Sollicitare n.º 42

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Sollicitare 42

ENTREVISTAS

Susana Antas Videira

Diretora-geral da Direção-Geral da Política de Justiça

Blandina Soares

Coordenadora da Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação

Cadastral Simplificado

Ministra da Justiça de Cabo Verde

JOANA ROSA

REPORTAGEM

IX Congresso

dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

Sollicitare 42

Diretora Anabela Veloso

Editora Liliana Fernandes

Redatores principais

André Silva e Joana Gonçalves

Colaboram nesta edição:

Amélia Fialho, António Lopes, Cecília Mendes, Filipa Ferreira Perdigão, Laura da Silva, Laura Silva, Pedro Soares e Telma Afonso

Conselho Geral Tel. 213 894 200 Fax 213 534 870 geral@osae.pt

Conselho Regional do Porto Tel. 222 074 700 Fax 222 054 140 c.r.porto@osae.pt

Conselho Regional de Coimbra Tel. 239 070 690/1 c.r.coimbra@osae.pt

Conselho Regional de Lisboa Tel. 213 800 030 Fax 213 534 834 c.r.lisboa@osae.pt

Design: Atelier Gráficos à Lapa

Impressão:

Lidergraf, Sustainable Printing

Tiragem: 6 500 Exemplares

Periodicidade: Semestral ISSN 1646-7914

Depósito legal 262853/07 Registo na ERC com o n.º 126585

Sede da Redação e do Editor Rua Artilharia 1, n.º 63, 1250 - 038 Lisboa

N.º de Contribuinte do proprietário 500 963 126

Propriedade: Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução Rua Artilharia 1, n.º 63 1250-038 Lisboa – Portugal Tel. 213 894 200 Fax 213 534 870 geral@osae.pt www.osae.pt

Estatuto editorial:

Os artigos publicados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Os conteúdos publicitários são da exclusiva responsabilidade dos respetivos anunciantes.

Os artigos e entrevistas remetidos para a redação da Sollicitare serão geridos e publicados consoante as temáticas abordadas em cada edição e o espaço disponível.

Bastonária

Anabela Veloso

Assembleia Geral

Presidente: Nuno Cardoso (Ílhavo)

1.ª Secretária: Inês Lopes da Silva (Leiria)

2.º Secretário: Miguel Fonseca Lima (Loures)

Conselho Geral

Presidente: Anabela Veloso (Santa Comba Dão)

1.º Vice-Presidente: Brás Duarte (Lisboa)

2.ª Vice-Presidente: Liliana Fernandes (Mortágua)

3.º Vice-Presidente: Victor Cardoso (Maia)

1.ª Secretária: Graça Isabel Carreira (Alcobaça)

2.º Secretário: Ricardo Amaral (Águeda)

Tesoureira: Ana Paula Jácome (Torres Vedras)

Vogais: Filipa Manuela de Oliveira (Braga) Paulo Barata (Pampilhosa da Serra)

Fátima Barros Ferreira (Funchal) Pedro Soares (Fafe)

Vanessa Vieira (Silves)

Conselho Superior

Presidente: Marco Antunes (Vagos)

Vice-Presidente: Manuel Rascão Marques (Figueira da Foz)

Secretária: Cláudia Cerqueira (Viana do Castelo)

Vogais associados da OSAE: Fernanda Gomes (Porto)

José Guilherme Pinto (Maia), Otília Ferreira (Lamego) Paula Luís (Penafiel)

Vogais não associados da OSAE: Gonçalo de Mello Bandeira,

Rute Couto Pedro Miguel Fernandes Freitas

Vítor Manuel Coimbra Leite de Azevedo Carvalho

Conselho Fiscal

Presidente: Liliana Burrica (Évora)

Secretário: Paulo Pereira (Barcelos)

Conselho de Supervisão

Presidente: Rosa Maria Rocha

Membros associados da OSAE: Ana Filipa da Silva (Seixal),

João Salcedas (Torres Novas)

Membros não associados da OSAE: Pedro Miguel Alves Ribeiro Correia

Susana Isabel Pinto Ferreira dos Santos Gil

Conselho Profissional do Colégio dos Solicitadores

Presidente: Francisco Serra Loureiro (Figueira da Foz)

Vice-presidente: Diana Silva Queiroz (Vila Franca de Xira)

Vogais: Carina Jimenez Reis (Oeiras) Luís Ferreira (Guimarães)

Carla Queirós (Lousada)

Conselho Profissional do Colégio dos Agentes de Execução

Presidente: Mara Fernandes (Lisboa)

Vice-presidente: Joel Silva Antunes (Torres Vedras)

Vogais: Bárbara Filipa Pinheiro (Porto), Bruno Rodrigues Coelho (Leiria), Sílvia de Sousa (Leiria)

Conselho Regional do Porto

Presidente: Nicolau Vieira (Gondomar)

Secretária: Marta Baptista (Esmoriz)

Vogais: Mariela Pinheiro (Barcelos) Josué Silva (Póvoa de Varzim), Sandra Teixeira dos Santos (Alijó)

Conselho Regional de Coimbra

Presidente: Bruno Monteiro Branco (Condeixa-a-Nova)

Secretária: Leandra Garcez (Alvaiázere)

Vogais: Rosa Maria Pereira (Nelas) Manuel Rodrigues Gaspar (Coimbra)

Lúcia Maria P. Silva (Fundão)

Conselho Regional de Lisboa

Presidente: Débora Riobom dos Santos (Odivelas)

Secretário: João Pedro Amorim (Cuba)

Vogais: Carla Matos Pinto (Santarém) António Raposo Preto (Setúbal), Maria José Palma Santos (Silves)

Encerramos o ano de 2025 com a satisfação de ver refletido, nesta edição da Sollicitare, o dinamismo e a vitalidade de uma Ordem que cresce com os seus profissionais, que se moderniza sem perder a sua identidade e que continua a afirmar-se como uma referência no sistema de Justiça português.

O IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, realizado em Évora, ocupa naturalmente um lugar central nesta edição. Durante três dias, reunimos centenas de colegas e personalidades do meio jurídico num encontro de ideias, inovação e compromisso com o futuro. Foi um Congresso de reencontro, de emoção e de trabalho coletivo, onde reafirmámos a importância das nossas profissões e da sua missão no acesso à Justiça e na concretização do Estado de Direito. Nesta edição, celebramos também a proximidade e a cooperação internacional, com especial destaque para a entrevista à Ministra da Justiça de Cabo Verde, Joana Rosa, a quem agradeço a disponibilidade e a partilha de uma visão inspiradora sobre o papel das profissões jurídicas e sobre o reforço das relações entre os nossos países. O seu testemunho sublinha a força da língua portuguesa e o valor da colaboração entre sistemas de Justiça que partilham história, princípios e objetivos comuns. Destaco igualmente a entrevista a Susana Antas Videira, Diretora-geral da Direção-Geral da Política de Justiça, que nos oferece uma reflexão profunda sobre o papel da informação, da evidência estatística e da inovação na formulação de políticas públicas. O seu testemunho é um contributo essencial para compreender como a Justiça portuguesa se tem modernizado com base em conhecimento técnico, cooperação institucional e rigor científico.

Da mesma forma, é com particular apreço que refiro a entrevista a Blandina Soares, Coordenadora da Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação Cadastral Simplificado. A sua análise sobre o BUPi e sobre a colaboração entre o Estado e os profissionais da OSAE na regularização fundiária e no ordenamento do território reforça o papel de proximidade dos Solicitadores na valorização do património e na gestão do território nacional.

Sublinhe-se também a entrevista a Gonçalo Maia Miranda, Coordenador da Delegação Portuguesa ao GAFI e Presidente do Comité Executivo da Comissão de Coordenação ABC/CFT, centrada nas políticas e nos desafios do combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. Uma reflexão lúcida e oportuna sobre o papel dos Solicitadores e Agentes de Execução neste domínio crucial da prevenção, da transparência e da salvaguarda da integridade do sistema financeiro e jurídico. Não menos relevante é a entrevista dedicada ao Instituto para a Tecnologia e Inovação (ITI) da OSAE, que evidencia a forma como a inovação tecnológica está a moldar o futuro das nossas profissões. A visão partilhada pelo Coordenador e pelo Coordenador-adjunto do ITI sobre a transição digital, a cibersegurança e a inteligência artificial demonstra que o progresso tecnológico só cumpre o seu propósito quando serve os profissionais, as pessoas e a Justiça, garantindo mais eficiência, transparência e confiança.

Por fim, merece particular destaque a reportagem realizada na Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM), que nos leva numa viagem pela fascinante história da moeda. Um testemunho de como a moeda reflete a identidade de um país, a sua cultura e a sua evolução institucional, unindo tradição, inovação e valor simbólico.

Uma palavra final de agradecimento a todos os que tornaram possível esta edição: à equipa editorial, aos entrevistados e aos autores dos artigos que, com o seu contributo, reforçam a credibilidade e o prestígio da nossa Ordem.

Sigamos juntos, com confiança e sentido de missão.

REVISTA DA ORDEM DOS SOLICITADORES E DOS AGENTES DE EXECUÇÃO
Anabela Veloso Bastonária da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

Labor Improbus Omnia Vincit

Entrevista

Joana Rosa

Ministra da Justiça de Cabo Verde

EDITORIAL 1

ORDENS

"Fisioterapeutas: a Ordem mais jovem está forte e recomenda-se" por António Lopes, Bastonário da Ordem dos Fisioterapeutas 11

PROFISSÃO

"A Mediação e o Papel do Solicitador na Resolução Alternativa de Litígios" por Pedro Soares 46 "Da Obrigação do Depósito do Preço –

Venda Judicial" por Telma Afonso 54

Solicitadores Ilustres

Florival Sanches de Miranda 80

OUTUBRO/NOVEMBRO 2025

IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

Entrevista

Susana Antas Videira Diretora-geral da Direção-Geral da Política de Justiça

Reportagem INCM

Entre o metal e a história. A arte de cunhar

Entrevista

Paulo Barata e Marco Santos Coordenador e Coordenador-adjunto do ITI

OSAE

Conselho Regional de Coimbra 70

Conselho Regional do Porto 72

Conselho Regional de Lisboa 74

REPORTAGEM Dia do Solicitador 2025 50

ENTREVISTA

José Luís T. Saraiva, Solicitador 62

Joana Branco de Magalhães, Solicitadora e Agente de Execução 82

Entrevista Blandina Soares Coordenadora da Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação Cadastral Simplificado (eBUPi)

Entrevista Gonçalo Maia Miranda Coordenador da Delegação Portuguesa ao GAFI e Presidente do Comité Executivo da Comissão de Coordenação ABC/CFT

“A Justiça é feita em nome do povo, o verdadeiro titular da soberania.”

Joana Rosa

Ministra da Justiça de Cabo Verde

Sonhou ser médica, mas acabou por se apaixonar pelo Direito no intenso e fervoroso contexto político de 1990, quando se erguiam os alicerces democráticos de Cabo Verde. A partir daí, o percurso de Joana Rosa fez-se entre a advocacia, o poder local, o parlamento e, desde 2021, o Ministério da Justiça.

Acreditando que “governar é, como se costuma dizer, uma corrida de estafeta”, é com esse espírito que tem conduzido uma agenda marcada pela aproximação da Justiça aos cidadãos, pela humanização do sistema prisional, pela aposta na transição digital e pelo reforço das profissões jurídicas. Fala também da igualdade de género e descreve como um caminho que ainda está a ser trilhado, lembrando que “as mulheres devem ser as primeiras a acreditar”.

Nesta entrevista à revista Sollicitare, Joana Rosa, a atual titular da pasta da Justiça em Cabo Verde, partilha histórias, desafios, ambições e perspetivas. Uma conversa sobre a vida do país e sobre a vida de quem escolhe também viver para o país.

Entrevista André Silva / Fotografia Ministério da Justiça de Cabo Verde

O direito sempre foi um sonho ou algo que a vida foi colocando no caminho?

Enquanto criança, o meu sonho era ser médica. Mais tarde, acabei por chegar à conclusão que não tinha vocação, desde logo porque não lidava, e não lido, bem com o sangue. Comecei então a apaixonar-me pelo Direito, paixão essa que cresceu em 1990, com o aparecimento do Movimento para a Democracia, partido de que sou militante desde então, liderado e integrado por altos quadros, quase todos formados em Direito. Nessa altura, os grandes objetivos passavam pela abertura política, pela implantação do regime democrático e pela emergência das liberdades individuais e, por isso, falava-se muito em “competência”, “mérito” e “direitos individuais”. Todo esse ambiente político e social efervescente atraiu-me para o Direito, pela busca da justiça e emergência de uma verdadeira cidadania.

E a política? Como é que aparece? E que espaço ocupa na sua vida?

Precisamente com base nesse contexto de 1990, entrei para a política como militante de base na cidade da Praia. A vontade de mudança era tanta que criámos um núcleo e fomos alargando a base, realizando reuniões e fazendo discussões sobre a estratégia que deveríamos implementar. Não foi fácil, visto que no bairro onde residia a maior parte das pessoas era do partido que estava no poder, mas isso não nos intimidou, nem nos impediu de fazer o nosso trabalho. Com isso, fui ganhando gosto pela política. Participava em todas as reuniões do partido na cidade da Praia e deslocava-me ao interior para também participar nas ações do partido. Com o tempo, fui fazendo parte dos órgãos do mesmo e, enquanto candidata suplente, cheguei a participar em algumas sessões da Assembleia Nacional. Entretanto, concluí o curso de Direito em 2001. De volta ao país, retomei as minhas atividades partidárias, até que, em 2005, fui convidada para liderar a lista às eleições legislativas, para o círculo eleitoral do Maio, minha ilha natal, tendo ganho as eleições e, com isso, exercido o mandato como deputada eleita. De resto, a política tem-me acompanhado ao longo destes anos e ocupa um espaço muito importante na minha vida. Mantenho a mesma paixão inicial pela política.

Essa paixão advém do gosto pelo debate político, pela retórica, mas, sobretudo, da vontade e convicção de retribuir à sociedade, pondo em prática os meus conhecimentos, sempre com base num forte sentido de serviço público e alcance de resultados concretos para a melhoria de vida das pessoas.

Que peso e significado tem o cargo de Ministra da Justiça? Olhando para o caminho até aqui, sente que tudo faz sentido?

Em 2021, fui convidada a assumir as funções de Ministra da Justiça, convite que assumi como um desafio, acreditando que a minha experiência enquanto advogada, autarca e parlamentar estaria a ser colocada ao serviço da Justiça no país e é o que tem acontecido. A experiência adquirida foi e está a ser muito importante no exercício deste cargo. Não tive problemas de adaptação pois os conhecimentos que fui tendo ao longo de 20 anos permitiram-me assumir este cargo com muito à-vontade, com uma visão clara dos desafios do setor e do caminho que deveria trilhar para ter sucesso. Exercer este cargo de muita responsabilidade é desafiador. A chave do sucesso é a humildade, o espírito de cooperação e a solidariedade.

A experiência no poder local, numa assembleia municipal, trouxe mais proximidade ao terreno e aos problemas das pessoas? É uma experiência que faz diferença no exercício do atual cargo?

Fui Presidente da Assembleia Municipal do Maio durante dois mandatos e foi uma experiência enriquecedora. Na verdade, enquanto eleita municipal pude conviver mais de perto com as pessoas, conhecer os seus problemas concretos e, sobretudo, contribuir para a resolução dos seus problemas e dos problemas da ilha. Por outro lado, há um conhecimento adquirido a nível da legislação municipal e da avaliação dos instrumentos de gestão apresentados pela Câmara Municipal, da relação entre o poder central e os municípios e as associações que, sem dúvida, integra o manancial de experiência que hoje tenho e que carrego comigo nas funções públicas que fui exercendo.

Para a plena igualdade de género há um caminho a percorrer. Trabalhar a mentalidade da sociedade, eliminar progressivamente o machismo, especialmente o “machismo no feminino”, porque as mulheres devem ser as primeiras a acreditar na igualdade.

amarras da violência no seio familiar e, bem assim, alertar para a necessidade de um equilíbrio de género na política. Garantir a participação da mulher na política continua a ser um desafio, mas a luta pela igualdade e equidade do género faz sentido. Para a plena igualdade de género há um caminho a percorrer. Trabalhar a mentalidade da sociedade, eliminar progressivamente o machismo, especialmente o “machismo no feminino”, porque as mulheres devem ser as primeiras a acreditar na igualdade. A igualdade de género exigirá maior disponibilidade da mulher para estar nos lugares de decisão e ver a política como uma missão.

E que desafios e oportunidades identificaria no seu mandato?

Foi vice-presidente da rede de mulheres parlamentares. Sente que, em Cabo Verde, ser mulher é, cada vez menos, motivo para deixar de ser alguma coisa? A igualdade de género é um caminho que está a ser trilhado?

Enquanto Vice-presidente da Rede de Mulheres Parlamentares, tive a oportunidade de trabalhar dossiers importantes e temas muito atuais, como o abuso sexual de menores, a lei de violência baseada no género e a lei da paridade. Temas importantes que visam proteger os nossos menores, mas também proteger a mulher das

O meu desejo para o setor da Justiça, e que é a finalidade maior do programa do Governo, é aproximar a Justiça dos cidadãos e torná-la mais efetiva, pois a justiça é feita em nome do povo, o verdadeiro titular da soberania. Portanto, o povo tem de sentir a sua realização e reconhecer a função primordial da Justiça na inclusão, na cidadania, enquanto pilar fundamental do Estado de Direito. Realizar a Justiça também é trabalhar a dignidade da pessoa humana. Tenho dedicado particular atenção à reinserção social dos condenados, exercendo a função que a Constituição e as leis dão ao Ministério da Justiça. Há, circunstancialmente, homens e mulheres privados de liberdade, mas nunca da sua dignidade humana.

Daí a aposta na humanização das prisões, com o ensino primário, secundário e formação profissional em várias áreas através do projeto “Empregabilidade” da mão de obra reclusa, com instalação de pequenas unidades produtivas, desde panificação, pastelaria, corte e costura, arte em cabedal, passando por atividades agrícolas, através da agricultura clássica, mas também da aeroponia. Este projeto financiado pela Cooperação Portuguesa visa dinamizar a produção interna, criar autossuficiência alimentar, mas, sobretudo, trabalhar a reinserção social dos reclusos.

A transformação ou transição digital também tem sido outra aposta firme deste mandato. A implementação do Sistema de Informação da Justiça (SIJ) é um ganho notório e um divisor de águas no setor, com ganhos de celeridade, transparência e segurança. Do mesmo modo, a digitalização dos registos e do notariado: criámos, para o efeito, o Instituto de Modernização e Inovação da Justiça, responsável pela gestão técnica do SIJ e pela sua implementação.

Também era um grande desafio criar e instalar o Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses. Conseguimo-lo em 2023, ainda que a instalação esteja a ser feita de forma faseada. Mas já há ganhos concretos e reconhecidos, sobretudo na realização do direito fundamental da criança à paternidade e redução de pendências de processos nos tribunais que aguardavam pela realização de testes, que eram necessariamente feitos fora do país.

Melhorar as condições ao exercício das diversas profissões judiciais é outro desafio e temo-lo conseguido com investimentos inéditos no setor. Desde a infraestruturação, ao recrutamento e capacitação de magistrados e oficiais de justiça, agentes da Polícia Judiciária, agentes de segurança prisional e técnicos de reinserção social, conservadores e notários. Mas também através da valorização e dignificação das suas funções, com a aprovação de novos Estatutos, que trazem uma melhoria considerável do quadro salarial e outros benefícios, mas também maior exigência e responsabilidade.

A digitalização, a desmaterialização e a integração de soluções como a inteligência artificial também são metas que pretende atingir?

Sim, absolutamente. A digitalização, a desmaterialização de processos e a integração de ferramentas de inteligência artificial não são apenas metas de governação, mas sim imperativos estratégicos para a modernização da Justiça. Estas tecnologias são fundamentais para ganhos de eficiência, redução de prazos, diminuição de custos operacionais e um significativo aumento da segurança jurídica e da transparência. O nosso lema é aproximar a Justiça dos cidadãos e não há como atingir esse objetivo sem apostar na transição digital. Implementámos o SIJ, o que constitui, sem dúvida, um dos grandes ganhos deste

A experiência concreta da OSAE na implementação de plataformas digitais e na desmaterialização de atos foi uma lição valiosa, permitindo-nos antever obstáculos e oportunidades. Há, sem dúvida, espaço para reforçar a cooperação nessa área e registamos, sobretudo, a disponibilidade da OSAE para apoiar o nosso processo de adaptação do quadro legal e operativo.

mandato. Tenho a certeza de que será uma ferramenta incontornável do futuro da Justiça. Aliás, já está a ser, com ganhos de eficiência, segurança e celeridade notórios. De igual modo, estamos a informatizar e digitalizar toda a atividade dos registos e do notariado, com claras vantagens para os cidadãos, para as empresas e para os negócios. Enfim, para a atratividade e competitividade do país. Todas estas soluções estão a ser implementadas de forma faseada, assegurando que complementam o trabalho dos profissionais, libertando-os de tarefas repetitivas, para que possam focar-se em áreas que exigem verdadeira análise e intervenção humanas.

Podendo determinar desde já, que legado gostaria de deixar?

Creio que muito já foi feito e há ainda muito por fazer. E governar é, como se costuma dizer, uma corrida de estafeta. Surgem novos desafios à medida que vamos alcançando objetivos. A dinâmica socioeconómica, o cidadão mais exigente e bem formado, a globalização, a era digital em que vivemos, tudo isso traz permanentemente novas questões, muitas das quais exigem abordagem imediata. Nesse sentido, deve permanecer a capacidade de trabalho, a abertura ao diálogo verdadeiro e construtivo, a responsabilidade e vontade de servir, certos de que os cargos desta natureza serão sempre transitórios. Estes são os princípios por que me guio e julgo poderem ser úteis a todos, sempre.

Estiveram recentemente na OSAE, numa partilha de experiências e boas práticas em áreas assumidas pelos solicitadores e agentes de execução portugueses. O que trouxeram desse momento de partilha?

A comitiva que foi recebida e se reuniu com a direção da OSAE apresentou-me um relatório bastante compreensivo, na linha, aliás, do que pretendíamos. Queríamos conhecer o quadro normativo e a realidade operacional de Portugal, perceber o contexto atual, bem como o percurso e os desafios até chegar onde estão. Tudo isso para naturalmente avaliar os aspetos que podem ser aproveitados e transpostos para a nossa realidade, de modo a conferir maior eficácia ao nosso processo executivo, um dos maiores desafios que enfrentamos em matéria de morosidade e pendências processuais, segundo dados dos relatórios dos Conselhos Superiores. Ressaltaria o conhecimento que nos foi proporcionado sobre técnicas modernas de gestão de processos de execução, desde a citação até à penhora e à venda de bens penhorados. De igual modo, a experiência concreta da OSAE na implementação de plataformas digitais e na desmaterialização de atos foi uma lição valiosa, permitindo-nos antever obstáculos e oportunidades. Há, sem dúvida, espaço para reforçar a cooperação nessa área e registamos, sobretudo, a disponibilidade da OSAE para apoiar o nosso processo de adaptação do quadro legal e operativo.

Que aspetos das profissões de solicitador e agente de execução é que considera mais interessantes para adaptação à realidade cabo-verdiana?

Nós teremos ainda pela frente um processo de adequação legislativa e de sensibilização junto dos operadores judiciais, a que se seguirá a necessária formação e capacitação dos nossos agentes. Este é um dos aspetos que nos chamou a atenção. A formação do solicitador, que abrange conhecimentos de direito, gestão e mediação, é um modelo versátil que se adequa bem a contextos como o cabo-verdiano, onde a multifuncionalidade é uma mais-valia. A própria figura do agente de execução, que ainda não existe entre nós, como um profissional especializado e com poderes para desbloquear e agilizar processos judiciais morosos, é um modelo a considerar seriamente. Pode ser uma peça-chave para ajudar a combater a questão da morosidade e das pendências de que falava anteriormente, especialmente em matéria de execução de sentenças.

A cooperação, designadamente entre países de língua oficial portuguesa, é um desejo e uma necessidade para que todos possam crescer de forma sustentável nos mais diversos domínios?

Sem minimizar a nossa vontade comum, bastantes vezes demonstrada e reafirmada, sublinharia, conforme a sua pergunta, a vertente da necessidade de cooperação. É uma necessidade estratégica incontornável.

Partilhamos uma base linguística, jurídica e cultural que constitui um ativo único. Ao cooperarmos, de forma estruturada e contínua, podemos potenciar sinergias, evitar a repetição de erros e acelerar o desenvolvimento sustentável em domínios cruciais como a economia, a educação, a saúde e, naturalmente, a justiça. É um caminho que permite que os países mais avançados em determinadas áreas apoiem os demais, fortalecendo o conjunto da comunidade. Creio que, através da cooperação a nível da CPLP, num quadro multilateral, bem como a nível bilateral, há consolidação de ganhos, alguns irreversíveis, diria. E a integração das pessoas no processo é um elemento unificador e catalisador da cooperação. O nosso papel, enquanto governantes, é sobretudo o de facilitar e potenciar esse contacto, essa interação entre os nossos povos, num quadro de harmonia, partilha e ganhos comuns.

E, na Justiça, que domínios destacaria e em que esta cooperação mais se poderia fazer notar?

A cooperação no domínio da Justiça tem sido profícua, quer a nível dos governos, quer a nível das instituições e agentes do setor. Temos hoje diversos fóruns institucionalizados, de reflexão, diálogo e partilha permanentes e há uma vontade genuína e concreta de aproximação, através da intensificação da cooperação bilateral e multilateral. Portanto, o quadro atual é bom. Voltando, contudo, um pouco a um aspeto que já tinha referido, apontaria a criação e implementação de programas de intercâmbio, estágios e formação, designadamente para juízes, procuradores, solicitadores e agentes de execução. Outra necessidade e desafio premente é a interoperabilidade dos Sistemas de Informação de cada um dos Estados, acompanhada de forte cooperação técnica para desenvolver ou adaptar plataformas digitais que, mantendo a soberania de cada país, permitam uma comunicação mais eficaz, por exemplo em matéria

de notificações ou de partilha de informação sobre direito aplicável. É preciso continuar e acelerar o processo de uniformização e harmonização de soluções legais em áreas comuns, como o direito civil e comercial, para maior segurança jurídica nas relações entre cidadãos e empresas dos diferentes países. A necessidade de adesão às Convenções de Haia tem sido uma das nossas bandeiras, mostrando as vantagens claras que daí advirão. Podemos e devemos também reforçar a nossa cooperação judiciária, designadamente através da Rede de Cooperação Judiciária, que completa, este ano, 20 anos de existência. Por fim, destacaria o desenvolvimento de mecanismos conjuntos de resolução alternativa de litígios, aproveitando a língua comum para criar centros de arbitragem regionais de referência.

Fisioterapeutas: a Ordem mais jovem está forte e recomenda-se

AFisioterapia é hoje uma atividade conhecida de todos. Do desporto à neurologia, do envelhecimento à área músculo-esquelética, da pediatria ao cardiorrespiratório, da saúde pélvica à emergência e catástrofes, muitos são os campos de intervenção que tornam evidente o forte contributo desta profissão para a saúde pública.

Partilhamos uma base linguística, jurídica e cultural que constitui um ativo único. Ao cooperarmos, de forma estruturada e contínua, podemos potenciar sinergias, evitar a repetição de erros e acelerar o desenvolvimento sustentável em domínios cruciais como a economia, a educação, a saúde e, naturalmente, a justiça.

