Pequenos Exploradores
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O CHILREAR DOS PÁSSAROS NÃO ENGANA
JÁ É DE MANHÃ! MARIA ESTAVA
ENTUSIASMADÍSSIMA. FINALMENTE CHEGOU
O DIA QUE TANTO ANSIAVA: ERA O DIA DA
VISITA DA ESCOLA À REGIÃO MINEIRA DO
AROUCA GEOPARK!
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- Depressa, depressa mãe! Hoje é o dia da minha visita! – dizia Maria numa correria desenfreada.
- Não te preocupes! Estamos com tempo, Maria! –respondeu a mãe, calmamente, enquanto terminava de preparar as coisas para mais um dia de trabalho.
- Pequeno-almoço tomado, dentes lavados, protetor solar posto, lancheira com comida, chapéu, água, bloco de notas, lápis…. tenho tudo pronto! – confirmava Maria em grande azáfama.
- Muito bem! – elogiou a mãe, esboçando um sorriso. Podia ser assim todos os dias!
- Nheeee……. Vou tentar mamã! – respondeu Maria, timidamente.
Rapidamente, a mãe chegou à escola. Maria deu um abraço apertado à mãe, deixando a promessa de se portar muito bem e cumprir, rigorosamente, as instruções dadas pelos professores.
Faltavam uns minutos para as 9:00h e o autocarro já estava à porta da escola. As crianças organizaram-se no átrio e rapidamente os professores deram instruções para entrarem, ordeiramente, no autocarro. Maria teve a sorte de ficar sentada ao lado da sua melhor amiga, a Rita, completamente aficionada por História e pela Natureza. A Rita era aventureira e aos fins-de-semana adorava caminhar com os pais. Já tinha feito quase todos os percursos pedestres de pequena rota (PR) do Arouca Geoparque Mundial da UNESCO!
- Maria, no fim-de-semana passado os meus pais decidiram fazer o PR8, a «Rota do Ouro Negro». Partimos, aqui, de Moldes, do lugar de Fuste, e fomos até à aldeia de Rio de Frades. Acho que vamos conhecer essa aldeia hoje! Descemos por um trilho estreito onde vimos muitos buracos escavados na rocha. Os meus pais disseram que eram «bocas de mina» e que pertenciam às Minas da Pena Amarela, aqui em Moldes! – partilhou Rita entusiasmadíssima.
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Minas da Pena Amarela | Yasmin Kokora J.I.
- «Bocas de Mina»?! Que nome curioso! E como escavavam esses buracos? - questionou Maria.
- Os meus pais contaram-me que eram escavados com picaretas pelos «pilhas»: pessoas que se aventuravam, no meio da serra, à procura do volfrâmio que era tão, mas tão valioso, que ficou conhecido como o «ouro negro», designação que, curiosamente, dá nome do percurso pedestre! Acreditas que os «pilhas» chegavam a dormir na serra, ao relento?! - questionou Rita toda empolgada.
As amigas iam tão entretidas a conversar que nem deram conta que já tinham chegado à aldeia mineira de Rio de Frades. A viagem tinha sido muito rápida! O sol espreitava e realçava as cores das encostas. As casas baixas, construídas em xisto, lembravam as casas de bonecas; as ruas, muito estreitas, convidam a partir à descoberta da aldeia.
À espera das crianças estavam já a D. Alice e a D. Isaura, habitantes de Rio de Frades, bem como a geóloga do Arouca Geopark com quem já tinham estado tantas vezes. Os alunos da Escola E.B. 1/J.I de Paços – Moldes estavam curiosos para conhecer as minas e todas as suas particularidades… Mal saíram do autocarro começaram logo a fazer mil perguntas.
A D. Alice tinha na sua mão imensos minerais de cor negra e relativamente pesados, que a geóloga descreveu como densos. Sentados no largo da aldeia as crianças estavam ansiosas para ouvir todas as histórias do tempo do minério.
- O meu pai comprava o volfrâmio “ao negro”, quer dizer na “candonga”. Por isso, muitas vezes a GNR batia-nos à porta, para revistar a casa. Lembro-me bem do meu pai, José, à pressa, abrir um alçapão e atirar os minerais para as cabras. No dia seguinte, lá os ia procurar no curral, no meio da palha. Foi o que permitiu, naquele tempo, termos uma vida folgada! –contou a D. Alice.
