BioAtivo - 19ª Edição

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EDITORI AL

2 editorial Caros leitores, A Bioativo chega à 19ª edição, que marca seu aniversário de 4 anos! A revista, que já mergulhou com profundidade no tema dos experimentos em animais em edições anteriores, apresenta em Pesquisa & Inovação o chip que simula um pulmão humano. A longo prazo, esse tipo de projeto pode ampliar a segurança e diminuir os custos das fases de testes de medicamentos. A ideia não é apenas solucionar a questão ética do uso de animais como cobaias, mas solucionar dificuldades ainda maiores, como a necessidade de garantir a confiabilidade de drogas para patologias que afetam apenas aos seres humanos. O Especial faz uma retrospectiva a 2014, apresentando um dossiê de um dos temas mais assustadores do ano: o maior surto de Ebola já registrado. A Bioativo te conta detalhes sobre a doença e porque, de fato, ela parece saída diretamente de um filme de terror. Em Mercado, você conhece a importância do licenciamento ambiental, e as dificuldades a área enfrenta por conta de embates politicos e do desenvolvimentismo difícil de ser combatido no Brasil. Boa leitura! Ana Carolina Leonardi Diretora de Jornalismo Científico Jornalismo Júnior

bioativo INSTITUCIONAL Farma Júnior realiza visita à Natura

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NOTÍCIAS MP que desobriga presença de farmacêuticos em farmácias é atraso

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Enguias usam descarga elétrica como controle remoto de presas

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Cientistas desenvolvem droga que pode consertar danos à medula

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Vacina contra a dengue em fase de testes

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Cientistas criticam MEC por R$247 milhões 6 doados ao projeto de Nicolelis Capacidade humana de digerir álcool começou nos primatas

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PESQUISA E INOVAÇÃO Chip que simula pulmão humano pode substituir testes em animais

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ESPECIAL Ebola: um dossiê sobre a epidemia que assustou o mundo

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MERCADO Os limites do licenciamento ambiental

BIO JÚNIOR – Diretoria: Davi Martinelli, Edmar Oliveira, Gabriela Christine Santos, Larissa Assis, Mathias Jorquera. Suplente: Bruna Bombarda. Presidente e Responsável pela BioAtivo: Priscilla Shiota Fedichina. Contato: biojr.usp@gmail. com. FARMA JÚNIOR – Diretoria: Ana Mendes, Bárbara Faustino, Beatriz Bianchi, Bruna Kyota, Camila Felix, Carla Pazini, Carolina Rabaneda, Débora Savino, Flávia Gomes, Flávia Arimori, Gabriel Barbosa, Juliana Medeiros de Deus, Karoliny Araújo, Paloma Nascimento, Paulo Souza, Rafaela Fiorotto, Vivian Borali. Responsável pela BioAtivo: Paloma Nascimento. Presidente: Juliana Medeiros de Deus. Endereço: Av. Prof. Lineu Prestes, 580 – Centro de Vivência, sala 14, Cidade Universitária. Contato: (11) 6901 – 5926, farmajr@usp.br. JORNALISMO JÚNIOR – Edição: Ana Carolina Leonardi e Murilo Carnelosso. Equipe: Guilherme Eler, Leandro Bernardo, Julio Viana, Marcos Vinícius Nona, Sofia Mendes. Diagramação e Projeto Gráfico: equipe de Comunicação Visual da Jornalismo Júnior. Contato: (11) 3091-4085, jjr@usp.br, @jornalismojr.

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Farma Júnior realiza visita à Natura Empresa júnior levou alunos da Farmácia para conhecer como funciona a produção de cosméticos na fábrica da Natura Por Murilo Carnelosso

Foto: Divulgação Farma Jr.