Tendo sido estudante de Direito e sendo, hoje, ministra da justiça, acredita que é no ensino e na formação que começam as verdadeiras reformas do sistema?

Sem dúvida. No ensino, na formação e permanente capacitação. E incluiria aqui a formação em sentido mais amplo. Não apenas a institucional, mas também, e sobretudo, a formação como ser humano, como cidadão, como pai e mãe, como profissional. É sobre essa sólida base psicossocial que se pode trabalhar de forma mais integrada e eficaz o conhecimento e as competências profissionais. O conhecimento exige transversalidade e integração. “Quem só de Direito percebe, nem de Direito percebe”. Trazer os diversos ramos da ciência para a mesa, refletir conjuntamente sobre os desafios e as soluções e, a jusante, decidir e implementar. É uma tarefa árdua, mas conjunta. Qualquer reforma é em si uma mensagem. Exige um emissor e um recetor capazes e em sintonia. Daí ter falado na formação integral do cidadão e não apenas do profissional da Justiça.

Durante muito tempo, os Fisioterapeutas lutaram pela sua afirmação e autonomia. Para deixarem de ser considerados como meros auxiliares ou subalternos. Há cinco anos, na sequência de uma ação perseverante e determinada, conseguiram criar a Ordem dos Fisioterapeutas, que veio a ter um papel decisivo no reconhecimento desta profissão, assente em gente que hoje possui licenciaturas, mestrados ou doutoramentos.

Neste período, demos passos decisivos para pôr em marcha a nossa Ordem como entidade reguladora da profissão, colocando a Fisioterapia ao serviço dos utentes e do país.

Dotámos a Ordem de um Código Deontológico e de um Regulamento Disciplinar que, a par do Regulamento do Ato do Fisioterapeuta, permitem o pleno funcionamento do Conselho Jurisdicional e confirmar a Fisioterapia como profissão autorregulada e merecedora do respeito de todos.

Demos um primeiro passo na criação de especialidades que assegurarão uma progressiva qualificação diferenciada do trabalho dos nossos membros.

Desenvolvemos um protocolo de colaboração com a Entidade Reguladora da Saúde, a quem compete a fiscalização das intervenções por agentes não qualificados.

Afirmámos a autonomia da nossa Ordem e a projeção da sua imagem, o que levou à aprovação da nossa inclusão no Conselho Nacional das Ordens Profissionais. Desenvolvemos um intenso trabalho com as restantes Ordens da área da Saúde, na convicção de que só em conjunto conseguiremos enfrentar os difíceis desafios que afetam um sector alvo de tanta crispação e polémica.

Fomos integrados no Conselho Nacional de Saúde e desenvolvemos a colaboração com a Direção-Geral de Saúde, no sentido de participar nos vários programas nacionais que promovem.

Ao longo deste período, percorri todo o país. Visitei todas as 39 Unidades Locais de Saúde (ULS), falando com os seus responsáveis e com os Fisioterapeutas que nelas trabalham. Discutimos também, com o Ministério e outras

estruturas da Saúde, o modo de darmos seguimento às necessidades desta profissão, cada vez mais composta por elementos com a adequada formação académica e forte experiência de serviço.

Foi um caminho intenso e não isento de dificuldades, como acontece com todas as jovens estruturas. Mas que fizemos com todo o empenhamento e convicção.

A Ordem dos Fisioterapeutas cresceu muito. Somos hoje mais de 14 mil membros. Vamos agora dar sequência a um trabalho que exige forte experiência e um foco muito grande nos problemas que enfrentamos. Os tempos não estão fáceis.

Conseguimos já assegurar a gestão autónoma no sector privado. Falta-nos dar esse passo no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Apenas cerca de 1.500 dos nossos membros trabalham no SNS, dos quais 150 nos Cuidados de Saúde Primários. Este é um dos maiores desafios que temos pela frente: conseguir levar à criação de Unidades de Fisioterapia nas ULS, que permitam melhor responder às necessidades dos utentes e contribuir para uma gestão mais racional dos recursos alocados à Saúde. Sem nos sobrepormos a ninguém, trabalhando em rede com as outras profissões, mas sem nos subalternizarmos nas nossas funções.

O nosso trabalho, em conjunto com todos os órgãos da Ordem, incluindo as novas Direções Regionais a eleger muito em breve, vai no sentido de nos aproximarmos ainda mais dos anseios dos Fisioterapeutas, onde quer que vivam ou trabalhem.

Em linha com as melhores práticas internacionais, articulados com os nossos colegas na World Physiotherapy, vamos continuar a consolidar a Ordem dos Fisioterapeutas com visão e ambição, ao serviço da saúde dos portugueses.

António Lopes
Bastonário da Ordem dos Fisioterapeutas

IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

Évora foi palco de três dias de debate, reflexão e compromisso com o futuro

da Justiça

Entre os dias 16 e 18 de outubro, a cidade de Évora acolheu o IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, um dos maiores eventos nacionais dedicados à Justiça e às profissões jurídicas. Reunindo mais de meio milhar de profissionais, o encontro contou um programa que cruzou reflexão, inovação e valorização institucional. Durante três dias, a Arena d’Évora, o Hotel M’AR De Ar Muralhas e o Palácio de D. Manuel foram palco de debates, homenagens e partilha de experiências, num ambiente de forte sentido associativo e de projeção para o futuro das profissões.

Abertura marcada pela emoção e pelo simbolismo

O primeiro dia do Congresso iniciou-se com uma atuação do grupo “Cantares de Évora”, que apresentou o tradicional Cante Alentejano, um símbolo cultural que serviu de inspiração a todos os presentes.

Seguiu-se uma homenagem ao Solicitador Florival Sanches de Almeida, recordado por Miguel Ângelo Costa como “um grande eborense por adoção, um democrata e um grande humanista”.

Já a cerimónia de abertura contou com intervenções de personalidades de grande relevo, começando pela juíza Ana Catarina Ferreira, Presidente da Comarca de Évora, que ressaltou a cooperação entre os diferentes operadores jurídicos para a melhoria contínua do sistema judicial: “Vejo aqui profissionais de várias áreas interessados em evoluir e a debater ideias. É um sinal de motivação para a inovação, o que me deixa muito feliz”.

Neemias Ramos Freire, Diretor de Relações Institucionais e Internacionais da FENASSOJAF, do Brasil, fez uma reflexão sobre os desafios globais que envolvem os Solicitadores e Agentes de Execução. Nas suas palavras, “a tecnologia tem de funcionar ao serviço da população. Mas nunca poderemos descurar a dimensão humana da Justiça”.

Seguiram-se as intervenções de Ricardo Garrido Rodríguez, Presidente do Conselho Geral dos Procuradores de Espanha, e de Marc Schmitz, Presidente da União Internacional dos Oficiais de Justiça, que deram as boas-vindas aos participantes e sublinharam o carácter internacional do congresso. Os oradores destacaram o caminho percorrido lado a lado em busca de uma Justiça mais próxima, mais humana e mais moderna, bem como a dignificação das profissões jurídicas.

Miguel Ângelo Costa
Neemias Ramos Freire
Ricardo Garrido Rodríguez
Sara Tainha Jornalista e apresentadora da cerimónia
Marc Schmitz
Ana Catarina Ferreira

“Este é um momento particularmente especial para todos nós. Um momento de reencontro, de reflexão e de compromisso com o presente e com o futuro”.

A encerrar a cerimónia de abertura, Anabela Veloso, Bastonária da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), destacou a importância do evento para o fortalecimento das profissões e para a evolução dos serviços de Justiça. “Este é um momento particularmente especial para todos nós. Um momento de reencontro, de reflexão e de compromisso com o presente e com o futuro. De quatro em quatro anos, a OSAE reúne-se em Congresso para pensar as profissões, avaliar as rotas traçadas até ao momento, e, sobretudo, olhar para as novas metas que se estão a iniciar. O Congresso representa todos e todas e hoje somos gratos por ver este espaço repleto de sorrisos e envolvência”, declarou a Bastonária.

No seu discurso, Anabela Veloso homenageou, ainda, José Carlos Resende, primeiro Bastonário da OSAE, que faleceu em 2024: “O seu legado é parte da nossa identidade — a força, a dedicação e o sentido de missão com que serviu a Ordem e o país”. Depois, convidou o filho, João Resende, a subir ao palco, entregando-lhe uma peça simbólica de agradecimento em nome de todos os Solicitadores e Agentes de Execução, que aplaudiram entusiasticamente.

filho de

Solicitadores: inovação, modernização e proximidade

Durante a tarde, os trabalhos dividiram-se entre a Arena d’Évora e o Hotel M’AR De Ar Muralhas, onde decorreram, respetivamente, os painéis dedicados aos Solicitadores e aos Agentes de Execução.

Na Arena d’Évora, a sessão “Parceria Estratégica: Solicitadores na modernização dos serviços públicos” iniciou-se com a intervenção de Isabel Sousa, Product Manager na Agência para a Reforma Tecnológica do Estado (ARTE), que apresentou a plataforma Mosaico, uma ferramenta criada pela ARTE com o objetivo de padronizar, simplificar e melhorar a experiência dos cidadãos nos serviços públicos.

“É um motor para simplificação. Todas as pessoas beneficiam do Mosaico — sobretudo as entidades —, que passam a compreender melhor, por exemplo, a legislação e as necessidades dos utilizadores”, sublinhou Isabel Sousa.

Seguiu-se o primeiro debate da tarde. Moderado por Pedro M. Santos, Solicitador, contou com a participação de Luís Goes Pinheiro, Coordenador-Geral da Estrutura de Missão para a Recuperação de Processos Pendentes na AIMA, Ricardo Torres, Chefe de Divisão da Área de Gestão do Património da Autoridade Tributária e Aduaneira, Paula Galhardas, Conservadora e Coordenadora do Ciclo de Vida do Prédio do Instituto dos Registos e do Notariado, e Isabel Sousa.

Durante o debate, Luís Goes Pinheiro destacou o trabalho já desenvolvido pela AIMA, em resultado do protocolo assinado com a OSAE, revelando que “60.000 processos já foram entregues a Solicitadores, dos quais 94% estão em execução”. Tal “evidencia a capacidade de resposta e eficácia destes profissionais na recuperação de processos”.

Por sua vez, Paula Galhardas reconheceu o papel de proximidade da profissão: “Os Solicitadores são parceiros estratégicos. São, sem dúvida, a ponte entre as necessidades da Administração Pública e o cidadão.”

Ricardo Torres destacou o esforço crescente para tornar os serviços públicos mais acessíveis e ágeis: “Há uma disponibilização crescente de serviços ao público para que as situações sejam tratadas de forma mais célere, sem necessidade de apoio presencial. O que realmente importa é a melhoria e a acessibilidade para todos os cidadãos.”

O segundo debate, moderado pelo Solicitador Leandro Siopa, centrou-se na regularização fundiária e urbanística, uma área em que o papel dos Solicitadores tem ganhado crescente relevância.

O painel contou com as intervenções de Silvério Regalado, Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Blandina Soares, Coordenadora da Estrutura de Missão do BUPi, e Mónica Jardim, Presidente da Direção do Centro de Estudos Notariais e Registais.

Durante a sua intervenção, Silvério Regalado salientou o contributo dos Solicitadores: “Para termos um país melhor, onde seja possível identificar o nosso território, é fundamental o trabalho desempenhado por estes profissionais. A OSAE é uma ponte entre a Justiça e os cidadãos, que tem respondido de forma inteligente e atenta aos desafios atuais.”

Sessão “Parceria Estratégica: Solicitadores na modernização dos serviços públicos”

Anabela Veloso
O
José Carlos Resende subiu ao palco para receber uma peça simbólica de agradecimento em nome de todos os Solicitadores e Agentes de Execução
Tomada de posse dos membros da Assembleia de Representantes do Colégio Profissional de Agentes de Execução

Blandina Soares reforçou a importância da colaboração entre o BUPi e os profissionais da OSAE, sublinhando que “os Solicitadores têm contribuído muito em matéria de Representação Gráfica Georreferenciada, assim como na regularização fundiária”.

Já Mónica Jardim recordou o percurso pioneiro da OSAE na área cadastral: “Antes do BUPi, já os Solicitadores tinham o GeoPredial, um projeto pensado e inovador. Foram verdadeiros pioneiros no levantamento cadastral.”

O debate evidenciou, assim, que os Solicitadores desempenham um papel fundamental na aproximação entre o cidadão e a Administração Pública, contribuindo para um sistema mais transparente, acessível e moderno.

Agentes de Execução: tecnologia e eficiência

Já no Hotel M’AR De Ar Muralhas, os Agentes de Execução concentraram-se em temas diretamente ligados à sua prática. O primeiro debate, “Inovar na Citação Executiva: Eficiência, Garantia e Cooperação Internacional”, moderado por Ana Tomé, Agente de Execução, contou com as intervenções de Miguel Vara, Chefe da Divisão de Cooperação Judiciária Internacional da Direção-Geral da Administração da Justiça, Susana Antas Videira, Diretora-Geral da Direção-Geral da Política de Justiça, e Elisabete Nogueira, Juíza de Direito. A inovação na citação executiva e a importância da cooperação internacional foram discutidas como fatores-chave para a modernização e eficácia das execuções.

O painel teve início com uma demonstração, feita por Miguel Vara, da plataforma e-CODEX, um sistema computorizado para a troca de dados, via eletrónica, na área da cooperação judiciária civil e criminal, utilizado pelos Estados-membros da União Europeia.

A inovação continuou a ser debatida por Susana Antas Videira: “Um aspeto que gostaria de destacar é o impulso que os Agentes de Execução procuram transmitir à ação executiva”, salientou. Depois, abordou as vantagens da citação eletrónica. Na sua perspetiva, “a citação é a pedra angular do processo”.

Opinião que foi partilhada por Elisabete Nogueira: “A citação é um ato crucial e tem de se ter muito cuidado com ele. Temos de ter a segurança de que a pessoa foi citada”, considerou. Sobre a citação eletrónica, a magistrada reconheceu que há vantagens e desvantagens nesse novo regime.

De seguida, no debate “Modernizar a Venda Executiva: Inovação ao Serviço da Justiça”, moderado pelo Agente de Execução David Lemos Morgado, foram destacadas novas formas de tornar o processo de venda executiva mais eficiente e transparente.

Este momento contou com as contribuições de Armando A. Oliveira, Solicitador e Agente de Execução,

Renato Gonçalves, Presidente da Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça, e Maria Helena Canelas, Juíza Desembargadora.

“A entrada do leilão eletrónico foi uma das grandes mudanças que permitiu a credibilização da venda executiva”, começou por referir Armando A. Oliveira. No entanto, para o Solicitador e Agente de Execução ainda há muito a fazer no que toca à modernização do sistema. Renato Gonçalves acrescentou que “temos uma plataforma que potenciou a recuperação de ativos como nenhuma outra e isso é muito significativo. Por isso, devemos construir o que houver para construir, adaptar à modernidade, sem nunca perder a essência do e-Leilões”. Para Maria Helena Canelas, “a modernização dos métodos tradicionais de venda executiva é essencial para garantir maior celeridade e justiça ao processo executivo”.

Terminados os debates, e dando continuidade ao programa, procedeu-se à apresentação, discussão e votação das propostas das 2.ª e 3.ª secções.

Findo o primeiro dia de trabalhos, faz-se um balanço bastante positivo deste evento, marcado por inúmeras oportunidades de enriquecimento pessoal e profissional e por momentos vários de confraternização, troca de conhecimentos e partilha de experiências entre os participantes.

Debate “Regularização Fundiária e Urbanística: Intervenção do Solicitador”
Debate “Inovar na Citação Executiva: Eficiência, Garantia e Cooperação Internacional”
Debate “Modernizar a Venda Executiva: Inovação ao Serviço da Justiça”

Digitalização, cibersegurança e novas gerações

Na última manhã de trabalhos do IX Congresso, Andreia Viana Silva, Presidente da Comissão de Apoio aos Jovens da OSAE, começou por abrir a discussão sobre a importância da construção de redes e da criação de comunidades. Este painel reuniu Abílio Silva, Conservador e Coordenador do Ciclo de Vida da Empresa do Instituto de Registos e do Notariado, Suzana Costa, Advogada, e Carlos Neves, Solicitador.

Abílio Silva abordou o processo de registo das sociedades disciplinares, multidisciplinares e as suas vicissitudes: “Quando constituem uma sociedade profissional, têm de o fazer cumprindo os prazos, ao contrário das sociedades que se assumem como sociedades comerciais. Nas sociedades civis, as pessoas têm de fazer o registo no ficheiro central de pessoas coletivas”.

Já Suzana Costa trouxe, como tema principal, a transparência fiscal e as várias possibilidades de sociedades que se podem e devem ter para que haja essa transparência. “É em rede e a partilhar experiências que constituímos o nosso negócio e a nossa profissão”, referiu.

Por outro lado, Carlos Neves debateu a questão do networking, reconhecendo os seus benefícios na profissão: “A partilha de conhecimentos é essencial na área da Solicitadoria. Para mim, o networking traduz-se em trabalhar a rede de contactos. E isso é a chave de sucesso nesta profissão. Deve haver uma troca de conhecimentos para se conseguir alcançar o sucesso.”

A manhã prosseguiu com o debate “Modernização. Digitalização. Cibersegurança.”, integrado no tema “Profissionais de confiança na evolução da Justiça”.

para sermos juristas, mais humanos e mais cidadãos.”

Na sua opinião, a transformação digital não deve ser vista apenas como um processo técnico, mas como uma mudança estrutural na forma como os serviços jurídicos são prestados e compreendidos.

Armando Veiga fez um balanço da aplicação do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) nos últimos sete anos. De acordo com a sua análise, há uma dificuldade em encontrar a finalidade do tratamento dos dados. Referenciou ainda que os Solicitador podem efetuar o tratamento de dados pessoais do seu cliente através de um software de gestão de clientes, dependendo do interesse e enquadramento legítimo. Já os Agentes de Execução “que têm uma plataforma própria de apoio à atividade, podem recorrer à legitimação para o uso de dados dos seus clientes”.

A questão da cibersegurança mereceu particular atenção, com enfoque na necessidade de políticas eficazes que assegurem a proteção dos sistemas e a confiança dos cidadãos. Nesse sentido, David Lopes recordou algumas das plataformas que têm contribuído para a digitalização dos serviços. “O SISAAE, criado em 2003, permitiu o transporte da informação entre vários organismos para tramitação dos processos judiciais pelos Agentes de Execução, sem qualquer documento físico. Destaco também o e-Leilões, que permite que qualquer pessoa, onde quer que esteja geograficamente, em Portugal, consiga licitar. “

O debate reforçou que os Solicitadores e Agentes de Execução são atores centrais na evolução da justiça digital, combinando experiência, ética e responsabilidade no uso das novas tecnologias ao serviço do cidadão e da eficiência do sistema.

O painel reuniu Eduardo Vera-Cruz Pinto, Diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Armando Veiga, Diretor da Licenciatura em Solicitadoria e Administração do Coimbra Business School | ISCAC, Nuno Guimarães, Vogal da Direção do Centro de Investigação Jurídica do Ciberespaço da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, e David Lopes, IT Service Manager da Comissão Europeia. A moderação ficou a cargo de Susana Almeida, Provedora dos Destinatários dos Serviços da OSAE.

Durante a sessão, foram debatidos os principais desafios e oportunidades da digitalização na Justiça, desde a necessidade de garantir a segurança e a confidencialidade dos dados, até à importância de preparar os profissionais para novas realidades tecnológicas e jurídicas, bem como os seus desafios.

Na ótica de Eduardo Vera-Cruz Pinto, “não havendo um conceito jurídico de ciberespaço, não havendo um conceito jurídico de inteligência artificial, parece-me que o que podemos fazer com a digitalização é usufruir da liberdade que daí advém. Usufruirmos de mais tempo

A manhã encerrou-se com a apresentação, discussão e votação das propostas de recomendação da 1.ª secção.

Inteligência Artificial e ética profissional

Depois do almoço, a tarde voltou a ser repleta de debates, apresentações e momentos de grande simbolismo para a classe.

O painel subordinado ao tema “Justiça e Futuro: A inteligência artificial decidiu, está decidido?”, abriu espaço para uma reflexão profunda sobre o impacto da tecnologia e da inteligência artificial (IA) na Justiça e nas profissões jurídicas. O debate contou com a presença de Anabela Veloso, Bastonária da OSAE, João Massano, Bastonário da Ordem dos Advogados, Jorge Batista da Silva, Bastonário da Ordem dos Notários, Paula Franco, Bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados, e Hugo Santos, membro da Direção Regional do Sul da Ordem dos Psicólogos.

Os intervenientes abordaram os desafios éticos e prá-

Painel que abriu a discussão sobre a importância da construção de redes e da criação de comunidades
Debate “Modernização. Digitalização. Cibersegurança.”
Painel subordinado ao tema “Justiça e Futuro: A inteligência artificial decidiu, está decidido?”

ticos que a automatização e o uso da IA colocam às profissões liberais, sublinhando a importância de garantir que a tecnologia seja um instrumento de apoio e não de substituição da decisão humana. “A inteligência artificial deve servir a Justiça, mas nunca substituir a consciência e o discernimento humano”, sublinhou a Bastonária Anabela Veloso, destacando o papel da responsabilidade e da formação contínua neste novo contexto digital.

Opinião que foi partilhada pelo Bastonário da Ordem dos Advogados: “Não posso aceitar que seja uma máquina a avaliar se o que aquela pessoa está a dizer é verdade ou não. Sem dúvida que a IA é uma mais-valia, mas há situações que não podem substituir o homem”, sublinhou João Massano. Além disso, e no seu ponto de vista, o uso da IA deve ser bem regulado, de modo a salvaguardar questões como a proteção de dados e o sigilo.

Já Jorge Batista da Silva reconheceu que há partes da atividade jurídica que vão ser automatizadas. Como o Bastonário observou, “a tecnologia não substituirá o Notário, o Solicitador ou o Advogado, mas transformará profundamente a forma como o Direito é praticado”. No seu discurso, sublinhou que tarefas repetitivas e de baixa complexidade tendem a ser assumidas por sistemas de IA, enquanto o trabalho humano se concentrará em funções estratégicas e interpretativas.

A Bastonária Paula Franco reiterou a ideia elencada pelos anteriores oradores: “Considero que devemos aproveitar todas as ferramentas ao nosso alcance para simplificar a vida. Devemos aproveitar esta oportunidade no seu potencial máximo. Com todos os cuidados e, acima de tudo, sem nunca deixarmos de ter massa crítica”.

Enquanto Psicólogo, Hugo Santos refletiu sobre as consequências positivas e negativas que as novas tecnologias trazem ao ser humano: “É certo que a tecnologia pode aproximar e facilitar a vida das pessoas, mas também pode afastar o indivíduo de si mesmo e dos outros, se usada de forma excessiva ou inconsciente”.

Dando continuidade ao programa, teve lugar a apresentação das propostas do Congresso, conduzida por Anabela Veloso e pelos presidentes dos Conselhos Profissionais dos Colégios dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, Francisco Serra Loureiro e Mara Fernandes, respetivamente. Os relatores Victor Cardoso, Luís Ferreira e Bárbara Filipa Pinheiro apresentaram as conclusões e recomendações resultantes dos trabalhos das diversas sessões.

Seguiu-se a votação das conclusões do Congresso, momento de grande relevância institucional, onde os participantes ratificaram as propostas que irão orientar a ação futura da OSAE.

A tarde continuou com a entrega do Prémio Daniel Lopes Cardoso, um momento de homenagem e reconhecimento à dedicação e ao mérito profissional. Os vencedores foram:

1.º Classificado: Rui Miguel Simão, com o trabalho

“Ativos digitais no direito civil: Da invisibilidade à tutela jurídica”

2.º Classificado: Daniela Vilaça, com o trabalho “O certificado sucessório europeu”

3.º Classificado: Beatriz Leal Rego, com o trabalho “Do conservadorismo ético à inovação tecnológica: a deontologia das profissões jurídicas perante a inteligência artificial”

Menção Honrosa: Raquel Alexandra Sousa de Sá, com o trabalho “O contrato de fornecimento de conteúdos e serviços digitais: uma análise do quadro legal europeu e nacional”

Decorreu também a entrega de um cheque de donativos, recolhidos durante o IX Congresso, à associação

Pão e Paz.

Encerramento e compromisso com o futuro

O encerramento do Congresso contou com a presença de várias personalidades de relevo, entre as quais a Presidente do Conselho Regional de Lisboa da OSAE, Débora Riobom dos Santos, o Presidente da Câmara Municipal de Évora, Carlos Pinto de Sá, o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, Luís Azevedo Mendes, a Bastonária da OSAE, Anabela Veloso, e o Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, Gonçalo da Cunha Pires. Nesta sessão, que marcou o final dos trabalhos, os discursos sublinharam a importância da OSAE no diálogo interprofissional e na modernização do sistema de Justiça, sempre com o cidadão no centro das decisões. Débora Riobom dos Santos iniciou a cerimónia felicitando a enorme participação nesta iniciativa que se realiza de quatro em quatro anos: “O Congresso é o evento mais importante da nossa classe. Visa pensar as pequenas e as grandes questões de natureza jurídica e preparar recomendações que serão apresentadas à tutela. A participação dos nossos associados é, por isso, fundamental.”

Entrega do Prémio Daniel Lopes Cardoso
Votação das conclusões do Congresso

Carlos Pinto de Sá felicitou a escolha de Évora como cidade acolhedora deste Congresso, sublinhando que “Évora tem sabido afirmar-se como um espaço de encontro, conhecimento e partilha, reunindo condições únicas para acolher eventos de grande relevância nacional e internacional”.

Também Luís Azevedo Mendes deu os parabéns à OSAE e à sua Bastonária: “Saúdo este IX Congresso e o seu programa, que percorreu os principais temas da atualidade para os Solicitadores, para os Agentes de Execução, para a Justiça e para os cidadãos.”

A adivinhar o final dos trabalhos, Anabela Veloso dirigiu palavras emocionadas de agradecimento a todos os que participaram naquele evento e fizeram dele um sucesso. “É com enorme honra e emoção que encerramos o IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução. Évora foi casa do diálogo, da reflexão e da afirmação do papel das nossas profissões na construção de uma Justiça mais moderna, mais acessível e mais justa”, começou por referir. Depois, dirigindo-se particularmente a Gonçalo da Cunha Pires, Anabela Veloso enumerou as prioridades e compromissos que gostaria de ver alcançados entre a OSAE e a tutela. A revisão do Estatuto da OSAE, a revisão urgente das tabelas de honorários dos Agentes de Execução, o reforço da colaboração institucional com a Autoridade Tributária, o IRN e a AIMA e o aumento de competências dos associados foram alguns dos exemplos salientados. “A OSAE quer continuar a ser parceira do Ministério da Justiça – sempre com diálogo, transparência e cooperação”, sublinhou. E foi com o discurso de Gonçalo da Cunha Pires que se deu por concluída a sessão: “É com grande honra que participo nesta cerimónia de encerramento. Invocamos não apenas uma profissão, mas o serviço público que a todos presta, com profissionalismo, rigor e humanidade. Agradeço o vosso trabalho quotidiano para que a Justiça chegue a todos nós”.

Assim terminou o segundo dia do IX Congresso da OSAE, não sem antes os participantes se reunirem num jantar de gala, que se pautou pela animação e pelo convívio. No final, o balanço só podia ser positivo, já que foi reafirmando o compromisso da Ordem com uma Justiça mais próxima, eficiente e preparada para os desafios tecnológicos do século XXI.

