Revista QQD - Quatro Quatro Dois - Ed. 03

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PALAVRA DO EDITOR O que é ciência? Segundo alguns livros didáticos, “ciência” é um conjunto de conhecimentos organizados e reunidos que nos ajudam (o ser humano) a ter melhor compreensão da vida. A história, a geografia (política), a sociologia e a filosofia são nada mais que tentáculos desse conjunto. Os conhecimentos dessas áreas ajudam a entender o que é o ser humano, sua história, sua organização e sua maneira de pensar. São conhecidas como “ciências humanas” Não seria um absurdo colocar o futebol como um dos ramos da ciência. É fato que não é simplesmente “22 homens correndo atras de uma bola”. Não, o futebol é muito mais que isso. O futebol mexe com cada um de nossos sentimentos. Alegria, amor, tristeza, raiva, decepção, surpresa. E mais um monte que nem conseguimos definir. E é uma das únicas coisas que faz isso. O futebol gera um sentimento de patriotismo também. É um esporte político, o que acontece em campo, às vezes, não é nem um décimo do que acontece fora dele. É um esporte extremamente humanizado, baseado inteiramente nas relações das pessoas. Só lembrar da célebre frase: “estatística não ganha jogo”. E o melhor: o futebol faz a compreensão e o autoconhecimento humano ficar mais fácil. A reflexão após uma partida extremamente emocionante (digamos, aquele 4×1 que o Atlético Mineiro meteu no Corinthians ou no Flamengo) não é sobre o jogo por si só. A memória dos sentimentos sentidos no jogo é mais marcante do que ele mesmo. E a reflexão sobre os sentimentos e pensamentos que você teve durante a partida é conhecer o que tens dentro de ti. Tentarei dissecar o futebol com todas as minhas forças. Porém, como toda ciência humana, o futebol nunca tem fim. Portanto, é preciso um ponto de partida. E esse ponto é a compreensão do futebol não como esporte, mas sim como uma ciência. Mas vamos lá. Isso é só o começo. O jogo acabou de começar. Lucas Vasconcelos

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EXPEDIENTE Diretor-geral do QQD Henrique Chaparro Editor-chefe Yuri Casari Redatores Eduardo Caspary Gabriel Belo Gustavo Forapani Jonathas Cotrim Lucas Vasconcelos William Pereira Diagramador Yuri Casari Acesse: www.quatroquatrodois.com QQD | Quatro Quatro Dois Maio | 2015 Todos os direitos reservados


SUMÁRIO

Certezas do futebol................................6 Copa do Nordeste: um fio de esperança.....7 O reinado de Hazard..............................9 Craque do mês....................................15 Na memória........................................16 Entrevista: Rovérsio..............................20 Geração Playstation.............................23 Futebol ousado....................................26 A solução fala espanhol.........................27 A palavra é sua....................................30


CERTEZAS do FUTEBOL

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Aquilo que você sempre pensou da maneira que nunca viu Sempre que você quiser ver algo sobre futebol e só tiver Sportv, o canal estará passando ou Zona de Impacto, ou um Sportv Repórter sobre algum caso isolado do atletismo infantil asiático ou um jogo do Campeonato Francês. Como nenhum desses três se encaixa na categoria “sobre futebol”, você vai entrar no computador e ver vídeos com duração de 8 minutos que contém dribles, gols, defesas e canetas do Riquelme.

Em 11% das vezes que seu time jogar contra o Vasco, com o Eurico como presidente, e perder, você vai reconhecer que o Vasco jogou melhor e aceitar a derrota. Em 89% das vezes você vai colocar a culpa na arbitragem e na maneira como o juiz conduziu o jogo e vai ignorar o empenho, o desempenho técnico e tático do time, a torcida cruzmaltina que comparece em peso e apoia o tempo todo, as jogadas ensaiadas e a motivação dos jogadores do Vasco. Em 100% das vezes você estará certo.

Magno Alves tem 39 anos há 7 anos e em toda temporada ele faz 43 gols, é sondado pelo Fluminense em janeiro, renova com o Ceará em fevereiro, é artilheiro do estadual, Fica no Top 3 da Chuteira de Ouro da Placar até junho, ganha destaque em algum jornal pela sua vitalidade e seus gols, é personagem de alguma matéria mostrando que ainda está em forma, é personagem de alguma outra matéria relembrando sua trajetória e seus gols, O Ceará não sobe, é vice artilheiro da série B, termina o ano como top 5 da Chuteira de Ouro da Placar e quando chega janeiro sai uma matéria com a manchete: “Magnata de volta ao Flu?”