A Farma Júnior, empresa júnior do departamento de Farmácia da USP, organizou uma visita dos estudantes do curso até a fábrica da Natura, que fica em Cajamar, na região metropolitana de São Paulo. Os 34 alunos tiveram a oportunidade de realizar a visita no dia 09 de setembro, em uma das principais atividades da gestão da Farma Junior no ano de 2014. A visita à fabrica de cosméticos começou pelo Núcleo de Aprendizagem, espaço onde qualquer pessoa que entra para trabalhar na empresa recebe os

treinamentos, assiste a palestras e se qualifica para iniciar a carreira na fábrica. É lá que fica tambem uma parede cheia de bótons de madeira, onde ficam gravados os nomes de todos os consultores da empresa que trabalham lá por pelo menos 10 anos. Logo em seguida a visita seguiu para as três fábricas da Natura. Elas levam o nome de Bacia do Rio da Prata, Bacia do Rio São Francisco e Bacia do Rio Amazonas. As fábricas com nome de bacias hidrográficas do Brasil também possuem creche para os filhos dos funcionários, cabeleireiro, banco, correio, um clube e um restaurante. A ideia da Natura com isso é facilitar a vida

Alunos da Farmácia conhecem fábrica da Natura


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de quem trabalha em sua fábrica, já que fica razoavelmente distante da cidade. Os alunos da Farmácia também tiveram a oportunidade de visitar a Casa Natura que existe dentro da fábrica. É o momento em que os visitantes podem tocar, cheirar e testar os produtos feitos nela. No final da visita os estudantes voltaram ao Núcleo de Aprendizagem para receber um brinde da empresa e assistir um filme sobre a Natura antes de voltar para São Paulo. Segundo a diretora da Farma Júnior, Paloma Nascimento, eventos como esse são oportunidades raras para os alunos. “Esses eventos eventos são importantes para chamar a atenção e até das empresas para a Farma Júnior. Além de serem uma

grande oportunidade para vivenciar experiências novas e diferentes tanto para os membros [da empresa] como para os alunos em geral”, conta Paloma. A empresa júnior espera realizar novas visitas no futuro para abrir mais oportunidades para os alunos da Farmácia. “Existem projetos para novas visitas, tanto para a Natura como para outras empresas, já que muitos alunos não puderam ir pela quantidade limitada de vagas. Mas ainda não nada definido”, disse a diretora da empresa. Para os próximos meses a Farma Júnior já pretende também iniciar a reformulação da gestão para se preparar para a entrada dos novos alunos do curso em 2015 e para futuros projetos. Foto: Divulgação Farma Jr.

Cartaz da 9ª Semana de Cosmetologia, em 2011


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notícias 5 MP que desobriga presença de farmacêutico em farmácias é atraso

Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Em artigo para o UOL, Pedro Eduardo Menegasso, presidente do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo, criticou a proposta da Medida Provisória 653/14, que tramitava no Congresso Nacional até o início de dezembro. A MP estabelece que para as farmácias enquadradas no Supersimples, ou seja, de micro ou pequeno porte, aplica-se o artigo 15 da Lei Federal nº 5.991/73. Segundo tal artigo, na falta de farmacêutico (profissional de saúde formado em curso superior), e comprovada a necessidade de estabelecimento no local, as farmácias poderão dispor de prático ou oficial de farmácia como responsáveis técnicos, desde que inscritos no CRF (Conselho Regional de Farmácia). Fonte: http://noticias.uol.com.br

Enguias usam descarga elétrica como controle remoto de presas

Cientistas desenvolvem droga que pode consertar danos à medula

A enguia-elétrica, também conhecida como peixe-elétrico, poraquê ou apenas enguia, pode liberar uma descarga elétrica potente para atacar suas presas indefesas. Mas esse choque não é usado apenas para atordoar outros peixes. Um novo estudo mostra que as enguias usam a eletricidade como forma de controle remoto sobre suas vítimas, fazendo com que peixes que possam estar escondidos se contorçam, expondo sua localização, ou induzindo contrações involuntárias de músculos para incapacitar suas presas.

Cientistas americanos dizem ter desenvolvido uma droga que pode incentivar os nervos na medula espinhal a crescer e reparar lesões. O estudo com ratos, divulgado na publicação científica Nature, permitiu a recuperação parcial de movimentos e controle da bexiga. A droga funciona ao perturbar a “cola pegajosa” que impede que as células nervosas cresçam durante uma lesão. Nos testes, 21 dos 26 ratos mostraram algum grau de recuperação na capacidade de movimentos ou das funções da bexiga.