Entre a História e a Justiça

O último dia do Congresso celebrou-se no Palácio de D. Manuel. A manhã iniciou-se com a Assembleia de Representantes da OSAE, seguindo-se a sessão “Segredos de Évora: entre a História e a Justiça”, que convidou os participantes a uma viagem pelo centro histórico da cidade.

O encerramento fez-se num brunch de convívio, que simbolizou o espírito de união e partilha que marcou estes dias do IX Congresso.

No final, entre a História e a Justiça, de Évora ficou a certeza de que cada encontro nos aproxima de um futuro mais coeso, humano e colaborativo.

Anabela Veloso, Gonçalo da Cunha Pires, Luís Azevedo Mendes, Carlos Pinto de Sá e Débora Riobom dos Santos
Assembleia de Representantes da OSAE
Cerimónia de Encerramento
Viagem pelo centro histórico de Évora
“Estamos muito empenhados em poder dar o nosso contributo positivo para o sistema de Justiça”

Susana Antas Videira

Diretora-geral da Direção-Geral da Política de Justiça

Mais de uma década após a sua primeira passagem pela Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ), Susana Antas Videira regressa à liderança deste organismo central do Ministério da Justiça com uma visão renovada, mas fiel ao propósito de colocar o conhecimento e o trabalho técnico ao serviço de uma Justiça mais eficaz, transparente e próxima dos cidadãos. Nesta entrevista, a Diretora-geral reflete sobre o significado deste regresso e sobre o percurso da instituição, destacando o papel fundamental da produção e análise estatística na formulação de políticas públicas baseadas em evidências, o reforço da cooperação internacional e o investimento contínuo na digitalização e modernização dos serviços da Justiça.

Ao longo da conversa, Susana Antas Videira aborda também a importância dos meios complementares de resolução de litígios enquanto respostas de proximidade e acessibilidade, explicando o alcance do recente protocolo celebrado entre a DGPJ e a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE).

O contributo da Justiça portuguesa no panorama europeu e internacional também não é esquecido, assim como o valor da colaboração entre instituições e o papel transformador da comunicação clara e da inovação tecnológica na relação entre a Justiça e os cidadãos.

O resultado é um retrato abrangente de uma Justiça em constante evolução, sustentada na evidência, na cooperação e na confiança, valores que a Diretora-geral assume como centrais na missão da DGPJ.

Entrevista Joana Gonçalves / Fotografia Rui Santos Jorge

Volvidos mais de 10 anos desde que foi Diretora-geral da Direção-Geral da Política de Justiça, como é o regressar a essa instituição?

É, sem dúvida alguma, um gosto e uma honra poder estar à frente de uma instituição que assume, pelas suas atribuições e competência, um papel tão importante e tão central no Ministério da Justiça (MJ).

A minha primeira passagem, iniciada em 2013 e concluída em 2018, aconteceu num contexto especialmente complexo para o país e para a Justiça, marcado, a partir de meados de 2011 pelo ajustamento económico e financeiro a Portugal.

Creio que a colaboração técnica da DGPJ, dentro da área governativa da Justiça, na implementação do memorando de entendimento com a Troika, redundou em anos de muito esforço, muito trabalho, mas que, em articulação com os demais organismos, conduziu à concretização de várias medidas estratégicas com vista ao melhor funcionamento da Justiça.

E quando assim é, conhecendo esta instituição como uma casa viva, com diversas valências e com recursos humanos muito dedicados, é também muito estimulante poder voltar a dirigir a DGPJ, numa altura em que muito mudou no país e no mundo, mas em que o desígnio do nosso trabalho se mantém: colocar o nosso conhecimento e o nosso trabalho ao serviço da Justiça.

Mas a academia continua a ter um papel importante na sua vida?

Como não podia deixar de ser.

São já quase 30 anos de docência universitária, que permitem, para além da investigação e da transmissão do saber jurídico, o que a minha profissão tem, para mim, de mais gratificante e compensador: o contacto com os estudantes, auxiliando-os, no seu percurso académico, a conhecer e a pensar o “Direito”.

Acompanhar as diversas gerações de estudantes também nos molda como profissionais, permitindo olhar para os problemas e pensar nas soluções de uma forma ampla e abrangente. É um lugar comum, mas absolutamente verdadeiro: a ensinar muito se aprende…

E é essa possibilidade de olhar para os problemas e pensar em soluções que também a move?

Naturalmente. Numa área tão relevante para os cidadãos, como é a da Justiça, e simultaneamente, num tempo de incertezas e de transformações aceleradas, é importante estarmos prontos a enfrentar os desafios com que nos deparamos. E com o capital humano qualificado que a Justiça dispõe, queremos muito, na DGPJ, desenvolver trabalho nesse prisma.

Para encontrar soluções que, na prossecução da nossa missão, possam ser sólidas e o mais consensuais possível, entendo que devem ser percorridas várias etapas

que permitam robustecer os trabalhos a desenvolver: pensar, conhecer, testar e avaliar.

Então o acompanhamento das políticas públicas da área da Justiça beneficia desses eixos de atuação?

Mais do que eixos de atuação, faz parte da missão da DGPJ. Entre as várias valências da DGPJ está precisamente o apoio técnico, acompanhamento e monitorização das políticas no âmbito da Justiça, propondo e elaborando estudos gerais de política legislativa.

E esta é uma atividade que queremos muito impulsionar, aproveitando o facto de, no quadro do sistema estatístico nacional, sermos também responsáveis pela informação estatística da área da justiça.

A informação quantitativa de qualidade é indispensável na definição e depois na condução das políticas públicas, sobretudo nesta área. Permite promover estudos tendentes à formulação de políticas públicas baseadas em evidências, possibilitando a definição, pelo decisor político, de prioridades estratégicas e a monitorização e avaliação do impacto normativo de medidas implementadas. O acompanhamento das políticas públicas na Justiça, em especial, no que respeita aos tribunais, deve estar permanentemente interligado à monitorização constante da respetiva informação estatística, em especial, no que respeita a alterações de maior densidade, para que se possa detetar, o mais precocemente possível, os constrangimentos, uma vez que se estes não forem conhecidos, então a monitorização cede. E, com isso, não se poderiam avaliar os resultados e, consequentemente, aferir e propor os caminhos de atuação passíveis de os superar.

De que forma os dados estatísticos produzidos pela DGPJ podem apoiar a definição de políticas públicas mais eficazes na área da Justiça?

A análise desta informação mostra-se fundamental para permitir antecipar e compreender alterações no sistema de Justiça, avaliando se podem ser conjunturais ou estruturais, com informação rigorosa e credível. Com esta visão, é possível estudar esses fenómenos de forma a poder conceber, elaborar e difundir instrumentos de planeamento e de avaliação das políticas desenvolvidas no âmbito do MJ.

O Sistema de Informação das Estatísticas da Justiça (SIEJ) é, de facto, uma importantíssima ferramenta de planeamento, gestão e avaliação do sistema de Justiça e, por essa via, de promoção da sua qualidade.

O recurso a esta fonte de dados possibilita, por exemplo, contrapor ou confirmar perceções e mitos, por intermédio de informação quantificada. Tal permite que as decisões se baseiem em evidências e se orientem para resultados.

É certo que procuramos sempre melhorar e inovar tecnologicamente, de forma a obter mais informação:

É muito estimulante poder voltar a dirigir a DGPJ, numa altura em que muito mudou no país e no mundo, mas em que o desígnio do nosso trabalho se mantém: colocar o nosso conhecimento e o nosso trabalho ao serviço da Justiça

tísticos contribuem para o reforço da transparência e da confiança nas instituições, mas também permitem algo muito importante, em especial no quadro europeu: comparabilidade.

Por um lado, diria que os dados disponíveis no SIEJ permitem conhecer uma parcela muito relevante do setor e diagnosticar problemas atempadamente, através de ferramentas como a análise do movimento e da duração processual, do cálculo de indicadores de desempenho ou da caracterização e distribuição territorial dos dados disponíveis.

O âmbito dos dados disponíveis no SIEJ abrange, já hoje, para além dos tribunais, os registos e notariado, as polícias e entidades de apoio à investigação, entre outros domínios relevantes, sendo que esses mesmos dados podem sustentar medidas legislativas ou administrativas em áreas conexas aos tribunais (que são, porventura, a área mais visível da Justiça).

Por outro lado, a existência das estatísticas produzidas pela DGPJ possibilita, adicionalmente, a comparabilidade dos dados no contexto de organismos supranacionais (como a CEPEJ ou a OCDE). Tal permite avaliar a posição de Portugal num quadro mais alargado, ao mesmo tempo que promove a cooperação interinstitucional e o alinhamento com boas práticas internacionais.

Uma das áreas de que a DGPJ se ocupa é a das relações internacionais, sendo que este ano se assinalam os 45 anos da institucionalização das relações internacionais da Justiça portuguesa. Quais considera terem sido os principais fatores que permitiram a Portugal consolidar a sua presença no panorama europeu e internacional?

estamos, por exemplo, a desenvolver uma plataforma de indicadores, estatísticas e dados abertos da Justiça. Estamos, ainda, a trabalhar na melhoria do sistema de monitorização de inquéritos de satisfação aos utentes e colaboradores do sistema de Justiça, desenvolvendo trabalhos que permitam tornar mais célere a aplicação de inquéritos de satisfação e a respetiva análise, no sentido de proceder à sua automatização, através da construção de uma ferramenta de análise e produção de relatórios que careçam de menor intervenção humana do que os que são produzidos atualmente, com relevância na monitorização de desempenho do sistema de justiça.

A publicitação de dados estatísticos é também uma forma de reforçar a transparência da Justiça. De facto, a produção e a divulgação de dados esta-

Creio que o percurso que Portugal tem trilhado no domínio das relações internacionais da Justiça assenta em três pilares essenciais, que ao longo do tempo se revelaram determinantes para a consolidação da nossa credibilidade externa. Em primeiro lugar, destaco, novamente, o capital humano que soubemos valorizar e projetar. Ao longo destas quatro décadas e meia, foram muitos os profissionais altamente qualificados — magistrados, académicos, técnicos e especialistas — que colocaram ao serviço do país não apenas um profundo conhecimento técnico, mas também uma notável capacidade de adaptação e de leitura dos contextos internacionais. Essa dedicação, pautada pela discrição, pelo rigor e pelo espírito de serviço público, permitiu que Portugal ganhasse reputação como um interlocutor fiável e respeitado. Em segundo lugar, sublinho a articulação estreita e permanente com as instâncias nacionais e internacionais. A coordenação entre diferentes entidades e setores internos foi essencial para que o país pudesse apresentar posições consistentes, devidamente alinhadas com os seus compromissos externos e capazes de transmitir

uma imagem de confiança e previsibilidade. Essa coesão interna refletiu-se, naturalmente, no exterior, onde Portugal soube afirmar uma voz coerente e empenhada, contribuindo para soluções equilibradas e sustentáveis em múltiplos fóruns internacionais.

Por último, considero fundamental a capacidade de conjugar tradição e inovação. Portugal construiu a sua identidade internacional enquanto parceiro construtivo, que valoriza o diálogo e a partilha de boas práticas, mas que, em simultâneo, se mantém aberto a aprender e a

A cooperação entre a DGPJ e a OSAE, no plano internacional, tem permitido projetar de forma credível e eficaz a realidade portuguesa, contribuindo para o enriquecimento do debate europeu e internacional e reforçando a posição de Portugal como um Estado-membro empenhado, inovador e construtivo.

acolher experiências de outros sistemas jurídicos. Esta flexibilidade, aliada ao respeito pela nossa herança jurídica e cultural, tem permitido que o país seja visto como uma ponte entre diferentes realidades, desempenhando um papel facilitador em negociações complexas.

A combinação destes fatores explica por que motivo, ao longo de 45 anos, Portugal conseguiu consolidar uma presença credível, respeitada e influente nos panoramas europeu e internacional da Justiça.

No domínio de atuação específico da OSAE, como tem a DGPJ cooperado na esfera das relações internacionais?

A cooperação com a OSAE na área internacional tem sido particularmente profícua e representa um exemplo concreto de como a articulação entre entidades nacionais permite projetar Portugal com eficácia nos fóruns internacionais da Justiça.

No plano europeu, a OSAE tem tido uma participação ativa, direta ou por intermédio de organizações representativas do setor, em múltiplos trabalhos no seio do Conselho da Europa. Destaco, em especial, a colabora-

ção na CEPEJ, na qual a representação portuguesa é assegurada pela DGPJ.

Nesse contexto, a OSAE tem dado, diretamente ou por via das instâncias em que se encontra representada, contributos relevantes para a elaboração de documentos de trabalho sobre execução, trazendo a experiência prática dos profissionais que estão no terreno e permitindo que as soluções internacionais tenham em conta a realidade concreta da função notarial e das funções de agente de execução.

Também no espaço da União Europeia a colaboração tem sido de grande importância. Sob a coordenação da DGPJ, a OSAE tem sido chamada a intervir em diferentes fases do processo legislativo e de implementação. Na fase de negociação, a OSAE tem contribuído para a preparação da posição nacional em matérias particularmente relevantes. Recordo, a título de exemplo, a proposta de diretiva destinada a harmonizar aspetos substantivos do direito da insolvência, que contou com contributos substanciais da OSAE, enriquecendo a posição portuguesa com perspetivas técnicas e práticas.

Na fase de aplicação do acervo da União Europeia, a sua colaboração continua a ser determinante para garantir que a transposição e a execução refletem adequadamente as especificidades nacionais.

Neste momento, destaco ainda a participação da OSAE, em conjunto com outros atores da Justiça, nos comités responsáveis pela implementação do Pacote Europeu da Digitalização da Justiça. Este pacote legislativo, composto por um regulamento e por uma diretiva, visa a digitalização de mais de 20 instrumentos de cooperação judiciária, promovendo a interoperabilidade entre sistemas de justiça dos diferentes Estados-membros. O envolvimento da OSAE assegura que as áreas de sua competência estão devidamente representadas e que as soluções propostas têm em consideração a realidade prática do exercício profissional.

Em suma, a cooperação entre a DGPJ e a OSAE, no plano internacional, tem permitido projetar de forma credível e eficaz a realidade portuguesa, contribuindo para o enriquecimento do debate europeu e internacional e reforçando a posição de Portugal como um Estado-membro empenhado, inovador e construtivo.

Também nesta área das relações internacionais da Justiça, terá sentido diferenças entre a primeira e a segunda vez em que é Diretora-Geral da DGPJ?

Efetivamente, como já referido, em 2013 estávamos num período de intervenção das três instituições internacionais com as quais Portugal havia assinado o Memorando de Entendimento. O período da intervenção da Troika foi, naturalmente, marcado por fortes condicionamentos financeiros e institucionais, que também se refletiram nas relações internacionais da Justiça.

Na altura, Portugal enfrentava o desafio de conciliar a necessidade de implementar reformas estruturais impostas pelo programa de ajustamento económico com a obrigação de manter uma presença ativa e credível nos fóruns internacionais. A atuação da Justiça portuguesa nesse contexto visava demonstrar estabilidade, capacidade de cumprimento e compromisso com os valores europeus e da ordem internacional, expressando convictamente a intenção de cumprimento das obrigações a que estávamos sujeitos. As prioridades estavam fortemente centradas na credibilidade externa do país e na recuperação da confiança das instituições europeias e internacionais.

Hoje, a situação é bastante distinta. Portugal apresenta-se no panorama internacional em condições muito mais sólidas, com maior margem de iniciativa e capacidade de influência. Já não estamos num registo de resposta a exigências externas, mas num quadro de afirmação proativa, em que podemos projetar a nossa experiência, propor soluções inovadoras e participar com maior autoridade nos debates multilaterais.

Atualmente, os desafios são, entre outros, reforçar a cooperação, enfrentar os novos fenómenos de criminalidade transnacional e contribuir de forma ativa para a construção de políticas de Justiça europeias mais integradas e eficazes, tendo em mente a simplificação da vida dos cidadãos e das empresas e a promoção do crescimento económico.

Outra diferença significativa prende-se com a nossa capacidade de promover cooperação para o desenvolvimento, especialmente no espaço da CPLP. Hoje temos maior disponibilidade para apoiar os países de língua portuguesa no reforço das suas instituições judiciais, na partilha de boas práticas e na capacitação técnica, fortalecendo os laços históricos e culturais que nos unem. Este é um domínio em que temos procurado desempenhar um papel de charneira, em articulação com parceiros multilaterais e contribuindo para que a Justiça seja também um instrumento de desenvolvimento sustentável e de aproximação entre povos. Com efeito, não podemos esquecer que a Justiça tem um papel de grande relevo, ao contribuir para o robustecimento das instituições democráticas e para a consolidação do Estado de Direito nas diferentes geografias, especialmente nas que falam Português.

No passado dia 16 de setembro, decorreu, na sede da OSAE, uma sessão de divulgação dos Meios Complementares de Resolução Alternativa de Litígios (RAL), culminando com a assinatura de um protocolo entre a DGPJ e a OSAE. Que significado teve para si este momento de cooperação institucional? Este evento integrou-se numa série de iniciativas de divulgação e promoção dos meios RAL que a DGPJ tem

vindo a promover, de forma consistente, no exercício das suas competências quanto a estas soluções de Justiça, uma vez que é a entidade do MJ que tem, entre as suas muitas atribuições, a de apoiar a criação, o desenvolvimento e o desempenho de meios RAL, designadamente a Mediação, a Conciliação e a Arbitragem, bem como as entidades que os promovem, e, neste caso, com relevo muito particular para os Julgados de Paz.

E foi com particular satisfação que testemunhámos a forma como a OSAE se associou a este desígnio, que se percebeu, partilhado: tornar estas respostas de Justiça conhecidas de todos quantos possam um dia beneficiar delas e que, em tese, são todos os cidadãos, todas as empresas, mas, muito particularmente, também todos os profissionais que lhes prestem consulta ou os representem. Com efeito, das profícuas conversações que a DGPJ tem mantido com a OSAE tem resultado muito claro que esta Ordem profissional reconhece o valor e a utilidade destas respostas de justiça a que, em especial, os Solicitadores podem e devem recorrer em múltiplas situações, oferecendo-lhes celeridade, acessibilidade (também do ponto de vista económico) e especialização, que são características fulcrais deste tipo de respostas. O evento em referência teve, assim, também, o valor, mais do que simbólico de prestar público testemunho do compromisso da OSAE para com os meios RAL. “Mais do que simbólico”, quero realçar: porque vertido em consequências práticas de enorme valor para a população, como a disponibilização, no centro da cidade de Lisboa, de salas dedicadas ao desenvolvimento de sessões de mediação no contexto dos sistemas públicos de mediação geridos pelo MJ através da DGPJ, concretamente o Sistema de Mediação Familiar. E assim se dá mais um relevante passo com vista à materialização da “proximidade”, como valor seguro destes meios.

Qual o papel dos Julgados de Paz e da Mediação Familiar como mecanismos alternativos à via judicial tradicional?

Antes de mais, gostaria de sublinhar o atributo de complementaridade, porventura sobrepondo-se ao de pura alternatividade, que reconheço a estes meios, no quadro geral das respostas de justiça. E passo a esclarecer, exatamente por referência à Mediação. Se tomarmos por referência, por exemplo, a Mediação Familiar, constatamos que a esmagadora maioria dos acordos celebrados em tal contexto reclamam, nos termos da lei, uma homologação obrigatória, seja por parte de Juiz ou de um Conservador do Registo Civil. E, nesta medida, a Mediação surge como um meio complementar, que não puramente alternativo, na aceção de “excludente” da resposta, designadamente judicial. Contudo, a sua importância, mesmo como meio complementar, é enorme, pois que um acordo celebrado em contexto de

mediação é um documento que foi construído pelas partes a quem se assaca o seu cumprimento: reflexo exato das suas vontades, preocupações e condicionamentos, construído com respeito pelos seus tempos de reflexão, e, por conseguinte, com um potencial incomparável de estrito cumprimento em comparação com uma qualquer outra solução imposta por um terceiro – ainda que esse terceiro seja um Juiz (independentemente da legitimidade que lhe assiste).

Já não será assim no que respeita à mediação desenvolvida no contexto do Sistema de Mediação Laboral ou nos processos dos Julgados de Paz: aí, sim, falamos de respostas de justiça que podem configurar uma autêntica alternativa à resposta dos tribunais judiciais, no sentido em que ditarão a desnecessidade de recurso à via judicial, de todo em todo.

Mas gostaria, de igual modo, de realçar este outro, valioso sentido, a emprestar ao conceito de “alternatividade” quando falamos de meios RAL, pondo agora a tónica num exercício de autodeterminação do indivíduo necessitado de uma resposta da Justiça: tal cidadão tem o poder de escolha. Entre respostas várias, o Sistema concede-lhe “alternativas” aos meios tradicionais, permitindo-lhe optar por aquela que, em concreto, seja mais adequada a servir os seus intentos.

O protocolo firmado com a OSAE –atenta a implementação territorial desta entidade – representa um relevante passo no fortalecimento da rede de espaços protocolados pelo MJ, com vista à operacionalização do Sistema de Mediação Familiar.

causa não terá qualquer custo. Eis algumas características dos Julgados de Paz que traçam uma singular proximidade aos seus potenciais destinatários.

Característica, de resto, partilhada com os sistemas públicos de mediação geridos pela DGPJ: tenhamos em consideração, assim, que o funcionamento destes sistemas assenta na gestão de listas de mediadores geograficamente referenciadas e espaços protocolados, como também em uma lista virtual para condução de procedimentos de mediação em linha, habilitando a que o procedimento de mediação se desenvolva sempre da forma mais confortável para as partes, de acordo com a sua vontade e a custos extremamente reduzidos.

Direi, em suma, que estão em causa, em qualquer caso, respostas de justiça particularmente responsivas às necessidades de quem se relaciona com o sistema de justiça e é isso que as aproxima dos seus destinatários.

O protocolo com a OSAE prevê que a Ordem disponibilize espaços para sessões de mediação familiar. Que impacto espera desta medida na promoção dos meios RAL?

E a proximidade é também uma das características basilares dos meios RAL?

Esta é, de facto, uma singular característica da “proximidade” dos meios RAL: pensemos num tribunal em que os cidadãos se dirigem, expondo verbalmente o conflito com que se debatem e a sua pretensão, e onde encontram acolhimento técnico para que essa pretensão seja vertida numa peça processual. Pensemos num tribunal cujo funcionamento é pautado pela simplicidade, pela informalidade e pela celeridade e que incentiva a resolução dos conflitos, por acordo entre as partes desavindas, quer seja em sede de mediação, quer de conciliação. Pensemos num tribunal com taxas de utilização até aos 70 euros e em que a parte que obtém integral ganho de

Trata-se de uma iniciativa muitíssimo relevante. Como referi, a gestão do Sistema de Mediação Familiar é pautada pela flexibilidade, com vista a tornar o procedimento acessível às partes. Quando as partes optem pela participação no procedimento no formato presencial, são os mediadores que se deslocam aos locais mais próximos das partes e não o contrário.

Tendo em conta que falamos de um Sistema com competência para o território nacional, isto traz especiais desafios à disponibilização de uma rede de espaços com suficiente disseminação territorial.

O protocolo firmado com a OSAE – atenta a implementação territorial desta entidade – representa um relevante passo no fortalecimento da rede de espaços protocolados pelo MJ, com vista à operacionalização do Sistema de Mediação Familiar. Começámos pela cidade de Lisboa, onde passamos a contar com mais duas salas, em local nobre da cidade e com excelentes acessos, mas estamos confiantes em como este é um primeiro importante passo que abre caminho à expansão da rede de salas disponíveis em todo o país.

Não posso também deixar de fazer notar que a OSAE acolheu estas primeiras salas no edifício da própria sede, o que não deixa de ter um significado valioso, na medida em que é um sinal do reconhecimento que esta instituição perfilha relativamente aos meios RAL.

Para além da disponibilização de espaços, que outras iniciativas conjuntas entre a DGPJ e a OSAE estão previstas para a promoção de conhecimento especializado e intervenção mais qualificada neste domínio?

Na medida em que a Justiça se faz de pessoas e para (…) estamos muito empenhados em poder dar o nosso contributo positivo para o sistema de Justiça.

A DGPJ vê com otimismo o aproveitamento de sinergias mútuas com a OSAE, designadamente ao nível formativo.

Reconhecemos que o conhecimento e experiência especializados detido pela OSAE e pelos seus associados, no âmbito formativo, em matéria de sobre-endividamento, é um capital precioso a considerar na base de ações formativas especificamente dirigidas aos conciliadores que exercem atividade no contexto do SISPACSE: o Sistema Público de Apoio à Conciliação no Sobre-Endividamento, gerido pela DGPJ.

Por outro lado, considerando a forma tão profícua como decorreu a sessão de divulgação dos meios RAL, realizada no passado dia 16 de setembro na OSAE, antecipamos a organização de novas sessões de divulgação e promoção dos meios RAL, até porque estamos convictos de que a divulgação destas respostas de justiça, quer junto dos cidadãos, quer junto dos profissionais que a elas poderão recorrer é, por natureza, uma tarefa que deve ser contínua.

A digitalização tem sido um dos grandes eixos de transformação da Justiça. A DGPJ também tem vindo a acompanhar esta evolução?

O nosso país tem vindo a ser, efetivamente, pioneiro na digitalização de serviços da área da Justiça, facto reconhecido em muitos relatórios internacionais, designadamente da OCDE, com elevado foco no cidadão e na sua experiência, disponibilizando serviços mais acessíveis e simplificados. E também a DGPJ tem vindo a prosseguir este caminho quer de transformação digital, quer de melhoria da experiência da comunicação da Justiça com o cidadão.

E, neste âmbito, posso destacar alguns dos projetos que temos em curso ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), como a plataforma de indicadores, estatísticas e dados abertos da justiça já mencionada, a que chamamos, de uma forma mais telegráfica, o “Data Lake” da Justiça. É um projeto desenvolvido pela DGPJ, que cremos irá ser um importante reforço para a eficiência e transparência da Justiça. Esta plataforma visa a integração de várias fontes de dados, através da criação de serviços de acesso a dados nos sistemas de informação de origem. O objetivo é harmonizar, automatizar, interoperar e monitorizar um conjunto de indicadores de atividade que permita acrescentar valor à evolução do Sistema de Justiça, bem como aumentar a oferta de informação estatística, indicadores de atividade e dados abertos do MJ.

A transformação digital deve, também, alcançar a forma como a área de justiça comunica com os cidadãos e empresas. Também no âmbito do PRR, a DGPJ está a desenvolver uma “plataforma de gestão de templates”, que se pretende como acelerador da implementação de processos de comunicação com o cidadão e empresas, nos diversos organismos da justiça e nos tribunais, com elevada ênfase na gestão e criação de minutas de comunicação com linguagem clara e simples. A utilização da linguagem clara está alinhada com uma justiça centrada no cidadão, promovendo o uso da comunicação como um instrumento de inclusão e confiança na justiça, projeto já em curso e em implementação gradual nos tribunais e em organismos do MJ.

Na medida em que a Justiça se faz de pessoas e para pessoas, nesta e nas demais dimensões das atribuições da DGPJ, estamos muito empenhados em poder dar o nosso contributo positivo para o sistema de Justiça.

