Revista QQD - Quatro Quatro Dois - Ed.01

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PALAVRA DO EDITOR F

ala, pessoal. Tudo certo?

Me chamo Henrique Chaparro. Sei que muitos de vocês não devem me conhecer, mas eu, junto com o Adrian Pavoni e mais um grupo de amigos, decidi criar esse site em maio de 2013. Entre idas e vindas e altos e baixos, o site completa dois anos em maio desse ano. É um número bem inexpressivo perto do que ainda teremos pela frente. Mas tudo que fizermos hoje será a base do amanhã. No final do ano passado, decidimos criar uma revista mensal do site. Na nossa visão, a publicação traria ainda mais seguidores ao site, além de divulgar a marca. E é isso que a gente quer: divulgar nosso trabalho. Mas no que consiste o nosso “pôjeto”? Em inovar. E seguimos mantendo esse ideal. Como é a primeira revista, eu gostaria de agradecer a cada um dos que contribuiram pro QQD crescer. Aos amigos que acompanham e opinam sobre o nosso trabalho. Aos que fecharam tantas portas pra nós (sem essas portas fechadas, outras não seriam abertas). Ao site Falando de Premier League, que foi a base pra tudo isso. Aos grandes craques do futebol mundial, que nos dão um motivo a mais pra gostar de esporte. É difícil imaginar, mas muita gente tem sua parcela de “culpa” nessa bagaça. No mais, obrigado a todos que sempre fortaleceram isso, de verdade! É só o começo.

EXPEDIENTE Diretor-geral do QQD Henrique Chaparro Editor-chefe Yuri Casari Redatores Eduardo Caspary Eduardo Schiefelbein Gabriel Belo Matheus Eduardo Vinícius França Willian Pereira Diagramador Yuri Casari Acesse: www.quatroquatrodois.com QQD | Quatro Quatro Dois Março | 2015 Todos os direitos reservados

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SUMÁRIO

Certezas do futebol................................6 Daniel Alves: ele não é mais o mesmo.......7 Artigo: Com alma de Libertadores..........12 Na Memória........................................13 Vivendo a 4ª divisão..............................17 Entrevista: Eduardo Didi.......................20 Craque do mês....................................24 O preço de uma taça.............................25 Foto do mês.........................................28 Futebol Arte........................................30 A palavra é sua....................................31


CERTEZAS do FUTEBOL

!

Aquilo que você sempre pensou da maneira que nunca viu A transferência de Paulo Vinícius Coelho pela Fox Sports foi no valor de 85 milhões de reais, ultrapassando a compra de Tévez pelo Corinthians em 2005 e, assim, assumiu o primeiro lugar como transferência mais cara da história do futebol brasileiro. Há uma cláusula que estabelece que a cada escalação completa de um time paraibano de antes da década de 40 que o jornalista souber, ele ganha mais 20.000 reais, e a cada jogo do Campeonato Mato-Grossense sub13 que ele souber a súmula inteira, mais 25.000 reais vão cair na conta do comentarista. O contrato vai até 2017 e tem uma multa rescisória de 300 milhões de reais para emissoras estrangeiras. O Craque Neto sofre de uma rara doença hereditária, chamada “mao espechulathismo chrôniko”, em que tudo que ele fala não acontece ou acontece ao contrário. Seu avô, conhecido apenas como “Craque”, foi o paciente zero dessa condição. Ele trabalhava com ações em 1929, nos EUA, quando especulou mal uma ação e causou a quebra da bolsa americana, que resultou numa crise econômica no país todo. O filho de “Craque”, conhecido como “Craque Filho”, vendeu todas as ações do Google quando valiam 10 dólares para tentar a sorte no ramo de videocassetes. O “Craque Neto”, vendo o insucesso da família com o passar dos anos no ramo de ações, depois de se aposentar como jogador, virou comentarista e tenta há 74 anos dar um furo certo de reportagem. 6

Depois de eleger Thiago Silva e David Luiz como os zagueiros do ano, a FIFA elegeu Caio Júnior como melhor técnico, Tiago Leifert como melhor jornalista esportivo e deu o Prêmio Fair Play vitalício a Pepe.