Fonte: http://g1.globo.com

Fonte: http://g1.globo.com


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Vacina brasileira contra a dengue entra em nova fase de testes

Cientistas criticam financiamento de projeto de Nicolelis

Após resultados iniciais promissores, começa em 2015 a nova fase de testes da vacina brasileira contra a dengue, desenvolvida no Instituto Oswaldo Cruz. Diferente de outras vacinas pesquisadas para a doença, o método brasileiro inova ao combinar duas técnicas de imunização. Para aumentar a eficácia de proteção, pesquisadores brasileiros uniram a técnica conhecida como vacina de DNA com o uso do vírus da febre amarela. Primeiros resultados de testes em camundongos mostraram eficácia de 100%. Em 2015, começam os testes em macacos.

O Ministério da Educação deve receber nos próximos dias um abaixo­assinado de cientistas contrários ao envio de R$ 247,6 milhões a um projeto idealizado pelo neurocientista Miguel Nicolelis. A ação é encabeçada pelos professores Paulo Saldiva (USP) e José Antonio Rocha Gontijo (Unicamp). Eles são coordenadores de dois dos três grupos de ciências médicas da Capes (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), órgão subordinado ao ministério. O valor será destinado para a construção, até 2017, do Campus do Cérebro em Macaíba (RN), idealizado por Nicolelis. Por lá, deve haver pesquisas sobre reabilitação e outras aplicações da neurociência e cursos de pós­graduação, atividades já desenvolvidas pelo IINN (Instituto Internacional de Neurociência de Natal), fundado por ele.

Fonte: http://noticias.terra.com.br

Capacidade humana de digerir álcool começou nos primatas

Fonte: http://noticias.uol.com.br

Fonte: http://www.folha.uol.com.br Foto:MEC Oficial

Os cientistas já sabiam que a capacidade humana para metabolizar o álcool, permitindo que as pessoas consumissem quantidades moderadas da bebida sem ficar doentes, vinha de um conjunto de proteínas que incluía a enzima desidrogenase ADH4. Embora todos os primatas tenham a ADH4, que realiza a primeira etapa crucial da quebra do álcool, nem todos podem metabolizá-lo. Lêmures e babuínos, por exemplo, tem uma versão da enzima que é menos eficaz do que a do homem. Ainda não se sabe em quanto tempo as pessoas alcançaram a forma mais ativa da enzima, mas alguns cientistas suspeitam que isso aconteceu quando humanos começaram a consumir alimentos fermentados, há cerca de 9.000 anos.


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Nosso pulmão do tamanho de um chip Foto: Wyss Institute de Harvard

Chip que simula pulmão humano pode ser utilizado para testar como substâncias reagem no órgão. No futuro, estruturas como essa podem substituir os testes em animais.

Por Julio Soares A asma é uma doença respiratória presente apenas nos seres humanos. Já parou pra pensar então, como são fabricados os remédios usados para combater os sintomas dessa doença? As drogas fabricadas precisam ser testadas para que haja a constatação da eficácia e segurança das moléculas utilizadas nelas. Para isso, atualmente, são usados animais como cobaias. Além de implicar várias questões éticas ainda polêmicas e que são debatidas constantemente, o uso de cobaias animais apresenta alguns problemas técnicos. O mais comum deles é o fato de que muitas

doenças, como a asma, são exclusivamente humanas e, por tanto, é necessário simulá-las nos animais. Isso demanda tempo e dinheiro, além de, novamente, despertar dúvidas morais na comunidade científica. Porém, uma recente invenção pode surgir como solução a tudo isso. A Wyss Institute for Biologically Inspired Engineering da Universidade de Harvard revelou em 2010 um chip que consegue simular um pulmão humano. O chip é uma peça de silicone e do tamanho de um cartão de memória. Ele é composto por alguns canais nos quais passam ar e fluídos, assim como


