Edição 404 - de 25 de novembro a 1º de dezembro de 2010

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internacional

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“Nos últimos dez anos, Israel arrancou mais de cinco mil árvores” Ivori Moraes

ENTREVISTA Integrantes do MST que participaram da colheita de azeitonas neste ano relatam a realidade dos camponeses palestinos da Redação OS MILITANTES do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Ivori Moraes e Deusamar Sales estiveram por 15 dias na Palestina, onde participaram do Fórum Mundial de Educação e da colheita de azeitonas. Em entrevista ao Brasil de Fato, Ivori conta como foi a experiência de conhecer a realidade e a luta do povo palestino. Brasil de Fato – Vocês foram ajudar os agricultores na colheita das oliveiras. Qual a importância da solidariedade internacional do MST/Via Campesina?

Ivori Moraes – Estivemos em contato com dirigentes e famílias camponesas de duas organizações. Uma delas é a União de Comitês de Trabalho Agrícola (UAWC, na sigla em inglês), que tem 450 comitês de base que lutam pela terra – que é tomada à força pelo Exército para implantar colônias de Israel –, pelo acesso à água e pela soberania alimentar. Buscam os mesmos objetivos da Via Campesina, com as especificidades da Palestina. Também tivemos um intercâmbio com a União de Agricultores da Palestina, que tem 75 entidades organizadas e 16 associações agrícolas. Participamos do final da colheita das azeitonas, que é um dos principais cultivos dessas famílias. Na Palestina, existem mil quilômetros quadrados com plantações de oliveiras. Nos últimos dez anos, alegando “razões de segurança”, o Estado de Israel arrancou mais de cinco mil árvores para a expansão das colônias, a construção do “muro do apartheid” e a implantação de estradas para os judeus. A colheita deste ano foi uma das mais violentas, pois muitos colonos judeus atacaram camponeses palestinos, impedindo a colheita de suas plantações. Houve mortes e muita gente ferida. Ou

seja, além da ação do Exército, que barra o acesso às plantações por qualquer motivo, alegando questão de segurança, agora a disputa é para acabar com a principal atividade agrícola das famílias palestinas e implantar os sistemas produtivos do agronegócio sob o controle das empresas transnacionais e israelenses. Participamos de alguns dias de colheita de azeitonas junto com as famílias, pois a presença de pessoas de delegações internacionais significa uma forma de solidariedade e também de defesa para as comunidades camponesas, principalmente nos lugares mais afastados e nas proximidades do muro ou das colônias de Israel. É possível estabelecer alguma relação com o problema dos semterras aqui no Brasil?

Se fizermos uma comparação com a luta dos sem-terras no Brasil, percebe-se que os temas são comuns: terra, água, soberania alimentar, controle das sementes. Infelizmente, frutos do mesmo sistema de concentração. Nosso Brasil, que possui muito mais recursos naturais, tem também famílias sem acesso às condições necessárias para viver e produzir no campo. Mas nem dá para comparar nossa situação política e organizativa com o grau de repressão e de isolamento em que trabalham e lutam as famílias palestinas. Cabe a nós fortalecer nossas organizações, pois as garras do imperialismo estão fincadas de formas diferentes em todo o planeta. As nossas ações locais precisam estar articuladas com as lutas dos trabalhadores (as) de forma global. Vocês também participaram do Fórum Mundial de Educação. Qual a importância de realizá-lo na Palestina?

O Fórum Mundial da Educação aconteceu de 28 a 31 de outubro deste ano,

Terra, água e soberania alimentar são alguns pontos comuns com a luta dos sem-terra no Brasil

com o lema: “Educação para a mudança”. Foi um marco importante na resistência palestina, no sentido de fortalecer a solidariedade internacional, enquanto compromisso de classe, no combate ao imperialismo e na reafirmação da soberania dos povos. Basicamente, os debates desse fórum foram em torno do papel da educação nesse contexto e da reafirmação das potencialidades dos processos educativos, quando estes estão vinculados à luta pela transformação social. Mas o evento teve inúmeras dificuldades para acontecer, devido ao cerco permanente de Israel. Um dos fatos graves foi a prisão de um dos membros do Secretariado do Fórum Social Mundial e da Comissão organizadora desse fórum, Ameer Makhoul, que ocorreu no dia 6 de maio. Ele foi preso em sua casa, às três da madrugada, com base na Lei de Segurança, sob acusação de espionagem, e foi mantido isolado por 12 dias e forçado a confissões pela inteligência israelense. Assim como os outros presos políticos mantidos em prisões de Israel, que são aproximadamente 6.850 pessoas, Ameer foi julgado por uma corte secreta e será condenado a uma pena de sete a dez anos de prisão.

Como o fórum contribuiu para a luta do povo palestino?

Diante desta situação tão grave, acredito que o Fórum da Educação teve um papel importante para que as ações de solidariedade ou de boicotes, que devem ser implementadas internacionalmente, ganhem força. Quem conseguiu chegar até as atividades do fórum sentiu na pele o que o povo palestino vive todo dia. Dessa forma, teremos que debater em nossos movimentos como fazer algo concreto para fortalecer a resistência daquele povo, como a campanha pela libertação de presos políticos, por exemplo. As pessoas precisam saber o que está acontecendo na Palestina, e é preciso articular as ações internacionais, pelo menos as que tenha mais unidade, como as de defesa dos direitos humanos básicos, que os presos políticos de lá não têm. Não dá para ficar debatendo possibilidades de transformação social em um fórum sem tratar de ações concretas para que as lideranças que conduziam os processos organizativos na Palestina possam ao menos ter o direito de se comunicar com os seus familiares e seu povo. Nesse sentido, achamos que o fórum cumpriu um papel muito importante. (DM)


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