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ÁGUA Urgência e desafio

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LUÍS MIRA

LUÍS MIRA

Luís Mesquita Dias

PRESIDENTE DA DIREÇÃO DA AGROTEJO

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Estamos a chegar ao fim de mais um ano particularmente rico em acontecimentos que trouxe à superfície o melhor e o menos bom que todos nós, como país, temos para dar. A comunidade, como um todo, deu exemplos notáveis de resiliência perante as dificuldades, de disciplina quando foi preciso tê-la e de solidariedade para com os mais afetados. Os poderes públicos, apesar de atuações por vezes erráticas, estiveram no seu melhor em momentos decisivos como o da vacinação. O setor agrícola confirmou os méritos que já tinha revelado no primeiro ano da pandemia, nunca parando e continuando a criar riqueza a uma taxa de crescimento superior à do resto da economia. Deparámo-nos, no entanto, com limitações antigas sem termos visto muitos dos nossos problemas estruturais serem resolvidos. A proliferação de entidades que têm de pronunciar-se sobre as várias intenções de investimento, não parece querer dar tréguas a quem pretende levar por diante os seus negócios. A burocracia comprova-se a cada dia como um dos fatores que mais retardam o nosso desenvolvimento e o seu combate deveria estar no centro das preocupações governativas. A dicotomia ambiente-agricultura parece ter-se extremado quando idealmente deveriam ter convergido. A mensagem de movimentos ativistas ocupou grande espaço mediático quase sempre sobrepondo-se a uma análise ponderada e objetiva que identifique as deficiências e divulgue os bons exemplos. Um maior equilíbrio entre estes dois pilares é urgente se queremos aspirar à prosperidade e não apenas ao idealismo bucólico. A água e a sua falta, continuou a ser insuficientemente debatida mantendo-se algum tabu relativamente à procura de novas fontes de captação, como sejam os transvases ou a dessalinização. As barragens continuaram a ser vistas como uma ameaça à natureza em vez de uma fonte de vida e de autonomia para o País. Tudo o que acima se refere tem relevância nacional. O tema da água tem, no entanto, particular relevância para o Ribatejo e o rio Tejo que o percorre. As receitas estão há muito identificadas e apontam para uma sequência temporal bastante óbvia: 1. O consumo atual da água deve ser racionalizado, assegurando uma gestão eficiente de um bem escasso. 2. As barragens do Zêzere têm no termo das atuais concessões, a janela de oportunidade para se tornarem o pulmão óbvio que deveriam ser. 3. A construção da barragem do Ocreza tem uma relação custo-benefício de tal forma positiva que é difícil entender que seja contestada. 4. O Projeto Tejo tem a dimensão que a nossa ambição, como país, deve ter, sabendo todos que, pela sua envergadura, a sua concretização terá de ser faseada. Assim, tenhamos empresários conscientes, ambientalistas equilibrados e governantes com visão que em conjunto permitam pôr em prática estes passos de que o Ribatejo e o país necessitam.

APRESENTAÇÃO DO PEPAC Setor agrícola apreensivo

O Conselho de Acompanhamento da Política Agrícola Comum (PAC) continua a elaborar o Plano Estratégico da PAC (PEPAC), que operacionaliza a sua aplicação em Portugal no período 2023-2027. Para o setor agrícola, a apresentação deste plano estratégico já peca por tardia.

Sara Pelicano

OPEPAC começou a ser discutido no passado mês de abril, em reunião do Conselho de Acompanhamento da PAC. Na altura, Maria do Céu Antunes, ministra da Agricultura, afirmou ser “intenção do Governo apresentar o primeiro draft do PEPAC para Portugal no verão, sendo, para isso, fundamental o cumprimento da prioridade da Presidência Portuguesa que corresponde à conclusão da reforma da PAC”. Em junho, durante a Presidência Portuguesa, chegou-se a acordo para a nova PAC, após um período negocial que durou três anos. O desenrolar das negociações fez com que a aplicação da nova PAC fosse adiada por dois anos, tendo agora início em janeiro de 2023. Mais recentemente, Maria do Céu Antunes referiu que a preparação do PEPAC continua em curso, e que até ao final do ano, será apresentada uma primeira proposta à Comissão. Além dis-

so, adianta que a Comissão de Acompanhamento irá realizar uma segunda consulta pública alargada, em novembro, após reunião com os agentes do território, por forma a definir as linhas orientadoras do novo plano estratégico. Perante os sucessivos atrasos na apresentação do PEPAC, o presidente da Direção da AGROMAIS considera que “estamos, no fundo, a tentar fazer políticas de última hora, uma vez que a vontade ambiental da senhora ministra, muitas vezes não lhe dá tempo para ouvir o setor”. Para Luís Vasconcellos e Souza, “o setor, neste momento, não tem quem o defenda”, admitindo que o mesmo terá de se “organizar de outra maneira, uma vez que não tem praticamente representantes no Conselho de Ministros”. Segundo o Ministério da Agricultura, “o PEPAC prossegue três grandes objetivos gerais: garantir o abastecimento alimentar, contribuir para a prossecução de objetivos ambientais e climáticos e promover o desenvolvimento socioeconómico dos territórios rurais”. Além disso, o plano estratégico passa ainda por “promover uma gestão ativa de todo o território, baseada numa produção agrícola e florestal, inovadora e sustentável, alinhada com os objetivos da estratégia ‘Do Prado ao Prato’ e com o conceito ‘Uma só saúde’, que enquadra a garantia da saúde humana, da saúde animal, da fitossanidade e da saúde ambiental”. Em contrapartida, Luís Vasconcellos e Souza defende que “o PEPAC tem de salvaguardar Portugal perante mercados não transparentes e custos periféricos superiores a outros países europeus”. Na sua opinião, o setor agrícola trava atualmente uma “luta desigual”, uma vez que “Portugal estabelece regras sempre mais penalizadoras, em comparação com as de outros países da União Europeia”. Para o Presidente da Direção da Agromais, “as empresas ou existem ou não existem. Se existem é para serem produtivas e competitivas”. Luís Vasconcellos e Souza reconhece que “a Europa vive num ambiente de produção agrícola totalmente diferente do de outras partes do mundo, por isso é normal que tente desenvolver a agricultura de uma forma mais amiga do ambiente”. Todavia, adianta, “o que acontece é que os outros países continuam como se nada fosse, enquanto a Europa criou um submundo em que, dentro desse submundo, Portugal continua com regras muitíssimo mais penalizadoras em comparação com outros países”. Para o líder da AGROMAIS, “o que está a acontecer em relação a determinadas políticas e determinadas questões, sobretudo relacionadas com a parte fitossanitária, é uma incompetência”. Sobre o atraso da apresentação do PEPAC, Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), defende que “o

Ministério da Agricultura já devia ter realizado as reuniões técnicas necessárias entre as confederações, representantes dos agricultores e outras associações”. No seu parecer, “aquilo que é conhecido em termos do PEPAC são ideias vagas”, pois “em termos de documentos de análise e de documentos produzidos para poderem ser discutidos em sede própria, ou seja, com as confederações, ainda estamos a zero”. Eduardo Oliveira e Sousa, revela ain-

(…) ESTAMOS, NO FUNDO, A TENTAR FAZER POLÍTICAS DE ÚLTIMA HORA (…).

Luís Vasconcellos e Souza

PRESIDENTE DA DIREÇÃO DA AGROMAIS

O MINISTÉRIO DA AGRICULTURA JÁ DEVIA TER REALIZADO AS REUNIÕES TÉCNICAS.