A Mediação e o Papel do Solicitador na Resolução Alternativa de Litígios

Quem trabalha no mundo jurídico sabe bem o quanto a lentidão da justiça pode ser desgastante. Processos que se arrastam durante anos, custos que pesam demasiado no orçamento de famílias e empresas, e um sistema que muitas das vezes parece afastado das pessoas a quem deveria servir. É nesse contexto que a mediação e os outros mecanismos de resolução alternativa de litígios — como a arbitragem ou os julgados de paz — se tornam cada vez mais relevantes. A mediação não deve ser vista como um simples “atalho” fora dos tribunais. É muito mais do que isso: é a oportunidade de as partes se sentarem frente a frente e, com a ajuda de um mediador imparcial, encontrarem a sua própria solução. Não é um juiz a decidir quem ganha e quem perde. São as próprias pessoas que, em conjunto, procuram um consenso, reduzindo a tensão, preservando relações e recuperando algum controlo sobre aquilo que está em causa.

Este caminho oferece algo que os tribunais, pela sua estrutura, dificilmente conseguem dar: espaço para o diálogo. Não há vencedores nem vencidos, há antes a construção de um entendimento alcançado pelas próprias partes. E aqui o Solicitador pode desempenhar um papel central. Pela proximidade que tem com os cidadãos, pelo conhecimento jurídico e pela prática diária, está em posição privilegiada para orientar, esclarecer e ajudar a criar pontes. O nosso trabalho não se limita a explicar e a aplicar a lei; muitas vezes passa também por ouvir, acalmar e abrir perspetivas que à partida pareciam inalcançáveis.

Na prática, percebe-se que a maioria das pessoas não procura uma sentença. Procura sim uma solução. Quer resolver o problema sem se perder num labirinto judicial que parece não ter fim. A mediação responde a isso: é mais rápida, menos dispendiosa e, sobretudo, mais humana. Mas não dispensa o rigor, porque o Solicitador assegura que os direitos de cada parte são respeitados e que o acordo tem a solidez necessária para perdurar.

Reduzir a resolução alternativa de litígios à ideia de “justiça de segunda linha” é não perceber a sua verdadeira força. Estamos a falar de uma justiça diferente, mais ajustada ao nosso tempo, que valoriza o diálogo e aproxima as pessoas da solução. Ao mesmo tempo, contribui para aliviar os tribunais, deixando-os concentrar-se nos casos em que a intervenção judicial é mesmo indispensável.

Num mundo em constante mudança, o papel do Solicitador é cada vez mais o de ser não apenas um profissional do Direito, mas também um mediador de confiança. Alguém capaz de transformar conflitos em entendimentos, ajudando a tornar a justiça mais próxima e mais útil. No fundo, afirmar a importância do Solicitador na mediação é reafirmar o compromisso com uma justiça moderna, eficaz e, acima de tudo, pensada para o cidadão.

Pedro Soares
Solicitador e Vogal do Conselho Geral da OSAE

ENTRE O METAL E A HISTÓRIA A ARTE DE CUNHAR PORTUGAL

Reportagem Joana Gonçalves / Fotografia Nuno Silva | INCM

Na era dos pagamentos digitais e das carteiras virtuais, há um lugar em Lisboa onde o som do metal ainda ecoa com o peso da história. É na Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM) que o passado e o futuro do dinheiro português se encontram. Dali saem moedas que circulam discretamente no quotidiano, mas também peças que são verdadeiras obras de arte, símbolos da cultura e da identidade de um país. À frente deste universo de precisão e simbolismo está Duarte Azinheira, Administrador Executivo da INCM e responsável pelo pelouro da moeda. Fala com a serenidade de quem compreende a dimensão do legado que carrega. “Assumir o compromisso de preservar e projetar uma instituição com séculos e séculos de história é uma responsabilidade imensa”, afirma. “Temos de ter presente que a INCM é herdeira dos mais antigos estabelecimentos industriais do país. A Casa da Moeda labora de forma contínua desde o final do século XIII e a Imprensa Nacional conta com mais de 255 anos de história. Gerir uma instituição com tal legado histórico e cultural é uma honra e, sobretudo, um desafio constante.”

A criação de uma moeda é um processo que combina arte e ciência com uma precisão quase coreográfica. Tudo começa com uma ideia, muitas vezes inspirada por um tema nacional ou cultural. Depois, entra em cena uma equipa que inclui artistas, engenheiros, técnicos e operadores.

“É um processo complexo, que envolve a colaboração de diversos profissionais, desde os artistas aos engenheiros e aos operadores de máquinas, que trabalham em conjunto para criar uma peça que é, ao mesmo tempo, um símbolo e um exemplo de mestria técnica”, explica Duarte Azinheira. No caso das moedas de coleção, o processo é acompanhado de perto pelo Conselho Numismático, um órgão consultivo que avalia e dá pareceres sobre o Plano Numismático anual.

A produção diária varia consoante as encomendas e as necessidades do Banco de Portugal, mas uma coisa nunca muda: o rigor. “O nosso controlo de qualidade é rigoroso e envolve inspeções técnicas constantes em cada fase, com testes laboratoriais e visuais”, sublinha. Cada moeda que sai das prensas da Casa da Moeda é resultado de um processo de verificação minucioso, que garante que nenhuma imperfeição passe despercebida.

Ao perguntarmos a Duarte Azinheira se a cunhagem é mais arte ou mais ciência, a resposta vem com naturalidade: “A cunhagem sempre foi um processo que integra arte e ciência de maneira intrínseca. Uma moeda é um objeto utilitário, certo, mas também é uma obra de arte.” Prova disso é o Museu Casa da Moeda, totalmente digital, que expõe centenas de peças e revela a evolução estética e técnica ao longo dos séculos. “É arte e técnica elevadas ao expoente máximo”, diz com orgulho. Essa ligação entre tradição e inovação tem dado à Casa da Moeda reconhecimento internacional. Nos últimos anos, a instituição conquistou diversos prémios e protagonizou projetos pioneiros, como a criação da primeira moeda física do mundo desenhada por Inteligência Artificial, resultado de uma parceria com o Centro de Informática e Sistemas da Universidade de Coimbra. “Foi uma feliz colaboração, que demonstra como a tecnologia e a criatividade podem coexistir num mesmo objeto”, explica.

metal em símbolo, ideias em forma, tempo em memória.

A técnica, por vezes, tem de se adaptar à ousadia estética. “Os artistas desafiam os limites da produção e isso é o que nos faz evoluir”, acrescenta.

E há projetos que, mesmo entre tantos, se destacam pela originalidade. “Já produzimos moedas com cor, com cheiro, que brilham no escuro, com diversos materiais. Cada moeda é um desafio”, conta. Este ano, a série dedicada ao azulejo português promete ser uma das mais exigentes e, também, uma das mais belas.

A sustentabilidade é outra preocupação constante. “Na INCM temos uma abordagem 360 da sustentabili-

“A

cunhagem sempre foi um processo que integra arte e ciência de maneira intrínseca. Uma moeda é um objeto utilitário, certo, mas também é uma obra de arte.”

DUARTE AZINHEIRA, Administrador Executivo da INCM

A investigação é outro pilar essencial. O INCMLAB, o laboratório de inovação da casa, trabalha diariamente no desenvolvimento de novas ligas metálicas e microdetalhes de segurança. “Trabalhamos com universidades e centros de investigação para garantir a autenticidade e a durabilidade das moedas”, afirma. É um trabalho que alia o saber técnico à ciência dos materiais, reforçando a posição da INCM entre as casas da moeda mais avançadas do mundo.

Mas, para além da tecnologia, há o olhar do artista. “Tal como na pintura, na música ou nas artes plásticas em geral, na numismática o papel do artista é essencial para criar obras que transcendam o tempo”, explica Duarte Azinheira. São esses criadores que transformam

dade, alinhada com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas”, explica. A instituição procura integrar práticas que conciliem o desempenho económico com a responsabilidade ambiental, social e cultural. “Trabalhamos para promover o crescimento centrado na transição digital do nosso negócio, dos nossos clientes e da sociedade em geral.”

E se o futuro parece cada vez mais digital, Duarte Azinheira acredita que a moeda física continuará a ter o seu lugar. “Apesar do crescimento das transações digitais, a moeda física mantém-se como símbolo de soberania, identidade cultural e segurança num mundo onde o numerário continua presente na vida do dia a dia”, defende. A INCM tem acompanhado a transição tecnológica, apostando em soluções como autenticação e certificação digital, blockchain e govtech sem nunca perder de vista a sua missão essencial: servir o país e preservar o seu património.

No final, Duarte Azinheira resume o espírito que move a instituição: o de uma casa que une o gesto artesanal à tecnologia de ponta, a memória à modernidade. Na Casa da Moeda, cada peça é mais do que metal, é uma história gravada em relevo, uma ideia transformada em forma, uma memória que perdura. É o reflexo de um país que, mesmo na era digital, continua a cunhar o seu tempo.

A INCM é feita também de pessoas. São cerca de 730 trabalhadores, distribuídos por áreas que vão das publicações oficiais à contrastaria, da gráfica de segurança à moeda e à inovação. “As competências técnicas são muito distintas, mas os valores são comuns: ética, proatividade, sentido crítico, rigor e um grande sentido de serviço público”, afirma o administrador. Aos jovens que desejam seguir esta carreira, deixa um conselho direto: “Sejam curiosos pelos objetos moeda e medalha. Procurem formação em Belas-Artes, Gravura, Design Industrial ou Engenharia de Materiais e procurem experiência prática. Podem sempre candidatar-se a estágios na INCM.” Quando lhe pedimos que escolha uma peça que simbolize o seu próprio percurso, a resposta é imediata. “Escolho a Medalha dos 8 Séculos da Língua Portuguesa, de Fernando Fonseca. É uma peça belíssima, cunhada em prata, com acabamento proof e contrastada. Reflete bem o meu percurso: estive à frente da editora pública muitos anos. Além disso, uma das missões mais significativas da INCM é a promoção e preservação da língua portuguesa. Esta medalha é um encontro feliz entre técnica apurada e aspiração cultural em que muito me revejo.”

Bastonária da OSAE apresentou cinco propostas para uma reforma convergente da Justiça em reunião no Parlamento

A Bastonária da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), Anabela Veloso, participou, no dia 7 de novembro, numa reunião de trabalho promovida pela Assembleia da República, que reuniu os principais agentes do sistema de justiça, representantes dos partidos políticos e órgãos de soberania, com o objetivo de abrir caminho a uma reforma estruturante do setor da Justiça.

No seu discurso, dirigido ao Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, a Bastonária destacou a importância deste encontro como “uma convocatória à responsabilidade, ao diálogo e, sobretudo, à ação”, sublinhando que a Justiça “é, antes de tudo, um serviço público essencial”.

Falando em nome dos cerca de 5.000 profissionais que a OSAE representa, Anabela Veloso apresentou cinco propostas concretas e exequíveis que visam contribuir para uma Justiça mais célere, acessível, moderna, credível e humana:

1. Digitalização, Inteligência Artificial e Prova Técnica Rápida

A Bastonária defendeu a modernização tecnológica da Justiça, com a digitalização integral dos processos e a criação de ferramentas inteligentes de gestão processual.

Entre as medidas propostas, destaca-se a certificação digital dos Autos de Constatação realizados por Solicitadores e Agentes de Execução, conferindo-lhes valor legal reforçado e transformando-os em prova técnica rápida, à semelhança do que já sucede em países como a Bélgica e a França.

2. Simplificação e Celeridade das Citações

A Ordem propõe a criação de um Regime de Morada Única associado ao Cartão de Cidadão e o reforço das notificações eletrónicas, permitindo acelerar a tramitação processual.

3. Expansão dos Meios de Resolução Alternativa de Litígios e da Rede de Julgados de Paz

A OSAE defende o reforço da rede nacional de Julgados de Paz e dos Meios de Resolução

Alternativa de Litígios, integrando novas matérias e mediadores qualificados.

Estas medidas visam promover a proximidade, a conciliação e a desjudicialização, libertando os tribunais de processos que podem ser resolvidos de forma mais simples e humanizada.

4. Revisão do Sistema de Acesso ao Direito

A Bastonária defendeu que “um sistema judicial não pode ser justo se não for acessível”, propondo a integração dos Solicitadores e dos Agentes de Execução na estrutura de apoio judiciário, incluindo nos processos executivos. “Uma sentença só é justa quando é cumprida — e o apoio judiciário deve ir até ao fim”, afirmou.

5. Revisão da Legislação do Contencioso Administrativo e Fiscal

A OSAE propõe a atualização do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em vigor desde 2003, para garantir coerência com o Código de Processo Civil e com os princípios modernos do contencioso tributário.

Esta revisão permitiria maior celeridade e segurança jurídica, reforçando a confiança de cidadãos e empresas na atuação do Estado.

Anabela Veloso reforçou que estas propostas “não são apenas da OSAE, mas refletem o que ouvimos diariamente de quem vive a Justiça — cidadãos, empresas e profissionais”, acrescentando que “a mudança começa pelo que é possível fazer já”.

A Bastonária concluiu reafirmando a total disponibilidade da OSAE para colaborar com a Assembleia da República, o Governo e todas as instituições do sistema de Justiça, participando ativamente em grupos de trabalho e comissões técnicas. “Queremos ser parte da solução. Porque acreditamos profundamente que a Justiça é de todos”, afirmou.

A reunião ficou também marcada pela intervenção de Rita Alarcão Júdice, Ministra da Justiça, que abordou várias prioridades estratégicas para a modernização do setor, nomeadamente:

– A valorização das carreiras dos guardas prisionais, conservadores e oficiais de registos e funcionários judiciais;

– A transformação eletrónica da Justiça, incluindo o aperfeiçoamento dos sistemas Citius e SITAF;

– A necessidade de se proceder a alterações na distribuição de processos;

– O avanço em matérias de anonimização de dados e de transcrição automática de depoimentos, aproveitando as potencialidades da inteligência artificial.

Por sua vez, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), João Cura Mariano, sublinhou a importância da transformação digital e da interoperabilidade entre sistemas judiciais, defendendo uma alteração do modelo de competências do STJ, que deve assumir um papel “mais uniformizador e menos de terceira instância, à semelhança do que sucede no Supremo Tribunal Administrativo”.

Destacou ainda a necessidade de reforçar a autonomia administrativa e financeira dos tribunais de comarca, bem como de melhorar as condições das suas instalações, fatores considerados essenciais para uma justiça mais eficiente e próxima dos cidadãos.

No final, José Pedro Aguiar-Branco destacou o carácter “inédito” da reunião que, pela primeira vez, reuniu no Parlamento representantes do Governo, dos tribunais superiores, do Ministério Público e das Ordens profissionais, sublinhando que “foi possível identificar um

denominador comum” em torno de várias prioridades, nomeadamente a modernização tecnológica e a maior interoperabilidade entre sistemas judiciais.

Aguiar-Branco explicou que as propostas apresentadas por todos os intervenientes serão reunidas e distribuídas pelos grupos parlamentares, constituindo uma base de trabalho para futuras reformas do setor. O presidente do Parlamento frisou ainda que o encontro demonstrou “ser possível promover diálogo e cooperação entre instituições”, abrindo caminho a novas iniciativas com o mesmo espírito de convergência e compromisso.

“O país está

hoje mais perto de ter um

cadastro predial completo.”

Blandina Soares

Coordenadora da Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação Cadastral Simplificado (eBUPi)

A criação de um cadastro predial completo e atualizado é um dos grandes desafios estruturais de Portugal. Conhecer com rigor a localização, os limites e os direitos associados a cada propriedade é essencial para o ordenamento do território, para a prevenção de riscos e para o desenvolvimento sustentável. É precisamente essa a missão da Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação Cadastral Simplificado (eBUPi), responsável por garantir que todo o território nacional dispõe de cadastro, através da expansão e consolidação do Balcão Único do Prédio (BUPi).

Em entrevista, Blandina Soares, Coordenadora da eBUPi, faz o balanço do percurso já realizado desde 2017, destaca os avanços tecnológicos e operacionais alcançados e aponta os desafios que se colocam até ao final de 2025, ano em que se prevê a conclusão da Estrutura de Missão. A responsável sublinha a importância da colaboração entre entidades públicas, municípios e profissionais habilitados, e reforça o papel essencial dos Solicitadores na construção de um cadastro nacional moderno, interoperável e ao serviço de todos os cidadãos.

Para começar, poderia explicar aos nossos leitores, de forma simples, qual é a missão da eBUPi e que importância tem este projeto para o país?

A missão da eBUPi é a de garantir a expansão do cadastro simplificado ao território nacional que, em 2017, não tinha qualquer forma de cadastro. Havia 173 municípios nessas condições, 153 no Centro e Norte do continente, 15 na Região Autónoma dos Açores e 5 na Região Autónoma da Madeira. Para além disso, cabe-lhe desenvolver e manter a plataforma informática de suporte ao Balcão Único do Prédio (BUPi). É fundamental termos todo o território cadastrado, isto é, conhecermos a localização, configuração e área de todos os prédios, sobretudo os terrenos florestais e agrícolas e os baldios, a par da necessidade de conhecermos os direitos que lhes estão associados, que é garantido pelo registo predial. Conseguir esse objetivo é muito importante e essencial para o país, para um eficaz desenvolvimento do território, para o seu planeamento e gestão e para a atuação preventiva e defensiva das populações face a riscos.

Passados estes anos desde o arranque, que balanço faz do caminho percorrido? Portugal está hoje mais perto de ter um cadastro predial completo? O balanço do BUPi é muito positivo, mas queremos dar continuidade ao projeto. O ano de 2025 trouxe muitas novidades, designadamente a nova plataforma BUPi, desenvolvida numa nova arquitetura tecnológica, mais atual, que permite melhor desempenho, mais estabilidade, mais segurança e assegura a componente fundamental de interoperabilidade; o novo site do BUPi, com indicadores atualizados e acesso fácil à plataforma para as Representações Gráficas Georreferenciadas (RGG) eletrónicas; a disponibilização de um Visualizador Público, no site do BUPi, para acesso pelo cidadão e sem necessidade de autenticação, com informação geográfica relativa às RGG, à Carta Cadastral e aos limites administrativos da Carta Administrativa Oficial de Portugal; a evolução da aplicação móvel do BUPi e a concretização da adesão dos municípios que faltavam. Basta dizer que o projeto se iniciou, em 2017, com 10 municípios, que atualmente conta com 158 e que estão a decorrer conversações com vista à adesão dos municípios que faltam: os 15 municípios da Região Autónoma dos Açores. O país está hoje mais perto de ter um cadastro predial completo. Basta consultar o Visualizador Público do BUPi, disponível no site, para concluirmos que sim. Um dos objetivos constantes do nosso Plano de Atividades para 2025 é o de aumentar o conhecimento do território através da georreferenciação de 40% das matrizes prediais. Estamos a caminhar para alcançar esse número, sensibilizando os cidadãos através de campanhas de marketing e publicidade, mas também com o auxílio precioso dos municípios aderentes, dos técnicos BUPi, dos

solicitadores, dos notários, dos advogados, dos conservadores e oficiais de registo, dos chefes e técnicos dos serviços de finanças, dos técnicos de cadastro predial e dos topógrafos.

Que resultados concretos já foram alcançados e quais considera serem os principais avanços?

Desde o início do projeto BUPi, estão identificadas mais de 2,8 milhões de propriedades, por mais de 436 mil cidadãos, o que corresponde a mais de 36% de área georreferenciada. Em termos de regiões do continente: a região do Centro com 37% e a região do Norte com 34%. Na Região Autónoma da Madeira, a operacionalização ocorreu apenas em fevereiro de 2024, pelo que conta apenas com 5% de área georreferenciada. Para além das novidades trazidas em 2025 e já evidenciadas, como principais avanços gostaria ainda de destacar a concretização tecnológica, em agosto último, do procedimento especial de registo e do procedimento especial de justificação, permitindo, que no mesmo momento e perante o técnico, ocorra o pedido de elaboração da RGG e o pedido de registo predial associado. Destaco também a evolução positiva dos procedimentos de conciliação administrativa, destinados à resolução amigável das sobreposições existentes.

O ritmo atual de execução está a permitir cumprir os objetivos e prazos inicialmente previstos, tendo em conta que a Estrutura de Missão tem prevista a sua conclusão a 31 de dezembro de 2025? Atualmente, estão a ser criadas mais de 4000 RGG por dia, pelos diversos canais, balcão e online. A manter esta tendência, no final do ano estaremos muito próximos da meta definida para 31 dezembro de 2025. Este é um projeto muito importante para o país, como procurei concretizar, mas leva o seu tempo porque depende da cooperação de todos. Mas a nossa missão é também garantir que efetuamos as ações necessárias para, em parceria com os municípios, as comissões de coordenação e desenvolvimento regional e as demais entidades envolvidas, assegurarmos a divulgação e comunicação, a nível nacional e local, da sua relevância para o país.

Como é que o facto de, até essa data, se manter a gratuitidade dos registos influencia a adesão dos cidadãos e o sucesso do projeto?

Julgo que a gratuitidade tem sido muito importante, quer das RGG, quer dos registos prediais associados. Para os titulares de prédios rústicos de pequenas dimensões, o preço dos registos poderia ser um entrave. Mas também é necessário sensibilizar para a importância do registo predial, essencial para garantir o direito de propriedade.

É importante lembrar que a gratuitidade existe des-

Desde o início do projeto BUPi, estão identificadas mais de 2,8 milhões de propriedades, por mais de 436 mil cidadãos, o que corresponde a mais de 36% de área georreferenciada.

de 2017, primeiro para os 10 municípios piloto, que foi generalizada em 2019 e ampliada em 2023. Em algum momento terá de terminar. Serve, por isso, de incentivo para que os cidadãos possam usufruir dessa gratuitidade, enquanto a mesma vigorar.

Que desafios estruturais e práticos permanecem no terreno, seja do lado dos cidadãos, das autarquias ou do próprio sistema?

Do lado dos cidadãos, é muito importante conseguirmos sensibilizá-los para a importância do cadastro, para cada um e para todos nós, enquanto país. Esclarecendo-os que isso permite associar o direito de propriedade a um polígono no mapa, identificando concretamente a localização e a configuração do seu prédio. E, uma vez

registado na Conservatória, o proprietário tem a garantia de que o seu direito de propriedade está protegido contra todos os terceiros. Que a partir do momento em que o cadastro e o registo ficam estabilizados e não há sobreposições nas confrontações, deixarão de existir os conflitos, atualmente tão recorrentes, sobre os limites das propriedades de cada cidadão. Isto é uma grande vantagem para os proprietários, mas também para as gerações futuras, pois permitirá evitar as situações, também hoje muito recorrentes, de cidadãos que herdaram propriedades e que não sabem os seus limites ou, por vezes, onde ficam. A identificação no BUPi e o seu registo predial permitirá, assim, salvaguardar os interesses quer dos proprietários, quer dos seus herdeiros. Do lado dos municípios, o principal desafio passa por todos terem técnicos habilitados a elaborarem RGG e também por conseguirem mobilizar os cidadãos. Já por parte do BUPi, será a concretização da interoperabilidade entre os vários sistemas, do IRN, AT, DGT e BUPi.

Há ainda resistência ou falta de sensibilização para a importância do cadastro? Como se ultrapassa esse obstáculo?

Sim, há alguma resistência. Ultrapassa-se com comunicação séria, verdadeira e coerente, mas também com disposições legais que determinem a obrigatorie -

dade, como a que existe para o registo de aquisição da propriedade, da existência prévia da RGG. É também preciso informar que, para os cidadãos que não sabem onde se localizam os seus prédios, existe na plataforma o algoritmo de dedução de matrizes, que permite, com a indicação do artigo matricial em causa, fornecer uma localização aproximada do terreno.

No projeto-piloto do BUPi, em 10 concelhos, foram os Solicitadores os únicos profissionais envolvidos diretamente na execução. Que importância teve essa fase inicial e que balanço faz desse contributo?

Efetivamente, no início do projeto, os balcões eram poucos, assim como os técnicos, pelo que a envolvência dos Solicitadores foi muito importante, pois permitiu dar maior capacidade de resposta e auxiliar os cidadãos nessa tarefa tão importante.

Numa segunda fase, passaram também a intervir os Técnicos de Cadastro Predial, juntamente com os Solicitadores, como técnicos habilitados para operar na plataforma. Qual foi o impacto dessa ampliação?

Acredita que contribuiu para maior qualidade, alcance e eficiência?

A intervenção dos Técnicos de Cadastro Predial (TCP) ainda é muito recente, pelo que os números ainda não são muito altos. Acredito, contudo, que poderão dar um forte contributo à elevação do número de RGG realizadas a nível global. A maioria dos técnicos habilitados dos municípios detêm elevada formação e conhecimentos

técnicos. O mesmo se passa com os TCP e isso é extremamente relevante para a qualidade e eficiência na elaboração das RGG.

Como avalia, em geral, o papel dos Solicitadores até agora? Há áreas em que a sua intervenção poderia ser reforçada?

Os Solicitadores são licenciados em Direito ou em Solicitadoria com elevada intervenção na área dos registos e do notariado, e com competências jurídicas e cadastrais já demonstradas, pelo que o seu papel tem sido fundamental. De todo o modo, o reforço da sua intervenção será sempre uma decisão política e julgo que o poder político é sabedor das competências dos Solicitadores.

Com a ampla experiência já demonstrada pelos Solicitadores, faz sentido, para si, que estes profissionais possam vir a ter um papel mais ativo, por exemplo, nos procedimentos de conciliação administrativa relacionados com o cadastro?

O procedimento de conciliação administrativa está previsto para o caso de existirem sobreposições entre RGG, permitindo aos proprietários acordarem sobre as estremas dos seus prédios, corrigindo os polígonos sobrepostos. No relatório de atividades da eBUPi relativo a 2024, constatamos que, dos procedimentos iniciados, 81% terminaram por acordo dos proprietários confinantes e com a resolução das sobreposições existentes. Em face da lei, podem atuar como conciliadores os técnicos habilitados dos municípios inscritos no BUPi,

Os Solicitadores têm um papel essencial, resultado da sua proximidade com os cidadãos e da sua preparação técnica.

que tenham sido designados por despacho do Presidente da Câmara Municipal, bem como os TCP inscritos na lista oficial. Mais uma vez, será sempre uma decisão política a atribuição de um papel mais ativo, nesta matéria, aos Solicitadores. Os Solicitadores poderão ter sempre um papel importante na mediação ou, existindo verdadeiro conflito, no acompanhamento e representação dos interessados no recurso aos órgãos jurisdicionais.

De que forma a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução pode contribuir para acelerar e consolidar os objetivos da eBUPi até ao final do mandato da Estrutura?

A OSAE pode apoiar diretamente os cidadãos na elaboração das RGG e dos registos prediais associados através dos seus Solicitadores; estabelecendo parcerias com os municípios com vista acelerar os processos, por exemplo, sempre que for necessário o reconhecimento de assinatura de um cidadão que não pode ou não sabe

assinar; pode, em conjunto com a eBUPi, preparar materiais de apoio, explicando a importância e os benefícios da elaboração da RGG e do registo predial; podemos criar um canal de comunicação para desbloquear problemas que surjam na realização das RGG e propor soluções. São apenas alguns exemplos.

A digitalização e a interoperabilidade entre serviços públicos são uma das bandeiras do projeto. Que impacto real já se sente na prática?

A plataforma BUPi trabalha com os artigos matriciais da Autoridade Tributária (AT) e com as descrições prediais das Conservatórias. Só assim conseguimos ligar um artigo matricial a uma RGG e a uma descrição predial. Por outro lado, as RGG efetuadas são automaticamente anotadas nas descrições prediais e são comunicadas à AT e ao IRN, para efeitos, por exemplo, de atualizações de área. Mas continuamos a trabalhar para amplificar essa interoperabilidade. Temos um protocolo recente assinado que irá trazer novidades em breve.

