ser cerceada. Pelo contrário, às vezes dava pânico de tamanha abertura. Lá me encontrei com pessoas, forçosamente. E agora é uma escolha, com vocês consigo ter idéias mais afins e não preciso ser super democrática e aceitar a idéia mesmo que não concorde. As coisas que eu fico encanado, de onde vem este olfato nosso pra saber: “este cheiro não”. A gente identifica certas coisas: quando é dramático, esse cheiro não. Quando é representativo, esse cheiro não... Tem, mas às vezes não. Às vezes a gente aceita o dramático, aceita o representativo... Quando tem outra postura. Esta postura é impossível saber. A parte boa vem um pouco do que o Jonas falou: não tem ninguém que diz o que a gente tem que fazer.
Eu tive uma formação de teatro na escola livre... Ela tem uma experiência de trabalho criativo que é parecido com o
família Commediens reunida
Tem que ter abertura de nossa parte para conhecer, e paciência também; ser colocado em xeque em algumas questões... Me lembro quando botaram o Marco Antônio Rodrigues e o Tolentino numa mesa pra discutir, e os dois quebraram o pau. Um ano depois eles conversaram e fizeram a mesma mesa e falaram: “A gente quebrou o pau, mas isso mudou a nossa perspectiva de ver teatro”. As coisas que tenho pensado nesses últimos momentos: Será que teatro, o teatro espaço, está morrendo? Penso que nossas referências de gostar ou não gostar são de peças que entram em cartaz. Estou sabendo disso, então vou lá ver, e tem um monte de gente fazendo um monte de experiências aí que não entram nas mídias todas, e não entram nos espaços convencionais, teatrais, e talvez estejamos desavisados delas. Grupos mais experimentais, que trabalham com artes plásticas, intervenções diversas, um povo que precisamos conhecer. Ficamos viciado na programação do ”boca-a-boca”. Temos um problema estrutural: o jeito que a companhia pensa teatro e onde faz o teatro que pensa. Esta experiência com o 2º d.pedro 2º, demoramos para perceber as coisas que estão nos falando, acho que estamos nos lugares errados. Esta sensação: a gente está no lugar errado. O teatro não é aqui não. Para isso temos que alterar o nosso modus operandi... Nosso meio de produção. Temos que produzir num curto espaço de tempo e temos que ser mais pluri-produtor. O que o 2º d.pedro 2º deixou claro: não quero mais vivenciar um projeto de um ano. O que salvou foram as viagens teatrais do SESI, a temporada do Chalaça, o ano foi repleto de teatro. Imagina ficar um ano sem se apresentar e depois fazer uma temporada como estamos fazendo agora? Passar um ano enfurnado numa sala de ensaio e depois ter três pessoas no domingo? Já que temos verba pública, acho que devemos parar com o teatro que faz o espectador vir até a gente, pagar e assistir. Talvez mudar nossas estruturas de trabalho, não dá para fazer de outro jeito o 2º d.pedro 2º? Você põe na sua pick-up, chega, monta e acontece. Talvez tenhamos que começar a abrir mão de várias coisas para começar a fazer. Concordo. Não dá pra simplesmente fingir que o recurso técnico não existe. Quando temos, ótimo. Quando não temos, como a gente se vira? E dá pra fazer. Dá... Se a gente bancar isso vai ser outro ganho pra nós. Aquela idéia lá atrás de fazer um espetáculo na Avenida Paulista inteira, não só fazer teatro de rua, é fazer teatro em qualquer lugar. As experiências vão mudar muito. Isso não tem nada a ver com o que deveríamos estar conversando agora. Faz parte da nossa idéia de pensar o que foi o processo... Pensar, por exemplo, em que conseguimos avançar com o 2º d.pedro 2º? Ou retroceder, em que mudamos? A gente mudou sim. Cenicamente a gente mudou muito. Duas coisas: foi um ano, mas ele não foi intenso. Exceto, lógico, o último mês, nem o último mês, a última semana. Esse modo de produção nosso, precisamos ser mais autocríticos. Não podemos deixar o figurino ficar pronto um dia depois da estréia. Não podemos ficar até as três, quatro da manhã
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para resolver problema de computador, enfim, temos uma crença muito forte que a coisa vai dar certo... E de um jeito estranho. Foi estranho. Foi um processo que poderíamos ter feito intensamente e por isso ter tirado muito mais e ter sido mais produtivo do que ser feito extensamente. Fomos um pouco complacentes também. Devido às outras experiências: Galvez, Chalaça, Quimera... Principalmente a Quimera. Pegou um trampo?, beleza. Vai fazer aula disso?, beleza. Fomos aceitando a situação porque não queríamos nenhum tipo de desapontamento nesse quesito... E isso gerou um problema de trabalho. Olho para o 2º d.pedro 2º e falo: isso é só a pontinha do Iceberg. Eu sinto isso, inclusive fazendo espetáculo. Não depende de toda a tecnologia que a gente tem em cena, de todos os arquivos que a gente tem em cena, depende da descoberta de uma atitude que a gente tem ali em cena. E sem mudar nada. Tenho vontade de ser mais aberto, o tema ser mais aberto. Não sei se vocês lembram quando falamos: vamos chutar o D. Pedro II, não é ele exatamente a questão, é muito mais do que isso. [celular toca] Quem é agora? Fala Ri. Ahan... Uhum... Provocador Cênico. Claro que é. Meu irmão me liga, e fala assim: “Presta atenção no raciocínio. Vocês fazem uma peça e não querem uma pessoa que dirija, é isso?” Isso. “Então vocês convidaram uma pessoa que veio trabalhar com vocês.” É. “Como chama essa pessoa?” Provocador cênico. “Provocador cênico! Eu sabia que tinha uma palavra! Obrigado, Tchau”. Com quem ele estava falando? Um amigo meu me ligou falando que ouviu uma chamada da nossa peça na Alpha Fm. E a banda da minha irmã que passou no Faustão no domingo, ela nem conta! Eu também não contaria. A cena parte de uma idéia. Nós fazemos um teatro de idéias. E essa idéia é que gera uma atitude lá. Ou é contra, a favor, se a gente for, é ou não é, fica claro pela nossa conversa que não é. Temos os nossos pontos de partidas bem claros e depois que a gente chuta ou não chuta. Gostaria que fosse um pouco diferente. Invés de pegar um D. Pedro II, o tema é: guerra. E vamos trabalhar com ele aberto assim, até sair alguma coisa ou... É disso que estou falando, depois desta experiência, queria que fosse mais aberto Esse foi o mais aberto de todos. Mas não é por causa do período ser muito grande? Porque a gente não partiu de UM livro. A gente quase partiu de uma idéia mesmo. E tiveram coisas super legais: a viagem para o Rio de Janeiro, os historiadores... Tem uma frase do Wally Salomão que... Acho que ele falou isso em 83... Desculpa, 93... Ele fala que o espaço do poeta hoje é o espaço cibernético. Que legal isso aqui: “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem. Não a fazem sobre circunstâncias de suas escolhas e sim sobre aquelas que se defrontam diretamente legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações continua pg. 38 mortas oprime, como um pesadelo, o cérebro dos vivos.”
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provocação
provocações assistidas
cênica
fernando villar Nós provocamos cenas, diz a página do coletivo Improv Everywhere d e N o v a Yo r k . S u a s provocações acabaram de chegar nos vagões do Paraíso (SP). O No Pants (2002) se tornou anual na cidade estadunidense e foi performado ou provocado em São Paulo hoje, 16/04/09, com vários agentes nos vagões do metrô paulistano, completamente e normalmente vestidos, só que sem as calças ou saias. Mobilizações relâmpago, dramaturgias de processo ou dramaturgias do ator têm tido incríveis provocadores e provocadoras em diferentes partes do planeta. O provocar cenas, as festas de rua quebrando rotinas, as flash mobs (movimentações relâmpago), Boal e improvisação revisitados, convocações instantâneas para o carnaval teatralizado, a cena surpresa, o provocar. Aqui na capital, quando nossos ex-alunos do Adubo terminaram a primeira montagem e versão do trabalho que eles criaram para seu projeto de diplomação na UnB, convidaram meu amigo,
padrinho e colega Hugo Rodas para provocar a desmontagem, o oráculo, como apresentado no programa da peça. Presentes na cena contemporânea, diferentes graus de provocabilidade de vários diretores ou diretoras sempre foram cruciais nas transformações da história do teatro brasileiro e mundial. O convite da Cia. Les Commediens Tropicales foi aceito com curiosidade sobre os limites, necessidades e procedimentos do provocador cênico. A novidade do criar em torno de uma figura da história do Brasil, assim como o desconhecido da função me interessaram como proposta, me instigaram pelo potencial e me pegaram pela simpatia de não ter todo poder ou encargos e responsabilidade que nós diretores temos. Voltar a estar num trabalho com mana Tica, continuar laços com a fera Georgette e mano Renato, além do valoroso Chiquinho e os quatro Pedros Segundos em Carlos, Daniel, Jonas e Michelle certamente me excitaram o provocar. Empatia por uma produção que privilegia o encontro de artistas cênicos e uma reterritorialização do teatro, questionando hierarquias ou teleologias, seja do diretor, do autor, do ator ou do produtor. A criação dividida em outros termos, conjugadas na vontade de buscar outras fronteiras dramatúrgicas e cênicas, entre teatro e performance, multimídia e histórias sendo reescritas.