ELE NÃO É MAIS O MESMO por Matheus Eduardo

Daniel Alves já não é mais o jogador “that we used to know”. Mas existe uma explicação lógica para isso

A

carreira de um jogador de futebol tem bons e maus momentos, e isso não é novidade para ninguém. Para Daniel Alves, o momento não é dos mais favoráveis, e já está assim há algum tempo. No último dia 24, na vitória do Barcelona sobre o Manchester City, dentro da Inglaterra, o lateral-direito foi substituído após sofrer uma falta e esbravejou ao sair de campo. O fato resume o que é a realidade do brasileiro nos últimos 2 anos, ou talvez em um intervalo de tempo maior do que esse. Como nada acontece por acaso, esse declínio do último camisa 2 do Brasil em uma Copa do Mundo tem uma justificativa plausível - acredite se quiser! Para entender um pouco melhor essa situação, é necessário voltar no tempo, mais necessariamente nos momentos áureos do defensor baiano. Alguns anos atrás, em meados de 2006, ainda com a camisa do

Sevilla, “Dani”, como é carinhosamente apelidado pelos espanhóis, dava seus primeiros passos rumo à glória, com o bicampeonato da Liga Europa da UEFA, além de outras competições nas quais este teve notório destaque. Nesse meio-tempo, suas assistências e a técnica refinada chamaram a atenção do poderoso Barcelona. Com o fim das especulações, Daniel chegou ao Barcelona, juntamente com o treinador Pep Guardiola. Um marco na carreira de ambos, especialmente na do ex-jogador do Bahia. Aqui começa a explicação para a ascensão e, principalmente, para o declínio do lateral mais estiloso do planeta. Com Pep, Daniel encontrou um paraíso à sua disposição, ao menos na parte futebolística. No popular “tiki taka”, o time mais famoso da Catalunha ganhou o mundo, e um dos grandes trunfos era justamente o posicionamento do camisa 2. No 7


esquema 4-3-3, o time era baseado no princípio de ter em seu time titular um lateral ofensivo e outro defensivo - Abidal, com a finalidade de obter um equilíbrio e não deixar o time exposto ao ataque adversário. Nessa temática, coube a Daniel a função de ser o jogador que atuaria pelo lado do campo com função técnica e tática de contribuir com os homens de frente. E assim surgiram os momentos áureos do jogador tupiniquim, principalmente através de triangulações com Messi e Xavi pela direita e as inúmeras assistências no período denominado “Era Pep”, entre 2008 e 2012.

Taticamente, este era o Barcelona na última temporada sob o comando de Pep Guardiola (2011/12). Alterações em relação à “escalação oficial”, adaptadas à função de Daniel Alves. Atenção ao recuo de Abidal, como terceiro zagueiro e ao posicionamento de Dani, inicialmente lateral-direito. À direita, o desenho tático atual. 8

Com o passar do tempo, o Barcelona fez o seu jogo fluir tendo Dani como uma válvula de escape pela direita, apoiando os atacantes e servindo-os, à medida que o volume de jogo crescia - especialmente com Messi. Não por curiosidade, Daniel Alves é o jogador que mais assistiu gols do craque argentino. No entanto, todas as virtudes e o grande repertório ofensivo do camisa 2, em meio a esse esquema muito bem arquitetado para explorar virtudes, maquiava um defeito muito relevante apresentado pelo lateral brasileiro. Embora fosse o cara nas subidas ao ataque, Alves deixava muito a desejar em aspectos defensivos,

Desenho tático do Barcelona na atual temporada, em partida contra o Atlético de Madrid, seguindo adaptações que vêm desde a temporada com Tito Vilanova: Alba e Alves nas laterais, time ofensivo e defesa exposta. Busquets complementando o quarteto defensivo para não expor tanto o time. Daniel avança, mas tem a obrigação de acompanhar o winger esquerdo do time adversário


especialmente na marcação e na cobertura do seu lado de campo. Isso é tão explícito que, como observado na imagem acima, é necessário que um dos zagueiros faça a cobertura pelo seu lado, enquanto Busquets, volante de origem, é recuado para proteger a linha defensiva, e o até então lateral-esquerdo Abidal torna-se zagueiro pelo seu lado. O plano deu certo por 4 anos, mas já dizia uma música conhecida: "todo carnaval tem seu fim". Com a saída de Guardiola, um novo técnico chegou. Tito Vilanova, que era auxiliar de Pep no comando do clube blaugrana, assumiu o cargo de treinador. Junto com ele, a primeira de muitas mudanças: Abidal, antigo dono da lateral-esquerda, foi tratar-se de um câncer e deu lugar a um novo contratado, o espanhol e ex-jogador de La Masia, Jordi Alba. Com as novas peças, novas mudanças aconteceram, especialmente com Daniel. O antigo esquema, com o lateral-esquerdo tornando-se um terceiro zagueiro, não existia mais. O time, até então, preparado para manter a segurança de sua defesa, precisou se expor e obrigar jogadores menos qualificados a trabalharem de maneira defensiva. O grande atingido nessa história? Ele mesmo, nosso lateral brazuca!