Finalmente, que mensagem gostaria de deixar à classe dos Solicitadores relativamente ao papel que podem ter na construção de um cadastro nacional moderno e útil para todos?

Os Solicitadores têm um papel essencial, resultado da sua proximidade com os cidadãos e da sua preparação técnica. A eBUPi conta com todos os Solicitadores para transformar este desafio que é o BUPi numa conquista de todos!

Da Obrigação do Depósito do Preço – Venda Judicial

No âmbito das funções do Agente de Execução, no que à tramitação da venda judicial de bens penhorados diz respeito, destaca-se, no presente artigo, a faculdade do mesmo optar por uma de três decisões, como consequência do transcurso do prazo para a efetivação do depósito do preço pelo proponente (conforme n.º 1 do art.º 825.º do Código de Processo Civil, doravante CPC):

a) determinar que a venda fique sem efeito e aceitar a proposta de valor imediatamente inferior; b) determinar que a venda fique sem efeito e efetuar a venda dos bens através da modalidade mais adequada; c) liquidar a responsabilidade do proponente ou preferente remisso.

Neste tocante, mercê do vertido no n.º 2 do art.º 824.º do CPC, infere-se que uma das diligências de execução a levar a cabo pelo Agente de Execução é a notificação do proponente, após a aceitação da sua proposta para, no prazo de 15 dias, efetuar o depósito do preço à sua ordem.

A este propósito tem sido judicialmente suscitada a questão da eventual admissibilidade da prorrogação deste prazo ou, se pelo contrário, o mesmo tem carácter imperativo.

A questão não é de somenos, uma vez que o legislador é omisso quanto à prorrogação do prazo no regime da venda executiva, o que determinou o posicionamento da jurisprudência, designadamente em 10/07/2025, materializada no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 18129/17.4T8LSB-B.L1-6, consultável in www.dgsi.pt , em cujo sumário se lê, na parte aplicável, o transcrito infra:

“…I. O prazo para depósito do preço da venda judicial é improrrogável, sendo o depósito fora do prazo apenas admissível nos casos de justo impedimento…”

Tendo por referência o caso dirimido no Acórdão em referência, a pretensão do proponente, junto do Agente de Execução, traduziu-se no requerimento de concessão do prazo de 90 dias para depósito do preço, em face da necessidade de obtenção de financiamento bancário. Do mencionado aresto ressalta que a ausência de resposta, por parte do Agente de Execução, ao pedido de prorrogação do prazo, tendo o mesmo já advertido para o disposto

no n.º 1 do art.º 825.º do CPC, não é fundamento passível de determinar a anulação da venda judicial, tão somente eventual violação do dever deontológico de urbanidade, sem qualquer repercussão na efetivação dos atos processuais conducentes à concretização da venda.

De resto, resulta do art.º 25.º da Portaria n.º 282/13, de 29 de agosto, que à falta de pagamento do preço, no prazo legal, é aplicável o disposto no artigo 825.º do CPC.

Neste ponto importa enfatizar, no âmbito de umas das temáticas vertidas no referido Acórdão, que o pressuposto de preterição do contraditório previsto no n.º 1 do art.º 825.º do CPC (consubstanciado na exigibilidade de prévia audição) passa pela concretização do conceito de “interessados na venda”, estando o mesmo adstrito à audição dos intervenientes processuais elencados no art.º 812.º do CPC, a saber: exequente, executado e credores com garantia sobre os bens a vender.

Nesta linha de entendimento, enaltece-se a menção no dito Acórdão da ausência de vinculação do Agente de Execução quanto às posições expressas pelos interessados na venda, sendo-lhe reconhecida livre discricionariedade para, no caso de leilão eletrónico, aceitar a proposta imediatamente inferior ou determinar nova venda. Destarte, ainda que o proponente reclame a inobservância da sua audição, tal não implica qualquer violação do contraditório, por banda do Agente de Execução, uma vez que aquele não é interveniente cujo “interesse” deva ser salvaguardado, atenta a própria natureza da execução e o seu escopo, balanceando quer o interesse do exequente/credores em ordem ao efetivo pagamento decorrente do produto da venda com o interesse do executado, na medida em que a execução onere apenas o seu património num valor justo.

Bastonária

da OSAE presente no 16.º Congresso Nacional de Oficiais de Justiça Avaliadores Federais

A Bastonária da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), Anabela Veloso, esteve presente no 16.º Congresso Nacional de Oficiais de Justiça Avaliadores Federais (CONOJAF) e no 6.º Encontro Nacional de Oficiais de Justiça Aposentados (ENOJAP), um evento promovido pela Associação Nacional dos Oficiais de Justiça Avaliadores Federais (FENASSOJAF), no Brasil.

Subordinado ao tema “Oficial de Justiça: Agente de Inteligência e Cidadania”, a iniciativa aconteceu nos dias 27, 28 e 29 de agosto, na cidade de São Paulo. “A presença da OSAE neste congresso tornou-se uma tradição e essa continuidade tem um profundo significado. Mostra que as nossas relações institucionais não se esgotam em protocolos formais, mas são vividas ano após ano, com amizade, cooperação e partilha de conhecimento. Ao longo das últimas décadas, Portugal e Brasil inspiraram-se mutuamente: na organização da execução, nas reformas processuais, na modernização

Tomada de posse de Rute Couto como vogal não associada do Conselho Superior da OSAE

No dia 6 de outubro, tomou posse, nas instalações do Conselho Regional do Porto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), Rute Couto, como vogal não associada do Conselho Superior da OSAE.

Rute Couto substitui Márcia Passos por cooptação.

A cerimónia contou com a presença de Marco Antunes, Presidente do Conselho Superior, e Nicolau Vieira, Presidente do Conselho Regional do Porto.

dos sistemas de justiça e na afirmação social da nossa profissão. Caminhamos lado a lado, com uma história comum e um futuro cada vez mais próximo”, sublinhou Anabela Veloso na cerimónia de abertura.

Ao longo dos três dias do congresso, foram abordados temas como a tecnologia e a inteligência no cumprimento de mandados, a segurança profissional, a saúde mental, o planeamento estratégico e a representatividade e os riscos da desjudicialização frente às garantias constitucionais.

“Sem oficiais de justiça e agentes de execução, as sentenças ficariam no papel e o Estado de Direito perderia a sua credibilidade. A nossa missão — dar vida às decisões judiciais — é aquilo que nos define, que nos dá identidade e propósito. Por isso, a valorização da nossa profissão, as condições adequadas de trabalho e o reconhecimento social não são apenas justos: são indispensáveis para que a justiça cumpra a sua promessa”, acrescentou a Bastonária da OSAE.

Telma Afonso Colaboradora do Conselho Superior da OSAE

“É fundamental que exista comprometimento e investimento por parte de profissionais, Ordens e autoridades nesta causa.”

Gonçalo Maia Miranda

Coordenador da Delegação Portuguesa ao GAFI e Presidente do Comité Executivo da Comissão de Coordenação ABC/CFT

O combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo é hoje uma prioridade global e um dos pilares centrais na defesa da integridade dos sistemas financeiros e jurídicos. Em Portugal, essa missão é coordenada, a nível nacional e internacional, por estruturas que garantem a articulação entre políticas públicas, entidades de supervisão e organismos internacionais. À frente desse esforço está Gonçalo Maia Miranda, Coordenador da Delegação Portuguesa ao Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) e Presidente do Comité Executivo da Comissão de Coordenação das Políticas de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo (ABC/CFT).

Nesta entrevista, o responsável partilha o seu olhar sobre os avanços alcançados por Portugal, os desafios que persistem na aplicação prática das medidas de prevenção e de combate e o papel fundamental que profissionais como os Solicitadores podem desempenhar na construção de um sistema mais transparente, eficaz e alinhado com as melhores práticas internacionais.

Entrevista Joana Gonçalves / Fotografia Alfredo Matos

O seu percurso profissional é marcado por funções de grande responsabilidade nacional e internacional. Que momentos ou experiências considera mais determinantes para chegar às funções que hoje desempenha?

As funções que fui exercendo no domínio da prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo são, em grande medida, o fruto das oportunidades de crescimento que o Banco de Portugal me foi dando nesta matéria. Assim, terei de considerar como momentos mais determinantes o ingresso no Banco de Portugal, em 2011; a designação, em 2016, como coordenador da unidade que tinha a seu cargo as funções de regulação e representação institucional no domínio ABC/CFT; e, por fim, a nomeação como coordenador da área que tinha a seu cargo todas as matérias relacionadas com a supervisão preventiva do BC/FT. Estes momentos, em paralelo com as oportunidades de desenvolvimento pessoal que me foram sendo concedidas, caracterizam bem a mescla de experiência de terreno e de representação institucional que acabou por convergir na minha nomeação, em 2022, como coordenador da Delegação Portuguesa ao GAFI e presidente do Comité Executivo da Comissão de Coordenação ABC/CFT-

Poderia explicar, de forma sucinta, qual é o trabalho desenvolvido pela Delegação Portuguesa ao GAFI e pela Comissão de Coordenação ABC/FT?

A Delegação Portuguesa ao GAFI e a Comissão de Coordenação ABC/CFT funcionam numa lógica de complementaridade, competindo à última assegurar a implementação no plano nacional das recomendações emitidas pelo GAFI.

Mais concretamente, o GAFI é uma task-force intergovernamental criada em 1989 para definir as melhores práticas internacionais no combate ao branqueamento de capitais e, posteriormente, ao financiamento do terrorismo e da proliferação das armas de destruição em massa. De entre as suas diversas funções, o GAFI avalia, através de exercícios de avaliação mútua com uma metodologia previamente estabelecida, a capacidade de resposta dos seus membros quer no domínio legislativo, quer no domínio da eficácia em áreas que vão desde o cumprimento dos deveres preventivos do BC/FT à investigação e julgamento dos crimes financeiros. Compete, assim, à Coordenação da Delegação Portuguesa ao GAFI articular a contribuição e participação das autoridades nacionais nos trabalhos do GAFI.

Por seu turno, a Comissão de Coordenação ABC/ CFT é o órgão de coordenação nacional responsável por avaliar os riscos nacionais de BC/FT, propor a estratégia nacional neste domínio, bem como as demais medidas legislativas, institucionais e operacionais que assegurem a conformidade e a eficácia do sistema nacional de com-

bate ao BC/FT, nomeadamente à luz do Direito da União Europeia e das recomendações do GAFI. Em última análise, compete à Comissão de Coordenação, de entre outras funções, coordenar as autoridades nacionais no quadro da preparação das avaliações conduzidas pelo GAFI e exercícios de natureza similar.

Como descreveria o atual panorama do combate à corrupção e ao branqueamento de capitais em Portugal?

Focando-me no combate ao branqueamento de capitais, que é a minha área de expertise, diria que o sistema se caracteriza hoje por uma elevada robustez legislativa (sem prejuízo de melhorias pontuais em alguns aspetos), havendo, contudo, um caminho ainda longo a trilhar em alguns domínios, quando falamos do ponto de vista da eficácia. Com efeito, existem ainda assimetrias muito grandes ao nível da consciencialização dos diferentes setores que devem contribuir para o sistema de prevenção e combate ao crime financeiro, o que se traduz necessariamente numa grande heterogeneidade de práticas.

Quais foram, na sua perspetiva, os principais progressos alcançados pelo nosso país, nos últimos anos, nestes domínios?

Como já foi reconhecido na última avaliação do GAFI de 2017, Portugal tem prosseguido uma trajetória de sucesso no que concerne ao quadro normativo nestes domínios, sendo hoje uma referência internacional nesse âmbito.

Ao longo da minha experiência profissional, pude também testemunhar que a supervisão financeira tem evoluído para um conhecimento cada vez mais aprofundado dos riscos, com reflexos na robustez da atividade de fiscalização e nos controlos aplicados pelas entidades financeiras.

Sem prejuízo das dificuldades no domínio estatístico, é possível identificar, ainda que casuisticamente, casos de sucesso ao nível da investigação e perseguição penal do crime do branqueamento.

Por último, em áreas com menor probabilidade de ocorrência, como o financiamento do terrorismo, a colaboração das autoridades com competências operacionais neste domínio tem também permitido desenvolver uma atitude proativa que já foi objeto de reconhecimento internacional.

Que medidas concretas têm contribuído para melhorar a eficácia das investigações e da cooperação entre autoridades nacionais e internacionais?

Numa área em que a quantidade e complexidade da informação a tratar assume proporções hercúleas, o re -

O GAFI é uma task-force intergovernamental criada em 1989 para definir as melhores práticas internacionais no combate ao branqueamento de capitais e, posteriormente, ao financiamento do terrorismo e da proliferação das armas de destruição em massa.

forço de meios humanos e tecnológicos é um fator crítico para a melhoria da eficácia. Assim, a eficácia tem naturalmente melhorado nas áreas em que esse investimento é mais evidente, ao contrário do que sucede nas áreas em que esse investimento é nulo ou incipiente.

Da mesma forma, o aprofundamento dos instrumentos de cooperação – formais e informais, nacionais e internacionais – nas mais diversas vertentes, tem-se consolidado como um fator gerador de eficácia. Posso testemunhar, nas diversas reuniões realizadas sob a égide da Comissão de Cooperação, o impacto positivo que é produzido pela troca de experiências e informação.

Quais são os principais desafios que ainda se colocam, quer ao nível legislativo, quer ao nível da aplicação prática, para tornar o sistema mais robusto?

No campo legislativo, e sem prejuízo de algumas necessidades pontuais de melhoria já em curso (por exemplo, no âmbito da recuperação de ativos), destaca-se a necessidade de executar ou transpor para a ordem jurídica nacional o pacote europeu anti-branqueamento, aprovado no ano passado pelo legislador europeu. Em matéria de aplicação prática, destacaria a necessidade de incrementar substancialmente a eficácia do setor não financeiro no cumprimento dos deveres de prevenção do BC/FT; a importância de aumentar as análises estratégicas e de tipologias que contribuam para uma maior capacidade de deteção das situações atípicas que devem ser objeto de comunicação; a criticidade de aumentar a abrangência de dados estatísticos em alguns domínios e, por último, de explorar todas as potencialidades conferidas pelo quadro de recuperação e gestão de ativos.

Por último, há uma necessidade de adaptação constante aos riscos verificados em ambiente digital, seja por força do surgimento de novas tecnologias (por exemplo, associadas à utilização de ativos virtuais), seja pela evolução das operativas criminais e de fraude no meio cibernético.

Em que áreas sente que é mais urgente investir?

As áreas em que é mais urgente investir são aquelas em que se colocam maiores desafios ao nível da aplicação prática, como já referi. Destacaria novamente, neste âmbito, a importância de aumentar substancialmente a eficácia e o nível de consciencialização no setor não financeiro, em particular nas áreas de maior risco, permitindo-me aqui destacar as entidades e os profissionais que intervêm na realização de transações imobiliárias e na criação de estruturas – incluindo ao nível da assessoria jurídica – que propiciem a opacidade sobre quem realmente as controla.

Quais são as prioridades estratégicas para Portugal, nesta matéria, nos próximos anos?

Numa perspetiva mais formalista, as prioridades estratégicas são aquelas que resultam das avaliações nacionais dos riscos de BC/FT e da estratégia nacional neste domínio, que atualmente consta da Resolução do Conselho de Ministros n.º 69/2022, de 9 de agosto, e que será necessariamente objeto de revisão.

Já de um ponto de vista mais substantivo, as prioridades estratégicas deverão passar por concretizar as melhorias a que já fiz referência, mantendo pelo menos a capacidade de resposta nas áreas hoje mais desenvolvidas. Neste contexto, é também fundamental aplicar as novas tecnologias na prevenção e combate ao BC/ FT, por exemplo no tratamento dos dados massificados que hoje são comunicados no cumprimento dos deveres preventivos do BC/FT. A massificação dos dados impossibilita, a meu ver, a análise individualizada das comunicações de operações suspeitas que não impliquem a abstenção da realização dessas operações, sendo vital a aplicação de sistemas de IA que permitam identificar as principais tipologias e riscos, bem como prestar feedback sobre a qualidade das comunicações efetuadas. A melhoria da qualidade da informação financeira traduz-se naturalmente em prova mais robusta e, nessa medida, permite melhorar a correlação entre os resultados do sistema de prevenção e o sucesso das investigações criminais.

A avaliação mútua do GAFI é um momento importante. Que expectativas existem para a próxima avaliação de Portugal e que áreas exigirão maior atenção?

Portugal tem, consistentemente, vindo a beneficiar

de avaliações positivas, com reflexo no tipo de acompanhamento (menos intenso) que o GAFI tem vindo a fazer das recomendações que nos são dirigidas, na sequência dos exercícios de avaliação. Todavia, a manutenção dos resultados obtidos em anteriores avaliações está dependente da introdução de melhorias práticas nas áreas que já identifiquei, com destaque para o setor não financeiro. Ao invés do que sucedeu em anteriores avaliações, as autoridades, entidades e profissionais do setor não financeiro, onde se enquadram os Solicitadores, deixarão de ser avaliados conjuntamente com o setor não financeiro. Esta avaliação autónoma, ao não poder beneficiar dos controlos postos em prática pelo setor financeiro, mesmo para as operações processadas pelas profissões relevantes do setor não financeiro, colocará a nu as deficiências que não sejam corrigidas e poderá ter um impacto negativo na nossa avaliação. Recordo, a este respeito, que o período de referência das avaliações do GAFI abrange os cinco anos anteriores à data da avaliação. Ora, estando o início da avaliação agendado para o segundo semestre de 2027, é bom ter presente que mais de metade desse período já decorreu sem que tenham sido introduzidas melhorias significativas.

No quadro legal e institucional português, qual é o papel dos Solicitadores e dos Agentes de Execução no combate à corrupção e ao branqueamento de capitais?

Focando-me na prevenção e combate ao branqueamento, começaria por referir que os Solicitadores estão sujeitos ao cumprimento dos deveres de prevenção do branqueamento, o mesmo não sucedendo com os Agentes de Execução (sem prejuízo de todos devermos contribuir para esta causa coletiva). Estes deveres compreendem saber identificar as operações de maior risco a que são aplicáveis os deveres de prevenção do BC/FT, com destaque para a intervenção – quer enquanto tituladores, quer no âmbito da consulta jurídica – em transações imobiliárias, na criação e gestão de pessoas coletivas e outras estruturas em representação dos clientes, a par da realização de operações financeiras, como a abertura de conta, em representação dos clientes. Estes deveres compreendem identificar, conhecer e acompanhar a atividade do cliente, com o intuito de comunicar operações potencialmente suspeitas à Unidade de Informação Financeira e ao DCIAP. Os Solicitadores, enquanto um dos garantes da integridade jurídica em operações de elevado risco (os denominados gatekeepers), têm assim um papel fundamental de interesse público, através da colaboração na identificação de pessoas, entidades ou transações potencialmente suspeitas (sempre no estrito respeito das obrigações de sigilo aplicáveis).

Que boas práticas ou mecanismos de cooperação

Os Solicitadores estão sujeitos ao cumprimento dos deveres de prevenção do branqueamento, o mesmo não sucedendo com os Agentes de Execução (sem prejuízo de todos devermos contribuir para esta causa coletiva). Estes deveres compreendem saber identificar as operações de maior risco a que são aplicáveis os deveres de prevenção do BC/FT, com destaque para a intervenção – quer enquanto tituladores, quer no âmbito da consulta jurídica – em transações imobiliárias, na criação e gestão de pessoas coletivas e outras estruturas em representação dos clientes, a par da realização de operações financeiras, como a abertura de conta, em representação dos clientes.

entre estes profissionais e as autoridades considera essenciais para prevenir riscos?

Estamos a concluir a atualização da avaliação nacional dos riscos de BC/FT, na qual foi efetuada uma análise das comunicações de operações suspeitas entre 2019 e 2023. É com muita preocupação que constatamos a inexistência de comunicações efetuadas pelos Solicitadores, o que evidencia um estado muito embrionário ao nível do cumprimento dos deveres de prevenção do BC/FT, sem prejuízo de todos nos revermos, pelo menos ao nível teórico, na nobreza da causa. É, assim, essencial que os Solicitadores procurem identificar e caracterizar adequadamente a atividade dos seus clientes, comunicando às autoridades as situações em que as operações ou fundos envolvidos não encontram justificação naquela atividade.

Que mensagem gostaria de deixar aos associados da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE) quanto ao seu contributo para um sistema mais transparente e íntegro?

É fundamental uma consciencialização transversal da importância de cumprir na prática os deveres de prevenção do BCFT. Nesse âmbito, a OSAE pode desempenhar um papel essencial não apenas no âmbito formativo, mas também no desenvolvimento de uma atividade de fiscalização e disciplinar efetiva que garanta, através de recolha periódica de informação e de ações de natureza inspetiva, o cumprimento pelos profissionais de obrigações basilares, como sejam: identificação e avaliação dos riscos que enfrentam; identificação, caracterização e acompanhamento dos clientes; comunicação de operações suspeitas e definição de responsáveis pelo cumprimento dos deveres preventivos ao nível dos próprios profissionais, que assegurem o estabelecimento e a execução dos procedimentos necessários.

Por fim, o que gostaria de dizer às instituições e profissionais que, no seu dia a dia, têm um papel ativo na promoção da integridade, transparência e cumprimento das normas em Portugal? É fundamental que exista comprometimento e investimento por parte de profissionais, Ordens e autoridades nesta causa. Os recursos humanos e tecnológicos que hoje investirmos na prevenção ou combate ao BC/FT são o garante da integridade no ambiente de negócios, com ganhos reputacionais para os profissionais e para o país. Tais ganhos reputacionais traduzir-se-ão, mais cedo ou mais tarde, também em ganhos económicos que justificam a racionalidade do investimento que a todos é pedido. Esse esforço tem naturalmente de ser proporcional à dimensão e riscos incorridos por cada profissional na atividade que desenvolve, sendo fundamental o contributo das Ordens Profissionais e das autoridades setoriais para essa concretização prática.

Dia do Solicitador 2025 UM MÊS DE CELEBRAÇÕES QUE APROXIMOU A ORDEM DOS SEUS ASSOCIADOS

Entre 8 de maio e 12 de junho, a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE) promoveu um vasto conjunto de iniciativas em várias regiões do país para assinalar o Dia do Solicitador, que se celebra a 10 de maio. O programa, diversificado e descentralizado, teve como principal objetivo fortalecer a ligação entre a Ordem e os seus membros, dando também visibilidade ao papel essencial que os Solicitadores e os Agentes de Execução desempenham na Justiça e na sociedade portuguesa.

As comemorações, que decorreram sob o lema da proximidade e valorização profissional, envolveram mais de uma dezena de eventos, tanto presenciais como online, organizados pelo Conselho Geral, pelos Conselhos Profissionais e pelos Conselhos Regionais. Para a Bastonária da OSAE, Anabela Veloso, o balanço foi “muito positivo” e refletiu o espírito de união da classe. “O Dia do Solicitador celebra a nossa profissão e queremos que todos tenham oportunidade de participar. Este ano, conseguimos chegar a mais colegas e reforçar o sentido de pertença que caracteriza a nossa Ordem”, afirmou.

O calendário das celebrações arrancou em Gondomar, a 8 de maio, onde, através da iniciativa “OSAE em Movimento”, se realizaram workshops dirigidos a Solicitadores e a Agentes de Execução, dedicados à atualização de conhecimentos e à partilha de boas práticas. O momento foi igualmente marcado pela tradicional cerimónia de assinatura dos compromissos de honra e pela entrega de diplomas aos novos profissionais, dois dos momentos mais simbólicos e emocionantes de todo o programa.

A dimensão formativa continuou presente ao longo das comemorações. No dia 10 de maio, realizou-se uma conferência online subordinada ao tema “A Inteligência Artificial na Gestão do Escritório”, que reuniu participantes de todo o país e destacou a importância da modernização das práticas jurídicas. A sessão permitiu refletir sobre o impacto da tecnologia na profissão e sobre as novas competências que os Solicitadores e os Agentes de Execução devem desenvolver para responder aos desafios do futuro.

A 14 de maio, Lisboa foi palco de várias iniciativas relevantes. Um grupo de associados visitou a Assembleia da República, numa ação organizada pelo Conselho Regional de Lisboa, que visou reforçar o diálogo institucional e dar a conhecer o contributo dos profissionais da OSAE para o funcionamento da Justiça. Nesse mesmo dia, a Ordem participou num Consultório Jurídico especial, transmitido pela RTP no programa “A Nossa Tarde”, no qual foram abordadas questões práticas e esclarecidas dúvidas do público, aproximando a profissão dos cidadãos.

OSAE em Movimento – Lisboa
Visita à Assembleia da República
Participação da OSAE na rubrica Consultório Jurídico no programa A Nossa Tarde, na RTP

As regiões autónomas também tiveram destaque nestas comemorações. Nos Açores, na cidade de Ponta Delgada, e na Madeira, no Funchal, respetivamente a 21 e a 26 de maio, realizaram-se workshops e cerimónias de entrega de diplomas, integrados no “OSAE em Movimento”, que contaram com grande adesão. Em ambos os locais, os eventos sublinharam a importância de uma presença ativa da OSAE em todo o território, valorizando os profissionais locais e promovendo a coesão dentro da classe. Para a Bastonária, “foi essencial garantir que todos os Solicitadores, do continente e das ilhas, sentissem que pertencem à mesma casa e que a Ordem está próxima de cada um deles”.

No interior do país, as comemorações prosseguiram com grande dinamismo. Em Bragança, nos dias 30 e 31 de maio, tiveram lugar duas iniciativas marcantes: no dia 30, uma conferência organizada em parceria com o Centro Nacional de Inovação Jurídica abordou o cadastro predial; no dia 31, um Conselho Geral aberto aos associados permitiu um diálogo direto entre os órgãos dirigentes e os profissionais. O encontro foi considerado como um passo importante na política de transparência e participação que a OSAE tem vindo a defender.

Já no mês de junho, a iniciativa “OSAE em Movimento” chegou a Lisboa, no dia 4, e a Coimbra, no dia 5, onde se repetiram as sessões formativas e as cerimónias de compromisso e entrega de diplomas. Em ambos os locais, o espírito de partilha e celebração marcou o reencontro de gerações de Solicitadores e Agentes de Execução, reforçando o orgulho na profissão.

A 7 de junho, o programa estendeu-se ao Fundão, com um evento integrado na tradicional Festa da Cereja. Esta iniciativa, organizada pelo Conselho Regional de Coimbra e intitulada de “Solicitadores e Agentes de Execução em família”, simbolizou a ligação da Ordem à comunidade e ao território, mostrando que a valorização da profissão também passa por momentos de convívio e envolvimento local.

Conferência “Cadastro Predial: solução ou problema?”, em Bragança
Conselho Geral em Bragança
OSAE em Movimento – Madeira
OSAE em Movimento – Açores Evento “Solicitadores e Agentes de Execução em família”

As comemorações encerraram oficialmente a 12 de junho, em Coimbra, com a celebração do Dia Regional do Solicitador, que reuniu profissionais de toda a região nas iniciativas “Conversas no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra” e “Conversas com as Execuções no Tribunal de Execuções de Soure”.