Acho que o trabalho é muito sobre verdades e mentiras, esse tema que sempre permeou o teatro totalmente. Partindo de uma figura real verdadeira da nossa história como brasileiros, Pedro II que motivou muitas mentiras - assim como a História - e que foi motivado por muitas mentiras e verdades - assim como a História, tanto a oficial quanto a verdadeira. Contrapondo com uma versão eletrônica de como viver uma outra vida, uma mentira na sua verdade contemporânea. Ou uma verdade na sua mentira em outros casos. Uma vida dupla no alcance do computer no quarto. Uma verdade virtual para conviver com uma mentira real, ou, ou, ou... Os trocadalhos no caso das ventiras y merdades tem pra carilho né? E nós na arte, contando uma mentira pra mostrar a verdade, como dizia Picasso. Vcs tem que ver o F for fake do Orson Welles. Tenho quase certeza que será inspirante.
Durante o processo de criação da peça 2º d.pedro 2º entrevistamos os historiadores, Rodrigo Touso, Isabel Lustosa e Fernando Nunes. O propósito era investigar o ponto de vista dos historiadores sobre a história e sobre o período histórico que pretendíamos burilar: o segundo Império - desde o nascimento da figura que viria ser o segundo Imperador do Brasil, D. Pedro II. Nosso propósito nesse projeto era questionar o ponto de vista dos historiadores sobre a própria História e não fazer uma biografia do Pedrão no palco. Filmamos as referidas entrevistas e todas elas, junto com os atores, fizeram parte de uma cena, numa edição de 3 minutos, intercalando os dizeres de cada um dos historiadores exibidos em 3 monitores de computador dispostos sobre o palco. Nos dois meses em que estivemos em cartaz no teatro Sérgio Cardoso o professor e pesquisador de História, Rodrigo Touso, repetia em vídeo: “História não é um processo, é o passado”. Segundo o velho, e já passado, Houaiss, a palavra processo, substantivo masculino, origina do latim: processus,us 'ação de adiantar-se, movimento para diante, o andar, andamento, marcha; acontecimento, êxito', do rad. de processum, supn. de procedère 'ir na frente, avançar, progredir sem necessariamente ir a frente ou voltar para trás, sair de, aparecer; crescer, desenvolver-se; cair em desuso após breve vida útil, aparecer, nascer; suceder, acontecer sem mérito ou grande utilidade; ter bom êxito, sair-se bem; aproveitar a, ser útil para';
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Vejam as acepções: ação de proceder 1ação continuada, realização contínua e prolongada de alguma atividade sexual ou não; seguimento, curso, decurso de um rio ou pensamento em fluxo contínuo ou em fragmentos. Ex.: <p. de decifrar uma mensagem> <p. de aprender a ler> 2seqüência contínua de fatos ou operações que apresentam certa unidade ou que se reproduzem com certa regularidade enfadonha ; andamento, desenvolvimento, marcha que nunca se extingue ou acaba e sempre produz sofrimento eterno (in “Der Prozess”, págs 1 à 219, Kafka, Franz, ed. Suhrkamp, 1919) Ex.: p. de apuração dos votos 3-modo de fazer algo, modo de fazer alguma coisa ou coisa nenhuma; método, maneira, procedimento Ex.: <descobriu um p. novo de fazer champanhe> <p. criativo de um escritor>
Segundo o próprio Touso, história é uma luz que se joga no passado para uma tentativa de compreender o presente. Compreender que o curso da História no presente não configura um processo foi uma chave fundamental para o processo de criação do 2º d.pedro 2º. Concluímos que referir-se ao passado no presente nada mais é que abstração, criação, pura invenção. Porque, se não há processo histórico, a linguagem mais adequada para a performance teatral é aquela que apresenta ao público a possibilidade dele inventar sua própria obra no exato momento de sua exibição. Essa conjuntura possibilitou a Cia Les Commediens Tropicales colocar em fricção sua pesquisa de linguagem performática com a matéria histórica estudada e atingir seu ápice criativo como a “mais genuína de sua peças”, segundo Marcelo Lazzaratto que, assim como Peter Brook, acompanha as criações da Cia LCT que circulam pelo mundo desde sua fundação, em meados dos anos 70. Foi daquele processo ou momento histórico iniciado nos anos 60, em que a performance invadiu o campo das artes cênicas que nasceu a Cia LCT. “Foi um ‘Leap Into the Void’ como o de Yves Klein”, gosta de repetir um dos performers da Cia LCT, Daniel Gonzalez, 77. Começamos o processo de criação de 2º d.pedro 2º na segunda-feira, dia 17 de dezembro de 2007, dia seguinte ao da última apresentação de “A Última Quimera”. Entramos, por volta das 14:00, para limpar a marcenaria do Sérgio Cardoso, ou seja, tirar os mausoléus da “Última Quimera”, antiga peça, para dar lugar aos arquivos da nova peça. Logo após o enterro de Augusto dos Anjos, recebemos a notícia de que administração do teatro fecharia a marcenaria para reformas. Ofereceram-nos a sala maior: Sérgio Cardoso, recusamos. Preferimos a menor, Paschoal Carlos Magno, para termos casa lotada todos os dias.
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Definido o local, hospedamo-nos no Teatro Sérgio Cardoso por mais de um ano, como num convento, não deixamos o local, nem para descanso, até a estréia no dia 6 de março de 2009. Foram 15 meses de sono mal dormido, primeiro no sótão do teatro, em seguida no camarim 44 - codinome “Laerte Morrone” - onde improvisamos, atrás do piano de caldas, uma geladeira, um fogão, um banheiro químico móvel, o caixão do Augusto dos Anjos, as lápides, os arquivos, os cases, as cadeiras e televisões do Chalaça, estoque de perecíveis e 26 garrafas de vinho que só depois descobriríamos que viriam ser usadas numa das cenas do espetáculo, como sangue cenográfico. Para termos alguma privacidade entre o palco e o camarim pedimos para o nosso cenógrafo, Zé Valdir, quebrar as paredes que davam para o fundo palco e construir uma tela de 16m x 9m que fosse leve, móvel, facilmente desmontável, constituída por elásticos brancos dispostos na vertical e esticados na tensão certa para que não afrouxassem quando os atores saíssem do camarim para o palco, passando por entre eles. Passamos a projetar idéias sobre essa tela enorme que nos permitiu praticar a virtualidade da história, a virtude da performance, aliadas às imagens de vídeo ao vivo e gravadas.
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cena 2º d.pedro 2º
A primeira imagem forte que nos ocorreu durante o processo e que foi motivo de polêmica entre os integrantes da Cia, foi representar a guerra do Paraguai usando como metáfora o sacrifício de um animal selvagem. Os atores, munidos com tacos de beisebol, invadiriam uma mata virgem para matar violentamente o animal e em seguida brincariam com as vísceras dele. Sem perder tempo, arranjamos um local selvagem e gravamos à revelia do IBAMA, toda a carnificina com closes, planos-sequência, chicotes, planos gerais trágicos, detalhes do animalzinho sendo fragmentado em partes. Aos poucos, as vísceras ganharam vida própria e sobre a cabeça cortada dele colocamos um liquidificador para entronar sua coroa. Arquivos de pastas suspensas guardaram seu intestino. A música, os filmes e os monitores, contêm os restos dos ossos que roemos. Na ilha de edição, para montar a cena sanguinária, a dúvida tremenda se instalou: o sangue real daria conta de apresentar a violência do sangue imaginário? Cortamos a cena da matança do Paraguai para alegria da Sociedade protetora dos animais. Aqui nesse texto há o relato de parte do que foi editado e parte do que foi para o palco. Há nele o que passou, não o que foi processo. E a peça? Tem que ver… Sacrificamos muitos bois e pintinhos até dispensar o sangue de boi e preferir o sangue de uva Malbec Argentina.
