BioAtivo - 13ª Edição

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BioAtivo


editori al

2 editorial Caros leitores, A BioAtivo de agosto fala sobre a participação da Bio Jr. e sua chegada à segunda fase da Olimpíada USP do Conhecimento. No Institucional deste mês, vocês poderão conferir a iniciativa dessa empresa júnior, que desenvolve um projeto ligado à mitigação da emissão de gases do efeito estufa pelos ônibus da Cidade Universitária. Esta edição também traz as seções “Pesquisa & Inovação”, “Especial” e “Mercado”. A primeira trata sobre um Dispositivo de Assistência Ventricular desenvolvido na China e implantado em um carneiro, que vive desde março com esse coração artificial. Na segunda, vocês encontrarão uma aprofundada reportagem sobre células-tronco, com enfoque em uma pesquisa que as obteve por meio de clonagem terapêutica. Já em “Mercado”, vocês saberão mais sobre o programa de residência farmacêutica no Hospital Universitário da USP. A próxima edição, a de outubro, será especial, visto que nesse mês completaremos três anos de BioAtivo. Não percam! Boa leitura! Bruna Rodrigues Diretora de Jornalismo Científico Jornalismo Júnior

bioativo Institucional Bio Jr. passa para a segunda fase da Olimpíada USP do Conhecimento

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Notícias Redução na emissão de gases do efeito estufa no Brasil é de 38,4%

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15 espécies inéditas de aves são descobertas na Amazônia

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2012 foi um dos anos mais quentes em mais de um século

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Pesquisa revela substância que simula efeito de exercícios físicos no organismo

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Bulas de remédios como Tylenol®, nos EUA, deverão informar risco de doença de pele 6 Pesquisas mostram que erva medicinal pode causar câncer

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pESQUISA E INOVAÇÃO Dispositivo chinês é bem sucedido e carneiro 7 vive com coração artificial desde março EsPECIAL O avanço que chegou atrasado

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mercado Referência brasileira, HU busca residentes farmacêuticos

BIO JÚNIOR - Diretoria: Davi Martinelli, Edmar Oliveira, Gabriela Christine Santos, Larissa Assis, Mathias Jorquera. Suplente: Bruna Bombarda. Presidente e Responsável pela BioAtivo: Priscilla Shiota Fedichina. Contato: biojr.usp@ gmail.com. FARMA JÚNIOR - Diretoria: Jéssica Rocha, Jessyca Kuba, Juliana Medeiros, MarcosEspecial Moretto, Paulo Souza, Thais Mikami, Vivian Borali. Responsável pela BioAtivo: Marcos Moretto. Presidente: Vivian Borali. Endereço: Av. Prof. Lineu Prestes, 580 - Centro de Vivência, sala 14, Cidade Universitária. Contato: (11) 6901-5926 //farmajr@usp.br. JORNALISMO JÚNIOR - Edição: Bruna Rodrigues e Gabriela Fachin. Equipe: Ana Carolina Leonardi, Bárbara D’Osualdo, Bruna Larotonda, Maria Beatriz Melero, Murilo Carnelosso e Otávio Fernandes Nadaleto. Diagramação e Projeto Gráfico: equipe de Comunicação Visual da Jornalismo Júnior. Contato: (11) 3091-4085, jjr@usp.br, @jornalismojr. Foto da capa: Wikimedia Commons.