– Foi este o minério que potenciou a abertura e a construção de tantas minas, algumas delas com grandes instalações, no Arouca Geopark. Desde as Minas da Pena Amarela, às Minas de Rio de Frades e de Regoufe, mas também em Alvarenga, mineiros e «pilhas» aventuravam-se à descoberta destes minerais de volframite, que eram fonte de volfrâmio, atualmente chamado de tungsténio – partilhou a geóloga, enquanto mostrava diferentes amostras de minerais negros de volframite e de quartzo, de cor branca como o leite.
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Volfrâmio | Joana Ferreira 3º Ano
A geóloga continuou a explicação:
- Em Rio de Frades, a licença de exploração mais antiga é de, pelo menos, 1915. Uns anos mais tarde, esta licença foi vendida à empresa Companhia Mineira do Norte de Portugal, gerida por alemães, que investiu muito dinheiro nesta região. Construíram a estrada que liga Arouca a Rio de Frades, instalaram eletricidade e linha telefónica nas minas e melhoraram as zonas onde se separava e lavava o minério. Em 1941 ocorreu o período de maior atividade de exploração e exportação de volfrâmio para a Alemanha. Os registos dizem-nos que, no tempo da guerra, chegaram a trabalhar aqui mais de 7000 pessoas! Esta aldeia, no passado, parecia uma cidade em grande azáfama.
Com toda esta descrição, Maria começou a imaginar imensa gente a circular pelas ruas estreitas da aldeia… homens magros com sacos de minério ao ombro, senhoras com cestos à cabeça cheios de broas em direção à cantina, que teria de ser enorme para poder alimentar tantos mineiros e outros trabalhadores da mina!
Embrenhada nos seus pensamentos quase nem tinha dado conta que os colegas já estavam de capacete e a começar a dirigir-se para a Galeria do Vale da Cerdeira. O caminho afastava-os da aldeia, que agora era ainda mais bonita, com casas de paredes e telhados em xisto - a rocha que viam, na montanha, ao seu redor.
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Mineiros | Ana Soares 2º Ano
Na paisagem, sobressaem ruínas de antigos edifícios e rochas amontoadas pelas encostas, que a geóloga chama de escombreiras. Estamos na primavera, as encostas parecem pintadas de tons rosa - da flor da urze, e amarelo - das flores da carqueja e do tojo. Pelo caminho, a D. Isaura ia indicando:
- Aqui, era o posto médico, onde estava o Sr. David; mais acima o posto da GNR. Perto do caminho que leva até Cabreiros e que, agora, é um percurso pedestre, o PR6, chamado o «Caminho do Carteiro», fica a Caserna dos Marteleiros. Lá podia ficar quem trabalhava com martelos pneumáticos na mina. Era um trabalho muito duro! E este edifício aqui em ruínas era a «Casa das Ratas», o sítio onde quem cometia crimes ou era apanhado a roubar minério ficava preso!
Todos soltaram uma gargalhada! Depois de subir uma grande escadaria, em pedra, estavam já à entrada da mina, bem identificada com uma bandeirola de geossítio do Arouca Geopark e um pequeno altar em honra de Santa Bárbara, a padroeira dos mineiros.
- Esta é a galeria mineira do Vale da Cerdeira, que também chamam de «Mina do Vale da Cerdeira». Temos, ainda, aqui a «Mina do Paiol», entre tantas outras que estão dispersas por estas encostas. Preparados para esta aventura? – questionou a geóloga.
Atravessar uma galeria mineira era o momento alto do dia! Estavam todos empolgados. Acenderam a luz do capacete e embrenharam-se terra dentro!
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Minas de Rio de Frades | Maria Santos 2º Ano
Dentro da mina era escuro, fresco e a água escorria pelos xistos. As lanternas iluminavam o caminho. A meio do trajeto, destaca-se uma faixa branca, no meio dos xistos de cor acastanhada, onde paramos para ouvir a explicação da geóloga.
- Este é um filão de quartzo, um mineral branco muito resistente. Era nos filões de quartzo que apareciam os minerais de volframite. Associados apareciam, também, outros minerais como a cassiterite, que é o minério de estanho, ou a pirite, conhecido por ser o «ouro dos tolos» pois o seu aspeto brilhante e cor lembram o ouro, mas o seu valor económico é muito mais baixo, sendo um mineral de ferro. Vamos continuar?