O balanço final foi amplamente positivo. Anabela Veloso destacou a forte participação dos associados e o sucesso da descentralização. A Bastonária agradeceu também o empenho de todos na organização destes eventos e sublinhou o valor do trabalho coletivo: “Conseguimos unir a profissão em torno de valores comuns, promover a formação e dar visibilidade ao trabalho dos nossos colegas em todo o país. Foi um mês de celebração, mas também de afirmação da nossa relevância social e institucional”.

OSAE em Movimento – Coimbra
OSAE em Movimento – Gondomar
Conversas no Tribunal

Num contexto em que a transformação digital redefine diariamente a forma como trabalhamos, comunicamos e prestamos serviços, a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE) tem vindo a afirmar-se como uma instituição visionária e comprometida com a modernização e a eficiência tecnológica. No centro desta missão encontra-se o Instituto de Tecnologia e Inovação (ITI), uma estrutura criada para conceber, desenvolver e acompanhar soluções tecnológicas que respondam, de forma concreta, às necessidades dos profissionais e da própria Ordem.

Em entrevista, Paulo Barata, Coordenador do ITI, e Marco Santos, Coordenadoradjunto, partilham a visão, os desafios e as prioridades que orientam este novo ciclo de transformação digital. Falam-nos de um instituto reestruturado e ambicioso, determinado em levar a OSAE para uma nova era tecnológica, com sistemas mais ágeis, plataformas mais inteligentes e infraestruturas robustas e seguras. Sempre com um único objetivo: servir, com excelência, os profissionais, o cidadão e a Justiça.

Entrevista Joana Gonçalves / Fotografia Alfredo Matos

Qual é a missão fundamental do ITI e como tem evoluído este Instituto?

A missão do ITI é idealizar, desenvolver e acompanhar soluções tecnológicas que respondam às reais necessidades dos solicitadores e dos agentes de execução, assim como da própria OSAE. Trata-se de uma estrutura estratégica ao serviço da Ordem e dos seus profissionais, por forma a garantir que a inovação não seja um mero conceito abstrato, mas sim uma prática concreta que simplifique, dignifique e fortaleça o exercício das nossas profissões.

O ITI foi reestruturado neste mandato com uma ambição muito clara: impulsionar a OSAE para uma nova era tecnológica. Queremos sistemas mais ágeis, plataformas mais inteligentes e infraestruturas que estejam realmente à altura das exigências e das necessidades profissionais dos nossos colegas.

Esta missão é, na verdade, de complexa execução, mas tem no seu âmago um objetivo muito simples: dar aos profissionais da OSAE condições para exercerem a sua atividade com mais produtividade, mais confiança e autonomia. Em suma, concentrando-se no que realmente importa. Estamos cientes de que tal modernização e inovação é uma necessidade urgente e estamos aqui para a concretizar.

Quais são, atualmente, as plataformas digitais desenvolvidas ou geridas pela OSAE?

Atualmente, a OSAE gere mais de 20 plataformas digitais, pensadas para apoiar o exercício profissional de solicitadores e agentes de execução. Entre as mais relevantes estão o SISAAE, ROAS, GeoPredial, Soligest e Solipred, que dão suporte direto às atividades diárias dos profissionais.

Destacam-se ainda plataformas como o PEPEX, o e-Leilões, o Homebanking, a Plataforma de Viagem de Menores, os Autos de Constatação, o OSAE 360 e o OSAE Mobile, entre outras soluções específicas, tanto para associados como para o público em geral. Trata-se de um ecossistema digital de ferramentas que urge repensar e fazer evoluir.

A nossa missão é clara: simplificar, automatizar e modernizar, para que os sistemas se transformem em verdadeiros aliados no exercício da profissão.

Coordenador
“Transformar para simplificar: A visão do Instituto de Tecnologia e Inovação para o futuro digital da OSAE”

Marco Santos

Coordenador-adjunto

O que queremos é simples: continuar a evoluir para que cada profissional sinta que tem ao seu lado um sistema que responde e que melhora, de forma real, a qualidade do seu trabalho.

De que forma estas soluções tecnológicas têm contribuído para a modernização do exercício profissional e para uma maior eficiência na relação com os cidadãos e entidades públicas?

Não tenhamos dúvidas que estas soluções tecnológicas têm sido fundamentais para modernizar a forma como trabalhamos. Ao permitir centralizar informação, automatizar tarefas e garantir comunicações eletrónicas seguras, elas dão-nos algo muito valioso: tempo e confiança.

Se, por um lado, para os profissionais, isto se traduz numa maior eficiência no desenvolvimento da sua atividade, com menos burocracia e mais foco no que verdadeiramente importa, por outro lado, para os cidadãos e entidades públicas, significa ter respostas mais rápidas, processos mais transparentes e uma relação mais direta e eficiente.

No fundo, estas ferramentas não são apenas tecnologia. Podemos afirmar que são também pontes que aproximam os profissionais da sociedade e reforçam a credibilidade da nossa profissão.

Estão previstas novas funcionalidades ou desenvolvimentos tecnológicos a curto ou médio prazo?

Que funcionalidades e vantagens oferecem estas plataformas aos Solicitadores e Agentes de Execução?

Resumidamente, todas estas plataformas foram criadas com o propósito de satisfazer as necessidades profissionais dos associados e, até mesmo, desenvolver ou consolidar competências. Seja na gestão do escritório, no registo de atos, na tramitação de processos executivos, na consulta de informação predial ou enquanto subsidiária a novas ambições, cada ferramenta procura resolver problemas concretos ou complementar tarefas do dia a dia.

Se é facto que o SISAAE veio, paulatinamente, evoluindo no sentido de trazer ao agente de execução um maior controlo sobre os seus processos, também o ROAS veio garantir aos solicitadores a autenticidade e transparência dos atos por eles praticados. Já o GeoPredial, símbolo de inovação e arrojo — características comuns aos nossos profissionais —, permitiu ao solicitador reunir um conjunto de novas valências. Estes são exemplos de três plataformas, três realidades distintas, mas todas com o mesmo fim: facilitar e valorizar o trabalho dos profissionais.

O que queremos é simples: continuar a evoluir para que cada profissional sinta que tem ao seu lado um sistema que responde e que melhora, de forma real, a qualidade do seu trabalho. Isso é o que nos move.

O que está previsto é mais do que acrescentar funcionalidades, é preparar uma transformação estrutural e tecnológica. Não se trata apenas de modernizar plataformas, mas também de reforçar as infraestruturas que lhes dão suporte, para que os colegas possam trabalhar com sistemas tecnologicamente robustos, seguros e alinhados com as melhores práticas internacionais. Neste momento, estamos a formalizar uma estratégia de ação que consideramos séria e exequível, porque não queremos cair no erro de anunciar mudanças sem capacidade de as concretizar. Portanto, o que estamos a preparar é uma verdadeira transformação digital. Não falamos de intenções vagas ou de planos arrumados numa gaveta, eternamente adiados, mas de uma estratégia concreta, assente no reforço técnico e numa metodologia clara, com vista a reforçar as infraestruturas e projetar o futuro através de soluções seguras, intuitivas, inteligentes e, acima de tudo, integradas.

É importante sublinhar que, mesmo reconhecendo a necessidade de evoluir, o ecossistema tecnológico da OSAE encontra-se já num nível de interoperabilidade e integração que muitos países apenas agora começam a explorar. Este é um património de inovação que queremos preservar e fazer crescer, reforçando o papel de liderança da OSAE no contexto europeu da digitalização da Justiça.

O nosso objetivo é claro: desenhar um plano sólido que permita, a curto e médio prazo, dar respostas concretas. Queremos que os colegas sintam que existe uma

O que estamos a preparar é uma verdadeira transformação digital.

visão, um rumo definido e, sobretudo, a determinação de não voltar a cair na inércia do “vamos fazer” sem resultados. É essa a visão simples, firme e inadiável, que queremos tornar realidade.

O SISAAE, que existe desde 2003, tem conseguido acompanhar e evoluir à mesma velocidade que a função do Agente de Execução?

O SISAAE tem uma história que merece ser reconhecida. Desde 2003, acompanhou as necessidades da profissão e foi um instrumento essencial para a dignificação da atividade de agente de execução. Consideramos que, durante anos, foi sinónimo de pioneirismo, responsabilidade e ambição profissional, tendo contribuído, em grande medida, para a consolidação da atividade. Desde o crescente volume de interações eletrónicas com os tribunais, advogados e as diversas entidades públicas, permitindo uma maior produtividade e eficiência que até então não existia, até à relação com as instituições bancárias, cuja inovação simplificou procedimentos, encurtou prazos, aumentou a eficiência e, acima de tudo, trouxe maior segurança ao trabalho dos agentes de execução. É verdade que se torna evidente a necessidade urgente de uma modernização profunda, sobretudo porque o SISAAE não vive isolado, estabelece múltiplas ligações com inúmeras plataformas institucionais que estão a ser objeto de uma revolução tecnológica no âmbito do PRR.

O desafio é grande, mas é também uma oportunidade única. Se, no passado, o SISAAE foi sinónimo de modernidade, queremos agora que volte a sê-lo. Necessitamos de um sistema robusto, atualizado e capaz de responder às exigências crescentes da profissão, garantindo ao agente de execução a confiança e as ferramentas que precisa para levar a cabo a sua missão com eficiência e dignidade e, eventualmente, a inclusão para uma nova competência.

A marca GeoPredial tem também uma componente tecnológica muito relevante. Há desenvolvimentos previstos?

Ao longo do tempo, o GeoPredial foi muito mais do que uma plataforma tecnológica. Permitiu-nos, enquanto juristas, dar um salto no domínio do conceito de prédio, não apenas na vertente jurídica, mas também no seu

complemento físico. Essa visão integrada foi decisiva para a participação dos nossos profissionais no projeto BUPi, onde o GeoPredial teve um papel preponderante. É verdade que, nos últimos anos, a marca perdeu dinamismo e há quem vaticine o seu desaparecimento por inutilidade, tendo em consideração a evolução das plataformas institucionais existentes, mas não partilhamos dessa visão. Consideramos que o GeoPredial pode ser revitalizado e atualizado, sobretudo para acompanhar os mais recentes desenvolvimentos legislativos no âmbito do cadastro predial. Esse é o caminho que nos parece natural para reforçar a sua utilidade e lhe devolver centralidade no trabalho dos solicitadores.

Existem ideias para a sua revitalização. No entanto, o que podemos assegurar é a nossa convicção: o GeoPredial tem futuro e não deixaremos que um projeto desta relevância se perca.

No passado mês de julho registaram-se constrangimentos informáticos com impacto na atividade dos profissionais. Que medidas foram implementadas para resolver a situação e reforçar a resiliência das infraestruturas tecnológicas da OSAE?

Durante os meses de julho e agosto registaram-se constrangimentos técnicos que exigiram uma resposta imediata e coordenada e que foram resolvidos com prioridade máxima, assegurando sempre a integridade e segurança da informação. Qualquer constrangimento tecnológico representa um desafio adicional para uma profissão já exigente, o que reforça a importância de continuarmos a investir em soluções resilientes e integradas. Partilhamos dessa frustração porque, a par de sermos representantes de uma classe, também somos profissionais e sentimos na pele o que significa ficar dependente de ferramentas que não respondem como deviam.

O selo digital, já em fase avançada de desenvolvimento, representará um avanço significativo na modernização dos atos praticados pelos profissionais.

A primeira preocupação é sempre recuperar a normalidade com a maior rapidez possível, salvaguardando a segurança da informação. Destes incidentes resultou a inevitabilidade de encarar, com realismo, as necessidades dos nossos sistemas e dar início a um plano estratégico de modernização tecnológica.

Há, em tudo isto, um ponto que se revela central: todo o SISAAE terá de ser alvo de modernização, para que deixe de ser um sistema pesado e ultrapassado e passe a ser uma verdadeira ferramenta de futuro, mais estável, mais segura, mais intuitiva e capaz de responder às exigências crescentes da atividade dos agentes de execução. Estes acontecimentos reforçaram a consciência coletiva sobre a importância de continuar a investir na modernização e resiliência dos nossos sistemas tecnológicos. Estes acontecimentos não só aceleraram essa perceção, como reforçaram a nossa determinação em não adiar mais o que é fundamental. O caminho da modernização não é apenas desejável, é inadiável.

Na altura, a direção comunicou que iria avançar com uma auditoria. Qual o ponto de situação?

A auditoria foi um compromisso assumido desde o início do mandato, enquadrado na necessidade de definir uma estratégia tecnológica para o futuro e acompanhar a rápida evolução dos sistemas de informação. Os acontecimentos recentes apenas reforçaram a pertinência e urgência deste projeto. Neste momento, encontram-se em curso os procedimentos necessários para a seleção, e eventual abertura de concurso público, com vista à contratação de uma empresa externa que assegure essa auditoria.

O objetivo é garantir total independência e rigor na

análise. Queremos que este processo não se limite a identificar fragilidades, mas que produza um relatório com recomendações práticas e úteis para reforçar as nossas infraestruturas e sistemas.

O mais importante é que os colegas saibam que não se trata de uma formalidade. A auditoria é um instrumento estratégico essencial para aprendermos com o que aconteceu e para construirmos, com transparência, bases mais sólidas para o futuro.

Registámos também, recentemente, uma falha no fornecimento de selos de autenticação. Para quando a disponibilização da alternativa digital?

O processo de transição do selo físico para o selo eletrónico tem sido cuidadosamente acompanhado, garantindo a sua total segurança e fiabilidade. O selo digital, já em fase avançada de desenvolvimento, representará um avanço significativo na modernização dos atos praticados pelos profissionais. Sabemos bem o impacto que situações destas têm no trabalho diário, sobretudo quando dependemos de ferramentas essenciais para a prática dos atos profissionais.

Felizmente, estamos agora numa fase evolutiva. O selo eletrónico encontra-se já em avançado estado de desenvolvimento e será uma alternativa digital ao selo físico.

A nossa prioridade é que esta transição decorra de forma tranquila, sem riscos e com total confiança dos utilizadores. Estamos convictos de que este passo marcará um avanço importante na modernização dos atos praticados pelos profissionais, reforçando a sua credibilidade e simplificando o seu trabalho.

Que principais desafios se colocam à transição digital dos Solicitadores e dos Agentes de Execução?

A transição digital coloca-nos vários desafios, mas talvez o maior seja fazê-la com inteligência e sentido estratégico. Modernizar não pode significar mudar tudo de um dia para o outro. Tem de ser um processo gradual,

Queremos uma modernização que inspire confiança e que devolva tranquilidade aos colegas no seu trabalho diário.

sólido e bem planeado, que envolva tanto as plataformas como as infraestruturas que lhes dão suporte. Compete-nos garantir que cada passo dado é um passo seguro, que os sistemas são estáveis, as ligações entre plataformas funcionam e que a tecnologia serve verdadeiramente os profissionais, e não o contrário. Não estamos apenas a falar de software, estamos a falar de bases técnicas, redes, servidores e sistemas de segurança que assegurem a continuidade dos serviços.

Queremos uma modernização que inspire confiança e que devolva tranquilidade aos colegas no seu trabalho diário. É esse o verdadeiro desafio.

O serviço de helpdesk da OSAE tem um papel fundamental no apoio diário aos profissionais. Que avaliação fazem deste serviço e que mudanças estão previstas para melhorar a qualidade do atendimento e a interação com os associados?

O helpdesk é, sem dúvida, a linha da frente da relação com os problemas dos colegas, é ali que sentimos, em tempo real, as dificuldades, as urgências e as frustrações que os associados enfrentam no seu trabalho diário. Temos uma equipa dedicada, que trabalha com grande empenho e sentido de missão, muitas vezes sob enorme pressão, para prestar o apoio necessário aos associados.

Ainda assim, sabemos que podemos, e devemos, evoluir. Estamos a rever processos e ferramentas para tornar o serviço mais ágil, mais próximo e mais eficaz. Queremos que o helpdesk seja mais do que um ponto de contacto técnico. Queremos que seja um verdadeiro espaço de acompanhamento permanente, proximidade e apoio especializado aos profissionais.

Entre as medidas em preparação estão a modernização da plataforma de gestão de pedidos e a criação de canais complementares de contacto. E, de forma gra-

dual, estudamos também a introdução de um primeiro nível de apoio assistido por inteligência artificial, que permita respostas mais rápidas às questões recorrentes, libertando os nossos colaboradores para casos de maior complexidade.

O objetivo é simples: garantir que cada colega encontre apoio constante, humano quando necessário, tecnológico quando possível, mas que, em ambos os casos, se sinta compreendido e bem acompanhado.

Qual é a abordagem do Instituto relativamente à integração de inteligência artificial no contexto da atuação dos profissionais representados pela OSAE?

A inteligência artificial (IA) representa uma oportunidade notável para reforçar a eficiência e a qualidade do trabalho dos nossos profissionais. É, inevitavelmente, uma nova etapa na evolução tecnológica, talvez a mais desafiante e transformadora das últimas décadas. No ITI, olhamos para ela com o mesmo espírito com que, em tempos, a sociedade acolheu a chegada dos computadores ou a internet de forma generalizada. Cada uma dessas “revoluções” alterou profundamente a forma como trabalhamos, comunicamos e até mesmo como pensamos. Esta é apenas mais uma etapa desse percurso, aparentemente mais frenética, sim, e por isso mais intensa e por vezes assustadora, mas igualmente repleta de possibilidades. No entanto, encaramos a sua integração com prudência e responsabilidade, como uma evolução natural da forma como exercemos as nossas funções. Vemos a integração da IA como uma ferramenta poderosa de apoio ao trabalho diário, ajudando na análise de informação, na automatização de tarefas repetitivas

e na gestão de processos mais complexos. Uma aliada com enorme potencial para que o associado se possa concentrar no essencial: o raciocínio estratégico-jurídico, o juízo técnico e a responsabilidade ética, aquelas que nenhuma tecnologia poderá substituir.

A nossa abordagem será gradual, ética, segura e estrategicamente pensada, garantindo que cada avanço tecnológico reforça, e nunca fragiliza, o papel do solicitador e do agente de execução, respeitando a sua autonomia e reforçando o papel da OSAE como referência de rigor e modernidade.

A história mostra-nos que cada revolução tecnológica, que parecia ameaçadora, nos obrigou a adaptar e acabou por nos fazer crescer. Queremos dizer com isto

que ninguém fica para trás neste processo, porque a modernização tecnológica só é completa quando se transforma também em modernização humana.

Que papel considera que a formação contínua deve assumir neste processo de transformação digital?

A formação contínua será sempre um dos pilares fundamentais de toda a transformação digital. A modernização tecnológica só faz sentido se for acompanhada por um processo de aprendizagem contínuo, que permita aos associados compreender, dominar e tirar verdadeiro proveito das novas ferramentas.

Mais do que ensinar a usar plataformas, a formação deve servir para fortalecer a confiança dos colegas e promover uma adaptação tranquila às novas realidades digitais. Sem sobrecarregar, é impreterível capacitar, dar tempo, contexto e apoio para que cada colega possa evoluir ao seu ritmo.

que não devemos temer o futuro, mas sim compreendê-lo com a inteligência e o sentido de missão que sempre definiram a nossa casa e os nossos profissionais.

Existem planos para reforçar a literacia digital, quer junto dos novos profissionais que integram a carreira, quer dos que já têm largos anos de profissão?

Estamos conscientes da importância da literacia digital e do impacto que ela terá no dia a dia dos nossos profissionais. Sabemos que qualquer mudança tecnológica só é verdadeiramente bem-sucedida se vier acompanhada da necessária capacitação dos seus utilizadores, tanto dos que agora iniciam a carreira, como dos que já têm largos anos de experiência.

Neste momento, o foco está nos desenvolvimentos aplicacionais e na modernização das infraestruturas. Só depois dessa base estar consolidada poderemos desenhar, de forma realista e eficaz, os planos de formação e de apoio aos colegas, ajustados às novas funcionalidades das plataformas.

A revolução digital que queremos implementar será progressiva e acompanhada passo a passo. O nosso compromisso é simples: à medida que a tecnologia evolui, evoluirá também a formação e o apoio aos colegas. Estamos atentos, sensíveis e determinados em garantir

Este será um caminho progressivo e sustentado que acompanhará cada etapa da modernização das plataformas. A transformação digital não se impõe, constrói-se. Neste cenário, a formação é o elo que garantirá que todos os associados evoluam com segurança e autonomia.

Quais são as principais prioridades estratégicas do Instituto para os próximos anos?

As prioridades estratégicas para os próximos anos assentam numa visão ambiciosa, mas muito clara: modernizar e planear com responsabilidade, garantindo que cada passo consolida uma base tecnológica sólida, segura e preparada para o futuro. Neste sentido, está em curso uma auditoria técnica que nos ajudará a delinear um plano estratégico de evolução responsável e exequível e que também nos permitirá identificar fragilidades, definir prioridades e estruturar um processo de transformação digital sustentado e realista.

Entre os eixos centrais dessa estratégia, destaca-se a revisão e otimização da base de dados, complexa por sinal, que necessita de ser modernizada para garantir um melhor desempenho, segurança e escalabilidade. Pretendemos avançar com a modularização e modernização do SISAAE, autonomizando alguns dos componentes que o integram, como por exemplo o ROAS, na perspetiva de tornar o sistema mais ágil, mais robusto e sustentável. Teremos também um novo website da OSAE, mais moderno, acessível e funcional, que seja um verdadeiro ponto de convergência entre os profissionais e a instituição. E, claro, não nos esqueceremos do GeoPredial, porque acreditamos no seu potencial e queremos revitalizá-lo, alinhando-o com as necessidades dos associados, com os desenvolvimentos legislativos do cadastro predial e na senda da transformação digital em curso.

Estes são apenas alguns exemplos do que pretendemos executar. Mas, como já mencionámos, temos uma visão ambiciosa, não apenas de modernização, mas também para extrair o máximo possível do potencial das nossas plataformas, garantindo a interoperabilidade entre elas e com as plataformas institucionais nacionais, para que os profissionais possam tirar pleno partido desta nova era de digitalização e inteligência artificial.

Que mensagem gostariam de deixar aos Solicitadores e aos Agentes de Execução?

A mensagem que queremos deixar é de confiança, de serenidade e de determinação. Sabemos que os poucos meses em que aqui estamos trouxeram desafios difíceis e inesperados. Mas cada uma dessas dificuldades só veio reforçar a nossa convicção de que é urgente evoluir. Estamos totalmente focados em melhorar as ferramentas que existem, corrigindo fragilidades e garantindo estabilidade, sem nunca perder de vista a inovação e o sentido de oportunidade que esta nova era tecnológica nos oferece. Queremos saber aproveitar as interações e as sinergias que hoje se abrem entre sistemas e instituições, para que possamos evoluir de forma integrada e inteligente. É

essa a essência do trabalho que estamos a desenvolver. Queremos agir no presente para preparar o futuro. No entanto, temos plena consciência de que esta transformação exigirá um investimento significativo, sendo nosso dever zelar pelos recursos disponíveis. O nosso compromisso é o de garantir que cada passo seja dado com critério, transparência e sentido de responsabilidade. Não queremos uma evolução abrupta, nem uma revolução feita por impulso. Queremos, sim, uma evolução segura, sustentada e financeiramente equilibrada, que garanta resultados duradouros, unicamente com o objetivo de beneficiar os associados. Para nós, a tecnologia só tem valor quando simplifica, quando facilita o trabalho e reforça a dignidade de quem a utiliza. Por isso, antes de pensar em evoluir sistemas e aplicações, pensamos nos colegas e nos problemas reais que precisamos de resolver e simplificar. Sabemos que a tarefa será exigente, mas a nossa motivação é maior, já que, no fim de tudo, é por e para os associados que tudo isto existe. São eles o princípio e o fim de cada investimento, de cada esforço, de cada inovação. Sempre com um único objetivo: servir, com excelência, o cidadão e a Justiça.

AF_Anuncio_IX Congresso da OSAE_210x135mm.pdf 1 06/10/2025 11:50

De pessoas para pessoas: um Conselho Regional (mais) próximo

Conselho Regional Coimbra

Acreditamos que quanto mais próximos estivermos, mais fortes e coesos nos apresentaremos. Temos a plena convicção das responsabilidades e obrigações que estão associadas à missão que fomos chamados a desempenhar.

O Conselho Regional de Coimbra tem, em si, a génese da simplicidade e da humildade, sem nunca descurar o propósito da defesa dos interesses dos seus associados.

Tem sido assim e assim continuará.

Precisamos, no entanto, que os destinatários da nossa atuação cheguem até nós, para que possamos chegar até eles.

Falamos, naturalmente, de iniciativas pensadas e criadas para os associados. Queremos a participação de todos. Estamos de portas abertas e disponíveis para receber as sugestões que se entendam positivas para melhorar o nosso desempenho.

Prestes a celebrar dez anos de existência, o Conselho Regional de Coimbra mantém a sua atuação com base em máximas indissociáveis do seu propósito enquanto órgão integrante da OSAE.

Queremos pautar a nossa atuação pelo respeito pelo associado, pelo zelo no tratamento dos seus anseios, dúvidas e expetativas, pela responsabilidade na gestão das tarefas que nos estão delegadas, pela ética e espírito de missão, bem como pela manutenção da imagem da classe perante a sociedade civil.

No próximo dia 4 de março de 2026, estaremos por cá para celebrar um marco que, podendo parecer demasiado simples e prematuro, terá um efeito catalisador na afirmação da OSAE na região Centro, em particular nos cinco distritos que compõem a nossa área de competência.

Esperamos um ano cheio de iniciativas que vão enriquecer pessoal e profissionalmente cada um dos nossos solicitadores e agentes de execução.

Estamos certos disso.

Tanto a direção em funções, como as direções que geriram os destinos da nossa casa, estão, com certeza, orgulhosos do caminho trilhado. Por isso, honrando o passado e vivendo o presente, o futuro avizinha-se bastante promissor.

Para tal, contamos com o sempre pronto e disponível trabalho dos nossos colaboradores, que, de uma forma abnegada e muito criteriosa, têm em si a virtude de tornar tudo mais simples e a capacidade de ultrapassar e resolver até mesmo as situações mais delicadas.

Somos uns sortudos em poder ter por perto as suas capacidades e a sua disponibilidade.

O nosso território é composto por realidades bem distintas.

Todavia, encaramos todos os assuntos da mesma forma e tentamos que o resultado seja sempre aquele que melhor beneficie o seu destinatário.

Estendemo-nos desde o ponto mais alto de Portugal continental, nos distritos de Castelo Branco e da Guarda, com a nossa Serra da Estrela, até à praia, na cidade da Figueira da Foz. Passamos pela mais antiga universidade, na sede de distrito, e pelas terras de Viriato, em Viseu. Não esquecemos os pinhais de Leiria, que em muito são responsáveis pela afirmação da nação além-fronteiras. O nosso território é composto por uma riqueza cultural, económica e financeira imensa e, em conjunto com as nossas delegações distritais e concelhias, temos tentado convergir ideias e afirmar a classe junto da sociedade.

Queremos servir as profissões e as pessoas de uma forma próxima.

Cremos que iremos conseguir ainda mais e melhor. Contamos com todos.

Contem sempre connosco.

Bruno

Proximidade com os Associados!

Conselho Regional Porto

Aceitei o desafio de integrar a equipa do Conselho Regional do Porto (CRP) movida pela necessidade — que bem conheço, enquanto associada a exercer isoladamente no interior transmontano — de aproximar os colegas da Ordem. Quis dar voz a quem, tantas vezes, sente as dificuldades na pele, mas nem sempre as consegue transmitir.

O CRP é de todos e está aberto a ouvir, dialogar e cooperar com os associados!