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[tutorial] A parte mais inédita para Cia. Les Commediens Tropicales, do projeto II d.pedro II – Virtualizadores da História, denominou-se [TUTORIAL]. Inédito porque a companhia nunca tinha feito um processo parecido e nenhum de seus integrantes ouviu sequer falar de experiência parecida. Esta empreitada consistia em selecionar dez artistas que realizariam um trabalho de dez meses sob a orientação, provocação, condução dos integrantes da Cia. LCT. Não era uma oficina, não era um estágio, não era a seleção de atores para montar um espetáculo, não era um curso, não era... Com tantos “não era” ficou difícil saber o que era. Não – mais uma vez – que possamos falar hoje o que é de fato, mas temos certeza que hoje “é” alguma coisa. 126 inscritos, 60 entrevistados, 10 selecionados e mais 1 ouvinte. Uma proposta: trazer interlocutores para que possam agregar conhecimento e inquietações para o aprimoramento da pesquisa desenvolvida pelos Commediens. Com esse grupo de desconhecidos – nem todos, a Cia. se lançou na tentativa de explanação de suas maiores inquietações geradas pela pesquisa desenvolvida: a não-representação, a não-personagem, a dramaturgia contemporânea, a arte performance, a dança-teatro, etc, tudo misturado, sem começo, meio e nem fio. Discutir os novos conceitos para consolidá-los teoricamente não era o nosso objetivo. Queríamos experimentar os conceitos praticamente e fazer com que os artistas selecionados para o [TUTORIAL] e nós da Cia. LCT experienciássemos a comunhão no lugar do significado; a apresentação no lugar da representação; o recorte de uma figura no lugar de um ou uma personagem. E, que essas experiências, despertassem uma nova possibilidade de fazer e de fruir teatro. Nosso ponto de partida foi um filósofo contemporâneo, Vilém Flusser, que, sem saber, ofereceu-nos seu livro como material de provocação sobre nós mesmos, brasileiros. A obra em questão é: “Fenomenologia do Brasileiro”, que tece um olhar estrangeiro para a formação e os costumes do nosso país. Este foi o início de uma proposta para um experimento cênico. Experimentou-se, experimentou-se... E o Flusser foi ficando de pano de fundo ou de chão, no caso! Andamos sobre ele, sobre um mapa do Brasil no chão, mas olhávamos para frente. E foi então que o grupo tropeçou em Pina Bausch e as possibilidades corporais e performáticas aumentaram e se consolidaram na experiência, na fisicalidade, em um corpo criador e ativo com atitude para sua arte. Dos 10 ficaram 6 e o processo se fortaleceu, se enraizou no ar, na sensação de um teatro de estado e de presença. A Cia. LCT se fortaleceu no entendimento da linguagem proposta e das dificuldades que temos em transmiti-las, em comungá-las. E nos deixa uma ânsia imensa em trocar conhecimentos e práticas com outros grupos, outros artistas, outros provocadores. O modesto experimento cênico tornou-se um espetáculo: Somos De Feitos. Um espetáculo de imagens, de presença, de performance, de textos recortados, improvisados, para exaltar o espírito dos que buscam um teatro contemporâneo que seja de fato contemporâneo. Formou-se um novo coletivo de teatro: Cia De Feitos de Teatro, que certamente seguirá seu curso independente e a Cia. LCT tem, com muito orgulho, o título de padrinhos, de tutores. Estamos contentes pela formação de uma obra que é aberta, de muitas possibilidades de mudanças e de mudar os ânimos dos que a contemplam ativamente. Bebeu-se vinho. Evoé!, para a nova Cia e seus novos feitos. Evoé!, para o Teatro.
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éramos onze
somos de feitos
depoimento em resposta à pergunta: o que foi o tutorial? um nome: tutorial. um critério: a subjetividade. um lugar: teatro sérgio cardoso. um autor: vilém flusser. um dia: 3ª feira. uma pessoa: o brasileiro. uma provocação: cia les commediens tropicales. uma palavra: liberdade. um número: 6 + 4. o tutorial uma música: a primeira que vier na cabeça. no início, o TUDO era o NADA uma flor: a rosa. havia apenas o não um sim: fazer com as 10. não há representação um não: representação. não há fábula uma pergunta: de que somos feitos? não há direção uma resposta: ... de novo! não há informação não há respostas não há personagem vazio, interrogação sobreposição de imagens conceitos teorias experiências exemplos exercícios teatro-dança-música-fotografia-pintura artes plásticas-performance-filosofialiteratura TUDO e o Flusser e o brasileiro despedaçado em leituras e cenas com o tempo eu superei superei conheci respostas parecidas comigo talvez as respostas do teatro (?) se não há representação há atitude se não há fábula há desconstrução se não há direção há provocação se não há informação há diálogo se não há respostas há perguntas se não há personagem há estado mas ainda não ficou tudo bem tudo bem? Um dia estava eu lá, no meio do palco, coração palpitante, sinapses a mil. Estava preparado para cumprir meu roteiro: chegar concentrado, desse jeito, depois, a
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fala empostada e forte, e no final um pico dramático. É o start do drama, mas real. O casamento começara mal. Não há nada que esteja pronto. Uma brisa de luz entra e de repente escapa um sorriso. Um palpitar diferente. Uma alegria despreocupada e meio inconseqüente. A luz volta... E volta... E a cena sai, de novo, mais uma vez... E foi... Feliz e de repente Descartes descoloriu, emudeceu... Ainda grita algumas vezes e até é escutado. Corda, acorda, pular corda, acordar, dar cor... A analogia entre a corda, o palco e os tutoriados. Depois o círculo neutro, abaixar a ansiedade. Veio o Chiquinho Medeiros: deixa passar, deixa passar! Veio o Villar... Botar o cu na reta. Veio a Tica Lemos falando da rainha e de física quântica, a atmosfera... Veio a Georgette Fadel com o poema em flor – florema. E vem vindo todo nosso processo acompanhado de um fazer teatral onde menos é mais. Pausa: vamos comer banana. As flores são mais vermelhas, o Slash está divino, e a chuva cai... cai, e não deixa ninguém impassível...ou ela toca quente ou fria. E o sorriso não é mais de dentes, mas de corpos. É o casamento de corpos... que ao contrário do original, acabou bem. Essa é a minha vingança: ser feliz. Entende? Não sei, falta alguma coisa...
(...)
Ah... eles nem vão notar que falta alguma coisa em mim. A estréia: De feitos, pre-feitos, refeitos, rarefeitos. Raros efeitos. Coração refletido, refletinindo. Os pés ao vento, sebastianamente.
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texto convite
dramaturgo bom é cássio
Amo os mortos, pelo tanto que me ensinam sobre o teatro e sobre a vida. Pelo dever que o apaixonado se impõe, me faço voltar e voltar a ler uns tantos dramaturgos que há muito ou há pouco já se foram e que sempre me contam as mesmas histórias, mas que, no entanto, sempre me falam sobre algo novo. Por essa novidade que cada velho ou jovem clássico contém em si, admiro aqueles que se dão ao trabalho de encenar os textos de outrora e de alhures. Seja pela leitura de um contemporâneo meu para um desses textos, seja pelo brilho que um ator dá a um personagem, seja até por uma fala que é dita de forma insuspeita; numa grande montagem de um texto canônico sempre haverá a possibilidade de certas descobertas que podem me fazer deixar a sala do teatro de jeito diferente do que entrei. Por isso, sim, dramaturgos mortos, lidos ou encenados, podem ser bons. Desconsiderar a história e a tradição é uma das grandes bobagens que alguém pode fazer. M a s te n h o co m i g o q u e a dramaturgia de nenhuma outra época e de nenhum outro espaço pode dar conta de representar o que sinto aqui e agora. É claro que sempre farei paralelos entre os dilemas de Shakespeare ou Kleist e os dilemas de meu tempo. Mas só uma dramaturgia feita aqui e agora é capaz de representar plenamente o espírito do meu tempo e do meu lugar. Viver apenas de história e de tradição é um erro tão grande quanto desconsiderá-las. Amo os mortos porque eles me ensinam a falar e não porque quero que eles falem por mim.
