Agricultura Familiar no Acre Censo Agropecuário 2006

Page 1

MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

1

AGRICULTURA FAMILIAR NO ACRE: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DO CENSO AGROPECUÁRIO DE 2006 Raimundo Cláudio Gomes Maciel1 Keyze Pritih da Costa Campos Gomes2

Resumo O processo desenvolvimentista implementado na região amazônica, pós-1964, resultou na ocorrência de vários problemas socioeconômicos e ambientais. Na década de 1970, vários projetos de reforma agrária foram instalados na região como forma de amenizar os problemas sociais. Porém, a agricultura familiar encontrava dificuldades de se reproduzir. Não obstante, a agricultura familiar subsiste ao longo do tempo. O objetivo do presente trabalho é avaliar o atual papel desse tipo produtivo, na região acreana, a partir do Censo Agropecuário de 2006, realizado pelo IBGE, em contraponto à agricultura patronal. Trabalha-se com metodologia que avalia a geração de emprego e renda, além da eficiência técnica e econômica dos produtores. Os resultados demonstraram que a agricultura familiar é mais eficiente que agricultura não familiar na geração de renda e emprego, sendo o principal responsável pela produção de alimentos para a sociedade. Palavras-chave: Agricultura Familiar. Avaliação Econômica. Desenvolvimento Rural. Amazônia.

Abstract The development process implemented in the Amazon region, post-1964 resulted in the occurrence of various socioeconomic and environmental problems. In the 1970s, various land reform projects were installed in the region as a way to alleviate social problems. But family farmers found it difficult to reproduce. However, family farming remains over time. The aim of this study is to assess the current role of this production in the region of Acre, from the Agricultural Census 2006, conducted by IBGE, in contrast to agriculture employers. We work with a methodology that assesses the income and employment generation, besides the technical and economic efficiency of producers. The results showed that family is more efficient than non-family farming in generating income and employment, primarily responsible for food production for society. Key-words: Family Agriculture. Economic Evaluation. Rural Development. Amazon.

Sub-áreas: Q1 Agricultura, Q19 Outras.

1

Economista, Doutor em Economia Aplicada (IE/UNICAMP), Professor do Departamento de Economia da UFAC, Coordenador do Projeto ASPF, e-mail: rcgmaciel@ufac.br; Endereço profissional: Universidade Federal do Acre, Departamento de Economia. Rodovia BR 364, nº 6637 (Km 04) Distrito Industrial. CEP: 69915-900, Rio Branco – AC. Telefone: (68) 3901 2665. 2

Graduanda em Economia pela UFAC, Pesquisadora do projeto ASPF – Departamento de Economia (UFAC), email: keyzepritih@hotmail.com; Endereço profissional: Universidade Federal do Acre, Departamento de Economia. Rodovia BR 364, nº 6637 (Km 04) Distrito Industrial. CEP: 69915-900, Rio Branco – AC. Telefone: (68) 3901 2665 SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

2

1. INTRODUÇÃO O recente Censo Agropecuário de 20063, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), lançado em setembro de 2009, apresenta pela primeira vez um especial retrato da agricultura familiar em todo o Brasil, respondendo a vários estudos que apontavam para a importância socioeconômica desse tipo de produção para o desenvolvimento do país. Destarte, o Censo Agropecuário de 2006 ampliou as intensas discussões em torno da agricultura brasileira e os caminhos da agricultura familiar, tendo em vista as políticas de desenvolvimento rural em todo o país, em particular na Amazônia, principalmente quando se verifica que muitas transformações ocorreram num período de uma década, tempo de intervalo entre os Censos Agropecuários. Cabe ressaltar as dificuldades de comparação do retrato da agricultura familiar apresentado no último Censo Agropecuário – cuja definição obedeceu a um critério legal (Lei nº 11.326) – com o retrato feito pela metodologia amplamente difundida por pesquisadores do convênio FAO/INCRA4, utilizada para diagnosticar a agricultura familiar no Censo Agropecuário de 1995/1996. Portanto, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o IBGE contrataram pesquisadores da Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) para refazer o estudo e traçar a evolução de 1996 a 2006. Assim, o presente texto tratará especificamente da situação recente da agricultura familiar acreana, conforme o Censo Agropecuário de 2006, buscando quantificar a participação desse segmento no setor agropecuário, notadamente comparando com a agricultura não familiar ou patronal, e seu papel para o desenvolvimento rural da região.