Estávamos já muito próximos da saída do túnel. Ouviase, cada vez mais, o forte som da água. De repente, um morcego, desorientado, começa a esvoaçar à frente do grupo. Algumas crianças assustaram-se!
- Shhhhhtttt…. é só um morcego-de-ferradura-pequeno e é inofensivo para os seres humanos! Gosta muito de comer insetos como mosquitos. E se repararem está aqui outro escondido nesta reentrância das rochas…
- acrescentou a geóloga, direcionando uma luz ténue para a zona onde estava o morcego.
Entretanto, já estavam na área exterior. Do outro lado da mina, aguardava-os uma bela lagoa onde descansaram por alguns momentos. Começaram a ouvir pessoas a conversar. Eram praticantes de canyoning que estavam a descer as cascatas do troço inferior do rio de Frades e que também iam atravessar o túnel. Juntámo-nos a eles e regressámos, ao som do tilintar dos equipamentos de canyon .
- Por este túnel saíam as vagonas, também chamadas de vagonetes, conduzidas através de carris. Um sistema teleférico levava as vagonas carregadas com material recolhido na mina, por via aérea, até ao outro lado do vale – contou a D. Isaura.
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Vagonete | Zé Pereira 4º Ano
Enquanto descíamos pelo trilho até à aldeia de baixo de Rio de Frades, onde o autocarro aguardava o grupo, a D. Isaura acrescentava: - Lá em baixo, no fundo do vale, perto do rio, havia um coberto com senhoras, a cantar toda a noite e a escolher o minério que ia para a lavaria. O que não interessava, os “seixos”, iam para as escombreiras que vemos espalhadas pelas encostas.
À entrada da aldeia, uma enorme laje destaca «As Voltas do Impossível», umas das provas de trail que agora se realizam por estas paragens. Aqui, agradecemos toda a amabilidade e despedimo-nos da D. Isaura ao som de uma das Cantas do Cancioneiro de Arouca alusivas às Minas de Rio de Frades e rumámos a Regoufe.
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ADEUS, Ó RIO DE FRADES!
Adeus, ó Rio de Frades
Adeus, ó Val´da Sardeira! Adeus, mina do Paiole , Adeus, Companhia Mineira!
Trabalha na quelha escura, Além do Val´ da Serdeira; Adeus, mina do Paiole , Adeus, quelasse mineira!
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CANCIONEIRO DE AROUCA (TEBILHÃO – CABREIROS)
Em Regoufe, o Sr. António, antigo mineiro, aguardava o grupo. Rapidamente, todos saíram do autocarro e seguiram a geóloga até ao núcleo das Minas de Regoufe, saltitando de bloco em bloco. Aqui a paisagem era bem diferente, com rochas arredondadas e de cor acinzentada - os granitos. Os edifícios das minas dispunham-se, à nossa volta, em anfiteatro e, aqui e ali, víamos as entradas das galerias mineiras.
- Em 1915, foi atribuída a licença de exploração da Mina de Regoufe, também conhecida por «Mina da Poça da Cadela». Em 1941, a «Companhia Portuguesa de Minas», empresa que pertencia a ingleses, explorava o volfrâmio nesta área para que os alemães não conseguissem obter tanto volfrâmio. - explicou a geóloga.
- Porque é que precisavam de tanto de volfrâmio?questionou Maria.
A geóloga continuou: - Durante a Segunda Guerra Mundial, que decorreu entre 1939 e 1945, o mundo dividiu-se para apoiar Ingleses ou Alemães, que
estavam em guerra na Europa. Em Arouca, estas forças viviam em paz, pois aqui ambos procuravam volframite, o mineral que saía destas minas para fabricar volfrâmio. Este metal era muito usado no fabrico de armas e munições. Mas, ainda hoje, este metal é usado em lâmpadas, computadores, fornos de alta temperatura ou na indústria aeronáutica.
A experiência de entrar numa das galerias da mina de Regoufe era bem diferente. Protegidos com capacete, depois de percorrer meia dúzia de metros, abria-se uma zona ampla de onde saíam vários túneis, em direções opostas. E no teto, por um enorme buraco, conseguia-se ver o céu azul.
Subitamente, o Sr. António embrenha-se por um dos túneis mais escuros. Ao regressar, segurava, na mão, algo que parecia uma lanterna muito antiga que deixou as crianças curiosas.
- É um gasómetro! – exclamou Maria. A minha bisavó Ana também tinha um!