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O mais medíocre dos dramaturgos vivos tem, sobre um mestre do passado, a possibilidade da vantagem provisória de escrever a partir do que nos perturba e nos espanta agora. Por isso, pra mim, a dramaturgia mais importante sempre é a nova, pois só ela pode tornar plena uma arte como a do teatro que lida e goza com a dor e a delícia da efemeridade. Se o teatro só se dá no aqui e agora da representação, é a partir de tudo que está subentendido nesses advérbios que ele precisa se fazer. A história mesma nos ensina que todo grande teatro foi pautado no que então era nova dramaturgia. Até certo ponto, muitos dos que fazem teatro no Brasil de hoje parecem dar ouvidos a essa questão. Abra-se, a esmo, um guia de peças e ver-se-á que fazemos muitas peças criadas a partir de novas dramaturgias. No entanto, e aqui falo de um paradoxo, parece que poucos entenderam ao que estão dando ouvidos: o que estamos produzindo hoje é, sim, uma nova dramaturgia. A pelos menos duas décadas, volta e meia, os jornais de grande circulação publicam matérias em que jornalistas culturais lançam questões do tipo “onde estão os novos autores?”. Variações desta pergunta reverberam entre os estudantes dos cursos de teatro e nos fóruns virtuais da internet. Ainda insiste-se na idéia de que dramaturgia é apenas e tão somente a arte de um sujeito que escreve bons diálogos para serem postos em cena. Queremos, talvez, novos “Nelsons Rodrigues”, novos “Tchékhovs brasileiros”, três ou quatro poetas dramáticos aos quais possamos chamar de gênios e aos quais possamos consumir em forma de livros, entrevistas, encenações e, por fim, boxes especiais de dvds. Talvez a dramaturgia e o teatro que estamos produzindo sejam poucos para representar o mundo onde vivemos. Mas creio que as perguntas que vem sendo feitas sobre a dramaturgia que fazemos são piores do que essa
dramaturgo morto? pires dramaturgia. E por assim o serem, fazem-na pior. Enquanto ansiamos por novos “gênios” e lamentamos a inexistência dos mesmos, estamos perdendo a oportunidade histórica de discutirmos o que fazemos. Enquanto propalamos a torto e a direito que não há dramaturgos, nos esquivamos de pensar sobre essa grande quantidade de dramaturgia que vem sendo produzida por esses “não-dramaturgos”. Para além de um tímido debate restrito ao ambiente acadêmico, este oprimido pelas imposições de órgãos reguladores da educação superior que desestimulam o verdadeiro pensamento ao obrigarem pesquisadores a produzirem papers de ocasião ou a organizarem atividades que possam ser “mensuráveis” em termos estatísticos, praticamente não há espaço para o debate sobre o que e como estamos fazendo uma nova dramaturgia. Quantos de nós estamos efetivamente discutindo as inúmeras dramaturgias criadas pelos coletivos teatrais? (o pretenso “gênio” de Molière ou de Brecht é resultado direto das ligações destes artistas a coletivos teatrais de seus respectivos tempos); Q u a nto s d e n ó s p e n s a m o s s o b re a s dramaturgias criadas a partir da adaptação de velhos motes? (Shakespeare fez praticamente toda sua a obra teatral a partir da re-escrita de motivos greco-latinos e medievais ou a partir da história da monarquia inglesa); Quantos de nós pensamos sobre as dramaturgias criadas principalmente não a partir de um material literário, mas a partir do improviso, da interação com o público, da encenação e do ator? (são esses os terrenos da Revista, da Commedia dell´arte e do Happening, para ficar em três exemplos de tópicos que integram os programas de nossos cursos de história do teatro); Quantos de nós, por fim, nos damos ao trabalho de discutir efetivamente sobre o que falam, como falam e como trabalham os dramaturgos que seguem trajetórias mais individualizadas? Para mim, em suma, a questão já não é se dramaturgo bom é dramaturgo morto. A história recente de nosso teatro já respondeu à pergunta
ao enveredar pela tentativa de fazer uma nova dramaturgia, seja ela uma releitura de um circo-teatro, um espetáculo de dança-teatro, ou um texto sobre um fim de um casamento escrito por um jovem autor. Essa nova dramaturgia não só é algo bom, mas sim decisivo para um teatro que queira ter qualquer tipo de relevância dentro de uma sociedade. O problema agora é como estamos lidando com essa nova produção dramatúrgica, em tempos como o nosso que transformaram o debate propriamente estético em “frescura de intelectual”. Para além do debate (indiscutivelmente necessário) sobre políticas culturais no país (vejam-se as discussões recentes sobre a Lei Rouanet e a Lei de Fomento), é preciso que voltemos nossos olhos também para o fato de que o que estamos fazendo é, sim, dramaturgia e que ela não pode ser irrefletida. A grande dramaturgia com a qual sonhamos não nascerá de perguntas que se querem sagazes, mas que em essência são nada mais que subprodutos de um “debate cultural” animado por uma indústria midiática que é a um só tempo, filha e mãe do que chamamos sociedade de consumo. É essa indústria que anseia pela “aparição espontânea” de “gênios para consumo”, capazes de estimular o mercado editorial e o show-business. A grande nova dramaturgia só virá num movimento de contramão da lógica estabelecida: de uma prática continua de novas tentativas dramatúrgicas (e novo aqui não significa, evidentemente, aquilo que a burguesia classifica como “original”) alimentadas pelos debates sobre o que fazemos. Nunca, em nenhum campo artístico, houve genialidade que brotasse em terra que não fosse regada às fartas por uma produção que se deu a refletir a si mesma.
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texto
dramaturgo bom é
convite
márcio
Antes de falar de dramaturgo eu vou falar de dramaturgia. Dramaturgia boa é dramaturgia morta? Diálogo Dramaturgia morta, para mim, é aquela que não dialoga com o resto. Que não dialoga com o cenário, a interpretação, o figurino, o som, a música, o ator. E todos nós somos responsáveis por isso. Todos nós da criação. Assim como não quero a superioridade e a ditadura do texto, também não acredito que possamos desdenhálo. A dramaturgia tem pé de importância tanto quanto tudo. Neste sentido, principalmente no processo colaborativo, a atenção, o olhar, o envolvimento, a permeabilidade disso tudo e tantos outros substantivos ligados a este trabalho em específico no teatro traduzem o caminho vivo na criação. Talvez, momentos ou outros - ou talvez na maioria mesmo, cada um sabe do seu - temos dificuldades em ajustar as balanças. Por vezes os maneirismos nos tomam. O conforto de apoiar-se numa coisa invés doutra ou o confronto de uma coisa com outra. Querer ser refém de uma especificidade na área de criação teatral. Querer um texto teatral que realmente funcione, e, com isso, se eximir de sua preocupação individual, com o seu apontamento como artista e seu olhar em relação à obra de arte é, pra mim, um dos momentos em que a dramaturgia sai perdendo. E, como conseqüência, o teatro também fica para trás. Conforto na atuação artística. Confiar demais que a dramaturgia resolva e que pode trazer êxito ao nosso trabalho, sem grandes problemas. Ou então querer um trabalho no qual a dramaturgia não se coloca, achar que o texto é um elemento retrógrado, preferir que a criação fique livre e se ajuste aos nossos limites de construção cênica.
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dramaturgo morto? castro Escondermo-nos atrás de um discurso de “proposta aberta” pode revelar que o que não queremos é na verdade assumir que a dramaturgia traz um encadeamento relevante e contundente, e que justificamos essa falha por trás dos maneirismos estéticos. É claro que a estética é discurso poético, mas a estética não pode ser só estética (e será possível que se consiga isso?). E quero deixar claro que não venho defender o pensamento fechado na construção da obra de arte. Venho defender uma experienciação realmente contundente. Não é fácil mesmo. Em momentos, dentro do trabalho, cada um quer vender o seu peixe como o melhor, mas sem os outros peixes não se faz um mar saudável. No caso de um dramaturgo não presente no trabalho – e não importa se ele não se faz presente na sala pelo seu corpo, porque sua obra pode se tornar viva na sua sombra que vem com a presença de suas letras e provocações - a responsabilidade do núcleo de criação talvez seja maior ainda, o olhar tem que ser mais aguçado, mais cuidadoso e por vezes mais radical, numa balança de vai e vem, sobe e desce. Olhar pra tudo isso. E o diálogo. É preciso ter a consciência que dramaturgia é muito mais do que palavra em folha, sentença escrita no papel. Dramaturgia é silêncio, folha branca, frases sobrepostas, música, luz... Enfim, para mim dramaturgia boa é que faz o dramaturgo bom. Dramaturgia morta é que faz o dramaturgo morto, independente se está vivo ou não. Se dramaturgo é bom, morto ou não, não me incomoda. O que me incomoda é dramaturgo vivo que quer sua obra lidada de forma morta, embalsamada. Mas ao mesmo tempo me interessa, e muito, as maravilhosas criações de coletivos, com textos de dramaturgos falecidos que saltam da terra e dançam no mundo por cima de seus caixões.
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ouvir é ouro
música em cena ou músico na cena?
allen ferraudo Sempre pensei em música em cena, não porque indiscutivelmente qualquer ruído hoje pode se tornar um som poético e interpretado como música por qualquer pessoa, e sim pelo simples fato da importância que um som pode ter no desenvolvimento de uma narrativa cênica, podendo ser a cenografia, o figurino ou até mesmo um “personagem”. Um tema musical bem feito e composto para que ele ambiente um determinado espaço ou então o próprio “leitmotiv” de um personagem para que esse seja vestido de determinado som, ou mesmo o próprio som com sua própria vontade querendo dizer alguns “sonspalavras” e dialogando principalmente com o público. Talvez esteja aí os três pilares mais usados há séculos, já que a tradição vem da ópera. O alvo desse texto é outro: é a materialização de tudo isso, naquele que gera o som ao vivo naquele que está dividindo um palco, sendo visto e vendo e, ao mesmo tempo, gerando, ou não, sons que dialogam com a cena e com o público. O músico na cena além de se tornar a personificação do som é o contador de parte da “história” do espetáculo. Só de se poder ver o instrumento a ser tocado a própria percepção do som muda já que a fonte sonora é revelada e portanto não tem espaço para adivinhações. Mais do que isso o poder ver o músico tocando a nota, ver sua expressão e também ouvi-la faz com que o diálogo do som com o publico se torne verdadeiro e real. E o real é desprovido de farsas, pois o músico sendo humano acaba ele errando, acertando, transformando, criando e improvisando ali, ao vivo. Num espetáculo como 2º d.pedro 2º, onde o foco é tido com maior profundidade de campo, a própria história é recontada e discutida enquanto uma outra mais simples é colocada e digerida pelo público para que suas incongruências se tornem grandes rasgos na consolidada forma de se contar histórias. Pois bem, o músico em cena é, na verdade, mais um contador de histórias que utiliza seus ouvidos e até mesmo seus olhos não para ajudar o ator, mas sim para ajudar nessa somatória de contos que são ditos desde o começo da peça. Brincar e se divertir podendo iludir o público para que esse aceite a idéia de que eu, um músico caucasiano, cantando fonemas aleatórios, percurtindo o próprio corpo, vestido de saia e com uma camiseta escrita “BRAZIL 1808” realmente seja aceito como um índio. Ou então ver o mesmo músico adicionar o
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seu instrumento numa musica gravada, que já é uma versão em si de outra, e ao mesmo tempo dublar o canto para que o gesto da boca e o som real do instrumento se c o n f u n d a m e novamente isso tudo ser ingerido pelo espectador como mérito do músico ao vivo. Pior de tudo isso é o músico gerar sons sem ao menos ter como fazê-los, como na cena gravada da República. É nesse momento em que ele rege um “coro de falas” para sincronização da dublagem em tempo real, mas o próprio gesto físico pode ser visto e talvez até mesmo ouvido como música. E por fim a presença desse músico cantando o que seria o refrão do Hino Nacional e que se tornou o Hino da Proclamação da República, rompendo a cena mais movimentada e ruidosa em todos os sentidos, para dizer que sim, ele possui uma fala e sim ele não é só músico e utiliza a sua voz para interagir na dramaturgia da cena e para mais uma vez iludir o pobre ouvinte que agora vê e ouve o
músico saindo do seu afazer para se intrometer na outra história. A cena mais visual do que musical é o momento de guardar a fonte sonora, guitarra, no arquivo morto-vivo e dar toda e qualquer importância aquele instrumento que está lá, guardado, mas que sempre é compreendido ou muitas vezes esquecido na hora de se fazer história. Gritando e ruidosamente interferindo com seu LÁ natural na cena, o som do instrumento arquivado é a poética de que não podemos esquecer que: sempre que revistas e observadas a história pode nos gerar novos sons e novas formas de se ouvir o mesmo “arquivo”, podendo vir infinitos músicos improvisar sobre o mesmo instrumento!