Temos trabalhado para reforçar os laços entre a classe e entre esta e o cidadão. Queremos uma Ordem descentralizada, próxima e presente. Para continuar esse caminho, contamos também com o apoio e envolvimento de todos os nossos associados.

No passado dia 26 de junho, realizámos o Fórum de Solicitadoria em Viana do Castelo, que foi um verdadeiro sucesso. Contámos com a presença de excelentes palestrantes, que abordaram temas atuais e relevantes, e com uma participação ativa dos colegas, cujo entusiasmo foi essencial para o êxito do evento.

Mantendo o compromisso de descentralização e proximidade, iremos festejar o São Martinho, em Penafiel, no dia 15 de novembro, com o tradicional magusto, num ambiente de grande convívio e partilha entre associados.

Já no dia 26 de novembro, rumaremos ao interior norte, até Sabrosa (Vila Real), para uma conferência dedicada aos registos, ao notariado e à solicitadoria. Espera-nos um debate muito enriquecedor.

Estamos profundamente empenhados em abordar as temáticas que hoje inquietam Solicitadores e Agentes de Execução. Sabemos que, no interior, a desertificação e a escassez de recursos nos serviços públicos tornam mais difícil a vida de quem exerce em prática isolada. Por isso, queremos ir ao encontro desses colegas — ouvir, partilhar, apoiar — e criar espaços onde todos se sintam representados.

Apelamos, por isso, à participação ativa em todas as iniciativas descentralizadas. Só com a presença e contributo de todos poderemos continuar a promovê-las e a dar-lhes a força que merecem.

Durante este mandato, continuamos firmes no propósito de valorizar as profissões de Solicitador e de Agente de Execução, combatendo a concorrência desleal e a prática de atos reservados por terceiros. Mantemos também o compromisso de defender, junto dos serviços públicos, os interesses dos nossos associados, lembrando sempre que os Solicitadores e os Agentes de Execução são peças fundamentais na aplicação da lei e na defesa dos direitos dos cidadãos.

Continuaremos a trabalhar com empenho, seriedade e sentido de mis-

são, reforçando a importância do diálogo e da cooperação entre todos. O sucesso do nosso trabalho depende da participação ativa dos associados — da partilha de ideias, experiências e preocupações, mas também das boas práticas que, todos os dias, se constroem na OSAE.

Acreditamos que é através da união e da cooperação que conseguiremos fortalecer a nossa profissão, garantir o reconhecimento do papel essencial dos Solicitadores e dos Agentes de Execução na sociedade e afirmar, com orgulho, a sua relevância junto das instituições e da comunidade.

Reafirmamos, assim, o nosso compromisso de continuar a promover iniciativas descentralizadas, que aproximem a Ordem dos seus associados e fomentem um contacto mais direto, humano e produtivo. Queremos continuar perto, atentos e disponíveis, com base nas reais necessidades de quem, todos os dias, representa e dignifica esta profissão.

O futuro da solicitadoria e da ação executiva depende da nossa capacidade de adaptação, inovação e união.

Juntos, seremos sempre mais fortes — e mais capazes de enfrentar os desafios que se colocam à classe, defendendo com determinação a Justiça, a ética e o valor do nosso trabalho.

O CRP continuará de portas abertas, disponível e comprometido com todos os seus associados, porque só juntos construiremos uma Ordem mais próxima, mais justa e mais forte.

Nota: artigo redigido no início de novembro.

Sandra Teixeira dos Santos
Vogal do Conselho Regional do Porto

Um novo mandato pelos olhos da mesma presidente regional

Conselho Regional Lisboa

Dez meses depois da tomada de posse de uma nova direção e de novos órgãos nacionais, regionais e distritais, o Conselho Regional de Lisboa mantém a sua estrutura, mas refrescada com a entrada do vogal António Raposo Preto, que traz a novidade e a visão de modernidade, e da vogal Maria José Palma Santos, que representa a geração motor do crescimento da OSAE.

Apesar de repetirmos a proeza, este novo mandato revela-se já muito diferente do anterior, e não o querendo qualificar nem como melhor, nem como pior, porque este balanço é ainda embrionário, apenas quero realçar que estes meses de caminho têm sido muito trabalhosos para todas as equipas.

A necessidade de reestruturação interna, a urgência em acompanhar uma tecnologia veloz, de nos colocarmos, de forma preparada, na dianteira e ao lado de projetos inovadores, de acompanhar o ritmo e as exigências dos profissionais do setor jurídico, de garantir a manutenção de competências e de ganhar espaço noutras áreas, desafia a OSAE a estar focada, apenas e só, em usar todos os seus recursos de qualidade, internos e externos, para atingir estes objetivos. Os tempos não permitem manter apenas, de forma tranquila, o que já existe. São precisos sonhos ambiciosos para que grandes projetos se concretizem.

A velocidade da informação e da desinformação nas redes sociais, o avanço da inteligência artificial (IA), a alteração à lei dos atos próprios, o fim das regras da publicidade, a escassa fiscalização de certas práticas, as sociedades multidisciplinares, a adaptação a novos modelos de estágio – que afastam os futuros profissionais dos escritórios – e a formação não obrigatória são temas que me preocupam e que, a meu ver, colocam em crise a confiança dos profissionais do setor jurídico, porque ampliam a sensação de insegurança e a desigualdade entre profissionais.

Atualmente, sem regras quanto à publicidade, a aposta num bom marketing digital e consequentemente, numa maior presença nas redes sociais, bem como a crescente procura de serviços jurídicos através de motores de busca dão, garantidamente, mais visibilidade aos profissionais que apostem em campanhas de marketing mais agressivas, mas com o risco de confundibilidade com outras atividades, de abandono da ética, de fragilização da perceção pública do direito e de enfraquecimento da confiança generalizada no trabalho dos profissionais da área jurídica.

A realidade dos escritórios é muito diferente da realidade das redes sociais. Nas redes sociais, as questões jurídicas podem parecer ter soluções demasiado simplistas, os profissionais são instantaneamente bem-sucedidos e os escritórios são na maioria glamorosos (o que gosto, particularmente). Porém, a realidade do dia a dia continua a ser muito exigente e é marcada por muita pressão, responsabilidades, prazos para cumprir, demoras dos serviços públicos e clientes impacientes, que querem tudo para ontem, não

deixando muito tempo livre. Institucionalmente, com tristeza, recebo pedidos de suspensão e até de cancelamento da inscrição da atividade por parte de jovens Solicitadores que alegam não ter trabalho ou não ter condições de manter a atividade aberta, devido aos custos fixos com quotas e CPAS.

É por isso fundamental encontrar este equilíbrio entre a imagem pública e a necessidade de cativar trabalho para os profissionais e para os seus escritórios, sem perder de vista a obrigação de manter uma comunicação transparente e verdadeira, o rigor, a independência, assegurando as questões éticas e deontológicas, de forma a preservar a credibilidade profissional.

Não se pode negar que, nos dias de hoje, não basta ser tecnicamente bom, nem é suficiente ter um bom raciocínio jurídico e elasticidade criativa. É indispensável que o Solicitador e o Agente de Execução, além da boa capacidade de adaptação e da flexibilidade, reúnam, em si ou na sua equipa, a capacidade técnica – porque não há marketing que resista a um mau resultado ou a um cliente insatisfeito. A adaptação às novas tecnologias e à IA, usando-as a favor dos escritórios, é fundamental, por exemplo através da automatização de tarefas repetitivas e da análise de grandes quantidades de dados; da promoção do escritório, que passa a ser uma marca; da gestão de equipas e de recursos; da capacidade de comunicar em mais do que uma língua estrangeira. Cultiva-se, assim, uma gestão cada vez mais empresarial e menos individual.

Não tenho dúvidas que o futuro, muito próximo, é dos profissionais que se organizem entre si e das sociedades multidisciplinares.

A OSAE é a ordem profissional que reúne, entre os seus associados, a maior diversidade de áreas profissionais – os Solicitadores são também Agentes de Execução e/ou Técnicos de Cadastros e/ou Avaliadores e/ou

Contabilistas Certificados e/ou Mediadores de Seguros. Portanto, tem uma palavra a dizer no que às sociedades disciplinares diz respeito.

A formação contínua e obrigatória é, na minha perspetiva, uma pedra basilar. Só podemos garantir a qualidade dos nossos profissionais se conseguirmos garantir a sua atualização formativa constante, quer ministrada interna ou externamente. Revela-se, para mim, imperativo fazer aprovar um regulamento de formação contínua obrigatória o mais rápido possível.

E a IA parece-me que vem reforçar esta necessidade. A tentação de cair no facilitismo e de usar sem controlo a tecnologia gera o risco de erros técnicos grosseiros, a insegurança na fiabilidade de fontes, a ausência de pensamento critico e a violação de proteção de dados, entre outros. Inclusivamente, a utilização da IA carece de formação.

A confiança nos profissionais do setor jurídico não depende apenas das leis, dos decretos-lei e dos regulamentos, mas essencialmente da forma como cada profissional e cada escritório se aperfeiçoam, de como respondem aos desafios técnico-jurídicos e à produção legislativa diária e como se posicionam perante as transformações tecnológicas.

Os Solicitadores e os Agentes de Execução servem a Justiça e têm, cada um deles, isolada ou conjuntamente, de garantir que continuaremos a ser uma referência na competência, rigor, responsabilidade e integridade.

A OSAE tem diante de si um caminho de modernização e afirmação e pode fazer esse caminho com sucesso. Fazer aprovar, em assembleia geral, regulamentos essenciais para a gestão da nossa atividade, como é caso da formação contínua, e apostar fortemente em formação em áreas nucleares da profissão, com programas formativos densos, orientados por áreas específicas, centrados em temas concretos, virados para a aplicação prática, permite que o profissional aprofunde conhecimentos e se torne cada vez mais preparado para quaisquer desafios. Desejo muito que, até ao final deste mandato, possamos dar um salto tecnológico significativo, reforçando os nossos sistemas informáticos e implementando novas aplicações informáticas.

É ainda essencial reforçar o conhecimento que o cidadão tem sobre as competências jurídicas do Solicitador, para que seja visto como a primeira escolha na resolução de questões legais. O Conselho Regional de Lisboa vai apostar, já no próximo ano, numa comunicação mais pedagógica e próxima, que esclareça o âmbito de atuação do Solicitador e do Agente de Execução através de um novo projeto intitulado “Conversas com a Comunidade”. Valorizar o conhecimento público sobre as competências do Solicitador é fortalecer a profissão e aproximar este profissional das necessidades reais da sociedade. Até já!

Débora Riobom dos Santos Presidente do Conselho Regional de Lisboa
“A Solicitadoria continua a ser uma aliciante profissão jurídica.”

José Luís T. Saraiva

Solicitador

Assinalando, este ano, 50 anos de atividade profissional, José Luís T. Saraiva conta com percurso marcante na história da Solicitadoria. Iniciou a carreira em 1975, após o regresso da Guiné, onde cumpriu o serviço militar obrigatório, e desde então tem exercido a profissão com dedicação e participação ativa na vida institucional da classe. Ao longo das últimas décadas, desempenhou diversos cargos nos órgãos representativos da profissão: foi Delegado da Câmara dos Solicitadores no Círculo Judicial da Guarda (2001–2006), período em que promoveu a criação do Centro de Formação de Solicitadores da Guarda, 1.º Secretário da Mesa da Assembleia Regional do Norte (2008–2016), Conselheiro no Conselho Consultivo do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda (2015–2018), Presidente da Mesa da Assembleia de Representantes do Colégio de Solicitadores da OSAE (2018–2021) e Presidente da Mesa da Assembleia Regional de Coimbra da OSAE (2022–2024).

O seu percurso institucional reflete uma participação constante nos processos de desenvolvimento, formação e representação da Solicitadoria. Por isso, nesta conversa, revisitamos meio século de experiência profissional, recordando os primeiros tempos da profissão, as transformações tecnológicas e institucionais que testemunhou e as perspetivas sobre o presente e o futuro da Solicitadoria.

O que o motivou a enveredar pela carreira de Solicitador após o regresso da guerra colonial?

Quando, na sequência da revolução de 25 de Abril de 1974, regressei da Guiné, onde prestei serviço militar obrigatório, já com idade e vontade de me tornar independente e autossuficiente, deparei-me com muitas dificuldades, tanto para encontrar trabalho, como para retomar a minha vida académica.

O meu saudoso pai, que era Advogado, reconhecia em mim o gosto pelas lides jurídicas, que apreendi em ambiente familiar.

Com a ajuda de um ilustre colega do meu pai, que me deu guarida no seu escritório como Empregado Forense, obtive, em julho de 1975, a concessão do Alvará de Solicitador Provisionário, por sentença proferida ao abrigo da lei então vigente.

Como foram os primeiros tempos?

Aprendi, no escritório daquele Advogado, o exercício da Solicitadoria, predominantemente na vertente judicial e na interação com outros serviços públicos, designadamente com as Conservatórias dos Registos, com as Repartições de Finanças, com os Notários e com a Câmara Municipal.

Desenvolvi a minha atividade profissional à custa do estudo autónomo e através da prática das leis e normativos necessários para o exercício da mesma, beneficiando com a formação que a então Câmara dos Solicitadores e a atual Ordem me foram disponibilizando.

O acesso conseguido à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e à licenciatura em Solicitadoria na Universidade Lusófona do Porto não teve aproveitamento, pelo incremento de afazeres profissionais e outras responsabilidades.

Quando abri o meu próprio escritório, usufruía já de uma assinalável implantação no mercado forense, aportando-me clientes e afazeres que me proporcionaram uma satisfatória qualidade de vida.

Como descreve a prática da Solicitadoria na década de 70? Que recursos utilizava no dia a dia?

No início da minha atividade profissional dominavam a máquina de escrever, as cópias com papel químico e a escrita à mão. Os documentos eram rascunhados, corrigidos e aperfeiçoados antes de serem datilografados, usando-se as “rasuras”, as “entrelinhas” e o “em tempo” para não ter de se datilografar tudo de novo.

Raramente havia formulários para qualquer tipo de requerimento ou peça processual: a sua redação era, na maioria das vezes, personalizada.

A procuradoria ilícita já então liderava o mercado. A Solicitadoria era praticamente desconhecida fora dos tribunais.

A lealdade, transparência e honestidade que sempre

a acreditar que “Labor

Recomendo nortear o exercício das profissões de Solicitador e de Agente de Execução pelo zelo, prontidão, cortesia, honradez e competência.

me pautaram e o bom relacionamento com os serviços públicos ajudaram-me muito no exercício da profissão.

Como viveu a transição tecnológica, desde a máquina de escrever até ao uso do computador e das tecnologias de informação?

Não têm conta as infindáveis buscas específicas que fiz na “Coletânea de Jurisprudência” em busca de acórdãos sob temas relacionados com casos pendentes no escritório de advocacia, hoje totalmente ultrapassadas pela tecnologia informática.

A primeira fotocópia que conheci não era mais que uma fotografia de maiores dimensões, que carecia de enxugar.

O processamento de texto por máquinas de datilografia avançadas e computadores foi revolucionário.

Os telefones portáteis e demais tecnologias de informação revolucionaram ainda mais a atividade forense. Fui sempre um entusiasta dos avanços tecnológicos, que sempre aproveitei.

Teve um papel ativo em vários órgãos da Câmara dos Solicitadores e da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE). O que o levou a envolver-se institucionalmente?

O espírito de classe e a vontade de colaborar institucionalmente em prol dos Solicitadores e dos Agentes de Execução contribuíram para a minha integração em

vários órgãos da Câmara dos Solicitadores e da OSAE, para os quais fui eleito, o que muito me honrou.

Foi promotor da criação do Centro de Formação de Solicitadores da Guarda, em 2005. Como surgiu esse projeto? Os objetivos foram alcançados?

Efetivamente, fui o ideólogo e promotor da criação e manutenção do Centro de Formação de Solicitadores da Guarda, em 2005, enquanto Delegado da Câmara dos Solicitadores no Círculo Judicial da Guarda. Este Centro de Formação tinha como principal objetivo a organização e implementação de ações de formação e conferências, a nível nacional e internacional, sob a égide do Centro de Estudos Ibéricos e do Colégio dos Procuradores de Salamanca. Tal contribuiu para a formação permanente dos Solicitadores, aproveitando o extraordinário apoio científico e logístico daquele Centro de Estudos. Através desse projeto, a cidade da Guarda foi palco de, pelo menos, três iniciativas de grande impacto, que contaram com a intervenção e colaboração do Ilustre Colégio de Procuradores de Salamanca. Em Espanha realizaram-se outras tantas iniciativas. Foi salutar e muito agradável o intercâmbio e o bom relacionamento havido entre Solicitadores e Procuradores espanhóis.

Como vê a importância da formação contínua na Solicitadoria?

É de extrema importância. A formação tem de che -

gar a todos, independentemente do local em que se encontrem, já que a atualização permanente, mormente na área que se domina, garante a prestação de serviços profissionais de alto nível, sem percalços.

Que mudanças mais significativas testemunhou na profissão de Solicitador ao longo das últimas décadas?

Noutros idos tempos, a gente humilde e iletrada das nossas aldeias recorria ao Senhor Solicitador para ler e fazer cartas, requerimentos e outros papéis, que ele manuscrevia. A Solicitadoria tinha maior expressão na prática individual ou em colaboração com Advogados.

O alargamento da Solicitadoria a outras áreas e serviços, em benefício dos cidadãos e empresas, aliado ao incremento tecnológico desenvolvido pela Câmara dos Solicitadores e pela OSAE, alavancaram a Solicitadoria e a Ação Executiva para o nível que hoje lhes é reconhecido.

Afirmou rever-se no lema “O Solicitador Resolve”. Acredita que essa máxima continua a representar fielmente a profissão?

Sem dúvida. Desde muito cedo me apercebi que o Solicitador era apontado como o profissional que “resolvia” problemas intrincados, designadamente em áreas que então os Advogados não exploravam.

O lema “O Solicitador Resolve”, adotado pela Câmara dos Solicitadores, continua a ser, em meu entender, uma mais-valia na divulgação e promoção da Solicitadoria.

Qual é a sua visão para o futuro da Solicitadoria?

A Solicitadoria continua a ser uma aliciante profissão jurídica. Está em permanente evolução, acompanhando e adaptando-se aos desafios decorrentes de uma sociedade em constante transformação.

Eu acredito no futuro promissor da Solicitadoria, dos Solicitadores e dos Agentes de Execução.

Que conselhos deixaria às novas gerações de Solicitadores?

Continuo a acreditar que “Labor Improbus Omnia Vincit”. Recomendo nortear o exercício das profissões de Solicitador e de Agente de Execução pelo zelo, prontidão, cortesia, honradez e competência.

Como gostaria de ser lembrado, quer pelos seus colegas, como pelos clientes?

Tal como acredito que presentemente sou conhecido: sempre disponível para ajudar e colaborar em tudo o que me é possível, transmitindo vivências e experiências de uma vida dedicada à profissão. Sempre procurei ter um amigo em cada cliente e em cada funcionário público com quem tenha interagido profissionalmente. É muito bom merecer saudações quando nos reencontramos.

Continuo
Improbus Omnia Vincit”.

Omédico catalão José de Letamendi (1828-1897) dizia que “del médico que no sabe más que medicina, ten por cierto que ni medicina sabe”, frase esta 'apropriada' pelo Professor Abel Salazar quando se dirigia aos seus alunos e alertava que um médico, como qualquer outro profissional, tinha de ir além da experiência da sua formação profissional. Só assim se alcançaria a plenitude na aplicação do seu conhecimento.

O Solicitador eborense Florival Sanches de Miranda seguiu essa máxima. Nasceu em Lisboa (freguesia da Lapa) no primeiro dia de janeiro de 1872, vindo a falecer, em Évora, no dia 29 de setembro de 1935. O seu pai, militar, era natural de Coimbra, e a mãe de Beja, com ascendência em Bragança e nos Açores. A sua origem familiar era um mosaico do país, razão pela qual teve uma educação bastante liberal para a época, o que o marcou para sempre.

SOLICITADORES ILUSTRES

Florival Sanches de Miranda

Um médico que só sabe medicina, nem medicina sabe.

Fixando-se em Évora — onde o seu pai foi comandante do Regime de Cavalaria n.º 5 — casou-se em 1898. Em 1907, foi empossado como Solicitador Encartado (1). Nunca mais deixou de exercer a profissão, granjeando o respeito dos seus colegas do foro e clientes. Dado o seu espírito empreendedor, era convidado para outras atividades, criando, com outro sócio, uma empresa de transportes de aluguer, a primeira deste ramo a sul do Tejo. Foi também acionista e sócio de várias empresas, que iam dos transportes aos seguros.

Em 1915, o seu espírito de Republicano Democrata leva-o para a política, sendo eleito para Presidente da Direção do Centro Democrático de Évora. Logo de seguida, passou por todas as funções de chefia da Câmara Municipal de Évora até ser nomeado Administrador do Concelho e Presidente da Câmara, cuja função foi brutalmente cerceada pelo golpe de Sidónio Pais, conhecendo aí as agruras da prisão.

Com o assassinato do Sidónio Pais, sai da prisão e é logo nomeado, a 8 de junho de 1919, Governador Civil de Évora, cargo que exerceu até 30 de maio de 1921. Foi exonerado a seu pedido, pois não concordava com as políticas dos dirigentes republicanos e não aceitava os novos ventos, que anunciavam a ditadura do 28 de Maio (2)

Saiu do serviço público e entrou no mecenato: em 1920 pagou do seu bolso uma quantia bastante elevada para a aquisição do Palácio do Amaral (antigo Governo Civil), para aí instalar o Museu de Évora. Mais tarde, negoceia, com uma sua cliente grande proprietária, a compra de um terreno que oferece a um clube da terra – o Juventude Sport Clube –, cujo campo de jogos mantém o seu nome até aos nossos dias, bem como um bairro adjacente.

Não deixando herdeiros legitimários, no seu testamento lega toda a herança à sua mulher, recomendando-lhe que o seu corpo seja enterrado no estado em que se der o óbito, não permitindo quaisquer alterações, e que o seu enterro seja o mais modesto possível, como modesto devia ter sido na vida. E acrescenta: “Mais ainda peço à minha querida mulher que não concordando eu com as manifestações do luto, como do uso, que evite de o pôr em prática para si e para os seus, caso em tal não seja contrariada nos seus sentimentos que muito prezo.” (3)

Um grande eborense por adoção, um democrata e um grande humanista!

NOTAS:

1 ANTT-Mercês do Rei D. Carlos, livro 23

2 ANTT-Ministério do Interior, maços 239-240 e 244, cx. 54 e 62

3 Arquivo Distrital de Évora - T. Cerrado.

Miguel Ângelo Costa
Solicitador e Agente de Execução
“O

desporto é uma verdadeira escola de vida.”

Joana Branco de Magalhães

Solicitadora e Agente de Execução

Joana Branco de Magalhães é um exemplo de dedicação, rigor e paixão por aquilo que faz, tanto no campo jurídico como no desportivo. Licenciada em Direito, encontrou, enquanto Solicitadora e Agente de Execução, a forma perfeita de aliar o conhecimento técnico-jurídico à prática concreta e dinâmica, com impacto direto na vida das pessoas. Paralelamente, é também uma figura de referência na patinagem artística, modalidade que abraçou desde os 5 anos e na qual construiu um percurso notável enquanto atleta, treinadora, técnica nacional e selecionadora. A sua trajetória reflete uma combinação de disciplina, resiliência e amor pelo que faz, valores que transpõe, com a mesma intensidade, para a sua carreira jurídica.

Dividindo o tempo entre o gabinete, as diligências e os treinos, Joana Branco de Magalhães representa a força de quem acredita que é possível seguir mais do que uma paixão e fazê-lo com excelência. A sua história inspira pela autenticidade, pela entrega e pela convicção de que o sucesso nasce da dedicação e do propósito.

Entrevista Joana Gonçalves / Fotografia Alfredo Matos

Como surgiu o interesse pela Solicitadoria?

O interesse surgiu do gosto por uma área que alia o conhecimento técnico-jurídico à prática concreta e dinâmica. Sempre me atraiu a possibilidade de estar próxima da resolução efetiva de problemas, com impacto real na vida das pessoas. Sou licenciada em Direito e, ao longo da minha formação, tive a sorte de ter professores que foram verdadeiramente marcantes. Recordo especialmente a minha professora de Direito Executivo, que me disse que eu tinha o perfil ideal para a profissão de Agente de Execução — uma observação que teve um grande impacto e foi decisiva no rumo que escolhi seguir.

Quais foram os maiores desafios que encontrou ao longo da formação académica?

Conciliar a exigência dos estudos com a prática intensiva da patinagem artística foi, sem dúvida, um grande desafio. Sempre fui atleta federada e, mais tarde, treinadora, o que exigiu muita organização, foco e disciplina. Mais tarde, já com responsabilidades familiares e profissionais, essa capacidade de gestão tornou-se ainda mais essencial.

O que a motivou a tornar-se também Agente de Execução?

A profissão de Agente de Execução surgiu como uma extensão natural da minha vocação para a prática jurídica com impacto direto. Gosto do dinamismo, do contacto direto com os processos e da responsabilidade que carrega. A tal recomendação da minha professora foi o primeiro empurrão, mas o gosto pelo terreno, pela resolução prática de conflitos e pelo rigor necessário na função é o que me mantém motivada todos os dias.

Que competências considera fundamentais para exercer estas funções?

Rigor, ética, imparcialidade, empatia e resiliência. Acrescento também a capacidade de organização e de comunicação. Lidamos com pessoas em situações delicadas e é essencial sermos justos, mas também humanos.

Há alguma experiência marcante ou caso que tenha moldado a sua forma de trabalhar?

São muitos os momentos marcantes, mas recordo um caso em que, através do diálogo e mediação, conseguimos evitar o despejo de uma família com crianças, encontrando uma solução justa para todas as partes. Essa experiência reforçou a minha convicção de que o nosso papel não é apenas executar decisões, mas também procurar a via mais equilibrada sempre que possível.

Agora sobre a outra paixão, a patinagem artística: quando começou a praticar esta modalidade e qual foi o percurso percorrido?

Comecei a patinar com apenas 5 anos e, desde então,

nunca deixei de estar ligada à modalidade. Passei por todas as fases: atleta de competição, treinadora e hoje desempenho também funções como técnica nacional e selecionadora da Associação de Patinagem do Minho. Ao longo dos anos, acompanhei atletas que se sagraram campeões nacionais e outros que alcançaram medalhas em competições internacionais — o que representa, para mim, um enorme orgulho e reconhecimento do trabalho desenvolvido.

O que a levou a tornar-se treinadora? Como tem sido o caminho?

Sempre tive uma grande paixão por ensinar e por ajudar os mais novos a crescer, não só tecnicamente, mas como pessoas. Comecei a treinar aos 16 anos e nunca mais parei. O caminho tem sido exigente, mas extremamente gratificante. Ver os atletas evoluírem, superarem-se e atingirem resultados, tanto a nível nacional como internacional, é algo que me dá força para continuar.

Como vê a evolução da patinagem artística, em Portugal, nos últimos anos?

A modalidade tem evoluído bastante, tanto em termos técnicos como no número de praticantes. No entanto, ainda existe um caminho a percorrer no que toca ao apoio institucional, valorização do papel dos treinadores e melhoria das infraestruturas. A nível técnico, Portugal tem vindo a afirmar-se e acredito que o futuro pode ser ainda mais promissor.

Que valores ou competências tenta transmitir aos alunos?