Com a obrigação de marcar e cobrir os wingers adversários, o camisa 2 sofreu bastante com as jogadas no mano a mano e protagonizou um momento de extrema fragilidade defensiva do Barcelona em meio a uma temporada de adaptação a um estilo de jogo novo e um treinador que passava por problemas profissionais e pessoais. O resultado dessa peleja toda foi um traumatizante 7 a 0 no placar agregado contra o Bayern de Munique pela Liga dos Campeões da UEFA, lá na temporada 12/13, onde Dani Alves bateu de frente com Franck Ribéry, o terceiro melhor jogador do mundo naquele momento. Para quem pensa que a explicação para por aqui, deve se perguntar também qual é o motivo pelo qual Daniel não é mais o cara das assistências e dos gols de fora da área como em outros momentos. Mas isso também tem uma explicação. Assim como na temporada com Tito Vilanova, nos anos seguintes, com treinadores diferentes, o Barcelona não conseguia encontrar um padrão de jogo, como o mantido até 2012. Sob o comando de Tata Martino, na temporada passada, questionou-se muito em como o time não tinha um bom trabalho conjunto e também em como o esti-

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lo de jogo mudou, cessando também o ponto forte do time na “Era Pep”, com muitas infiltrações e entradas com passes curtos. O fato é que esta era a grande arma do Barcelona para marcar tantos gols de maneira rápida e letal, e assim Daniel geralmente deixava seus parceiros de time na cara do gol várias vezes. Com os novos treinadores - incluindo o atual técnico, Luis Enrique -, o estilo de jogar se alterou bastante, e o grande repertório de passes rápidos e curtos foi trocado por uma série incessante e tediosa de cruzamentos para a área, geralmente inutilizados. Além disso, muito se questiona sobre a capacidade de finalização do lateral-direito, uma arma letal durante seus bons momentos por Sevilla, Barcelona e Seleção Brasileira. Especialmente no período pós-Guardiola, essa virtude deixou de ser tão utilizada e eficaz como em outros tempos, possivelmente coincidindo com a queda de rendimento já explicada no parágrafo acima. Além disso, tem muito a ver com o estilo de jogo do Barcelona, especialmente, além da maneira como o time buscava criar espaços no campo de ataque. Geralmente, com Xavi e Iniesta na distribuição do jogo, havia muita triangulação, passes rápidos e bastante movimentação quando o time catalão estava no campo de ataque. Com isso, 10

sobrava espaço para o elemento surpresa do esquema em questão (no caso, Daniel Alves) aparecer em lugares inesperados e encontrar espaço para o arremate, algo que deixou de acontecer com tamanha frequência após a instabilidade de treinadores no Camp Nou. Tendo falado tudo isso, penso que é necessário ter paciência e até um pouco de racionalidade em relação às críticas a Daniel Alves ou seu estilo de jogo. Além de tudo, há também a questão da idade e, especialmente com um “defensor”, o que é sua posição de origem, o tempo às vezes limita a funcionalidade do atleta. Antes de qualquer coisa, é necessário entender que o atual dono da lateral-direita do Barcelona nunca foi um jogador de cacoete defensivo invejável, tampouco que a função que este desempenha hoje é a mesma de 3 anos atrás. Por outro lado, esse momento é, provavelmente, a grande hora para uma mudança de ares. O Barça almeja um jogador com outras características para a sua posição, haja vista a frequência de críticas sobre o brasileiro e ainda há mercado e clubes com estilos diferentes de trabalhar e pensar o futebol. Agora, o ultimato será dado no meio do ano, quando a temporada se encerra e o contrato de Dani Alves com o Barcelona expira. Talvez seja a hora de mudar.



Artigo

por Vinícius França

Com alma de Libertadores

S

e dissessem há cinco anos atrás que, em um jogo de Libertadores da América, não haveriam bandeiras e nem os animados mascotes das equipes em campo, a resposta seria uma só: “este jogo não é de Libertadores da América”. Porém, neste dourado 2015, é exatamente esse cenário o previsto para acontecer dentro dos gramados da Sudamérica por esforço cru e único da maestrina de seu futebol. É impressionante o esforço da CONMEBOL para descaracterizar sua principal competição e derrubar um dos últimos bastiões do esporte pulsante e vivo que ainda resistia ante ao assalto de almas cometido pela modernidade.

que rege a presença dos mascotes em campo junto às equipes. Nossos ilustres engravatados querem MULTAR a equipe que subir o túnel acompanhada de seu guarda-caça histórico. A pena? 10 mil dólares em primeiro e portões fechados em caso de reincidência.