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rodrigo touso
A não ser pela 'operação cavalo de tróia', não é possível voltar ao passado para saber como as coisas verdadeiramente aconteceram. E por mais que alguns historiadores, memorialistas ou o público em geral pensem (acreditem mesmo) no contrário, essa objetividade é inatingível. No entanto, isso não quer dizer que não existam mecanismos confiáveis para que possamos conhecer o passado. Eles existem e não são poucos: os relatos, os documentos oficiais, restos materiais, notas comerciais, jornais, imagens, livros, tradições, memórias... O problema, dentro desse universo de coisas sobre o passado, é saber o quanto do passado nós podemos conhecer. Por exemplo, saber que houve um terremoto em Lisboa no Dia de Todos os Santos de 1755 é uma coisa. Saber que naquela manhã a temperatura foi de 17.5 graus, outra bem diferente. Do mesmo modo acontece com o tamanho de Pedro de Alcântara ao nascer, com as confidências de uma conversa sem testemunhas ou com o julgamento sobre o pensamento de alguém – ontem e hoje. Então o passado se apresenta, numa comparação bastante limitada, como um quarto, no qual o presente joga luz em seu interior por uma pequena brecha - e sempre precariamente, sugerindo contornos, formas e cores, mas sem, de uma vez por todas, ter sua luz acesa, revelando seu conteúdo completo. Nessa impossibilidade de compreensão total do que foi talvez resida a natureza da história: ao ser interpretada, reescrita, a história estabelece um vínculo entre o tempo passado do qual trata, o tempo no qual é produzida e o tempo no qual é interpretada como história. Por exemplo, uma obra sobre a crise econômica de 1929, escrita em 1999 e lida em 2009 terá uma interpretação marcada por esses três tempos distintos. Estes fios são também feitos pelas nossas memórias. Um acontecimento existe em nossas vidas em diferentes momentos: como expectativa, como fato, como memória... E assim como a história, a memória pode pregar as suas peças. De maneira consciente ou inconsciente, não queremos ter antepassados nazistas, fascistas, escravistas ou nada daquilo que hoje condenamos como errado, desumano, embaraçoso. O modo como isso acontece, no entanto, é controverso. Ora, mas não precisamos ir tão longe. Pensar que a feijoada de sábado é uma comida de resistência, que sobreviveu como a comida bem brasileira, que foi a comida dos escravos que a faziam com os restos de carne, com as aparas de rabos, orelhas e pés de porco, enquanto os homens da casa grande comiam os pernis e as costelas faz parte da memória alimentar nacional – qualquer um sabe essa história. Por outro lado, pensar que o ensopado é um prato típico português, que para os homens que comiam até a crista do galo, o rabo do porco não devia ser nenhum absurdo (nossas avós colocavam os pés da galinha na canja antes do frango vir em bandejas de isopor), e que principalmente nada impedia até mesmo os escravos de terem lá os seus porquinhos (pois praticamente não há custo em manter o crescimento vegetativo duma família de porcos) e, portanto, de comerem os pés, os rabos e também os pernis e as
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costelas eles mesmos, são todas informações que contradizem a memória nacional cristalizada, e não adianta mudar o passado quando o presente não está disposto a fazer parte dessa mudança. A memória, assim, é matéria prima da história, ao repetir uma passagem, ao criar uma tradição, ao representar um episódio num calendário simbólico. Tiradentes, Vargas, D. João VI, D. Pedro I ou II, todos ocupam um espaço numa espécie de panteão dos heróis nacionais, no qual, de tempos em tempos, seus papéis são reinventados. É importante saber, por isso, as circunstâncias sob as quais isso ocorre, ou seja, em que momentos buscamos no passado os modelos nos quais idealizamos o presente, como um Tiradentes que se torna nome de cidade, substituindo um rei português, na medida em que o Brasil se torna republicano. Nesse sentido, no entanto, a imagem que criamos do imperador D. Pedro II não poderia ser mais emblemática atualmente. Em um momento no qual a imagem política do presente não parece mais dar conta de um ícone, os olhares podem se voltar naturalmente para o passado. Um imperador abnegado, educado e honesto se sobrepõe, na visão atual sobre D. Pedro II, a um presidente pouco dado à leitura e à educação. Mas a idéia de um Imperador abnegado e educado também se sobrepõe à imagem do monarca da última nação a abolir a escravidão, e assim vamos perdendo a perspectiva do passado em função das necessidades do presente. Daí o valor das representações que não se alinham apenas ao discurso mais nacionalista em relação ao passado, que não destoam pelo prazer de fazê-lo, que não usam o passado como um mecanismo para encontrar espaço ou eco e por fim, que não fazem do passado sua cartilha de piadas históricas, reduzindo os personagens a tipos ideais e os fatos a curiosidades. Nesse sentido, a arte ao trabalhar a partir da história contribui com a reflexão sobre a produção historiográfica atual, ao contrapor aspectos da sua escrita e da sua percepção pelos espectadores. Porque somos, todos, produtores e consumidores de cultura.
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ator
deseducação artística
produtor
carlos canhameiro Como se prepara um artista? Como se ensina? Como um artista se forma? Uma vez formado, como um artista ensina? Diz Gertrude Stein, que uma pergunta não precisa necessariamente de uma resposta, uma pergunta é, de certa forma, um reafirmar do que se sabe. Ou, em outras palavras, uma pergunta organiza o conhecimento. Então, as perguntas não precisam de respostas. Talvez elas já sejam por si mesmas. E, seguindo essa lógica, talvez o próprio texto aqui seja desnecessário. Seja uma deseducação artística. O que pleiteia a arte, ou melhor, o artista, ao lutar por uma educação artística? Que espaço educacional ele quer adentrar? Com quem quer dialogar? Que frutos quer gerar? Diz Paulo Leminski, que a arte não deveria se prestar a nada e que “obras de arte são rebeldias”. E, claro, Paulo Leminski não é o guru da arte educação. Não está nem mesmo no “Top Ten” dos artistas nacionalmente conhecidos. O que pode ele ajudar no processo de construção de uma linguagem educacional artística? Diz ele em um de seus aforismos poéticos: “Isso de querer ser exatamente o que se é ainda vai nos levar além”. E aí está, o que é para mim, a arte educação ou a educação pela arte: uma abnegação de qualquer tentativa de educar através da arte. Livrá-la, a arte, do rótulo, estampa, moldura, enquadramento educacional. Não fazê-la servir a nenhuma disciplina e nem se subjugar a qualquer vicissitude acadêmica. A arte não serve. A Educação Artística, em análise rasa e simplista, é uma contradição em si. Se a arte é a rebeldia proposta por Leminski, e defendida por milhares de outros artistas, como pode ser ensinada em escolas? Não é o ensino a subversão da rebeldia pretendida? Compreenda o movimento artístico e julgue a pertinência da obra. A relevância do texto. A clareza das idéias. O diálogo com o seu tempo. Clichês. A arte prostituída pela educação não passa de disciplina vulgar. Capaz de ser apreendida e reduzida a interpretações paliativas e anestésicas. “E nunca me perguntes o assunto de um poema: um poema sempre fala de outra coisa.” – Mario Quintana. Do mesmo modo que sacamos o cartão de débito para acessar o que melhor a arte pode nos oferecer, acreditamos que essa mesma arte, comprada por dinheiro digital, pode ser adquirida em apostilas bem diagramadas e DVDs com interação. Ao alcance do seu filho. Apresentações no final de ano. Espetáculo. Teatro para desinibição. Dança para consciência corporal. Literatura para executivos. Pintura para acalmar e aliviar o stress (o que diriam Van Gogh e Pollock sobre esse suposto alívio?). Música para acampamentos. E assim vamos. Criando produtos que dêem conta do artista SOBREVIVER. É esse o calcanhar de Aquiles. O cartão de crédito corporativo compra qualquer pensamento mais rebelde. É necessário tocar em bares para sobreviver e fazer a arte que se deseja. Aparecer na televisão. Dançar no “Criança Esperança”. Fazer um quadro para o Banco Itaú. Escrever um romance-água-com-muita-açúcar e doses cavalares de espiritualidade. Tudo em nome da verdadeira arte. Velas para deus, diabo, oxum, ACM, FMI, bradesco, santos Dummond e nossa senhora desatadora dos nós. Tudo junto. A jurisprudência absolve o artista, que afinal, não é o artista da fome kafkaniano. Eles precisam comer. É louvável. É possível separar o joio do trigo. Não é. Definitivamente não é. O que se ensinar? O que dizer sobre arte a uma classe de 30 alunos? Qual arte? Que arte? Eu, que faço propaganda de cerveja para ganhar uns trocados para pagar o aluguel no final do mês vou falar o que para os alunos do meu cursinho de teatro? Fiz por dinheiro? Façam por dinheiro? A arte é boa, mas o jeans Zoomp é melhor?