Foto: NIAD / Flickr

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em um pulmão real. O ar flui pelas células de pulmão humano, as quais revestem um dos lados da membrana, enquanto um líquido mimetizador de sangue passa por capilares sanguíneos do outro. Os movimentos são reproduzidos quando se aplica uma espécie de sucção no chip. Para observar a resposta do órgão aos medicamentos, os cientistas replicaram várias situações de enfermidades. Por exemplo, infectaram o chip introduzindo bactérias junto às células pulmonares, para, logo depois, constatarem que as células imunológicas presentes no “sangue” migraram para o local específico e as atacaram. Os cientistas também introduziram nele um edema pulmonar. Além disso, Don Nicholson, que supervisiona a pesquisa de medicamentos para doenças respiratórias na Merck Sharp e Dohme, disse que o chip ajuda a entender melhor os mecanismos da asma. Tudo isso ajuda a diminuir muito o gasto de tempo e dinheiro no processo de testes de novas drogas. Apenas uma em cada dez mil substâncias descobertas em laboratório passam para a utilização em pacientes humanos. Isso após mais de 10 anos e dezenas de milhões de dólares. O chip pode repre-

bioativo sentar um grande avanço ao proporcionar uma observação mais detalhada e focada de cada droga testada. Nicholson afirma que é muito dificil fazer testes com medicamentos voltados para asma justamente porque ela é uma doença exclusivamente nossa, não existente no mundo animal. Parece que, quando se consegue controlar a doença simulada na cobaia, o mesmo remédio não apresenta sucesso conosco. A simulação de doenças ocorre da seguinte maneira, segundo o aluno de Biologia da USP, Alexandre Paes, que já teve experiências com isso: é inserido, por exemplo, um químico na fase embrionária do animal para inibir um certo hormônio. Após o nascimento dele, ele é colocado em uma situação de exercício diário e submetido ao medicamento em questão. Depois, muitas vezes, a ação da droga só será constatada após o sacrifício do animal e uma biópsia dos tecidos afetados e se foi resolvido o problema. O caso se diferencia se o foco da observação é algum órgão que pode ter sua análise feita enquanto ele estiver vivo ou não. Segundo o estudante, isso até hoje foi a melhor opção porque era o modo mais focado de ver os resultados da ação da substância. Mas parece que caminhamos para um novo caminho. A farmacêutica GlaxoSmichKline PLC testou efeitos de uma droga sobre um edema pulmonar no chip e viu que as respostas eram as mesmas àquelas recebidas na simulação de cães, camundongos e ratos. O único impasse encontrado na questão é a desconfiança dos órgão reguladores estadounidenses. A maioria ainda afirma que, mesmo sendo promissor, o invento ainda precisa de muito desenvolvimento e estudo para que possa substituir testes em animais ou qualquer outra forma de método atual.


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Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Que a emulação de um pulmão em um chip demonstra a viabilidade do invento, alguns já adimitiram, como o diretor do Centro Nacional para avanços das Ciências Translacionais, Chritopher Austin. Mas como disse Douglas Throckmorton, vice-diretor da regulamentação científica na divisão de medicamentos da FDA - agência americana que regulamenta os remédios e alimentos nos EUA -, é necessário mais trabalho para decidir que os chips são capazes da substituição das atuais formas de analisar a eficácia de um medicamento, porém também comenta que existe potencial na invenção. Entretanto, famacêuticas e centros de pesquisa estão dispostos a investir no desenvolvimento da ideia. “Futuramente, teremos um sistema de 10 órgãos reunidos” é o que diz Michael Shuler, presidente do departamento de engenharia biomédica da universidade de Cornell, em Nova York. Muitos laboratórios estão querendo desenvolver chips que simulem

pesquisa e inovação 9 função dos fígados, rins e outros. A Merck Sharp e Dohme que tentar modelar o chip de forma que se assemelhem a pulmões predispostos geneticamente à asma e, dessa maneira, observar as diferenças biológicas existentes entre pulmões doentes e saudáveis, levando a um maior conhecimento dos efeitos dos medicamentos naqueles enfermos. Já a AstraZeneca PLC e sua divisão de neurociência estão procurando obter um chip que simule um fígado fabricado pela Hurel Corp. Com o chip irão tentar descobrir com que rapidez uma molécula é metabolizada e saber a dose necessária para que uma substância aja de forma a não criar efeitos colaterais. Os avanços no campo são muitos, e apenas o futuro e a paciência para esperar por ele que são obstáculos para a sociedade até poderem usufruir dos efeitos de tais invenções. E não apenas a sociedade humana, mas a animal parecem respirar aliviados com o prospecto de um pulmão em chip.