A primeira vez de Ed Motta em estádio de futebol foi no jogo Bélgica 1x0 Rússia no “New Maracanan”, válido pela Copa de 2014. No jogo, o cantor comprou 7 pipocas de 10 reais, elogiou a política de lugar marcado e o silêncio estabelecido para apreciar um bom espetáculo, gostou do futebol mostrado pela “Incrível geração belga” (especialmente pelo habilidoso meia Hazard) e, mesmo assim, ao final do jogo decidiu nunca mais ir a estádio ver futebol, a não ser que seja jogo do “meu Chelsea”. Questionado sobre o porquê de nunca ter ido ver jogos antes, Ed respondeu: “pelo fato de ter muitos “pedreiros sem camisa gritando nome de time”. 6


Um fio de esperança por Gabriel Belo

Com novas arenas, Copa do Nordeste se consolida de vez; Comparativo de público com os estaduais é assustador

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m um tempo de caos no futebol brasileiro, onde observamos diariamente diferentes tipos de descaso na relação clube-torcedor, às vezes é bom encontrar motivo para sorrir um pouco. Nessa quarta-feira (29), a Copa do Nordeste chegou ao seu fim e sagrou o Ceará, vice-campeão do ano anterior, como grande vencedor. Foi a terceira edição desde que a competição “voltou”. E, com o passar dos anos, ela só cresce. O sucesso de público, aliado a novas arenas, atraiu diversos patrocinadores. Tendo média de público maior do que qualquer estadual, pode ser considerada a competição nacional mais importante do primeiro semestre. Até a final, a média de público foi de 7.727 pagantes por partida, considerando que, na primeira fase, muitas equipes jogam em estádios de pequeno porte. Se contarmos somente as eliminatórias, os números sur-

preendem. São cerca de 22.000 pessoas por jogo. De acordo com dados do blog “O Povo”, desde 1983 o Brasileirão não tem média superior a essa. Na decisão, entre Ceará e Bahia no Castelão, o público foi de aproximadamente 63 mil pessoas, superando os jogos decisivos do carioca no Maracanã e as principais partidas da Libertadores. Juntando as duas partidas da final, pouco mais de 100 pessoas estiveram em Fonte Nova e Castelão para acompanhar os jogos. E a receita de tudo isso é simples. Mesmo com o crescimento visível, o torneio se manteve “povão”. Preços acessíveis nos ingressos garantem, além de lotação e excelente lucro para os clubes, uma atmosfera impressionante. Sabe aquele jogador que vibra com a torcida quando afasta a bola para a linha lateral com um carrinho? Essa figura está tão rara no futebol hoje em dia que, quando vemos uma cena desse caráter na Copa do 7


Nordeste, chega a arrepiar, emocionar. Isso se alia a muito carisma. É comum vermos o “Tour da Taça” em competições como a Copa do Mundo, por exemplo. Mas essa visão já é passada para o “Nordestão”. A taça que premia o campeão circulou por mais de cinco mil quilômetros, alcançando dez cidades e cinco estados, aproximando o público e criando ansiedade para o início das partidas. O Esporte Interativo, que transmite e promove a competição, teve liderança entre os canais pagos de esporte durante a fase eliminatória da Copa do Nordeste. A competição não veio apenas para divertir, mas sim para ensinar. Nos estaduais de Rio, São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas, os principais do país, a média de público não foi superior a oito mil pessoas (sendo bonzinho,

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pois o único que bateu na trave para chegar nesse número foi o Paulistão). E há sempre um motivo. No Rio, a Federação deita e rola nos clubes. Em São Paulo, os ingressos têm preço abusivo e o número de datas é absurdo. Em Minas e RS, a situações descritas acima se repetem. Adicionando isso ao pouco interesse do público, temos um fracasso coletivo. Necessitamos de Copa do Nordeste, necessitamos de uma atmosfera que arrepie. A torcida nordestina está de parabéns por comprar a idéia do torneio e proporcionar lindas festas. Dá um fio de esperança. De que as coisas podem voltar a ser como eram antes. O principal campeão da “Nordestão” nesses últimos anos não foi Campinense, Sport nem Ceará. Mas sim todos nós, que ganhamos uma pitada de emoção na nossa programação esportiva.