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Bio Jr. passa para a segunda fase da Olimpíada USP do Conhecimento Por Gabriela Fachin Sete membros da Bio Jr., juntamente com três alunos da pós-graduação do IB - USP e Cláudia Maria Furlan, professora responsável, compõem uma das equipes que está na segunda fase da Olimpíada USP do Conhecimento. A competição, que propõe a busca por soluções de problemas técnicocientíficos, tem como objetivo promover o aprendizado prático e a cooperação entre os integrantes das equipes. A disputa acontece em duas fases. Na primeira há a seleção dos projetos, que é feita através de análise comparativa das propostas. Já na segunda, as ideias serão desenvolvidas e os resultados, apresentados. O projeto elaborado pela equipe da Bio Jr. para a primeira fase consiste na mitigação dos gases do efeito estufa

emitidos pelos ônibus circulares, tanto os internos quanto os da SPTrans, na Cidade Universitária Armando Salles de Oliveira. Além disso, pretende-se identificar a flora utilizada no processo de mitigação, para realização de transposição didática. Na segunda fase, cada grupo recebe R$ 5 mil durante quatro meses, para o desenvolvimento das atividades previstas nos projetos. As etapas realizadas pela Bio Jr. nesse segundo momento da Olimpíada USP do Conhecimento são: a coleta dos dados de emissão de carbono pelos ônibus circulares, a quantificação dos valores obtidos em carbono e a conversão desse valor em número de árvores necessárias no processo de mitigação. Para a conversão, será utilizada uma calculadora desenvolvida pela própria


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bioativo Foto: Francisco Emolo - Jornal da USP

empresa júnior, mais especificamente pelo Grupo de Estudos de Mitigação de Gases do Efeito Estufa – Bio Jr. USP (GEMGEE). O dispositivo é semelhante às calculadoras encontradas na internet, mas foi adaptado à realidade brasileira. Concluídas as primeiras etapas, o próximo passo é a identificação da flora com placas informativas, que incluirão desde dados morfo e fenológicos até fotos ilustrativas. A equipe conta quais são as expectativas para esse segundo momento da competição: “Esperamos exercer uma ação ambiental e educacional, difundindo a ideia de ações sustentáveis, como o uso do transporte público”.

Ao final do período de quatro meses, os grupos participantes da Olimpíada deverão expor os resultados obtidos com seus projetos. Em cada área do conhecimento, a comissão julgadora indicará três equipes vencedoras, havendo um primeiro lugar e dois segundos lugares. Sobre a escolha de participar da competição enquanto empresa, a equipe da Bio Jr. conta que “foi uma boa oportunidade para realizarmos um estudo novo de mitigação, aprimorando as etapas do processo e agregando conhecimento ao grupo GEMGEE. Acreditamos que um trabalho em equipe, novo e tão ambicioso, seria motivador para os membros da empresa”.


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Por Bruna Rodrigues e Gabriela Fachin

Redução na emissão de gases do efeito estufa no Brasil é de 38,4%

15 espécies inéditas de aves são descobertas na Amazônia

De acordo com estimativa divulgada pelo governo federal, a emissão de gases que causam o efeito estufa diminui 38,4% no Brasil, entre 2005 e 2010. Contudo, os dados indicam que esta porcentagem se refere às áreas florestais. As emissões originadas pela queima de combustíveis fósseis, bem como pela indústria petrolífera e de gás natural, cresceram 21,4%, número que representa o dobro da estimativa anterior. No setor agropecuário, o aumento foi de 5,2%, enquanto na siderurgia e na mineração foi de 5,3%.

Quatro grupos de ornitólogos, tanto brasileiros quanto estrangeiros, descobriram 15 novas espécies de aves na Amazônia brasileira. Elas foram descritas numa edição especial do Handbook of the Birds of the World, tipo de enciclopédia que reúne todas as aves conhecidas no mundo. Desde 1871, não aconteceu de tantas espécies de aves do Brasil serem descritas na mesma obra, de uma só vez. A maioria delas foi encontrada na região entre o sul do Pará, o norte de Mato Grosso e o sudeste do Amazonas.