Eduardo Oliveira e Sousa

PRESIDENTE DA CAP

da que “na ausência dessas reuniões, a CAP tomou a iniciativa e produziu um documento de trabalho, com medidas definidas e quantificadas no âmbito da arquitetura verde, que posteriormente entregou ao Governo”. Ainda à espera de resposta por parte do Executivo, Eduardo Oliveira e Sousa sublinha “a inércia e a falta de objetividade com que o Ministério da Agricultura está a tratar um assunto desta natureza”. Por sua vez, também Francisco Avillez, coordenador Científico da Agroges, admite que o PEPAC “está um pouco atrasado” e que “é possível que até ao final do ano, altura em que este deve ser entregue a Bruxelas, não se consiga elaborar por completo”. Todavia, ressalva que o setor já deverá ter uma ideia geral e perceber as consequências que advirão para todas as suas fileiras. “Aquilo que está em cima da mesa é globalmente positivo”, afirma Francisco Avillez, apontando que há quem o considere “reformista” e “sem visão da política agrícola”. Na sua opinião, “o PEPAC tem instrumentos suficientes para que o setor dê mais um passo em frente”, apesar de reconhecer que existe sempre “grande resistência ao nível das instituições e das organizações de produtores relativamente a grandes mudanças. Deve haver um equilíbrio

AQUILO QUE ESTÁ EM CIMA DA MESA É GLOBALMENTE POSITIVO.

Francisco Avillez

COORDENADOR CIENTÍFICO DA AGROGES

entre o que é desejável que se fizesse e aquilo que é realizável no curto e médio prazo”. Em relação às verbas alocadas ao PEPAC, Francisco Avillez sublinha que “falta definir que verbas estarão disponíveis”, já que “as medidas existentes são suficientes para se poder chegar a um resultado positivo e favorável em relação ao futuro da nossa agricultura. Quanto mais dinheiro melhor, mas o ideal é que se aproveite da melhor forma possível o montante disponível”. Neste sentido, o coordenador da Agroges acredita que, uma vez apresentado o PEPAC nacional, será possível “equilibrar as decisões no sentido de conseguir compatibilizar aquilo que são os ganhos de eficiência económica com os ganhos de sustentabilidade”.

Milho de regadio: produtividade mais elevada das últimas 3 décadas Mais vida e sabor num novo gene do tomate

O Instituto Nacional de Estatística (INE) estima que a produtividade do milho de regadio possa, esta campanha, ser das mais elevadas das últimas três décadas. “Estima-se um aumento de 5% no rendimento unitário, face a 2020, para as 10,7 toneladas por hectare, ao nível dos mais elevados das últimas três décadas”, lê-se no boletim mensal de Agricultura e Pescas do INE. O mesmo documento esclarece ainda que “no milho para grão de regadio, a colheita das searas mais precoces (de variedades de ciclo mais curto) arrancou no início de setembro, tendo acelerado o ritmo apenas a partir da terceira semana, estimando-se que no final do mês estivesse colhida entre 10% e 15% da área semeada”.

pub. Uma investigação do Boyce Thompson Institute (BTI), a Universidade de Cornell, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e a Universidade de Zhejiang descobriu um novo gene com forte potencial para aumentar o tempo de vida do tomate e melhorar o sabor. Em comunicado, é explicado o estudo do genoma do tomate conduziu “à identificação do S. lycopersicum lateral organ boundaries (SlLOB1), que regulavam uma ampla gama de genes relacionados com a parede celular e processos de amolecimento de fruta. Jim Giovannoni, investigador do BTI, referiu que “o SlLOB1 é interessante porque regula principalmente os genes envolvidos no amolecimento da parede celular e outras mudanças texturais do fruto”.

Gabriela Ventura

UM NOVO CICLO EUROPEU Alinhar o rumo

O início de cada ciclo europeu acarreta necessariamente novos desafios e novas oportunidades que, em termos globais e em particular na última década, o sector agroalimentar tem sabido enfrentar e vencer. É hoje unânime e mensurável a evolução positiva que o sector tem registado, indissociável dos fundos comunitários e sobretudo do esforço e do mérito dos agricultores. Mas o início de um novo ciclo europeu acarreta também novas e acrescidas exigências e riscos, sendo naturalmente o momento de definir o posicionamento com que vamos enfrentá-los. Quando se exige aos agricultores que produzam mais, com mais qualidade, com mais segurança alimentar, com mais sustentabilidade ambiental; que sejam atores centrais na proteção da paisagem e da biodiversidade, mas também na defesa dos direitos de quem trabalha no sector, é essencial traçar um rumo claro, que dê coerência e clareza a estes objetivos e seja percetível por todos, dentro e fora do sector.

O VETOR AMBIENTAL

Em primeiro lugar, é indiscutível a aposta reforçada no vetor ambiental, em linha com o que são hoje as preocupações centrais e incontornáveis, ao nível global. Mais do que ter estados de alma sobre o carácter mais ou menos realista dos objetivos traçados, o sector deve assumir claramente que as preocupações ambientais estão comprovadamente presentes na sua atividade desde há muito, com resultados visíveis; e que o foco tem de estar na consolidação, melhoria e generalização das boas práticas que tem vindo a desenvolver. Não vale a pena interiorizar os objetivos ambientais como inimigos: É absolutamente irrealista e não faz justiça ao que nessa matéria a agricultura tem feito. O que vale a pena é demonstrar que não há defesa do ambiente, do território, da biodiversidade e da paisagem sem uma agricultura desenvolvida, fortemente alicerçada na inovação e na tecnologia.

O VETOR PRODUÇÃO

Mas é igualmente essencial colocar no centro das atenções a necessidade – também reclamada globalmente como objetivo a atingir – do reforço da capacidade produtiva do sector. A evolução tecnológica e as práticas inovadoras adotadas por

um número crescente de agricultores e empresas, demonstram bem que hoje é possível produzir mais, com maior respeito pelo ambiente e uma gestão mais adequada, rigorosa e precisa dos recursos. Por isso, a palavra produção não pode ser uma palavra maldita, até porque quando se fala do sector agrícola, produzir significa alimentar. Imaginemos que durante a pandemia que vivemos, em vez do famigerado papel higiénico, desapareciam dos supermercados os alimentos… Cabe às autoridades europeias e nacionais garantir que este esforço de aumentar a produção com respeito pelos mais elevados padrões ambientais e de segurança – e é obviamente um enorme esforço – não afecte a competitividade europeia e acabe por fazer ricochete sobre os objectivos pretendidos.

O VETOR INOVAÇÃO

É por isso absolutamente coerente a aposta na inovação, que é crucial, quando pretendemos ser mais sustentáveis e mais competitivos; a inovação é a chave para enfrentar, simultaneamente, o desafio ambiental e o desafio da produção e tem que chegar a todos. Por isso o investimento nesta área tem que ser especialmente bem dirigido e reprodutivo. Sejamos realistas, a inovação desenvolve-se cada vez mais em termos globais e os nossos agricultores recorrem – e bem – aos produtos que daí resultam. Importa pois colocar o acento tónico do esforço nacional nesta matéria nas nossas especificidades; garantir que o investimento que se vai fazer tem uma total adesão às necessidades concretas das empresas; que é claramente orientado para resultados; e que os resultados não se dispersam e esfumam, pelo contrário, contribuem objetivamente para a acessibilidade crescente e genérica de todo o sector ao conhecimento e inovação.

O VETOR SOCIAL

Este novo ciclo europeu traz também para o quadro da política agrícola um vetor social, centrado na associação dos pagamentos ao cumprimento das regras relativas aos direitos sociais e laborais. O objetivo subjacente a esta vertente é certamente compreendido por todos, mas a forma como vai ser prosseguido é essencial para que não tenha efeitos nefastos, que podem revelar-se contraproducentes. É preciso ter confiança nas leis que temos, garantir a respetiva e efetiva aplicação e resistir à tentação de ir pelo caminho, indubitavelmente mais fácil, de acreditar que atingimos o objetivo fazendo mais leis. E é também essencial garantir que o Estado tem a agilidade suficiente para atingir o objetivo a que se propõe, sem prejudicar a fluidez e celeridade dos pagamentos devidos aos agricultores. Sabemos que o sector tem que fazer face a diversos constrangimentos que impactam na sua competitividade, como os custos de contexto ou a própria localização geográfica; o pagamento atempado das ajudas comunitárias é essencial para não agravar as suas dificuldades face aos competidores diretos.