O reinado de Hazard por Gustavo Forapani

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oje, o Chelsea confirmou a conquista do seu quinto campeonato nacional, – terceiro sob o comando de José Mourinho -, e confirmou sua supremacia sobre os demais adversários na forte Premier League, a equipe iniciou o campeonato de maneira avassaladora e com pouquíssimos momentos instáveis manteve-se no topo durante toda a competição, muitas figuras podem ser destacadas na conquista do Chelsea, como o treinador José Mourinho, a sensacional dupla de goleiros composta por Courtois e Cech, os gols de Diego Costa, as assistências de Fábregas, e também a excelente temporada de Hazard, o belga foi o principal atleta do time londrino, e no fim de temporada, – principalmente -, com as lesões sofridas por seus companheiros manteve o Chelsea na ponta, rumo à taça. Revelado no Lille, o meia despontou no cenário mundial levando a equipe ao título francês, diversos clubes se interessaram pelo mesmo, mas seu destino foi mesmo Londres,

nos blues há três temporadas o meia já havia demonstrado habilidade singular, venceu alguns títulos, mas faltava algo muito grande para coroar seu trabalho, e isso veio hoje com a conquista da Premier League, considerado o campeonato nacional mais forte do mundo, o Chelsea não tomou conhecimento e se manteve bem à frente dos adversários, rivais tradicionais como Manchester United, Liverpool e Arsenal não chegaram perto da equipe que alcançou o título com três rodadas de antecedência. O meia brilhou no jogo decisivo contra o Crystal Palace, em jogo complicado a equipe mandante só foi marcar seu único tento ao fim da primeira etapa, pênalti para o Chelsea, Hazard na marca da cal para a cobrança, o meia bateu no canto esquerdo, – não muito bem -, e o goleiro defendeu, mas no rebote lá estava o meia para garantir a vitória azul em um Stamford Bridge lotado para assistir a conquista, foi o gol de número quatorze do meia 9


na competição, vice-artilheiro da equipe, atrás apenas de Diego Costa com dezenove. Ao fim da partida, Hazard foi eleito o melhor jogador da competição, prêmio esse que há duas temporadas não parava nas mãos de um atleta campeão, Bale e Suárez ficaram com os dois últimos prêmios. Tudo azul para Éden Hazard na Premier League, campeão e melhor jogador, brilhou com gols, assistências e seus conhecidos dribles, – é um dos jogadores com mais dribles certos na Europa -, agora o objetivo é a conquista européia na próxima temporada, se a equipe foi disparada a melhor dentro da Inglaterra, na Champions a decepção foi enorme, eliminada em casa pelo PSG, a equipe decepcionou logo nas oitavas-de-final da competição, jogando com um a mais e favorito, o Chelsea não conseguiu bater os franceses e viu seu sonho do segundo título da Champions morrer cedo, Hazard que já foi importante na conquista de uma Liga Europa há duas temporadas precisará mostrar o mesmo desempenho agora na UEFA Champions League, além disso o meia se preparará fortemente para a disputa do Euro-2016 pela seleção belga.

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Essa temporada foi fundamental para Hazard, mais maduro após duas temporadas pelo Chelsea e uma Copa do Mundo disputada pela seleção belga, o meia conseguiu assumir o protagonismo que sempre esperaram dele e liderou um forte Chelsea, pautado sempre no forte sistema marcador de Mourinho, pragmático, – para alguns até chato -, mas com jogadores capazes de definir o jogo em poucas jogadas, e Hazard define bem isso, no jogo morno que Mourinho tenta fazer, Hazard é a peça para esquentar o jogo, com dribles e tabelas é o fator de desequilíbrio. Se o sonho de Hazard é um dia ser melhor do mundo, alcançar Messi e Cristiano, o meia ainda precisa correr muito e alcançar muitos feitos, mas um passo importantíssimo já foi dado com a conquista da Premier League, seu nome já está escrito na história do Chelsea, o objetivo agora é escreve-lo na Champions e na história das bolas de ouro, se isso será possível só se descobrirá no futuro, mas uma coisa é certa e a torcida do Chelsea já sabe bem, na Terra da Rainha quem tem Hazard é Rei.