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Gasómetro | David Cruz J.I
- É verdade! Durante muito tempo, não havia luz dentro das minas. Usávamos esta lanterna que se chama gasómetro. É constituído por dois reservatórios sobrepostos: um superior, com a função de armazenar água, e um inferior, com a função de armazenar carboneto. O carboneto reage quando a água do reservatório superior é libertada, produzindo o gás acetileno, que é incandescente, e origina esta chama. Era o que iluminava a mina e permitia as deslocações e trabalhos! – partilhou o Sr. António emocionado, dirigindo a luz para a parede da mina.
- Aqui, nesta parede, observam um filão de quartzo, de onde terão extraído minério. E esta abertura no teto é um poço vertical que faz a ligação ao exterior. Os poços eram contruídos para a entrada de oxigénio e, muitas vezes, serviam para os mineiros circularem dentro da mina, através de escada. Por isso, devem ter
muito cuidado quando visitam áreas mineiras! Devem usar capacete e circular, apenas, nas zonas permitidas, não pondo em risco a vossa segurança! – advertiu a geóloga.
Já no exterior, o Sr. António explica ao grupo as ruínas dos edifícios:
- Aqui do lado direito, vocês tinham a lavaria, com vários tanques e máquinas ao longo da encosta. Tínhamos, também, as oficinas, os armazéns e a central elétrica. Aqui atrás de nós, tínhamos edifícios técnicos como os escritórios. Já do lado esquerdo, tínhamos o «bairro dos mineiros», pequenas casas onde habitavam os mineiros, a «venda», a cavalariça e o «clube», onde jogávamos às cartas.
- E o campo de futebol! – reparou Rita.
- Sim, também jogávamos futebol nos momentos livres
- partilhou o Sr. António, a esboçar um sorriso.
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Minas de Regoufe | Juliana Carvalho 1º Ano
Esta visita estava a ser uma verdadeira aventura! Das
Minas desceram até à aldeia de Regoufe onde, viram tratores a lavrar os campos e ainda a D. Fátima com o seu rebanho que tinha mais de cem ovelhas e cabras.
- Sabiam que Regoufe significa «Rei dos Lobos»? –perguntou a D. Fátima.
- É verdade que ainda existem lobos ibéricos por aqui?
– questionou Maria amedrontada.
A D. Fátima apressou-se a confirmar: - Sim, é verdade.
É uma espécie muito importante e que está em perigo de extinção, mas que não faz mal aos seres humanos.
Todos os dias, tenho que acompanhar e guardar o rebanho nos currais, para evitar que o lobo se aproxime dos meus animais e garantir a sua segurança.
Mais descansados sentaram-se numa zona de prado verdejante, à sombra de um enorme e velho sobreiro, para o merecido piquenique.
- Shhhhhhhtttttttt! – disse repentinamente Rita.
- Acho que estou a ouvir alguém a cantar! – partilhou
Maria a tentar perceber de onde vinha o som.
As Cantadeiras surgiram no caminho, ao longe. Traziam bolo de laranja para a sobremesa e vinham a «botar Cantas»….
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O GALO QUANDO CANTA É DIA
Os pobres vão para o minério
E os ricos ficam num sarilho
É por causa do minério, Não há jornaleiros pra sachar o milho.
O galo quando canta é dia
O galo quando canta é hora
O galo quando canta é dia
Põe-te a pé Maria
Bota o galo fora
Os pobres vão para o minério
E os ricos ficam numa fona
É por causa do minério, Não há jornaleiros pra apanhar ´ zeitona
O galo quando canta é dia
O galo quando canta é hora
O galo quando canta é dia
Põe-te a pé Maria
Bota o galo fora
TRADIÇÃO ORAL
(PONTE DE TELHE - MOLDES)
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As minas são, hoje, espaços de aprendizagem e de práticas desportivas como o pedestrianismo, o trai l running ou o canyoning . Persiste o património geológico, industrial e também as memórias que as letras das Cantas não deixam esquecer.
Este património, salvaguardado, principalmente, por mulheres, cujo canto polifónico a três ou mais vozes integra o Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, ajuda a perpetuar a identidade mineira do território, que hoje se alarga às crianças da E.B1/J.I de Paços – Moldes, através do projeto «Botar Cantas».
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Botar Cantas | Rodrigo Santas 4º Ano
E.B. 1/J.I de Paços – Moldes