2. AGRICULTURA FAMILIAR E O DESENVOLVIMENTO RURAL Atualmente, a questão agrária no Brasil suscita muitas discussões que permeiam vários assuntos, desde o processo de modernização da agricultura brasileira até a questão do desenvolvimento rural sustentável. Pode-se dizer que o processo de modernização da agricultura brasileira gerou vários resultados negativos, como, por exemplo, a exclusão social e a degradação ambiental no meio rural brasileiro. (Santos, 2001) Nesse processo houve uma valorização do grande capital em prejuízo da produção familiar rural. Além disso, a modernização caracterizou-se pela introdução de novas técnicas produtivas, que culminou na substituição de parte da mão-de-obra humana por máquinas e tecnologias mais produtivas. Desta forma, os trabalhadores assalariados antes ocupados na atividade agrícola viram-se forçados a buscarem novas alternativas para manter o sustento de suas famílias. Muitos deles migraram para os centros urbanos, o que acarretou um inchaço populacional, pois na maioria das cidades não havia a infraestrutura necessária para receber essa população. Contudo, alguns trabalhadores optaram por continuar no campo trabalhando de forma temporária. Com relação a essa questão, Graziano Neto (1982, p. 91) sintetiza: 3 4

Cf. IBGE (2009) INCRA/FAO (2000)

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

3

No Brasil, a modernização da agricultura baseia-se na introdução de capital na forma de máquinas pesadas, que desocupam trabalhadores no campo. Como o preço do capital, através do crédito rural subsidiado, possibilitando essa modernização. (...) os grandes proprietários são privilegiados, seja porque detêm mais recursos e têm maior acesso ao crédito, seja porque a escala em que devem operar as máquinas é grande, não se ajustando às pequenas propriedades.

No processo de modernização da agricultura brasileira, dito “conservadora”, deu-se pouca importância aos principais componentes da questão agrária brasileira: as relações sociais no campo e a estrutura fundiária. Além disso, “desconsiderava o papel primordial da produção familiar rural no processo de desenvolvimento da sociedade, em particular na Amazônia”. (MACIEL, CAMPOS E SOUZA, 2010, p. 4) De acordo com Lima e Wilkinson (2002), aproximadamente 85% dos estabelecimentos rurais no Brasil são de grupos familiares, revelando que este setor possui bastante relevância no meio rural, pois é o principal responsável pela produção de alimentos no país. Além disso, a pequena produção familiar é responsável por grande parte da produção agrícola, emprego e renda na Amazônia (RÊGO, COSTA FILHO E BRAGA, 2003). No Brasil é comum a utilização de técnicas produtivas inapropriadas na agricultura, justamente aquelas utilizadas e praticadas nos países desenvolvidos, adequadas às regiões temperadas, seguindo a tradição/imposição de se importar os costumes e hábitos dos países ditos desenvolvidos. Segundo Graziano Neto (1982), esta é uma concepção equivocada uma vez que as condições ambientais entre um país e outro é diversa: (...) querer reproduzir um modelo de agricultura utilizado na Europa perto da linha do Equador é demais. E, infelizmente, é o que está se fazendo. O processo de expansão da agricultura na Amazônia é condenável sob todos os aspectos, mas principalmente pelo fato de não dispormos de uma tecnologia adequada para explorar tal região (p. 93).

O governo militar e suas políticas desenvolvimentistas pós-1964 incentivaram fortemente a adoção destas técnicas produtivas “importadas” na agricultura brasileira, o que resultou na necessidade de “novos enfoques, mais respeitosos com o meio ambiente, socialmente desejáveis, politicamente aceitáveis e viáveis sob o ponto de vista econômico” (COSTABEBER e CAPORAL, 2003, p.158). Essa questão está no cerne do conceito de desenvolvimento sustentável, previsto no Relatório Brundtland, cujo efetivo desenvolvimento é “aquele que satisfaz as necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras para satisfazer suas próprias necessidades” (CMMAD, 1988, p. 9). Segundo Assis (2006), a definição mais adequada à abordagem dada ao referido estudo é: O desenvolvimento sustentável tem como eixo central a melhoria da qualidade de vida humana dentro dos limites da capacidade de suporte dos ecossistemas e, na sua consecução, as pessoas, ao mesmo tempo que são beneficiários, são instrumentos do processo, sendo seu envolvimento fundamental para o alcance do sucesso desejado. Isto se verifica especialmente no que se refere à questão ambiental, na medida em que as populações mais pobres, ao mesmo tempo que são as mais atingidas pela degradação ambiental, em razão do desprovimento de recursos e da falta de informação, são também agentes da degradação (p. 81)

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

4

Conforme Batista (2004), as políticas desenvolvimentistas largamente utilizadas no período pós-guerra acarretaram em ao menos dois resultados extremamente prejudiciais às sociedades, especialmente na Amazônia: a propagação mundial dos ideais da sociedade de consumo e a difusão da política de uso ilimitado dos recursos naturais. Infelizmente, os indicadores habituais utilizados para avaliar o desenvolvimento dos países e nações com relação à sua capacidade e possibilidade de crescimento não consideram a possibilidade de esgotamento dos recursos naturais. (MACIEL, CAMPOS E SOUZA, 2010) Contudo, na Amazônia, e em particular no Acre, as consequências sociais, econômicas e ambientais da introdução desenvolvimentistas resultaram na expulsão de famílias de seringueiros pelos “paulistas” – grandes fazendeiros – a partir da década de 70, que acabou originando a necessidade de implantação de uma política de reforma agrária que resolvesse a questão agrária (demanda por terra), de modo que o excedente de mão-de-obra familiar disponível fosse utilizado, pois, assim, as famílias antes expulsas do meio rural poderiam retornar às práticas produtivas. (MACIEL, 2003; BATISTA, 2004; SOUZA, 2008). De acordo com Souza, Souza e Maciel (2008, p. 3), Os efeitos da ocupação desordenada da Amazônia, mais especificamente das terras acreanas, se revelaram devastadores, tendo em vista que extensas áreas de florestas foram derrubadas para dar lugar a campos de pastagens e um expressivo número de seringueiros migrou para áreas periféricas de Rio Branco, dilatando os bolsões de miséria da capital.