O NOSSO RUMO

Finalmente, é importante que todos os atores tenham claros os objetivos estratégicos nacionais. É em função deles que se deve definir como desenvolver e aplicar a agenda europeia em Portugal, aproveitando toda a margem de flexibilidade e simplificação que este novo ciclo possibilita. Só quando sabemos claramente para onde queremos ir é que podemos encontrar ventos favoráveis. A redução progressiva do deficit (em valor) da nossa balança alimentar deve ser, sem dúvida, um objetivo estratégico a prosseguir de forma permanente e estruturada, através de uma aposta clara na produção, com base na inovação, na eficiência, na digitalização. A própria continuidade da performance que temos registado em matéria de exportações está obviamente dependente deste objetivo; que passa também pela progressiva organização do sector e tem que congregar todos, precisa de todos, independentemente da dimensão de cada um. Esta aposta na capacidade produtiva tem que englobar uma lógica de reforço das cadeias de valor associadas ao investimento agrícola; é preciso promover, de forma consistente, que o investimento que fazemos, quer na agricultura, quer em infraestruturas se traduz, crescentemente, em efetivo valor acrescentado.

Eleger a água – o seu acesso, armazenamento e uso eficiente - como foco central e constante é um objetivo indissociável do reforço da capacidade produtiva e da gestão sustentável dos recursos. A utilização eficiente e sustentável da água determina, cada vez mais, a diferença entre poder ou não poder fazer; entre conseguir ou não conseguir fazer de forma competitiva. Por isso deve ser uma aposta forte, acompanhada de um esforço de investigação e inovação que permita encontrar

pub. soluções para as áreas em que o acesso à água seja impossível. Simplificar e clarificar as regras e o funcionamento da máquina do Estado, porque a burocracia desnecessária e sobretudo a incerteza e a imprevisibilidade são os maiores inimigos do investimento e por isso de qualquer estratégia sólida de crescimento do sector; fomentam a fraude e desacreditam o Estado, que acaba por não ter capacidade para fazer cumprir as regras que define. Acreditar que a autoridade do Estado é diretamente proporcional ao número e à complexidade das regras que impõe é uma armadilha perigosa; a autoridade constrói-se com regras essenciais, percetíveis e estáveis, aplicadas de forma absolutamente equitativa, transparente, consistente e sem hesitações.

Reivindicar e construir uma centralidade para a agricultura. O sector é, por dever, mas também por direito próprio, ator principal no quadro das grandes prioridades atuais e futuras; isso deve ter uma correspondência na importância económica, social e política que assume. Esse caminho tem que ser feito pelo Estado e pelo sector, com base numa relação de confiança, profissionalismo e exigência recíproca. Há poucos anos, agricultura era sinónimo de subsidiodependência; ninguém – ninguém mesmo – pronunciava as palavras investimento, exportações, tecnologia, ambiente a propósito de agricultura. Se conseguimos que tanta coisa mudasse desde aí, temos que ter confiança na nossa capacidade para mais um salto qualitativo.

PRR Uma oportunidade perdida

O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) não reserva grande espaço de manobra para a agricultura. O setor considera ser “uma oportunidade perdida” e mostra o desapego do Governo em relação à agricultura.

Sara Pelicano

OPlano de Recuperação e Resiliência (PRR) é um programa de aplicação nacional, com um período de execução até 2026, que vai implementar um conjunto de reformas e de investimentos destinados a repor o crescimento económico sustentado, reforçando o objetivo de convergência com a Europa ao longo da próxima década. O PRR está assente em três grandes pilares: Resiliência; Transição Climática e Transição Digital. A agricultura parece ser a grande ausente deste plano, já aprovado em Bruxelas e do qual já chegaram as primeiras verbas. Para Luís Vasconcellos e Souza, presidente da direção da AGROMAIS, esta ausência mostra bem como a agricultura neste momento “está a ser tratada como um subsetor”, mais acrescentando que “há uma discriminação negativa do setor face a outras atividades. Neste momento, estamos a ir num caminho inclinado para baixo a grande velocidade”. Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da CAP, recorda que o PRR “não é um instrumento financeiro de apoio à tesouraria”, mas sim um plano para relançar a economia e, em Portugal, decidiu-se “fazer investimentos que beneficiam diretamente instituições do Estado, como é o caso do INIAV. Estes são investimentos que “a longo prazo poderão ter impacto na economia”. No entanto, poderíamos fazer como alguns países em que o PRR foi focado no “relançamento da economia através da atividade priva-

da”. Eduardo Oliveira e Sousa partilha que “gostaríamos que o Estado tivesse olhado para as diferentes componentes que o país precisa para se relançar e aproveitar este instrumento financeiro que, conjugado com o plano financeiro plurianual, tivéssemos uma verdadeira bazuca que permitisse atirar Portugal para as carruagens da frente. Não vai acontecer infelizmente, por isso, o PRR é uma oportunidade perdida”. Pensar no PRR como um plano de apoio ao desenvolvimento do setor agroalimentar nos próximos anos é concluir que “é um apoio relativamente marginal”, comenta Francisco Avillez, coordenador científico da Agroges. O mesmo responsável recorda que uma margem significativa do PRR ficará alocada à agenda de inovação. Esta tem o seu lugar e importância, porque é relevante para o setor sobretudo transferir conhecimento das universidades para o mundo empresarial. No entanto, é de salientar que há algumas iniciativas no âmbito do PRR que podem ter impacto mais direto no setor agrícola como seja a construção da barragem do Pisão, no Crato. O contrato de financiamento do empreendimento envolve um investimento global de 171 milhões de euros, dos quais 120 milhões foram inscritos pelo Governo no PRR, cabendo a sua execução à Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA).

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PRR Receio que no final do dia, esta possa ser mais uma oportunidade perdida

Pedro Santos

DIRETOR-GERAL DA CONSULAI

OPRR tem sido apresentado como a panaceia de todos os problemas da economia nacional e que é a última oportunidade para Portugal. Na verdade, todos sabemos que não é. Ao vermos a estrutura do Programa, ninguém pode criticar as componentes e os eixos referidos, mas também percebemos que, na prática, a prioridade está centrada na concretização de muitos dos projetos que ao longo dos últimos anos têm sido adiados e no financiamento de estruturas do Estado que são historicamente subfinanciadas pelo Orçamento do Estado. Trata-se de um programa com um envelope financeiro de 16,6 M€, em que a agricultura apenas representa 3,6%, com um montante total de 599 M€ (o que representa 6% do montante global do Programa de Desenvolvimento rural para o período 2021-2027). Sendo o setor agrícola, claramente, um dos setores com taxas mais elevadas de execução histórica dos programas, seria de esperar, num cenário em que é necessário garantir execução rápida dos fundos, que pudesse ser dos setores mais abrangidos por medidas estruturantes de apoio. Apesar de ter sido um setor que não foi tão afetado diretamente pela crise pandémica, o que permitiu que não faltassem alimentos às pessoas nem que se quebrassem cadeias de abastecimento, parece-me que seria expectável que fosse um dos setores mais afetados no período pós-pandemia. A atual conjuntura de aumento de preços de matérias-primas e dos fatores de produção irá criar um conjunto de dificuldades acrescidas ao setor produtivo e o PRR não responde a nenhum dos problemas que daí advêm. Num cenário em que existirá, no