Fonte: http://www.folha.uol.com.br

Fonte: http://www.estadao.com.br/

Foto: Wikimedia Commons

2012 foi um dos anos mais quentes em mais de um século Segundo o relatório “Estado do clima”, divulgado pela NOAA (sigla em inglês para Administração Nacional Oceânica e Atmosférica, dos Estados Unidos), 2012 foi um dos dez anos mais quentes já registrados. O monitoramento que permite fazer essa comparação iniciou-se há mais de um século. Além das altas temperaturas, o ano passado apresentou recorde na subida do nível dos mares e no derretimento do gelo no Ártico. O documento foi escrito com a colaboração de 384 cientistas, espalhados em 52 países. Fonte: http://g1.globo.com/


6 notícias Pesquisa revela substância que simula efeito de exercícios físicos no organismo Um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Scripps, na Flórida, revela a descoberta de uma substância que aumentou a ativação da proteína REV-ERB em ratos obesos. Ela é responsável por controlar, em partes, o relógio biológico dos animais. Os roedores que tiveram essa substância injetada tiveram uma perda considerável de peso, mesmo com uma dieta gordurosa. Além de utilizarem mais oxigênio ao longo do dia, gastaram 5% mais energia que ratos que não receberam a substância, mesmo não se exercitando mais. Fonte: http://portal.crfsp.org.br/

O Projeto de Lei 5359/09, que tem por Nos Estados Unidos, todos os analgésicos que contenham o princípio ativo paracetamol deverão colocar em suas bulas que podem causar sérias doenças de pele, como a síndrome de Stevens-Johnson, que pode levar a mudanças na pigmentação da pele, cegueira e danos a órgãos internos. A agência reguladora de medicamentos nos EUA diz não querer assustar os consumidores, visto que a incidência dessa síndrome é muito rara, apenas quer que as pessoas reconheçam e reajam aos sintomas iniciais o quanto antes. Fonte: http://portal.crfsp.org.br/

Pesquisas mostram que erva medicinal pode causar câncer Estudos realizados pela Universidade de Johns Hopkins e pelo Memorial Sloan-Kettering, de tratamento de câncer, nos Estados Unidos, revelam que erva medicinal da família Aristolochia, utilizada em fitoterápicos contra a artrite, gota e inflamação, causa mutações nas células de seus consumidores, levando ao desenvolvimento de tumores. Os cientistas provaram que o ácido aristolóquico, composto dessa planta utilizado na fabricação dos remédios, é mais cancerígeno que o tabaco e a radiação ultravioleta. Fonte: http://www.cff.org.br/ Foto: Wikimedia Commons

Bulas de remédios como Tylenol®, nos EUA, deverão informar risco de graves doenças de pele

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pesquisa e inovação 7

Dispositivo de Assistência Ventricular chinês é bem sucedido e carneiro vive com coração artificial desde março O novo modelo desenvolvido em Tianjin equipara a tecnologia chinesa às mais avançadas do mundo Por Ana Carolina Leonardi e Maria Beatriz Melero

Foto: http://www.ritosocultos.com.br

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, cerca de 300 mil pessoas morrem por ano no Brasil de doenças cardiovasculares, fazendo com que o país seja o nono colocado dentre aqueles que apresentam cardiopatias como a principal causa de morte da população. Nos Estados Unidos, a falência cardíaca já é considerada

epidêmica pelo National Institute of Health, órgão equivalente ao Ministério da Saúde brasileiro. Em 14 de maio deste ano, no entanto, pesquisadores chineses anunciaram um experimento de sucesso que pode alterar esse quadro: um novo modelo de coração artificial apresentado pelo Hospital Internacional de Tianjin, implantado com enorme êxito em um carneiro, que permanecia estável e com saúde já há dois meses.