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Dossiê: A epidemia que assustou o mundo Histórico, tratamento e questões éticas que cercam o Ebola, doença que se espalha com velocidade alarmante Foto: BBC News

Por Marcos Vinícius de Oliveira Nona e Sofia Mendes de Paula Impossível não ter ouvido falar, nos últimos dias, da doença que se originou na África e que se difundiu exponencialmente por outros continentes. O surto do ebola é, definitivamente, um assunto que veio para assustar o mundo. O vírus do gênero Ebolavirus pode ser contraído por meio do contato com sangue ou fluidos corporais infectados, e é sexualmente transmissível. Oziris Simões, infectologista e pesquisador pela Santa Casa de São Paulo, explica que o a transmissão através do ar é pouco provável: “Isso se verifica pelo ritmo lento que os casos se propagam. O ebola é

muito mais controlável do que os vírus da gripe que são transmissíveis pelo ar, no entanto, quem contrai a doença tem um alto risco de morrer”. Também é preciso estar atento àqueles acometidos pela epidemia, pois o vírus permanece ativo mesmo após a morte do paciente, tornando o corpo da vítima outra via possível para a contaminação. O ebola foi registrado pela primeira vez em humanos na República Democrática do Congo (então Zaire), em 1976. Desde então, o ano de 2014 presencia o maior surto já registrado da doença, com a taxa de mortalidade em cerca de 70%. Os países mais atingidos são a Libéria, Guiné e Serra Leoa. Em países como Nigéria e Senegal, que também


bioativo apresentaram alguns casos, a epidemia está contida. Os sintomas são semelhantes aos de uma gripe comum, e incluem febre, dores musculares e de cabeça, vômito, diarreia e, posteriormente, hemorragias graves e insuficiências renal e hepática. A transmissão ao homem se deu por meio do contato com animais como macacos e morcegos-fruta. Acredita-se que os morcegos pertencentes a essa família sejam os hospedeiros do vírus, uma vez que podem portá-los sem apresentarem sintomas. Um delicado agravante é o fato da doença ainda não ter cura devido à alta

especial 11 capacidade de mutação do vírus. Tratamentos de reidratação e cuidados secundários podem ser feitos como forma de amenizar os sintomas, mas o sistema imunológico não conta com muita ajuda no combate ao vírus, como explicou Ozíris: “Os médicos tentam controlar a progressão da infecção baixando a febre, mantendo o doente hidratado e tratando infecções secundárias. Essas medidas reduzem a mortalidade de 90% (sem tratamento) para 60%”. Na tentativa de mudar este panorama, dois laboratórios desenvolveram vacinas para o ebola. Mas, mais do que a esperança de uma possível erradicação

Foto: BBC News


12 especial da doença, questionamentos éticos e científicos também surgem com a produção da vacina.