Para definir do jeito mais suave, é uma atrocidade. Mais empenhada em combater um possível marketing de guerrilha do que a violência dos vândalos infiltrados nas torcidas, a CONMEBOL vai traçando um fim melancólico para a fervura que tanto marcou fãs e jogadores por todo o mundo. Sem os ingredientes que fazem la Copa (e os demais torneios, que seguem o mesmo regimento) serem a repre Com o perdão pela poesia forçada no sentação mais sublime de paixão ao futebol, primeiro parágrafo, temos de concordar que é as partidas correm o risco de não passarem arrepiante assistir a sequência de trapalhadas de um insosso toque de bola. O assassinato da Confederação ao gerir o espetáculo. Os em Oruro, ocorrido em 2013, continua impune, cartolas alocados em Luque conseguiram ul- mas a cartolagem insiste em focar na pelúcia trapassar em menos de dois meses qualquer dos mascotes, que podem estampar o sorriso limite aceitável de burrada contra o torcedor do concorrente. Os patronos não vão gostar. no ato de redigir o regulamento da Liberta- Assim, fica o aplauso à cegueira administratidores e dentre os tópicos mais bizarros adi- va e à falta de amor ao jogo. No ganamos, ni cionados ao código para a edição atual, está o perdimos, aún nos divertimos. 12


Na Memória por Eduardo Caspary

A maldição do favoritismo

Num momento de transição de forças na história da dupla Gre-Nal, relembre vitória surpreendente do lado azul

E

ra um Inter vacinado. Prometera a si mesmo que outro martírio como o vivido em Belém do Pará um ano antes não mais ocorreria. Mas, ao mesmo tempo, era um Inter jovem e desconhecido, que fez do laboratorial ano de 2003 um ponto de partida para um crescimento que, aliado a uma nova filosofia de gestão de futebol, o levou à Yokohama anos depois. No advento dos pontos corridos em solo bra-

sileiro, o grande destaque do time era não ter destaque algum. Respaldado pelo chefe Carvalho, de quem virou amigo, Muricy Ramalho ganhava sua primeira chance em um grande clube e não tinha outra alternativa a não ser apostar nas categorias de base. Nos passos de Nilmar e Daniel Carvalho, o time surpreendia a todos com uma campanha sólida que, dizem, o fez favorito no fatídico Gre-Nal. 13


Era um Grêmio no sufoco. Sentia na pele o desgaste de uma ótima geração formada por nomes como Zinho, Anderson Lima, Polga e Rodrigo Fabri, que venceu uma Copa do Brasil e bateu na trave duas vezes na Libertadores. Sentia na pele porque esse grupo comandado por Tite simplesmente ruiu após o treinador ser criticado publicamente pelo ex-dirigente Luiz Eurico Vallandro (lembram dele?) no famoso episódio das “ovelhinhas”, onde o cartola acusava o treinador de defender certos jogadores. Tamanha crise de bastidores levou dirigentes, treinador e um por um dos melhores jogadores embora. O último a sair deveria apagar a luz. Darío Pereyra e Nestor Simionato vieram para tentar apagar o fogo e apenas se queimaram. Como o último dos últimos recursos, chegou Adílson Baptista,

o Capitão América, com o único objetivo de tentar evitar o pior, mesmo que naquela tarde o Grêmio entrasse em campo em último lugar, de onde não parecia ter mais forças para sair. Foi nesse sonoro e incoerente antagonismo que as duas equipes pisavam no gramado do velho Beira-Rio, às 18h de 12 de outubro de 2003. No improvável clássico 356, era o Grêmio, recém saído do período de vitórias do final da década de 90 e início dos anos 2000, que disputava a duras penas a fuga do rebaixamento. Enquanto isso, o Inter nadava em mares calmíssimos e se permitia sonhar com uma ida à Libertadores do ano seguinte. Afinal de contas, uma vitória colorada no clássico – esperada por todos, inclusive por muitos gremistas – colocaria a equipe na zona de classificação.

Tinga disputa bola com Daniel Carvalho: naquele domingo de outubro, o “favorito” perdeu no Beira-Rio (Foto: divulgação) 14


Bastou Héber Roberto Lopes apitar o início de jogo para o tal favoritismo dar lugar à imprevisibilidade comum em clássicos. As cartas se embaralham. Mais de 38 mil colorados prontos para fazerem a festa assustavam-se com a evidente inversão de papeis: era o Grêmio, à luz de sua lanterna, que jogava como um mandante e postulante à Libertadores, enquanto o Inter limitava-se a defender como quem não estivesse entendendo nada do que estava acontecendo. Prova disso foram os sucessivos escanteios que os azuis tiveram com menos de 10 minutos de partida, onde um deles culminou com um arremate para fora, de dentro da pequena área, do glorioso atacante Caio, que hoje comenta futebol na Rede Globo. No 3-5-2 adorado por Muricy, o Inter demonstrava clamorosas dificuldades em sair de trás. Quando conseguiu, nos pés do jovem atacante Diego, irmão de Diogo, o bandeirinha Rogério Rolim errou ao erguer seu instrumento e impedir o ataque dos mandantes, para desespero de uma arquibancada aflita. No momento que o Inter ensaiava uma melhora e já obrigava o goleiro Eduardo Martini a sujar o uniforme, veio o golpe certeiro, o soco no estômago e no orgulho dos colorados, que choraram lágrimas da alma ao verem o antigo

