Manter prisão por falta de condições para pagar fiança é ilegal, diz juíza

Page 1

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS

Nota de Esclarecimento

1.

Inicialmente, ressalto que, tratando os autos de crime de

natureza sexual, a ação deveria tramitar em Segredo de Justiça, nos moldes do artigo 234B do Código Penal, buscando-se preservar e resguardar a dignidade da vítima. Desta forma, somente deveriam ter acesso aos autos, os agentes policiais responsáveis pela lavratura do flagrante, o juiz, o órgão acusatório e a defesa. Sublinho que o segredo de justiça deveria imperar não só na fase processual, mas também na fase do inquérito policial vedando-se a divulgação midiática de informações ou documentos relativos ao processo que possam causar revitimização, como no presente caso em que as vítimas tiveram suas conversas divulgadas.

2.

Por oportuno, informo que, a Delegacia Especializada em

Proteção à Criança e ao Adolescente – DEPCA, tipificou o delito no artigo 241-B do ECA (Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente), cuja pena admite a imposição de fiança: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

3.

Acrescento que, foi estipulada em sede de Delegacia

Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente – DEPCA, fiança no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e, uma vez reconhecida a possibilidade de aplicação de fiança a manutenção da prisão em virtude da falta de condições financeiras para o seu pagamento, é ilegal conforme entendimento dos Tribunais Superiores a sua manutenção (HC 547.385/SP, j. 10/12/2019 e HC 568.693 - ES):

4. Informo que, a despeito de ter sido formulado pedido de Prisão Preventiva pela Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente – DEPCA, este veio desacompanhado da fundamentação jurídica necessária para embasar um pedido de restrição de liberdade, senão vejamos:


PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS

5. Pontuo que as a decretação ou manutenção da prisão preventiva, hodiernamente, exige a presença das seguintes circunstâncias fático-processuais: I) causas de admissibilidade da pretensão cautelar: 1.1) que o delito seja punido com pena máxima, privativa de liberdade, superior a 04 (quatro) anos; 1.2) que o requerente seja reincidente (artigo 64, I, do Código Penal) por condenação passada em julgado pela prática de outro crime doloso ou culposo (situações excepcionais); 1.3) que o crime envolva violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; 1.4) quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou 1.5) quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la; II) pressupostos: 2.1) indícios suficientes de autoria; e 2.2) prova da materialidade do crime; e III) fundamentos: 3.1) para garantia das ordem pública e 3.2) econômica, 3.3) por conveniência da instrução criminal, 3.4) para assegurar a aplicação da lei penal ou, o mais novo deles, 3.5) em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares. In casu, não se fazem presentes as causas de admissibilidade da pretensão cautelar, previstas no art. 313, tendo em vista a pena abstrato do delito, a primariedade do flagranteado, bem como o crime não envolvia violência doméstica e familiar, tampouco havia dúvidas acerca da identidade civil do flagranteado. 6. Sublinho, por último que, antecipar por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação consiste em crime, conforme artigo 38 da da Lei 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade). Manaus, 24 de fevereiro de 2022. Suzi Irlanda Araujo Granja da Silva Juíza de Direito


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.