Ainda conforme os referidos autores, na segunda metade dos anos 1970, foram instalados os primeiros projetos de colonização no Acre – inicialmente denominados Projetos de Assentamento Dirigidos (PADs) –, pelo INCRA, assentando nas áreas desapropriadas não somente os seringueiros expropriados de suas áreas, mas, também vários outros trabalhadores oriundos de outras regiões do país que foram expulsos de suas posses. Ademais, tais projetos previam, além da resolução dos problemas fundiários, o desenvolvimento da atividade agrícola, nos moldes da agricultura familiar, levando à geração de emprego e renda na região. Todavia, de acordo com Guaziroli et al. (2001), as políticas de reforma agrária criadas pelos governos militares não obtiveram êxito, especialmente no que diz respeito à tentativa de atenuar os conflitos sociais gerados pela condução do processo de modernização conservadora. Não obstante, nos anos 1980, durante o processo de redemocratização do Brasil, surgiram novas perspectivas de reforma agrária, com propostas que incluíam inclusive áreas produtivas. Todavia, tais perspectivas foram encerradas pela Constituição de 1988 que limitava as desapropriações de terra somente às que fossem improdutivas, conduzindo o processo para uma reforma agrária como se fosse uma extensão do período anterior – acomodando as forças opositoras a esse tipo de política. Não obstante, segundo Souza, Souza e Maciel (2008, p. 3 e 4) a instalação de projetos de assentamento agrícolas não resolveu por si só a consternação dos seringueiros expulsos de suas propriedades, tendo em vista que nem todos os Projetos receberam a devida assistência do poder público, tolhendo a implementação de um sistema agrícola comunitário que garantisse a todos os PAD’s oportunidades igualitárias de desenvolvimento.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

5

Atualmente, conforme diagnóstico recente do projeto “Análise Socioeconômica de Sistemas de Produção Familiar Rural no Estado do Acre”, denominado ASPF5, a produção agrícola familiar, em particular nas áreas de assentamento do INCRA, enfrenta imensas dificuldades de consolidação segundo a chamada agricultura moderna, visto que seu desenvolvimento é constrangido pelas condições edafoclimáticas, infraestrutura e pelo mercado. O que se vê é um acelerado processo de reconcentração de propriedades rurais nas referidas áreas. Um aspecto decisivo nessa discussão é justamente desmistificar a necessidade da agricultura familiar em seguir os padrões, ainda prevalecentes na sociedade, da modernização “conservadora” agrícola, seguindo o processo evidenciado pelas empresas agrícolas, tendo como pano de fundo a denominada revolução verde, como se tais empresas servissem de modelo para todo o setor agrícola, especialmente para os produtores familiares rurais. Por outro lado, de acordo com Guanziroli et al. (2001, p. 189): A reforma agrária continua sendo um instrumento legítimo para dar acesso aos trabalhadores a um bem essencial de produção, que é a terra, e com base nesta permitir o acesso a outros meios necessários, desde a infraestrutura básica até os requerimentos mais essenciais para uma condição digna de vida, ou seja, as condições para as famílias assentadas exercerem sua cidadania. Representa uma política importante de geração de empregos no meio rural.

Ora, a reprodução da agricultura familiar depende claramente da mudança do paradigma da modernização da agricultura, como principal política de geração de renda e desenvolvimento comunitário, para um novo paradigma do desenvolvimento rural, buscando-se um novo padrão para o meio rural, porém ajustado a cada região e realidade em que se encontram as famílias rurais.6 No bojo dessa discussão não se pode esquecer as dificuldades teóricas relativas ao conceito em torno da categoria agricultura familiar, já que a definição prevista em lei basicamente é operacional. Destarte, Wanderley (2003) avança na discussão entendendo a agricultura familiar ou campesinato a partir de duas dimensões distintas e complementares: historicamente como uma civilização ou uma cultura e como uma forma social particular de organização da produção. Assim, quando se olha para produção familiar rural da Amazônia, percebe-se a utilidade dessas dimensões para um melhor entendimento de seus resultados. Portanto, tornam-se prementes mais estudos sobre o papel da agricultura familiar no meio rural, especialmente na região amazônica, haja vista suas condições e peculiaridades históricas, enfocando a comparação com a agricultura não familiar ou patronal, além de encaminhar questões que possam nortear um novo padrão de desenvolvimento rural. O presente trabalho busca, a partir das discussões propostas, ampliar o debate sobre os caminhos do desenvolvimento rural na Amazônia, em particular no Acre, tendo em vista o desempenho da agricultura familiar verificado no último Censo Agropecuário de 2006.