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Na Memória por Eduardo Caspary

A barriga santa de Renato O

racinzento dia 25 de junho de 1995 guardou nos céus do Rio de Janeiro, em meio às nuvens escuras e gotas de chuva, o desfecho mais emblemático da história dos Fla-Flus. Sim, não poderia ter emergido de outro lugar que não o berço das estrelas o gol de barriga que fez o Fluminense campeão carioca. Perto de completar 20 anos, o clássico decidido pelo umbigo de Renato Gaúcho até hoje ecoa pelas entranhas do Maracanã, que volta a receber as duas equipes neste final de semana no momento que o certame estadual 16

tenta afastar-se do marasmo por quem tanto nadou. Com mais de 120 mil pessoas catando espaço num pequeníssimo Maraca, Flamengo e Fluminense encontravam-se naquela tarde com motivos distintos para o mesmo objetivo. Do lado das Laranjeiras, sob a batuta e a prancheta do Papai Joel, que ainda não falava inglês, havia o consenso de que era chegada a hora de estancar o jejum de nove anos sem mandar no bairro. Pelas bandas da Gávea, o centenário do clube não poderia passar sem a


conquista do estadual, especialmente quando se tinha Luxa na casamata, Branco e Sávio em campo e Romário na pequena área. O primeiro tempo poderia muito bem ter sido escrito pelo mais tricolor dos roteiristas ou cineastas. Tudo dava certo ao Fluminense. Por volta dos 30 minutos de jogo, o próprio Renato Gaúcho desarmou o flamenguista Willian no meio campo fazendo com que a bola se oferecesse timidamente ao sempre lúcido Aílton. Este, ao esticar na esquerda e dar vida à tabela entre Leonardo e Rogerinho, possibilitou ao mesmo Renato – pai da jogada – empurrar para as redes de Roger e ir ao solo como um saco de batatas. Antes do carequinha Leo Feldman trilar o apito para dar fim à primeira etapa, o volante tricolor Márcio Costa bateu de muito longe e fez com que a redonda desencontrasse o centro das mãos ensaboadas de Roger para se oferecer a Leonardo ampliar. O 2×0 fazia justiça ao melhor time e tirava a emoção da final. Ou não. O início do período complementar de partida não dava indícios de que muita coisa mudaria. Lento, previsível e molhado, o Flamengo, por mais que tivesse o controle do jogo, não se aproximava do gol de Wellerson. Era hora do baixinho trabalhar. Aos 26, em

um lance tão feio quanto o dia lá fora, a bola marcou encontro com Romário depois de bater em inúmeras canelas: ali ele não perderia nem se o lance fosse daqui a 15 minutos. Descontava o Flamengo e, agora sim, punha fogo no jogo. Sem deixar que o ímpeto rubro-negro esmorecesse, Fabinho, cinco minutos depois, tratou de igualar os números e devolver momentaneamente a taça ao Fla, em um lindo gol ao limpar com a perna direita e fuzilar com a esquerda. Correndo contra o relógio, que teimava em correr, o Flu passou a ser todo ataque na reta final de jogo. Precisava de um gol para dar fim ao jejum incômodo de quase uma década sem vencer um Carioca. Precisava de um gol, nem que fosse de barriga. Então Ailton recebeu na direita. Os ponteiros no punho de Feldman indicavam 42 minutos e o 43 estava próximo. Ailton avançou a linha de fundo, cortou o marcador, cortou de novo e mandou um tiro de meta à meia altura para o meio da área. Numa bola que fatalmente correria para fora, Renato Gaúcho esticou-se para, de barriga, dar um leve desvio e empurrar para dentro. O título carioca de 1995 veio da barriga santa, como Renato costuma chamar.

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Entrevista

por Henrique Chaparro

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NO CAMINHO

DO SOCCER Você já imaginou jogar ao lado de Raúl, ídolo do Real Madrid? Vestir a camisa que Beckenbauer e Pelé já vestiram? Um brasileiro está vivendo isso. Rovérsio Rodrigues de Barros é zagueiro e atua pelo New York Cosmos. Já passou por equipes como Santa Cruz, Gil Vicente, Paços de Ferreira, Osasuna, Real Bétis e Orduspor. O pernambucano, de 31 anos, falou sobre as experiências da sua carreira fora do Brasil, a adaptação ao Cosmos e o privilégio de atuar ao lado de Raúl. QuatroQuatroDois: Antes de jogar nos Estados Unidos, você passou por clubes de Portugal, Espanha e Turquia. Em qual desses quatro países a adaptação foi mais difícil? Rovérsio: Quando fui para Portugal, a minha primeira experiência fora do Brasil, foi muito bom. Consegui me adaptar rapidamente com a ajuda dos colegas e companheiros de clube. Quatro anos depois, fui para a Espanha. Mais uma vez, foi fácil a adaptação, gostei do estilo de jogo da La Liga. Alguns dos maiores jogadores do mundo jogam por lá. Depois, fui para a Turquia. Foi o país onde eu tive maior dificuldade. Acho que foi uma combinação de cultura, língua e outras coisas, que eram totalmente diferentes de Portugal e Espanha. Mas, no futebol, essas coisas acontecem, e eu não me arrependo do tempo que passei lá. Foram grandes experiências.