Disciplina, responsabilidade, respeito, resiliência e paixão pelo que fazem. O desporto é uma verdadeira escola de vida, e tento sempre passar isso aos meus alunos. Quero que sejam bons atletas, mas acima de tudo, boas pessoas.

Quais são os maiores desafios que enfrenta ao gerir uma carreira jurídica exigente e, ao mesmo tempo, ensinar patinagem artística?

A gestão do tempo é, sem dúvida, o maior desafio. Di-

Ver os atletas evoluírem, superarem-se e atingirem resultados, tanto a nível nacional como internacional, é algo que me dá força para continuar.

vido o meu dia entre o trabalho no escritório, diligências externas, treinos diários no período pós-laboral e aos fins de semana. Acresce o facto de ser mãe de dois jovens atletas, o que implica ainda mais organização. Mas a verdade é que quando se gosta realmente daquilo que se faz, encontra-se forma de o fazer acontecer.

Existem pontos em comum entre o Direito e a patinagem artística (disciplina, rigor, ética, …)? Sim, muitos. Ambas as áreas exigem preparação, foco, ética, respeito por regras e trabalho em equipa. A exigência e o compromisso são transversais às duas realidades.

O que aprendeu numa área que aplica na outra?

Da patinagem trouxe a resiliência, a perseverança e a capacidade de lidar com pressão — qualidades fundamentais também no mundo jurídico. Do Direito, levo a objetividade, a análise crítica e a responsabilidade. Ambas as áreas se complementam e enriqueceram a minha forma de estar.

Como organiza o tempo e a energia para se dedicar a ambas?

Com uma gestão rigorosa, muita disciplina e paixão, sem esquecer o apoio de amigos próximos. A chave está em saber definir prioridades e estar verdadeiramente presente em cada momento, seja numa diligência ou num treino. Faço questão de dar o meu melhor em ambas as funções.

Quais são os próximos objetivos profissionais na área jurídica?

Continuar a aprofundar o meu trabalho como Agente de Execução, contribuir para uma maior humanização da função e, a médio prazo, envolver-me em projetos de formação ou representação da classe.

E na patinagem artística?

Acompanhar o desenvolvimento dos meus atletas, continuar a contribuir para a seleção regional e apoiar a modalidade também a nível técnico e estratégico. Quero deixar uma marca positiva no futuro da patinagem artística em Portugal.

Que mensagem deixaria aos jovens que gostariam de seguir mais do que uma paixão/profissão?

Acreditem que é possível! Não precisamos de escolher apenas uma paixão para a vida. Com trabalho, resiliência e boa gestão do tempo, é perfeitamente possível conciliar várias áreas e ser feliz em todas elas. O importante é fazer tudo com dedicação e consciência do propósito. Não tenham medo de desafiar os limites — é aí que está o verdadeiro crescimento.

“O Cante Alentejano representa a preservação da memória e o respeito pela nossa história, cultura e identidade.”

Há sons que transportam memórias, vozes que ecoam a alma de um povo e canções que contam histórias de gerações inteiras. O Grupo Cantares de Évora é um desses guardiões da tradição que, há mais de quatro décadas, leva o Cante Alentejano, símbolo maior da identidade do Alentejo, a palcos de Portugal e do mundo. Após a emocionante atuação na cerimónia de abertura do IX Congresso dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, conversámos com Luís Silva, membro do grupo, que nos abriu o coração sobre a origem, a vivência e o profundo significado do Cante. Entre recordações, partilhas e reflexões, fala-nos de um legado que se mantém vivo graças à paixão, à união e ao orgulho de quem canta não apenas com a voz, mas com a alma alentejana.

CANTE ALENTEJANO

Grupo Cantares de Évora

Como e quando nasceu o Grupo Cantares de Évora?

O Grupo Cantares de Évora nasceu em 1979. Inicialmente, foi um grupo formado por trabalhadores da fábrica Siemens, hoje Tyco Electronics, pela ocasião de uma visita à fábrica do seu diretor-geral, vindo da Alemanha. Alguns trabalhadores reuniram-se para tentar cantar algumas modas alentejanas, mas acabaram por não conseguir fazê-lo. Consequentemente, fazendo jus à resiliência do povo alentejano, resolveram começar a ensaiar para que outra situação semelhante não voltasse a acontecer. A partir daí, não pararam mais

atuais. De referir que a ligação inicial à fábrica deixou de existir, passando a ser integrados elementos de outras áreas e profissões.

Como tem evoluído o grupo ao longo dos anos, em número de elementos, repertório e atuações?

O Grupo teve uma evolução natural. No início era composto por cerca de 15 a 18 elementos. Atualmente contamos com 24. Este é um número que nos parece razoável e que permite ir correspondendo às exigências

O nosso repertório foi sempre muito constante. Retiramos as modas que cantamos do cancioneiro tradicional alentejano, que é riquíssimo, mantendo-nos fiéis ao mesmo, não fazendo quaisquer arranjos ou alterações às músicas nem aos poemas. Vamos escolhendo as modas à medida que sentimos que fazem sentido. Podemos cantar determinadas modas durante um período, mas vamos sempre introduzindo outras de forma cíclica. Para além das modas mais tradicionais, também abordamos outras mais litúrgicas, nomeadamente quando cantamos em igrejas ou na época do Natal, por exemplo. Relativamente a atuações, temos o privilégio de ser bastante solicitados e vamos cantando um pouco por todo o país. Para além disso, já contamos com várias passagens pelo estrangeiro, a países como Cuba, Rússia,

Tunísia, Egito, Canadá, Espanha, Itália, Grécia, Marrocos ou China, para citar alguns.

Com que frequência se juntam para ensaiar e como são esses momentos de convívio?

Os nossos ensaios acontecem uma vez por semana, quando é possível, e em épocas de maior tranquilidade ao nível das atuações. Mas, ultimamente, costumamos dizer que ensaiamos a atuar. Temos tido tantas solicitações para atuações que chegamos a fazer duas ou três por semana. Assim sendo, acabamos por estar “em ensaios constantes”, por assim dizer.

Seja como for, em ensaios ou atuações, é sempre um gosto estarmos juntos, porque sentimos que somos uma verdadeira família. Como tal, os momentos de convívio são sempre muito animados e gratificantes.

Como é feita a passagem de conhecimento entre gerações dentro do grupo?

O conhecimento acaba por passar quase por osmose. Eu, por exemplo, cresci dentro do Cante. Os meus pais, que também cantam no grupo, começaram nestas andanças tinha eu 8 anos. Acompanhava-os aos ensaios, atuações e saídas várias. Como tal, a sequência normal seria a minha entrada para o grupo, tal como aconteceu com o meu irmão, que também cá está. De entre os restantes elementos, as histórias são muito semelhantes. Tanto assim é que temos no grupo pais, mães e filhos, irmãos, tios e sobrinhos e, essencialmente, amigos verdadeiros. Assim, torna-se fácil passar o conhecimento, de forma muito natural e tranquila.

O que representa o Cante Alentejano para quem o canta?

Essencialmente, o Cante Alentejano representa a preservação da memória e o respeito pela nossa história, cultura e identidade. Quando um alentejano canta não está apenas a entoar melodias e letras inconsequentes. Está a incorporar a essência de um povo que sempre conheceu uma realidade de vivências muito fortes, que precisam de ser contadas. É por isso que o Cante tem uma componente emocional muito forte, que se sente nas vozes que o cantam. É quase como se conseguíssemos viajar no tempo e espaço para reviver os sentimentos dos nossos antepassados. E isso é algo mágico e muito forte emocionalmente.

Que papel tem o Cante no quotidiano das comunidades alentejanas?

Do ponto de vista social, o Cante já não terá uma representatividade tão forte como tinha no início do século XX. Ou seja, com a evolução dos tempos e das sociedades, o Cante tornou-se uma arte e uma forma de preservar a nossa identidade. Mas tempos houve em

que, através das modas que se cantavam, afirmavam-se posições políticas e defendiam-se causas importantes, nomeadamente em tempos de ditadura e repressão do povo. Tanto assim era que havia modas que eram absolutamente proibidas de serem cantadas, havendo outras que são verdadeiras metáforas para questões sobre as quais não se podia falar de forma clara e aberta. Para lá dessas questões, há também muitas modas que são “apenas” retratos simples e belos da vida no Alentejo, guardando em si memórias felizes e de saudade.

Que temas predominam nas letras das modas que interpretam?

Como disse antes, há modas com letras eminentemente políticas, havendo outras com alguma sátira social. Depois também há modas que retratam episódios da vida no Alentejo, tais como os trabalhos no campo ou os elementos da natureza. Há outras que retratam as relações familiares e de amizade. Ou ainda as situações de saudade daqueles que tinham de partir em busca de uma vida melhor noutras paragens.

De que forma o Cante traduz a identidade do Alentejo: a terra, as gentes, o trabalho, as emoções?

A identidade do Alentejo está sempre presente de forma vincada no Cante. Tal como referi, é através do Cante que mantemos vivas as memórias da nossa terra, das nossas gentes, do nosso sentir. O Cante passou sempre de geração em geração da forma mais pura e simples possível – ouvindo-se e cantando. Tem sido sempre assim, de avós para netos, de pais para filhos. Desde sempre, o Natal, Páscoa, ou quaisquer outras épocas festivas tiveram sempre como “pano de fundo” o entoar de modas alentejanas, retratando histórias antigas que sempre se contaram em forma de música.

O que significou para o grupo e para o Alentejo o reconhecimento da UNESCO, em 2014?

O reconhecimento do Cante Alentejano como Património Imaterial da Humanidade, em 2014, foi um marco muito significativo para a consolidação do trabalho feito pelos vários grupos que foram mantendo a sua existência ao longo do tempo. No fundo, para quem já cá andava há muitos anos a “fazer por esta arte”, este reconhecimento foi um “empurrão” muito bom para alavancar aquilo em que nós sempre acreditámos. Os grupos de Cante Alentejano que existem há muitos anos mereciam este reconhecimento, por tudo o que sempre fizeram sem exigir muito em troca. A partir de 2014, esses grupos passaram a ter outra projeção, mais consistente, e sentiu-se uma espécie de “renascimento do Cante”, com muitos jovens a aderirem e a acreditarem que vale mesmo a pena dedicarem-se ao Cante. Digamos que o Cante passou a ter mais visibilidade e isso contribuiu para “abrir novas por-

É através do Cante que mantemos vivas as memórias da nossa terra, das nossas gentes, do nosso sentir. O Cante passou sempre de geração em geração da forma mais pura e simples possível – ouvindo-se e cantando.

ta história agregada. Aí sim… talvez se tenham notado diferenças na forma como outras pessoas passaram a conhecer e receber o Cante.

Que desafios existem hoje na preservação desta tradição?

Eu diria que os desafios de hoje são quase os mesmos de sempre. No sentido em que a continuidade do Cante dependerá sempre da vontade de quem canta e do gosto de quem ouve. No entanto, na senda da tal “evolução da sociedade”, hoje em dia a vida é levada mais “a correr” do que acontecia antigamente e o Cante implica vagar, tranquilidade, tempo. Talvez seja esse o maior desafio – as pessoas terem tempo para o Cante, para o aprenderem, para o acarinharem, para o preservarem.

Como se pode atrair os jovens para o Cante e para garantir a sua continuidade?

Temos a felicidade de viver tempos muito positivos nesta relação dos jovens com o Cante Alentejano. Temos muitas e belíssimas jovens vozes que gostam de cantar e fazem-no com muita qualidade. Como tal, se estivermos atentos e conseguirmos encontrar os jovens certos no momento adequado, acredito que conseguiremos garantir a continuidade do Cante.

tas”, para dar a conhecer a nossa identidade e cultura de forma mais abrangente.

Sentem que esse estatuto trouxe mais visibilidade ou responsabilidade?

Juntamente com a visibilidade vem sempre uma noção de responsabilidade muito grande por aquilo que estamos a fazer. Por tudo aquilo que disse anteriormente, os alentejanos sempre levaram o Cante muito a sério, por terem uma noção muito clara daquilo que ele sempre representou nas nossas vidas. Nesse sentido, todos aqueles que têm o privilégio de cantar o Alentejo fazem-no sempre com uma forte noção de responsabilidade, sabendo que é ela que nos “dá o chão” para continuar a nossa caminhada.

Notam que houve mudanças na forma como o público olha para o Cante depois dessa distinção?

O público que já apreciava o Cante, que já nos ouvia regularmente, revitalizou o seu gosto e também se sentiu reconhecido, tanto quanto nós. Até porque, como costumamos dizer, o Cante foi feito para ser partilhado e entregue a quem o ouve. Não faz sentido ser de outra forma. Neste sentido, podemos dizer que esta distinção foi uma espécie de confirmação para quem nos acompanhava de que estavam certos na sua escolha. Para “outros públicos” que não estavam tão despertos para o Cante, funcionou como uma espécie de “abrir horizontes”, trazendo-lhes algo novo, embora com mui-

Recentemente atuaram na cerimónia de abertura do IX Congresso da OSAE. Como viveram essa experiência e o que significou para o grupo representar o Cante num evento dessa dimensão? Foi para nós um privilégio estar presentes nesta cerimónia, na medida em que pudemos, uma vez mais, dar a conhecer a nossa identidade e cultura através do Cante Alentejano. Como disse antes, o Cante só faz sentido se for partilhado de forma recíproca e honesta com quem nos ouve. Foi o que aconteceu nesta cerimónia e isso é algo que nos enche sempre de muito orgulho e satisfação.

Como imaginam o futuro do grupo e do Cante Alentejano nos próximos anos?

Imaginamos um futuro positivo e de muitas alegrias. No nosso grupo, esperamos conseguir ir renovando as vozes que o compõem dentro do registo que sempre aconteceu. Ou seja, esperamos que aqueles que vierem de novo tragam consigo o espírito de quem cá está ou de quem por cá passou – a humildade e vontade para aprender com quem já por cá anda há algum tempo, acrescentando vitalidade e espírito de iniciativa. Para que um dia sejam eles a dar continuidade para as gerações seguintes, mantendo-se fiéis aos valores subjacentes ao que fazemos. Se assim for, certamente que o nosso grupo e o Cante Alentejano se manterão vivos, dando continuidade à banda sonora da cultura e identidade alentejana.

O novo Posto Médico da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) foi inaugurado no dia 5 de novembro, nas instalações do Conselho Regional de Coimbra (CRC) da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução (OSAE), sitas na Avenida Fernão de Magalhães, Lojas n.º 167 a 169.

A cerimónia contou com a presença, por parte da OSAE, da Bastonária, Anabela Veloso, e do Presidente do Conselho Regional de Coimbra, Bruno Monteiro Branco. Por parte da Ordem dos Advogados, e em representação do seu Bastonário, estiveram Marta Pinto Ferreira e Rita Brazete, Vogais do Conselho Geral, e Elisabete Monteiro, Vogal do Conselho Regional de Coimbra, em representação da Presidente deste Conselho Regional. Pela CPAS, marcou presença o seu Presidente, Victor Alves Coelho.

A apresentação esteve a cargo de Leandra Garcez, Secretária do Conselho Regional de Coimbra da OSAE.

Durante a sessão, os intervenientes salientaram a importância deste novo espaço como um marco na consolidação da rede de apoio aos profissionais da Justiça. Foi ainda evidenciado que o Posto Médico de Coimbra vem estreitar a ligação entre as instituições e os seus Beneficiários, disponibilizando um acompanhamento mais próximo, célere e adaptado às suas necessidades.

No seu discurso, Anabela Veloso destacou “o reforço da proximidade entre as nossas instituições e os profissionais que servimos”, considerando que o novo posto médico “traduz um compromisso claro com o bem-estar e a qualidade de vida dos nossos colegas –Advogados, Solicitadores e Agentes de Execução – que diariamente enfrentam desafios exigentes no exercício das suas funções”.

A Bastonária realçou também o valor da cooperação institucional, afirmando que esta inauguração é “um exemplo concreto de cooperação em prol de um objetivo comum: cuidar de quem cuida da Justiça”.

Leituras

Histórias sobre traumas que atravessam gerações

Fantasmas da Mente

Um clássico do terror para fãs de O Exorcista e A Semente do Diabo. Stephen King afirmou que este livro o assustou, tornando Fantasmas da Mente uma leitura perfeita para o Halloween.

A história gira em torno de uma família que acredita que a filha, que demonstra sinais de esquizofrenia, está possuída por um demónio. Um padre entra em contacto com uma produtora de televisão, enquanto uma escritora decide desenterrar a história falando com a irmã mais nova.

Ficamos à ponta da cadeira, tentando distinguir o que provém das memórias infantis, dos exageros de reality show ou da influência demoníaca.

É uma obra bem escrita, fluída e com uma ação envolvente que nos mantém agarrados até à última página.

Coisas Ruins

João Zamith

Coisas Ruins é a primeira obra publicada de João Zamith, um autor corajoso por escolher um género pouco popular.

A narrativa centra-se nas várias gerações da família Viaforte, uma família da burguesia industrial que acaba de perder o seu patriarca. Nesta obra, percebemos como um período de luto pode despertar pesadelos que há muito estavam enterrados.

O estilo descritivo da escrita pode tornar a leitura mais lenta, mas compensa: o livro entrelaça criaturas do folclore português com a mística religiosa, fazendo-nos sentir dentro das cenas, ao lado das personagens.

É uma história sobre pecados que não morrem e traumas que atravessam gerações, deixando-nos a refletir se todos realmente merecem redenção.

Laura Silva Colaboradora do Departamento de Informática da OSAE
Inaugurado novo Posto Médico da CPAS em Coimbra

MOINHO DO CU TORTO

Sabores com História: uma paragem obrigatória

Em Évora, cidade de encantos e de saberes, há um restaurante cujo nome faz sorrir, mas cuja cozinha deixa marca: o Moinho do Cu Torto. Se o nome não passa despercebido, a experiência gastronómica também não. É o refúgio ideal para quem quer recordar a essência da cozinha alentejana — aquela que conforta e nos leva, de certa forma, até casa.

Foi no dia de S. Martinho, em 1996, que a D. Fátima e o Sr.Ludgero abriram, pela primeira vez, as portas do grande projeto das suas vidas: o Moinho do Cu Torto. Desde então, o espírito com que começaram continua bem vivo.

No coração da cozinha vivem, ainda hoje, as receitas da lendária “avó Quinita”, a guardiã da essência desta casa.

Como me contou o Sr. José Almeida, atual gerente e membro desta história, a carta mantém-se inalterada por respeito à tradição. Aqui, tudo é feito com tempo, com alma — até o pão. Produzem o seu próprio pão, utilizando uma massa mãe artesanal, e isso sente-se logo ao primeiro pedaço.

As migas com carne de alguidar são um clássico, mas a minha escolha favorita é a sopa de tomate. Rica, reconfortante, com o ovo escalfado no ponto e o toque do pão a absorver todo o sabor… Hmmmm! É daquelas que nos aquecem de dentro para fora. A acompanhar, claro, um bom vinho alentejano.

O espaço é rústico, familiar e acolhedor. Tudo a lembrar a casa de campo da “avó”. Todo o ambiente “cheira” a avó — nas madeiras, nos objetos antigos, no calor do serviço, nas memórias que evoca. O atendimento é cordial e tranquilo, como só no Alentejo se sabe fazer. Para quem passa por Évora — ou para quem, como eu, tem o privilégio de lá voltar com frequência — o Moinho do Cu Torto é uma paragem obrigatória. Porque há sítios onde se come bem… E depois há sítios onde se come com alma.

Encerra

A BRUXA D’ÉVORA

Tradição, História e Sabor na Rua 5 de Outubro

Na emblemática Rua 5 de Outubro, em pleno coração da cidade de Évora, ergue-se o restaurante “A Bruxa d’Évora”, um espaço ímpar que conjuga a riqueza das tradições regionais com uma cozinha contemporânea de grande elegância. Inaugurado em 2019, o restaurante nasceu do sonho de quatro amigos, todos ligados ao setor da restauração, que encontraram na lenda da Bruxa d’Évora uma inspiração forte para dar alma ao seu projeto.

Na figura lendária da Bruxa d’Évora ecoam histórias de feiticeira culta, poliglota e dotada de sabores ocultos, com cruzamento de várias culturas, remontando à Idade Média. Ao descobrirem documentos antigos, os fundadores do espaço decidiram reerguer este legado mágico, resultando num restaurante que serve refeições em tachos de barro, evocando rituais ancestrais, e onde o ambiente é tão fascinante quanto a lenda que o inspira.

O restaurante entrega um espaço acolhedor e original. É composto por duas salas distintas: uma delas insere-se numa antiga cavalariça de linhas rústicas, ideal para momentos a dois ou para encontros descontraídos. Do lado de fora, uma esplanada com generosas áreas e instalações sanitárias é ideal para dias amenos.

Prima pela belíssima gastronomia alentejana, com especial destaque para os ovos rotos, uma receita com batata palha caseira e paia do toucinho, ideal para uma explosão de sabores nunca antes experienciada. As bochechas de porco preto estufadas, acompanhadas de migas de espargos e legumes, são uma verdadeira “feitiçaria gustativa” que conquista até os paladares além-fronteiras. A ementa oferece entradas variadas, com enchidos e queijos regionais, carnes do montado e opções vegetarianas criativas, como o arroz de espargos com cogumelos. Para os mais gulosos, para além das sobremesas típicas, destaco o cheesecake de figo da Índia, ideal para terminar a refeição em beleza. Em resumo, “A Bruxa d’Évora” é muito mais do que um restaurante; é um portal para a história e para os sabores do Alentejo. É, sem dúvida, um destino a não perder no centro histórico de Évora.

Laura da Silva Solicitadora
Filipa Ferreira Perdigão Solicitadora
Restaurante A Bruxa d’Évora
Restaurante
Moinho do Cu Torto

Por séculos, Évora tem sido palco de encontros entre culturas e histórias. Hoje, a cidade alentejana continua a surpreender quem busca autenticidade, património e uma experiência sensorial única. A cidade de Évora é um território antigo, com vestígios de ocupação humana desde a pré-história e famosa pelos seus monumentos megalíticos, como o Cromeleque dos Almendres, considerado um dos maiores da Europa. Os romanos conquistaram a cidade no século II a.C., dando-lhe o nome de Ebora Liberalitas Júlia, e deixaram-nos o célebre Templo Romano de Évora, também conhecido como Templo de Diana, um dos monumentos mais emblemáticos da cidade. Após visigodos e muçulmanos, Évora foi conquistada, em 1165, por Geraldo Sem Pavor, no reinado de D. Afonso Henriques, e rapidamente ganhou importância estratégica e religiosa.

Évora

Tesouro vivo do Alentejo

Nos séculos XV e XVI, viveu a sua Idade de Ouro: foi reconstruído o convento de São Francisco, instalou-se o Poço Real, foi fundada a Universidade e construídas várias igrejas e palácios. Classificada como Património Mundial da UNESCO em 1986, devido ao seu extraordinário conjunto arquitetónico romano, medieval, renascentista e barroco, Évora é, muitas vezes, descrita como uma “cidade-museu”, pois mantém, até hoje, o seu charme tradicional em todo o centro histórico, inserido dentro das muralhas de estilo Vauban, construídas no século XVII. No coração do Alentejo, Évora convida-nos a abrandar e a descobrir. Sugiro que comece pela Praça do Giraldo, ponto de encontro entre locais e visitantes. Depois, ao passear pelas ruas de calçada portuguesa, poderá encontrar vestígios de diversas épocas, o Templo Romano e as Termas Romanas, as muralhas medievais, a Sé, a Igreja da Graça e a Igreja de São Francisco, com a sua curiosa Capela dos Ossos. Se ainda houver tempo, não deixe de incluir no seu percurso o Museu de Évora, a Fundação Eugénio de Almeida e a antiga Universidade, fundada no século XVI – uma das razões que explicam o espírito jovem e descontraído que encontramos nesta cidade. Vale ainda a pena passear pelo romântico Jardim Público, onde se encontra o Palácio de D. Manuel, outrora conhecido por Paço Real, e visitar a Ermida de São Brás, já fora de muralhas.

Évora também nos conquista pelo paladar e os sabores alentejanos são intensos e genuínos. Nos restaurantes típicos, entre as especialidades mais procuradas estão a açorda alentejana, o ensopado de borrego e as migas com carne de porco, passando pelo inevitável pão alentejano, os queijos e os enchidos da região. Para acompanhar, nada melhor do que um copo de vinho do Alentejo, reconhecido internacionalmente pela sua qualidade.

Mais do que visitar, Évora é para sentir, caminhar sem pressa, perder-se nas conversas com os locais ou simplesmente observar o pôr do sol sobre os campos dourados que cercam a cidade. Estas são experiências que vão além de uma visita turística e é nesse compasso lento que reside o seu maior encanto.

Amélia Fialho
Solicitadora e Presidente da Delegação Distrital de Évora da OSAE

Em meados de 2017, concretizei um sonho que há muito guardava: embarcar num cruzeiro pelas ilhas gregas. Sempre imaginei um lugar onde o azul do mar se confundisse com o céu, onde as casas brancas com cúpulas azuis se espalham pelas encostas e onde tempo parece abrandar. Essa imagem acompanhou-me durante anos, até que se tornou realidade e, ainda assim, superou todas as expectativas, enchendo-me os sentidos de beleza, serenidade e gratidão.

Comecei por Atenas, cidade onde a história se ergue em cada colina. Antes de partir, subi à Acrópole e contemplei a cidade aos meus pés. Ao zarpar, o navio deixou o porto e, lentamente, as águas do mar Egeu abriram caminho para que a magia começasse.

O itinerário levou-me a algumas das ilhas mais emblemáticas da Grécia, entre elas Santorini, onde as casas suspensas nas falésias me deixaram incrédula, como se fosse uma pintura viva que o tempo não consegue apagar.

Cruzeiro pelas Ilhas Gregas

A

minha viagem de sonho

Seguiu-se Creta, guardiã de histórias milenares e de sabores intensos. Cada canto da ilha parecia contar uma lenda diferente e cada refeição revelava tradições preservadas. Também passei por Patmos, conhecida como a “ilha do Apocalipse”. Mais pequena e tranquila do que as restantes, ofereceu-me um ambiente sereno e espiritual. Passeei pelas suas ruas silenciosas, entre mosteiros e casas caiadas, e recordo a lua refletida no mar naquela noite como uma das imagens mais mágicas e inesquecíveis da viagem.

A despedida grega aconteceu em Mykonos. Perdi-me nas ruelas brancas, deixei-me levar pelo ambiente descontraído, observei os moinhos de vento e, ao entardecer, jantei junto ao mar. O som das ondas acompanhava cada sabor e a luz dourada refletida na água tornava o momento quase cinematográfico. Foi o cenário perfeito para fechar o capítulo das ilhas gregas.

O cruzeiro terminou na Turquia, com a visita a Éfeso. Caminhar por aquela antiga cidade romana foi como viajar no tempo: ruas de mármore, colunas imponentes, cada pedra guardando séculos de história. A grandiosidade da civilização deixou-me, ao mesmo tempo, pequena e maravilhada.

Mais do que os lugares, ficou o ritmo sereno da viagem. Acordar com uma nova paisagem à janela, viver entre o céu e o mar, sentir o sol a aquecer a pele e ouvir o movimento suave das ondas. Houve tempo para contemplar, explorar, descansar, saborear e respirar.

Regressei a Portugal com a certeza de que esta viagem, de Atenas às ilhas gregas e destas à Turquia, ficará para sempre no meu coração como uma memória única e inesquecível.

Cecília Mendes Solicitadora e Agente de Execução

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