João camilo de oliveira torres o elogio do conservadorismo e outros escritos (ed. Arcádia)

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derradeira e das mais ilustres seria o nosso Vieira. O cristão sabe que a história será sempre um tecido de males e bens, de luz e de sombras, e que no dia do Juízo é que o joio será separado do trigo. Até lá, ambos crescerão juntos. Mas, seja qual for a nossa posição filosófica e nossa explicação acerca da origem do mal no mundo, um fato é verdadeiro: ninguém pode ter um poder ilimitado, pois dele abusará fatalmente. Guardo na memória a mais antiga das lições de filosofia política que recebi, quando meu avô, Luiz Camillo de Oliveira Penna, certa vez me disse: “Se os homens fossem perfeitos, o governo ideal seria a monarquia absoluta; mas, como os reis são conduzidos a erros e crimes, convém que existam constituições e limitações ao poder”. Reconheço que a lição do velho itabirano foge da tendência corrente, de supor o Poder um mal, e que não existira num estado de perfeição. Mas, não nos esqueçamos de que há um bem comum, distinto dos bens individuais, e que, seja como for, deve ser procurado. Mas, num mundo de homens pecadores, que é o existente, há o perigo da tirania. Num mundo de santos, o rei cuidaria da coisa pública — (a monarquia, identificando os interesses da dinastia ao do Estado, faz da coisa pública a coisa particular do rei) e os cidadãos particulares cuidariam de seus negócios privados. Mas, repito, há o pecado e por isto inventamos o regime legal. Aliás, a velha monarquia absoluta não conhecia o poder ilimitado — o poder dos reis absolutos era muito menos absoluto do que se pensa. Havia limitações costumeiras, limitações legais, influência da Igreja, privilégios de corpos profissionais, etc. Assim mesmo deu no que sabemos. O governante — seja qual for o regime político e o sistema de governo — está sujeito a erros e enganos de toda sorte. Mesmo honesto, competente, bem informado acerca das questões do momento, ele errará; e se não errar por si, será induzido a erro por influência de partidários, parentes, compadres e a apaniguados — que existem em todos os tempos, lugares e situações. Um governante de pretensões moderadas, enquadrado num corpo de instituições,

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