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De 2 a 8 de dezembro de 2004

INTERNACIONAL ÁFRICA

Moçambique escolhe novo presidente da Redação

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leições gerais em Moçambique escolhem esta semana (dias 1º e 2 de dezembro) o novo presidente da República e 250 deputados ao Parlamento. Cinco candidatos concorrem à vaga do atual presidente, Joaquim Chissano, em 21 partidos e coligações. A disputa presidencial está, no entanto, polarizada entre os dois maiores partidos, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo). Nove milhões de moçambicanos estão aptos a votar. Chissano, da Frelimo, está no poder há 18 anos. Analistas apontam que seu candidato, Armando Emílio Guebuza, vencerá o pleito, apesar da boa colocação do principal líder de oposição, Afonso Dhlakama, da Renamo. Tanto Guebuza quanto Dhlakama afirmaram durante a campanha eleitoral que o combate à Aids, à corrupção e à burocracia da máquina governamental está entre seus principais desafios. Quem quer que ganhe, porém, não vai alterar muito a situação do empobrecido Moçambique, que enfrentou uma guerra civil de quase 20 anos, encerrada em 1992. O crescimento econômico do país apresentou uma média de 10% na última década – entre os maiores do mundo –, mas metade dos 18 milhões de habitantes ainda vive na extrema pobreza. O desemprego tem taxa de 50%. Em agosto deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdoou 95% da dívida de 331 milhões de dólares de Moçambique com o Brasil. Para rebater os números negativos de suas quase duas décadas no poder, o atual chefe de Estado moçambicano faz questão de trazer a público outros dados. Joaquim Chissano destaca que a taxa de analfabetismo foi reduzida de 90% para 54% – desde 1975, quando a Frelimo assumiu o poder no país. No entanto, foram necessários cinco anos para reduzir de 60% para 40% a dependência de ajuda estrangeira, um dos problemas mais graves de Moçambique. Embora ainda pudesse concorrer para um terceiro mandato, Chissano disse ter escolhido sair, em benefício da democracia. A polícia moçambicana divulgou na semana passada que 12 pessoas tinham morrido até então vítimas da violência eleitoral, contra 50 que morreram nas eleições de 1999, quando Chissano venceu com 52,3% dos votos contra 47,7% de Dhlakama. A Frelimo tem hoje

Paulo Lima

Disputa está polarizada entre candidatos da Frelimo, no poder, e da Renamo, antiga guerrilha de direita

Vendedora de legumes em rua de Maputo, capital do Moçambique: desde as eleições de 1999, clima é de tensão entre Frelimo e Renamo

QUEM É AFONSO DHLAKAMA

133 cadeiras no Parlamento contra 127 da Renamo. Desde as eleições de 1999 o clima é tenso entre partidários da Frelimo e da Renamo. Esta última reclamou de fraude nos resultados que deram a vitória a Chissano. No pleito atual, o partido de Dhlakama alega que computadores “são sinistros instrumentos de fraude eleitoral” e exige que a tabulação e contagem dos votos seja feita manualmente, segundo informa a agência All Africa. O uso de computadores, porém, não é novidade nas eleições moçambicanas. São usados desde 1994 para tabulação e contagem dos votos, embora não para a votação em si. Em 1999,

operadores de computadores da Renamo é que foram acusados de fraudar a contagem de votos na província de Nampula. Cerca de 900 observadores eleitorais credenciados pelas autoridades moçambicanas estão no país desde a semana passada para acompanhar as eleições. Os observadores são de várias missões internacionais, entre as quais a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a Commonwealth (das quais Moçambique é membro), União Européia, Parlamento Europeu, Carter Center e organizações independentes moçambicanas.

Principal candidato de oposição na eleição à Presidência de Moçambique. Aos 51 anos, Dhlakama enfrenta a terceira corrida presidencial, depois de ter liderado a guerrilha da Renamo contra o governo da Frelimo. A possibilidade de uma terceira derrota deixa para a Renamo uma decisão sobre a sua continuidade na liderança partidária. Afonso Dhlakama colocou a reforma do Estado moçambicano no centro das preocupações do seu governo, caso vença as eleições, defendendo a “despartidarização do funcionalismo público” e de altos cargos do Estado. Durante a guerra civil moçambicana, foi um dos líderes da Renamo, guerrilha que recebia apoio do então regime racista da África do Sul, o apartheid, e combatia o governo de orientação marxista de Samora Machel.

QUEM É ARMANDO GUEBUZA Candidato favorito à Presidência de Moçambique. Tem 61 anos, é empresário e foi eleito secretário-geral da Frente Nacional de Libertação de Moçambique (Frelimo) em 2002. Participou ativamente da luta pela independência de Portugal, ao lado do lendário líder moçambicano Samora Machel, um dos criadores da Frelimo. Ficou famoso em 1974, por ocasião da proclamação da independência, quando deu aos colonizadores portugueses que não queriam se submeter ao novo governo 24 horas para deixar o país. É conhecido pelo combate à corrupção. Liderou a negociação de paz pela Frelimo para pôr fim à guerra civil moçambicana (19761992), durante a qual a então organização marxista combateu a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo).