próximo período de programação do Desenvolvimento Rural, menos financiamento para o investimento nas explorações agrícolas e nas unidades agroindustriais, o PRR poderia ser um importante complemento para dinamização de projetos estruturantes que ajudassem a reduzir os impactos relacionados com a gestão da água e com a desertificação (climática e populacional) do território, que são dois dos mais importante desafios societais que enfrentaremos nas próximas décadas. A questão da água implicaria uma ação muito mais ambiciosa na criação de mais barragens e/ou de sistemas capilares de pequenos regadios que permitam, por um lado, garantir que não falta água para a produção de alimentos e, por outro lado, que se possa promover uma agricultura mais competitiva em algumas regiões. A questão da desertificação que, naturalmente, tem diversas dimensões, depende também de questões relacionadas com a dinamização de territórios que permitam criar mais riqueza. Para isso, necessitamos, no mínimo, de uma estrutura fundiária mais adequada, no aumento do valor criado pela produção nacional e na valorização das atividades desenvolvidas no mundo rural. Isso implicaria, por um lado, uma aposta em modelos de emparcelamento, que promovam a criação de uma dimensão mínima de explorações agrícolas (condição básica para que haja competitividade), uma aposta forte na promoção de uma “marca-país” com impacto nos mercados destino das nossas produções e o desenvolvimento de uma campanha de promoção, com escala, bem pensada e atrativa, do mundo rural e da atratividade dos territórios rurais. O PRR não tem qualquer resposta para essas questões. Julgo que todos gostaríamos sempre de ver o nosso setor com mais recursos e que temos tendência para pedir sempre, e sempre, mais. É humano e eu também gostaria, naturalmente, de ter visto isso neste PRR. Mas o que mais me preocupa é a falta de ambição que este Programa traz para o setor, parecendo que o remete cada vez mais para um papel quase irrelevante. Não sei se por falta de visão ou por falta de peso político, mas a verdade é que parece que é esquecido, ou diminuído, o papel multiplicador do investimento agrícola no conjunto da economia e na dinamização dos territórios. Por exemplo, os primeiros concursos abertos no âmbito da “Terra Futura”, uma das linhas de investimento para o setor mais relevantes no PRR, revelam uma lógica de “mais do mesmo”. Ao longo dos últimos anos já todos assistimos à promoção de Projetos Mobilizadores, de Centros Operativos, de Centros Tecnológicos, de Centos de Competências, entre outros. Alguém verdadeiramente parou para pensar no real impacto de tantos desses projetos? E se as suas atividades chegaram às empresas e à produção? Às vezes parece que estamos mais preocupados em criar uma semântica diferente para fazer tudo igual, do que pegar no que existe de melhor e potenciar os seus resultados. Tenho receio que no final do dia, esta possa ser mais uma oportunidade perdida.

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GRUPO ISAGRI E CENTRALGEST Juntas dão “resposta às necessidades do mundo agrícola”

O Grupo ISAGRI adquiriu a CentralGest, uma editora portuguesa de software de gestão SaaS (Software as a Service) para a área contabilística e empresas. A Isagri Luso será a Unidade de Negócios Agro que continuará a ser dirigida por Jorge Neves. O software da CentralGest permite a gestão comercial, contabilidade, processamento de salários, desmaterialização SAFT e, entre outras funcionalidades, ligações bancárias. Em comunicado, as empresas esclarecem que “o Grupo ISAGRI agrega à CentralGest o seu software técnico, 650 clientes e os pontos fortes da sua filial ISAGRI Luso para acelerar a conquista dos mercados agrícola, cooperativo, industrial e de comércio agroalimentar”. Esta união tem como objetivo “acelerar o crescimento da CentralGest, que superior a 20% ao ano, e dar uma resposta global às necessidades do mundo agrícola em Portugal”. O Grupo ISAGRI, fundado em 1983, em França, “revolucionou o mercado agrícola ao tornar os sistemas de informação de gestão acessíveis a um alargador número de pessoas”, lê-se em comunicado. A empresa está orientada para as indústrias e fornecedores disponibilizando sistemas de informação e soluções de gestão dedicados aos agricultores, viticultores, cooperativas, indústria alimentar, entre outras áreas de negócio; possui um software de consultoria e soluções de gestão para contabilistas certificados e seus clientes; software para arquivo eletrónico, cofres digitais e plataformas de documentos desmaterializados; sistemas de rede de comunicação para empresas, armazenamento de dados e gestão informática e, entre outras valias, elabora estudos de marketing e estudos técnicos. Hoje em dia tem um volume de negócios de 241 milhões de euros, emprega mais de 2.000 pessoas em vários países. A união agora anunciada vai gerar um volume de negócios de 2,5 milhões de euros, empregar 50 colaboradores, integrar 5.000 clientes empresariais e 1.000 clientes de gabinetes de contabilidade. “A ambição do Grupo ISAGRI é tornar-se o líder mundial na agricultura digital, o líder europeu em soluções verticais de gestão empresarial e o líder francês na edição de software para a área dos gabinetes de contabilidade até 2030”, informa comunicado da empresa.

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Jorge Pires

COORDENADOR DO COMITÉ TÉCNICO FISCAL DO GRUPO MONERIS

Proposta de Lei do Orçamento do Estado

A proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2022 (Proposta de Lei n.º 116/XIV/3.ª) foi apresentada pelo Governo na Assembleia da Republica e, desde logo, foi objeto de análise e de vários comentários, que consideram o documento aquém das expectativas existentes para que no ano 2022 seja alcançada, de facto, a tão ansiada retoma económica pós pandemia Covid-19 para as famílias e para as empresas. No que respeita ao IRS, a proposta contém um conjunto de alterações ao nível do regime fiscal aplicável a ex-residentes que venham a tornar-se residentes em 2021, 2022 e 2023, bem como ao nível do IRS jovem para as categorias A e B, e ainda alterações da dedução à coleta para famílias com mais de 2 dependentes, com o objetivo de reduzir a carga fiscal. Verifica-se também o alargamento dos escalões de rendimentos que passam de sete para nove e com a redução do limiar do valor do escalão máximo de 80.882,00€ para 75.009,00€. Por outro lado, e ainda no âmbito do IRS, a proposta prevê o englobamento obrigatório do saldo positivo entre as mais-valias e as menos-valias apuradas na alienação onerosa de partes sociais e outros valores mobiliários (até aqui tributado autonomamente à taxa de 28%), quando resultem de ativos detidos por um período inferior a 365 dias e o sujeito passivo tenha um rendimento coletável, incluindo este saldo, igual ou superior a 75.009,00€. Esta medida, caso seja mantida na versão final da Lei do OE2022, conduzirá a um potencial agravamento da tributação destas transações, podendo vir a prejudicar a retoma dos mercados de capitais. Ao nível do IRC, e contrariamente às expectativas existentes por parte das empresas, há poucas novidades face às regras em vigor em 2021, referindo-se o aumento da dedução ao lucro tributável dos rendimentos provenientes de contratos que tenham por objeto a cessão ou a utilização temporária de direitos de propriedade industrial sujeitos a registo, que passa de 50% para 85%, e a extinção do pagamento especial por conta, pese embora se trate de uma medida com muita pouca relevância pois as empresas que apresentem a Modelo 22 e a IES dentro dos prazos legais já podiam deixar de efetuar o pagamento especial por conta. Continuam a não ser agravadas em 10 pontos percentuais as taxas de tributação autónoma para os sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal em 2022 desde que reúnam determinadas condições, e é aprovado o regime do Incentivo Fiscal à Recuperação (IFR), em jeito de continuidade do Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (CFEI II) que vigorou no 2.º semestre de 2020 e no 1.º semestre de 2021, não obstante o IFR seja mais restritivo do que o CFEI II, pois para além da obrigatoriedade de não cessação dos contratos de trabalho durante três anos nas modalidades despedimento coletivo ou por extinção dos postos de trabalho, também não será possível distribuir lucros durante três anos. Em 2022 o IFR também irá tendencialmente gerar menores valores de dedução à coleta do IRC comparativamente com o CFEI II, especialmente para as empresas que já tenham efetuado investimentos relevantes e significativos no triénio 2019-2021. Volta a propor-se o adiamento para o ano 2023 da implementação do SAF-T (PT) relativo à contabilidade, assim como da menção do código ATCUD nas faturas e outros documentos fiscalmente relevantes, mantendo-se a obrigatoriedade de introdução do QR Code até 31 de dezembro de 2021 para constar nas faturas a partir de 1 de janeiro de 2022. Durante o 1.º semestre de 2022, as micro, pequenas e médias empresas, desde que verificadas determinadas condições, nomeadamente a diminuição do volume de negócios confirmada por contabilista certificado, poderão efetuar os pagamentos do IVA e IRS/IRS em prestações, sendo que as declarações periódicas do IVA podem ser enviadas até ao dia 20 do segundo mês seguinte ao da prática das operações. Por último, referir que a proposta de Lei do OE2022 contém um vasto conjunto de medidas para reforçar o setor público e a sua capacidade de resposta, que poderá conduzir a um aumento considerável da despesa pública.