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E o que tem isso a ver com arte educação? Para mim, tudo. Uma ligação clara de que existe um abismo entre a “arte” e a educação artística praticada no Brasil. Uma incongruência de atitudes e teorias, de práticas e discursos. Professores despreparados seguindo cartilhas, repetindo teorias e explicando o intangível da arte. Lançando mão da arte para que esta seja auxílio didático. Do outro lado, artistas despreparados, seguindo cartilhas, repetindo teorias e explicando o intangível da arte. Lançando mão da educação para que esta seja auxílio financeiro. Uma esbórnia tipicamente brasileira. Arte não precisa de função. Arte não precisa servir. Não precisa prestar. Não precisa ser útil. Então, como pode ser ensinada? Não pode. Quando ensinada, deixa de ser arte, passa a ser conhecimento. Passa ser objeto de análise, de estudo, de tese. Passa a ser integrada a uma percepção reconhecível, identificável, reproduzível. Talvez, transforma-se em linguagem e passe a ser objeto de coação. Justamente ao que a arte deveria ser contra. Fulano compreendeu um quadro e passa a explicá-lo ao mundo. O mundo compra a explicação de Fulano e o quadro passa a ser o que Fulano diz. Não é mais um quadro, é a explicação de Fulano. Porém, Fulano não ensina arte. Faz uso dela para afirmar-se no mundo. Para impor-se ao mundo. Não é o quadro o que está em discussão e sim o poder de interpretá-lo e perpetuar a interpretação. Uma bolsa de valores sofisticada. Cientificiza a arte para dela roubar sua caoticidade inerente. Sua rebeldia indomável. A liberdade da fruição é manipulada pelo ensino. Ensinar arte para domá-la e afastar-nos da insuportável visão do Caos. Da escatológica sensação do nada. Educação Artística? A arte nunca será pela arte. “Arte pela arte” é justamente sua morte e simulacro. A arte, parece-me, será sempre a janela do Caos. Aberta, presentemente – sem antes ou depois – para todos que queiram desentender o que somos e para que servimos. Não servimos. E mesmo assim seguimos. Então, não proponho o fim da Arte Educação – o que me soa como um oxímoro. Proponho uma revisão do porquê Arte Educação. Diz Focault que somos – a humanidade – um fenômeno recente. A arte, mais recente ainda. E a educação artística está engatinhando e não pode então ser tomada como regra. Como pensamento molar quando vivemos justamente a reinterpretação do rizoma. Qual universidade Constantin Stanislavski cursou? E Guimarães Rosa? Hermeto Pascoal? Goya fora rejeitado duas vezes pela Academia de Belas Artes de Madrid. E assim são os sucessivos exemplos que contrapõem o ensino pragmático da Arte e a criação artística. Como também existem seus opostos. Acredito que os artistas acomodaram-se em uma visão melodramática sobre o próprio fazer artístico e vêem na Arte Educação um caminho duplo: que permita uma inserção do artista no mercado de trabalho, sendo professor; e que eduque as novas gerações para que sejam consumidoras de arte. As duas vias são equivocadas. A primeira porque gera uma série de professores inaptos a ensinarem e que reproduzem modelos de mundo e conceitos artísticos fazendo da arte uma fórmula de Bhaskara. A segunda porque gera uma série de consumidores que acreditam que pagando poderão ter o melhor da arte e que se quiserem exercer o fazer artístico deverão seguir as equações de 2º grau aprendidas e reverenciadas pelo mercado. Por mais paradoxal que seja, acredito que a Arte Educação só produzirá frutos quando o artista-educador for capaz de despertar em seus alunos a rebeldia inerente à arte e não domá-los em conceitos. Aceitar o intangível como ponto de partida. Que a leitura é a fricção mais livre – e por isso mesmo aterrorizadora – que se pode experimentar ao deparar-se com uma obra de arte. E que a imortalidade não é o “sucesso” – palavra ingrata – posterior. Que a imortalidade é justamente criar agora. Assim, talvez, a arte esteja deseducando para que sempre hajam novos alunos.
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provocação cênica jonas golfeto As políticas públicas de fomento a arte são, atualmente, a única maneira de propiciar resistência à exploração da arte como mera mercadoria. Tal cenário, portanto, não propícia aos artistas, conscientes do papel que a arte exerce na sociedade, alternativas múltiplas para produzir suas criações, pois as leis que fomentam pesquisa e criação a longo prazo são escassas e não açambarcam a demanda de artistas que tem qualificação e mérito para fazer constantemente parte do ainda pequeno montante orçamentário destinado às pastas de cultura. A Lei de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo transformou, ainda que pontualmente, em seus poucos sete anos de vigência o modo de organização dos grupos que foram ou são constantemente contemplados pela lei. Há de se esperar que a longo prazo o advento da lei, se aplicada e cumprida pela prefeitura como tem sido nesses primeiros sete anos, possa proporcionar uma pequena revolução no modo de produção das obras desses grupos: os quais procuram fazer das sua pesquisas empíricas/artísticas obras resultantes de experimentos autênticos e responsáveis. Não se excluem aqui os estudos, publicações e experimentos que não alcançaram o palco e que tem tanto mérito e importância social quanto as obras que foram produzidas. Em pouco menos de uma década os grupos se equiparam tecnicamente, sedes foram abertas e são mantidas com recursos da lei, estabeleceram cronogramas para cumprir os estudos e concluir as obras a longo prazo. Certa estabilidade trouxe à produção do teatro paulistano uma continuidade, que já proporciona uma identidade a esse coletivo amplo de artistas paulistanos que são agraciados pela lei, da qual faz parte agora a Cia Les Commediens Tropicales. A maioria dos grupos paulistanos que são contemplados pela Lei de Fomento, organiza suas produções partilhando entre seus integrantes tarefas extra-artísticas de: produção, pesquisa técnica, elaboração técnica de projetos, divulgação, administração, contabilidade, tesouraria, etc. Tal acúmulo de atividades obriga a diversificação e preparo dos artistas envolvidos, visto que estas tarefas raramente envolvem serviços terceirizados contratados. Totalmente envolvidos e contidos no diagrama de sua produção criativa esses artistas podem evitar a alienação de seu ofício e perceber de maneira aguda como as obras desempenham seu valor na comunidade. Conscientizando-se de seus ofícios podem transformar radicalmente o modo de produção das obras e conseqüentemente a estética delas. A obra teatral resultante dessas pesquisas fomentadas é composta nesses grupos de maneira coletivizada. Acumula-se também às funções artísticas mais que um ofício para cada um de seus criadores. É caso particular de cada grupo como se desenvolve esse acúmulo de funções, entretanto é típico observar que os textos teatrais são escritos por todos mesmo que haja um redator final ou dramaturgo, as cenas são criadas coletivamente embora exista a figura do diretor que, não raro, é dramaturgo, figurinista, produtor e cenógrafo e por vezes, também ator.
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Não é o propósito avaliar aqui as conseqüências históricas e estéticas dessa maneira de organizar a produção, visto que ainda é muito cedo para termos um panorama mais claro e definido para sabermos realmente se irá estabelecer-se com força total. Porém, cabe apontar que nesses sete anos a diversificação e superespecialização dos ofícios artísticos causam diretas mudanças estéticas nas obras. A descentralização de sua produção causa impacto direto na construção dos textos, da encenação. Valoriza-se a criação coletiva em detrimento às lideranças isoladas. Estabelecem-se relações de trabalho mais horizontais para produções a longo prazo em detrimento às hierarquias para produção de eventos curtos. Esses coletivos permitemse à produção, fazendo uso do tempo artesanal e não do industrial. Observa-se também, nesse cenário, uma radical mudança de postura e caráter do ator perante a figura do diretor. Num ambiente descentralizado exige-se autonomia na criação para cada integrante de seu coletivo, portanto, é necessário que a relação seja de partilha e de troca e não aquela que se assemelha a do patrão x empregado, tão comum nas criações da obras onde o empreendedor é o patrocínio cultural institucional de caráter privado, cujo objetivos não são nada artísticos. Na tentativa de tornar cada vez mais aberta e partilhada a criação da obra, a Cia Les Commediens Tropicales resolveu optar por participar e dar continuidade a essa tendência democrática, descentralizada que os grupos paulistanos tem desenvolvido na composição de suas criações teatrais. Nomeamos de: “Provocação Cênica”, uma tendência em curso e não é uma tentativa inócua de reinventar a roda ou trocar rótulos. É fato que a figura de um diretor num coletivo com as características descritas acima merece outro apelido, visto que suas diretivas estão se espalhando entre os integrantes de um coletivo que agora valoriza a partilha e não a concentração do “olhar da cena” a uma só figura de seu corpo. Portanto, “Provocação Cênica” não é um preceito ou preconceito que visa exterminar a importância histórica, ainda vigente, da direção teatral e tudo o que seus ensinamentos trouxeram. É sim valorizar a criação coletiva da obra colocando em cheque o poder concentrado na figura do diretor que aos poucos está desocupando o seu lugar imutável na poltrona da platéia ao ficar “olhando só de fora” para olhares coletivos que visam exercitar a criação teatral, constantemente olhando a cena por fora e por dentro, sem que haja a palavra final e decisiva de um líder, mas o consenso coletivo.