ídolo Christian, vestido de azul naquela tarde, acertar aos 33min um balaço no ângulo de Clemer e fazer justiça a um placar que já avisava que não ficaria no zero como no primeiro turno do campeonato. Na segunda etapa, os onze jogadores colorados esqueceram tática, técnica e qualquer outra coisa relacionada ao futebol para se jogarem ao ataque na base do abafa, da pressão, como um trem desgovernado que não sabe onde vai e deixa tudo aberto lá atrás. A tentativa de sufocar o rival resultou em apenas uma chance clara de gol, quando o volante Flávio, sempre ele, carimbou o travessão de Martini. Fora isso, o colorado imprimia uma pressão mentirosa, que mais agonizava o seu próprio torcedor do que preocupava o adversário. Lúcido, o Grêmio se fechava com sabedoria e oferecia perigo nos contra-golpes, empilhando chances de gols perdidas com direito a bola salva em cima da linha por Clemer. Para ninguém esquecer que era Gre-Nal, Sangaletti e Anderson Lima trataram de lembrar ao fazerem faltas duras, se engalfinharem e serem expulsos. Fim de jogo e vitória gremista, que a partir dali arrancava no campeonato e postergava o rebaixamento para o ano seguinte. Mesmo assim, naquele fatídico clássico, houve quem arriscasse um favorito.

O jornal Correio do Povo, de Porto Alegre (RS), publicou as notas segundo a sua editoria de esportes no dia seguinte ao jogo 15



Vivendo a

divisão

Texto e fotos: Willian Pereira

C

alor de 25 graus em Pirassununga, interior de São Paulo. O Estádio Bellarmino Del Nero mal abre os portões e um grupo de torcedores toma seus lugares no setor descoberto das arquibancadas, local em que o sol está 100% presente. O Atlético Pirassununguense (CAP) ainda se aquece no gramado enquanto as bandeiras são colocadas no alambrado. Debaixo de sol ou chuva, a 4ª divisão do Campeonato Paulista está presente nos finais de semana da torcida do centenário clube da cidade. Em 2012, o estudante de história Madequier Naressi, 29, criou a “Malucos do Vale”, torcida organizada que não poupa esforços para acompanhar o time durante a temporada. Para ele, torcer representa o amor. Estar em todos os jogos é uma tradição de família e, desde criança, o CAP é prioridade.“Desmarco qualquer evento por ele, que está em primeiro lugar. A arquibancada descoberta é nosso ponto de encontro. Lá, independente de chuva ou sol, só os que gostam de verdade ficam”. A paixão influenciou também sua namorada, a agrônoma Márcia Fuzaro, 28. Juntos há mais de

dois anos, preferem o ambiente futebolístico à outra programação. “Prefiro vir porque gosto daqui. Tudo pelo amor, que são ele e o CAP. Não dá para viver sem”, comenta ela. Palavra de jogador “O torcedor é o 12º jogador em campo. Sua presença é fundamental. É uma injeção de ânimo para nós. Quando vamos jogar em casa ou fora, tê-los do nosso lado é algo que fortalece demais”, afirma Ederson Martins, lateral direito do Atlético. O amor sem idade “Todo jogo eu fico correndo atrás do bandeirinha gritando e reclamando. Não sei se ajuda, mas faço isso só para tirar sua atenção,” diz o pequeno Eduardo Vieira, de apenas nove anos. O professor de educação física Mário Trapani, 69, há mais de 50 anos é apaixonado pelo CAP. O fato de nunca ter subido de divisão, não atrapalha em nada. “Frequento o es17


tádio para apoiar o Pirassununguense desde que as arquibancadas eram de madeira [...] estamos sempre juntos, a quarta divisão não me intimida”. Mário conta que sempre gostou de cinema, pescar e nadar, mas larga tudo para ir ao jogo. “Sou casado e tenho três filhos. Se tiver algum problema com eles no dia, aviso a mulher e vou do mesmo jeito. Se estiverem doentes, ela cuida. Só perco se for algo muito grave, mas, graças a Deus isso nunca foi necessário”. Com o aposentado Euclides Bech, 59, a relação também é antiga. O tempo livre o deixa mais próximo da equipe. “Durante a semana acompanho os treinos e fiz amizade com todo o pessoal de lá. Eles dizem que sou o torcedor número um”, afirma em tom descontraído.