5

Cf. MACIEL (2010) Nessa direção vale mencionar a discussão realizada em Navarro (2001), entre outros artigos interessantes contidos numa coletânea sobre "Agricultura e Desenvolvimento Rural" da revista ESTUDOS AVANÇADOS, do Instituto de Estudos Avançados da USP, em 2001. 6

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

6

3. MATERIAIS E MÉTODOS Este estudo tem como objeto a produção familiar rural do estado acreano. O Acre é um dos 27 estados do Brasil, com extensão territorial de 152.581,38 Km2 e formado por 22 municípios. Desde 1999 está politicamente divido em cinco microrregiões, que são Alto Acre, Baixo Acre, Purus, Tarauacá/Envira e Juruá; e duas mesorregiões: Vale do Acre e Vale do Juruá (IBGE, 2007). A mesorregião do Vale do Acre é formada por 14 municípios, distribuída entre as regionais do Alto Acre, Baixo Acre e Purus, sendo eles: Manoel Urbano, Santa Rosa do Purus, Bujari, Sena Madureira, Acrelândia, Capixaba, Plácido de Castro, Porto Acre, Senador Guiomard, Assis Brasil, Epitaciolândia, Rio Branco, Brasiléia e Xapuri. O Vale do Juruá é formado pelas regionais do Juruá e Tarauacá/Envira, agregando 8 municípios, quais sejam: Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Marechal Thaumaturgo, Porto Walter, Rodrigues Alves, Feijó, Jordão e Tarauacá. Conforme o Censo Agropecuário de 2006, na região acreana existiam 25.187 estabelecimentos familiares no período pesquisado. Cabe ressaltar que de acordo com Acre (2009) há cerca de 30.295 famílias assentadas em diversas formas de assentamento, incluindo Projetos de Assentamento, Florestas Estaduais e Reservas Extrativistas.

3.1 Metodologia Para fazer a avaliação econômica da produção familiar rural no estado do Acre, foram utilizados os dados extraídos do Censo Agropecuário de 2006. Para tanto, fez-se uma análise comparativa entre a agricultura familiar e a agricultura não familiar, buscando-se avaliar a eficiência técnica e econômica entre esses dois tipos de produção rural, a partir de indicadores referentes a Receitas e Valor Bruto da Produção (VBP), total de estabelecimentos, área plantada, pessoal ocupado e crédito. A eficiência técnica, caracterizada pela produtividade física da produção (PFP), é medida a partir do resultado entre a quantidade produzida de um produto específico e sua área plantada. Segundo Guanziroli et al. (2001), a eficiência econômica pode ser mensurada tanto por indicadores de produtividade total quanto por produtividade parcial de fatores. Dadas as dificuldades de equalização dos preços dos fatores produtivos agrícolas, entre outras, a economia agrícola tem utilizado as produtividades parciais para avaliar assuntos específicos, ao invés da produtividade total de fatores. Assim, no presente trabalho, dada a disponibilidade de dados, trabalha-se basicamente com o indicador retorno econômico da terra (RET), ou seja, busca-se identificar quanto de renda (VBP ou Receita) é gerado pela utilização de cada unidade de área nos estabelecimentos familiares ou não.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


7

MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES Segundo a Tabela 1 foram identificados na região acreana 29.482 estabelecimentos agropecuários, sendo que 85% (25.187) destes foram classificados como estabelecimentos da agricultura familiar. Entretanto, os agricultores familiares ocupavam apenas 43% da área total (3.491.283 hectares) ocupada pelos estabelecimentos agropecuários, demonstrando clara concentração fundiária na região, visto que apenas 15% dos estabelecimentos não familiares concentravam 57% da área ocupada, ou seja, quase dois milhões de hectares (ha). A área média dos estabelecimentos da agricultura familiar era de 59 ha, enquanto que nos estabelecimentos não familiares era de 465 ha. Tabela 1 – Estabelecimentos, Área, VBP e Renda da Terra da Agricultura Familiar - Acre - 2006 Discriminação

Agricultura familiar Não familiar Total

Estabelecimentos

%

25.187 4.295

85 15

29.482

100

Renda Econômica da Terra (R$/ha)

Área média (ha)

VBP (1000 R$)

%

43 57

59 465

241.092,13 106.783,75

69 31

161,33 53,48

3.491.283 100

118

347.875,88

100

99,64

Área total (ha)