QQD: O que mudou na sua vida quando você deixou a Santa Cruz para ir jogar em Portugal? Rovérsio: O meu grande sonho era ser jogador de futebol. No Brasil, só joguei seis meses como profissional. Depois disso, tive a oportunidade de me transferir para Portugal e jogar no Gil Vicente. Eu não pensei duas vezes ao tomar a decisão, porque o meu sonho era continuar jogando. Tive a sorte de ter essa oportunidade tão cedo na minha carreira. O que mudou? Sinceramente, não sei. Faz 11 anos que saí do Brasil. Fui aprendendo e amadurecendo ao longo dos anos. Se algo mudou, foi a minha experiência. Foram 11 anos jogando em países diferentes. Fiquei muito feliz quando saí. Hoje, sou tão feliz quanto antes, se não mais. Consigo trabalhar no que eu realmente amo. QQD: Como foi a sua recepção no New York Cosmos? 19


Rovérsio: Foi maravilhoso. Nunca vi algo parecido. Os jogadores, os treinadores e os torcedores, todos me acolheram e me desejaram boa sorte. É como se fosse uma segunda família, me sinto em casa aqui.

QQD: Quem ou o que te inspirou a jogar futebol? Rovérsio: Até hoje, as crianças brasileiras aprendem a jogar futebol como aprendem a andar. Aprendi com meus familiares, e quando estudava e tinha tempo livre, jogava futeQQD: Como você se sente jogando no time bol o tempo todo. Era algo que eu realmente que Pelé, Beckenbauer e muitos outros fize- gostava, e eu tinha vários amigos que jogavam ram história? comigo sempre, seja na rua, nas praias ou nos Rovérsio: É realmente uma honra, e um dos campos. A cada jogo, minha paixão pelo esmotivos para eu ter vindo pra cá. O New York porte só aumentava. Se tornava mais desafiaCosmos é um clube tradicional não só nos Es- dor também. Chegou uma hora que eu pensei tados Unidos, mas no mundo. É um privilégio que tivesse que escolher entre os estudos e o jogar em um time que Pelé também jogou. futebol. Felizmente, consegui continuar estudando. Isso com certeza foi importante. QQD: Sua família o acompanha em todos os lugares em que você joga? Eles estão em Nova QQD: O que o futebol brasileiro tem a aprenYork com você? der com os americanos e europeus? Rovérsio: Minha esposa e meu filho, de três Rovérsio: Como eu disse, fiquei 11 anos fora anos, estão sempre comigo. Quando o jogo é do Brasil. Então, só podia acompanhar pela teem casa, eles vão ao estádio. Quando é fora, levisão. Entretanto, na Europa eu aprendi muieles assistem pela televisão. Estamos todos to. É um futebol mais rápido que o brasileiro, muito felizes de estar aqui. onde às vezes você só pode dar dois ou três toques na bola. Apesar disso, eu gosto desse

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ritmo de jogo. Nos Estados Unidos é diferente também. Mas o futebol é um esporte universal; se joga de maneiras diferentes em vários lugares do mundo. Nos EUA, há qualidade, e a qualidade está crescendo. Eu, que joguei em La Liga, posso afirmar isso. Os jogos aqui são muito intensos. A cada ano que passa, me sinto mais adaptado. Gosto muito de jogar aqui. QQD: Como é jogar na mesma equipe que Raul, que é ídolo no mundo inteiro? Como você se sente fazendo parte deste momento histórico de transição no futebol americano, que começa a se desenvolver em um ritmo acelerado para atrair a atenção do mundo? Rovérsio: É um privilégio. Eu vim aqui para jogar duro e melhorar a minha equipe e esta liga. A cada ano, fica um pouco maior, um pouco mais visada. Temos um monte de jogadores de renome mundial nesta equipe, como Marcos Senna e Raúl. Nos outros times, há jogadores de grande nome também. Então, para mim é um prazer e um privilégio treinar com esses caras e brincar com eles. Esta liga vive

um belo momento. O mundo está começando a falar do futebol deste país. QQD: Você acha que volta para o futebol brasileiro? Rovérsio: Eu o faço às vezes, quando eu assisto na TV os jogos. Eu gosto de ver os jogos. Mas já faz muito tempo que joguei aí, e minha experiência como profissional no Brasil era limitada. QQD: Como você viu a chegada de Léo Moura na mesma liga que você? Rovérsio: Eu acho que é ótimo ter o Léo na liga. Jogadores como ele, com a sua qualidade, fazem a liga tornar-se mais forte. É gratificante jogar contra jogadores como ele. O jogo contra o Strikers foi intenso e difícil. Temos de estar preparados para esses tipos de desafios, porque cada equipe no campeonato joga a vida contra nós. Somos o Cosmos, uma equipe com grande tradição nos EUA. Temos que treinar duro para estarmos sempre prontos.