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sicos como luvas, máscaras e seringas descartáveis, por exemplo. Países ao norte do globo estão reagindo, mesmo que tardiamente, para ajuOMS, cuidados básicos e dar no combate ao ebola após o registro questões éticas de novos casos no leste europeu. O presidente dos Estados Unidos (EUA), BaA Organização Mundial de Saúde (OMS) rack Obama, anunciou recentemente o autorizou a produção em larga escala de maior programa humanitário das Forças duas vacinas que não atravessaram todas Armadas Americanas para combater a as etapas e testes requeridos normal- doença: serão enviadas tropas, leitos e mente para esse tipo de produção. Oziris suporte financeiro para os locais afetaSimões acredita que, devido ao caráter dos. Cuba, China, Grã-Bretanha e outros emergencial, certas concessões podem países estão respondendo a um apelo já ser feitas: “A aceleração do protocolo de antigo feito pela Fundação Médicos sem produção de vacinas não implica que se- Fronteiras, que durante muito tempo se jam dispensados os procedimentos bási- manteve como única combatente concos de segurança necessários para que tra o surto do ebola. elas tenham baixo ou inexistente risco de alergias, menor toxicidade possível e alto Outras implicações poder de estimular as defesas contra o agente infeccioso”. A OMS deve diminuir Desespero e mortes não são as únicas de 4 para 2 anos o tempo para produzir implicações que o surto do vírus causou as vacinas, e pretende liberar o uso ape- na África: a doença devastou o já frágil nas nas equipes de saúde que cuidam sistema de saúde dos países infectados. dos doentes, por constituírem um grupo Na Libéria, por exemplo, os principais com alto risco de contaminação. hospitais públicos foram fechados e o Os laboratórios pretendem aumentar ebola se soma a doenças como malária, a produção do novo meio de preven- tifo e cólera, que permanecem sem tração, mas a OMS afirma que a meta será tamento em muitas regiões do país. atingida apenas no início de 2015. Por Outra triste consequência acomete os enquanto, os esforços possíveis contra a jovens: nos países infectados, muitas disseminação da doença estão concen- crianças que perderam os pais para a dotrados na higiene feita nos hospitais dos ença não encontram um lar em casas de países infectados. Em nações africanas parentes ou amigos. Os órfãos ficam soque sofrem com a epidemia, profissio- zinhos após a perda dos pais por serem nais de saúde morreram em decorrên- considerados ameaças e possíveis meios cia do vírus por falta de materiais bá- de contaminação para seus parentes.


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As implicações econômicas também não poderiam ser positivas. Segundo o Banco Mundial, a epidemia pode causar uma retração de 4,9% da economia da Libéria, e cortar o crescimento de Serra Leoa de 11% para 2%, sem contar com a diminuição no trânsito de turistas entre os países africanos. Ao menos um campo econômico não foi atingido de modo negativo: na Nigéria, houve um boom nas compras online, uma vez que muitas pessoas evitam sair de casa por medo de uma possível infecção. Os pedidos triplicaram no maior site de compras do país, e produtos de higiene estão entre os mais vendidos, ultrapassando a venda de celulares.

O medo e a fragilidade O crescimento no número de casos da doença é alarmante. Recentemente, foi diagnosticado o primeiro caso do ebola em solo estadunidense, colocando o país em alerta. Segundo o CDC (Centers for Disease Control, Centros para Controle de Doença), o número de casos registrados pode subir de por volta de 6.000 para 1,4 milhão se nenhuma intervenção global significativa for realizada. A epidemia de 2014 chegou aos Estados Unidos e Europa trazendo consigo o medo da vulnerabilidade diante de uma circunstância que não escolhe cor de pele ou nível social.


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Os limites do licenciamento ambiental Regulamentação estatal da relação homem-ambiente encontra ainda muitas dificuldades para barrar a degradação cada vez maior do meio ambiente Por Guilherme Eler e Leandro Bernardo Um país com grande quantidade de água doce potável disponível, detentor de infinidades de áreas verdes - outrora classificadas (incorretamente) como “pulmão do mundo”- e que possui de 15 a 20% das espécies conhecidas mundialmente: a notável disponibilidade de recursos hídricos e toda a biodiversidade do Brasil se contrastam de forma quase que maniqueísta com um intenso desmatamento, um trato inadequado de dejetos e uma forte poluição nos grandes centros. Seria o ambiente um obstáculo para a vida humana, associada ao desenvolvimentismo e ao consumo cada vez mais acelerado? A degradação parece acompanhar o ritmo do progresso. Fala-se muito de uso sustentável e de responsabilidade ambiental, mas até que ponto isso visa o desenvolvimento, em detrimento de uma conservação mais intensa e eficaz? Essa permissividade, por vezes, abre brechas que acabam por limitar a atuação de iniciativas que almejam a real conservação do ambiente. Porém, há mecanismos que buscam, ao menos, minimizar tais impactos. Necessário a diversos tipos de atividades econômicas que utilizem recursos naturais ou que possam causar poluição e outras formas de degradação, o licenciamento ambiental é uma tentativa de regulamentar a relação homem-ambiente. Desde o começo da década de 1980, como lei federal, esse procedimento ainda não conse-