Cientistas chineses realizam testes com o dispositivo no carneiro


8 pesquisa e inovação O novo dispositivo O implante realizado no animal consiste, na realidade, em um aparelho chamado de VAD (sigla em inglês para Dispositivo de Assistência Ventricular). Ele faz parte de uma terceira geração da produção desse tipo na China e compõe um projeto que está sendo desenvolvido desde 2009 pela equipe chefiada por Liu Xiaocheng, presidente do hospital de Tianjin. O carneiro recebeu o apelido de Tianjiu, que traduzido literalmente significa “para sempre” ou “eterno”, sendo o décimo oitavo submetido ao implante. O máximo de tempo de sobrevivência dos outros animais foi de 38 dias, deixando claro o que representa para os pesquisadores tamanha conquista. Os dispositivos de assistência ventricular são bombas cuja via de entrada é ligada a um dos ventrículos do coração, recebendo o sangue do ventrículo que está em falência, que é bombeado para um dos grandes vasos de saída do órgão. São conectados a uma bateria e a um sistema de controle que o paciente carrega externos ao corpo. Segundo o cardiologista Alfredo Ignácio Fiorelli, no artigo “Assistência circulatória mecânica: porque e quando”, esse tipo de equipamento é capaz de manter as condições hemodinâmicas dos pacientes por períodos prolongados, podendo substituir total ou parcialmente as atividades de bombeamento do coração. VADs são tradicionalmente utilizados em pacientes que estão a espera de

bioativo um novo coração, sendo o transplante, atualmente, a única forma de garantir ao enfermo o desempenho pleno da função cardíaca. Sabe-se, contudo, que o transplante cardíaco é um procedimento incapaz de atender o número de pacientes que dele necessitam, principalmente pela falta de doadores disponíveis. Assim, pesquisas como a chinesa buscam uma solução definitiva e independente do transplante para a insuficiência cardíaca. O novo VAD desenvolvido pela equipe de Tianjin apresenta um tamanho menor, com melhor estabilidade e eficiência, menor risco de infecções e tromboses, além de não limitar o usuário em suas atividades diárias. O modelo permanece em testes e é baseado na tecnologia de suspensão magnética desenvolvida pela ciência aeroespacial. “Nunca uma experiência teve tanto sucesso aqui na China. É um grande avanço”, celebrou Liu, em entrevista ao portal What’s On Tianjin. Ele ainda adicionou: “Baseado nesse êxito, nós realizaremos testes em animais para então realizá-los em seres humanos, assim que as autoridades de saúde aprovarem. Através do uso das VADs provavelmente encontraremos um tratamento permanente para a falência cardíaca”. Segundo a Idágene Cestari, diretora do Centro de Tecnologia Biomédica do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), “este tipo de VAD se assemelha a alguns dispositivos já em uso clínico, considerados de última


bioativo geração. A experiência descrita, porém, necessita ser ampliada para demonstrar a segurança e aplicação do dispositivo como suporte de longa duração”.

Previsões otimistas de preço e uso

Foto: http://blogs.reuters.com

Ela acrescentou que o impacto desse estudo, se concluído satisfatoriamente, deverá ser notado principalmente na própria China. “Há a possibilidade de beneficiar pacientes à espera de um transplante, e que até então não dispunham de um dispositivo desenvolvido localmente”. Em termos de impacto internacional, os custos tradicionalmente mais baixos praticados pela indústria chinesa podem levar à distribuição do novo aparelho fora da China. “Não se pode excluir a possibilidade desses dispositivos,

Equipe apresenta êxito no experimento

pesquisa e inovação 9 normalmente de alto custo, serem oferecidos a custos competitivos para outros países.” Para Cestari, portanto, o desenvolvimento de VADs ao redor do mundo é um passo importante para o tratamento da insuficiência cardíaca. “Existem dispositivos aprovados para uso como terapia de destino na Europa e Estados Unidos. Isso, no entanto, não representa a cura para a falência cardíaca, mas sim uma alternativa ao transplante”.

