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O machismo resiste

* Fernanda Lira

As leis em defesa aos bons costumes estão aí, formuladinhas, para dizer com todas as letras aos homens que tratar mal uma mulher não é seu direito. Em 2023, já é sabido, e de longa data, que a manipulação do discurso, colocando toda a culpa na mulher pelas grosserias e violência dos machos, é algo abjeto e pode ser enquadrado como assédio emocional ou psicológico, muito praticados contra a mulher.

Um cidadão ilustre e renomado, exemplo de pessoa de bem, pai, filho, esposo, parente, amigo, cidadão, compartilha com o irmão sua dúvida a respeito da razão de ter sido colocado “no gelo” por uma familiar, demonstrando não ter a menor noção do quando o assédio sexual que cometeu contra ela, mesmo tendo ficado no campo verbal, deixou marcas na sua disposição para ter que conviver com ele.

Enquanto isso, o colega de trabalho reclama para outros colegas, incluindo seu chefe, da capacidade profissional daquela que não reagiu bem a suas piadinhas ou comentários do tipo: “hoje a reunião está bonita”, quando ela adentra a sala, ou então “seu marido é um cara de sorte” depois de alongar os olhos sobre sua aparência. Vingancinha por ela não corresponder a seu assédio velado, machista e de mau gosto.

Na mesma linha de conduta, o patrão que se julga muito espirituoso e amigo de seus subalternos não se cansa de inventar novas piadas envolvendo suas funcionárias, refer- nindo-se em tom jocoso sobre sua forma física, seus hábitos e seu suposto comportamento sexual, acreditando que elas riem por ser engraçado e não de nervoso pelo constrangimento e pela submissão necessária para manter o emprego.

Um comportamento típico, aliás, do predador barato, que faz comentários indevidos a mulheres com as quais se depara no campo profissional, acreditando-se sedutor (no que consegue algum sucesso eventualmente), sem ter a menor noção do quão patético se apresenta.

Não faltam exemplos. Inclusive do cara que esculhamba com a mulher que dança livremente na pista, mas lhe dá um toco quando ele tenta se aproximar querendo mais do que uma troca de movimentos seguindo a música. Ah, e não vamos esquecer do marido da amiga que sempre faz questão de comentar que se não fosse por ela, você não estaria solteira. Puá!

E não vamos nos esquecer também dos maridos e filhos de mulheres que por estudar ou trabalhar (ou os dois casos) chegam em casa e se comportam como um rei, cujos vassalos (servidores) são as mulheres que ali residem. Elas lavam, passam, cozinham, limpam para esses marmanjos.

O machismo, em muitas formas além dessas, persiste. Inacreditavelmente. Dando cada vez mais sentido ao Dia Internacional da Mulher, que se estendeu a todo o mês tem que ser. E me alegro com essa constatação. Naturalizar esses ciclos faz as portas ficarem abertas. Amigos vão e vem. E às vezes voltam.

P.S.: “Alguém em Algum Lugar” é uma série da HBO que de uma forma muito singela, fala de amizades.

* Ator, diretor e escritor de março por ser esse ser incrível ainda vítima de atrocidades masculinas de todas as espécies, nuances e efeitos. Incluindo, naturalmente, todos os crime de feminicídio, estupro e pedofilia.

Recado para machistas de plantão: se li- guem! Vocês já eram. Nenhum ser masculino tem mais direitos que qualquer mulher. E se você ainda não aprendeu a respeitar isso está completamente fora da civilidade.