Carlos Trindade CONSULTOR

Fundos de investimento no sector agrícola

Nos últimos anos o sector agroalimentar tem sido alvo de um conjunto de grandes investimentos promovidos por Fundos de Investimento, principalmente localizados no sul do país e na zona de influência do empreendimento de Alqueva. No presente artigo efetua-se uma breve análise deste tipo de investimentos tentando identificar o contributo que esta nova forma de abordagem pode trazer ao sector em Portugal e em especial ao setor agrícola de regadio. Os fundos de investimento são instrumentos financeiros que resultam das aplicações de vários investidores individuais e institucionais em ativos financeiros diversos procurando atingir uma determinada rentabilidade esperada. Trata-se assim de uma modalidade de investimento coletiva, em que vários investidores colocam um ativo comum, a ser gerido por uma equipa profissional com base numa estratégia previamente conhecida. Os investidores têm uma participação no fundo proporcional ao montante que investem, materializada num determinado número de unidades de participação. São produtos regulamentados pela Comissão Nacional do Mercado de Valores Mobiliários, bem como pelas sociedades gestoras que os gerem. Os fundos de investimento são habitualmente classificados de acordo com: • as classes de ativos em que investem (ações, obrigações de dívida pública ou privada, derivados, moeda, depósitos, imobiliários, entre outros); • a estrutura dos seus capitais e dos seus detentores, sendo a mais comum a classificação em abertos ou fechados; • a sua duração, apresentando um prazo indeterminado ou sendo perfeitamente delimitados no tempo. Muitos são os fundos disponíveis no mercado nacional e colocados junto dos aforradores individuais, sendo os fundos de ações, de obrigações, monetários e os fundos de investimento imobiliário os mais frequentes. No caso do sector agroalimentar, estão numa primeira linha um conjunto de fundos nacionais e internacionais, com uma dimensão muito considerável. Independente mente da sua forma e classificação a sua atuação é efetuada de quatro formas principais: • Fundos de Investimento Imobiliário principalmente direcionados para a aquisição e gestão de imóveis de rendimento. Estes fundos, habitualmente os mais conservadores, adquirem propriedades com potencial de valorização e externalizam a realização das atividades produtivas a terceiros (por exemplo mediante arrendamentos); • Fundos de Private Equity que adquirem posições em empresas do sector para financiar a sua restruturação ou expansão. Nesta situação encontram-se empresas agrícolas e florestais, agroalimentares, de consultoria e de fatores de produção. Devido à sua complexidade, os fundos de Private Equity só estão disponíveis para investidores qualificados; • Fundos de Capital de Risco, mais centrados em empresas em início de atividade (start-ups) e direcionados habitualmente para o setor de tecnologia com um potencial de rápido crescimento; • Fundos que adquirem empresas e imóveis e que as gerem diretamente, remunerando o seu capital através dos resultados obtidos com a atividade e com o acréscimo de valorização obtido, aquando da saída. Em qualquer dos casos, trata-se de um modelo de organização que procura remunerar da melhor forma os capitais dos detentores das unidades de participação. Independentemente da sua dimensão e dispersão do capital, este é sempre o objetivo: criar mais-valias para os investidores de forma a remunerar adequadamente os seus capitais. Sendo o sector agrícola, frequentemente apontado como tendo muitas dificuldades de rentabilidade, onde os lucros são muitas vezes inexistentes, como é que se compreende a entrada destes capitais? Poderemos apontar um conjunto de razões estruturais e conjunturais para estas explicações: • o atual momento económico-financeiro mundial com taxas de juro muito baixas (até frequentemente negativas) torna atrativos investimentos com reduzidas taxas de rentabilida-

de que, noutra conjuntura, não seriam sequer olhadas como uma aplicação alternativa; • a enorme disponibilidade de capitais existentes ao nível mundial que procura diversificar as suas aplicações e que encontra no sector uma possibilidade alternativa; • a segurança dos investimentos associados a ativos duradouros e principalmente, a terra, olhada hoje como um bem escasso. Em Portugal, e embora continue a persistir alguma instabilidade na política fiscal e uma burocracia ainda muito pesada, destacam-se um conjunto de razões adicionais: • a disponibilidade de terras de média/grande dimensão e com boas aptidões edafoclimáticas; • a existência de reservas de água com garantia de quantidade e qualidade, como acontece na zona de influência de Alqueva; • o preço da terra, que apesar de ter verificado um movimento em alta no caso do regadio, é ainda mais baixo que noutros países semelhantes; • um ambiente de estabilidade económica, social e política; • a existência de um conjunto de infraestruturas que permitem boas condições logísticas e de comunicações e uma posição geoestratégica privilegiada, que facilitam o contacto com o exterior e as exportações; • alguma disponibilidade de mão-de-obra qualificada, a preços relativamente baixos, e uma política favorável ao acolhimento de mão-de-obra emigrante para tarefas menos diferenciadas; • a possibilidade de apoios públicos aos investimentos. Importa ainda salientar de que forma pode este tipo de investimentos, promovidos por Fundos, contribuir de forma positiva para o desenvolvimento do sector agrícola de regadio em Portugal. • Desde logo, destaca-se a capacidade financeira, que permite efetuar investimentos muito relevantes, impossíveis de realizar pela maioria dos proprietários e empresários portugueses quando tomados individualmente. • O elevado nível tecnológico resultante da integração frequente em redes de conhecimento que permitem o domínio de tecnologia de ponta, tendo sido frequentemente os percursores de novas formas de produção; • As economias de escala resultantes de investimentos elevados, que proporcionam um melhor acesso a fatores intermédios de produção, a mão-de-obra e a equipamentos; • A capacidade de gestão, que permite avançar de forma mais eficiente para a execução adequada dos projetos, para o controlo das operações e para o repport aos acionistas. O fato de estas entidades estarem permanentemente sob escrutínio de terceiros (quer das equipas de avaliação e auditoria, quer dos detentores das Unidades de Participação), implica um nível de transparência e necessidade de eficiência muito elevado. Como foi referido, a grande maioria dos Fundos tem um limite de vigência temporal, pelo que habitualmente o curto e médio prazo é o tempo de atuação. Provavelmente é esta a maior divergência face às tradicionais empresas de origem familiar, onde a perpetuidade do sistema de exploração da terra é a principal estratégia. Assim, assistimos à preferência por arrendamentos em detrimento de aquisições e, no caso de aquisições, os ativos imobiliários (terra) serão vendidos no final da vida do fundo. Foi o desenvolvimento de novas tecnologias de culturas permanentes, com árvores mais densas, menores e com mais rápida entrada em produção que atraiu muitos fundos para estas áreas. Mais do que um atrativa Taxa Interna de Rentabilidade do Investimento a muito longo prazo é necessário que no prazo de vida do fundo essa taxa possa ser interessante. E hoje temos pomares de amêndoa, noz ou olival como uma clara opção para investimentos a 20 anos. Uma entrada em produção muito lenta, implicando um período de recuperação excessivamente longo, mesmo com uma vida da plantação 40 ou 50 anos não é habitualmente considerada interessante. Desta forma de abordagem resultam igualmente alguns riscos para o sector. Numa perspetiva de sustentabilidade ambiental, associada principalmente ao solo e à água, é essencial que sejam efetuadas práticas culturais adequadas de forma a não haver delapidação de recursos. A forte pressão que a opinião publica hoje tem sobre estes temas, transmite-se de uma forma bastante intensa aos detentores dos fundos, que começam a exigir rótulos de sustentabilidade nas suas intervenções conduzindo, de forma crescente, a boas práticas sociais e de respeito pelo ambiente. É aliás hoje frequente que os temas de fixação do carbono, da promoção da biodiversidade e do respeito pelos solos seja uma das melhores bandeiras na captação de investidores, tanto mais que muito do capital disponível provém de países com forte sensibilidade ambiental. Em conclusão, o investimento efetuado por fundos pode ser uma excelente alavanca para o crescimento do Valor Acrescentado do sector agroalimentar nacional constituindo uma muito boa forma de financiamento e de gestão, desde que seja possível associá-los a boas práticas ambientais e sociais que garantam a sustentabilidade dos nossos recursos.