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A preferência europeia pelos pequenos torcedores por William Pereira

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essi, Neymar, Iniesta, Xavi e Piqué”. Esta é a lista que o menino Guilherme Bizio faz ao ser questionado sobre quem são seus ídolos no futebol. Aos 10 anos, ele não dá indícios de que seguirá os passos do pai. Corintiano fanático, Gumercindo Bizio Junior, não se diz preocupado com a situação, mas se sente incomodado por ver o filho, mesmo tão jovem, mostrar desinteresse pelo clube alvinegro. “O chamo para vir assistir ao jogo no domingo a tarde comigo, e o que ele me responde é que não vai porque o Corinthians é muito fraco perto do time dele, que é o Bar-

celona”, diz. “Diz que odeia. Não tem vontade nenhuma de ver as partidas”. O provável amor pelo Barcelona, equipe espanhola de futebol, é tanto, que Guilherme pediu sua festa de aniversário com enfeites do time catalão. Os pais, até tentaram fazer o gosto do menino, mas ficaram devendo apenas o escudo estampado no bolo. “Já comprei coisas do Corinthians, mas ele não usa. Só me pede coisas do Barça. Mas, não me importo. Irritado eu ficaria se escolhesse torcer pelo Palmeiras”, completa. Assim como Guilherme, muitas outras crianças de 8 a 13 anos demonstram se inte23


ressar por culturas europeias. Justamente no mo time que pessoas da família. período em que a paixão por um time começa “A escolha decorre da identificação com as a aflorar, segundo psicólogos. pessoas significativas. Os pequenos, principalmente, até podem torcer para mais de um COMÉRCIO time, para agradar a mãe e outro para agradar o pai, mas somente para agradá-los”, aponta. No mundo futebolístico, garotos de classe média para cima, que antes desfilavam WE ARE LITTLE GOONERS por escolinhas de futebol e até pelas ruas, hoje se rendem ao charme dos clubes euro- E se depender de Matheus Vianna, prepeus. Em uma das lojas de artigos esportivos sidente da Arsenal Brasil, torcida brasileira do de São João da Boa Vista, interior de São Paulo, time europeu, a afirmação da psicóloga será a cada dez camisas de times infantis vendidas, ainda mais reforçada. oito são de clubes da Europa. “É só o que eles Pai das gêmeas Maitê e Clara Cascaes Banquerem”, afirma a vendedora. deira Vianna, certamente ele não se importaDe acordo com um levantamento publicado rá se as filhas idolatrarem Thierry Henry no pela revista Placar, a Centauro, maior loja de futuro. Pelo contrário, Matheus já faz o “dever departamento esportivo da América Latina, de casa” desde cedo. “Eu canto as músicas fez um ranking das camisas infantis mais ven- do Arsenal para elas dormirem”, afirma. “Vou didas entre janeiro e setembro de 2014 em apresentar o time para elas. Estou trabalhando suas 186 lojas. Não só a do Barcelona é a mais para isso. Mas se no futuro elas não gostarem vendida, com 21% do total das vendas, como de futebol, paciência”, conta o presidente da seis das dez “campeãs” são de times da Euro- AB, que ao lado da esposa, desde a gravidez, pa. já compravam artigos dos Gunners para as Em um ano, a camisa do Barcelona teve pequenas. um crescimento de vendas de 93% em relação Questionado se tal atitude é vista com maus ao ano passado. A do Palmeiras, a mais vendi- olhos por parte da família, Matheus é firme na da entre os brasileiros subiu apenas 22%. resposta. “Se eles são contra, nunca tiveram a Psicóloga da área infantil, Mariana Tavares diz ousadia de me falar”, brinca. que é comum crianças torcerem para o mes-

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O futebol ousado respira por aparelhos por Henrique Chaparro