Helsinque: “Para os pobres, o tempo está acabando” Moyiga Nduru de Pretória (África do Sul) Sua jornada típica começa às cinco da manhã. Com uma cabaça na cabeça, e às vezes com um bebê nas costas, as mulheres camponesas da África caminham até 12 quilômetros por dia para conseguir água. Quando voltam do rio, devem limpar suas cabanas, para, em seguida, irem trabalhar no campo. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), as mulheres produzem 80% dos alimentos em muitos países africanos. No Sudão, 30% das mulheres trabalham na agricultura, e, na República Democrática do Congo, elas somam 80%, segundo a FAO. Ao terminar o extenuante trabalho na lavoura, as mulheres voltam para casa, onde cozinham para os filhos e maridos antes de irem para a cama exaustas. No dia seguinte, as mesmas tarefas esperam por elas: uma armadilha da pobreza sem escapatória à vista. Entretanto, o Processo de Helsinque se nega a sucumbir ao

pessimismo que inspiram essas e muitas outras situações no Sul em desenvolvimento. A iniciativa lançada há dois anos pelos governos da Finlândia e Tanzânia tem como objetivo combater a desigualdade para tornar o mundo um lugar mais seguro. “A premissa do Processo de Helsinque é que a atual estratégia para resolver problemas mundiais não dá resultado e que as instituições com poder para melhorar as coisas são ineficientes, injustas e antidemocráticas”, afirmou Flora Musonda, membro da secretaria do Processo de Helsinque na Tanzânia. “O processo promove a mudança, e acreditamos que ela é possível se forem feitas as perguntas corretas, se envolverem as instituições certas e se buscarem soluções inovadoras”, disse Musonda em uma reunião convocada pelos organizadores da iniciativa em Pretória, capital da África do Sul. Essa busca de soluções está encabeçada pelo Grupo de Helsinque, co-presidido pelos chanceleres da Finlândia e Tanzânia,

Erkki Tuomioja e Jakaya Kikwete, respectivamente. Ilari Rantakari, representante do Processo de Helsinque no Ministério de Assuntos Exteriores da Finlândia, disse na reunião de Pretória que o processo tende a promover novas associações entre o Norte e o Sul, bem como entre governos, sociedade civil e setor privado. Rantakari espera que o processo faça com que a comunidade internacional “seja mais responsável ao fixar políticas mundiais e mais cumpridora de políticas acordadas mundialmente, como as referentes aos direitos humanos e às Metas de Desenvolvimento do Milênio”. Essas metas, estabelecidas pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas em 2000, incluem a redução da pobreza à metade, o acesso universal à educação fundamental e a redução da mortalidade infantil em dois terços entre 1990 e 2015. Outras metas se referem à redução da mortalidade materna, ao combate ao HIV/Aids e à sustentabilidade ambiental.

De todas essas metas, a única que está em vias de ser cumprida até 2015 é a da redução da pobreza, afirmou o presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, no Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, 17 de outubro. Esse objetivo mundial seria alcançado “graças aos esforços da China e da Índia”, os países de maior população do mundo. No entanto, “em algumas partes da Ásia meridional, o panorama é menos promissor, e na África subsaariana se prevê que o número de pessoas que vivem na pobreza absoluta aumentará”, advertiu Wolfensohn. No dia 26 de setembro, a Grã-Bretanha anunciou uma iniciativa para ajudar a pagar 10% da dívida que os 32 países mais pobres do mundo têm com credores internacionais. Entretanto, a proposta foi rejeitada pelos outros membros do Grupo dos Sete (G-7) países mais ricos do mundo durante reunião realizada no último dia 2 de outubro em Washington. Fantu Cheru, professor de desenvolvimento internacional da Universidade de Washington,

disse na reunião de Pretória, no dia 15 de outubro, que o tempo está acabando para os pobres do mundo. Cheru propôs que 5 bilhões de dólares para uma sugerida venda das reservas de ouro do Fundo Monetário Internacional (FMI) sejam separados para ajudar os países em desenvolvimento a enfrentarem as flutuações das moedas e dos preços dos produtos básicos, entre outros males da economia mundial. Além das deliberações do Grupo de Helsinque, o Processo de Helsinque inclui discussões sobre uma “agenda econômica mundial” e “segurança humana”. Com base no resultado dessas conversações, o Grupo de Helsinque emitirá recomendações dirigidas a governos e instituições, que serão publicadas com um relatório final em maio do próximo ano. Embora o Processo seja dirigido por Tanzânia e Finlândia, em breve poderão somar-se às discussões Brasil, África do Sul, Argélia, México, Malásia, Índia, Canadá e outros países, anunciou Rantakari. (...) (IPS/Envolverde – www.envolverde.com.br)


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