%

1.494.424 1.996.859

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Não obstante, a baixa ocupação de terras por parte dos estabelecimentos familiares não quer dizer baixa eficiência econômica. Pelo contrário, os agricultores familiares, mesmo ocupando áreas menores que os não familiares, são muito mais eficientes na geração do Valor Bruto da Produção (VBP) que os últimos, sendo responsáveis por 69% (R$ 241.092,13) do VBP do setor agropecuário no Acre. Isto representa em termos de renda econômica da terra o valor de R$ 161,33/ha/ano, cerca de três vezes mais que a renda auferida pelos não familiares. Segundo a Tabela 2, a produção vegetal é o principal gerador do VBP no setor agropecuário acreano, sendo que para a agricultura familiar a lavoura temporária, notadamente os produtos da chamada lavoura branca (arroz, feijão, milho e mandioca), é responsável por quase 60% do VBP desse segmento. Nota-se, ainda, a importante participação da produção animal de grande porte, particularmente de gado bovino, com 11,22%, similar à participação dessa produção no VBP do segmento não familiar, que por sinal tem na produção silvícola, notadamente a produção de madeira, como seu principal gerador de renda bruta, com participação em 51,4% do total do VBP dos estabelecimentos não familiares.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

8

Tabela 2 - Participação percentual dos tipos de produção na geração do Valor Bruto da Produção (VBP) da agricultura familiar – Acre - 2006 Tipo de Produção Vegetal Lavoura Temporária Lavoura Permanente Extração Vegetal Silvicultura Horticultura Floricultura Animal De grande porte Aves Pequenos animais De médio porte Agroindústria

Agricultura familiar (%) 76,32 59,10 9,65 3,14 2,72 1,69 0,02 17,23 11,22 3,85 0,95 1,21 6,45

Não familiar (%) 77,45 16,05 4,67 4,28 51,40 1,04 19,90 10,97 3,81 4,35 0,77 2,65

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Em relação à utilização das terras ocupadas tanto pela agricultura familiar quanto pelos não familiares, de acordo com a Tabela 3, observa-se preocupante percentual de áreas utilizadas como pastos, essencialmente para gado bovino, bem como áreas florestais que indicam estar bem abaixo do limite legal permitido para desflorestamento na região – o código florestal estabelece que cada propriedade deve manter 80% do tamanho do estabelecimento como reserva legal. Essa preocupação passa a ser evidente quando se “compara”, grosso modo, com a utilização da terra identificada de forma geral no Censo Agropecuário de 1995/1996, pois as áreas florestais entre agricultores familiares ou não eram, nesse período, de 73,5% (contra os 61% verificados no Censo mais recente) e as pastagens somavam 19,3% (contra os 26,3% - agricultura familiar – e 32,3% - não familiares no período recente). Ora, mesmo sendo necessários estudos complementares para comparação, pode-se indicar a redução em torno 17% da área florestal para o período de uma década em detrimento do aumento da área de pastagem nas áreas familiares, em torno de 37%, e não familiares de aproximadamente 67%. Tabela 3 – Utilização das terras nos estabelecimentos agropecuários – Acre - 2006 Uso da Terra

Agricultura Familiar

Não Familiar

Mata e/ou florestas

60,9%

61,2%

Pastagens

26,3%

32,3%

Lavoura

6,7%

3,1%

Sistemas agroflorestal

3,2%

1,6%

Áreas inaproveitáveis

1,2%

0,6%

Construções, benfeitorias e caminhos

1,1%

0,5%

Corpos d'água (açudes, tanques etc.)

0,4%

0,6%

Áreas degradadas Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

0,2%

0,0%

Dentre os principais produtos da lavoura e da pecuária que compõem a base alimentar da população brasileira, conforme a Tabela 4, destaca-se a ampla importância da agricultura familiar SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

9

no provimento de tais produtos, cujos resultados, em particular relativo à proteína vegetal, são responsáveis por mais de 80% do VBP produzido na região acreana, em particular a produção de mandioca, com 93% do VBP. Tabela 4 – Participação da agricultura familiar no VBP de produtos selecionados – Acre e Brasil - 2006 % VBP total do produto (Acre)

Produtos

% VBP total do produto (Brasil)

Mandioca

93

88

Arroz

87

35

Feijão

87

69

Milho

85

47

Suínos

80

51

Ovos

76

17

Leite de Vaca

73

56

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Ademais, em relação às fontes de proteína animal, ressalta-se que, além da importante contribuição da agricultura familiar na produção de suínos e aves (Tabela 4), segundo o Censo Agropecuário de 2006, do plantel de gado bovino verificado no setor agropecuário da região – 1.721.660 cabeças – 44% (749.018 cabeças) estavam nos estabelecimentos da agricultura familiar. Do ponto de vista da produtividade física, notadamente da lavoura branca, observa-se, nas Tabelas 5 e 6, que não há significativa diferença entre os agricultores familiares acreanos e o mesmo segmento no restante do Brasil tanto em termos de produtividade quanto de renda da terra, destacando-se, inclusive, melhores produtividades e renda da terra para os produtos mandioca e feijão na região acreana. A Tabela 5 mostra que as produtividades físicas da agricultura familiar e não familiar são muito semelhantes no Acre. Isto evidencia baixos padrões tecnológicos dos estabelecimentos não familiares acreanos para a produção de alimentos vegetais, uma vez que em termos nacionais a produtividade dos estabelecimentos não familiares é bastante expressiva em relação aos agricultores familiares: a produtividade do arroz e do feijão entre os estabelecimentos não familiares superam em mais de 80% os familiares; cerca 31% a mais em relação à mandioca; e 42% a mais na produção de milho. Tabela 5 – Produtividade das principais lavouras da agricultura familiar e não familiar (em kg/ha) – Acre e Brasil – 2006 Produtos