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ribles humilhantes, arrancadas, golaços históricos… Isso está cada vez mais difícil de se ver. O futebol ousado está perdendo espaço no novo mundo da bola. Se antes aplaudíamos Ronaldinho driblando seis defensores em sequência, hoje aplaudimos os gols construídos por jogadas coletivas. Se antes aplaudíamos as humilhantes canetas de Ronaldo, um chapéu de Neymar hoje chega a ser considerado ofensivo e desnecessário. Seria o fim da arte do improviso? Talvez sim. A imprevisibilidade e a mística estão sendo deixadas de lado. Hoje, é essencial ter um sistema tático bem definido e jogadas previamente ensaiadas. Não que isso seja ruim, mas o futebol parece robótico. Deixa o jogador programado, acaba bloqueando a criatividade do atleta. O futebol das decisões em segundos é cada vez mais raro. Tudo parece ter que ser programado, como uma peça teatral. Podemos tomar como exemplo os melhores do mundo Cristiano Ronaldo e Lionel Messi. Não é preciso um estudo elaborado para sabermos que, de 10 gols do argentino, 7 são de cavadinha com lançamento de Iniesta, driblando o goleiro ou chute colocado a meia altura. De 10 gols do gajo, 7 são chutes de fora da área ou pênaltis. De forma alguma

estou dizendo que os dois são jogadores ruins por isso. A gente sabe que os dois já marcaram seu nome na história. Mas é chato quando o futebol se torna previsível. Leitor, lembra aquele tempo em que o Ronaldinho reinava? Todo gol era de um jeito diferente. Arrancada desde o meio de campo, bicicleta, chute no ângulo, falta perfeita… Era algo imprevisível. E todo jogo era um gol novo. Modéstia à parte, a gente sabe que só quem faz isso são os sul-americanos, sobretudo os brasileiros. Ronaldinho, Rivaldo, Romário, Ronaldo, Kaká… Nem estamos falando de muito tempo atrás. Hoje, só quem chega perto dessa improvisação é Neymar (e mais nos tempos de Santos, quando o jogador não era refém de um sistema tático). Claro, isso vai muito além da nacionalidade do jogador. Vem desde a base. Os esquemas táticos estão aí pra engrandecer e melhorar o futebol, a gente sabe. Mas as equipes não precisam ser reféns do sistema. Jogador habilidoso serve pra furar bloqueios defensivos, rasgar defesas. E se a tática for engolida, quem salva? A grande sacada é aliar o futebol sul-americano ao europeu. O improviso à tática, a raça ao padrão objetivo… O que não se pode fazer é proibir um jogador de ousar. O show tem que continuar.


A solução fala espanhol por Jonathas Cotrim

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em boas opções no mercado nacional, os clubes brasileiros que recorreram ao mercado sul-americano começam a colher os frutos de boas contratações feitas no começo do ano. O que eram apenas apostas começam a despontar como ótimos jogadores, que tem de tudo para trazer títulos para seus clubes. Vamos conferir quem resolveu investir no mercado latino e agora está sorrindo a toa: LUCAS PRATTO Após conquistar o título da Copa do Brasil, o Galo Mineiro perdeu sua principal peça durante a janela de transferência. Fechado com o futebol chinês, Diego Tardelli deixou um enorme buraco no ataque alvinegro. Para compensar, o Atlético trouxe Luccas Pratto do Vélez Sarsfield. E o argentino já começa a cair nos braços da torcida atleticana, principalmente após os gols no clássico contra o Cruzeiro, que eliminaram raposa da final do

Campeonato Mineiro. Com boa presença de área e com boa movimentação, o atacante está entrando em sincronia com o meio-campo Guilherme e deve marcar muitos gols com a camisa alvinegra. O Galo trouxe também o colombiano Cárdenas, mas esse, por enquanto ainda não caiu na graça da torcida e precisa ainda mostrar futebol para ganhar espaço no time. DE ARRASCAETA Após passar pelo mesmo problema do rival, a raposa perdeu muitos jogadores importantes para esta temporada. E para substituir o destaque do Brasileirão 2014, Everton Ribeiro, o Cruzeiro resolveu apostar em De Arrascaeta. O meia tem habilidade, sabe criar boas oportunidades e tem qualidade no passe. Precisa ainda amadurecer para firmar de vez. Mas já deixou sua marca no primeiro jogo da semi-final do Mineiro: O Uruguaio aplicou uma bela caneta em Josué e fechou o lance


com um golaço em cima do Atlético Mineiro. Com amadurecimento e melhor adaptação ao futebol brasileiro, e também com melhoria da equipe cruzeirense, Arrascaeta tem de tudo para ser um grande jogador no futebol brasileiro.

companheiros são-paulinos. Mas nada que o tempo não resolva. Se tiver a chance e com paciência, Centurión é mais uma aposta que pode vingar no futebol brasileiros. AGUIRRE