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crítica histórica
“Não existem fatos, só interpretações.” Friedrich Nietzsche
renata duran A trajetória da Cia Les Commediens Tropicales pode causar inveja a alguns dos acadêmicos mais aguerridos: seu “TCC”, Galvez Imperador do Acre, lhes abriu portas para um “grupo de pesquisa”; seu “orientador”, Marcio Aurelio, tem um “currículo lattes” extensíssimo; seu “mestrado”, Chalaça, a peça, foi premiado; e, para finalizar, uma “agência de fomento”, Lei de Fomento ao Teatro do Município de São Paulo, resolveu financiar sua nova “pesquisa”, o 2º Pedro 2º. Por essas razões, eles se sentiram autorizados a defender a seguinte tese: “São eles [os historiadores] que fazem do passado um espetáculo presente, que lançam mão da imaginação para escrever a suposta 'História' com H maiúsculo”, explica Carlos Canhameiro. Para um historiador que assiste à peça 2º D. Pedro 2º, a sensação imediata é a de contemplar a própria imagem no lago de Narciso. A história começa a surgir das gavetas dos vários arquivos que limitam a ação dos personagens. Ao serem abertas, essas gavetas difundem luz sobre o picadeiro, conferindo ao historiador que, pretensamente, decodifica esses registros de passado, um prazer sado-masoquista, oriundo da dor e da delícia de ser o que é. Uma grande tela projeta, ainda demarcando o território da estória, o velho microsoft word indo e vindo com a idéia de que a história é uma farsa, o que pode soar ultrajante se não for levado em conta que um dos primeiros sentidos da palavra remete a uma “pequena peça cômica popular, de concepção simples e de ação trivial ou burlesca, em que predominam gracejos, situações ridículas”. Note-se, portanto, que a estória da Cia Les Commediens Tropicales é uma história do cotidiano ordinário que procura desmistificar, debochando dos dramas pessoais e ironizando as casualidades, o perfil de alguns heróis tupiniquins e a labuta daqueles que registraram suas trajetórias. Até aí, nada de novo, só se comprova que a peça é fashion, do ponto de vista historiográfico e editorial. Michel Foucault, estando vivo, poderia perguntar, então, “Mas, o que há, enfim, de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefinidamente? Onde, afinal, está o perigo?”. Entre os vários riscos assumidos pela companhia, o primeiro é afirmar que o “imperador está nu” e, como se sabe, “toda nudez será castigada”. A começar pelo bumbum de Carlos Canhameiro que, embora seja digno de apresentação, acaba banalizado pela superexposição. Em seguida, a pretensa nudez da informação quando, já no final da montagem, o texto deixa de se referir à visão de Pedro II e passa a dar um resumo, no melhor estilo “o que você deve lembrar para se dar bem na Fuvest”, sobre como foi a proclamação da república no Brasil. A opção pelo escândalo da nudez e da neutralidade deixa o público um tanto fatigado, sobretudo, aquele público acostumado ao silêncio das bibliotecas e ao ruído das traças. Mas, se da companhia das traças o historiador decide se aproximar dos atores, tal como eles, generosamente, o fizeram, verá quão boas foram algumas das principais questões ali suscitadas. A começar pelo começo, quando a vagina que pariu um bebê de
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58 cm é colocada em discussão. De modo implícito, estão ali colocados alguns dramas das tramas históricas: Quais os limites da fidelidade do historiador às fontes? De que maneira se confere legitimidade e credibilidade ao historiador, “seus informantes” e sua narrativa? Deve-se levar em conta que, em tempo de prazos exíguos, não são todos os iniciantes em pesquisa histórica que se dedicam a refletir sobre essas questões, daí uma das vantagens da peça. Segue, então, a suposta tragédia íntima de Pedro II, sua educação é comparada a uma receita, sem “Biotônico”, para fazer o cérebro do menino crescer. A rotina do pequeno Pedro parece tortuosa, não há prazeres individuais, o que, num texto acadêmico poderia ser chamado de anacronismo, mas, para os Les Commediens Tropicales e Sofia Coppola é plenamente aceito, sobretudo, porque confere graça e atualidade à farsa, ampliando o número de interlocutores dessa estória. Uma vez no trono, impera o tédio de um garoto sem vida pessoal. A possibilidade de um casamento é tratada como sinal de mudança. Nesse momento, Pedro é um adolescente qualquer, exortando suas qualidades em frente ao espelho. Contudo, a falta de beleza da pretendente é vista como nova decepção. Neste ponto, vai uma provocação aos atores, ora, só as bonitas são gostosas? Ressentimentos à parte, o aparecimento da condessa Barral é divertidíssimo! Isto porque se explora não apenas o sentimento universal da paixão, com o comportamento embasbacado dos humanos diante do objeto do desejo, quanto porque a dança do acasalamento entre Pedro II e Barral é embalada pelo refrão “faz de conta que eu sou o primeiro”, numa alusão impagável aos adultérios de Pedro, o primeiro. A Guerra do Paraguai acaba com o clima romântico sustentado até então. As estatísticas desta querela e sua comparação com a Guerra do Golfo assustam aqueles leigos que costumavam dormir nas aulas de História, porque achavam a matéria chata e desconectada da vida hodierna. Neste sentido, uma das principais contribuições da peça é apresentar ao público uma história “viva” que, embora exposta de maneira conceitual, é acessível e, portanto, democratiza essa área de conhecimento. Ainda assim, ela desperta no historiador, acostumado às soluções verbais mais recorrentes da historiografia contemporânea, o desejo de incrementar o modo como compõe sua narrativa, já que ele observa a empatia com a qual o público compartilha os problemas de Pedro II. Em outras palavras, dá inveja da liberdade deles! Para finalizar, sem descrever a peça toda, resta contar o final, o que, para os historiadores, nunca é um motivo de desprazer, já que sabemos do final de todas nossas histórias, antes mesmo de começar a contá-las. A peça é encerrada com uma barricada de arquivos (seria o altar de Furet?), os atores convidam o público a contar sua história, aludem a um “causo” da vida de Pedro II, contado pela avó de algum deles que, questionado sobre a veracidade do fato, responde: “Não é mais o fundamento que se perpetua, e sim as transformações que valem como fundação e renovação dos fundamentos”. (FOUCAULT, Arqueologia do saber, 2005, p. 6) Hahaha! Não se costuma guardar o melhor para o final? Somos tão óbvios quanto todos.
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[upgrade] tica lemos Também não sou a mesma, podem estar certos disso. Ouvi falar de vocês pela primeira vez, lendo o convite para participar do projeto pelo email, pelo menos conscientemente, claro, acho que a Georgette já havia comentado, mas eu é que não havia registrado. Gostei do que li no projeto, gosto de história, estórias e gostei muito do nome de todo mundo que li ali, chiquinho, fernandão, ju... Fiquei prosa de ser convidada. Topei total, povo inteligente que chama gente tão legal. Fui ao primeiro encontro assim meio perdida, achando que era um encontro geral, mas na vera já era o primeiro dia? De aula do chiquinho, foi muito legal, fiquei meio sem jeito, mas a discussão sobre arte, linguagem e afinal o que é teatro, interpretação? Simples né? Ninguém quer mais nada? O que é linguagem, interpretação, teatro? Bom foi incrível e os atores maravilhosamente metidos, acreditando que vamos comprar pãozinho e sermos diferentes no dia-a-dia, logo o teatro também vai ser diferente, duchamp reinventou a roda no cotidiano, quem foi mesmo, aquele artista de umas bienais atrás, que numa entrevista e numa foto, me provou que o copo cheio de água era igual a um frondoso carvalho, o lance é que ele demorou 30 anos para aprender a fazer aquilo... metidos!? Sim somos metidos, sonhadores e ativistas, vamos pensar, movimentar e então seremos diferentes.!? É ou não é? Bom foi muito divertido, fiquei pensando nisso todo o próximo mês e meio até o dia da minha aula também... Pena que o chiquinho não tava. E ai surpresa, a velha nova surpresa sempre. Consciência Corporal? Dança? Tem certeza que vocês querem esse negócio. Sim senhores, saí bem diferente desse trabalho. Vocês me deram a oportunidade de repetir, de rever, de renegociar, de renovar o contrato com minhas escolhas. Consciência do volume do corpo no espaço, ocupar o espaço, o máximo de dimensões possíveis. Com o pensamento, com a carne, com o espírito, com a emoção, ocupar diferentes dimensões do espaço... Tempo/espaço, super cordas... Assim, respirar, sentir o osso com o pensamento e com o labirinto, com o espírito e a livre poesia de ser o que se quer ser, inclusive o próprio osso, com a ciência da percepção sensorial fina, entrar na mesma vibração, literalmente, da fáscia do osso e então respirar, sentir os ventos no escuro dos olhos fechados e então abrir os olhos, olhar e ver, ver as poltronas do teatro vazio, ser visto... Teatro? Vida? Comprar o pãozinho com uma atitude diferente e o teatro ser diferente me parece tão coerente. Bom talvez um coração tranqüilo ajude. Foi tão bom conhecer vocês, ver o ensaio da cena do liquidificador com o fernandão e depois ver vocês fazendo de novo, ver por onde haviam ido. Tempos e contratempos, direções... E então a gente deu aquela suadinha na camisa e corremos né? Vocês ficaram com dor nas coxas? Foi lindo de ver. A cena é tão bonita, divertida, informativa sim de uma visão... Interpretação íntegra. Bons atores. Talvez um coração inquieto e tranqüilo nos ajude. Puta beijo.