Agricultura - Produtividade Lavoura (kg/ha) Familiar Familiar- Não FamiliarNão FamiliarBrasil (C) Acre (A) Acre (B) Brasil (D)

Acre (B/A)

Brasil (D/C)

Arroz

2 558

2 695

2 741

5 030

1,05

1,84

Feijão

1 033

1 133

618

1 151

1,10

1,86

Milho

2 762

3 003

3 029

4 303

1,09

1,42

Mandioca

8 844

8 792

5 770

7 541

0,99

1,31

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006. SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

10

Conforme a Tabela 6, a baixa produtividade física levou ao baixo rendimento econômico da terra entre os estabelecimentos não familiares acreanos, que auferiram rendimentos próximos de 35% menos que os obtidos pelas unidades familiares, em quase todos os produtos. Em termos de Brasil, a renda econômica da terra obtida pela agricultura não familiar é bem superior à familiar, com exceção da lavoura da mandioca, cujo rendimento econômico da terra desse produto entre os produtores familiares no Acre é mais que o dobro que a média nacional, tanto familiar quanto não familiar. Tabela 6 – Renda econômica da terra das principais lavouras da agricultura familiar e não familiar (em R$/ha) – Acre e Brasil – 2006 Produtos

Agricultura - Renda Econômica da Terra (R$/ha) Familiar Familiar- Não FamiliarNão FamiliarBrasil (C) Acre (A) Acre (B) Brasil (D)

Arroz

1 124

740

1 212

Feijão

607

585

Milho

839

564

3 916

2 478

Mandioca

Acre (B/A)

Brasil (D/C)

2 105

0,66

1,74

489

957

0,96

1,96

834

1 133

0,67

1,36

1 346

1 524

0,63

1,13

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Do ponto de vista social, de acordo com a Tabela 7, a agricultura familiar é importantíssima na ocupação da mão-de-obra, já que 82,6% (66.977 pessoas) do pessoal ocupado no setor agropecuário acreano encontravam-se nos estabelecimentos familiares. Nota-se a preponderância da mão-de-obra masculina para setor agropecuário, mas na agricultura familiar a quantidade de mulheres é bastante significativa, com 23.242 ocupações femininas. Tabela 7 – Pessoal ocupado (14 anos e mais) nos estabelecimentos da agricultura familiar – Acre – 2006 Discriminação

Total de Pessoas

%

Homens

%

Mulheres

%

Agricultura familiar

66.977

82,60

43.735

65,30

23.242

34,70

Não familiar

14.113

17,40

10.355

73,37

3.758

26,63

Total

81.090

100,00

54.090

66,70

27.000

33,30

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Quanto ao nível de assalariamento fora dos estabelecimentos, o Censo Agropecuário de 2006 mostra que em aproximadamente 28% (7.044) dos estabelecimentos o produtor declarou algum tipo de assalariamento fora do estabelecimento. A necessidade de rendimentos fora dos estabelecimentos está claramente associada às baixas receitas oriundas do processo produtivo. Entretanto, nota-se, na Tabela 8, que a receita média mensal (R$ 556,61) por estabelecimento da agricultura familiar era 59% acima do salário mínimo mensal vigente no período7. Cabe observar que se levar em consideração apenas a receita 7

R$ 350,00

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

11

mensal por estabelecimento poderia se chegar à conclusão de que as receitas dos não familiares seriam quatro vezes mais (R$ 2.331,39) eficientes na geração de receita que os familiares. Porém, levando-se em consideração a área ocupada pelos estabelecimentos de cada categoria, pode-se concluir que os estabelecimentos não familiares, que trabalham essencialmente de forma extensiva, geram valores em torno da metade das receitas geradas pelos estabelecimentos da agricultura familiar. Tabela 8 – Receitas obtidas por estabelecimento no ano, segundo a agricultura familiar e não familiar – Acre - 2006 Discriminação

Receita Média por estabelecimento (R$/mês)

Agricultura familiar (A) Não familiar (B)

Receita Média (R$/mês/ha)

556,61

9,38

2.331,39

5,01

4,19

0,53

B/A Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Além disso, destaca-se, na Tabela 9, que a principal atividade produtiva na geração de receitas para a agricultura familiar ainda é a produção vegetal, com participação em 68,11% da receita total. A pecuária vem logo em seguida na geração de quase 20% do total, tornando-se mais importante para esse segmento do que para os estabelecimentos não familiares. Outro aspecto importante é a maior diversificação produtiva entre os estabelecimentos familiares, contando, inclusive, com parcela importante (10,44%) de produtos da agroindústria para a geração de receitas. Tabela 9 – participação percentual dos tipos de produção para a geração de receitas na agricultura familiar – Acre - 2006 Tipos de produtos Produtos vegetais Produtos animais Produtos da agroindústria Outros