Pesquisas brasileiras A pesquisadora também forneceu um panorama das pesquisas brasileiras no setor. Atualmente dois tipos de aparelhos para adultos se encontram em fase de testes clínicos. Um deles é o paracorpóreo, desenvolvido pelo InCor; o outro é o Coração Total, desenvolvido pelo Instituto Dante Pazzanese. Ela ainda ressalta que há pesquisas sendo realizadas pelo grupo do professor Adib Jatene, da Faculdade de Medicina da USP, e do professor José Roberto Cardoso, da Escola Politécnica da USP, buscando desenvolver VADs implantáveis, numa parceria entre InCor, Instituto Dante Pazzanese e Escola Politécnica da USP. Questionada sobre a possibilidade de tornar esse tipo de aparelho acessível ao grande público no Brasil, Cestari afirma que “é necessário que haja ressarcimento via Sistema Único de Saúde, o que está em análise”.


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O avanço que chegou atrasado Por Barbara D’Osualdo e Murilo Carnelosso Um dos estudos em maior evidência nos últimos anos é o das células-tronco. As pesquisas ainda enfrentam dificuldades em questões técnicas e algumas polêmicas, mas o uso dessas células é apontado como uma das novas tecnologias com grandes expectativas para a área da saúde. Um novo avanço nas pesquisas ocorreu em maio deste ano. Um grupo de cientistas obteve células-tronco embrionárias pluripotentes por clonagem terapêutica. O fato foi publicado em artigo por Shoukhrat Mitalipov, um especialista em biologia reprodutiva na Oregon Health and Science University em Beaverton, e seu grupo de pesquisa. A técnica é muito semelhante à de clonagem reprodutiva, mas a tentativa, por vários grupos, de obter tais células por esse procedimento havia se mostrado frustrada até então.

A clonagem terapêutica Trata-se de um procedimento chamado de transferência nuclear somática. São necessários dois tipos de célula: um oócito e uma célula qualquer de um doador. O núcleo do oócito é removido, sendo substituído pelo núcleo da célula do doador. Uma vez que esse núcleo

é inserido no oócito, este se comporta como um zigoto. Este é, então, cultivado em laboratório, em condições especiais, desenvolvendo-se e dividindo-se, gerando novas células, recapitulando o que ocorre nos primeiros estágios do desenvolvimento embrionário até se tornar um blastocisto, a primeira estrutura embrionária conhecida. Deste, são removidas as células-tronco embrionárias, que são pluripotentes, ou seja, capazes de se tornar qualquer tipo de célula humana, e apresentam o mesmo genoma da célula doadora. No entanto, apesar de ter alcançado um resultado por muito tempo buscado pelos cientistas da área, a pesquisa não obteve um grande impacto.

Breve histórico das pesquisas com células-tronco As pesquisas com células-tronco existem há algumas décadas, sendo que eram principalmente voltadas ao entendimento do desenvolvimento embrionário em mamíferos. Apenas em 1998 foram estabelecidas as primeiras linhagens de células-tronco embrionárias humanas. Nessa data, o grande impacto se deu pela capacidade de tais células fornecerem um modelo importante para o estudo do desenvolvimento humano. A partir de então, houve uma explosão


bioativo de trabalhos pensando em como explorar essa nova linhagem para o estudo de terapias celulares. No entanto, pelas dificuldades técnicas – como incompatibilidade genética e geração de tumores – e éticas – pela necessidade de destruição de embriões –, nos primeiros cinco anos a partir dos anos 2000, os estudos realizados pensando em terapias celulares focaram-se no uso de células-tronco adultas, obtidas de diferentes tecidos. Os estudos com células embrionárias persistiram, mas não tanto para fins terapêuticos, apesar de os pesquisadores continuarem tentando vencer as barreiras para seu uso. Uma das grandes apostas, nesse cenário, era a da obtenção de células-tronco por clonagem terapêutica, que resolveria a questão da incompatibilidade genética ao criar células que poderiam se transformar em qualquer outra célula humana geneticamente idêntica ao doador. Contudo, com o passar dos anos e das novas perspectivas, a maioria dos grupos abandonou as pesquisas nesse sentido.