Abertura de candidaturas do PRR componente 5 – Capitalização e inovação empresarial

O âmbito da componente 5 visa promover a execução de planos de ação em matéria de investigação e inovação, enquadrado em iniciativas no âmbito da Agenda de Inovação para a Agricultura 20|30. Estes concursos estão direcionados para candidaturas à Iniciativa Emblemática 3 – Mitigação das alterações climáticas, visando promover a redução das emissões de GEE no setor agrícola, assim como potenciar o aumento do sequestro de carbono no solo e à Iniciativa Emblemática 4 – Adaptação às alterações climáticas, visando a celebração de contratos de financiamento promover um setor agrícola mais resiliente, dando resposta aos atuais impactos das alterações climáticas e os que são esperados no futuro. A apresentação das candidaturas é feita através de formulário eletrónico disponível no Sistema de Informação do IFAP, IP, disponível em https://www.ifap.pt/web/guest/prr-candidaturas durante o período definido nos Avisos de Abertura, com início em 30 de setembro de 2021 e fim a 30 de novembro de 2021, às 17h00. A apresentação das candidaturas implica o registo prévio obrigatório na Bolsa de Iniciativas, disponível na plataforma eletrónica da RRN em www.rederural.gov.pt/bolsa-iniciativas-prr.

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Love Butternut, uma campanha para a abóbora empresarial

A campanha Love Butternut visa promover o consumo da abóbora ibérica e é uma iniciativa de cerca de 200 produtores portugueses e espanhóis. “A missão do Love Butternut, que conta com a participação dos principais produtores de abóbora em Portugal, é estimular o consumo que, hoje, é de apenas 0,85 quilos per capita”, lê-se em comunicado. Saiba mais em https://lovebutternut.com/pt/.

A agricultura portuguesa: desafio para o futuro

FRANCISCO AVILLEZ

No decorrer da última edição da Agroglobal, em setembro, Francisco Avillez, engenheiro agrónomo, professor emérito do Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa e sócio fundador e coordenador científico da AGROGES - Sociedade de Estudos e Projetos, lançou o livro “A agricultura portuguesa: desafio para o futuro”. A obra reúne um conjunto de textos de sua autoria, publicados em jornais, revistas e sites entre 2015 e 2020. Tratam-se de artigos de opinião, datados, que ficam assim reunidos numa coletânea para memória futura. Estruturado em três partes – enquadramento geral, reflexões sobre o setor agrícola nacional e a Política Agrícola Comum – o livro aborda questões muito atuais como a sustentabilidade ambiental, a neutralidade carbónica, a água, os solos, o futuro da alimentação, entre muitos outros temas. Francisco Avillez abordada também a economia e a rentabilidade para os agricultores, um tema que o preocupa. O autor comenta que “não temos conseguido melhorar a eficiência no uso dos fatores de produção e o fator capital, ou seja, não temos conseguido produzir mais valor acrescentado por cada unidade de produto final que produzimos. Nessa perspetiva, apesar de termos tido uma evolução aparentemente muito positiva e de ter havido uma grande modernização e melhorias tecnológicas, na prática o nosso setor está praticamente estagnado, tem tido crescimentos perfeitamente débeis”. Estas e outras reflexões estão agora reunidas num mesmo espaço, o que fez deste livro uma obra de “consulta” acessível a qualquer pessoa que tenha interesse em refletir e debruçar-se sobre o desafio para o futuro da agricultura nacional.

RESERVA NATURAL DO PAUL DO BOQUILOBO O documentário, realizado por Carlos Mateus de Lima, desvenda a beleza e potencialidades da Reserva Natural do Paul do Boquilobo. PRODUÇÃO DE MILHO DE FORMA SUSTENTÁVEL Na Quinta da Cholda, o produtor de milho João Coimbra mostra como adotou a agricultura de precisão e como esta é fundamental para produzir de forma mais eficiente.

INÍCIOS DA AGROTEJO E DA AGROMAIS Acompanhe os momentos da agricultura no ano de 1990, no programa TV Rural. FAÇA CHUVA OU FAÇA SOL Neste programa, a produção de milho no Norte do Vale do Tejo está em destaque.

26 Produtores de cereais consideram haver desinteresse do Governo

A Estratégia Nacional para a Promoção da Produção de Cereais foi apresentada há três anos e pouco se concretizou até hoje. Os produtores de cereais consideram que há falta de “vontade política” e descrevem como “incompreensível” algumas decisões tomadas.

Sara Pelicano

AResolução do Conselho de Ministros n.º 101/2018 aprovou a Estratégia Nacional para a Promoção da Produção de Cereais. Passados três anos, são poucos os eixos definidos nesta estratégia que tiveram avanço. O setor do milho considera que “não existe vontade política” para implementar um conjunto de propostas desta estratégia, comenta Jorge Neves, presidente da ANPROMIS (Associação Nacional de Produtores de Milho e Sorgo). Algumas das medidas já implementadas, como a marca Cereais do Alentejo e o centro de competências INOVMILHO, resultam do trabalho dos empresários agrícolas. “Temos já algumas medidas implementadas, nomeadamente aquelas que dependiam da produção e que se centram na valorização da fileira”, afirma José Pereira Palha, presidente da direção da ANPOC – Associação Nacional de Produtores de Cereais. A estratégia nasce pelo reconhecimento da importância dos cereais para o país e, por isso, uma das metas estabelecidas tem como objetivo reduzir a dependência externa, ou seja, atingir algum grau de autoaprovisionamento. E, nesta área, muito pouco se tem feito. José Palha mantém-se otimista e considera “ser possível atingir um grau de autoaprovisionamento de 20%”. Por outro lado, Jorge Neves está mais cético: “a estratégia começa exatamente pela situação preocupante em que nos encontramos de dependência”, mas nada se avançou. “Estamos totalmente expostos às importações num momento em que vemos, ao nível da cadeia logística de abastecimento, que as coisas estão complicadíssimas pelo mundo fora. Para o Governo isto não é uma prioridade. O nosso grau de autoaprovisionamento nos cereais é tão pequenino que ao fim de meia dúzia de dias de colheita, o stock esgota-se”. José Palha descreve ainda como “incompreensível a retirada da ajuda ligada aos cereais da proposta enviada pelo Governo português para Bruxelas, no que concerne ao período de transição (2022), como aliás tinha sido pubicamente anunciada pela senhora ministra da Agricultura, por mais que uma vez, nos últimos meses. Esta era uma medida emblemática, que, na nossa opinião, e à semelhança do que acontece em dez países da União Europeia, poderia dar um grande impulso a este tipo de pro-