Agricultura familiar (%) Não familiar (%) 68,11 81,81 19,82 15,66 10,44 1,89 1,63 0,64

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Diante do exposto, fala-se em baixas receitas para a busca de outras formas de rendimentos como o assalariamento fora dos estabelecimentos, além das transferências governamentais (aposentadorias, bolsa família etc.). Ora, a receita média mensal obtida por estabelecimento da agricultura familiar é baixa em virtude das necessidades de gastos no mercado, uma vez que o projeto ASPF8, em recentes pesquisas, levantou o valor gasto por mês dos familiares rurais acreanos na compra de bens e serviços no mercado. Tal gasto girava em torno de R$ 550,00, ou seja, justamente a receita mensal (ver Tabela 8) verificada pelo Censo Agropecuário de 2006. Entretanto, os gastos no mercado não se resumem apenas em bens de consumo de primeira necessidade (alimentação e vestuário, por exemplo), mas também em gastos relativos à reposição dos capitais fixos. Assim, a referida pesquisa verificou que a linha de 8

Cf. MACIEL (2010)

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

12

dependência do mercado era, em termos medianos, no período considerado, em torno de R$ 1.000,00/mês por estabelecimento. Assim, conforme a Tabela 10, cerca de 36% dos estabelecimentos familiares tiveram produtores com algum rendimento obtido fora – em média R$ 338,80/mês, sendo que entre os não familiares metade dos produtores obtiveram receitas fora do estabelecimento, com obtenção de receitas um pouco mais que o dobro das auferidas pelos familiares. Destarte, pode-se inferir uma maior dependência dos produtores não familiares de receitas fora do estabelecimento. Tabela 10 – Estabelecimentos com receitas obtidas fora da unidade de agricultura familiar – Acre - 2006 Discriminação

Estabelecimentos com receitas obtidas fora da unidade (em %)

Receita média obtida fora do estabelecimento (R$/mês)

Agricultura familiar (A)

36,36

338,80

Não familiar (B)

52,13

763,69

B/A

1,43

2,25

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

Por outro lado, do ponto de vista da busca de financiamentos para alavancar a produção dos estabelecimentos da agricultura familiar, a obtenção de crédito foi baixíssima, pois, de acordo com o Censo Agropecuário de 2006, somente 4% dos estabelecimentos da agricultura familiar obtiveram financiamento tanto para investimento quanto para custeio do processo produtivo. Resultado similar ocorreu no segmento não familiar. Agora, o mais impressionante é constatar, conforme a Tabela 11, que o principal motivo para a não obtenção de financiamento é a afirmação por parte dos produtores de que não precisa de empréstimo para alavancar o estabelecimento, resposta de quase metade dos produtores da agricultura familiar acreana. Tabela 11 – Motivos da não obtenção de financiamento para a agricultura familiar – Acre - 2006 Motivos da não obtenção de financiamento Não precisou Medo de contrair dívida Burocracia Outros

Agricultura familiar (%) 48,74 15,32 10,95 24,99

Não familiar (%) 57,45 12,21 9,95 20,39

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

13

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A discussão sobre o papel da agricultura familiar no desenvolvimento rural se ampliou bastante nas últimas décadas, especialmente quando se leva em consideração a questão da segurança alimentar da sociedade e, não menos importante, a geração de emprego de renda. Ora, a base alimentar do povo brasileiro, expresso no prato composto por arroz e feijão, vem justamente das produções agrícolas familiares. Em algumas regiões, como o Norte e Nordeste, soma-se a mandioca e seus derivados como produto elementar do prato popular. Ademais, o milho, que complementa, juntamente com as demais culturas citadas, aquilo que se denomina como lavoura branca, torna-se um dos principais insumos da produção de aves e suínos, também parte constante do cardápio da sociedade. Não obstante, os produtores familiares rurais ainda enfrentam muitas dificuldades de manutenção e reprodução tanto do ponto de vista produtivo quanto do ponto de vista mercadológico. As causas para tal situação podem estar associadas a diversos fatores, que vão desde a imposição de políticas (agrícolas ou agrárias) inadequadas ao diversos contextos socioculturais, especialmente na região amazônica, ao contínuo atrelamento da agricultura familiar ao desenvolvimento do agronegócio, ainda dentro do marco teórico da modernização conservadora. No presente trabalho, evidenciou-se, a partir do Censo Agropecuário de 2006, o papel primordial da agricultura familiar na região acreana na produção dos principais alimentos, sendo, ademais, mais eficiente na geração de emprego e renda do que a agricultura não familiar ou patronal, demonstrando ser este segmento fundamental para qualquer plano de desenvolvimento rural para a região. Por outro lado, vislumbra-se certa preocupação com os baixos níveis de produtividade da agricultura patronal acreana, uma vez que se esperava ser esta uma das fortalezas desse segmento produtivo, o que foi evidenciado pelos resultados nacionais. A agricultura familiar praticada no estado do Acre, mesmo sendo mais eficiente que a patronal, ainda apresenta dificuldades de reprodução social, como em diversas regiões do país, pois as famílias não conseguem adquirir todas suas necessidades no mercado a partir das receitas próprias auferidas, buscando outras formas de receitas, como assalariamento fora das unidades produtivas, além de transferências governamentais, como o programa bolsa família. Assim, a necessidade de políticas mais efetivas para o fortalecimento da agricultura familiar rural na região torna-se cada vez mais premente, principalmente em torno de alternativas produtivas – muitas delas já disponíveis – que se inserem entorno da discussão do desenvolvimento sustentável. Talvez um aspecto preponderante nesse processo seja viabilização da incorporação de novas tecnologias para que os produtores possam avançar quantitativamente e qualitativamente no manejo de suas produções, visto que muitos processos produtivos na região “simplesmente” não evoluíram ao longo do tempo, permanecendo dentro da tradicional cultura de “corte e queima”.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