especial 11 boa, só que chegou tarde demais”, afirma a pesquisadora Lygia da Veiga Pereira, Chefe do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (LaNCE) da USP. “Em termos científicos, ela é muito importante, porque mostra que esse processo, embora seja mais complexo nos seres humanos, também é possível de se obter”, afirma o pesquisador Oswaldo Keith Okamoto, Professor Associado do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do IB-USP. A importância dessa pesquisa se dá pelo melhoramento das técnicas envolvidas. “Eles aprimoraram cada um dos passos envolvidos. Esses aprimoramentos podem, talvez, melhorar outras coisas que a gente faz. Mesmo em fertilização in vitro, quem sabe você consiga aumentar a eficiência de desenvolvimento do embrião produzido in vitro, para reprodução”, afirma Lygia Pereira.

Desempenho da clonagem terapêutica na aplicação prática

Por que o impacto da recente Por um lado, a clonagem terapêutica dá conquista foi pequeno? Qual é sua conta do problema da incompatibilidade genética – apesar de já haver outros prorelevância atualmente? Apesar de a clonagem terapêutica ter parecido promissora, com o passar dos anos, outras procedimentos foram desenvolvidos e deram conta das questões técnicas e éticas. “A eficiência que eles conseguiram [para a técnica] é muito

cedimentos atualmente que resolveram a questão. Ainda, os pesquisadores do grupo de Oregon, responsáveis pela pesquisa, apontam que a qualidade de suas células e a semelhança com o doador seria superior às outras técnicas, mas ainda não há comprovação.


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bioativo Por outro lado, o procedimento ainda apresenta problemas. O primeiro deles seria por não ter resolvido a questão ética. Afinal, a técnica envolve a destruição de embriões com potencial de vida. Por esse motivo, por exemplo, no Brasil ela não poderia ser realizada. Além disso, há uma enorme dificuldade em encontrar doadoras de óvulo. Por fim, há o medo na comunidade científica da possibilidade de clonagem humana. “Uma vez que você obtém esse embrião, se ele fosse inoculado no útero de alguém, embora as chances sejam muito pequenas, poderia ocorrer uma gestação e poderia gerar um indivíduo, que seria um clone daquele que doou”, afirma Okamoto. Os pesquisadores de Oregon negam a possibilidade. “Se for computar todas as ineficiências, as chances são muito pequenas. Mas existe esse risco”, reafirma o professor.

As células IPS chegaram na frente O que de fato ofuscou a conquista do

grupo da Universidade de Oregon foi que sete anos antes da publicação da pesquisa de produção de células-tronco embrionárias através da clonagem terapêutica, o pesquisador japonês Shinya Yamanaka descobriu uma técnica inovadora. A partir da adição de quatro genes específicos através de vetores virais em células adultas especializadas, elas podem ser reprogramadas e retornar ao estágio de células pluripotentes. Estas células ficaram conhecidas como IPS, sigla em inglês para Células-tronco Pluripotentes Induzidas, cujas características são idênticas às de células-tronco embrionárias, como a autorrenovação e o enorme potencial de diferenciação. O sucesso desta técnica foi tanto que, após ser realizada com sucesso pela equipe do professor Yamanaka em 2006 com camundongos e em 2007 com células humanas, rapidamente começou a ser utilizada por diversos laboratórios em todo o mundo e proporcionou ao pesquisador o Prêmio Nobel de Medicina de 2012. “A metodologia dele é tão simples que laboratórios do mundo inteiro conseguiram reproduzir isso, o que virou um instrumento de pesquisa muito poderoso”, afirma Lygia da Veiga Pereira. “Isso [a pesquisa sobre as IPS] revolucionou a área de pesquisa, porque agora não é preciso de óvulo, de transferência nuclear, não é preciso de uma porção de coisas para transformar uma célula adulta em célula embrionária”, continua Lygia. Além da facilidade de realização da