dução e mostrava a preocupação da tutela com a produção”. O mesmo responsável diz ainda que “infelizmente a agricultura não é uma prioridade deste Governo, pelo que, tem preferido dar contrapartidas do sector a jogos de política doméstica com os partidos que apoiam o Governo, ao invés de se focar no que é essencial para o país, e para o sector, nomeadamente o elevado grau de dependência de Portugal nos cereais, cerca de 90% nos cereais praganosos, estando, no seio da UE, apenas Malta numa situação de maior dependência, sendo que estes são a base da alimentação humana e animal”. Jorge Neves recorda que, em época de colheita, o país tem milho nacional disponível, mas consome todo, não ficando nada em reserva. “Quando acabamos as colheitas, ficamos totalmente expostos às importações. Se por algum azar, um navio atrasar uma semana, se calhar ficamos sem cereais ou sem milho porque não há reservas estratégicas em Portugal”, afirma Jorge Neves. José Palha acrescenta que “os cereais são uma importante peça no mosaico agrícola nacional, desde logo porque existem no país muitas áreas sem alternativas culturais viáveis, se não as pastagens pobres em extensivo seguidas do abandono, e, até por uma razão de coesão territorial, de fomentar a presença de pessoas nas zonas rurais. Para o produtor cria obviamente condições mais difíceis, este tipo de culturas tem margens pequenas, pelo que apesar da valorização da produção dar uma ajuda, nomeadamente através da comercialização com uma marca, e da valorização da qualidade, pode não ser o incentivo necessário para que mais área não se perca, levando mais superfície para abandono, e provocando uma situação de dependência do exterior ainda maior”.

DEPENDÊNCIA DE MERCADOS INSTÁVEIS O presidente da ANPROMIS recorda ainda um dos problemas da falta de autoaprovisionamento em cereais é “ficarmos dependentes de países instáveis. Atualmente, há uma escassez relativa de cereais no mundo. Mas não podemos esquecer que temos um país chamado China que quando intervém no mercado destabiliza tudo. Tirando os Estados Unidos da América, que tem uma situação política estável, os outros grandes fornecedores de milho são países muito instáveis como a Argentina, Brasil, Ucrânia e Rússia. São estes quatro países que de alguma maneira condicionam ou facilitam o comércio mundial de cereais. São economias frágeis e desequilibradas, que ao mínimo sinal de aumento dos preços do mercado mundial desincentivam a exportação. Ficamos, assim, dependentes da boa vontade política destes países”.

CENTROS DE COMPETÊNCIAS SÃO UMA REALIDADE Os centros de competências são espaços onde as entidades envolvidas têm margem para avançar com trabalho efetivo em cada um dos setores. No caso dos cereais, oleaginosas e proteaginosas, o centro de competências designa-se por CEREALTECH e visa “promover o trabalho em rede e a integração da fileira, capacitar e disseminar informação, contribuindo assim para a inovação e incorporação de conhecimento nas empresas e organizações do setor agrícola”. O centro já tem neste momento algum trabalho desenvolvido, nomeadamente a conclusão de uma agenda de inovação, “que era o nosso principal objetivo de curto prazo, pois representa a base de todo o trabalho do centro de competências e uma ferramenta fundamental para o sector, na medida em que concentra as necessidades de inovação de toda a cadeia de valor – produção, transformação e distribuição. O processo de definição da agenda de inovação do CEREALTECH partiu de um estudo da realidade do setor e passou por várias fases de consulta generalizada à fileira, numa lógica de promoção do debate e do comprometimento perante a mesma. No fundo, a agenda de inovação identifica os caminhos para tornar a fileira dos cereais mais competitiva, sustentável e preparada para o futuro”. O centro de competências dedicado ao milho, o INOVMILHO, já desenvolveu “vários tipos de ações desde dias de campo onde é possível assistir a demonstrações de novas técnicas na área do milho, formações, entre outras ações”, esclarece Jorge Neves.

José Palha

PRESIDENTE DA ANPOC

“(…) INCOMPREENSÍVEL A RETIRADA DA AJUDA LIGADA AOS CEREAIS DA PROPOSTA ENVIADA PELO GOVERNO PORTUGUÊS PARA BRUXELAS, (…).

Jorge Neves

PRESIDENTE DA ANPROMIS

(…) NÃO EXISTE VONTADE POLÍTICA (…).

Jorge Durão Neves DIRETOR-GERAL DA AGROMAIS

Ponderação, precisa-se!

Sou completamente insuspeito na defesa intransigente do papel das OP’s na organização da produção em Portugal. Sou levado a acreditar, também, que seja esse o posicionamento do Ministério da Agricultura português. Até aqui, e no plano meramente teórico, estamos de acordo. O pior é a prática… A transposição do direito comunitário no que respeita à manutenção do reconhecimento das OP’s, mais concretamente a partir da publicação da Portaria nº 169/2015, veio desestabilizar totalmente o ténue, mas crescente, esforço de organização da produção, nomeadamente nos setores tradicionalmente reconhecidos até então (Frutas e Produtos Hortícolas e Cereais). Não mais, a partir desse momento, se conseguiu um enquadramento estável para a organização da produção, quer pelo facto de o regime de manutenção de reconhecimento pouco ou nada dizer aos agricultores, quer pela sanha persecutória da Administração, que vê um inimigo em cada Organização de Produtores. É triste, mas é assim! Se, só por si, esta situação já seria por demais preocupante, acresce agora a instabilidade nos mercados mundiais, neste período pós-COVID, rastilho para, por parte dos produtores menos interessados na organização da produção, poder provocar brechas insanáveis no funcionamento das OP’s. O imediatismo e o taticismo na decisão de alguns poderá claramente pôr em risco o esforço que muitos agricultores, durante muitos anos, imprimiram no fortalecimento das suas organizações. Não tomemos a nuvem por Juno, até porque as nuvens no horizonte apontam mais para tempestade do que para bonança. É bom que aqueles que não reconhecem a importância, e o trabalho feito, das OP’s reflitam sobre isto! Organismos do Ministério da Agricultura e alguns (poucos!) agricultores!

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Domingos dos Santos PRESIDENTE DA DIREÇÃO DA FNOP*

ORGANIZAÇÕES DE PRODUTORES Mais futuro

As Organizações de Produtores (OP) são um pilar fundamental na organização e nas relações entre diversos agentes na cadeia agroalimentar – agricultores, indústria, retalho e outros. A criação das organizações de produtores remonta há mais de duas décadas com o objetivo de melhorar o equilíbrio nas relações existentes entre os produtores e a indústria ou os grandes retalhistas na fileira hortofrutícola. Paralelamente, foi desde logo instituído um envelope financeiro e um pacote legislativo de modo a incentivar a organização da produção. Como a implementação e reconhecimento das OP na fileira hortofrutícola teve bastante sucesso em alguns países, a Direção-Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural da Comissão Europeia (DG AGRI) estendeu a possibilidade do reconhecimento de OP a outras fileiras agrícolas, uma excelente decisão diga-se. No entanto, rapidamente veio a verificar-se que isto poderia ser um presente envenenado, pois as regras, a pouca robustez jurídica e a carga burocrática tornaram-se fatores inibidores do crescimento das OP. Portugal é um país pequeno, mas com uma agricultura muito diversificada ao longo de todo o território, o que faz com que as Organizações de Produtores sejam uma ferramenta preponderante no sucesso dos agricultores, no entanto, o nosso nível de organização é bastante baixo comparativamente com a média da União Europeia, o que nos obriga a refletir sobre esta situação pouco coerente.