14

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACRE. Governo do Estado do Acre. Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Sustentável. Acre em Números: 2009. Rio Branco: SEPLANDS, 2009. ASSIS, Renato Linhares de. Desenvolvimento rural sustentável no Brasil: perspectivas a partir da integração de ações públicas e privadas com base na agroecologia. Econ. Apl., Mar 2006, vol.10, no.1, p.75-89. BATISTA, Gisele Elaine de Araújo. Alternativas de desenvolvimento sustentável: o caso da RESEX Chico Mendes e das ilhas de alta produtividade. 2004. 93p. Monografia (Graduação em Economia) - Universidade Federal do Acre, Rio Branco. CMMAD. Nosso Futuro Comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991. 430 p. COSTABEBER, J. A.; CAPORAL, F. R. “Possibilidades e alternativas do desenvolvimento rural sustentável”. In: Vela, Hugo. (Org.): Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural Sustentável no Mercosul. Santa Maria: Editora da UFSM/Pallotti, 2003. p.157-194. IBGE. Censo Agropecuário 2006. Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: MPOG, 2009. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/agropecuaria/censoagro/default.shtm INCRA/FAO. Novo Retrato da Agricultura Familiar. O Brasil redescoberto. Brasília: Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO, 2000 (FAO/BRA 036). GRAZIANO NETO, Francisco. Questão Agrária e Ecologia: Crítica da moderna agricultura. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1982. GUANZIROLI, Carlos et al. Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Século XXI. Rio de Janeiro: Garamond, 2001. LIMA, Dalmo Marcelo de Albuquerque; WILKINSON, John. (Org.). Inovação nas tradições da agricultura familiar. Brasília: CNPq/Paralelo 15, 2002. MACIEL, Raimundo Cláudio Gomes (coord.) Diagnóstico socioeconômico dos sistemas básicos de produção familiar rural do estado do Acre (ASPF) – período 1996/2006. Rio Branco, Acre, Brasil: EDUFAC, 2010. (in press) __________. Ilhas de alta produtividade: Inovação essencial para a manutenção dos seringueiros nas reservas extrativistas. UNICAMP. Campinas, 2003. 98p. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente). SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


MACIEL, R.C.G & GOMES, K.P.C.C. Agricultura familiar no Acre: considerações a partir do censo agropecuário de 2006.

15

__________; CAMPOS, K. P. da C.; SOUZA, E. F. de. Diagnóstico sócio-econômico da produção familiar rural nos Pólos Agroflorestais do Acre. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 48. 2010, Campo Grande. Anais... Campo Grande: SOBER, 2010. NAVARRO, Zander. Desenvolvimento rural no Brasil: os limites do passado e os caminhos do futuro. Estudos Avançados, São Paulo, v. 15, n. 43, p. 83-100, set./dez. 2001. RÊGO, J. F. do.; COSTA FILHO, O. S.; BRAGA, R. A. da R. (Editores). Análise econômica dos sistemas de produção familiar rural da região do Vale do Acre – 1996/1997. Rio Branco: UFAC/SEBRAE/The Ford Foundation, 2003. 80p. SANTOS, Manoel José dos. Projeto alternativo de desenvolvimento rural sustentável. Estud. av., Dez 2001, vol.15, no.43, p.225-238. SOUZA, Elyson Ferreira de. Os Pólos Agroflorestais como Política de Desenvolvimento Rural Sustentável em Rio Branco no Acre: da proposição à realidade. Viçosa: DED/UFV, 2008. 180 p. (Dissertação de Mestrado – Economia Doméstica, DED/UFV) SOUZA, G. E. A. B.; SOUZA, E. F.; MACIEL, R. C. G. Análise Econômica dos PAD’s Boa Esperança e Humaitá: dez anos depois. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 44., 2008, Rio Branco. Anais... Rio Branco: SOBER, 2008. WANDERLEY, M. de N. B., Agricultura familiar e campesinato: rupturas e continuidade, Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, n. 21, p. 42-61, out. 2003.

SOCIEDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL on line – v.7, n. 2 – Abr – 2013. www. inagrodf.com.br/revista

ISSN 1981-1551


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.