O clube Fundado em 7 de setembro de 1907, o Atlético Pirassununguense é o segundo clube em atividade mais antigo do estado, atrás apenas da Ponte Preta. No Brasil é o 13º. Entretanto, a equipe se profissionalizou somente em 1918 e, desde então, passa pelas divisões de acesso. A primeira partida oficial do clube foi realizada em 23 de fevereiro de 1908, contra o Paulista, de São Carlos, e obteve sua primeira vitória, por 2 a 1. O CAP possui apenas um título: o do Campeonato Amador do Interior, em 1954. O Bellarmino Del Nero, seu estádio, foi inaugurado em 1931, com originalmente 8 mil lugares. Hoje, o local tem capacidade para 5.300 apaixonados. Natural de Cornélio Procópio (PR), Alex, meio-campista do Internacional, com passagens também pelo Corinthians, chegou a atuar no time entre 2000 e 2001, onde jogou a Copa São Paulo de Futebol Junior.

Acima, à esquerda: O casal Márcia e Madequier dividem a paixão pelo clube. Acima: Euclides Bech, fanático torcedor do CAP. À esquerda: o professor Mario trapani ignora a idade e comemora gol subindo pelo alambrado. 18



Entrevista

por Henrique Chaparro Fotos: Danilo Camargo

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PELA GLÓRIA

MÁXIMA

Vivendo e realizando novos sonhos a cada dia. Logo na sua primeira temporada na Liga Futsal, tornou-se um dos jogadores mais jovens a conquistar o torneio. Mas ele quer mais. Mais títulos e mais espaço para escrever sua história. QuatroQuatroDois: Como foi o seu início no futsal? Eduardo Dídi: Iniciei aos 6 anos, na escolinha de futsal do colégio. Fiquei um ano ali, até meu pai me levar para fazer um teste no CEPE para categoria fraldinha na época. Passei no teste e fiquei um tempo jogando estadual, mas não me destacava muito e não gostava daquela coisa levada a sério. Decidi sair. Jogava em escolinhas menores em Canoas-RS. Só depois de um tempo que nasceu o Dinamigos, feito pela minha família e amigos, onde dos 9 aos 12 anos vivi intensamente o futsal. Depois, me mudei para Horizontina-RS, devido à transferência de trabalho do meu pai. Lá, havia o John Deere Futsal, profissional, e eu comecei a jogar pelas categorias sub-13 e sub-15. Foi em Horizontina que realmente vi que era o futsal que eu queria para a minha vida. Aquele sonho, cresceu então voltei pra canoas, com 15 anos. Morei com a minha vó para voltar a jogar no cepe e estudar. Foi no sub-15 e no sub17 do CEPE que vivi a fase mais feliz da minha carreira antes do profissional. Foi graças ao CEPE que tive a oportunidade de ir para o Kuwait pela primeira vez, em 2012. A partir daí, a minha relação com o futsal começou

a ficar mais profissional. Tive minha primeira oportunidade como adulto na AFUSCA, de Cachoeirinha-RS em 2013, no meu primeiro ano de sub-20. QQD: Por quê o futsal e não o futebol? Dídi: Eu sempre estive em ginásio, meu avô e meu pai sempre foram do futsal amador em Canoas. Era algo que já estava no sangue. Aos 11 anos, até tentei fazer um teste no Internacional. Fiquei pouco mais de 1 mês e fui dispensado. Tinha muita diferença de tamanho e não me adaptei também. Aí, voltei para o futsal e nunca mais quis sair. QQD: A “Era Falcão” está acabando. Quem você acha que pode substituir o craque? Dídi: Falcão é insubstituível. Até o Pelé gera dúvida entre alguns se foi o maior, já que tem o Maradona disputando, por exemplo. Mas o Falcão é único. O futsal tem uma carência de ídolos. Será muito difícil quando o Falcão se aposentar. QQD: Você acha que o esporte é pouco valorizado no Brasil? Dídi: Sim. Não é dado o devido valor ao futsal, 21


que é o esporte mais praticado no país. Não é olímpico, isso é triste e dificulta. Deveria ter mais espaço na midia, mais incentivo para vender melhor o “produto” futsal. QQD: Como foi atuar ao lado de grandes ídolos do futsal nesta temporada, como o próprio Falcão? Dídi: O que estou vivendo é um sonho. Cada dia aqui é uma realização e estou aproveitando ao máximo para ser feliz com essa oportunidade, sempre crescendo e aprendendo. Mas eu quero muito mais. Tudo isso está me ajudando no meu futuro. QQD: Como foi sua passagem pelo Kuwait? O esporte é tratado de que maneira por lá? Dídi: O Kuwait foi a melhor coisa que aconteceu pra mim, pois foi algo muito diferente. Com apenas 16 anos conhecer um país assim, sozinho. Fui duas vezes. Na primeira, fui jogar um torneio sub-17. Já na segunda, fui convidado para jogar o Al Roudan, torneio do Ramadan. Foi também na segunda que conheci o Falcão, que me trouxe para essa oportunidade no Brasil Kirin. O futsal no Kuwait é um produto novo, e eles gostam bastante. Eu gostei muito. Quero voltar pra lá algum dia. QQD: Você acha que a CBFS deveria melhorar a organização da liga? Dídi: Eu acredito que a liga nacional está bem organizada. O futsal de um modo geral vai evoluir com o tempo, principalmente com essa reformulação da federação. Porém, falando da liga nacional em si, eu acho que está bem organizada. QQD: É sabido que você e Falcão convivem muito bem. Que tipo de papel ele desempenhou dentro do vestiário na campanha do título? Dídi: Ele e os demais jogadores, tanto os líderes do time quanto os mais novos, são muito importantes dentro do vestiário. Nosso grupo é diferenciado por ter inteligência e motivação além do normal. Isso contribui para que 22