bioativo necessárias leis bem definidas que reflitam essas opiniões. No caso do Brasil, a Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05), aprovada em 2005, possibilita o trabalho com embriões obtidos por fertilização in vitro e que sejam considerados inviáveis ou que estejam congelados por mais de três anos e haja autorização expressa dos pais Legislação e religião: vozes que para usos com fins atrapalham ou caminham junto de pesquisa e terapêuticos. Mas com as pesquisas? falhas na lei são apontadas por Lygia: É impossível dissociar as pesquisas com “ela foi mal redigida células-tronco dos debates públicos que e acabou tendo uma elas suscitam. Como saber se embriões limitação, porque você já configuram uma vida ou apenas um só pode usar embriões conjunto de células? A pressão exercida que foram congelados pelas forças religiosas contra a utilização até março de 2005 e de embriões existe e se constitui como os embriões produuma voz forte e atuante no ambiente de zidos após isso ficapesquisas científicas. “Eu acho que as ram em um ‘limbo’ religiões têm que ser ouvidas, elas reflelegal.” Outro ponto tem o que a sociedade quer, mas um grudesta lei é a proibipo baseado só nisso não deve ter poder ção de qualquer tipo de veto. A gente no final das contas tem de clonagem humaque aceitar o que a maioria da populana, tanto reprodutiva ção aceita”, opina novamente a pesquicomo terapêutica, o sadora. que impossibilitaria o Exatamente para que a vontade da desenvolvimento da maioria seja atendida e observada, são pesquisa do grupo técnica do professor Yamanaka, os problemas bioéticos que persistiam com a técnica de transferência nuclear são resolvidos com a técnica de obtenção das IPS. “Mesmo que você obtenha um embrião por clonagem terapêutica, você ainda estaria destruindo uma estrutura embrionária, uma potencial vida, para retirar a célula-tronco embrionária”, alerta Oswaldo Okamoto. As IPS, por outro lado, são obtidas através de reprogramação de células adultas, sem o envolvimento de embriões.

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Foto: ThinkStock - Getty Images

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muito embora, até o momento, ainda não exista um protocolo com efeitos terapêuticos significativos. Mas tudo isso O que esperar das células-tronco? faz parte do avanço”, explica Okamoto. No entanto, o trabalho com células-tronco não possui apenas a vertente Atualmente, o único tratamento implantado através de células-tronco e de produzir tratamentos clínicos a partir que pode ser receitado por médicos delas. Na área de pesquisa, muitos proé o seu transplante a partir da medula gressos são esperados, segundo Lygia. óssea para tratar doenças de sangue, “Do ponto de vista de pesquisa básica como a leucemia. Porém, este tipo de elas têm um papel muito importante célula-tronco, por ser adulta, é apenas para entendermos, primeiro, o desenmultipotente, ou seja, tem capacidade volvimento embrionário humano. Quande gerar um número limitado de células do eu pego uma célula embrionária e faço ela virar neurônio eu entendo como especializadas. Mas as promessas são muitas e trazem uma célula no embrião de repente vira esperanças para o tratamento de outras um neurônio”. A professora ainda apondoenças no futuro. “Existe um grande ta que é possível utilizar uma célula soavanço de estudos em cardiologia, mui- mática de uma pessoa doente e regredito embora não exista nenhum tratamen- -la ao estágio de célula embrionária para to aprovado. Há muitos estudos sendo desenvolvê-la em qualquer tipo de célufeitos em doenças autoimunes, como lu- la desejada. Assim é possível analisar o pus, diabetes tipo 1, esclerose múltipla. que está errado e entender melhor os Existem protocolos clínicos feitos tam- mecanismos da doença. Com isso será bém para algumas doenças neurodege- possível desenvolver novas terapias que nerativas, e dentre elas a principal ex- utilizem as células-tronco apenas como periência está na doença de Parkinson, um modelo experimental. da Universidade de Oregon caso eles estivessem em território brasileiro.