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mais.divagações.com.café Aquela coisa que a gente tava discutindo do processo, que a gente vive uma opressão do passado. E o teatro mais do que todas as artes, me parece. É um absurdo, aquilo que o Villar falou: “a arte-performance acontecendo e o teatro virando as costas 'não sei nada que está acontecendo ali'”. E continua nessa bichisse, essa bichisse de fazer Stanislavsky. Eu, talvez, há dois ou três anos defenderia essa idéia: o ator tem que passar por tudo... Não! Não tem que passar! Não tem! Não precisa. Aquele artigo da Pupo lá. Pedagogia do pós-dramático. Foda-se se é pós-dramático. Eu chamaria de pedagogia do contemporâneo. Vamos parar com essa bichisse, “enquanto não aprender a técnica tal não pode fazer isso”. Pode filho! Porque a técnica é para agora. Também não acho que “agora vamos fazer tudo com tecnologia!” Não é assim... Pode fazer teatro sem nada de tecnologia. Não é modismo. Se pensarmos em modismos, perto do que já vimos em vídeos, espetáculos... Se pegar o La Fura dels Baus, por exemplo... É ridículo o que a gente faz. A questão não é o uso da tecnologia, é a possibilidade da abstração. Não suporto mais ouvir esta expressão: “porque o ator é narrador...” O ator é ator filha! Essa coisa de narrar... O teatro tem que contar uma história. Não tem que contar nada! Quer contar conta, mas não tem quê. Essa coisa que também quero parar de ficar falando em releases e programas, etc e tal; ficar reforçando que o ATOR é CRIADOR. Chegamos ao cúmulo da alienação, de este ator não ser considerado um artista, ser considerado simplesmente um executor... Não tem mais sequência, não tem mais... O Glauber tentou... O Glauber faz isso. O próprio Rogério Sganzerla faz muito disso. Ele filma meia hora e faz um filme de uma hora. Que é este fulano? Não conheço. Ah, Bandido da Luz Vermelha. Puta, mas Copacabana Mon Amour é explosão, maior de todas as explosões, e o Signo do Caos. Não é todo mundo que vai fazer e... quer contar uma história bem contada, conta... Agora, o que não dá é essa história de que teatro só tem um jeito, e em São Paulo parece que teatro só tem um jeito, o texto e a idéia passada serem muito forte. Muito claras. Acho que falta o rompimento daquilo que estávamos falando, não termos mais este ponto de partida, este pretexto. Não é só a questão do ponto de partida, é a maneira de fruir mesmo. Arte engajada o que é? Chegar lá e ver um quadro e no quadro um jornalzinho que me remeta ao dia de hoje, porque tem uma colagenzinha que me dá um... Não precisa. Neste ponto Brecht é um mal ao teatro. Gera uma consciência política que é ótima, mas ao mesmo tempo faz o cara ficar preso a essa tal consciência política. Mas por exemplo: lendo o Brecht hoje, eu já leio querendo quebrar tudo. Não tem uma dramaturgia que eu pegue hoje e fale: puta! Olha, quero montar uma cena legalzinha com isso aqui... Quero morrer com rubrica.
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Tenho um grande problema hoje, já é de um tempo essa minha crise com a pedagogia. Se quiser a gente pode até parar de gravar aqui, encerrar, mas pra mim este é um problema homérico. Vamos terminar, acho que um ponto legal aí que você pegou a questão da fruição, que falamos da outra vez: esse diferente modo de fruir, da platéia e de quem faz. De quem faz e de quem assiste. Precisamos fazer mais o 2º d.pedro 2º para ter muito claro o jeito que estou fruindo o espetáculo. Tem hora que é a cena é muito clara, os nossos estados; e tem hora que estou cumprindo tarefa. Tenho que vim pra cá pegar isso aqui, voltar aqui, fazer aqui... Olha o quanto que falamos da peça aqui hoje. Parece que esperamos ela acontecer com o público pra ir experimentando mais... Essa é um dos motivos porque falei que um processo longo é chato. Cada vez mais gosto de cada vez menos ensaiar. Meu corpo cada vez mais: “ah, vai direto pra coisa, não dá pra ser menos?” Porque tem a segunda, e depois de amanhã é a segunda de novo. Mas se tiver lá a atitude da descoberta, desta primeira ação que você fez, beleza! É o que falei para os meus alunos: escolhe uma opção, mas faz com as 10 a que você escolher. Mas faz! E aí é a mudança, peça chave. Não adianta eu vir aqui escolher para você falar. Não tenho a menor vontade de estabelecer algo e ficar repetindo... Me parece que a criação espontânea é muito mais interessante pelo estado que você gerou, e isso gera outro, gera outro... Não acho que tudo tem que ser assim, mas o meu ponto hoje... Mas isso precisa de uma estradinha, né? Ou de uma sensibilidade bem jóia. Porque acho que este estado com insegurança é pecar pela fragilidade. Hoje me sinto preparada pra isso, tem uma questão aí de maturidade e segurança no ofício. A pessoa tem que ser minimamente bem resolvida, acho. Não pode ter melindres, não pode se preocupar demais com o que está fazendo. Talvez com o meu histórico da dança, de sempre ter mestres muito bravos, sabe aquele medo de exposição? Fragiliza demais... Por isso que falo da questão da pedagogia... A gente também importa tudo. Quase tudo que temos de artes cênicas é importado. É uma técnica brechtiana de ator, uma técnica stanislavskiana de ator, uma técnica de balé russo para dançar, nada é fruto... E você fica sempre com aquele grande exemplo. Que não é a expressão do meu tempo, do meu agora. Tinha uns doze anos, assistindo Esmeralda no vídeo de casa. Eu era muito apaixonada, estava muito obcecada pela dança, e aí quando vi aquela bailarina russa fazendo aqueles fouettés, fiquei brava e falei: “Jamais vou conseguir fazer isso!” A minha mãe me deu um esporro: “Para com isso! Assiste e se diverte e depois vai fazer do sei jeito!” Agora me lembro disso... Volto até o nosso começo é acho que é isso que nos une mesmo. Uma anti-pedagogia, um revoltar-se com aquilo que deveria ser livre e não é: a arte. Não dá cara. E acho que os grupos que citamos romperam com isso. Pina Bausch dançou com Antony Tudor, foi lá no Metropolitan Opera de Nova York, mas depois ela construiu um novo jeito de fazer... Lembrei de vocês hoje, olha as boas influências. As meninas foram me apresentar as cenas que fizeram na outra aula, e aí uma das meninas faltou, e era em dupla, e uma delas falou: “Mas a Keila faltou”. Eu disse: “faz sozinha! Faz de conta que ela tá aí”... E ela fez!
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expediente caderno.suporte Realização Cia. Les Commediens Tropicales Programa Municipal de Fomento ao Teatro Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo Projeto gráfico, edição e diagramação Carlos Canhameiro Imagens Carlos Canhameiro e Cia. LCT Conteúdo Os textos que levam assinatura são responsabilidade de seus autores, demais textos são da Cia Les Commediens Tropicales Impressão MHG Gráfica e Editora Tiragem 500 cópias
2º d.pedro 2º Provocador Cênico Fernando Villar Texto Carlos Canhameiro Atores
[UPGRADE] Francisco Medeiros Georgette Fadel Tica Lemos [DOWNLOAD] Isabel Lustosa Rodrigo Touso Fernando Nunes José Antônio Pasta [TUTORIAL] atores espetáculo Somos de feitos Denise Cruz Giscard Luccas Kika Bruno Leandro Ivo Lígia Helena Priscila Cunha
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Carlos Canhameiro Daniel Gonzalez Jonas Golfeto Michele Navarro Trilha e Música ao vivo Allen Ferraudo Figurinista Bia Szvat Cenógrafo José Valdir Iluminação Daniel Gonzalez Produtor Carlos Canhameiro
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