os jogos tenham os resultados do ano passado. Mas falando do Falcão, parece que ele já sabe que vai ganhar. Confiança acima da média.

QQD: Você e o Pimpolho (foto acima) já fizeram história no futsal, sendo os campeões mais jovens da liga. Acredita que essa dupla ainda possa dar muito trabalho? Dídi: (risos) Espero que sim! Só o futuro irá dizer, mas posso afirmar que temos muita vontade disso. Trabalho não vai faltar. QQD: Você considera o futsal brasileiro mais organizado que o futebol daqui? Dídi: Não tenho como te responder sim ou não, pois são esportes diferentes. Investimentos absurdamente desiguais. O futebol envolve muita gente. Empresário, agente, muito dinheiro e muita mídia, o que o torna muito diferente do futsal. QQD: Qual foi o gol mais marcante da tua carreira? Dídi: Não fiz muitos gols, mas acho que foi no Kuwait. Foi o gol que marquei no jogo que fui escolhido o melhor da partida. Não foi um golaço, mas foi um gol importante, que contribuiu para que eu viesse ao Brasil Kirin. 23


CRAQUE DO MÊS

Quer golaços? Chame Philippe Coutinho! Com a maioria dos votos da nossa redação, o brasileiro foi eleito o craque do mês. Seus golaços e suas assistências contribuíram muito para a recente arrancada do Liverpool. A equipe agora soma 11 jogos de invencibilidade e está na quinta posição da Premier League. Muito se deve ao nosso craque do mês!

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O preço de uma taça

por Gabriel Belo

Apesar de ainda encherem os bolsos dos grandes clubes, estaduais vêem sua moral respirar por aparelhos

É

reconhecível a fatia do bolo que os estaduais representam para os principais clubes brasileiros. Equipes midiáticas como, por exemplo, Corinthians, Flamengo, Palmeiras e São Paulo muitas vezes fazem mais dinheiro com cotas de TV durante o estadual do que na própria Libertadores da América. Mas, por um momento, vamos tentar esquecer isso. Ou pelo menos maquiar, para que a seguinte pergunta possa ser feita: HOJE, quanto vale um estadual? O troféu tem alguma representatividade, ou é objeto de desejo em pleno ano de 2015? Questões que não tão difíceis de responder. Há algum tempo o torneio se tornou

uma pré-temporada entendida, ou um obstáculo no calendário, como preferir. Para equipes que estão se reconstruindo, como o Palmeiras, o Vasco, o Botafogo e o Grêmio, por exemplo, ele ainda tem alguma importância. Preparar o elenco para o Brasileirão é uma causa nobre. Porém, mesmo para os que pensam nisso como benefício, ainda há de se reconhecer todas as adversidades. Três/quatro meses de ocupação no calendário, gramados precários que podem ocasionar lesões e a tal falta de vontade. Nenhum time que tenha alguma expressão coloca estadual como prioridade, como era a algumas décadas. É um torneio 25


obsoleto, que ocupa calendário e que tem apenas como grande objetivo dar ritmo de jogo. Os bons momentos são os clássicos, mas até isso está perdendo valor. Obviamente, esse é a visão de um torcedor de time de primeira divisão. Para times menores/ de divisões inferiores, os estaduais são mais relevantes. Mas aí é necessário separar as coisas. Criação de mais divisões, torneios regionais para as equipes não ficarem paradas. Existiriam maneiras de buscar soluções, mas essa não parece ser a vontade da CBF. Algumas equipes já ameaçaram “largar” o estadual, escalando equipes mais jovens. Mas aí veio a pressão das federações, que conseguiram atingir seu objetivo. O único clube que não se deixou influenciar foi o Atlético/PR. No entanto, é claro que dói muito

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menos no bolso de um clube como o CAP do que de outros grandes. No ano mais bem sucedido em que realizou isso, o Atlético chegou à final da Copa do Brasil e emplacou uma classificação para a Libertadores. É exagero ficar cinco meses parado mas, se pensarmos que uma equipe extremamente limitada foi longe por se sobressair fisicamente, imagine o que um clube com mais recursos técnicos faria. É uma discussão válida, instigante. Vai ser complicado alguma coisa mudar, pelo menos enquanto todos ficarem acomodados. O fato é: ninguém mais passa uma noite sem dormir por ter perdido um estadual. A moral do torneio se perdeu, ele mais atrapalha do que ajuda. Alguém tem que fazer a diferença.





