Revista APEP - Edição 49 - Janeiro a Junho 2021

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Academia Paranaense de Letras colaborassem, como por exemplo o Valfrido Piloto e o Valério Hoerner Júnior, as críticas continuavam fortes. O René segurava as pontas e cumpria a promessa de independência ao Wilson Bueno. Lá pelos tantas as pressões se agigantaram. O Wilson estava preocupado e se reuniu a sós com o Dotti. Depois de muitas horas chegaram à conclusão de que o Nicolau precisava de um Conselho Editorial para dividir e pulverizar um pouco a inveja, as críticas e a autofagia. Também havia uma ciumeira na redação, com o sucesso do Nicolau recaindo apenas na pessoa do Bueno, quando, afinal, o jornal era um projeto coletivo (mais detalhes em Manfredini). Alguns da equipe, aproveitando a criação do Conselho Editorial, se revoltaram e cairam fora, não sem antes publicarem um manifesto nos jornais locais acusando o Dotti de “censura” por interpostas pessoas. No número seguinte nova e aguerrida equipe era comandada pelo Wilson Bueno. O Conselho Editorial era presidido pelo Hélio Puglielli, respeitadíssimo jornalista e escritor, e formado por Alice Ruiz, Walmor Marcelino e Milton Ivan Heller. Perseguidos após o golpe de 64, Walmor e Milton foram, depois, anistiados e retomaram seus cargos públicos até o tempo de aposentadoria. Para sobreviver durante a ditadura Marcelino colaborava com a imprensa alternativa e Milton se dedicou ao jornalismo esportivo, sucedendo e antecedendo, respectivamente, Carlos Maranhão e Zé Beto na sucursal da Editora Abril como correspondente da Revista Placar. O Conselho Editorial nunca censurou nada e nem ninguém e Hélio Puglielli, quase 30 anos depois, em entrevista para o livro do Manfredini passou um atestado de bons antecedentes ao Bueno na acusação sobre o tema “panelinhas”. O Jaques Brand já tinha deixado o Nicolau, depois de um desentendimento com o Bueno. Mas, sempre que solicitado, continuava colaborando. Outro que deixou de falar com o Wilson e frequentar o Nicolau foi o Aramis Millarch, depois que o jornal publicou uma colaboração do Sylvio

Back. (Millarch e Back tinham uma briga muito antiga, dos tempos em que trabalharam na Última Hora de Curitiba). Depois Aramis e Wilson retomaram a amizade. Quando o Nicolau publicava nova colaboração do Back a história se repetia. Eram alguns percalços aqui e ali que se resolviam sem maiores tragédias, mas com muitos incômodos ao Secretário René Dotti. Alguns, para publicar no Nicolau, usavam os mais diversos artifícios. Um luminar das letras jurídicas (não estou sendo irônico), que depois alcançaria os píncaros da glória (mais uma vez aviso que não estou sendo irônico), levou pessoalmente um cartapácio de poesias da sua lavra. Acompanhava o volume uma cartinha endereçada ao René Dotti pedindo que os poemas fossem submetidos a apreciação da redação do Nicolau para eventual publicação. Conversa mole. Era queria sim era publicar os poemas sem passar pelo Conselho Editorial e pelo Wilson Bueno. Dotti nem se deu ao trabalho de ler um poema, afinal sua palavra de só conhecer o conteúdo do Nicolau depois de publicado valeu durante os 4 anos da sua gestão, e mandou entregar o grosso volume na redação. Como os poemas não foram publicados, o citado voltou à Secretaria e me perguntou se o envelope havia chegado nas mãos do professor Dotti. Eu disse que sim e que o Secretário tinha mandado o material para a redação do Nicolau. Ele então pediu que eu desse uma sondada com o Wilson Bueno. Cai na besteira de prometer que falaria com o Wilson. Quando ele foi embora percebi a burrada que tinha feito. Se o Secretário não tinha qualquer ingerência sobre o conteúdo dos números do Nicolau, como eu poderia indagar ao Bueno sobre a não publicação de alguns poemas? Como promessa é dívida resolvi, dias depois, abordar o Bueno com muito tato. Percebendo a situação e o meu constrangimento o Wilson riu e disparou: “Paulo, li os poemas, eles não são ruins, alguns até são bons. Mas eu recebo dezenas de poemas ótimos e dois ou três excelentes todos os meses e tenho, por falta de espaço, que descartar os ótimos. Como posso publicar um poema bom e deixar de fora um excelente!”. Para minha sorte o luminar em questão não

voltou mais ao assunto. De vez em quando cruzo com ele e acho que nem se lembra mais da conversa. Cada vez com mais prestígio nacional e internacional o Nicolau enfrentava com galhardia a inveja e as críticas. A redação era um ninho de falcões da cultura nacional. O Paulo Leminski aparecia lá com frequência, sempre que ia a caminho do Bar Stuart. Afinal da Ébano Pereira até o citado bar era uma linha quase reta. O Sóssella quando estava em Curitiba sempre dava um jeito de passar por lá. O Sábato Magaldi e sua esposa Edla van Steen quando vinham frequentemente a Curitiba (a Edla nasceu aqui e tinha parentes) não deixavam de visitar o Nicolau. Ary Fontoura certa vez veio apresentar uma peça em Curitiba e disse nas entrevistas que concedeu que o Wilson Bueno era um dos maiores escritores do país e tinha criado o melhor jornal cultural do Brasil. A Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA) concordou com o Ary e concedeu ao Nicolau o prêmio de melhor jornal cultural do Brasil em 1987. No ano de 1989, a mesma APCA concedeu outro prêmio: o de melhor jornal cultural da década de 80. Ainda em 1989 a União Brasileira de Escritores outorgou ao Wilson Bueno o prêmio de Personalidade Cultural Brasileira, graças ao seu trabalho no Nicolau. Em 1994 a IWA – International Writers Association discordou do Ary Fontoura e concedeu ao Nicolau o prêmio de melhor jornal cultural da América. Cada um desses prêmios aumentava ainda mais a inveja e autofagia dos curitibocas inimigos do Nicolau.

B O A L E I T U R A P A R T E II


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