Querido digital

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Entrámos na mesma altura os três e todos como estafetas! Era o percurso normal na época.” Mas não se pense, por isso, que o encontro com as letras e com o jornalismo foi acidental. Já vinha de miúdo “o sonho de ser escritor” e é com um sorriso que recorda que se preparava para esse dito futuro “escrevendo imenso numa máquina antiga que tinha, uma Royal!”. Contudo, depressa percebeu que aquela talvez não fosse a melhor opção. Tinha um primo que era jornalista e, pela proximidade com o Carlos Pina e com o Paulo Dentinho, a ideia de desenvolver uma actividade também ligada à escrita, mas como jornalista, começou a ganhar forma e depois corpo. A veia de escritor estava lá e os livros acabariam por chegar, sim, é verdade, mas muitos anos depois. A evolução tecnológica, em especial na última década, tem sido espantosa, na sociedade em geral e no jornalismo em particular. E o nosso interlocutor recorda que, antes do offset, ainda chegou a trabalhar no chumbo. Era o tempo em que o telex era uma tecnologia moderna e ainda nem se falava em telefax. “Fazíamos as peças por telex e por telefone! Depois veio o fax, que foi a primeira grande revolução, mais tarde o desktop publishing, a entrada dos primeiros computadores nas redacções e, de então para cá, a evolução tem sido imparável”. Provavelmente até Gutemberg ficou surpreendido com as mudanças na velhinha Imprensa quando começou a ouvir palavrões como web journalism e web publishing! Mas nada disto surpreende Paulo Querido. Reconhece que as coisas mudaram muito, mas isso “é normal, é a evolução”. “E a evolução acontece em todas as épocas”, enfatiza. O ritmo a que tudo acontece é que é muito mais acelerado. As grandes diferenças que assinala são mais ao nível do perfil sociológico de quem faz jornalismo: a formação universitária superior, que na O novo agregador das comunicações

“Hoje, faz muito mais sentido falar de transparência. Contudo, parece-me que no plano ético não se evoluiu. E isso não se ensina na escola, aprende-se no dia-a-dia, no terreno, por osmose. Como se vive num ambiente extremamente concorrencial há muito menos tempo para essas questões, que de alguma forma têm vindo a diluir-se na última década”

época era inexistente, a entrada posterior das mulheres nas redacções, então uma imensa minoria, o início da personalização do jornalismo, quase inexistente nos anos 70... “O que o jornalismo ocidental ganhou aqui, acabou por perder noutras coisas”, nomeadamente um certo espírito comunitário e até mesmo gregário. Objectividade e independência eram valores muito importantes na altura. “Hoje, faz muito mais sentido falar de transparência, por exemplo. Contudo, parece-me que no plano ético não se evoluiu. E isso não se ensina na escola, aprende-se no dia-a-dia, no terreno, por osmose. Como se vive num ambiente extremamente concorrencial há muito menos tempo para essas questões, que de alguma forma têm vindo a diluir-se na última década. Em contrapartida, há uma pressão sobre a produtividade - hoje tudo se mede - que na época não existia”. Queremos saber o que faz nos tempos livres. Mas a verdade é que não se lhe conhecem hobbies. O portátil, o iPhone e

Não se pense que o encontro com as letras e com o jornalismo foi acidental. Já vinha de miúdo “o sonho de ser escritor” e é com um sorriso que recorda que se preparava para esse dito futuro “escrevendo imenso numa máquina antiga que tinha, uma Royal

PERFIL

O fio condutor Quando e como foi o primeiro encontro com a sua paixão? Onde é que tudo começou? Na década de 70 o computador era comummente encarado com desconfiança, sentido como uma ameaça que se aproximava e Paulo Querido também pensava assim. Com os Spectrum e a evolução da micro-informática interessou-se pelo tema, que tinha tudo a ver com informação. Comprou um Spectrum, aprendeu Basic, a linguagem de programação, e nunca mais parou. A integração plena no seu trabalho aconteceria ainda na “Gazeta dos Desportos”, onde estava na altura. Com um amigo desenvolveu um programa no Spectrum para fazer a classificação das equipas de futebol, um processo ainda manual. Em meia hora tinham aquilo que até então levava seis horas a fazer: a classificação da jor-

nada de todas as equipas nacionais de futebol. A internet veio mais tarde, mas muito mais cedo do que para a maioria dos portugueses. Talvez pelo seu espírito empreendedor e pelo seu carácter de pioneiro. No final dos anos 80 tem pela primeira vez na mão um modem. Na altura era preciso ligar à Compuserve, nos Estados Unidos. Foi marcante a entrevista que fez na altura em alto mar a João Cabeçadas, que estava a participar numa regata de volta ao mundo. Tratar a tecnologia e o digital por tu passou a ser natural na vida de Paulo Querido, que também, pelo seu espírito arguto e curioso, sempre esteve um pouco mais à frente, iniciando percursos inexplorados ainda pela maioria. Não sabemos, nem Paulo Querido sabe, o destino desta viagem.

Setembro 2011

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