Futebol Arte Curte design? Curte futebol? Envie seu desenho para n贸s para publicarmos na sess茫o Futebol Arte.


A palavra é sua

A

té onde o nosso ego não nos deixa aceitar a máxima: dar um passo para trás para dar outros tantos pra frente? O nosso orgulho de torcedor é tão acentuado que preferimos ver o nosso tão querido time figurar no grupo de elite do futebol sem nenhuma competitividade ou expressão a vê-lo, durante um breve ano, no grupo secundário, brigando por título e, de forma mais importante, passando por grande reformas/melhorias gerenciais. Os benefícios econômicos de se disputar uma série secundária são claros e não é necessário muito esforço para identificá-los e entendê-los. Um clube dito grande, ao disputar outra série, tem, por exemplo, sua folha salarial reduzida consideravelmente, pois o elenco que essa série exige não é tão dispendioso quanto à série de elite. Com isso, há a

por Jônatas Pereira

oportunidade de se revelar/amadurecer bons jogadores que foram contratados com custo baixo/sem custo e aproveitá-los, também, no ano seguinte, quer seja como moeda de troca, gerador monetário quer seja, até mesmo, como parte do elenco a ser montado para o retorno à primeira divisão. No futebol brasileiro, temos alguns exemplos que comprovam isso: o Corinthians foi rebaixado em 2007 e, em 2012, foi campeão da Libertadores e, mais tarde, campeão do Mundial de Clubes da FIFA. O Timão passou por diversas reformulações que incluem mudança na diretoria, bem como mudança da filosofia dentro do clube (principalmente). Nesse mesmo cenário, temos o Atlético-MG que foi rebaixado em 2005 e, logo em seguida, veio a figurar como um dos clubes a serem ba31


tidos no futebol brasileiro. Em ambos os casos, os clubes revelaram jogadores, geraram mais capital, investiram em infraestrutura, o marketing conseguiu fazer brotar a essência dos torcedores: apoiar e vestir a camisa nas boas e nas más. Situação semelhante foi a do Vasco da Gama rebaixado em 2008 e Campeão da Copa do Brasil em 2011. Outro exemplo disso é o Fluminense: o Tricolor das Laranjeiras foi rebaixado para a série C no final da década de 90 e hoje é um dos clubes brasileiros mais vitoriosos dos últimos anos com uma Copa do Brasil e dois Campeonatos Brasileiros, além de um (doloroso) vice-campeonato da Libertadores. Por outro lado, o rebaixamento faz com que ocorra uma descontinuidade no crescimento da torcida desse time. Uma torcida se constrói – lê-se “se aumenta” - com ídolos, títulos; em suma, com triunfos. Toda uma geração assistirá a queda desse clube, sucumbirá ao negativismo que a mídia impõe a ele como intrínseco ao rebaixamento e, portanto, não se sentirá motivada a torcer por esse clube, não se sentirá identificada... Depois de alguns anos, se fizermos um estudo do crescimento dessa torcida, veremos que, no ano do rebaixamento, haverá um “rombo”. Já ouviu falar que “Há males que vêm para o bem”? Pois bem, será que, de fato, no futebol, aceitamos ou conseguimos vislumbrar isso? – decida se essa pergunta é retórica ou não -. É como um alcoólatra que vive sua rotina de forma pífia o qual não consegue enxergar o mundo parado. Apenas girando. Que, dia após dia, se lamenta por sua vida de insucesso, vê o resto dela indo pelo ralo e, ainda assim, teima em procurar ajuda: passar um tempo em reabilitação. Para esse alcoólatra, os males serão os dias internados numa clínica... E para os clubes?! Serão as rodadas que antecedem o fim do campeonato; serão as zoações dos rivais, serão as arquibancadas, gramados, estádios de baixo investimento; serão as demissões, as despedidas; serão as soluções invasivas e extremas; serão as cobranças da torcida; se32

rão as constantes saídas da zona de conforto... Cabe ao clube garantir que tudo isso seja passageiro: que esses males sejam os precursores e a condição necessária e suficiente para o bem, para o triunfo e para as glórias as quais esses clubes estão habituados. Garantir que o orgulho seja devolvido a cada torcedor que derramou suas lágrimas ao ver o seu time preso à zona de rebaixamento após o apito final da última rodada do campeonato. Garantir um novo recomeço escrito por vitórias.

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