pub. As OP são e serão o garante de uma economia mais justa, de um modo de produção mais sustentável e com grande responsabilidade social. Então se esta é a realidade, porque não são criadas mais OP e as que existem não têm um crescimento significativo, quer em Volume de Produção Comercializada (VPC), quer em número de produtores? Deixaram-se de fazer diferenciações positivas, através de majorações nos investimentos a sócios das OP, não se dá às organizações a possibilidade de serem as tutoras dos jovens que entram para a atividade agrícola, aumentou-se significativamente a carga burocrática e os respetivos custos de contexto, são múltiplos os organismos intervenientes nas decisões, por vezes com interpretações distintas em relação aos mesmos assuntos e falta ainda, rapidez e clareza na transposição dos regulamentos comunitários e orientações da DG AGRI. Considero que o Ministério da Agricultura e os seus organismos demitiram-se desta temática e abdicaram da ambição de aproximar o nível da produção organizada em Portugal da média da União Europeia. Falta, claramente, envolvimento político e comprometimento nesta matéria. Nós agricultores esperamos que se inverta esta tendência de desvalorizar as Organizações de Produtores e que se possa dar início a um novo ciclo, conjuntamente com a implementação do novo quadro comunitário, em que as OP sejam encaradas como uma ferramenta verdadeiramente importante para a produção e um parceiro do Ministério da Agricultura, contribuindo para a manutenção de uma produção sustentável, aumentando a rentabilidade dos agricultores e da economia no seu todo. Organizados somos mais fortes.

*Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas

Ondina Afonso PRESIDENTE DO CLUBE DE PRODUTORES CONTINENTE

Os clubes de produtores e a sua relevância

A palavra “clube” normalmente remete-nos para um grupo restrito de entidades selecionadas, sob determinados critérios, e que usufruem de benefícios específicos, tendo em conta o seu posicionamento em determinados setores da sociedade. A maior parte das vezes não são entidades jurídicas, constituindo-se como plataformas informais de cooperação. No setor agroalimentar nacional existem algumas iniciativas desta natureza e com objetivos específicos diferentes, mas sob um objetivo comum: a agregação de empresas e organizações. É o caso do Clube de Produtores Continente (CPC). Não sendo uma entidade jurídica, posiciona-se há mais de 20 anos, como uma plataforma agregadora de produtores agroalimentares e agropecuários que abastecem as lojas da Sonae MC. Este Clube foi criado num tempo onde a agricultura nacional necessitava de apoio próximo, por forma a responder aos desafios e necessidades de uma empresa da grande distribuição, principalmente no que respeita à estabilidade quer da qualidade quer da quantidade de produtos frescos. Da identificação de produtores com elevado potencial ao estabelecimento de contratos que proporcionavam garantias de escoamento dos seus produtos, rapidamente sentiu-se a necessidade de ir mais além. Em 2005, o CPC cria a sua própria certificação, baseada em critérios de qualidade e segurança alimentar e que permitia avaliar a performance dos produtores bem como providenciar suporte para ultrapassar as não conformidades identificadas. Pela atratividade dos mercados externos, os produtores membros do CPC lançaram-se para as exportações com níveis de confiança elevados, adquiridos pela experiência com a Sonae MC e, especificamente, pelo contributo da certificação. Tal certificação robusteceu os procedimentos de qualidade e segurança alimentar internos, permitindo responder às exigências de players externos. Ao longo dos anos, o CPC tem vindo a organizar momentos de reflexão e partilha de informação, junto dos seus produtores, colocando-os a par da evolução do mercado, das tendências de consumo e desafiando-os para uma oferta mais diferenciadora e inovadora, muitas das vezes aliada à tradição. Estes momentos, são por isso considerados importantes para consolidar a parceira entre o maior retalhista nacional e a produção nacional, bem como de partilha de informação entre empresas/organizações do mesmo setor. Com a evolução dos hábitos de consumo, onde os consumidores esperam dos produtos que adquirem o cumprimento de um conjunto enorme de atributos como a indulgência, a saúde e a sustentabilidade do planeta, o CPC tem desenvolvido algumas ações para que, em conjunto, se consiga endereçar essa procura, muitas das vezes difícil de atender, pela necessidade de investimentos e tempo de implementação. O CPC, enquanto plataforma de aceleração da incorporação de novos conhecimentos e novas tecnologias mune-se de outros parceiros que possam também contribuir para que os seus produtores consigam acompanhar aquela evolução. É o caso do Conselho Científico do CPC, criado em 2016 e composto por um conjunto de investigadores portugueses reconhecidos internacionalmente pela sua produção científica, que anualmente partilham resultados de projetos de investigação e desenvolvimento com os produtores. Com o “Green Deal”, a Comissão Europeia apresentou ao setor agroalimentar europeu o desafio dos desafios: atingirmos a neutralidade carbónica em 2050 assente num conjunto de metas muito claras e que visam contribuir para este objetivo maior. A materialização destes desafios, espelhada na Estratégia Europeia “Farm to Fork” está prevista acontecer até 2030, contudo a transição tem de começar já! Para tal implementação, serão necessários investimentos, meios e formação aliados a parcerias estratégicas que garantam uma cadeia de abastecimento mais sustentável, nas suas várias dimensões. Enquanto retalhista, os clientes estão no centro da nossa atividade e do propósito de melhorar constantemente a experiência de compra. A montante temos a produção nacional, os nossos produtores, e com eles queremos cada vez mais aumentar a oferta de produtos nacionais de excelência e surpreender os nossos clientes.

Mas, porque a Política Agrícola tem um papel que vai para além de garantir alimentos suficientes seguros e a preços acessíveis para os consumidores, entendemos que caberá também ao Estado garantir um apoio à produção, adequado às pequenas e médias explorações e que favoreça a agregação dessas iniciativas em organizações de produtores com capacidade para incorporar as novas tecnologias de informação bem como melhores práticas ambientais. Os “clubes de produtores” são de facto muito relevantes para a economia nacional, mas sem uma política agregadora e de suporte à excelência, o esforço dos produtores poderá ser em vão.

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Smart Farm Colab recruta investigadores

O laboratório colaborativo para a inovação digital na agricultura, Smart Farm Colab, está a recrutar um investigador com mestrado na área da eletrónica, eletrotécnia e áreas afins e um doutorado em engenharia, informática ou áreas afins. Para mais informações visite o site https://pt.sfcolab.org/hiring Um estudo da Universidade de Quiel, publicado em setembro, analisa a estratégia europeia Do Prado ao Prato na ótica da produção. A conclusão a tirar é de que a estratégia resultará numa redução significativa da produção agrícola na União Europeia. De acordo com o trabalho, poderá haver um declínio na produção, que varia entre -20% na carne bovina, -6,3% para o leite, -21,4% para os cereais e -20% para as sementes oleaginosas. Em consequência desta quebra de produção, poderá haver um aumento dos preços no espaço da União Europeia. O mesmo trabalho considera ainda que a redução da aplicação de fitofármacos pode

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Do Prado ao Prato, uma estratégia que pode reduzir produção agrícola

ser compensado, em parte, pelo aumentos do controle mecânico de ervas daninhas e cultivo do solo. O estudo Economic and Environmental impacts of the Green Deal on the Agricultural Economy: A Simulation Study of the Impact of the F2F-Strategy on Production, Trade, Welfare and the Environment based on the CAPRI-Model analisa ainda os impactos da estratégia do Prado ao Prato no consumo e do comércio de produtos agrícolas.

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