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Referência brasileira, HU busca residentes farmacêuticos Por Bruna Larotonda e Otávio Fernandes Nadaleto

Através de um processo de seleção, os candidatos concorrem a quatro vagas oferecidas pelo Programa, que é desenvolO Programa de Residência Profissional vido tanto no Hospital Universitário e na da Saúde em Farmácia Clínica e Atenção Farmácia Universitária da USP, como em Farmacêutica, oferecido aos alunos de AMAs e UBSs da Região Oeste de São Paupós-graduação da Faculdade de Ciências lo e no Centro de Vigilância Sanitária do Farmacêuticas (FCF - USP) teve início em Estado de São Paulo. 2012 e encontra-se no seu segundo ano Segundo consta no edital do Programa, ele tem duração de dois anos e constitui de aplicação. Foto: Marcos Santos - USP Imagens

Hospital Universitário da USP, um dos centros de desenvolvimento do projeto


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Foto: Aché Laboratórios Farmacêuticos S.A.

uma modalidade de ensino sob a forma de curso de especialização caracterizado por ensino em serviço. Dessa forma, o residente, após aprovação no primeiro ano e de acordo com seu desempenho, poderá escolher uma das quatro áreas para atuar no ano seguinte: Prática em Farmácia Clínica Pediátrica; Prática em Atenção Farmacêutica; Prática em Farmácia Clínica Adulto; Utilização de Antimicrobianos, Controle de Infecção Hospitalar, Comissão de Controle de Infecção e no Setor de Microbiologia Clínica do Laboratório de Análises Clínicas do HU-USP.

Mais detalhes De acordo com a professora Eliane Ribeiro, coordenadora atual do programa de residência no HU-USP, um dos objetivos gerais do projeto é promover uma integração maior entre ensino, serviço e comunidade, “visando consolidar a educação e atitudes críticas e reflexivas do farmacêutico, na área de Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica, como um dos profissionais da saúde inseridos na política do Sistema Único de Saúde (SUS)”. Outro objetivo é “contribuir para a me-


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Foto: Wikimedia Commons

lhoria da qualidade da atenção à saúde das famílias e grupos sociais, ao captar e interpretar suas necessidades de saúde, e aperfeiçoar as formas de intervenção e de gerenciamento dos serviços”, bem como colaborar para a integração entre os diferentes níveis de atenção à saúde, para a humanização das relações entre trabalhadores e usuários dos serviços e para o diálogo entre a população e os serviços de saúde. Ela também falou sobre a existência de projetos semelhantes ao Programa de Residência Farmacêutica. Na Universidade Federal do Rio de Janeiro, por exemplo, desde 2010 o programa já está em vigor. Em relação à própria USP, existe o Programa de Aprimoramento Profissional da Secretaria da Saúde, na Área de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, que é oferecido pela Faculdade de Odontologia.

mercado 17 “O programa é uma das formas do profissional se aprimorar na área. Um complemento da formação acadêmica para os profissionais interessados em Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica. O HU-USP é uma das referências brasileiras na área de Farmácia Clínica, atividade em desenvolvimento na USP há cerca de 20 anos”, esclareceu Eliane. Assim, acredita-se que o Programa motiva o aluno a participar, justamente por oferecer a ele tais vantagens profissionais.

Boa avaliação, bons resultados Sobre a repercussão acadêmica da iniciativa, ela afirma que através do Programa “o farmacêutico residente permaneceria mais tempo conosco [docentes], possibilitando-o participar de todas as atividades desenvolvidas no Serviço de Farmácia do HU e, também, em algumas unidades com as quais este Serviço faz interface (UBS/AMA e Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo)”. Perguntada sobre os resultados do Programa obtidos até agora, a professora afirmou que os atuais residentes o avaliaram positivamente. A maioria deles encontra-se bastante integrada aos serviços do Hospital Universitário, à exceção daqueles que estão realizando os módulos externos ao HU e à USP. Porém, já se planejam melhorias para o futuro: algumas mudanças, principalmente na carga horária, foram realizadas, com base nas críticas e sugestões apontadas pelos próprios residentes.



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