gue ser associado ao combate efetivo de iniciativas que potencialmente degradem o solo, o ar, os recursos hídricos ou que influenciem nas atividades de comunidades que possuem uma relação de dependência com algum ambiente ou recurso natural, como tribos indígenas. O professor da Escola Politécnica da USP, Luís Sanchez, especialista no tema, trata dessa falta de representatividade sobre o ponto de vista prático: “Muitos veem o licenciamento ambiental como uma formalidade, uma etapa a ser cumprida para que se dê prosseguimento a alguma licitação. Um papel a ser obtido, que não mensura da forma adequada para que serve todo esse uso de recursos de empresas e governos”. Com vários níveis de profundidade, de acordo com o potencial que certo empreendimento detém de influir no ambiente, o procedimento é composto por etapas que partem do estudo de impactos ambientais e questões de caráter técnico. Ao passo que garante ao empreendedor o reconhecimento documental de que suas atividades estão de acordo com o que determina os órgãos públicos, seja em nível federal (IBAMA), estadual, ou municipal (secretarias de meio ambiente), estabelece-se, ao mesmo tempo, como regulador eficaz dessas atividades, capaz de barrar empreendimentos e o funcionamento de suas atividades. No entanto, são poucos e com baixa abrangência os estudos que associam a eficácia da implementação do licenciamento ambiental com a real preservação


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Foto: Cecilia Bastos/Jornal da USP

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do meio ambiente. De acordo com o professor, como acontece com toda fiscalização governamental, há limites decorrentes do próprio tamanho e quantidade de situações que devem ser fiscalizadas. Um acompanhamento contínuo e detalhado é muito difícil de ser feito. Na maioria das vezes, isso se dá de forma ocasional, com maior atenção para os grandes empreendimentos, que normalmente passam por mais etapas de fiscalização. Os impactos físicos nos ecossistemas e, principalmente, os impactos sociais, como o deslocamento involuntário de populações humanas, demanda um estudo detalhado que determine a relação dessas comunidades com o ambiente local e entre comunidades. Em um plano ideal, deve-se procurar evitar os impactos e reduzir os inevitáveis. O reassentamento de comunidades humanas e o acompanhamento até a reinserção das pessoas são processos essenciais. Recentemente a comunidade USP presenciou um caso em que o processo de licenciamento foi bastante questionado. O campus da EACH (USP Leste) teve que paralisar suas atividades por ter sido construído numa área onde há grande concentração de gás metano, altamente

inflamável, proveniente do processo de assoreamento do Rio Tietê. Segundo Luís Sanchez, a fiscalização foi eficaz nesse caso. Lidar com essas questões de projeto é compromisso do empreendedor, que não executou de maneira satisfatória as sanções nas esferas administrativas. Portanto, a execução falha é reflexo direto dessa insuficiência no projeto. A entidade que solicita o serviço deve cumprir as condicionantes do licenciamento ambiental estabelecidas por procedimentos a serem cumpridos especificamente para aquela demanda, e o prazo para as medidas serem tomadas acompanham a complexidade das mudanças. Uma das chaves para um melhor trato do meio ambiente, o licenciamento ainda esbarra em diversas situações que acabam por limitar sua ação mais efetiva. Interesses de terceiros, fiscalização pouco efetiva ou distante, pluralidade de causas e eventos a serem mensurados. Por mais utópica que pareça, a construção de um sentimento de consciência ambiental parece ser a mais efetiva e eficaz forma para que as questões ligadas à preservação e à propriedade, seja ela pública ou privada, recebam atenção a ponto de se consolidarem como instrumentos reais para tal.



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