CENTURIÓN

Reforço para o banco, o Internacional decidiu apostar em um treinador estrangeiro. Um dos poucos que não ganhou tantas E até o momento, Aguirre parece ter sido uma oportunidades, foi o meia Centurión, contrata- boa aposta. Ainda em fase de construção do do pelo São Paulo junto ao Racing, da Argen- time, o uruguaio já mostra que vai criar um cotina. O jogador argentino, no entanto, enfrenta lorado forte e aguerrido. Aproveitando o bom um concorrência díficil. Para se firmar no São futebol de Nilmar, Jorge Henrique, D’AlesPaulo, o meia deve desbancar Paulo Henrique sandro e do amuleto Valdívia, além do jovem Ganso. Mas no que depender de Centurión, a Rodrigo Dourado, o Inter fez uma campanha disputa será acirrada. Nas vezes em que en- tranquila e regular na primeira fase da Libertrou em campo, o jogador mostrou habilidade tadores. Aguirre vem pra provar que o mercacom a bola, bom domínio e passe e que sabe do de técnicos no Brasil está em baixa e que chutar. Além da concorrência, o argentino já investir em treinadores estrangeiros pode dar disse da dificuldade de entrosamento com os certo. ARMERO De última hora, mais um reforço sul-americano que chega ao Brasil. O colombiano Armero vem do Milan para jogar no Rubro-negro carioca. Ainda não estreou, o jogador só deve começar no campeonato brasileiro, daqui 15 dias. Mas o lateral chega para assumir a camisa 2, deixada por Léo Moura, que saiu do Flamego após um década no Flamengo. Apesar da responsabilidade, a expectativa é que Armero consiga apresentar o bom futebol que o levou a seleção colombiana. É notável que a maioria das contrações de jogadores sul-americanos sejam em grande parte de jogadores ofensivos. É onde o Brasil mais está carente. Então, Uruguaios, Argentinos Colombianos e até Peruanos (o melhor estrangeiro no momento é Paolo Guerreiro) vão se mostrando ótimas alternativas, ou melhor, soluções para trazer qualidade ao futebol brasileiro nesta temporada.


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A palavra é sua

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tpreocupação com táticas é cada vez maior. Muitos procuram numerar com quatro algarismos sistemas de jogos volúteis, usam a tecnologia para captar distância percorridas, zona ocupada durante o jogo e tantos outros elementos oblíquos. Se empurra uma ideia de que o melhor ‘time’ sempre ganhará os jogos, aquele que aparenta se estabelecer melhor em campo. Sempre foi assim, sempre se teve resistência com aqueles que prendem a bola por mais de dois segundos quando estão em direção ao gol, ao passe totalmente arriscado onde a bola não vai para o jogador mais próximo. Ao citarmos o incrível Barcelona de Guardiola, muito se diz sobre o jogo coletivo, mas nunca foi dito que são as individualidades 30

por Israel de Oliveira

que trouxeram a perfeição. O primeiro toque perfeito de Daniel Alves, a solidez de Sergio Busquets, a habilidade de Andés Iniesta, o controle de Xavi, e Lionel Messi, a essência do talento. Na primeira partida da semi-final, cresceu novamente, no cenário favorável ao inimigo. O time de Pep Guardiola controlava o jogo, após um bom acerto defensivo no segundo tempo, e parecia chegar cada vez mais próximo do gol. Sem Robben e Ribery, as duas grandes individualidades do conjunto, faltava sutileza, habilidade para destroçar a defesa blaugrana. O ataque posicional só funciona com boas peças. No outro lado, um jogador que só precisava de uma bola, e assim foi. Se Luis Suárez estava impreciso, errando finalizações e de-


morando para soltar a bola, foi do pé daquele que sempre procurou criar que a finalização letal chegou. Uma breve passagem. O gol de Lionel Messi, ao deixar Jerome Boateng mais duro que uma tábua, e seu toque desmoralizador em cima do gigante Manuel Neuer, abrem o preceito defendido aqui: nada substitui a individualidade. É ela quem separa os bons dos grandes. Quando o autor é do nível de Messi, vira algo gigante, lendário. Pressionado por uma marcação numerosa, escapou com efetivida-

de, ofereceu passes ofegantes na vertical, mas precisou ele mesmo dar o toque letal para toda sua qualidade técnica desfilada. Muito se fala de falso 9, ‘playmaker’, goleiro que participe do jogo, mas o elemento mais importante do jogo sempre será o individualista, aquele que arruma truques inesperados, desmorona sistemas com um toque, que fuja das jogadas ensaiadas e elaboradas pelo professor. Todos na rua rabiscam os pés para assinar um gol como o de Lionel Messi.

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